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Documento 62018CJ0515

Acórdão do Tribunal de Justiça (Décima Secção) de 24 de outubro de 2019.
Autorità Garante della Concorrenza e del Mercato contra Regione autonoma della Sardegna.
Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Tribunale amministrativo regionale per la Sardegna.
Reenvio prejudicial — Regulamento (CE) n.o 1370/2007 — Serviços públicos de transporte de passageiros — Transporte ferroviário — Contratos de serviço público — Adjudicação por ajuste direto — Obrigação de publicação prévia de um anúncio relativo à adjudicação por ajuste direto — Alcance.
Processo C-515/18.

Coletânea da Jurisprudência — Coletânea Geral — Parte «Informações sobre as decisões não publicadas»

Identificador Europeu da Jurisprudência (ECLI): ECLI:EU:C:2019:893

 ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Décima Secção)

24 de outubro de 2019 ( *1 )

«Reenvio prejudicial — Regulamento (CE) n.o 1370/2007 — Serviços públicos de transporte de passageiros — Transporte ferroviário — Contratos de serviço público — Adjudicação por ajuste direto — Obrigação de publicação prévia de um anúncio relativo à adjudicação por ajuste direto — Alcance»

No processo C‑515/18,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Tribunale amministrativo regionale per la Sardegna (Tribunal Administrativo Regional da Sardenha, Itália), por Decisão de 4 de julho de 2018, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 6 de agosto de 2018, no processo

Autorità Garante della Concorrenza e del Mercato

contra

Regione autonoma della Sardegna,

sendo interveniente:

Trenitalia SpA,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Décima Secção),

composto por: I. Jarukaitis, presidente de secção, E. Juhász (relator) e C. Lycourgos, juízes,

advogado‑geral: M. Campos Sánchez‑Bordona,

secretário: A. Calot Escobar,

vistos os autos,

vistas as observações apresentadas:

em representação da Autorità Garante della Concorrenza e del Mercato, por S. Gattamelata, avvocato,

em representação da Regione autonoma della Sardegna, por S. Sau e A. Camba, avvocatesse,

em representação da Trenitalia SpA, por L. Torchia e F. G. Albisinni, avvocati,

em representação do Governo italiano, por G. Palmieri, na qualidade de agente, assistida por F. Sclafani, avvocato dello Stato,

em representação do Governo austríaco, por G. Hesse, na qualidade de agente,

em representação da Comissão Europeia, por W. Mölls e G. Conte, na qualidade de agentes,

vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 7.o, n.os 2 e 4, do Regulamento (CE) n.o 1370/2007 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de outubro de 2007, relativo aos serviços públicos de transporte ferroviário e rodoviário de passageiros e que revoga os Regulamentos (CEE) n.o 1191/69 e (CEE) n.o 1107/70 do Conselho (JO 2007, L 315, p. 1).

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a Autorità Garante della Concorrenza e del Mercato (Autoridade da Concorrência, Itália) (a seguir «AGCM») à Regione autonoma della Sardegna (Região Autónoma da Sardenha, Itália) (a seguir «Região da Sardenha») a respeito da adjudicação por ajuste direto à Trenitalia SpA, pela Região da Sardenha, de um contrato de serviço público de transporte ferroviário de passageiros.

Quadro jurídico

Direito da União

3

Os considerandos 25, 29 e 30 do Regulamento n.o 1370/2007 enunciam:

«(25)

O transporte público ferroviário de passageiros suscita questões específicas no que se refere à importância dos investimentos e ao custo das infraestruturas. Em março de 2004, a Comissão [Europeia] apresentou uma proposta de alteração da Diretiva 91/440/CEE do Conselho, de 29 de julho de 1991, relativa ao desenvolvimento dos caminhos de ferro comunitários [(JO 1991, L 237, p. 25)], a fim de garantir a qualquer empresa ferroviária comunitária o acesso às infraestruturas de todos os Estados‑Membros para efeitos da exploração de serviços internacionais de passageiros. O presente regulamento tem como objetivo estabelecer um quadro jurídico para a compensação e/ou direitos exclusivos para os contratos de serviço público, e não uma maior abertura do mercado de serviços de transporte ferroviários.

[…]

(29)

Para efeitos da adjudicação de contratos de serviço público, com exceção de medidas de emergência e de contratos relativos a prestações em quilómetros pouco significativas, as autoridades competentes deverão tomar as medidas necessárias para publicitar, com uma antecedência mínima de um ano, a sua intenção de adjudicar tais contratos, a fim de que os potenciais operadores de serviços públicos possam reagir.

(30)

Os contratos de serviço público adjudicados por ajuste direto deverão estar subordinados a maior transparência.»

4

O artigo 2.o, alínea h), desse regulamento define a «adjudicação por ajuste direto» como a «adjudicação de um contrato de serviço público a um determinado operador de serviços públicos sem qualquer processo prévio de concurso».

5

O artigo 5.o, n.o 6, do referido regulamento dispõe:

«Salvo proibição da legislação nacional, as autoridades competentes podem decidir adjudicar por ajuste direto contratos de serviço público relativos ao transporte ferroviário, com exceção de outros sistemas guiados como os metropolitanos e os metropolitanos ligeiros de superfície. Em derrogação do n.o 3 do artigo 4.o, a duração destes contratos não pode ser superior a dez anos, exceto em caso de aplicação do n.o 4 do artigo 4.o»

6

O artigo 7.o, n.os 2 e 4, deste regulamento prevê:

«2.   Cada autoridade competente toma as medidas necessárias para que, o mais tardar um ano antes da abertura do concurso ou um ano antes da adjudicação por ajuste direto, sejam publicadas no Jornal Oficial da União Europeia, no mínimo, as seguintes informações:

a)

Nome e dados de contacto da autoridade competente;

b)

Tipo de procedimento previsto para a adjudicação;

c)

Serviços e territórios potencialmente abrangidos pela adjudicação.

As autoridades competentes podem decidir não publicar estas informações sempre que um contrato de serviço público diga respeito à prestação anual de menos de 50000 quilómetros de serviços públicos de transporte de passageiros.

Em caso de alteração destas informações posterior à sua publicação, a autoridade competente publica logo que possível uma retificação, a qual em nada afetará a data do lançamento da adjudicação por ajuste direto ou da abertura do concurso.

O presente número não é aplicável ao n.o 5 do artigo 5.o

3.   Relativamente aos contratos de serviço público adjudicados por ajuste direto para o transporte ferroviário previstos no n.o 6 do artigo 5.o, a autoridade competente deve tornar públicas as seguintes informações no prazo de um ano a contar da adjudicação do contrato:

a)

Nome da entidade contratante, respetivo regime de propriedade e, se for caso disso, o nome da parte ou partes que exercem o controlo legal;

b)

Duração do contrato de serviço público;

c)

Descrição dos serviços de transporte de passageiros a efetuar;

d)

Descrição dos parâmetros da compensação financeira;

e)

Objetivos qualitativos, como a pontualidade e a fiabilidade, e os prémios e as sanções aplicáveis;

f)

Condições relativas aos recursos financeiros.

4.   A pedido de uma parte interessada, a autoridade competente deve comunicar os fundamentos da sua decisão de adjudicar por ajuste direto um contrato de serviço público.»

7

O Regulamento n.o 1370/2007 foi alterado pelo Regulamento (UE) 2016/2338 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 14 de dezembro de 2016 (JO 2016, L 354, p. 22). Este regulamento modificativo entrou em vigor em 24 de dezembro de 2017, pelo que não é aplicável aos factos do processo principal.

Direito italiano

8

O artigo 61.o da legge n.o 99 — Disposizioni per lo sviluppo e l’internazionalizzazione delle imprese, nonché in materia di energia (Lei n.o 99, relativa às disposições para o desenvolvimento e a internacionalização das empresas e para a energia), de 23 de julho de 2009 (GURI n.o 176, de 31 de julho de 2009), dispõe:

«As autoridades competentes para a adjudicação de contratos de serviços podem invocar o disposto no artigo 5.o, n.os 2, 4, 5 e 6, e no artigo 8.o, n.o 2, do [Regulamento n.o 1370/2007], mesmo que em derrogação da legislação do setor. A exclusão prevista no artigo 18.o, n.o 2, alínea a), do [decreto legislativo n.o 422 — Conferimento alle regioni ed agli enti locali di funzioni e compiti in materia di trasporto pubblico locale, a norma dell’articolo 4, comma 4, della legge 15 marzo 1997, n.o 59 (Decreto Legislativo n.o 422, relativo à transferência de funções e tarefas em matéria de transporte público local para regiões e organismos locais em conformidade com o artigo 4.o, n.o 4, da Lei n.o 59, de 15 de março de 1997), de 19 de novembro de 1997 (GURI n.o 287, de 10 de dezembro de 1997, p. 4)] não se aplica às sociedades a que, em Itália ou no estrangeiro, tenham sido adjudicados contratos de serviços nos termos do referido [Regulamento n.o 1370/2007].»

9

O decreto legislativo n.o 50 — Attuazione delle direttive 2014/23/UE, 2014/24/UE e 2014/25/UE sull’aggiudicazione dei contratti di concessione, sugli appalti pubblici e sulle procedure d’appalto degli enti erogatori nei settori dell’acqua, dell’energia, dei trasporti e dei servizi postali, nonché per il riordino della disciplina vigente in materia di contratti pubblici relativi a lavori, servizi e forniture (Decreto Legislativo n.o 50 que estabelece as modalidades de aplicação da Diretiva 2014/23/UE, relativa à adjudicação de contratos de concessão, da Diretiva 2014/24/UE, relativa aos contratos públicos, e da Diretiva 2014/25/UE, relativa aos contratos públicos celebrados pelas entidades que operam nos setores da água, da energia, dos transportes e dos serviços postais), de 18 de abril de 2016 (GURI n.o 91, de 19 de abril de 2016), constitui o novo Codice dei contratti pubblici (Código dos Contratos Públicos).

10

O artigo 4.o deste código dispõe:

«A adjudicação dos contratos públicos que tenham por objeto empreitadas, prestação de serviços e fornecimento de bens, e dos contratos geradores de receita para a Administração, excluídos, no todo ou em parte, do âmbito de aplicação objetiva do presente código, deve respeitar os princípios da economia, eficácia, imparcialidade, igualdade de tratamento, transparência, proporcionalidade, publicidade, proteção do ambiente e eficiência energética.»

11

O artigo 17.o, n.o 1, alínea i), do referido código prevê:

«As normas previstas no presente código não são aplicáveis aos contratos e às concessões de serviços relativos a serviços públicos de transporte de passageiros por caminho de ferro ou por metropolitano.»

Litígio no processo principal e questões prejudiciais

12

Em 29 de dezembro de 2015, a Região da Sardenha publicou, nos termos do artigo 7.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1370/2007, um anúncio de pré‑informação relativo a uma adjudicação por ajuste direto de serviços públicos de transporte ferroviário.

13

Na sequência dessa publicação, recebeu, além da proposta do operador histórico Trenitalia, duas manifestações de interesse por parte de operadores económicos ativos nesse setor. Neste contexto, um desses operadores solicitou à Região da Sardenha que indicasse o quadro formal em que se realizaria o concurso e que apresentasse documentação complementar com informações mais pormenorizadas.

14

Tendo considerado que não devia proceder à abertura de um concurso, a Região da Sardenha, na sequência de uma negociação com a Trenitalia, adjudicou por ajuste direto a esta, por Decisões de 27 de junho e de 17 de julho de 2017, o serviço de transporte público ferroviário de passageiros, para o período entre 1 de novembro de 2017 e 31 de dezembro de 2025.

15

Tendo recebido uma indicação relativa a alegados vícios que afetavam este procedimento de adjudicação por ajuste direto, a AGCM interpôs recurso contra esta adjudicação no Tribunale amministrativo regionale per la Sardegna (Tribunal Administrativo Regional da Sardenha, Itália).

16

Nesse órgão jurisdicional, a AGCM alega que as adjudicações por ajuste direto se devem basear nos princípios gerais da igualdade de tratamento, da não discriminação e da transparência. Esta autoridade recorda que os considerandos 29 e 30 do Regulamento n.o 1370/2007 preveem a publicação da intenção de adjudicar contratos de serviço público a fim de permitir aos eventuais operadores reagir e, em caso de adjudicação por ajuste direto, o respeito de uma maior transparência. Além disso, sublinha que, uma vez que o objetivo do artigo 7.o, n.o 2, deste regulamento consiste em dar aos interessados a possibilidade de elaborar uma proposta no âmbito do procedimento de adjudicação por ajuste direto, a Região da Sardenha devia ter pedido ao operador histórico que comunicasse todos os dados em seu poder no que respeita ao nível do pedido, ao pessoal, ao material circulante e a outras informações, a fim de os colocar à disposição dos outros operadores económicos que tenham manifestado o seu interesse.

17

Com efeito, segundo a AGCM, uma autoridade regional que pretenda proceder a uma adjudicação por ajuste direto de um contrato de serviço público de transporte ferroviário de passageiros deve pôr à disposição dos operadores económicos potencialmente interessados todas as informações necessárias para a formulação de uma proposta comercial. Além disso, deve efetuar uma análise comparativa das propostas apresentadas na sequência da pré‑informação efetuada nos termos do artigo 7.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1370/2007 e fundamentar a escolha do operador económico ao qual o contrato é adjudicado.

18

Em contrapartida, segundo a Região da Sardenha, apoiada pela Trenitalia, foram cumpridos todos os requisitos processuais exigidos no âmbito de um procedimento de adjudicação por ajuste direto e efetuar uma análise comparativa ou a abertura de um concurso relativamente às ofertas ou manifestações de interesse eventualmente recebidas viola a própria natureza do procedimento de adjudicação por ajuste direto, conforme previsto pelo Regulamento n.o 1370/2007.

19

Nestas circunstâncias, o Tribunale amministrativo regionale per la Sardegna (Tribunal Administrativo Regional da Sardenha) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

Deve o artigo 7.o, n.o 2, do [Regulamento n.o 1370/2007] ser interpretado no sentido de que impõe à autoridade competente que pretende proceder à adjudicação por ajuste direto do contrato que tome as medidas necessárias para publicar ou comunicar a todos os operadores eventualmente interessados na gestão do serviço em causa as informações necessárias para apresentarem uma oferta séria e razoável?

2)

Deve o artigo 7.o, n.o 4, do [Regulamento n.o 1370/2007] ser interpretado no sentido de que a autoridade competente, antes de proceder à adjudicação do contrato por ajuste direto, deve efetuar uma avaliação comparativa de todas as propostas de gestão do serviço eventualmente recebidas após a publicação do anúncio de pré‑informação previsto no artigo 7.o, n.o 4?»

Quanto às questões prejudiciais

20

Com estas questões, que importa analisar em conjunto, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 7.o, n.os 2 e 4, do Regulamento n.o 1370/2007 deve ser interpretado no sentido de que as autoridades nacionais competentes que tenham a intenção de adjudicar por ajuste direto um contrato de serviço público de transporte ferroviário de passageiros devem, por um lado, publicar ou comunicar aos operadores económicos interessados todas as informações necessárias para que possam elaborar uma proposta suficientemente pormenorizada e suscetível de ser objeto de uma avaliação comparativa e, por outro, efetuar essa avaliação comparativa relativamente a todas as propostas eventualmente recebidas na sequência da publicação dessas informações.

21

O artigo 7.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1370/2007 prevê que cada autoridade competente toma as medidas necessárias para que, o mais tardar um ano antes da abertura do concurso ou um ano antes da adjudicação por ajuste direto, sejam publicadas no Jornal Oficial da União Europeia, no mínimo, determinadas informações expressamente referidas nesta disposição. Nos termos da mesma disposição, trata‑se do nome e das coordenadas da autoridade competente, do tipo de adjudicação previsto e dos serviços e territórios suscetíveis de serem afetados pela adjudicação.

22

O artigo 7.o, n.o 4, deste regulamento exige que, a pedido de qualquer parte interessada, a autoridade competente lhe comunique os fundamentos da sua decisão relativa à adjudicação por ajuste direto de um contrato de serviço público.

23

Para determinar se, como alega a AGCM, estas disposições obrigam a autoridade competente a publicar ou a comunicar tantas informações quantas as necessárias para efetuar uma avaliação comparativa das propostas eventualmente recebidas e realizar a abertura de um concurso efetivo, há que, em conformidade com jurisprudência constante, ter em conta não só os termos dessas disposições mas também o seu contexto e os objetivos prosseguidos pela regulamentação de que fazem parte, uma vez que a génese dessas disposições pode igualmente conter elementos pertinentes para a sua interpretação (v., neste sentido, Acórdão de 8 de maio de 2019, Inspecteur van de Belastingdienst, C‑631/17, EU:C:2019:381, n.o 29 e jurisprudência referida).

24

Antes de mais, no que se refere aos termos dessas disposições, importa declarar que os mesmos não exigem a publicação ou a comunicação de informações sobre a adjudicação prevista que permitam elaborar uma oferta suscetível de ser objeto de uma avaliação comparativa e também não preveem que seja organizada uma avaliação comparativa das propostas eventualmente recebidas na sequência da publicação dessas informações.

25

Com efeito, por um lado, o artigo 7.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1370/2007 limita‑se a enumerar os elementos de informação que a autoridade competente deve necessariamente publicar no Jornal Oficial da União Europeia, o mais tardar um ano antes da adjudicação por ajuste direto. Além disso, os referidos elementos de informação não permitem, por si só, preparar uma proposta suscetível de ser objeto de uma avaliação comparativa. Basta referir, a este respeito, que as únicas informações sobre o contrato de serviço público de transporte ferroviário de passageiros que a autoridade competente pretende adjudicar por ajuste direto, que figuram nesta disposição, visam os «serviços e territórios suscetíveis de serem afetados pela adjudicação». Estas informações não colocam um operador interessado em condições de discernir sobre as características concretas do contrato previsto.

26

No que diz respeito à obrigação de comunicar a fundamentação da decisão relativa à adjudicação por ajuste direto, referida no artigo 7.o, n.o 4, do Regulamento n.o 1370/2007, há que salientar, por outro lado, que não se pode deduzir da própria redação desta disposição que essa obrigação remeta não apenas para as razões que levaram a autoridade competente a recorrer a uma adjudicação por ajuste direto mas também para as apreciações quantitativas ou qualitativas das propostas que a autoridade competente eventualmente recebeu.

27

Em seguida, no que respeita ao contexto das disposições do artigo 7.o, n.os 2 e 4, do Regulamento n.o 1370/2007 e aos objetivos prosseguidos pela regulamentação de que fazem parte, há que recordar, em primeiro lugar, que este regulamento estabelece as regras relativas às adjudicações, por ajuste direto ou através de concurso público, dos contratos de serviço público de transporte ferroviário e rodoviário de passageiros.

28

O artigo 2.o, alínea h), do referido regulamento visa distinguir dois regimes de adjudicação dos contratos de serviço público de transporte ferroviário e rodoviário, definindo o conceito de «adjudicação por ajuste direto» como a adjudicação de um contrato de serviço público a um determinado operador de serviços públicos sem qualquer processo prévio de concurso.

29

Por conseguinte, a «adjudicação por ajuste direto» exclui qualquer concurso prévio.

30

Ora, se as disposições do artigo 7.o, n.os 2 e 4, do Regulamento n.o 1370/2007 devessem ser entendidas no sentido de que introduzem um regime de publicidade substancialmente análogo ao que caracteriza a abertura de um concurso e exigem uma avaliação comparativa das propostas eventualmente recebidas, tal interpretação levaria a equiparar o processo de adjudicação por ajuste direto ao procedimento de abertura de concurso, violando assim as diferenças importantes que o Regulamento n.o 1370/2007 prevê quanto a estes.

31

Há que recordar, neste contexto, conforme enunciado no considerando 25 do Regulamento n.o 1370/2007, que este regulamento tem por objetivo, não prosseguir a abertura do mercado dos serviços ferroviários, mas estabelecer um quadro jurídico para a compensação e/ou direitos exclusivos para os contratos de serviço público.

32

Em segundo lugar, há que salientar que, nos termos do seu considerando 30, o referido regulamento procura estabelecer um nível mais elevado de transparência para os contratos de serviço público adjudicados por ajuste direto e que, segundo o seu considerando 29, as medidas de publicidade previstas no artigo 7.o, n.o 2, deste regulamento visam permitir que os eventuais operadores de serviços públicos possam reagir.

33

Daqui resulta que as informações publicadas nos termos do artigo 7.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1370/2007 devem permitir que um operador económico conteste, desde o momento referido nesta disposição, o próprio princípio da adjudicação por ajuste direto previsto pela autoridade competente (v., neste sentido, Acórdão de 20 de setembro de 2018, Rudigier, C‑518/17, EU:C:2018:757, n.os 64 e 66). Embora se deva, por conseguinte, assegurar a efetividade desse direito de contestação, não deixa de ser verdade que uma contestação que tenha por objeto o próprio princípio da adjudicação por ajuste direto do contrato de serviço público pode ser utilmente apresentada por um operador económico sem impor, previamente, à autoridade competente que publique ou comunique aos operadores económicos interessados todas as informações necessárias para que estes possam apresentar uma proposta séria e razoável.

34

Por último, a génese do artigo 7.o, n.os 2 e 4, do Regulamento n.o 1370/2007 confirma igualmente a interpretação literal desta disposição.

35

A este respeito, conforme sublinhou o Governo austríaco nas suas observações escritas, o legislador da União Europeia não adotou a proposta da Comissão, apresentada no âmbito dos trabalhos preparatórios do Regulamento n.o 1370/2007, no sentido de uma maior abertura à concorrência. Com efeito, essa instituição tinha nomeadamente previsto, para os contratos adjudicados por ajuste direto, que outros potenciais operadores pudessem, nos seis meses seguintes ao anúncios de pré‑informação, apresentar à autoridade competente, a título facultativo, uma proposta a contestar os resultados anteriormente obtidos pelo operador a quem se destinava a adjudicação por ajuste direto. De acordo com esta proposta, a autoridade competente devia analisar essas propostas e comunicar as razões do seu acordo ou da sua recusa (artigo 7.o, n.o 2, da proposta alterada de Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho, relativo à ação dos Estados‑Membros em matéria de obrigações de serviço público e adjudicação de contratos de serviço público no setor do transporte de passageiros por via férrea, estrada e via navegável interior [COM(2002) 107 final, de 21 de fevereiro de 2002 (JO 2002, C 151 E, p. 146)].

36

Em contrapartida, o legislador da União optou por uma redação do artigo 7.o, n.os 2 e 4, do Regulamento n.o 1370/2007 que não faz qualquer referência a qualquer tipo de obrigação de avaliar comparativamente as propostas eventualmente recebidas após a publicação prevista no referido artigo 7.o, n.o 2.

37

Atendendo às considerações precedentes, há que responder às questões submetidas que o artigo 7.o, n.os 2 e 4, do Regulamento n.o 1370/2007 deve ser interpretado no sentido de que as autoridades nacionais competentes que tenham a intenção de adjudicar por ajuste direto um contrato de serviço público de transporte ferroviário de passageiros não estão obrigadas, por um lado, a publicar ou a comunicar aos operadores económicos eventualmente interessados todas as informações necessárias para que possam elaborar uma proposta suficientemente pormenorizada e suscetível de ser objeto de uma avaliação comparativa e, por outro, a efetuar essa avaliação comparativa relativamente a todas as propostas eventualmente recebidas na sequência da publicação dessas informações.

Quanto às despesas

38

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Décima Secção) declara:

 

O artigo 7.o, n.os 2 e 4, do Regulamento (CE) n.o 1370/2007 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de outubro de 2007, relativo aos serviços públicos de transporte ferroviário e rodoviário de passageiros e que revoga os Regulamentos (CEE) n.o 1191/69 e (CEE) n.o 1107/70 do Conselho, deve ser interpretado no sentido de que as autoridades nacionais competentes que tenham a intenção de adjudicar por ajuste direto um contrato de serviço público de transporte ferroviário de passageiros não estão obrigadas, por um lado, a publicar ou comunicar aos operadores económicos eventualmente interessados todas as informações necessárias para que possam elaborar uma proposta suficientemente pormenorizada e suscetível de ser objeto de uma avaliação comparativa e, por outro, a efetuar essa avaliação comparativa relativamente a todas as propostas eventualmente recebidas na sequência da publicação dessas informações.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: italiano.

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