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Documento 62013CJ0254

Acórdão do Tribunal de Justiça (Sétima Secção) de 2 de outubro de 2014.
Orgacom BVBA contra Vlaamse Landmaatschappij.
Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo hof van beroep te Brussel.
Reenvio prejudicial – Encargos de efeito equivalente a um direito aduaneiro – Imposições internas – Direito nivelador à importação de efluentes de origem animal importados na Região da Flandres – Artigos 30.° TFUE e 110.° TFUE – Direito nivelador devido pelo importador – Direitos niveladores diferentes consoante os efluentes de origem animal sejam importados ou sejam originários da Região da Flandres.
Processo C‑254/13.

Coletânea da Jurisprudência — Coletânea Geral

Identificador Europeu da Jurisprudência (ECLI): ECLI:EU:C:2014:2251

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Sétima Secção)

2 de outubro de 2014 ( *1 )

«Reenvio prejudicial — Encargos de efeito equivalente a um direito aduaneiro — Imposições internas — Direito nivelador à importação de efluentes de origem animal importados na Região da Flandres — Artigos 30.° TFUE e 110.° TFUE — Direito nivelador cobrado pelo importador — Direitos niveladores diferentes consoante os efluentes de origem animal sejam importados ou sejam originários da Região da Flandres»

No processo C‑254/13,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo hof van beroep te Brussel (Bélgica), por decisão de 28 de fevereiro de 2013, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 8 de maio de 2013, no processo

Orgacom BVBA

contra

Vlaamse Landmaatschappij,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Sétima Secção),

composto por: J. L. da Cruz Vilaça (relator), presidente de secção, G. Arestis e A. Arabadjiev, juízes,

advogado‑geral: E. Sharpston,

secretário: M. Ferreira, administradora principal,

vistos os autos,

vistas as observações apresentadas:

em representação da Orgacom BVBA, por F. Janssen e G. Peeters, advocaten,

em representação do Governo belga, por T. Materne e J.‑C. Halleux, na qualidade de agentes,

em representação da Comissão Europeia, por C. Soulay e W. Roels, na qualidade de agentes,

vista a decisão tomada, ouvida a advogada‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação dos artigos 30.° TFUE e 110.° TFUE.

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a Orgacom BVBA (a seguir «Orgacom») à Vlaamse Landmaatschappij (Sociedade rural da Flandres, a seguir «VLM»), agência externa do Governo da Flandres responsável pelo ordenamento e a gestão dos espaços metropolitanos na Região da Flandres, a propósito de determinados direitos niveladores à importação reclamados à Orgacom.

Quadro jurídico

Regulamentação belga

3

O Decreto da Região da Flandres de 23 de janeiro de 1991, relativo à proteção do ambiente contra a poluição devida a fertilizantes, conforme alterado pelo Decreto de 28 de março de 2003 (a seguir «decreto relativo aos fertilizantes»), aplicável à data dos factos no processo principal, sujeitava os produtores, os importadores e os utilizadores de fertilizantes na Região da Flandres a direitos niveladores pecuniários. Foi revogado pelo Decreto da Região da Flandres de 22 de dezembro de 2006, relativo à proteção das águas contra a poluição causada por nitratos de origem agrícola.

4

O artigo 21.o do referido decreto dispunha no seu n.o 1 aplicável à produção de efluentes de origem animal na Região da Flandres:

«É cobrado um direito de base BH1 sobre a produção de efluentes de origem animal, a favor da Mestbank [uma divisão interna da VLM], a cargo de qualquer produtor em cuja empresa a produção de efluentes de origem animal MPp tenha ultrapassado, no ano civil anterior, 300 kg de anidrido fosfórico. O montante desse direito de base BH1 é calculado com base na seguinte fórmula:

BH1 = (MPp x Xdmp) + (MPBn x Xdmn)

em que:

MPp = a produção bruta de efluentes de origem animal expressa em kg de P2O5;

MPBn = a produção bruta de efluentes de origem animal expressa em kg de N;

Xdmp = a taxa de imposição para a produção de efluentes de origem animal em EUR/kg de P2O5;

Xdmn = a taxa de imposição para a produção de efluentes de origem animal em EUR/kg de N.

Para efeito de aplicação destas disposições, deve entender‑se por produção bruta de efluentes de origem animal MPBn expressa em kg de N: o produto do efetivo animal médio na criação e/ou na exploração agrícola no ano civil anterior e as quantidades de excreção brutas correspondentes por animal expressas em kg de N.

O efetivo animal médio para cada uma das espécies visadas é determinado dividindo por doze o montante das quotas de animais mensalmente registadas. As quantidades de excreção brutas por animal, expressas em kg de N, são fixadas numa base fixa ou real, em aplicação do resultado de excreção, tal como referido no artigo 20.o‑A, em conformidade com o artigo 5.o

As taxas de imposição acima referidas são determinadas da seguinte forma:

Xdmp = 0,0111 EUR/kg de P2O5;

Xdmn = 0,0111 EUR/kg de N.»

5

O artigo 21.o do decreto relativo aos fertilizantes previa no seu n.o 5 aplicável à importação na Região da Flandres excedentes de efluentes de origem animal:

«É cobrado um direito de base a favor da Mestbank, a cargo de cada importador de excedentes de efluentes de origem animal. O montante desse direito de base é fixado em 2,4789 euros por tonelada de excedentes de efluentes de origem animal importada na Região da Flandres no ano civil anterior.»

Jurisprudência do Tribunal Constitucional belga

6

O Tribunal Constitucional considerou no ponto B.6 do acórdão n.o 123/2010, de 28 de outubro de 2010 (Belgisch Staatsblad, de 23 de dezembro de 2010, p. 81723), relativo à compatibilidade do artigo 21.o, n.o 5, do decreto relativo aos fertilizantes com os princípios da união económica e monetária belga:

«[…] basta declarar que [o direito nivelador previsto no referido artigo], que está ligado à ultrapassagem do limite territorial fixado entre as Regiões por força da Constituição, tem um efeito igual ao de um direito aduaneiro na medida em que onera os fertilizantes importados na Região da Flandres mais fortemente do que os fertilizantes produzidos nesta Região.»

Litígio no processo principal e questões prejudiciais

7

A Orgacom é uma empresa com sede na Bélgica, na Região da Flandres, especializada no fabrico de fertilizantes orgânicos. No âmbito da sua atividade, a Orgacom importa efluentes de origem animal provenientes da Região da Valónia e dos Países Baixos, que transforma em correções do solo e fertilizantes orgânicos, os quais são seguidamente exportados para outros Estados‑Membros da União Europeia.

8

A Orgacom foi sujeita, com base no artigo 21.o, n.o 5, do decreto relativo aos fertilizantes, a um direito nivelador de 28071,16 euros relativamente ao exercício fiscal de 2002 (ano de produção de 2001) e a um direito nivelador de 7999,41 euros relativamente ao exercício fiscal de 2004 (ano de produção de 2003).

9

Por cartas de 20 de dezembro de 2005 e 18 de agosto de 2005, a Orgacom apresentou à VLM reclamações contra, respetivamente, o direito nivelador relativo ao exercício fiscal de 2002 e o direito nivelador relativo ao exercício fiscal de 2004. A VLM declarou improcedentes essas duas reclamações por decisões adotadas, respetivamente, em 27 de novembro de 2006 e 11 de agosto de 2006.

10

Em seguida, a Orgacom interpôs no rechtbank van eerste aanleg te Brussel (Tribunal de Primeira Instância de Bruxelas) um recurso das decisões que indeferem as suas reclamações, que foi também julgado improcedente, por sentença de 17 de outubro de 2008.

11

A Orgacom interpôs recurso dessa decisão no órgão jurisdicional de reenvio. Em apoio do seu recurso, a recorrente no processo principal alega que os direitos niveladores que lhe foram aplicados constituem encargos de efeito equivalente a direitos aduaneiros, contrários ao artigo 30.o TFUE ou, pelo menos, imposições internas discriminatórias, proibidas pelo artigo 110.o TFUE.

12

Nestas condições, o hof van beroep te Brussel (Tribunal de Recurso de Bruxelas) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

[Deve o direito sobre a] importação[,] descrito no artigo 21.o, n.o 5, do [decreto relativo aos fertilizantes], que incide somente sobre a[s] importaç[ões] [na Região da Flandres] de excedentes de [efluentes de origem animal e outros] fertilizantes, [provenientes] de outros Estados‑Membros e independentemente de serem [seguidamente] transformados ou [aplicados no solo flamengo], [direito] esse que é [cobrado ao] importador, [ao passo que] o imposto sobre os excedentes de fertilizantes produzidos no [interior do] território […] é [cobrado ao] produtor, […] ser considerado um encargo de efeito equivalente a um direito aduaneiro de importação, previsto no artigo 30.o TFUE, e isto [quando] o próprio Estado‑Membro a partir do qual os excedentes de fertilizantes são exportados aplica uma redução do[s] imposto[s] em caso de exportação de excedentes de fertilizantes para outros Estados‑Membros?

2)

[Em caso de resposta negativa à primeira questão:] esse [direito] sobre as importações deverá então ser considerado [uma imposição discriminatória] sobre produtos dos outros Estados‑Membros, [na aceção do] artigo 110.o […] TFUE, [dado] que aos [efluentes] de origem animal produzidos [no interior do] território […] é aplicado um imposto de base[, previsto numa regulamentação] nacional e cuja taxa varia consoante o processo de produção, [ao passo que, sobre os] excedentes de fertilizantes importados, independentemente do processo de produção (entre outros, a origem animal ou a quantidade de P2O5N)[,] é aplicado um [direito sobre a importação] com uma taxa uniforme[,] superior à taxa mínima do imposto de base [aplicável aos efluentes de origem] animal produzido[s] na [R]egião da Flandres, para o qual a taxa é [de] 0,00 euro, e [quando] o próprio Estado‑Membro a partir do qual os excedentes de fertilizantes são exportados aplica uma redução do[s] imposto[s] em caso de exportação de excedentes de fertilizantes para outros Estados‑Membros?»

Quanto à admissibilidade do pedido de decisão prejudicial

13

A Comissão Europeia tem dúvidas quanto à admissibilidade do pedido de decisão prejudicial, por considerar que o quadro factual e jurídico com base no qual as acusações foram formuladas não foi exposto de forma suficientemente clara pelo órgão jurisdicional de reenvio. Segundo a Comissão, este último também não explica claramente as razões precisas pelas quais se colocam no processo principal as questões sobre a interpretação dos artigos 30.° TFUE e 110.° TFUE.

14

A este respeito, há que recordar que, no âmbito de um processo nos termos do artigo 267.o TFUE, baseado numa nítida separação de funções entre os órgãos jurisdicionais nacionais e o Tribunal de Justiça, cabe exclusivamente ao juiz nacional que conhece do litígio e que deve assumir a responsabilidade pela decisão jurisdicional a tomar apreciar, tendo em conta as especificidades do processo, tanto a necessidade de uma decisão prejudicial para poder proferir a sua decisão como a pertinência das questões que submete ao Tribunal de Justiça. Consequentemente, desde que as questões submetidas sejam relativas à interpretação do direito da União, o Tribunal de Justiça é, em princípio, obrigado a pronunciar‑se (acórdão Donau Chemie e o., C‑536/11, EU:C:2013:366, n.o 15).

15

A recusa de se pronunciar sobre uma questão prejudicial submetida por um órgão jurisdicional nacional só é, com efeito, possível quando for manifesto que a interpretação do direito da União solicitada não tem nenhuma relação com a realidade ou com o objeto do litígio no processo principal, quando o problema for de natureza hipotética ou ainda quando o Tribunal de Justiça não dispuser dos elementos de facto e de direito necessários para responder utilmente às questões que lhe são submetidas (acórdão Donau Chemie e o., EU:C:2013:366, n.o 16).

16

Ora, há que salientar que, no seu pedido de decisão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio expôs suficientemente, embora sucintamente, tanto o quadro factual como o teor das disposições nacionais aplicáveis, bem como a pertinência das disposições do direito da União de que pede a interpretação para a resolução do litígio. Em especial, a este respeito, resulta desse pedido que, em caso de resposta afirmativa do Tribunal de Justiça às questões submetidas, os atos de imposição em causa no processo principal devem ser anulados.

17

Atendendo aos referidos elementos, há que concluir que o pedido de decisão prejudicial é admissível.

Quanto às questões prejudiciais

18

Com as suas questões, que devem ser examinadas em conjunto, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 30.o TFUE ou o artigo 110.o TFUE devem ser interpretados no sentido de que se opõem a um direito, como o previsto no artigo 21.o, n.o 5, do decreto relativo aos fertilizantes, que incide somente sobre a importação na Região da Flandres de excedentes de fertilizantes, tanto de origem animal como outros, que é cobrado ao importador, quando o imposto sobre os excedentes de fertilizantes produzidos no território da Região da Flandres é cobrado ao produtor, e que é calculado segundo uma taxa uniforme, por tonelada e independentemente do processo de produção, enquanto o direito de base ao qual estão sujeitos os efluentes de origem animal produzidos no território da Região da Flandres é calculado segundo uma taxa que varia consoante o processo de produção, cujo valor mais baixo é de 0 euro em caso de produção bruta de anidrido fosfórico e não ultrapassa 300 quilogramas no ano civil anterior.

19

Neste contexto, o referido órgão jurisdicional pergunta igualmente se o facto de o Estado‑Membro de origem dos produtos importados em causa prever uma diminuição da imposição em caso de exportação para outros Estados‑Membros pode incidir sobre a interpretação a dar aos artigos 30.° TFUE e 110.° TFUE.

20

A título preliminar, há que recordar que as disposições do Tratado FUE relativas aos encargos de efeito equivalente e as relativas às imposições internas discriminatórias não são aplicáveis cumulativamente, de forma que uma mesma medida não pode, no sistema do Tratado, pertencer simultaneamente a estas duas categorias (acórdão Stadtgemeinde Frohnleiten e Gemeindebetriebe Frohnleiten, C‑221/06, EU:C:2007:657, n.o 26).

21

Por conseguinte, há que examinar, em primeiro lugar, se o direito nivelador previsto no artigo 21.o, n.o 5, do decreto relativo aos fertilizantes pode ser qualificado de encargo de efeito equivalente a direitos aduaneiros de importação na aceção do artigo 30.o TFUE. Caso contrário, há que verificar, em segundo lugar, se o referido direito nivelador constitui uma imposição interna discriminatória proibida pelo artigo 110.o TFUE.

22

No que diz respeito à qualificação do direito controvertido de encargo de efeito equivalente a um direito aduaneiro, há que recordar, desde já, como o Tribunal de Justiça declarou reiteradamente, que a justificação da proibição dos direitos aduaneiros e de todos os encargos de efeito equivalente reside no entrave que os encargos pecuniários, ainda que mínimos, aplicados em consequência da passagem de fronteiras, constituem para a circulação das mercadorias, agravado pelas formalidades administrativas respetivas (acórdão Comissão/Alemanha, C‑389/00, EU:C:2003:111, n.o 22).

23

A este respeito, é jurisprudência constante que qualquer encargo pecuniário, por mínimo que seja, imposto unilateralmente, sejam quais forem as suas denominação e técnica, e que onere as mercadorias pelo facto de passarem a fronteira, quando não seja um direito aduaneiro propriamente dito, constitui um encargo de efeito equivalente, na aceção dos artigos 28.° TFUE e 30.° TFUE (v., neste sentido, acórdão Stadtgemeinde Frohnleiten e Gemeindebetriebe Frohnleiten, EU:C:2007:657, n.o 27).

24

Por outro lado, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que uma imposição cobrada em razão da transposição de um limite territorial no interior de um Estado‑Membro constitui um encargo de efeito equivalente a um direito aduaneiro (v. acórdão Carbonati Apuani, C‑72/03, EU:C:2004:506, n.o 25 e jurisprudência referida).

25

No processo principal, resulta dos elementos à disposição do Tribunal de Justiça que o direito em causa diz respeito aos importadores de excedentes de efluentes de origem animal por importação. Além disso, o montante do direito nivelador é «fixado em 2,478 euros por tonelada de excedentes de fertilizantes importados na Região da Flandres no ano civil anterior». Por conseguinte, há que declarar que o direito previsto no artigo 21.o, n.o 5, do decreto relativo aos fertilizantes onera os fertilizantes que não são de origem flamenga em razão da sua importação na Região da Flandres, de forma que o direito controvertido é cobrado sobre esses fertilizantes devido à passagem da fronteira dessa Região, uma vez que essa passagem deve ser considerada o facto gerador do direito em causa.

26

Nestas condições, há que concluir que o direito previsto no artigo 21.o, n.o 5, do decreto relativo aos fertilizantes constitui um encargo de efeito equivalente a um direito aduaneiro, proibido pelo artigo 30.o TFUE.

27

A qualificação do direito previsto pela referida disposição do decreto relativo aos fertilizantes de encargo de efeito equivalente a um direito aduaneiro não pode ser posta em causa pelo argumento do Reino da Bélgica segundo o qual esse direito, em razão da existência de um direito nivelador semelhante cobrado sobre os fertilizantes produzidos na Região da Flandres, faz parte integrante de um regime geral de imposições internas que compreende sistematicamente, segundo os mesmos critérios, produtos nacionais e produtos importados e exportados, e deve, por conseguinte, ser apreciado à luz do artigo 110.o TFUE.

28

A este respeito, há que salientar, por um lado, que a característica essencial de um encargo de efeito equivalente, que o distingue de uma imposição interna de natureza geral, reside na circunstância de o primeiro incidir exclusivamente sobre o produto importado como tal, enquanto a segunda incide quer sobre os produtos importados, quer sobre os produtos exportados, quer sobre os produtos nacionais (v., neste sentido, acórdão Michaïlidis, C‑441/98 e C‑442/98, EU:C:2000:479, n.o 22).

29

Por outro lado, há que recordar que, para ser abrangido por um sistema geral de imposições internas, o encargo fiscal considerado deve atingir o produto interno e o produto exportado idêntico com o mesmo imposto no mesmo estádio da comercialização, e que o facto gerador do imposto deve, também ele, ser idêntico para os dois produtos (v., neste sentido, acórdão Michaïlidis, EU:C:2000:479, n.o 23).

30

No que diz respeito ao processo principal, há que declarar, desde já, que, como referido no n.o 25 do presente acórdão, o direito previsto no artigo 21.o, n.o 5, do decreto relativo aos fertilizantes onera os produtos, enquanto tais, que passam a fonteira da Região da Flandres.

31

Em seguida, não é contestado que este direito é cobrado aos importadores, enquanto o encargo semelhante previsto no artigo 21.o, n.o 1, do referido decreto é cobrado aos produtores. Por conseguinte, os dois direitos não são cobrados no mesmo estádio da comercialização.

32

Por último, os dois direitos são calculados segundo métodos diferentes, o que é suscetível de conduzir, como salientou o Tribunal Constitucional belga no seu acórdão n.o 123/2010, de 28 de outubro de 2010, e, pelo menos, no caso de o montante do direito na fase da produção ser de 0 euro, a uma tributação mais onerosa para o produto importado do que para o que é produzido na Região da Flandres.

33

Por conseguinte, o argumento do Reino da Bélgica não pode ser acolhido.

34

Além disso, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se, nos casos em que o Estado‑Membro de origem dos fertilizantes aplique uma redução dos impostos em caso de exportação para outros Estados‑Membros, um direito como o direito sobre a importação em causa no processo principal poderia escapar à qualificação de encargo de efeito equivalente a um direito aduaneiro, e como sustenta a VLM, em razão da necessidade de manter o controlo das quantidades flamengas de fertilizantes e de proteger a produção interna contra medidas externas suscetíveis de falsear a concorrência e de constituir um dano suplementar para o ambiente na Flandres.

35

A este respeito, o Tribunal de Justiça já precisou que os direitos aduaneiros e os encargos de efeito equivalente a esses direitos são proibidos independentemente de qualquer consideração da finalidade para os quais foram instituídos, bem como do destino das suas receitas (v., neste sentido, acórdãos Brachfeld e Chougol Diamond, 2/69 e 3/69, EU:C:1969:30, n.o 19, e Carbonati Apuani, EU:C:2004:506, n.o 31).

36

Por outro lado, há que salientar que o artigo 21.o, n.o 5, do decreto relativo aos fertilizantes impõe um direito nivelador que onera indistintamente todos os fertilizantes importados, sem que a sua aplicação seja limitada aos casos em que o Estado‑Membro de origem prevê uma redução de impostos em caso de exportação desses produtos, como sucede, no caso em apreço, relativamente ao Reino dos Países Baixos.

37

Resulta do exposto que há que responder às questões submetidas que o artigo 30.o TFUE se opõe a um direito, como o previsto no artigo 21.o, n.o 5, do decreto relativo aos fertilizantes, que incide somente sobre as importações na Região da Flandres de excedentes de efluentes de origem animal e outros fertilizantes, que é cobrado ao importador, ao passo que o imposto sobre os excedentes de fertilizantes produzidos no interior do território flamengo é cobrado ao produtor, e que é calculado segundo modalidades diferentes das que regulam o cálculo deste último imposto. A este respeito, é indiferente que o Estado‑Membro a partir do qual os excedentes de efluentes são importados na Região da Flandres aplique uma redução da tributação em caso de exportação desses excedentes para outros Estados‑Membros.

Quanto às despesas

38

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Sétima Secção) declara:

 

O artigo 30.o TFUE opõe‑se a um direito, como o previsto no artigo 21.o, n.o 5, do Decreto da Região da Flandres de 23 de janeiro de 1991, relativo à proteção do ambiente contra a poluição por fertilizantes, conforme alterado pelo Decreto de 28 de março de 2003, que incide somente sobre as importações na Região da Flandres de excedentes de efluentes de origem animal e outros fertilizantes, que é cobrado ao importador, ao passo que o imposto sobre os excedentes de fertilizantes produzidos no interior do território flamengo é cobrado ao produtor, e que é calculado segundo modalidades diferentes das que regulam o cálculo deste último imposto. A este respeito, é indiferente que o Estado‑Membro a partir do qual os excedentes de efluentes são importados na Região da Flandres aplique uma redução da tributação em caso de exportação desses excedentes para outros Estados‑Membros.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: neerlandês.

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