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Este documento é um excerto do sítio EUR-Lex

Documento 62018CJ0830

    Acórdão do Tribunal de Justiça (Nona Secção) de 2 de abril de 2020.
    Landkreis Südliche Weinstraße contra PF e o.
    Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Oberverwaltungsgericht Rheinland-Pfalz.
    Reenvio prejudicial — Livre circulação dos trabalhadores — Regulamento (UE) n.o 492/2011 — Filhos de trabalhadores fronteiriços — Vantagens sociais — Sistema de reembolso das despesas de transporte escolar — Requisito de residência num Land — Exclusão dos filhos que frequentam a escola nesse Land e que residem num Estado‑Membro diferente do Estado‑Membro do estabelecimento escolar frequentado — Exclusão dos cidadãos nacionais residentes nos outros Länder.
    Processo C-830/18.

    Coletânea da Jurisprudência — Coletânea Geral

    Identificador Europeu da Jurisprudência (ECLI): ECLI:EU:C:2020:275

     ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Nona Secção)

    2 de abril de 2020 ( *1 )

    «Reenvio prejudicial — Livre circulação dos trabalhadores — Regulamento (UE) n.o 492/2011 — Filhos de trabalhadores fronteiriços — Vantagens sociais — Sistema de reembolso das despesas de transporte escolar — Requisito de residência num Land — Exclusão dos filhos que frequentam a escola nesse Land e que residem num Estado‑Membro diferente do Estado‑Membro do estabelecimento escolar frequentado — Exclusão dos cidadãos nacionais residentes nos outros Länder»

    No processo C‑830/18,

    que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Oberverwaltungsgericht Rheinland‑Pfalz (Tribunal Administrativo Superior da Renânia‑Palatinado, Alemanha), por Decisão de 11 de dezembro de 2018, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 28 de dezembro de 2018, no processo

    Landkreis Südliche Weinstraße

    contra

    PF e o.,

    sendo interveniente:

    Vertreter des öffentlichen Interesses,

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Nona Secção),

    composto por: S. Rodin, presidente de secção, D. Šváby e N. Piçarra (relator), juízes,

    advogado‑geral: M. Szpunar,

    secretário: A. Calot Escobar,

    vistos os autos,

    vistas as observações apresentadas:

    em representação da Comissão Europeia, por C. Hödlmayr e B.‑R. Killmann, na qualidade de agentes,

    vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

    profere o presente

    Acórdão

    1

    O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 7.o, n.o 2, do Regulamento (UE) n.o 492/2011 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de abril de 2011, relativo à livre circulação dos trabalhadores na União (JO 2011, L 141, p. 1).

    2

    Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe PF ao Landkreis Südliche Weinstraße, a respeito da tomada a cargo, pelo Land, das despesas de transporte escolar de filhos de trabalhadores fronteiriços.

    Quadro jurídico

    Direito da União

    3

    Os considerandos 3 a 5 do Regulamento n.o 492/2011 indicam:

    «(3)

    É conveniente prever disposições que permitam alcançar os objetivos fixados nos artigos 45.o e 46.o do Tratado [FUE] no domínio da livre circulação.

    (4)

    A livre circulação constitui um direito fundamental dos trabalhadores e das suas famílias. […] O direito que assiste a todos os trabalhadores dos Estados‑Membros de exercerem a atividade da sua escolha na União deverá ser afirmado.

    (5)

    Este direito deverá ser reconhecido sem discriminações aos trabalhadores permanentes, sazonais e fronteiriços e àqueles que exercem a sua atividade para fins de prestação de serviços.»

    4

    O artigo 7.o, n.os 1 e 2, deste regulamento dispõe:

    «1.   O trabalhador nacional de um Estado‑Membro não pode ser sujeito no território de outro Estado‑Membro, em razão da sua nacionalidade, a um tratamento diferente daquele que é concedido aos trabalhadores nacionais no que respeita a todas as condições de emprego e de trabalho, nomeadamente em matéria de remuneração, de despedimento e de reintegração profissional ou de reemprego, se ficar desempregado.

    2.   O trabalhador referido no n.o 1 beneficia das mesmas vantagens sociais e fiscais que os trabalhadores nacionais.»

    5

    O artigo 10.o do referido regulamento prevê:

    «Os filhos de um nacional de um Estado‑Membro que esteja ou tenha estado empregado no território de outro Estado‑Membro são admitidos nos cursos de ensino geral, de aprendizagem e de formação profissional nas mesmas condições que os nacionais deste Estado, desde que residam no seu território.

    Os Estados‑Membros devem encorajar as iniciativas que lhes permitam seguir os cursos acima referidos nas melhores condições.»

    Direito alemão

    6

    O § 56, n.o 1, da Rheinland‑pfälzisches Schulgesetz (Lei relativa à Organização do Sistema Escolar do Land da Renânia‑Palatinado), de 30 de março de 2004 (GVBl. RP 2004, p. 239), conforme alterado em último lugar pelo artigo 10.o da Lei de 16 de fevereiro de 2016 (GVBl. RP 2016, p. 37), dispõe:

    «A escolaridade é obrigatória para todas as crianças, jovens e adolescentes com domicílio na Renânia‑Palatinado ou que aí tenham a sua residência habitual, sem prejuízo de disposições de direito internacional ou de acordos entre Estados.»

    7

    O § 69 desta lei, relativo ao serviço de transporte escolar, estabelece:

    «(1)   Cabe aos Landkreise (distritos) e às kreisfreie Städte (cidades‑distrito), a título de competência obrigatória no âmbito da sua autonomia, assegurar o transporte dos alunos para as escolas primárias e para as escolas de ensino especial situadas no seu território, quando os alunos tenham a sua residência na Renânia‑Palatinado e não possa razoavelmente ser‑lhes exigido que efetuem o trajeto até à escola sem recorrerem a um meio de transporte.

    O disposto no parágrafo anterior também é aplicável ao transporte dos alunos:

    1. Até ao estabelecimento de ensino secundário mais próximo […]

    Quando for frequentada uma escola fora da Renânia‑Palatinado, o Landkreis ou a kreisfreie Stadt devem suportar as despesas de transporte dos alunos que residem no seu território.

    (2)   Entende‑se que o trajeto para a escola não pode razoavelmente ser efetuado sem utilização de um meio de transporte quando for especialmente perigoso ou quando o trajeto a pé mais curto que não seja especialmente perigoso, entre a residência e a escola primária, for superior a dois quilómetros e, entre a residência e a escola de ensino secundário […], for superior a quatro quilómetros. […]

    (3)   Caso seja frequentada uma escola que não seja a mais próxima na aceção [do n.o 1, segundo parágrafo, ponto 1], os custos só serão assumidos na mesma medida em que devessem ser assumidos em relação ao transporte para a escola mais próxima. Para efeitos de determinação da escola mais próxima só devem ser tidas em conta as escolas onde é lecionada a primeira língua estrangeira escolhida. […]

    (4)   Esta tarefa será prioritariamente realizada através da assunção dos custos necessários de transporte para utilização dos transportes públicos. Se não existirem transportes públicos com ligações razoáveis devem ser utilizados autocarros escolares. Os custos com outros meios de transporte só serão assumidos até ao valor que os mesmos atingiriam nos casos previstos na primeira frase.»

    8

    O § 5, n.o 1, da Rheinland‑pfälzisches Landesgesetz über den öffentlichen Personennahverkehr (Lei relativa aos Transportes Públicos Urbanos e Interurbanos do Land da Renânia‑Palatinado), de 17 de novembro de 1995 (GVBl. RP 1995, p. 450), conforme alterado em último lugar pelo § 12 da Lei de 22 de dezembro de 2015 (GVBl. RP 2015, p. 516), prevê:

    «Os responsáveis pelos serviços de transporte público local de passageiros nos termos do § 1, n.o 2, ponto 1, são os Landkreise (distritos) e as kreisfreie Städte (cidades‑distrito). Trata‑se de uma missão facultativa que se enquadra na autonomia administrativa destas entidades coletivas, que as mesmas suportam no limite da sua capacidade financeira. […]»

    Litígio no processo principal e questões prejudiciais

    9

    PF, de nacionalidade alemã, reside em França com os seus pais, também de nacionalidade alemã. Frequenta uma escola de ensino secundário no Landkreis Südliche Weinstraße do Land da Renânia‑Palatinado, na Alemanha. O local de trabalho da sua mãe situa‑se igualmente na Alemanha.

    10

    As despesas de transporte escolar de PF foram assumidas pelo Landkreis, onde frequenta a escola, até ao ano letivo de 2014‑2015. No entanto, relativamente ao ano de 2015‑2016, o Landkreis notificou, por aviso de 16 de junho de 2015, que as despesas de transporte escolar de PF deixariam de ser tomadas a cargo, em conformidade com as disposições legais em vigor na Renânia‑Palatinado. Com efeito, esta legislação prevê que o Landkreis só é obrigado a organizar o transporte escolar para os alunos que residem nesse Land.

    11

    PF apresentou uma reclamação contra a decisão do Landkreis, que foi indeferida. Em seguida, interpôs recurso dessa decisão de indeferimento para o Verwaltungsgericht Neustadt an der Weinstraße (Tribunal Administrativo de Neustadt em Weinstraße, Alemanha). Este último deu provimento ao recurso com o fundamento de que PF, enquanto filho de um trabalhador fronteiriço, tinha o direito de beneficiar da tomada a cargo das suas despesas de transporte escolar, nos termos do artigo 7.o, n.o 2, do Regulamento n.o 492/2011.

    12

    O Landkreis interpôs recurso dessa sentença no órgão jurisdicional de reenvio, o Oberverwaltungsgericht Rheinland‑Pfalz (Tribunal Administrativo Superior da Renânia‑Palatinado, Alemanha). Este pretende saber se uma disposição como o § 69, n.o 1, segundo parágrafo, ponto 1, da Lei relativa à Organização do Sistema Escolar do Land da Renânia‑Palatinado viola o artigo 7.o, n.o 2, do Regulamento n.o 492/2011.

    13

    Com efeito, o órgão jurisdicional de reenvio considera que esta última disposição é aplicável ao processo de que conhece. Entende, por um lado, que a tomada a cargo das despesas de transporte escolar em causa no processo principal constitui uma vantagem social na aceção do artigo 7.o, n.o 2, do Regulamento n.o 492/2011. Por outro lado, recorda que, segundo o Acórdão de 12 de maio de 1998, Martínez Sala (C‑85/96, EU:C:1998:217, n.o 25), este conceito cobre todas as vantagens relacionadas ou não com um contrato de trabalho, que são geralmente reconhecidas aos trabalhadores nacionais, em razão da sua qualidade objetiva de trabalhador ou pelo simples facto da sua residência no território nacional, e cuja extensão aos trabalhadores nacionais de outros Estados‑Membros se mostra suscetível de facilitar a sua mobilidade.

    14

    O órgão jurisdicional de reenvio pergunta, todavia, se a medida nacional em causa no processo principal conduz a uma discriminação indireta dos trabalhadores migrantes, na aceção do artigo 7.o, n.o 2, do Regulamento n.o 492/2011.

    15

    A este respeito, sublinha nomeadamente que, nos processos em que o Tribunal de Justiça foi chamado a pronunciar‑se, o requisito de residência abrangia todo o território do Estado‑Membro em causa. Ora, no processo principal, uma vez que o requisito de residência está limitado a uma parte do território alemão, a medida nacional exclui do benefício da prestação social em causa no processo principal quase exclusivamente os filhos de trabalhadores residentes nesse Estado‑Membro, ao passo que apenas um número limitado de filhos de trabalhadores migrantes é afetado.

    16

    No entanto, no caso de esta medida nacional ser considerada indiretamente discriminatória, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se a referida medida nacional pode ser justificada por uma razão imperiosa de interesse geral, em concreto, a necessidade de assegurar a organização efetiva do sistema escolar. Este objetivo legítimo enquadra‑se na escolaridade obrigatória, que tem por finalidade garantir o direito à educação inscrito no artigo 26.o da Declaração Universal dos Direitos do Homem, adotada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948, e no artigo 14.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia.

    17

    O órgão jurisdicional de reenvio precisa que existe uma ligação indissociável entre a organização do sistema escolar e o território, o que permite justificar o requisito de residência previsto na legislação nacional em causa no processo principal. A este respeito, refere‑se ao artigo 10.o do Regulamento n.o 492/2011, que subordina o direito de frequentar cursos de ensino geral a um requisito de residência no Estado‑Membro, como o Tribunal de Justiça declarou no Acórdão de 13 de junho de 2013, Hadj Ahmed (C‑45/12, EU:C:2013:390, n.o 31).

    18

    Além disso, o órgão jurisdicional de reenvio indica que o abandono de tal requisito de residência será difícil de implementar. Com efeito, tratando‑se de um aluno residente num Estado‑Membro diferente do Estado‑Membro do estabelecimento escolar frequentado, seria complicado determinar o estabelecimento escolar mais próximo, para calcular o montante das despesas de transporte escolar a reembolsar.

    19

    Nestas condições, o Oberverwaltungsgericht Rheinland‑Pfalz (Tribunal Administrativo Superior da Renânia‑Palatinado) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

    «1.

    Deve o artigo 7.o, n.o 2, do Regulamento [n.o 492/2011] ser interpretado no sentido de que uma disposição de direito nacional que limita a obrigação dos entes territoriais nacionais (Landkreise) de fornecerem transporte escolar aos residentes do correspondente Estado federado (Bundesland) tem um efeito discriminatório indireto mesmo quando resulta das circunstâncias de facto que, através do requisito da residência, são predominantemente excluídos da prestação os residentes no resto do território nacional do Estado‑Membro?

    No caso de resposta afirmativa à primeira questão:

    2.

    A organização efetiva do sistema escolar constitui uma razão imperiosa de interesse geral suscetível de justificar uma discriminação indireta?»

    Quanto à primeira questão

    20

    Com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 7.o, n.o 2, do Regulamento n.o 492/2011 deve ser interpretado no sentido de que uma legislação nacional que subordina a tomada a cargo do transporte escolar por um Land a um requisito de residência no território desse Land constitui uma medida indiretamente discriminatória.

    21

    Para responder a esta questão, em primeiro lugar, importa precisar, por um lado, que qualquer nacional da União, independentemente do seu lugar de residência e da sua nacionalidade, que faz uso do direito de livre circulação dos trabalhadores e exerce uma atividade profissional num Estado‑Membro diferente do Estado‑Membro da sua residência, está abrangido pelo âmbito de aplicação do artigo 45.o TFUE, disposição que o Regulamento n.o 492/2011 visa concretizar (v., neste sentido, Acórdão de 21 de fevereiro de 2006, Ritter‑Coulais, C‑152/03, EU:C:2006:123, n.o 31).

    22

    Assim, um nacional de um Estado‑Membro que, mantendo o seu emprego nesse Estado, transfere o seu domicílio para outro Estado‑Membro está abrangido pelo âmbito de aplicação das disposições do Tratado FUE relativas à livre circulação dos trabalhadores e, portanto, do Regulamento n.o 492/2011 [v., neste sentido, quanto ao Regulamento (CEE) n.o 1612/68 do Conselho, de 15 de outubro de 1968, relativo à livre circulação dos trabalhadores na Comunidade (JO 1968, L 257, p. 2; EE 05 F1 p. 77), revogado e substituído pelo Regulamento n.o 492/2011, Acórdão de 18 de julho de 2007, Hartmann, C‑212/05, EU:C:2007:437, n.o 19].

    23

    Por outro lado, há que recordar que este regulamento beneficia os trabalhadores fronteiriços, como decorre dos considerandos 4 e 5 do referido regulamento, por força dos quais o direito que assiste a todos os trabalhadores dos Estados‑Membros de exercerem a atividade da sua escolha na União deverá ser reconhecido sem discriminação aos trabalhadores «permanentes», sazonais e fronteiriços e àqueles que exercem a sua atividade para fins de prestação de serviços. Do mesmo modo, o artigo 7.o do Regulamento n.o 492/2011, que reproduz de forma idêntica o texto do artigo 7.o do Regulamento n.o 1612/68, refere‑se, sem reservas, ao «trabalhador nacional de um Estado‑Membro» (Acórdãos de 27 de novembro de 1997, Meints, C‑57/96, EU:C:1997:564, n.o 50; e de 18 de julho de 2007, Geven, C‑213/05, EU:C:2007:438, n.o 15).

    24

    Além disso, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que um nacional de um Estado‑Membro que, mantendo o seu emprego nesse Estado, transferiu o seu domicílio para outro Estado‑Membro e exerce, desde então, a sua atividade profissional como trabalhador fronteiriço pode invocar o estatuto de «trabalhador migrante» na aceção do Regulamento n.o 492/2011 (v., quanto ao Regulamento n.o 1612/68, revogado e substituído pelo Regulamento n.o 492/2011, Acórdão de 18 de julho de 2007, Hartmann, C‑212/05, EU:C:2007:437, n.o 20).

    25

    No caso em apreço, o processo principal diz respeito a um nacional alemão que trabalha na Alemanha, mas reside em França. Consequentemente, o elemento de conexão com o direito da União prende‑se com a residência desse trabalhador num Estado‑Membro diferente daquele de que é nacional. Uma vez que o referido trabalhador exerceu a sua liberdade de circulação, tem, portanto, o direito de invocar, contra o Estado‑Membro de que é nacional, o Regulamento n.o 492/2011, que tem por objeto a aplicação da livre circulação dos trabalhadores na União, nomeadamente o artigo 7.o, n.o 2, deste regulamento.

    26

    Em segundo lugar, importa referir que os membros da família de um trabalhador migrante são beneficiários indiretos da igualdade de tratamento concedida a esse trabalhador pelo artigo 7.o, n.o 2, do Regulamento n.o 492/2011 (v., quanto ao artigo 7.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1612/68, atual artigo 7.o, n.o 2, do Regulamento n.o 492/2011, Acórdão de 20 de junho de 2013, Giersch e o., C‑20/12, EU:C:2013:411, n.o 40).

    27

    Quanto ao conceito de vantagem social a que se refere o artigo 7.o, n.o 2, deste regulamento, ele cobre todas as vantagens relacionadas ou não com um contrato de trabalho, que são geralmente reconhecidas aos trabalhadores nacionais pelo simples facto da sua residência no território nacional, e cuja extensão aos trabalhadores nacionais de outros Estados‑Membros se mostra suscetível de facilitar a sua mobilidade (v., designadamente, Acórdãos de 12 de maio de 1998, Martínez Sala, C‑85/96, EU:C:1998:217, n.o 25; e de 20 de junho de 2013, Giersch e o., C‑20/12, EU:C:2013:411, n.o 38).

    28

    Daqui resulta que a tomada a cargo do transporte escolar de um membro da família constitui uma vantagem social na aceção desta disposição.

    29

    Em terceiro lugar, importa recordar que o artigo 7.o, n.o 2, do Regulamento n.o 492/2011 constitui uma expressão particular, no domínio específico da concessão de vantagens sociais, do princípio da igualdade de tratamento consagrado no artigo 45.o TFUE e deve ser interpretado da mesma forma que esta última disposição (Acórdão de 10 de outubro de 2019, C‑703/17, EU:C:2019:850, n.o 21; v., igualmente, quanto ao artigo 7.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1612/68, atual artigo 7.o, n.o 2, do Regulamento n.o 492/2011, Acórdão de 20 de junho de 2013, Giersch e o., C‑20/12, EU:C:2013:411, n.o 35).

    30

    Este princípio da igualdade de tratamento proíbe não só as discriminações ostensivas, baseadas na nacionalidade, mas também todas as formas dissimuladas de discriminação que, por aplicação de outros critérios de distinção, conduzam, de facto, ao mesmo resultado (Acórdão de 10 de outubro de 2019, C‑703/17, EU:C:2019:850, n.o 23; v., igualmente, quanto ao artigo 7.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1612/68, atual artigo 7.o, n.o 2, do Regulamento n.o 492/2011, Acórdão de 20 de junho de 2013, Giersch e o., C‑20/12, EU:C:2013:411, n.o 41 e jurisprudência referida).

    31

    Assim, um requisito de residência no território nacional imposto por uma legislação nacional para beneficiar de um subsídio de educação dos filhos constitui uma discriminação indireta na medida em que é suscetível, pela sua própria natureza, de afetar mais os trabalhadores migrantes do que os trabalhadores nacionais e, consequentemente, pode desfavorecer mais particularmente os primeiros (v., quanto ao Regulamento n.o 1612/68, revogado e substituído pelo Regulamento n.o 492/2011, Acórdão de 18 de julho de 2007, Hartmann, C‑212/05, EU:C:2007:437, n.os 28 a 31).

    32

    Daqui resulta que a medida nacional em causa no processo principal, uma vez que subordina o reembolso das despesas de transporte escolar a um requisito de residência no Land, é suscetível, pela sua própria natureza, de desfavorecer mais particularmente os trabalhadores fronteiriços que residem noutro Estado‑Membro. Por conseguinte, constitui uma discriminação indireta, proibida pelo artigo 7.o, n.o 2, do Regulamento n.o 492/2011.

    33

    Esta conclusão não pode ser posta em causa pelo facto de os trabalhadores nacionais, que residem nos outros Länder, serem igualmente afetados por esta medida nacional.

    34

    Com efeito, por um lado, há que recordar que, uma vez estabelecido que a regulamentação nacional é suscetível, pela sua própria natureza, de afetar mais os trabalhadores fronteiriços do que os trabalhadores nacionais, é indiferente, para efeitos da qualificação de discriminação indireta, que a medida nacional afete, eventualmente, tanto os nacionais que não podem cumprir esse critério como os trabalhadores fronteiriços. Para que uma medida possa ser qualificada de indiretamente discriminatória, não é necessário que tenha por efeito favorecer todos os nacionais ou desfavorecer apenas os nacionais dos outros Estados‑Membros, com exclusão dos nacionais (v., neste sentido, Acórdão de 13 de março de 2019, Gemeinsamer Betriebsrat EurothermenResort Bad Schallerbach, C‑437/17, EU:C:2019:193, n.os 31 e 32; v., igualmente, quanto ao Regulamento n.o 1612/68, revogado e substituído pelo Regulamento n.o 492/2011, Acórdão de 20 de junho de 2013, Giersch e o., C‑20/12, EU:C:2013:411, n.o 45).

    35

    Por outro lado, uma vez que a discriminação em causa no processo principal tem origem num requisito de residência numa parte do território de um Estado‑Membro e não num requisito de nacionalidade, pouco importa, para determinar a existência de uma discriminação conforme definida nos n.os 30 e 31 do presente acórdão, que os trabalhadores nacionais que residem noutro Land sejam igualmente discriminados por esse requisito de residência. A sua situação enquadra‑se, eventualmente, no conceito de discriminação inversa e não é abrangida pelo direito da União (v., neste sentido, Despacho de 19 de junho de 2008, C‑104/08, não publicado, EU:C:2008:357, n.os 22 e 23).

    36

    Em todo o caso, tal medida nacional constitui um entrave à livre circulação dos trabalhadores, proibido pelo artigo 7.o, n.o 2, do Regulamento n.o 492/2011, uma vez que, mesmo indistintamente aplicável, é suscetível de impedir ou dissuadir um nacional de um Estado‑Membro de sair do seu Estado de origem para exercer o seu direito de livre circulação (v., neste sentido, Acórdão de 15 de dezembro de 1995, Bosman, C‑415/93, EU:C:1995:463, n.o 96).

    37

    Tendo em conta as considerações precedentes, há que responder à primeira questão prejudicial submetida que o artigo 7.o, n.o 2, do Regulamento n.o 492/2011 deve ser interpretado no sentido de que uma legislação nacional que subordina a tomada a cargo do transporte escolar por um Land a um requisito de residência no território desse Land constitui uma discriminação indireta, na medida em que é suscetível, pela sua própria natureza, de afetar mais os trabalhadores fronteiriços do que os trabalhadores nacionais.

    Quanto à segunda questão

    38

    Com a sua segunda questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 7.o, n.o 2, do Regulamento n.o 492/2011 deve ser interpretado no sentido de que a necessidade de assegurar a organização efetiva do sistema escolar constitui uma razão imperiosa de interesse geral suscetível de justificar uma medida nacional qualificada de discriminação indireta.

    39

    Importa recordar que uma discriminação indireta é, em princípio, proibida, a menos que seja objetivamente justificada. Para isso, deve, por um lado, ser adequada para garantir a realização de um objetivo legítimo e, por outro, não ir além do necessário para alcançar esse objetivo (Acórdãos de 20 de junho de 2013, Giersch e o., C‑20/12, EU:C:2013:411, n.o 46; e de 10 de julho de 2019, Aubriet, C‑410/18, EU:C:2019:582, n.o 29).

    40

    A este respeito, o Tribunal de Justiça declarou que uma ação empreendida por um Estado‑Membro para assegurar um nível elevado de formação da sua população residente prossegue um objetivo legítimo suscetível de justificar uma discriminação indireta e que o prosseguimento dos estudos superiores é um objetivo de interesse geral reconhecido ao nível da União (Acórdãos de 20 de junho de 2013, Giersch e o., C‑20/12, EU:C:2013:411, n.o 53; e de 10 de julho de 2019, Aubriet, C‑410/18, EU:C:2019:582, n.o 31).

    41

    Daqui resulta que o objetivo mencionado pelo órgão jurisdicional de reenvio no presente processo, a saber, a organização efetiva do sistema escolar, na medida em que diz respeito ao direito à educação garantido no artigo 14.o da Carta dos Direitos Fundamentais, pode constituir um objetivo legítimo na aceção da jurisprudência recordada no n.o 39 do presente acórdão.

    42

    No entanto, não se pode deixar de observar que, por um lado, embora as disposições nacionais em causa no processo principal se inscrevam no âmbito de uma Lei relativa à Organização do Sistema Escolar do Land da Renânia‑Palatinado, têm exclusivamente por objeto a organização do transporte escolar nesse Land. Por outro lado, o próprio facto de o § 69 da Lei relativa à Organização do Sistema Escolar do Land da Renânia‑Palatinado prever que, quando for frequentada uma escola fora desse Land, o Landkreis ou a kreisfreie Stadt devem suportar as despesas de transporte dos alunos que residem no seu território atesta que a organização do transporte escolar ao nível do Land e a organização do sistema escolar nesse Land não estão necessariamente ligadas.

    43

    Por conseguinte, como a Comissão Europeia observa, as disposições nacionais em causa no processo principal não apresentam uma ligação suficientemente estreita com a organização do sistema escolar para que se possa considerar que essas disposições prosseguem tal objetivo legítimo.

    44

    Em todo o caso, o requisito de residência oposto às partes no processo principal não pode ser considerado indispensável para o planeamento e a organização do transporte escolar, uma vez que, como indica o órgão jurisdicional de reenvio, poderiam ser consideradas outras medidas. Em especial, para o cálculo do montante das despesas de transporte escolar que devem ser reembolsadas, poderia ser tido em conta, a título de domicílio do aluno, «o local onde a linha aérea entre a residência efetiva e a escola mais próxima cruza a fronteira do Land».

    45

    A este respeito, sublinhe‑se que o facto, mencionado pelo órgão jurisdicional de reenvio, de que a implementação de tais medidas alternativas pelas autoridades nacionais é mais complexa não pode, por si só, justificar a violação de uma liberdade fundamental garantida pelo Tratado FUE (v., neste sentido, Acórdão de 26 de maio de 2016, Kohll e Kohll‑Schlesser, C‑300/15, EU:C:2016:361, n.o 59) e, portanto, justificar um entrave à luz do artigo 7.o, n.o 2, do Regulamento n.o 492/2011.

    46

    Tendo em conta todas as considerações precedentes, há que responder à segunda questão prejudicial submetida que o artigo 7.o, n.o 2, do Regulamento n.o 492/2011 deve ser interpretado no sentido de que as dificuldades práticas relacionadas com a organização efetiva do transporte escolar num Land não constituem uma razão imperiosa de interesse geral suscetível de justificar uma medida nacional qualificada de discriminação indireta.

    Quanto às despesas

    47

    Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

     

    Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Nona Secção) declara:

     

    1)

    O artigo 7.o, n.o 2, do Regulamento (UE) n.o 492/2011 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de abril de 2011, relativo à livre circulação dos trabalhadores na União, deve ser interpretado no sentido de que uma legislação nacional que subordina a tomada a cargo do transporte escolar por um Land a um requisito de residência no território desse Land constitui uma discriminação indireta, na medida em que é suscetível, pela sua própria natureza, de afetar mais os trabalhadores fronteiriços do que os trabalhadores nacionais.

     

    2)

    O artigo 7.o, n.o 2, do Regulamento n.o 492/2011 deve ser interpretado no sentido de que as dificuldades práticas relacionadas com a organização efetiva do transporte escolar num Land não constituem uma razão imperiosa de interesse geral suscetível de justificar uma medida nacional qualificada de discriminação indireta.

     

    Assinaturas


    ( *1 ) Língua do processo: alemão.

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