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Documento 62012CJ0382

Acórdão do Tribunal de Justiça (Terceira Secção) de 11 de setembro de 2014.
MasterCard Inc. e o. contra Comissão Europeia.
Recurso de decisão do Tribunal Geral – Recursos subordinados – Admissibilidade – Artigo 81.° CE – Sistema de pagamento aberto através de cartões de débito, de pagamento único e de crédito – Comissões interbancárias multilaterais supletivas – Associação de empresas – Restrições da concorrência por efeito – Critério de fiscalização jurisdicional – Conceito de ‘restrição acessória’ – Caráter objetivamente necessário e proporcionado – ‘Hipóteses contrafactuais’ adequadas – Sistemas biface – Tratamento de anexos da petição em primeira instância.
Processo C‑382/12 P.

Coletânea da Jurisprudência — Coletânea Geral

Identificador Europeu da Jurisprudência (ECLI): ECLI:EU:C:2014:2201

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção)

11 de setembro de 2014 ( *1 )

Índice

 

Antecedentes do litígio e decisão controvertida

 

Recurso para o Tribunal Geral e acórdão recorrido

 

Pedidos das partes

 

Quanto à admissibilidade dos recursos subordinados

 

Quanto ao mérito

 

Quanto ao terceiro fundamento do recurso principal, relativo a um erro de direito no que respeita à admissibilidade de certos anexos da petição em primeira instância

 

Acórdão recorrido

 

Argumentação das partes

 

Apreciação do Tribunal de Justiça

 

Quanto ao segundo fundamento do recurso principal, relativo a um erro de direito e/ou a uma insuficiência de fundamentação no que respeita à apreciação da questão de saber se a MasterCard é uma associação de empresas

 

Argumentação das partes

 

Apreciação do Tribunal de Justiça

 

— Quanto à admissibilidade

 

— Quanto ao mérito

 

Quanto ao primeiro fundamento do recurso principal, relativo a um erro de direito e/ou a uma insuficiência de fundamentação no que respeita à avaliação da necessidade objetiva da pretensa restrição da concorrência

 

Acórdão recorrido

 

Quanto à primeira parte do primeiro fundamento do recurso principal

 

— Argumentação das partes

 

— Apreciação do Tribunal de Justiça

 

Quanto à segunda e terceira partes do primeiro fundamento do recurso principal

 

— Argumentação das partes

 

— Apreciação do Tribunal de Justiça

 

Quanto à quarta parte do primeiro fundamento do recurso principal

 

— Argumentação das partes

 

— Apreciação do Tribunal de Justiça

 

Quanto ao fundamento único do recurso subordinado da RBS e ao primeiro fundamento do recurso subordinado da LBG

 

Acórdão recorrido

 

Argumentação das partes

 

— Quanto ao fundamento único do recurso subordinado da RBS

 

— Quanto ao primeiro fundamento do recurso subordinado da LBG

 

Apreciação do Tribunal de Justiça

 

— Quanto às exceções de inadmissibilidade suscitadas pela Comissão

 

— Quanto ao mérito do fundamento único do recurso subordinado da RBS e do primeiro fundamento do recurso subordinado da LBG

 

Quanto ao segundo fundamento do recurso subordinado da LBG

 

Acórdão recorrido

 

Quanto à primeira parte do segundo fundamento do recurso subordinado da LBG

 

— Argumentação das partes

 

— Apreciação do Tribunal de Justiça

 

Quanto à segunda parte do segundo fundamento do recurso subordinado da LBG

 

— Argumentação das partes

 

— Apreciação do Tribunal de Justiça

 

Quanto à terceira parte do segundo fundamento do recurso subordinado da LBG

 

— Argumentação das partes

 

— Apreciação do Tribunal de Justiça

 

Quanto às despesas

«Recurso de decisão do Tribunal Geral — Recursos subordinados — Admissibilidade — Artigo 81.o CE — Sistema de pagamento aberto através de cartões de débito, de pagamento único e de crédito — Comissões interbancárias multilaterais supletivas — Associação de empresas — Restrições da concorrência por efeito — Critério de fiscalização jurisdicional — Conceito de ‘restrição acessória’ — Caráter objetivamente necessário e proporcionado — ‘Hipóteses contrafactuais’ adequadas — Sistemas biface — Tratamento de anexos da petição em primeira instância»

No processo C‑382/12 P,

que tem por objeto um recurso de uma decisão do Tribunal Geral, interposto ao abrigo do artigo 56.o do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, entrado em 4 de agosto de 2012,

MasterCard Inc., com sede em Wilmington (Estados Unidos),

MasterCard International Inc., com sede em Wilmington,

MasterCard Europe SPRL, com sede em Waterloo (Bélgica),

representadas por E. Barbier de la Serre, V. Brophy e B. Amory, avocats, e por T. Sharpe, QC,

recorrentes,

sendo as outras partes no processo:

Comissão Europeia, representada por V. Bottka e N. Khan, na qualidade de agentes,

recorrida em primeira instância,

Banco Santander SA, com sede em Santander (Espanha),

Royal Bank of Scotland plc, com sede em Edimburgo (Reino Unido), representada por D. Liddell, solicitor, e M. Hoskins, barrister,

HSBC Bank plc, com sede em Londres (Reino Unido), representada por R. Thompson, QC,

Bank of Scotland plc, com sede em Edimburgo,

Lloyds TSB Bank plc, com sede em Londres,

representadas por K. Fountoukakos‑Kyriakakos e S. Wisking, solicitors, e por J. Flynn, QC,

MBNA Europe Bank Ltd, com sede em Chester (Reino Unido), representada por A. Davis, solicitor,

British Retail Consortium, com sede em Londres, representado por R. Marchini, advocate, e A. Robertson, barrister,

EuroCommerce AISBL, com sede em Bruxelas (Bélgica), representada por J. Stuyck, advocaat,

Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte, representado por M. Holt e C. Murrell, na qualidade de agentes, assistidos por J. Turner, QC, e por J. Holmes, barrister,

intervenientes em primeira instância,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção),

composto por: M. Ilešič, presidente de secção, C. G. Fernlund, A. Ó Caoimh (relator), C. Toader e E. Jarašiūnas, juízes,

advogado‑geral: P. Mengozzi,

secretário: L. Hewlett, administradora principal,

vistos os autos e após a audiência de 4 de julho de 2013,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 30 de janeiro de 2014,

profere o presente

Acórdão

1

Através do presente recurso, a MasterCard Inc. e as suas filiais MasterCard International Inc. e MasterCard Europe SPRL pedem a anulação do acórdão do Tribunal Geral da União Europeia, MasterCard e o./Comissão (T‑111/08, EU:T:2012:260, a seguir «acórdão recorrido»), que negou provimento ao recurso em que pediam, a título principal, a anulação da Decisão C (2007) 6474 final da Comissão, de 19 de dezembro de 2007, relativa a um processo nos termos do artigo [81.° CE] e do artigo 53.o do Acordo EEE (Processos COMP/34.579 — MasterCard, COMP/36.518 — EuroCommerce, COMP/38.580 — Cartões Comerciais) (a seguir «decisão controvertida»), e, a título subsidiário, a anulação dos artigos 3.° a 5.° e 7.° desta decisão.

2

Através dos respetivos recursos subordinados, a Royal Bank of Scotland plc (a seguir «RBS»), por um lado, e a Bank of Scotland plc (a seguir «BoS») e a Lloyds TSB Bank plc (a seguir «LTSB»), estas duas últimas (a seguir, em conjunto, «LBG») agora sob o controlo do Lloyds Banking Group plc e atuando conjuntamente para efeitos do presente processo, por outro, pedem a anulação do acórdão recorrido e da decisão controvertida.

Antecedentes do litígio e decisão controvertida

3

Como resulta, em especial, dos n.os 20, 24, 27, 35, 39 e 40 do acórdão recorrido, através da decisão controvertida, a Comissão das Comunidades Europeias concluiu, designadamente, em substância, que, uma vez que a fixação das comissões interbancárias multilaterais supletivas do sistema de pagamento efetuado pela organização internacional de pagamento denominada «MasterCard» (a seguir «MasterCard») se aplica sobretudo a pagamentos transfronteiriços por cartão bancário no Espaço Económico Europeu (EEE) ou na zona euro (a seguir «CIM»), constituía uma decisão de associação de empresas na origem de uma restrição da concorrência entre os bancos participantes que fornecem aos comerciantes serviços que permitem a estes últimos aceitar cartões de débito, de pagamento único e de crédito MasterCard e/ou Maestro, que tal restrição era sensível, afetava as trocas comerciais entre Estados‑Membros, e que as recorrentes não tinham feito prova suficiente de que as CIM eram objetivamente necessárias ao funcionamento do sistema MasterCard nem que os requisitos de isenção impostos no artigo 81.o, n.o 3, CE ou no artigo 53.o, n.o 3, do Acordo sobre o Espaço Económico Europeu, de 2 de maio de 1992 (JO 1994, L 1, p. 3), estavam preenchidos.

4

Resulta dos autos, em particular do n.o 17 do acórdão recorrido, que, num sistema de pagamento dito «aberto», como o sistema MasterCard, as partes envolvidas em cada compra por cartão bancário são, além do proprietário do sistema de pagamento, o titular do cartão, o estabelecimento financeiro emitente do cartão, qualificado de «banco de emissão», o comerciante e o estabelecimento financeiro que fornece a esse comerciante serviços que lhe permitem aceitar o referido cartão como meio de pagamento da transação em causa, qualificado de «banco de aquisição».

5

Tal como resultam dos n.os 1 a 44 do acórdão recorrido, os antecedentes e os elementos essenciais da decisão controvertida, para efeitos do recurso principal e dos recursos subordinados, podem ser resumidos do seguinte modo.

6

As recorrentes ocupam‑se da gestão e da coordenação do sistema de pagamentos efetuados por meio dos cartões MasterCard e Maestro, o que inclui designadamente a fixação das regras do sistema e a prestação de serviços de autorização e de compensação aos estabelecimentos financeiros participantes. A emissão dos cartões MasterCard e Maestro e a celebração de acordos de adesão com comerciantes para a aceitação desses cartões são da responsabilidade desses estabelecimentos financeiros.

7

Antes de 25 de maio de 2006, toda a propriedade da MasterCard e os correspondentes direitos de voto pertenciam aos estabelecimentos financeiros participantes. Nessa data, a MasterCard Inc. entrou na Bolsa de Nova Iorque (Estados Unidos) através de uma «initial public offering» (a seguir «IPO»), que modificou a sua estrutura e a sua gestão.

8

Em 30 de março de 1992 e 27 de junho de 1997, a Comissão recebeu denúncias, respetivamente, do British Retail Consortium (a seguir «BRC») e da EuroCommerce AISBL (a seguir «Eurocommerce») contra, designadamente, a Europay International SA (a seguir «Europay»), que se tornou MasterCard Europe SPRL.

9

A Europay efetuou notificações à Comissão, relativas ao conjunto do seu sistema de pagamento.

10

Em 13 de abril de 2002, a Comissão publicou uma comunicação, em conformidade com o artigo 19.o, n.o 3, do Regulamento n.o 17 do Conselho, de 6 de fevereiro de 1962, Primeiro Regulamento de execução dos artigos [81.° CE] e [82.° CE] (JO 1962, 13, p. 204; EE 08 F1 p. 22), em que anunciava a sua intenção de adotar uma posição favorável sobre determinadas regras do sistema da Europay, entre as quais não figuravam as relativas às comissões interbancárias supletivas.

11

Através da decisão controvertida, a Comissão declarou que as recorrentes tinham violado o artigo 81.o CE e o artigo 53.o do Acordo sobre o Espaço Económico Europeu. Esta decisão contém, designadamente, as considerações seguintes:

As comissões interbancárias dizem respeito às relações entre os bancos de emissão e de aquisição por ocasião do pagamento das transações por cartão e correspondem a um montante deduzido em proveito do banco de emissão. Estas comissões devem ser distinguidas das despesas faturadas pelo banco de aquisição aos comerciantes («merchant service charges», a seguir «MSC»). A decisão controvertida apenas tem por objeto as CIM, e não as comissões interbancárias fixadas bilateralmente entre bancos de emissão e de aquisição ou as comissões interbancárias fixadas coletivamente a nível nacional.

Há que distinguir três mercados de produtos distintos no domínio dos sistemas de cartões bancários abertos: antes de mais, o «mercado interssistemas», no qual os diferentes sistemas de cartões concorrem entre si; em seguida, o «mercado da emissão», no qual os bancos de emissão concorrem pela clientela dos titulares de cartões bancários; por último, o «mercado da aquisição», no qual os bancos de aquisição concorrem pela clientela dos comerciantes. O mercado relevante para efeitos da decisão controvertida é constituído pelos mercados nacionais da aquisição nos Estados‑Membros do EEE.

As decisões das recorrentes relativas à fixação das CIM constituem decisões de uma associação de empresas na aceção do artigo 81.o, n.o 1, CE, apesar das alterações de estrutura e de gestão da MasterCard introduzidas pela IPO.

As CIM têm por efeito inflacionar a base das MSC, quando estas poderiam ser de nível inferior sem as CIM e se existisse uma proibição da tarifação unilateral, a posteriori, das transações pelos bancos de emissão, isto é, uma regra que proibisse os bancos de emissão e de aquisição de definirem o montante das comissões interbancárias depois de uma compra ter sido feita por um dos titulares de cartões do banco de emissão a um dos comerciantes do banco de aquisição e de a transação ter sido submetida para pagamento (a seguir «proibição de tarifações ex post»). As CIM estão portanto na origem de uma restrição da concorrência pelos preços entre os bancos de aquisição, em detrimento dos comerciantes e dos seus clientes.

As CIM não podem ser consideradas «restrições acessórias» na medida em que não têm um caráter objetivamente necessário ao funcionamento de um sistema de cartões de pagamento aberto. Este poderia funcionar com base apenas numa remuneração dos bancos de emissão pelos titulares dos cartões, dos bancos de aquisição pelos comerciantes e do proprietário do sistema pelas comissões pagas pelos bancos de emissão e de aquisição. Contrariamente às restrições necessárias à realização de uma operação principal, as restrições que apenas são desejáveis para alcançar o sucesso comercial da referida operação ou que apresentam ganhos de eficácia só podem ser examinadas no quadro do artigo 81.o, n.o 3, CE.

No que respeita à incidência da exigência, no quadro do sistema MasterCard, de aceitar todos os cartões Maestro ou MasterCard seja qual for o banco de emissão (a seguir «Honour All Cards Rule»), a supressão das CIM não significaria a possibilidade de os bancos de emissão fixarem livre e unilateralmente as comissões interbancárias, dado que esse risco poderia ser evitado através de uma regra com efeitos menos restritivos da concorrência, como a proibição de tarifações ex post.

Relativamente ao artigo 81.o, n.o 3, CE, os argumentos económicos aduzidos pelas recorrentes, relativos ao papel das CIM no equilíbrio do sistema MasterCard e na sua maximização, não são suficientes para demonstrar que estas estão na origem de benefícios objetivos. As recorrentes não apresentaram designadamente provas suscetíveis de demonstrar que eventuais vantagens objetivas compensariam os inconvenientes das CIM para os comerciantes e respetivos clientes.

Recurso para o Tribunal Geral e acórdão recorrido

12

Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 11 de março de 2008, as recorrentes interpuseram um recurso de anulação da decisão controvertida ou, a título subsidiário, dos seus artigos 3.° a 5.° e 7.°

13

Em apoio do recurso, como resulta do n.o 73 do acórdão recorrido, as recorrentes apresentaram quatro fundamentos, relativos, o primeiro, à violação do artigo 81.o, n.o 1, CE, devido a erros na análise dos efeitos das CIM na concorrência, o segundo, à violação do artigo 81.o, n.o 3, CE, o terceiro, à violação do artigo 81.o, n.o 1, CE, devido à qualificação errada de decisões de uma associação de empresas aplicadas às CIM, e o quarto, à existência de vícios do procedimento administrativo e de erros factuais.

14

Nas respetivas intervenções perante o Tribunal Geral, o BRC, a EuroCommerce e o Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte concluíram pedindo que fosse negado provimento ao recurso das recorrentes, enquanto a Banco Santander SA, a RBS, a HSBC Bank plc (a seguir «HSBC»), a BoS, a LTSB e a MBNA Europe Bank Ltd (a seguir «MBNA») concluíram, entre outros pedidos, requerendo a anulação da decisão controvertida.

15

No acórdão recorrido, o Tribunal Geral negou provimento ao recurso das recorrentes, declarando, no essencial, que elas não tinham demonstrado que a decisão controvertida padecesse de um erro de direito ou de um erro manifesto de apreciação.

Pedidos das partes

16

As recorrentes pedem, em substância, que o Tribunal de Justiça se digne:

anular o acórdão recorrido;

anular a decisão controvertida; e

condenar a Comissão nas despesas relativas às duas instâncias.

17

A RBS, a HSBC, a LBG e a MBNA apresentaram alegações em apoio do recurso, enquanto o BRC, a EuroCommerce e o Reino Unido apoiam o pedido da Comissão de que, no essencial, seja negado provimento ao presente recurso e, a título subsidiário, seja negado provimento ao recurso de anulação interposto contra a decisão controvertida.

18

Os pedidos dos recursos subordinados da RBS e da LBG são, em substância, os mesmos que os do recurso principal.

19

As recorrentes apoiam os pedidos dos recursos subordinados, enquanto a Comissão, apoiada pelo BRC, conclui pedindo que lhes seja negado provimento.

Quanto à admissibilidade dos recursos subordinados

20

A Comissão suscita a inadmissibilidade dos recursos subordinados interpostos, respetivamente, pela RBS e pela LBG, pelo facto de cada um deles figurar no mesmo ato que contém a resposta apresentada pelas partes em causa no recurso principal.

21

Como observa a Comissão, o artigo 176.o, n.o 2, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, que entrou em vigor em 1 de novembro de 2012, prevê que «o recurso subordinado deve ser apresentado em requerimento separado, distinto da resposta».

22

Todavia, há que salientar que as versões eletrónicas dos recursos subordinados interpostos, respetivamente, pela RBS e pela LBG deram entrada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 31 de outubro de 2012, seguidas da entrega dos respetivos originais, dois dias e cinco dias mais tarde.

23

Consequentemente, quer seja aplicado o artigo 57.o, n.o 7, do Regulamento de Processo em vigor a partir de 1 de novembro de 2012 ou o artigo 37.o, n.o 6, do Regulamento de Processo em vigor até essa data, os recursos subordinados foram validamente interpostos em 31 de outubro de 2012.

24

Ora, o Regulamento de Processo em vigor nesta última data não contém uma disposição equivalente ao referido artigo 176.o, n.o 2, invocado pela Comissão. Por conseguinte, os recursos subordinados não podem ser considerados inadmissíveis por terem sido apresentados no quadro de respostas ao recurso principal.

25

As exceções de inadmissibilidade mais pontuais suscitadas pela Comissão serão examinadas no âmbito dos fundamentos em que foram suscitadas.

26

Quanto ao recurso principal, na medida em que a Comissão sustenta, a título liminar, que o mesmo é, «no essencial», inadmissível, esta instituição suscita, na realidade, de maneira pontual, a inadmissibilidade de certas partes específicas de tal recurso, sem no entanto afirmar que o mesmo é totalmente inadmissível. Assim, há que abordar essas exceções específicas no âmbito da análise dos fundamentos em que foram suscitadas.

Quanto ao mérito

27

Através do recurso principal e dos recursos subordinados, as recorrentes, a RBS e a LBG alegam que o Tribunal Geral cometeu erros de direito ao afirmar, em substância:

que vários anexos da petição em primeira instância eram inadmissíveis (terceiro fundamento do recurso principal);

que a Comissão não errou ao considerar que o sistema de pagamento MasterCard constitui uma «associação de empresas» na aceção do artigo 81.o CE, apesar das alterações introduzidas pela IPO (segundo fundamento do recurso principal);

que a decisão controvertida faz uma demonstração suficiente de que as CIM têm efeitos restritivos da concorrência (recurso subordinado da RBS e primeiro fundamento do recurso subordinado da LBG);

que as CIM não podem ser consideradas objetivamente necessárias ao funcionamento do sistema MasterCard (primeiro fundamento do recurso principal); e

que a Comissão não errou ao considerar que as recorrentes não tinham demonstrado que as CIM satisfazem as condições estabelecidas pelo artigo 81.o, n.o 3, CE (segundo fundamento do recurso subordinado da LBG).

28

O primeiro fundamento do recurso principal, o recurso subordinado da RBS e o primeiro fundamento do recurso subordinado da LBG têm por objeto a questão de saber se o Tribunal Geral cometeu um erro de direito ao avalizar a conclusão da decisão controvertida segundo a qual a fixação das CIM é abrangida pelo princípio da proibição previsto no artigo 81.o, n.o 1, CE. Para efeitos do tratamento destes fundamentos, há que abordar, em primeiro lugar, o terceiro fundamento do recurso principal. Na medida em que o exame do primeiro fundamento do recurso principal bem como do recurso subordinado da RBS e do primeiro fundamento do recurso subordinado da LBG se tornaria supérfluo se o segundo fundamento do recurso principal fosse procedente, há que abordar, em segundo lugar, este segundo fundamento.

Quanto ao terceiro fundamento do recurso principal, relativo a um erro de direito no que respeita à admissibilidade de certos anexos da petição em primeira instância

Acórdão recorrido

29

Quanto à alegação perante ele suscitada, relativa à apreciação pela Comissão dos elementos de prova económicos apresentados pelas recorrentes no decurso do procedimento que levou à adoção da decisão controvertida, o Tribunal Geral salientou, no n.o 183 do acórdão recorrido, que as recorrentes acusavam a Comissão de não ter examinado esses elementos e de não ter respondido aos mesmos. O Tribunal Geral concluiu, no n.o 185 do acórdão recorrido, que esta alegação «surge sob uma forma particularmente sucinta na petição e que a argumentação que a apoia se encontra, na realidade, desenvolvida nos anexos A.13 [a] A.15, redigidos pelos diferentes peritos na origem das provas económicas apresentadas no procedimento administrativo e para os quais as recorrentes fazem uma remissão global».

30

Nos termos dos n.os 186 a 188 do acórdão recorrido:

«186

[...] nos pontos 52 a 54 da petição, as recorrentes limitam‑se a enunciar que forneceram argumentos económicos consideráveis no procedimento administrativo, não seguidos ou deformados pela Comissão, e que as ‘conclusões dos [seus] economistas’ apoiam a sua análise jurídica, segundo a qual a Comissão tinha ‘errado, designadamente, ao concluir que a comissão interbancária [era] uma limitação da concorrência, [ao] concentrar‑se no impacto da comissão interbancária (ou das diferenças no seu nível) quanto às MSC, sem analisar o efeito nos custos dos detentores de cartões, ao contestar que o mecanismo [devia] fixar um nível da comissão interbancária que maximizasse o volume das transações e ao ignorar que isso promovia o bem‑estar do consumidor’.

187

Por conseguinte, há que considerar que, embora a petição apresente o enunciado da alegação das recorrentes, não inclui qualquer argumentação suscetível de a sustentar.

188

Assim, tem razão a Comissão quando afirma que não resultam do texto da petição elementos suficientemente precisos para que o Tribunal possa exercer a sua fiscalização e para que ela prepare a sua defesa.»

31

No quadro da primeira parte do quarto fundamento da petição apresentada em primeira instância, que figura nos n.os 111 a 130 desta, relativa a uma violação dos direitos de defesa, as recorrentes acusaram a Comissão, designadamente, de «falta de clareza da carta de exposição dos factos» que a Comissão lhes tinha enviado em 23 de março de 2007, posteriormente à audição de 14 e 15 de novembro de 2006. A este respeito, o Tribunal Geral concluiu, no n.o 278 do acórdão recorrido, que «a argumentação das recorrentes surge apenas de forma particularmente sucinta na sua petição». No n.o 280 do referido acórdão, o Tribunal Geral considerou que, dado que as recorrentes se limitaram a proceder a um reenvio global para o anexo A.20 da petição em primeira instância, esse anexo não podia ser tido em consideração.

32

Nos n.os 189 e 282 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral julgou inadmissíveis as alegações relativas, respetivamente, à apreciação pela Comissão dos elementos de prova económicos apresentados pelas recorrentes e à falta de clareza da carta de exposição dos factos.

Argumentação das partes

33

As recorrentes alegam que o Tribunal Geral cometeu erros de direito no que respeita à admissibilidade de vários anexos da petição em primeira instância. Contrariamente às exigências do artigo 52.o, n.o 1, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, não há, segundo as recorrentes, base legal que permita ao Tribunal Geral limitar desta maneira o direito de acesso ao juiz.

34

A título subsidiário, mesmo que o Tribunal Geral dispusesse de tais poderes, as recorrentes entendem que cometeu um erro de direito ao considerar que esta limitação se devia aplicar no caso vertente. Acrescentam que o Tribunal Geral, nos n.os 188 a 189 e 278 do acórdão recorrido, cometeu igualmente um erro de apreciação ao considerar que a exposição de certas alegações das recorrentes não revelava elementos suficientemente precisos para que os anexos correspondentes pudessem ser considerados admissíveis. Com efeito, o Tribunal Geral deveria ter concluído que os n.os 52 a 54 e 122 da petição em primeira instância eram suficientemente precisos no que respeita às alegações e aos argumentos invocados e que os anexos A.13 a A.15 e A.20 da referida petição eram, consequentemente, admissíveis. Além disso, entendem que, no n.o 219 do dito acórdão, o Tribunal Geral não se pronunciou sobre a questão de saber se os anexos A.13 e A.14 deviam ser rejeitados, apesar de ter rejeitado, nos n.os 185 a 189, o argumento que fazia referência a esses mesmos anexos. Quanto a esta questão, as recorrentes consideram em particular que o facto de terem identificado, por um lado, os pontos específicos da referida petição que pretendiam completar com os anexos e, por outro, os anexos correspondentes devia ter sido considerado suficiente.

35

Neste contexto, as recorrentes contestam igualmente a afirmação que figura no n.o 190 do acórdão recorrido, segundo a qual, em substância, na medida em que a sua alegação poderia ser compreendida como uma crítica à Comissão por «não ter tomado em consideração os argumentos económicos que provavam as vantagens resultantes das CIM para o sistema [de pagamento] MasterCard, os detentores de cartões ou o consumidor, em geral, [esta alegação] é irrelevante no âmbito de um fundamento relativo à violação do artigo 81.o, n.o 1, CE».

36

Segundo a Comissão, a argumentação das recorrentes no quadro do terceiro fundamento do recurso principal não é clara. Por um lado, as recorrentes afirmam que não há base jurídica que justifique a restrição imposta pelo Tribunal Geral e que o seu direito de acesso ao tribunal era entravado. Por outro lado, as recorrentes sustentam que os argumentos expostos nos anexos da petição em primeira instância estavam suficientemente resumidos na petição, o que entendem constituir uma questão factual inadmissível. Acresce que as recorrentes não explicam em que é que o resultado do acórdão recorrido teria sido diferente se os anexos em causa tivessem sido considerados pelo Tribunal Geral.

37

O RBS e a HSBC não tomam posição sobre o terceiro fundamento do recurso principal. A LBG e a MBNA sustentam este fundamento, sem lhe dedicarem argumentos específicos. A BRC e a EuroCommerce contestam sucintamente o referido fundamento. Sem apresentar argumentos em concreto, o Reino Unido conclui pedindo que o mesmo seja rejeitado.

Apreciação do Tribunal de Justiça

38

Nos termos do artigo 21.o do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, aplicável ao Tribunal Geral por força do artigo 53.o, primeiro parágrafo, do mesmo Estatuto, e do artigo 44.o, n.o 1, alínea c), do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, a petição deve indicar o objeto do litígio e fazer uma exposição sumária dos fundamentos invocados.

39

Resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que a «exposição sumária dos fundamentos», que deve ser indicada em qualquer petição, na aceção dos referidos artigos, significa que a petição deve explicitar em que consiste o fundamento em que o recurso se baseia (v. acórdãos Fives Lille Cail e o./Alta Autoridade, 19/60, 21/60, 2/61 e 3/61, EU:C:1961:30, 588, e Grifoni/CEEA, C‑330/88, EU:C:1991:95, n.o 18).

40

Assim, para que um recurso no Tribunal Geral seja admissível, é designadamente necessário que os elementos essenciais de facto e de direito em que se baseia resultem, pelo menos sumariamente, mas de um modo coerente e compreensível, do texto da própria petição. Ainda que o corpo da petição possa ser sustentado e completado, em pontos específicos, por remissões para determinadas passagens de documentos a ela anexados, uma remissão global para outros documentos, mesmo anexos à petição, não pode suprir a falta dos elementos essenciais da argumentação jurídica, os quais, por força das disposições atrás recordadas, devem figurar na petição (v., neste sentido, acórdãos Dansk Rørindustri e o./Comissão, C‑189/02 P, C‑202/02 P, C‑205/02 P a C‑208/02 P e C‑213/02 P, EU:C:2005:408, n.os 94 a 100, e Versalis/Comissão, C‑511/11 P, EU:C:2013:386, n.o 115).

41

Com efeito, a fim de garantir a segurança jurídica e uma boa administração da justiça, a exposição sumária dos fundamentos do recorrente deve ser suficientemente clara e precisa para permitir ao recorrido preparar a sua defesa e à jurisdição competente pronunciar‑se sobre o recurso (v., neste sentido, acórdão Grifoni/CEEA, EU:C:1991:95, n.o 18). Assim, não incumbe ao Tribunal Geral procurar e identificar, nos anexos, os fundamentos que poderia considerar que constituem a razão de ser do recurso (v. acórdão Dansk Rørindustri e o./Comissão, EU:C:2005:408, n.os 97 e 100). Impõem‑se exigências análogas quando um argumento é invocado em apoio de um fundamento suscitado perante o Tribunal Geral (v. acórdão Versalis/Comissão, EU:C:2013:386, n.o 115).

42

Nestas condições, as recorrentes não têm razão quando alegam que não há base legal que sustente a posição adotada pelo Tribunal Geral no que toca à tomada em consideração do conteúdo dos anexos apresentados perante ele.

43

Quanto à argumentação subsidiária exposta no n.o 34 do presente acórdão, importa referir desde logo que, como resulta dos n.os 189 e 282 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral não declarou inadmissíveis os anexos em causa, como sustentam as recorrentes, mas sim duas alegações que, embora constantes da petição em primeira instância, não vinham, segundo a apreciação feita pelo Tribunal Geral, acompanhadas de elementos suficientemente precisos para o Tribunal poder exercer a sua fiscalização e para a parte contrária poder assegurar a sua defesa. A este respeito, as recorrentes fazem uma leitura errada do acórdão recorrido.

44

É, aliás, baseando‑se nesta leitura errada que estas últimas invocam o facto de, no n.o 219 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral, no âmbito do segundo fundamento da petição em primeira instância, não se ter pronunciado sobre a questão de saber se os anexos A.13 e A.14 desta deviam ser afastados, rejeitando, porém, nos n.os 185 a 189 do mesmo acórdão, o argumento que faz referência a esses anexos.

45

Além disso, no âmbito do presente recurso, as recorrentes não alegaram, e muito menos provaram, que o Tribunal Geral, nos n.os 186 e 278 do acórdão recorrido, tivesse desvirtuado o conteúdo ou o alcance das partes em causa da petição em primeira instância para concluir, em seguida, que estas estavam suficientemente articuladas para poderem satisfazer as exigências do artigo 44.o, n.o 1, alínea c), do Regulamento de Processo do Tribunal Geral e que os anexos correspondentes não podiam ser considerados.

46

O argumento apresentado pelas recorrentes para sustentar a crítica ao n.o 190 do acórdão recorrido, como exposta no n.o 35 do presente acórdão, deve ser julgado inoperante, uma vez que o referido número respeita a um fundamento apresentado a título cautelar no acórdão recorrido, como resulta designadamente do emprego da expressão introdutória «[d]e resto».

47

Vistas as considerações precedentes, há que rejeitar o terceiro fundamento do recurso na totalidade.

Quanto ao segundo fundamento do recurso principal, relativo a um erro de direito e/ou a uma insuficiência de fundamentação no que respeita à apreciação da questão de saber se a MasterCard é uma associação de empresas

48

A título liminar, há que recordar que, no n.o 259 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral declarou o seguinte:

«Não se pode deixar de observar que, à luz dos dois elementos acima mencionados, a saber, a manutenção de um poder decisório dos bancos posteriormente à IPO no seio da [MasterCard] e a existência de uma comunidade de interesses entre esta e os bancos na questão das CIM, a Comissão podia validamente considerar, no essencial, que, apesar das alterações introduzidas pela [IPO], [a MasterCard] tinha continuado a ser uma forma institucionalizada de coordenação do comportamento dos bancos [participantes]. Por conseguinte, foi com razão que a Comissão manteve a qualificação de decisões de uma associação de empresas relativamente às decisões tomadas pelos órgãos da [MasterCard] que determinavam as CIM.»

Argumentação das partes

49

Segundo as recorrentes, o Tribunal Geral, ao declarar que a MasterCard, apesar das alterações introduzidas pela IPO na sua estrutura e no seu modo de gestão, é uma associação de empresas quando toma decisões relativas às CIM, cometeu um erro de direito e/ou não fundamentou suficientemente o acórdão recorrido.

50

Em primeiro lugar, a pretensa comunidade de interesses entre a MasterCard e os bancos participantes, bem como o poder decisório desses bancos, posteriormente à IPO, sobre questões diferentes das CIM são, segundo as recorrentes, insuficientes para sustentar o ponto de vista de que a MasterCard é uma associação de empresas quando toma decisões relativas às CIM. Com efeito, as recorrentes sublinham que resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que uma organização não pode ser qualificada de associação de empresas na aceção do artigo 81.o, n.o 1, CE, quando, por um lado, não é composta por uma maioria de representantes das referidas empresas e, por outro, a legislação nacional exige que prossiga interesses diferentes dos dessas empresas, quando toma as suas decisões. Ora, posteriormente à IPO, por um lado, o conselho de administração da MasterCard era composto por uma maioria significativa de pessoas sem nenhuma ligação com qualquer instituição financeira. Por outro lado, a MasterCard é uma entidade comercial diferente da sua clientela bancária, prosseguindo o seu próprio interesse comercial, e dirigida pelo seu comité de direção, que é legalmente obrigado a agir em conformidade com os seus deveres fiduciários para com os acionistas da MasterCard.

51

Em seguida, posteriormente à IPO, as recorrentes consideram que o poder decisório residual dos bancos participantes sobre questões diferentes das CIM é manifestamente desprovido de pertinência para qualificar a MasterCard de associação de empresas quando toma decisões relativas às CIM. Assim, mesmo admitindo que, posteriormente à IPO, a MasterCard ainda pudesse ser qualificada de associação de empresas quando toma decisões sobre assuntos diferentes das CIM, entendem que esta qualificação não é pertinente para determinar se é esse o caso quando toma decisões relativas às CIM. As recorrentes acrescentam que a insuficiência do poder decisório residual dos bancos participantes sobre questões diferentes das CIM é confirmada pela utilização do vocábulo «parecia», no n.o 249 do acórdão recorrido, que indica claramente que os elementos factuais nem sequer eram suficientes para corroborar a tese de que a MasterCard é uma associação de empresas quando toma decisões sobre assuntos diferentes das CIM.

52

A pretensa comunidade de interesses entre a MasterCard e os bancos participantes quanto à fixação ou à manutenção de CIM elevadas é igualmente desprovida de pertinência e, em qualquer caso, insuficiente para qualificar a MasterCard de associação de empresas. O acórdão Verband der Sachversicherer/Comissão (45/85, EU:C:1987:34), referido no n.o 251 do acórdão recorrido, não corrobora o ponto de vista segundo o qual a comunidade de interesses é um fator pertinente para avaliar a existência de uma associação de empresas. Mesmo admitindo que a pretensa comunidade de interesses entre estes bancos e a MasterCard seja um fator pertinente para determinar se a MasterCard é uma associação de empresas quando toma decisões relativas às CIM, este fator é insuficiente para chegar a essa conclusão. Com efeito, por um lado, a existência de uma associação de empresas na aceção do artigo 81.o, n.o 1, CE não pode ser deduzida do simples facto de uma sociedade cotada poder igualmente tomar em consideração o interesse dos seus clientes, quando adota as suas decisões. Por outro lado, de forma mais geral, deduzir a existência de uma associação de empresas, para aplicar o direito da concorrência, do simples facto de duas ou mais empresas poderem ter um interesse económico comum teria consequências jurídicas absurdas e indesejáveis, em especial nos mercados concentrados.

53

Por último, as recorrentes sustentam que, mesmo aplicando o critério de uma comunidade de interesses, a tese da Comissão não pode ser mantida. Para este efeito, acusam o Tribunal Geral de se ter limitado a afirmar que os adquirentes repercutem normalmente as CIM nos comerciantes e de não ter, assim, examinado se a afirmação da Comissão segundo a qual os bancos de aquisição têm interesse em CIM elevadas era sustentada por alguma prova.

54

A Comissão alega, em substância, que a argumentação resumida nos n.os 50 a 52 do presente acórdão, com exceção da respeitante à interpretação do acórdão Verband der Sachversicherer/Comissão (EU:C:1987:34), visa pôr em causa a apreciação dos factos pelo Tribunal Geral e, consequentemente, é inadmissível. A Comissão acrescenta, no quadro da sua resposta quanto ao mérito, que, na medida em que o segundo fundamento do recurso principal tem por objeto a insuficiência de fundamentação, é desprovido de argumentação.

55

O Reino Unido sustenta que o argumento mencionado no n.o 53 do presente acórdão é inadmissível na medida em que se limita a pôr em causa a apreciação dos factos efetuada em primeira instância.

56

Quanto ao mérito, a Comissão considera que, em aplicação da jurisprudência, a MasterCard pode ser qualificada de associação de empresas na sequência da IPO e as CIM podem ser qualificadas de decisão dessa associação. Quanto a este ponto, alega designadamente que, consoante as circunstâncias, o juiz da União utilizou uma multiplicidade de critérios não exaustivos para se pronunciar sobre a questão da existência de uma associação de empresas. No caso em apreço, os membros da MasterCard são exclusivamente bancos de emissão e de aquisição, que limitaram a sua liberdade comercial delegando algumas decisões no seu órgão comum, isto é, o conselho de administração mundial da MasterCard ou os seus representantes, que fixa o montante das CIM para esses bancos. Segundo a Comissão, a «distinção complexa e artificial operada pela MasterCard relativamente ao papel da comunidade de interesses» não é procedente.

57

A RBS, a HSBC, a LBG e a MBNA subscrevem o segundo fundamento do recurso principal. A HSBC considera, designadamente, que os critérios jurídicos aplicados de maneira constante pelo Tribunal de Justiça para identificar uma associação de empresas, em especial o facto de a associação ser controlada por representantes dos seus membros e agir exclusivamente no seu interesse, não se verificam no caso em apreço. A LBG alega, designadamente, que o critério da «comunidade de interesses», utilizado incorretamente pelo Tribunal Geral, é bem mais amplo do que o da «concordância de vontades», aplicado para determinar se existe um acordo abrangido pelo artigo 81.o CE, uma vez que está preenchido mesmo na falta de qualquer forma de colusão.

58

O BRC, a EuroCommerce e o Reino Unido contestam a argumentação invocada em apoio do segundo fundamento do recurso principal. A este respeito, a EuroCommerce sustenta nomeadamente que a decisão da associação de empresas constituída pela MasterCard, anteriormente à IPO, ainda está em vigor, de modo que nem a Comissão nem o Tribunal Geral deveriam examinar se, posteriormente à IPO, a MasterCard continuava a constituir uma associação de empresas. O Reino Unido considera que este fundamento assenta numa abordagem excessivamente formal relativamente às categorias de atos abrangidos pelo artigo 81.o CE. Segundo este Estado‑Membro, o requisito essencial de atuação coordenada está claramente preenchido no caso em apreço.

Apreciação do Tribunal de Justiça

– Quanto à admissibilidade

59

Quando as recorrentes alegam, designadamente, no âmbito do segundo fundamento do recurso principal, uma insuficiência de fundamentação do acórdão recorrido, limitam‑se, na realidade, a alegar que o Tribunal Geral ignorou o conceito de «associações de empresas» na aceção do artigo 81.o, n.o 1, CE. Por conseguinte, na medida em que este fundamento é relativo a uma pretensa insuficiência de fundamentação do referido acórdão, deve ser julgado inadmissível.

60

Deve igualmente acolher‑se a exceção de inadmissibilidade suscitada pelo Reino Unido, exposta no n.o 55 do presente acórdão. A este respeito, recorde‑se que resulta dos artigos 256.° TFUE e 58.°, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça que só o Tribunal Geral é competente, por um lado, para apurar a matéria de facto, exceto nos casos em que a inexatidão material das suas conclusões resulte dos documentos dos autos que lhe foram apresentados, e, por outro, para apreciar esses factos. Todavia, quando o Tribunal Geral tiver apurado ou apreciado os factos, o Tribunal de Justiça é competente, por força do artigo 256.o TFUE, para fiscalizar a qualificação jurídica desses factos e as consequências jurídicas daí extraídas pelo Tribunal Geral (v., nomeadamente, acórdãos General Motors/Comissão, C‑551/03 P, EU:C:2006:229, n.o 51, e Evonik Degussa/Comissão, C‑266/06 P, EU:C:2008:295, n.o 72). Daqui resulta que, na medida em que, através do argumento exposto no n.o 53 do presente acórdão, as recorrentes pretendem obter do Tribunal de Justiça uma nova apreciação dos factos apurados pelo Tribunal Geral, o seu argumento deve ser julgado inadmissível.

61

Quanto ao restante, na medida em que os argumentos expostos nos n.os 50 a 52 do presente acórdão são relativos a um erro de direito no que respeita à avaliação da questão de saber se a MasterCard é uma associação de empresas, há que salientar que, contrariamente ao que sustenta a Comissão, as recorrentes não se limitam, em substância, a pôr em causa a apreciação dos factos efetuada em primeira instância, mas invocam, no essencial, questões de direito que são admissíveis na fase do recurso.

– Quanto ao mérito

62

Sem prejuízo do direito que assiste aos operadores económicos de se adaptarem inteligentemente, mas de maneira autónoma, ao comportamento constatado ou previsível dos seus concorrentes (v. acórdãos Suiker Unie e o./Comissão, 40/73 a 48/73, 50/73, 54/73 a 56/73, 111/73, 113/73 e 114/73, EU:C:975:174, n.o 174; Ahlström Osakeyhtiö e o./Comissão, C‑89/85, C‑104/85, C‑114/85, C‑116/85, C‑117/85 e C‑125/85 a C‑129/85, EU:C:1993:120, n.o 71; e AsnefEquifax e Administración del Estado, C‑238/05, EU:C:2006:734, n.o 53 e jurisprudência referida), o artigo 81.o CE é suscetível de englobar todas as formas de cooperação e de colusão entre empresas, incluindo através de uma estrutura coletiva ou de um órgão comum, como uma associação, que tende a produzir os efeitos que esta disposição se destina a reprimir (v., neste sentido, acórdãos Nederlandse Vereniging voor de fruit en groentenimporthandel e Frubo/Comissão, 71/74, EU:C:1975:61, n.o 30; van Landewyck e o./Comissão, 209/78 a 215/78 e 218/78, EU:C:1980:248 n.o 88; e Eurofer/Comissão, C‑179/99 P, EU:C:2003:525, n.o 23).

63

Assim, resulta de jurisprudência bem assente que, se o artigo 81.o CE distingue os conceitos de «prática concertada» e de «acordos entre empresas» ou de «decisões de associações de empresas», é com o objetivo de englobar, nas proibições dessa disposição, diferentes formas de coordenação do comportamento das empresas no mercado (v., designadamente, acórdãos Imperial Chemical Industries/Comissão, 48/69, EU:C:1972:70, n.o 64; Comissão/Anic Partecipazioni, C‑49/92 P, EU:C:1999:356, n.o 112; e AsnefEquifax e Administración del Estado, EU:C:2006:734, n.o 32) e de, assim, evitar que estas se possam eximir às regras da concorrência unicamente graças ao modo como coordenam esse comportamento.

64

No caso em apreço, como resulta nomeadamente do n.o 238 do acórdão recorrido, é pacífico que, anteriormente à IPO, a MasterCard podia ser considerada uma «associação de empresas» na aceção do artigo 81.o CE. Resulta igualmente desse número que, no quadro do seu terceiro fundamento em primeira instância, as recorrentes acusavam a Comissão, em especial, de não ter tomado em consideração as alterações introduzidas pela IPO na estrutura e na gestão da MasterCard. Nestas condições, como resulta do n.o 244 do acórdão recorrido, o terceiro fundamento apresentado ao Tribunal Geral era relativo à questão de saber se, posteriormente às alterações introduzidas pela IPO, a MasterCard podia continuar a ser considerada «uma forma institucionalizada de coordenação do comportamento dos bancos».

65

É neste contexto que há que examinar os argumentos suscitados no quadro do segundo fundamento do recurso principal.

66

Resulta do n.o 259 do acórdão recorrido que, baseando‑se, por um lado, na manutenção de um poder decisório dos bancos no seio da MasterCard e, por outro, na existência de uma comunidade de interesses entre esta e os bancos na questão das CIM, o Tribunal Geral julgou improcedente a argumentação das recorrentes, recordada no n.o 238 do acórdão recorrido, segundo a qual, em substância, as alterações introduzidas na estrutura e no funcionamento da MasterCard no âmbito da IPO tinham por consequência que essa organização, no momento da adoção da decisão controvertida, já não podia ser considerada uma «associação de empresas» na aceção do artigo 81.o CE.

67

De maneira mais pontual, no que respeita, em primeiro lugar, aos argumentos resumidos nos n.os 51 e 52 do presente acórdão, há que salientar que os dois elementos em que o Tribunal Geral concentrou a sua análise no quadro do terceiro fundamento da petição em primeira instância devem ser lidos conjuntamente. Com efeito, como resulta do n.o 238 do acórdão recorrido, as recorrentes tinham sustentado, por um lado, que, posteriormente à IPO, os bancos já não controlavam a MasterCard e esta decidia unilateralmente as CIM. Por outro lado, resulta do n.o 239 do referido acórdão que a Comissão era acusada de não ter demonstrado que a MasterCard continuava a agir no interesse destes bancos ou em seu nome e não em nome dos acionistas da MasterCard Inc.

68

A este respeito, nos n.os 245 a 249 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral, na sua apreciação soberana dos factos, concluiu, no essencial, em primeiro lugar, que, à data da adoção da decisão controvertida, embora os bancos membros da MasterCard não participassem no processo decisório dos órgãos dessa organização relativo às CIM, «a […] MasterCard parecia mais continuar a funcionar na Europa como uma associação de empresas, relativamente à qual os bancos não constituíam apenas clientes dos serviços prestados, mas participavam coletivamente e de forma descentralizada em aspetos essenciais do poder decisório». Importa sublinhar a este respeito que, apesar do emprego inadequado, pelo Tribunal Geral, do termo «parecia» neste contexto, resulta de uma leitura conjunta dos n.os 245 a 249 do acórdão recorrido que o Tribunal Geral verificou efetivamente que, à data da decisão controvertida, os bancos continuavam a exercer coletivamente um poder decisório sobre aspetos essenciais do funcionamento da organização de pagamento MasterCard, posteriormente à IPO, o que contribuía para relativizar significativamente as consequências que havia que extrair da IPO. Em segundo lugar, nos n.os 250 a 258 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral constatou igualmente, em substância, que a Comissão tinha validamente concluído que as CIM refletiam os interesses dos bancos, pelo facto de haver, quanto a este ponto, uma comunidade de interesses entre a MasterCard, os seus acionistas e os bancos.

69

Considerados conjuntamente, estes dois elementos, resumidos no n.o 259 do acórdão recorrido, reconduzem‑se a explicar a razão pela qual, segundo o Tribunal Geral, a fixação das CIM pela MasterCard continuava a funcionar, apesar das alterações introduzidas pela IPO, como «uma forma institucionalizada de coordenação do comportamento dos bancos». Com efeito, segundo a lógica adotada pelo Tribunal Geral no acórdão recorrido, dado que os interesses da MasterCard e dos acionistas da MasterCard Inc. eram comuns quanto à fixação das CIM, os bancos participantes estavam em condições de delegar a fixação dessas comissões, embora conservando, em vários outros aspetos, poderes decisórios.

70

Por outro lado, resulta de uma leitura conjugada dos n.os 238 a 260 do acórdão recorrido, nomeadamente dos seus n.os 243 a 245, 249 e 259, que, no quadro da sua apreciação da questão de saber se o modo institucionalizado de cooperação através do qual a MasterCard operava antes da IPO tinha deixado de funcionar após esse evento, o Tribunal Geral considerou soberanamente que os dois critérios em causa eram pertinentes com base nos elementos de facto e de direito existentes à data da adoção da decisão controvertida, inscrevendo‑se a sua apreciação no âmbito do quadro factual mais lato que lhe foi apresentado.

71

Em particular, o Tribunal Geral considerou que a existência de uma comunidade de interesses era pertinente no caso em apreço, não apenas com base numa coincidência teórica entre os interesses dos bancos e da MasterCard mas também por ter tomado em consideração, na sua apreciação soberana dos factos, as circunstâncias factuais específicas cuja desvirtuação não foi alegada, designadamente, em primeiro lugar, como resulta da argumentação das partes exposta nos n.os 238 e 239 do acórdão recorrido, que era pacífico que a MasterCard atuava no interesse dos bancos, antes da IPO, em segundo lugar, como resulta do n.o 256 do referido acórdão, que a evolução verificada após a IPO demonstra que essa organização continua, na prática, a ter em conta os interesses concretos dos bancos quando fixa o nível das CIM, e, em terceiro lugar, como resulta do n.o 258 do mesmo acórdão, que os interesses dos acionistas da MasterCard não se opõem aos interesses dos bancos.

72

Nestas condições, o Tribunal Geral considerou legitimamente, nas circunstâncias particulares do caso vertente e tendo em conta a argumentação que lhe foi submetida, que tanto o poder decisório residual dos bancos sobre questões diferentes das CIM, posteriormente à IPO, como a comunidade de interesses entre a MasterCard e os bancos eram simultaneamente pertinentes e suficientes para apreciar a questão de saber se, após a IPO, a MasterCard podia continuar a ser considerada uma «associação de empresas» na aceção do artigo 81.o CE.

73

Importa salientar que a remissão, no n.o 251 do acórdão recorrido, para o acórdão Verband der Sachversicherer/Comissão (EU:C:1987:34, n.o 29), visa simplesmente responder à crítica, reproduzida no n.o 239 do acórdão recorrido, segundo a qual o critério da existência de uma comunidade de interesses entre a MasterCard e os bancos não se baseava num precedente jurisprudencial. Contrariamente ao que deixam entender as recorrentes, ao recordar, neste contexto, que «resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que a existência de uma comunidade de interesses ou de um interesse comum constitui um elemento relevante para efeitos da apreciação da existência de uma decisão de associação de empresas na aceção do artigo 81.o, n.o 1, CE», o Tribunal Geral não pretendeu estabelecer um critério geral e muito menos um critério exclusivo.

74

No que respeita, em segundo lugar, à argumentação resumida no n.o 50 do presente acórdão, é verdade que resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que uma decisão de um organismo que dispõe de poderes regulamentares num determinado setor pode não estar abrangida pelo artigo 81.o CE, quando esse organismo é composto por uma maioria de representantes do poder público e toma a referida decisão observando um certo número de critérios de interesse público (v., nomeadamente, acórdão Pavlov e o., C‑180/98 a C‑184/98, EU:C:2000:428, n.o 87 e jurisprudência referida).

75

Todavia, a jurisprudência referida no número precedente respeitava, em substância, à questão de saber se, quando adotavam uma regulamentação determinada, se devia considerar que os organismos em causa, compostos, pelo menos parcialmente, por representantes dos operadores económicos de um determinado setor, eram associações de empresas ou, pelo contrário, exerciam a autoridade pública. Esta questão não se colocava no Tribunal Geral no caso em apreço. De igual modo, as circunstâncias de facto e as questões jurídicas suscitadas no processo em que foi proferido o acórdão Wouters e o. (C‑309/99, EU:C:2002:98) e as respetivas conclusões (conclusões do advogado‑geral P. Léger no processo Wouters e o., C‑309/99, EU:C:2001:390), nas quais as recorrentes se baseiam principalmente, não são comparáveis às do presente processo.

76

Atendendo a todas as considerações precedentes, há que declarar que, como o advogado‑geral salientou no n.o 45 das suas conclusões, as recorrentes não podem sustentar que um organismo como a MasterCard não pode ser qualificado de associação de empresas quando adota decisões relativas às CIM, uma vez que resulta das considerações precedentes que o Tribunal Geral considerou acertadamente que, quando tais decisões são tomadas, as referidas empresas tencionam ou, pelo menos, aceitam coordenar o seu comportamento através dessas decisões e que os seus interesses coletivos coincidem com os tomados em consideração aquando da adoção das referidas decisões, em especial no caso de as empresas em causa terem prosseguido, durante vários anos, o mesmo objetivo de regulação em comum do mercado no âmbito da mesma organização, ainda que sob formas diferentes.

77

Tendo em conta o exposto, importa, portanto, rejeitar o segundo fundamento do recurso principal.

Quanto ao primeiro fundamento do recurso principal, relativo a um erro de direito e/ou a uma insuficiência de fundamentação no que respeita à avaliação da necessidade objetiva da pretensa restrição da concorrência

78

No acórdão recorrido, o Tribunal Geral procedeu a uma apreciação da necessidade objetiva das CIM, antes de abordar a questão de saber se essas comissões comportam efeitos anticoncorrenciais. Nestas condições, no quadro do presente acórdão, é oportuno examinar o fundamento relativo ao caráter acessório das CIM em relação ao sistema de pagamento MasterCard, antes de abordar o relativo aos efeitos eventualmente restritivos das referidas comissões.

79

Em substância, o primeiro fundamento do recurso principal articula‑se em quatro partes, sendo a segunda, a terceira e a quarta subsidiárias da primeira.

Acórdão recorrido

80

Segundo o Tribunal Geral, o primeiro fundamento da petição em primeira instância compunha‑se, em substância, de duas partes. No âmbito da primeira parte deste fundamento, as recorrentes alegaram que a Comissão considerou sem razão que as CIM produziam efeitos restritivos da concorrência. No âmbito da segunda parte, sustentaram que a Comissão devia ter concluído que as CIM eram objetivamente necessárias ao funcionamento do sistema MasterCard.

81

Ao examinar, em primeiro lugar, esta segunda parte, o Tribunal Geral indicou, no n.o 89 do acórdão recorrido, o seguinte:

«[…] o exame do caráter objetivamente necessário de uma restrição reveste um caráter relativamente abstrato. Com efeito, só as restrições que sejam necessárias para que a operação principal possa, em qualquer hipótese, funcionar podem ser consideradas abrangidas pela teoria das restrições acessórias. Assim, as considerações que se referem ao caráter indispensável da restrição à luz da situação concorrencial no mercado em causa não fazem parte da análise do caráter acessório da restrição […]».

82

Em seguida, o Tribunal Geral salientou, no n.o 90 do acórdão recorrido, que «o facto de a inexistência das CIM poder ter consequências negativas no funcionamento do sistema MasterCard não implica, em si mesmo, que as CIM devam ser consideradas objetivamente necessárias, se resultar do exame do sistema MasterCard no seu contexto económico e jurídico que continua a ser capaz de funcionar sem elas». No n.o 91 do referido acórdão, o Tribunal Geral considerou que «não está ferido de nenhum erro de direito o raciocínio da Comissão que infere o caráter não objetivamente necessário das CIM do facto de o sistema MasterCard poder funcionar sem elas».

83

Nos n.os 94 a 99 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral rejeitou o argumento das recorrentes segundo o qual, no essencial, as CIM são objetivamente necessárias ao sistema MasterCard na medida em que constituem uma modalidade de pagamento supletiva das transações, dado que, se não existissem CIM, a Honour All Cards Rule teria por consequência pôr os bancos de aquisição «à mercê» dos bancos de emissão.

84

Neste contexto, após ter concluído que o recurso pela Comissão à proibição de tarifações ex post, exposta no n.o 11, quarto travessão, do presente acórdão, não contém «nenhum erro manifesto de apreciação», o Tribunal Geral considerou, no n.o 96 do acórdão recorrido, que «a existência de regras de liquidação de transações supletivas menos restritivas de concorrência que as CIM impede que estas sejam consideradas objetivamente necessárias ao funcionamento do sistema MasterCard unicamente com base na sua qualidade de modo de liquidação supletiva das transações». No n.o 99 do referido acórdão, é nomeadamente referido que competia «à Comissão examinar se a hipótese de um sistema MasterCard funcionar sem CIM era economicamente viável e podia, por conseguinte, ser tida em conta a título de comparação». Em contrapartida, segundo o mesmo n.o 99, a Comissão não «tinha de demonstrar que o jogo do mercado levava os bancos de emissão e de aquisição a decidir por si próprios a adoção de uma regra menos restritiva de concorrência que as CIM».

85

Depois de considerar, no n.o 120 do acórdão recorrido, que a Comissão concluiu validamente que as CIM não apresentavam um caráter objetivamente necessário ao funcionamento do sistema MasterCard, o Tribunal Geral rejeitou a segunda parte do primeiro fundamento da petição em primeira instância.

Quanto à primeira parte do primeiro fundamento do recurso principal

– Argumentação das partes

86

As recorrentes alegam que o Tribunal Geral aplicou erradamente o critério da «necessidade objetiva» de uma restrição. Em vez de aplicar o critério segundo o qual uma limitação determinada da autonomia comercial é «objetivamente necessária» se, sem esta, a operação principal for impossível ou difícil de realizar, o Tribunal Geral utilizou, designadamente nos n.os 89 e 90 do acórdão recorrido, um critério incompleto em aplicação do qual uma restrição apenas é objetivamente necessária se, sem ela, a operação principal não puder funcionar. As recorrentes baseiam‑se, a este respeito, no n.o 109 do acórdão do Tribunal Geral, M6 e o./Comissão (T‑112/99, EU:T:2001:215), segundo o qual, «[s]e, não havendo restrição, a operação principal se mostra dificilmente realizável ou mesmo irrealizável, a restrição pode ser considerada objetivamente necessária à sua realização». Segundo as recorrentes, no n.o 89 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral confunde o critério da necessidade objetiva com vista a determinar o caráter acessório da restrição com o critério do caráter indispensável estabelecido no artigo 81.o, n.o 3, CE.

87

A Comissão alega que, sob pena de tornar inútil a distinção entre as limitações «acessórias» e as restrições indispensáveis a que se refere o artigo 81.o, n.o 3, CE, só o caráter «necessário» dessas limitações permite distinguir uma restrição que pode ser justificada ao abrigo do artigo 81.o, n.o 3, CE e uma limitação que, por ser acessória, pode escapar à aplicação do artigo 81.o, n.o 1, CE.

88

A RBS, a HSBC, a LBG e a MBNA subscrevem a primeira parte do primeiro fundamento do recurso principal. Em apoio da Comissão, o BRC, a EuroCommerce e o Reino Unido alegam, no essencial, que são as recorrentes que estão enganadas acerca do critério em causa.

– Apreciação do Tribunal de Justiça

89

Resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que se uma operação ou uma atividade determinada não estiver abrangida pelo princípio da proibição previsto no artigo 81.o, n.o 1, CE, devido à sua neutralidade ou ao seu efeito positivo no plano da concorrência, uma restrição da autonomia comercial de um ou de vários dos participantes nessa operação ou nessa atividade também não está abrangida pelo referido princípio da proibição se essa restrição for objetivamente necessária à realização da referida operação ou da referida atividade e proporcionada aos objetivos de uma ou da outra (v., neste sentido, entre outros, acórdãos Remia e o./Comissão, 42/84, EU:C:1985:327, n.os 19 e 20; Pronuptia de Paris, 161/84, EU:C:1986:41, n.os 15 a 17; DLG, C‑250/92, EU:C:1994:413, n.o 35; e Oude Luttikhuis e o., C‑399/93, EU:C:1995:434, n.os 12 a 15).

90

Com efeito, quando não for possível dissociar tal restrição da operação ou da atividade principal sem comprometer a existência e os objetos das mesmas, há que analisar a compatibilidade com o artigo 81.o CE desta restrição juntamente com a compatibilidade da operação ou da atividade principal de que é acessória, e isso apesar de, tomada isoladamente, se afigurar que essa restrição pode, à primeira vista, ser abrangida pelo princípio da proibição do artigo 81.o, n.o 1, CE.

91

Tratando‑se de determinar se uma restrição anticoncorrencial pode escapar à proibição prevista no artigo 81.o, n.o 1, CE, por constituir o acessório de uma operação principal desprovida de tal caráter anticoncorrencial, há que apurar se a realização dessa operação seria impossível na falta da restrição em questão. Contrariamente ao que defendem as recorrentes, não se pode considerar que o facto de a referida operação se tornar simplesmente mais difícil de realizar ou até menos rentável sem a restrição em causa confere a esta restrição o caráter «objetivamente necessário» exigido para poder ser qualificada de acessória. Com efeito, tal interpretação equivaleria a alargar esse conceito a restrições que não são estritamente indispensáveis à realização da operação principal. Esse resultado poria em causa o efeito útil da proibição prevista no artigo 81.o, n.o 1, CE.

92

Todavia, esta interpretação não cria uma confusão entre, por um lado, as condições impostas pela jurisprudência para qualificar uma restrição de acessória, com vista à aplicação do artigo 81.o, n.o 1, CE, e, por outro, o critério do caráter indispensável exigido nos termos do artigo 81.o, n.o 3, CE, para que uma restrição proibida possa beneficiar de uma isenção.

93

A este respeito, basta recordar que estas duas disposições prosseguem finalidades diferentes e que o último critério diz respeito à questão de saber se uma coordenação entre empresas suscetível de ter uma influência desfavorável sensível nos parâmetros da concorrência, como, nomeadamente, o preço, a quantidade e a qualidade dos produtos ou dos serviços, que está abrangida, assim, pelo princípio da proibição previsto no artigo 81.o, n.o 1, CE, pode, no entanto, no âmbito do artigo 81.o, n.o 3, CE, ser considerada indispensável à melhoria da produção ou da distribuição ou à promoção do progresso técnico ou económico, reservando, no entanto, aos consumidores uma parte equitativa dos ganhos daí resultantes. Em contrapartida, como resulta dos n.os 89 e 90 do presente acórdão, o critério da necessidade objetiva, na aceção destes mesmos números, tem por objeto a questão de saber se, na falta de uma determinada restrição da autonomia comercial, uma operação ou atividade principal não abrangida pela proibição imposta pelo artigo 81.o, n.o 1, CE, e em relação à qual essa restrição é secundária, corre o risco de não se realizar ou de não prosseguir.

94

Ao considerar, no n.o 89 do acórdão recorrido, que «só as restrições que sejam necessárias para que a operação principal possa, em qualquer hipótese, funcionar podem ser consideradas abrangidas pela teoria das restrições acessórias» e ao concluir, no n.o 90 do acórdão recorrido, que «o facto de a inexistência das CIM poder ter consequências negativas no funcionamento do sistema MasterCard não implica, em si mesmo, que as CIM devam ser consideradas objetivamente necessárias, se resultar do exame do sistema MasterCard no seu contexto económico e jurídico que continua a ser capaz de funcionar sem elas», o Tribunal Geral não cometeu, portanto, um erro de direito.

95

Nestas condições, há que rejeitar a primeira parte do primeiro fundamento do recurso principal.

Quanto à segunda e terceira partes do primeiro fundamento do recurso principal

– Argumentação das partes

96

Através da segunda e terceira partes do primeiro fundamento do recurso principal, que há que tratar conjuntamente, as recorrentes acusam o Tribunal Geral de não ter examinado a restrição da concorrência eventualmente constituída pelas CIM e, portanto, a questão da necessidade objetiva dessas comissões, no seu contexto real, permitindo à Comissão invocar uma «hipótese contrafactual», a da proibição de tarifações ex post, que consideram que, na realidade, nunca se verifica. A tese da Comissão, segundo a qual alguns dos problemas criados pela eliminação das CIM poderiam ser resolvidos pela proibição de tarifações ex post, é muito diferente de uma avaliação daquilo que se passaria, na realidade, se as CIM fossem eliminadas. As recorrentes alegam que o Tribunal Geral não respondeu ao argumento segundo o qual tal proibição, simplesmente, não existiria sem uma intervenção regulamentar, tendo‑se limitado a afirmar que o cenário previsto não devia ser o resultado do jogo do mercado. Ora, a Comissão, ao introduzir uma condição fictícia na sua análise, isto é, a proibição de tarifações ex post, não respeitou a sua obrigação de avaliar os efeitos das CIM na concorrência relativamente àquilo que, na realidade, se produziria sem elas. As recorrentes acusam igualmente o Tribunal Geral de falta de fundamentação, na medida em que não explicou em que é que a proibição de tarifações ex post era significativamente diferente das CIM atualmente aplicadas pela MasterCard.

97

Além disso, as recorrentes alegam, em substância, que o Tribunal Geral não deveria ter aceitado aquilo que, no n.o 96 do acórdão recorrido, qualifica de «existência de regras de liquidação de transações supletivas menos restritivas de concorrência que as CIM», quando, no quadro da decisão controvertida, a Comissão não tinha primeiro tentado compreender como é que a atividade em causa funcionaria sem uma regra supletiva. Segundo as recorrentes, a Comissão limitou‑se, na decisão controvertida, a substituir uma tarifação supletiva por outra, embora mais reduzida do ponto de vista dos comerciantes.

98

Por outro lado, as recorrentes acusam o Tribunal Geral de ter caracterizado de modo errado a «hipótese contrafactual» em que a Comissão se baseou efetivamente perante si, segundo a qual tanto os bancos de emissão como os bancos de aquisição suportam os seus próprios custos, sem necessidade de uma regra supletiva consistente numa proibição de tarifações ex post.

99

Por último, as recorrentes sustentam que o Tribunal Geral substituiu indevidamente a apreciação da Comissão pela sua própria apreciação, quando procedeu ao exame da necessidade objetiva das CIM. A avaliação feita pela Comissão baseava‑se na combinação de um certo número de constatações expostas nos considerandos 550 a 648 da decisão controvertida. Todavia, o Tribunal Geral cometeu um erro ao basear‑se num número limitado dessas constatações que desempenhavam um papel meramente secundário nessa decisão, ignorando o cerne da análise da Comissão e não reconhecendo que a referida decisão era constituída por um conjunto de elementos de prova que, se considerados unicamente no seu conjunto, era suposto sustentarem as conclusões da Comissão.

100

A Comissão suscita a inadmissibilidade da segunda e terceira partes do primeiro fundamento do recurso principal.

101

Por um lado, através delas, as recorrentes contestam, segundo a Comissão, a apreciação dos factos e dos elementos de prova efetuada pelo Tribunal Geral.

102

Por outro lado, a Comissão alega que as recorrentes não podem invocar, em apoio do seu fundamento de recurso principal relativo ao caráter objetivamente necessário das CIM, argumentos formulados inicialmente para apoiar outro fundamento da petição em primeira instância e que, consequentemente, foram examinados pelo Tribunal Geral no contexto desse outro fundamento. Com efeito, a Comissão salienta que o recurso principal não contém nenhum fundamento que, à semelhança da primeira parte do primeiro fundamento da petição em primeira instância, conteste que as CIM produzem efeitos restritivos da concorrência. Nestas condições, a Comissão sustenta, em substância, que os argumentos invocados contra o postulado, no âmbito do exame da necessidade objetiva das CIM, de uma proibição de tarifações ex post são inadmissíveis como «hipótese contrafactual» realista.

103

Quanto ao mérito, a Comissão sublinha, nomeadamente, que a jurisprudência que faz referência ao que aconteceria se não existisse o acordo em análise aborda a questão prévia de saber se esse acordo constitui uma restrição da concorrência. Ora, no âmbito do primeiro fundamento do recurso principal, trata‑se, ao invés, de determinar se um acordo que, em todo o caso, constitui uma restrição deste tipo é, não obstante, necessário, a título acessório, ao bom funcionamento de um acordo de alcance mais amplo. A este propósito, a Comissão recorda que, através do presente recurso, as recorrentes não contestam a abordagem segundo a qual o critério da «necessidade objetiva» das CIM pressupõe que se verifique se essas comissões são proporcionadas ao funcionamento do sistema MasterCard, o que levaria a refletir sobre a existência de outras soluções menos restritivas e objetivamente aplicáveis.

104

A RBS, a HSBC, a LBG e a MBNA subscrevem a segunda e terceira partes do primeiro fundamento do recurso principal. O BRC, a EuroCommerce e o Reino Unido contestam a argumentação invocada em apoio dessas partes pelas recorrentes.

– Apreciação do Tribunal de Justiça

105

Contrariamente ao que afirma a Comissão, as recorrentes não contestam simplesmente, sem invocar a desvirtuação dos elementos de prova, a apreciação dos factos efetuada pelo Tribunal Geral, mas suscitam questões de direito que podem, enquanto tal, ser invocadas no âmbito de um recurso de uma decisão do Tribunal Geral.

106

Em seguida, há que salientar que as exceções de inadmissibilidade resumidas no n.o 102 do presente acórdão, nas quais a Comissão se limita a sustentar que certos argumentos já apresentados no Tribunal Geral são agora apresentados no âmbito de outro fundamento, não podem ser acolhidas. Quanto ao mérito, como resulta dos n.os 96 e 97 do presente acórdão, as recorrentes criticam o facto de o Tribunal Geral se ter baseado na hipótese da proibição de tarifações ex post, cenário que, segundo elas, não se verificaria, sem as CIM, salvo intervenção regulamentar, e que, em todo o caso, não seria diferente do resultante da existência das CIM, para concluir, no n.o 96 do acórdão recorrido, que «a existência de regras de liquidação de transações supletivas menos restritivas de concorrência que as CIM impede que estas sejam consideradas objetivamente necessárias ao funcionamento do sistema MasterCard».

107

A este respeito, há que recordar que, como resulta dos n.os 89 e 90 do presente acórdão, no âmbito da apreciação, para efeitos da aplicação do artigo 81.o, n.o 1, CE, do caráter acessório relativamente a uma operação ou a uma atividade principal de uma determinada restrição da autonomia comercial, importa não só examinar a necessidade desta restrição para a execução da operação ou da atividade principal mas também a proporcionalidade da referida restrição em relação aos objetivos subjacentes à referida operação ou à referida atividade.

108

Importa sublinhar que, seja qual for o contexto ou o objetivo com que se recorre a uma hipótese contrafactual, é necessário que esta hipótese seja adequada à questão que se reputa esclarecer e que o postulado em que assenta não seja irrealista.

109

Assim, a fim de refutar o caráter acessório de uma restrição, na aceção dos n.os 89 e 90 do presente acórdão, a Comissão pode basear‑se na existência de alternativas realistas, menos restritivas da concorrência do que a restrição em causa.

110

A este respeito, como resulta do n.o 97 do presente acórdão, as recorrentes alegam, em substância, que o Tribunal Geral errou ao omitir criticar o facto de, na decisão controvertida, a Comissão não ter procurado compreender como é que a concorrência funcionaria sem as CIM e sem a proibição de tarifações ex post, proibição que as recorrentes não teriam escolhido adotar na falta de uma intervenção regulamentar.

111

Todavia, as alternativas em que a Comissão se pode basear no quadro da apreciação da necessidade objetiva de uma restrição não se limitam à situação que se verificaria na falta da restrição em questão, mas podem igualmente estender‑se a outras hipóteses contrafactuais baseadas, nomeadamente, em situações realistas que poderiam ocorrer na falta da referida restrição. Foi, portanto, acertadamente que o Tribunal Geral concluiu, no n.o 99 do acórdão recorrido, que a hipótese contrafactual avançada pela Comissão podia ser tida em conta no exame do caráter objetivamente necessário das CIM, na medida em que era realista e permitia a viabilidade económica do sistema MasterCard.

112

Por seu turno, o argumento das recorrentes, exposto no n.o 96 do presente acórdão, relativo a falta de fundamentação, é improcedente. Como resulta dos n.os 95 e 96 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral, na sua apreciação soberana dos factos, considerou que a Comissão podia com razão concluir que a proibição de tarifações ex post era menos restritiva para a concorrência porque não fixa um nível de preços mínimo de cada lado do sistema, fundamentando assim suficientemente a conclusão que enunciou no n.o 99 desse acórdão. A este respeito, importa recordar que o dever de fundamentação que se aplica ao Tribunal Geral não lhe impõe que faça uma exposição exaustiva e individual de todos os passos do raciocínio articulado pelas partes no litígio (acórdão Aalborg Portland e o./Comissão, C‑204/00 P, C‑205/00 P, C‑211/00 P, C‑213/00 P, C‑217/00 P e C‑219/00 P, EU:C:2004:6, n.o 372).

113

Por último, há que observar que, como salienta a Comissão, a argumentação das recorrentes segundo a qual, ao examinar a necessidade objetiva das CIM, o Tribunal Geral substituiu indevidamente a apreciação da Comissão pela sua própria apreciação conduz, na realidade, a pôr em causa a apreciação dos elementos de prova efetuada pelo Tribunal Geral. Ora, pelas razões expostas nos n.os 94 a 120 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral, no termo de uma apreciação soberana dos dados factuais do processo que não é da competência do Tribunal de Justiça em sede de recurso, declarou que «a Comissão podia validamente concluir que as CIM não apresentavam um caráter objetivamente necessário para o funcionamento do sistema MasterCard». Esta argumentação deve, pois, ser julgada inadmissível.

114

Atendendo ao que precede, há que rejeitar a segunda e terceira partes do primeiro fundamento do recurso principal, na medida em que visam pôr em causa a «hipótese contrafactual» utilizada pelo Tribunal Geral na sua análise do caráter objetivamente necessário das CIM e a sua apreciação dos elementos de prova efetuada nessa análise.

Quanto à quarta parte do primeiro fundamento do recurso principal

– Argumentação das partes

115

As recorrentes alegam que o Tribunal Geral não respeitou o grau de fiscalização jurisdicional exigido. A este respeito, segundo as recorrentes, mesmo perante apreciações económicas complexas, conceito que deve ser interpretado de forma estrita, o Tribunal Geral, tendo em conta nomeadamente os artigos 47.° e 48.° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, não podia renunciar a uma fiscalização completa e aprofundada das decisões da Comissão. Ora, no caso em apreço, o Tribunal Geral efetuou um exame muito limitado no âmbito da sua análise relativa ao caráter objetivamente necessário das CIM. O Tribunal Geral limitou o controlo das constatações da Comissão à fiscalização da existência de um erro manifesto de apreciação, quando essas constatações não implicavam verdadeiras apreciações económicas complexas. Mesmo admitindo que o critério do «erro manifesto» seja aplicável, o Tribunal Geral recorreu a um novo critério, através do qual verificou o «caráter razoável» da conclusão da Comissão. As recorrentes alegam que este critério incorreto de fiscalização levou o Tribunal Geral, nomeadamente, a apenas apreender um número limitado de fundamentos expostos na decisão controvertida e a atribuir‑lhes radicalmente mais importância do que a própria Comissão.

116

A Comissão alega que a quarta parte do primeiro fundamento do recurso principal é inoperante, na medida em que a argumentação desenvolvida em apoio desta é uma repetição da argumentação aduzida em primeira instância, relativa à inexistência de uma restrição da concorrência, que se situa fora dos fundamentos do recurso principal.

117

Quanto ao mérito, a Comissão sustenta que não se pode extrair nenhum argumento da utilização, no acórdão recorrido, da expressão «erro manifesto». O acórdão recorrido consagra uma longa secção, nos seus n.os 77 a 122, à avaliação do caráter objetivamente necessário das CIM e rejeita os argumentos principais da MasterCard.

118

A RBS, a HSBC, a LBG e a MBNA subscrevem a quarta parte do primeiro fundamento do recurso principal. O BRC, a EuroCommerce e o Reino Unido concluem pedindo que seja rejeitada.

– Apreciação do Tribunal de Justiça

119

Importa salientar, por um lado, que, na medida em que, com os argumentos que apresentam em apoio da quarta parte do primeiro fundamento do recurso principal, as recorrentes acusam o Tribunal Geral de não ter respeitado o nível de fiscalização jurisdicional que devia ter exercido na sua análise dos critérios jurídicos aplicados pela Comissão no âmbito da sua apreciação do caráter objetivamente necessário das CIM, foi acertadamente, como resulta dos n.os 89 a 95 do presente acórdão, que o Tribunal Geral confirmou o raciocínio da Comissão segundo o qual o caráter não objetivamente necessário das CIM podia ser deduzido da circunstância de o sistema MasterCard poder funcionar sem elas. Nestas condições, os argumentos das recorrentes, na medida em que acusam o Tribunal Geral de ter exercido um nível de fiscalização demasiado restrito ao confirmar este critério jurídico, são inoperantes e devem, por isso, ser rejeitados.

120

Por outro lado, na medida em que, através desta quarta parte, as recorrentes pretendem pôr em causa o nível de fiscalização efetuada pelo Tribunal Geral na aplicação do referido critério aos factos do caso em apreço, há que observar que os argumentos invocados a este respeito são, em substância, idênticos aos invocados no âmbito da terceira parte do primeiro fundamento do recurso principal e expostos no n.o 99 do presente acórdão. Estes argumentos devem, por isso, ser julgados inadmissíveis pelas razões enunciadas no n.o 113 do presente acórdão.

121

Sendo parcialmente inoperante e parcialmente inadmissível, deve a quarta parte do primeiro fundamento do recurso principal ser rejeitada. Daqui resulta que o primeiro fundamento do recurso principal deve ser julgado improcedente na totalidade.

Quanto ao fundamento único do recurso subordinado da RBS e ao primeiro fundamento do recurso subordinado da LBG

Acórdão recorrido

122

Nos n.os 123 a 193 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral rejeitou a primeira parte do primeiro fundamento da petição em primeira instância, relativa a erros de apreciação na análise dos efeitos das CIM na concorrência.

123

No n.o 132 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral considerou que, «pelas razões […] mencionadas nos n.os 94 a 120 [do referido acórdão], a circunstância de que a hipótese de um sistema MasterCard que funciona sem CIM — unicamente com base numa regra que proibisse as tarifações ex post — parece ter um caráter economicamente viável é suficiente para justificar que seja tomada em consideração, no âmbito da sua análise dos efeitos das CIM na concorrência».

124

Nos n.os 142 e 143 do acórdão recorrido afirma‑se o seguinte:

«142

[…] as recorrentes alegam, no essencial, que o facto de as CIM terem efeito no montante das MSC não afeta, porém, a concorrência entre os [bancos de aquisição], com o fundamento de que são aplicáveis da mesma maneira a todos [esses bancos] e agem como um custo de entrada comum. Assim, a proibição da tarifação ex post [redundaria em] impor uma CIM à taxa zero que, do ponto de vista da concorrência, seria equivalente e tão transparente como a CIM atual, residindo a única diferença no respetivo nível.

143

Semelhante argumentação não pode ser acolhida. Se se admitir que as CIM fixam um mínimo às MSC e na medida em que a Comissão podia validamente considerar que um sistema MasterCard que funcionasse sem CIM era economicamente viável, daí decorre necessariamente que estas têm efeitos restritivos de concorrência. Com efeito, em comparação com um mercado de aquisição a funcionar sem elas, as CIM limitam a pressão que os comerciantes podem exercer sobre os bancos de aquisição na negociação das MSC reduzindo as possibilidades de os preços diminuírem abaixo de um determinado limiar.»

125

Nos n.os 150, 157 e 158 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral considerou que a Comissão tinha acertadamente constatado o caráter insuficiente da pressão que os comerciantes podem exercer sobre o montante das CIM na medida em que essa pressão só é suscetível de ser exercida efetivamente para lá de um limiar máximo de tolerância dos comerciantes, quando o custo da transação se torna mais importante do que os efeitos negativos de uma recusa de aceitar esse meio de pagamento, ou de uma discriminação de que seja objeto, para a sua clientela.

126

Nos termos dos n.os 181 e 182 do acórdão recorrido:

«181

Em segundo lugar, no que respeita às críticas relativas à falta de tomada em conta da natureza dualista do mercado, saliente‑se que, nesse contexto, as recorrentes realçam as vantagens económicas que decorrem das CIM. Assim, no essencial, as recorrentes realçam que estas permitem otimizar o funcionamento do sistema MasterCard financiando despesas destinadas a fomentar a aceitação dos detentores de cartões e a sua utilização. Deduzem daí que, por um lado, não é do interesse dos bancos fixar as CIM num nível excessivo e, por outro, os comerciantes beneficiam das CIM. As recorrentes criticam igualmente a Comissão [por] ter ignorado o impacto da sua decisão nos detentores de cartões, concentrando‑se unicamente nos comerciantes. A este propósito, diversos intervenientes acrescentam que, num sistema que funcione sem CIM, são obrigados a limitar as vantagens concedidas aos detentores de cartões, ou mesmo a reduzir a sua atividade.

182

Estas críticas não são pertinentes no âmbito de um fundamento relativo à violação do artigo 81.o, n.o 1, CE, uma vez que implicam uma ponderação dos efeitos restritivos de concorrência das CIM, validamente apurados pela Comissão, com as eventuais vantagens económicas que daí pudessem resultar. Ora, só se pode proceder a uma ponderação dos aspetos pró‑concorrenciais e anticoncorrenciais de uma restrição no quadro preciso do artigo 81.o, n.o 3, CE (v., neste sentido, acórdão Van den Bergh Foods/Comissão, [T‑65/98, EU:T:2003:281,] n.o 107 e jurisprudência referida).»

Argumentação das partes

– Quanto ao fundamento único do recurso subordinado da RBS

127

A RBS sustenta que o Tribunal Geral, ao basear‑se em considerações e em hipóteses gerais, cometeu erros de direito na sua apreciação da existência de um efeito restritivo da concorrência.

128

Em primeiro lugar, ao examinar a questão de saber se uma decisão tem um efeito restritivo da concorrência, a Comissão deveria ter examinado que «hipótese contrafactual» se verificaria efetivamente sem as CIM. Ao não censurar esta omissão, nomeadamente no n.o 132 do acórdão recorrido, e ao basear‑se apenas na viabilidade económica da proibição de tarifações ex post, e não em considerações sobre a probabilidade de adoção dessa proibição, o Tribunal Geral, confundindo as condições jurídicas da necessidade objetiva com as dos efeitos na concorrência, cometeu um erro de direito.

129

Em seguida, segundo a RBS, na lógica do acórdão recorrido, presume‑se que as CIM geram um efeito restritivo da concorrência porque fixam o nível das tarifas das comissões interbancárias para o conjunto dos bancos de aquisição. Contudo, embora esta forma de «análise abreviada» possa ser suficiente para uma «infração por objetivo» do artigo 81.o, n.o 1, CE, em que a restrição da concorrência é tão evidente que não é necessário considerar os seus efeitos, numa situação em que a Comissão não demonstrou a existência de tal infração, esta abordagem é, segundo a RBS, totalmente inadequada para estabelecer uma análise dos efeitos. Nem a Comissão nem o Tribunal Geral fundaram em provas específicas e concretas as respetivas análises dos efeitos. Assim, particularmente no n.o 143 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral cometeu o erro de aplicar uma abordagem fundada no objetivo e não nos efeitos.

130

Por fim, remetendo para os n.os 143, 150, 157 e 158 do acórdão recorrido, a RBS sustenta que, em qualquer caso, a análise dos efeitos das CIM na concorrência, feita pelo Tribunal Geral, é errada do ponto de vista jurídico e baseia‑se numa hipótese que é contrariada no acórdão recorrido, a saber, que os comerciantes podem exercer uma pressão sobre os bancos de aquisição na negociação das MSC.

131

As recorrentes subscrevem o fundamento único do recurso subordinado da RBS. Quanto à argumentação exposta no n.o 129 do presente acórdão, sustentam que a única diferença entre as CIM e a «hipótese contrafactual» na qual se baseia o acórdão recorrido reside no nível de preços das CIM. Com efeito, tal como as CIM, a proibição de tarifações ex post é decidida pela MasterCard, aplica‑se supletivamente e tem por consequência fixar (em zero) o preço faturado entre estes bancos. Segundo as recorrentes, fixar o nível das CIM em zero tem o mesmo efeito de «fixação de um limite mínimo» que as CIM, se bem que a um nível mais favorável para os comerciantes e menos favorável para os titulares de cartões. Por conseguinte, ao não explicar como é que a «hipótese contrafactual», escolhida pela Comissão, da proibição de tarifações ex post tem efeitos menos restritivos da concorrência do que as CIM, a conclusão do Tribunal Geral de que as CIM têm um efeito restritivo da concorrência padece de falta de fundamentação.

132

Segundo a Comissão, embora a RBS, no seu recurso subordinado, remeta, de forma geral, para os n.os 123 a 182 do acórdão recorrido, não invoca nenhum erro, exceto no que respeita ao n.o 132 deste último, de modo que este recurso só seria admissível na medida em que fosse dirigido contra o referido n.o 132.

133

Quanto ao mérito, a Comissão sustenta, em substância, que a RBS se baseia numa leitura errada do acórdão recorrido. Segundo a Comissão, é absolutamente manifesto que o Tribunal Geral, nos n.os 132 e seguintes do acórdão recorrido, examinou o efeito das CIM na concorrência, por referência às condições de concorrência caso essas comissões não existissem.

134

No entender da Comissão, a posição segundo a qual as CIM não restringem a concorrência não é plausível em si mesma. A RBS não tem em conta o quadro real. Neste ponto, a Comissão afirma que as CIM resultam de uma decisão de uma associação de empresas de fixar os preços e que os efeitos restritivos dessas comissões são evidentes.

135

A Comissão considera que o Tribunal Geral não cometeu um erro de direito ao declarar que a proibição de tarifações ex post podia servir de base de raciocínio realista, suscetível de permitir comparar a situação com e sem as CIM. Segundo a Comissão, o sistema MasterCard é uma construção artificial. Não é necessário ao funcionamento de um mercado biface que uma parte desse mercado remunere o outro, mas foi assim que as recorrentes escolheram conceber o seu sistema. A Comissão considera que, tendo em conta os n.os 107 a 110 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral não cometeu um erro de direito ao utilizar a proibição de tarifações ex post como uma solução de substituição relativamente às CIM.

136

Além disso, a Comissão contesta que o acórdão recorrido assente no postulado de que os preços elevados constituem, em si mesmos, uma infração ao artigo 81.o, n.o 1, CE. Segundo a Comissão, a conclusão consagrada nesse acórdão é que esses preços elevados são a consequência de um acordo restritivo.

137

Por outro lado, a Comissão contesta a afirmação segundo a qual o Tribunal Geral não baseou a sua análise em elementos de prova específicos e concretos, do mesmo modo que a alegação de contradição de fundamentos exposta no n.o 130 do presente acórdão.

– Quanto ao primeiro fundamento do recurso subordinado da LBG

138

A LBG alega que o Tribunal Geral, na sua análise dos efeitos das CIM na concorrência, que figura nos n.os 123 a 193 do acórdão recorrido, cometeu erros de direito.

139

Antes de mais, considera que o Tribunal Geral não tratou os argumentos pertinentes nem os elementos que lhe foram submetidos e não forneceu uma fundamentação adequada para justificar como é que as CIM afetam a concorrência no mercado da aquisição, quando «a fixação do preço» era alegada no mercado da emissão. Em particular, segundo a LGB, o Tribunal Geral não explicou como é que as CIM afetam a concorrência no mercado da aquisição, no qual constituem apenas um custo de entrada comum para todos os concorrentes.

140

Em seguida, à luz dos argumentos das partes e, em especial, dos elementos de prova de caráter económico, o Tribunal Geral, segundo a LBG, cometeu erros de direito ao excluir diversos elementos na sua análise. Em especial, no quadro do exame de uma infração ao artigo 81.o, n.o 1, CE, o Tribunal Geral não reconheceu a importância das contingências provenientes de outros sistemas de pagamento nem do caráter biface do sistema, que, segundo o Tribunal Geral, apenas são pertinentes no âmbito do artigo 81.o, n.o 3, CE. Com efeito, segundo a LBG, para concluir que a Comissão fez prova bastante da existência de uma restrição da concorrência, o Tribunal Geral devia certificar‑se de que a Comissão tinha examinado a pretensa restrição da concorrência no seu próprio contexto.

141

Por último, segundo a LBG, o Tribunal Geral aplicou um grau inadequado de fiscalização jurisdicional. Como decorre, designadamente, do n.o 169 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral aplicou, com efeito, um grau de fiscalização muito limitado, distinto do decorrente dos acórdãos Comissão/Tetra Laval (C‑12/03 P, EU:C:2005:87, n.o 39) e KME Germany e o./Comissão (C‑272/09 P, EU:C:2011:810, n.os 94, 102 e 103).

142

As recorrentes subscrevem este fundamento com argumentos semelhantes aos invocados em apoio do recurso subordinado da RBS.

143

A Comissão considera, designadamente, que, embora a BoS e a LTSB, na sua qualidade de intervenientes no Tribunal Geral, tenham sido autorizadas a desenvolver novos argumentos, não podiam suscitar um fundamento de anulação totalmente novo, relativo à definição do mercado relevante, pois o recurso em primeira instância não contestou a delimitação dos mercados constante da decisão controvertida. A este respeito, a Comissão afirma que o n.o 168 do acórdão recorrido, segundo o qual «[a]s recorrentes e diversos intervenientes alegam que a Comissão, no essencial, no seu raciocínio, não tomou em conta a natureza [biface] do mercado e contestam a definição do mercado de produtos feita pela Comissão», é errado.

144

No que respeita ao grau de fiscalização aplicado pelo Tribunal Geral aos elementos de prova económicos, a Comissão sustenta que o recurso subordinado interposto pela LBG não satisfaz as exigências enunciadas no artigo 169.o, n.o 2, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça. Por outro lado, o interesse do acórdão KME Germany e o./Comissão (EU:C:2011:810) é reduzido, uma vez que se tratava de um recurso que apenas tinha por objeto uma coima e que continha obiter dicta unicamente sobre o grau de fiscalização da legalidade das decisões.

145

A Comissão também considera que o argumento da LBG relativo ao «custo de entrada comum» foi rejeitado pelo Tribunal Geral nos n.os 142 e 143 do acórdão recorrido, que não foram contestados pela LBG, como exige o artigo 169.o, n.o 2, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça.

146

Finalmente, a Comissão sustenta que a crítica, reproduzida no n.o 140 do presente acórdão, segundo a qual o acórdão recorrido não reconheceu a importância dos efeitos restritivos de outros sistemas de pagamento e não tomou em conta o caráter biface do sistema, também não respeita o referido artigo 169.o, n.o 2, e visa obter do Tribunal de Justiça uma nova apreciação dos factos.

Apreciação do Tribunal de Justiça

– Quanto às exceções de inadmissibilidade suscitadas pela Comissão

147

A exceção de inadmissibilidade exposta no n.o 132 do presente acórdão assenta numa leitura inexata do recurso subordinado da RBS. Contrariamente ao que afirma a Comissão, a RBS não se limita a remeter, na generalidade, para a análise dos efeitos restritivos das CIM efetuada pelo Tribunal Geral, mas invoca números precisos do acórdão recorrido em apoio dos seus argumentos, como expostos nos n.os 129 e 130 do presente acórdão. Por conseguinte, a exceção de inadmissibilidade exposta no n.o 132 do presente acórdão deve ser julgada improcedente.

148

Por outro lado, na medida em que, com o seu argumento exposto no n.o 128 do presente acórdão, a RBS acusa o Tribunal Geral de não ter procedido a uma certa análise, há que recordar que quando um recorrente sustenta que o Tribunal Geral não respondeu a um fundamento, não pode ser criticado, no âmbito da admissibilidade do fundamento do recurso, por não mencionar nenhuma passagem ou nenhuma parte do acórdão recorrido que seja precisamente visada pelo seu argumento, no caso de, por hipótese, ser invocada uma falta de resposta (v. acórdão Limburgse Vinyl Maatschappij e o./Comissão, C‑238/99 P, C‑244/99 P, C‑245/99 P, C‑247/99 P, C‑250/99 P a C‑252/99 P e C‑254/99 P, EU:C:2002:582, n.o 423).

149

Por sua vez, a argumentação exposta no n.o 143 do presente acórdão assenta numa leitura errada do recurso subordinado da LBG. Como resulta dos n.os 139 a 142 do presente acórdão, esta limitou‑se a apresentar argumentos relativos à inexistência de efeitos restritivos das CIM, sem, contudo, pôr em causa a definição do mercado relevante enquanto tal. Nestas condições, há que rejeitar a exceção de inadmissibilidade exposta no referido n.o 143.

150

No que respeita aos argumentos da Comissão reproduzidos nos n.os 144 a 146 do presente acórdão, há que recordar que, como resulta do n.o 23 do presente acórdão, o recurso subordinado da LBG foi interposto em 31 de outubro de 2012. Ora, o artigo 169.o, n.o 2, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, no qual a Comissão se baseia, só entrou em vigor no dia seguinte. Na medida em que esta disposição, ao exigir que os fundamentos e argumentos jurídicos invocados no recurso identifiquem «com precisão os pontos da fundamentação da decisão do Tribunal Geral que são contestados», estabelece um requisito de admissibilidade, não pode ser aplicada retroativamente.

151

Resulta, no entanto, dos artigos 256.° TFUE, 58.°, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça e 112.°, n.o 1, alínea c), do Regulamento de Processo deste último, em vigor à data da interposição do recurso subordinado da LBG, que um recurso de uma decisão do Tribunal Geral deve indicar com precisão os elementos contestados do acórdão cuja anulação é pedida, bem como os argumentos jurídicos em que se apoia especificamente esse pedido (v., designadamente, acórdãos Limburgse Vinyl Maatschappij e o./Comissão, EU:C:2002:582, n.os 497 e 618, e EFIM/Comissão, C‑56/12 P, EU:C:2013:575, n.o 21 e jurisprudência referida). Não satisfaz estes requisitos e deve ser julgado inadmissível um recurso ou um fundamento que é demasiado obscuro para obter uma resposta (v., designadamente, acórdãos Thyssen Stahl/Comissão, C‑194/99 P, EU:C:2003:527, n.os 101 e 106; Schindler Holding e o./Comissão, C‑501/11 P, EU:C:2013:522, n.os 43 a 45; e EFIM/Comissão, EU:C:2013:575, n.o 21).

152

No caso em apreço, no primeiro fundamento do seu recurso subordinado, a LBG identifica expressamente uma parte do acórdão recorrido, que contesta alegando que não respeitou o nível de fiscalização jurisdicional, isto é, o n.o 169 do mesmo, com uma argumentação clara em apoio deste argumento. Além disso, na medida em que, através deste fundamento, a LBG acusa o Tribunal Geral de não ter tido em conta o caráter biface do sistema, entendendo que a tomada em consideração deste caráter apenas seria pertinente no quadro do artigo 81.o, n.o 3, CE, é suficientemente claro que essa alegação visa os n.os 181 e 182 do acórdão recorrido, nos quais o Tribunal Geral declarou que as críticas das recorrentes relativas ao caráter biface do sistema apenas são pertinentes no âmbito preciso dessa disposição. Além disso, na medida em que, através do referido fundamento, a LBG acusa o Tribunal Geral de não ter reconhecido a importância das contingências de outros sistemas de pagamento, tendo em conta a jurisprudência referida no n.o 148 do presente acórdão, a LBG não pode ser acusada de não ter especificado os números do acórdão recorrido visados nessa crítica. Por último, contrariamente à sugestão da Comissão mencionada no n.o 146 do presente acórdão, os referidos argumentos não se limitam a pôr em causa a apreciação dos factos, mas constituem questões de direito, admissíveis na fase de recurso de uma decisão do Tribunal Geral, uma vez que suscitam a questão dos elementos que devem ser considerados na análise dos efeitos restritivos das CIM ao abrigo do artigo 81.o, n.o 1, CE.

153

Daqui se conclui que as exceções de inadmissibilidade expostas nos n.os 144 a 146 do presente acórdão devem igualmente ser rejeitadas.

– Quanto ao mérito do fundamento único do recurso subordinado da RBS e do primeiro fundamento do recurso subordinado da LBG

154

Como decorre do n.o 141 do presente acórdão, a LBG acusa o Tribunal Geral de ter aplicado um grau inadequado de fiscalização jurisdicional, designadamente no n.o 169 do acórdão recorrido.

155

No que respeita ao alcance da fiscalização jurisdicional, recorde‑se que resulta da jurisprudência da União que, quando lhe é submetido, ao abrigo do artigo 263.o TFUE, um recurso de anulação de uma decisão de aplicação do artigo 81.o, n.o 1, CE, o Tribunal Geral deve exercer, de maneira geral, com base nos elementos apresentados pelo recorrente em apoio dos fundamentos invocados, uma fiscalização completa sobre a questão de saber se as condições de aplicação desta disposição estão ou não reunidas (v., neste sentido, acórdãos Remia e o./Comissão, EU:C:1985:327, n.o 34; Chalkor/Comissão, C‑386/10 P, EU:C:2011:815, n.os 54 e 62; e Otis e o., C‑199/11, EU:C:2012:684, n.o 59). O Tribunal Geral deve igualmente verificar oficiosamente se a Comissão fundamentou a sua decisão (v., neste sentido, acórdãos Chalkor/Comissão, EU:C:2011:815, n.o 61 e jurisprudência referida, e Otis e o., EU:C:2012:684, n.o 60).

156

No âmbito desta fiscalização, o Tribunal Geral não se pode basear na margem de apreciação de que a Comissão dispõe, em virtude do papel que lhe é atribuído, em matéria de política da concorrência, pelos Tratados UE e FUE, para renunciar a uma fiscalização aprofundada, tanto de direito como de facto (v., neste sentido, acórdãos Chalkor/Comissão, EU:C:2011:815, n.o 62, e Otis e o., EU:C:2012:684, n.o 61).

157

No caso em apreço, há que salientar que, no âmbito da sua apreciação da questão dos efeitos restritivos das CIM, o Tribunal Geral, no n.o 169 do acórdão recorrido, utilizou a expressão «fiscalização limitada», que podia deixar entender que exerceu uma fiscalização jurisdicional mais restrita sobre a decisão controvertida do que a exigida pela jurisprudência exposta nos n.os 155 e 156 do presente acórdão.

158

Porém, em si mesma, esta expressão não demonstra necessariamente que o Tribunal Geral não exerceu, de facto, a fiscalização jurisdicional exigida. Por isso, há que prosseguir a análise dos fundamentos apresentados ao Tribunal de Justiça (v., por analogia, designadamente, acórdão KME Germany e o./Comissão, EU:C:2011:810, n.os 108 e 109).

159

No caso em apreço, com o seu argumento relativo ao grau inadequado de fiscalização jurisdicional, a LGB apenas se baseou especificamente no n.o 169 do acórdão recorrido, número que faz parte da análise, pelo Tribunal Geral, dos argumentos que contestam a definição do mercado dos produtos adotada pela Comissão. Todavia, no âmbito do presente recurso, as recorrentes não puseram diretamente em causa a apreciação do Tribunal Geral relativa a essa definição, ou seja, o mercado da aquisição.

160

Nestas circunstâncias, o argumento aduzido pela LBG, na medida em que critica ao Tribunal Geral o nível de fiscalização jurisdicional aplicado nessa parte da sua análise, afigura‑se, em qualquer caso, inoperante. Quanto ao restante, o argumento da LBG relativo à fiscalização jurisdicional deve ser julgado inadmissível na medida em que não identifica com precisão as outras partes visadas no acórdão recorrido.

161

No que respeita à acusação da RBS, resumida no n.o 128 do presente acórdão, segundo a qual, ao examinar a questão de saber se uma decisão tem um efeito restritivo da concorrência, a Comissão deveria ter examinado qual a «hipótese contrafactual» que se verificaria efetivamente sem as CIM, há que recordar que o Tribunal de Justiça decidiu reiteradamente que, para se determinar se um acordo deve ser considerado proibido em razão das alterações do jogo da concorrência que provoca, é necessário examinar o jogo da concorrência no quadro real em que se produziria se não existisse o acordo controvertido (v. acórdãos LTM, 56/65, EU:C:1966:38, 360; Béguelin Import, 22/71, EU:C:1971:113, n.os 16 e 17; Lancôme e Cosparfrance Nederland, 99/79, EU:C:1980:193, n.o 26; L’Oréal, 31/80, EU:C:1980:289, n.o 19; ETA Fabriques d’Ébauches, 31/85, EU:C:1985:494, n.o 11; Bagnasco e o., C‑215/96 e C‑216/96, EU:C:1999:12, n.o 33 e jurisprudência referida; e General Motors/Comissão, EU:C:2006:229, n.o 72). Como o Tribunal Geral considerou acertadamente no n.o 128 do acórdão recorrido, o mesmo acontece com uma decisão de uma associação de empresas na aceção do artigo 81.o CE.

162

Todavia, resulta em particular do n.o 132 do acórdão recorrido que, para apreciar os efeitos concorrenciais das CIM, o Tribunal Geral se baseou na «hipótese de um sistema MasterCard que funciona sem CIM — unicamente com base numa regra que proibisse as tarifações ex post», ou seja, na mesma «hipótese contrafactual» que aplicou para analisar se as CIM podiam ser consideradas uma restrição acessória na aceção dos n.os 89 e 90 do presente acórdão, relativamente ao sistema de pagamento MasterCard.

163

Ora, como resulta do n.o 108 do presente acórdão, a mesma «hipótese contrafactual» não é necessariamente adequada a questões conceptualmente distintas. Com efeito, quando se trata de saber se as CIM comportam efeitos restritivos da concorrência, a questão de saber se, sem essas comissões, mas por efeito da proibição de tarifações ex post, um sistema aberto de pagamento, como o sistema MasterCard, poderia continuar a ser viável não é, por si só, determinante.

164

Em contrapartida, importa, para este efeito, apreciar a incidência da fixação das CIM nos parâmetros da concorrência, tais como, nomeadamente, o preço, a quantidade e a qualidade dos produtos ou dos serviços. Assim, em conformidade com a jurisprudência constante recordada no n.o 161 do presente acórdão, há que examinar o jogo da concorrência no quadro real em que se verificaria se essas comissões não existissem.

165

A este respeito, o Tribunal de Justiça já teve ocasião de sublinhar que a apreciação dos efeitos de uma coordenação entre empresas à luz da aplicação do artigo 81.o CE implica a necessidade de tomar em consideração o quadro concreto em que o dispositivo de coordenação em causa se insere, nomeadamente o contexto económico e jurídico em que operam as empresas em causa, a natureza dos bens ou dos serviços afetados e as condições reais do funcionamento e da estrutura do mercado ou dos mercados em questão (v., neste sentido, designadamente, acórdãos Delimitis, C‑234/89, EU:C:1991:91, n.os 19 a 22; Oude Luttikhuis e o., EU:C:1995:434, n.o 10; Asnef‑Equifax e Administración del Estado, EU:C:2006:734, n.o 49 e jurisprudência referida; e Erste Group Bank e o./Comissão, C‑125/07 P, C‑133/07 P, C‑135/07 P e C‑137/07 P, EU:C:2009:576, n.o 54).

166

Daqui resulta que o cenário previsto a partir da hipótese de inexistência do dispositivo de coordenação em causa deve ser realista. Nesta ótica, é possível, sendo caso disso, levar em conta os desenvolvimentos prováveis que se produziriam no mercado, na falta desse dispositivo.

167

Todavia, no caso em apreço, o Tribunal Geral não abordou minimamente a questão do caráter provável, ou mesmo plausível, da proibição de tarifações ex post na hipótese de inexistência das CIM no âmbito da sua análise dos efeitos restritivos dessas comissões. Em especial, não abordou, em conformidade com as exigências da jurisprudência exposta nos n.os 155 e 156 do presente acórdão, a questão de saber de que modo, tendo em conta, nomeadamente, as obrigações que oneram os comerciantes e os bancos de aquisição por força da Honour All Cards Rule, a qual não é objeto da decisão controvertida, os bancos de emissão poderiam ser incitados, sem as CIM, a renunciar à exigência das comissões por ocasião do pagamento das transações por meio de cartões bancários.

168

É certo que, como resulta do n.o 111 do presente acórdão, o Tribunal Geral não era obrigado, no âmbito da análise do caráter acessório das CIM, na aceção dos n.os 89 e 90 do presente acórdão, a examinar se era provável que a proibição de tarifações ex post ocorresse no caso de essas comissões não existirem. Contudo, atendendo à jurisprudência recordada nos n.os 161 e 165 do presente acórdão, a situação é diferente no contexto distinto da questão de saber se as CIM comportam efeitos restritivos da concorrência.

169

Nestas condições, é com razão que se alega no caso vertente que, ao basear‑se exclusivamente no critério da viabilidade económica, designadamente nos n.os 132 e 143 do acórdão recorrido, para justificar a tomada em consideração da proibição de tarifações ex post no âmbito da sua análise dos efeitos das CIM na concorrência, e ao evitar, portanto, explicar, no âmbito dessa análise, se era provável que tal proibição ocorresse, no caso de as CIM não existirem, por um meio diferente de uma intervenção regulamentar, o Tribunal Geral cometeu um erro de direito.

170

Deve recordar‑se, no entanto, que se os fundamentos de uma decisão do Tribunal Geral revelarem uma violação do direito da União, mas o dispositivo dessa decisão se basear noutros fundamentos jurídicos, essa violação não é de molde a provocar a anulação da decisão e há que proceder a uma substituição de fundamentos (v., neste sentido, acórdãos Lestelle/Comissão, C‑30/91 P, EU:C:1992:252, n.o 28, e FIAMM e o./Conselho e Comissão, C‑120/06 P e C‑121/06 P, EU:C:2008:476, n.o 187 e jurisprudência referida).

171

É o que acontece no caso em apreço. A argumentação das recorrentes perante o Tribunal Geral, no que respeita ao caráter objetivamente necessário das CIM, conforme descrita no n.o 94 do acórdão recorrido, que não é contestado no quadro do presente recurso, assenta essencialmente na alegação de que, sem as CIM, os adquirentes ficariam à mercê dos emitentes, que poderiam determinar unilateralmente o montante da comissão interbancária, sendo os vendedores e os compradores obrigados a aceitar a transação.

172

Nos n.os 95 e 96 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral considerou corretamente, como resulta dos n.os 78 a 121 do presente acórdão, que a Comissão podia concluir com razão que «[a] possibilidade de certos bancos de emissão explorarem adquirentes vinculados pela [Honour All Cards Rule] poderia ser afastada por uma regra de rede que tivesse efeitos menos restritivos na concorrência que a solução atual da MasterCard, que exige que, supletivamente, seja aplicado um certo nível de comissões interbancárias. A outra solução seria uma regra que impusesse uma proibição de tarifações ex post, na falta de um acordo bilateral entre eles».

173

Daqui se conclui que, como resulta dos n.os 94 a 96 do acórdão recorrido, a única outra opção que se apresentava em primeira instância de forma a permitir ao sistema MasterCard funcionar sem CIM era efetivamente a hipótese de um sistema que funcionasse unicamente com base numa proibição de tarifações ex post. Nestas circunstâncias, a referida proibição pode ser encarada como uma «hipótese contrafactual» não apenas economicamente viável no âmbito do sistema MasterCard mas igualmente plausível, ou mesmo provável, dado que não resulta de forma alguma do acórdão recorrido e que é pacífico que não foi sustentado perante o Tribunal Geral que a MasterCard teria preferido deixar o seu sistema desagregar‑se a adotar outra solução, isto é, a proibição de tarifações ex post.

174

Consequentemente, embora o Tribunal Geral tenha errado ao considerar que o caráter economicamente viável da proibição de tarifações ex post no âmbito do sistema MasterCard era, por si só, suficiente para justificar a tomada em consideração dessa proibição no âmbito da análise dos efeitos das CIM na concorrência, nas circunstâncias do caso em apreço, como resultam do acórdão recorrido, o Tribunal Geral, para proceder à análise dos efeitos restritivos das CIM, baseou‑se corretamente na mesma «hipótese contrafactual» que tinha aplicado quando analisou a necessidade objetiva dessas comissões, ainda que por motivos diferentes dos expostos pelo Tribunal Geral nos n.os 132 e 143 do acórdão recorrido. Nestas condições, o erro de direito verificado no n.o 169 do presente acórdão não tem incidência na análise dos efeitos restritivos efetuada pelo Tribunal Geral com base na «hipótese contrafactual» em causa.

175

De igual modo, esse erro não tem incidência no dispositivo do acórdão recorrido, que se funda noutras razões jurídicas.

176

No que respeita ao argumento, resumido no n.o 140 do presente acórdão, com o qual a LBG acusa o Tribunal Geral de não ter reconhecido a importância das contingências provenientes de outros sistemas, basta salientar que, no n.o 137 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral concluiu expressamente que a Comissão teve razão ao tomar em consideração a concorrência interssistemas no âmbito da sua análise dos efeitos das CIM. Este argumento, dado que assenta numa interpretação errada do acórdão recorrido, deve ser rejeitado (v., neste sentido, acórdão Ojha/Comissão, C‑294/95 P, EU:C:1996:434, n.os 48 e 49).

177

Quanto ao argumento, também referido no n.o 140 do presente acórdão, com o qual a LBG acusa o Tribunal Geral de ter considerado que o caráter biface do sistema apenas é pertinente no âmbito do artigo 81.o, n.o 3, CE, importa recordar que, como decorre do n.o 161 do presente acórdão e como a LBG de resto alega, o Tribunal Geral era obrigado a certificar‑se de que a Comissão tinha examinado a pretensa restrição da concorrência no seu quadro real. Com efeito, para apreciar se uma coordenação entre empresas deve ser considerada proibida em razão das alterações do jogo da concorrência que provoca, é necessário, segundo a jurisprudência recordada no n.o 165 do presente acórdão, tomar em consideração qualquer elemento pertinente, tendo em conta, designadamente, a natureza dos serviços em causa, bem como as condições reais do funcionamento e da estrutura dos mercados, relativo ao contexto económico ou jurídico em que a referida coordenação se insere, pouco importando que esse elemento faça ou não parte do mercado relevante.

178

No caso em apreço, o Tribunal Geral concluiu, no n.o 173 do acórdão recorrido, sem que isso tivesse sido diretamente posto em causa no âmbito do presente recurso, que a Comissão podia ter em conta o mercado da aquisição como mercado relevante para a sua análise dos efeitos concorrenciais das CIM. Além disso, como resulta do n.o 176 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral, no âmbito da sua apreciação soberana dos factos, que não é contestada no quadro do presente recurso, salientou que há alguma interação entre as vertentes «emissão» e «aquisição», como o caráter complementar dos serviços e a presença de efeitos de rede indiretos, na medida em que a importância da aceitação dos cartões pelos comerciantes e o número de cartões em circulação se influenciam mutuamente.

179

Nestas circunstâncias, o contexto económico e jurídico no qual a coordenação em causa se inscreve compreende, como afirmam as recorrentes, a RBS e a LBG, o caráter biface do sistema de pagamento aberto da MasterCard, tendo especialmente em conta que é pacífico que há interação entre as duas faces do referido sistema (v., por analogia, acórdãos Delimitis, EU:C:1991:91, n.os 17 a 23, e Allianz Hungária Biztosító e o., C‑32/11, EU:C:2013:160, n.o 42).

180

Contudo, no caso vertente, como resulta dos n.os 181 e 182 do acórdão recorrido, a argumentação apresentada, em substância, ao Tribunal Geral, que não é contestada no âmbito do presente recurso, não incluía o argumento agora avançado pela LBG no quadro do presente recurso, segundo o qual, para julgar uma restrição da concorrência no seu próprio contexto, há que ter em conta o caráter biface do sistema em causa. Pelo contrário, as críticas feitas em primeira instância à não tomada em consideração do caráter biface do sistema limitavam‑se a salientar as vantagens económicas decorrentes das CIM. Ora, como resulta do n.o 93 do presente acórdão e da própria redação do artigo 81.o CE, verificando‑se que uma medida é suscetível de ter uma incidência desfavorável sensível nos parâmetros da concorrência, como, nomeadamente, o preço, a quantidade e a qualidade dos produtos ou dos serviços, estando, portanto abrangida pelo princípio da proibição do artigo 81.o, n.o 1, CE, tais vantagens apenas podem ser consideradas no quadro do n.o 3 desse artigo.

181

Atendendo a esta constatação, o Tribunal Geral concluiu portanto, com razão, no n.o 182 do acórdão recorrido, que as críticas que lhe foram apresentadas em relação ao caráter biface do sistema não eram pertinentes no quadro de um fundamento relativo à violação do artigo 81.o, n.o 1, CE, na medida em que implicavam a tomada em consideração de vantagens económicas ao abrigo deste número. Foi também corretamente que o Tribunal Geral concluiu que as eventuais vantagens económicas que poderiam resultar das CIM apenas são pertinentes no âmbito da análise ao abrigo do artigo 81.o, n.o 3, CE.

182

Daqui resulta que o argumento da LGB relativo ao caráter biface do sistema assenta numa interpretação errada do acórdão recorrido e não é, assim, procedente.

183

No que se refere à alegação da RBS, resumida no n.o 129 do presente acórdão, segundo a qual o Tribunal Geral procedeu a uma «análise abreviada» dos efeitos das CIM, em especial no n.o 143 do acórdão recorrido, a Comissão contrapõe, como resulta do n.o 134 do presente acórdão, que as CIM provêm de uma decisão de uma associação de empresas de fixar os preços e que os seus efeitos anticoncorrenciais são evidentes.

184

A este respeito, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que certos tipos de coordenação entre empresas revelam um grau suficiente de nocividade relativamente à concorrência para que se possa considerar que o exame dos seus efeitos não é necessário (v., neste sentido, designadamente, acórdãos LTM, EU:C:1966:38, 359 e 360; Beef Industry Development Society e Barry Brothers, C‑209/07, EU:C:2008:643, n.o 15; e Allianz Hungária Biztosító e o., EU:C:2013:160, n.o 34 e jurisprudência referida).

185

Esta jurisprudência tem a ver com a circunstância de certas formas de coordenação entre empresas poderem ser consideradas, pela sua própria natureza, prejudiciais ao bom funcionamento do jogo normal da concorrência (v., neste sentido, designadamente, acórdão Allianz Hungária Biztosító e o., EU:C:2013:160, n.o 35 e jurisprudência referida).

186

No entanto, há que recordar que, como resulta, nomeadamente, dos n.os 27 e 141 do acórdão recorrido, a decisão controvertida não se baseia na existência de uma infração por objetivo, prevista no artigo 81.o, n.o 1, CE, mas nos efeitos das CIM.

187

Nestas condições, contrariamente ao que a Comissão deixa entender, não se pode, portanto, recorrer, com base na jurisprudência referida no n.o 184 do presente acórdão, a simples suposições ou afirmações segundo as quais os efeitos anticoncorrenciais das CIM seriam «evidentes» (v., neste sentido, designadamente, acórdão Compagnie royale asturienne des mines e Rheinzink/Comissão, 29/83 e 30/83, EU:C:1984:130, n.os 16 e 20).

188

No que respeita aos argumentos referidos nos n.os 131, 139 e 142 do presente acórdão, que se entrecruzam em certa medida com o argumento da RBS exposto no n.o 129, supra, há que recordar que o dever de fundamentação dos acórdãos resulta do artigo 36.o do Estatuto do Tribunal de Justiça, aplicável ao Tribunal Geral por força do artigo 53.o, primeiro parágrafo, do mesmo Estatuto, e do artigo 81.o do Regulamento de Processo do Tribunal Geral (v., designadamente, acórdão Deutsche Telekom/Comissão, C‑280/08 P, EU:C:2010:603, n.o 135).

189

Segundo jurisprudência constante, a fundamentação de um acórdão deve revelar de forma clara e inequívoca o raciocínio do Tribunal Geral, de forma a permitir aos interessados conhecerem as razões da decisão tomada e ao Tribunal de Justiça exercer a sua fiscalização jurisdicional (v., designadamente, acórdãos France Télécom/Comissão, C‑202/07 P, EU:C:2009:214, n.o 29, e Ziegler/Comissão, C‑439/11 P, EU:C:2013:513, n.o 81). No entanto, como já foi mencionado no n.o 112 do presente acórdão, o dever de fundamentação não obriga o Tribunal Geral a fazer uma exposição exaustiva e individual de todos os passos do raciocínio articulado pelas partes no litígio. A fundamentação pode, portanto, ser implícita, na condição de permitir aos interessados conhecerem as razões pelas quais o Tribunal Geral não acolheu os seus argumentos e ao Tribunal de Justiça dispor dos elementos suficientes para exercer a sua fiscalização (v., designadamente, Ziegler/Comissão, EU:C:2013:513, n.o 82 e jurisprudência referida).

190

Contudo, embora seja verdade, como resulta do n.o 169 do presente acórdão, que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito na interpretação do artigo 81.o, n.o 1, CE, à luz da substituição de fundamentos efetuada nos n.os 171 a 175 deste acórdão, os argumentos utilizados para censurar o Tribunal Geral por ter efetuado uma análise abreviada dos efeitos das CIM e por, sobre essa questão, ter fundamentado insuficientemente o acórdão recorrido não podem ser fundados nesse simples erro.

191

Quanto ao restante, na medida em que acusam o Tribunal Geral de ter feito uma análise ou apresentado uma fundamentação insuficiente dos efeitos concorrenciais das CIM, os argumentos mencionados no n.o 188 do presente acórdão não podem ser acolhidos.

192

Na verdade, tendo‑se validamente fundado na «hipótese contrafactual» de um sistema funcionando com base na proibição de tarifações ex post, contrariamente ao que alega a RBS, o Tribunal Geral não considerou que as CIM, pela sua própria natureza, fossem prejudiciais ao bom funcionamento do jogo normal da concorrência, mas iniciou uma análise dos efeitos concorrenciais dessas comissões. Há que sublinhar que a análise do Tribunal Geral a este respeito não resulta da simples leitura do n.o 143 do acórdão recorrido, como parece sugerir a RBS, mas inclui também toda a análise constante dos n.os 123 a 193 do referido acórdão.

193

Em especial, embora, no n.o 143 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral tenha claramente explicado que as CIM tinham efeitos restritivos na medida em que «limitam a pressão que os comerciantes podem exercer sobre os bancos de aquisição na negociação das MSC reduzindo as possibilidades de os preços diminuírem abaixo de um determinado limiar», e isso em contraste «com um mercado de aquisição a funcionar sem elas», o Tribunal Geral não se limitou a presumir que as CIM fixam um mínimo às MSC, tendo procedido, pelo contrário, a uma análise minuciosa, nos n.os 157 a 165 do acórdão recorrido, a fim de determinar se era esse efetivamente o caso.

194

Por conseguinte, o argumento da RBS segundo o qual a análise dos efeitos deve ser equiparada a uma análise de uma restrição «por objetivo» baseia‑se numa leitura parcial do acórdão recorrido, ao centrar‑se unicamente no n.o 143 desse acórdão, sem ter em conta o exame mais completo em que este número se inscreve.

195

De igual modo, as recorrentes não podem acusar o Tribunal Geral de não ter explicado como é que a hipótese escolhida teria efeitos menos restritivos da concorrência do que as CIM, uma vez que a única diferença entre as duas situações reside no nível de preços das CIM. Com efeito, como corretamente sublinha a Comissão, o acórdão recorrido não assenta no postulado de que os preços elevados constituem, em si mesmos, uma infração ao artigo 81.o, n.o 1, CE. Pelo contrário, como decorre da própria redação do referido n.o 143, os preços elevados mais não são do que a consequência das CIM, que limitam a pressão que os comerciantes poderiam exercer sobre os bancos de aquisição, tendo como consequência uma diminuição da concorrência entre os adquirentes, no que respeita ao montante das MSC.

196

Nestas circunstâncias, o Tribunal de Justiça está em condições de exercer a sua fiscalização sobre a análise subjacente às afirmações que figuram no n.o 143 do acórdão recorrido. Tendo em conta as considerações que figuram nos n.os 183 a 195 do presente acórdão, o Tribunal Geral fundamentou suficientemente a sua apreciação dos efeitos das CIM na concorrência.

197

Esta conclusão não é posta em causa pelo argumento relativo à alegada contradição de fundamentos, apresentado pela RBS e explanado no n.o 130 do presente acórdão. Basta observar que nada há de contraditório no raciocínio do Tribunal Geral, na medida em que este reconheceu que os comerciantes podem exercer uma pressão sobre o montante das CIM, embora qualificando esta pressão de insuficiente, para impedir que as CIM fixem um limite mínimo e reduzam assim a concorrência entre os adquirentes. Com efeito, no n.o 158 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral explicou claramente que a Comissão podia qualificar de insuficiente a referida pressão, na medida em que apenas é suscetível de ocorrer para além de um limiar máximo de tolerância dos comerciantes. Trata‑se de apreciações autónomas que não se contradizem entre si, pelo que este argumento é infundado (v., por analogia, despacho Piau/Comissão, C‑171/05 P, EU:C:2006:149, n.o 85).

198

Em face do exposto, há que declarar que, embora o Tribunal Geral tenha cometido um erro de direito, como foi afirmado no n.o 169 do presente acórdão, esse erro não é suscetível de justificar a anulação do acórdão recorrido, atendendo à substituição de fundamentos efetuada nos n.os 171 a 175 do presente acórdão. Quanto ao restante, os argumentos invocados no âmbito do fundamento único do recurso subordinado da RBS e do primeiro fundamento do recurso subordinado da LBG são parcialmente inoperantes e parcialmente infundados.

199

Nestas condições, há que negar provimento ao recurso subordinado da RBS e ao primeiro fundamento do recurso subordinado da LBG.

Quanto ao segundo fundamento do recurso subordinado da LBG

200

Em substância, o segundo fundamento do recurso subordinado da LBG, relativo a uma violação do artigo 81.o, n.o 3, CE, articula‑se em três partes. As recorrentes subscrevem este fundamento, apresentando observações adicionais.

Acórdão recorrido

201

No entender do Tribunal Geral, o segundo fundamento da petição em primeira instância era composto, em substância, por duas partes. No âmbito da primeira parte, as recorrentes acusavam a Comissão de lhes ter aplicado um ónus da prova demasiado elevado relativamente à demonstração do respeito das condições previstas no artigo 81.o, n.o 3, CE. No âmbito da segunda parte, alegavam que a análise dessas condições pela Comissão enfermava de erros manifestos de apreciação. Considerando que era impossível examinar a primeira parte em abstrato, o Tribunal Geral examinou conjuntamente as duas partes do segundo fundamento da petição em primeira instância.

202

No n.o 207 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral declarou que, «na medida em que as CIM não constituem restrições acessórias relativamente ao sistema MasterCard, foi com razão que a Comissão analisou se existiam vantagens objetivas sensíveis decorrentes especificamente das CIM. Assim, a circunstância de a Comissão reconhecer, no considerando 679 da decisão [controvertida], que os sistemas de cartões de pagamento, como o sistema MasterCard, constituem um progresso técnico e económico é irrelevante para a questão de saber se as CIM preenchem a primeira condição imposta pelo artigo 81.o, n.o 3, CE».

203

Nos n.os 208 a 216 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral examinou a argumentação das recorrentes sobre o papel das CIM na compensação entre as vertentes «emissão» e «aquisição» do sistema MasterCard. No n.o 217 do seu acórdão, o Tribunal Geral concluiu que, «[e]m face do exposto, há que observar que a Comissão podia, sem cometer qualquer erro manifesto de apreciação, rejeitar a argumentação apresentada pelas recorrentes para justificar uma imputação dos benefícios objetivos que podem decorrer do sistema MasterCard ao papel desempenhado pelas suas CIM».

204

No n.o 220 do referido acórdão, o Tribunal Geral acrescentou que, mesmo admitindo que fosse possível deduzir que as CIM contribuem para aumentar a produção do sistema MasterCard, isso não basta para demonstrar que preenchem a primeira condição imposta pelo artigo 81.o, n.o 3, CE. A este respeito, o Tribunal Geral observou, no n.o 221 do mesmo acórdão, que os primeiros beneficiários desse aumento são a organização de pagamento MasterCard e os bancos que nela participam, e que a melhoria, na aceção do artigo 81.o, n.o 3, CE, não pode ser equiparada a qualquer vantagem que os participantes tiram do acordo para a respetiva atividade de produção ou de distribuição.

205

Nos n.os 222 a 225 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral examinou a existência de vantagens objetivas sensíveis, imputáveis às CIM, para os comerciantes e concluiu, no n.o 226 do referido acórdão, que, «na falta de prova da existência de um vínculo suficientemente estreito entre as CIM e as vantagens objetivas de que beneficiariam os comerciantes, a circunstância de poderem contribuir para o aumento da produção do sistema MasterCard não é, por si só, suscetível de demonstrar que está preenchida a primeira condição imposta pelo artigo 81.o, n.o 3, CE».

206

Nos n.os 227 a 229 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral considerou que, não tendo feito prova da existência de vantagens objetivas sensíveis, imputáveis às CIM, para os comerciantes, um dos dois grupos de utilizadores visados pelos cartões de pagamento, a crítica das recorrentes relativa à insuficiente tomada em consideração das vantagens das CIM para os titulares de cartões era inoperante.

207

No quadro do exame da argumentação das recorrentes através da qual acusam a Comissão de se comportar como um «regulador de preços» das CIM, o Tribunal Geral, nos n.os 230 a 232 do referido acórdão, concluiu que a Comissão tinha examinado e refutado validamente a justeza da argumentação desenvolvida pelas recorrentes no decurso do procedimento administrativo e que a inexistência de dados que permitissem satisfazer o nível de prova económica exigido pela Comissão, admitindo‑a demonstrada, não poderia implicar uma atenuação ou mesmo uma inversão do ónus da prova.

208

Finalmente, nos n.os 236 e 237 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral concluiu a sua análise do segundo fundamento da petição em primeira instância, relativo a uma violação do artigo 81.o, n.o 3, CE, nos seguintes termos:

«236

Em face do exposto, há que concluir que as recorrentes não demonstraram que o raciocínio da Comissão sobre a primeira condição do artigo 81.o, n.o 3, CE estivesse ferido de ilegalidade. Visto ser necessária a reunião das condições enunciadas nesse artigo para que este se possa aplicar, há que julgar improcedente a segunda parte do fundamento, sem que seja necessário analisar as críticas das recorrentes sobre os outros aspetos da análise da Comissão nos termos desse artigo.

237

Por conseguinte, a primeira parte do fundamento, relativa ao caráter exagerado do ónus da prova imposto às recorrentes, deve igualmente ser julgada improcedente. Com efeito, resulta dos desenvolvimentos expostos que a Comissão examinou os argumentos e as provas apresentados pelas recorrentes e, nas circunstâncias do caso, podia validamente concluir que não permitiam demonstrar que as condições de aplicação do artigo 81.o, n.o 3, CE estavam reunidas. Na medida em que a Comissão podia validamente concluir que as recorrentes não tinham feito prova da exceção que invocavam, improcede também a alegação relativa à violação do princípio in dubio pro reo

Quanto à primeira parte do segundo fundamento do recurso subordinado da LBG

– Argumentação das partes

209

A LBG alega que o Tribunal Geral não aplicou o critério correto no que se refere ao ónus da prova, isto é, a ponderação das probabilidades. Remetendo para as observações escritas que apresentou sobre o artigo 81.o, n.o 3, CE, no Tribunal Geral, a LBG sustenta que este devia ter examinado a totalidade do sistema MasterCard, que oferece importantes vantagens aos titulares de cartões e aos comerciantes. O Tribunal Geral não deveria ter pedido à MasterCard que justificasse o nível das CIM, mas simplesmente pedido uma justificação da metodologia seguida pela MasterCard para fixar as CIM.

210

A Comissão considera que as três principais alegações suscitadas pela LBG no âmbito do segundo fundamento do seu recurso subordinado são inadmissíveis na medida em que assentam em afirmações vagas e gerais que não permitem identificar as partes contestadas do acórdão recorrido nem determinar qual é a base jurídica em que se baseiam, em conformidade com as exigências enunciadas no artigo 169.o, n.o 2, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça. A Comissão considera que a LBG não demonstra claramente a existência de um erro de direito cometido pelo Tribunal Geral, limitando‑se a reproduzir os argumentos já expendidos em primeira instância.

211

Mais concretamente, a Comissão sustenta que, em apoio da primeira parte do segundo fundamento do seu recurso subordinado, a LBG não designa nenhum número do acórdão recorrido nem comenta a jurisprudência invocada pelo Tribunal Geral no que se refere ao nível de prova adequado.

212

Quanto ao mérito, a Comissão alega que, no que toca à primeira parte do segundo fundamento da petição em primeira instância, relativa ao ónus da prova, o Tribunal Geral se baseou corretamente, nos n.os 196 e 206 do acórdão recorrido, na jurisprudência constante segundo a qual, para beneficiar do artigo 81.o, n.o 3, CE, a empresa deve apresentar argumentos e elementos de prova convincentes que a Comissão deve examinar. Em contrapartida, o critério da ponderação das probabilidades proposto pela LBG não é sustentado por nenhuma jurisprudência.

213

Além disso, a Comissão considera que, na medida em que a LBG parece contestar o requisito relativo ao nexo de causalidade entre a restrição real e os ganhos de eficácia, este argumento é inoperante dado que a LBG não contesta o número pertinente do acórdão recorrido, isto é, o n.o 207. De qualquer forma, a referida exigência é compatível com a jurisprudência e, por conseguinte, os argumentos da LBG segundo os quais, por um lado, o sistema MasterCard oferece importantes vantagens aos consumidores e aos comerciantes e, por outro, o Tribunal Geral aplicou um critério demasiado rigoroso à luz do artigo 81.o, n.o 3, CE não podem ser acolhidos.

214

Por último, a Comissão sustenta que não se trata de justificar o nível preciso das CIM, mas sim responder à questão de saber se as CIM implicam ganhos de eficácia objetivos.

– Apreciação do Tribunal de Justiça

215

Como resulta dos n.os 150 e 151 do presente acórdão, embora o artigo 169.o, n.o 2, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, no qual a Comissão se baseia, não possa ser aplicado retroativamente ao recurso subordinado da LGB, resulta das disposições em vigor à data da interposição desse recurso subordinado, nomeadamente dos artigos 256.° TFUE, 58.°, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça e 112.°, n.o 1, alínea c), do Regulamento de Processo deste, que um recurso deve indicar de modo preciso os elementos criticados do acórdão cuja anulação é pedida, bem como os argumentos jurídicos em que se baseia especificamente esse pedido.

216

Não respeita esta exigência o recurso que se limita a repetir ou a reproduzir textualmente os fundamentos e os argumentos que foram apresentados perante o Tribunal Geral, incluindo os que se baseavam em factos expressamente rejeitados por aquela jurisdição. Com efeito, caso esse recurso não contenha uma argumentação especificamente destinada a criticar o acórdão recorrido, constitui, na realidade, um pedido que visa obter um simples reexame da petição apresentada no Tribunal Geral, o que, nos termos do artigo 58.o do Estatuto do Tribunal de Justiça, escapa à competência deste (v. acórdão Deere/Comissão, C‑7/95 P, EU:C:1998:256, n.o 20 e jurisprudência referida).

217

Ora, embora a LBG alegue que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito na medida em que não considerou, como critério do ónus da prova para efeitos do artigo 81.o, n.o 3, CE, a ponderação das probabilidades, não se pode deixar de observar que, a este respeito, o recurso subordinado não indica e não permite identificar com precisão os números ou a parte do acórdão recorrido que critica.

218

Há também que salientar que, ao remeter para os argumentos apresentados nas suas alegações de intervenção apresentadas em primeira instância, a LBG reproduz os mesmos argumentos que já tinha invocado no Tribunal Geral e pretende, na realidade, que estes sejam reexaminados, sem sequer tentar apresentar argumentos jurídicos que demonstrem de modo específico que o Tribunal Geral, com a sua atuação, cometeu um erro de direito (v., neste sentido, acórdão Deere/Comissão, EU:C:1998:256, n.o 41).

219

Assim, a exceção de inadmissibilidade suscitada pela Comissão é procedente e a primeira parte do segundo fundamento do recurso subordinado da LBG é, consequentemente, inadmissível.

Quanto à segunda parte do segundo fundamento do recurso subordinado da LBG

– Argumentação das partes

220

Com a segunda parte do segundo fundamento do seu recurso subordinado, a LBG, apoiada pelas recorrentes, alega que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito, no n.o 233 do acórdão recorrido, ao centrar‑se apenas nas vantagens proporcionadas aos comerciantes, apesar de ter reconhecido, no n.o 228 do mesmo acórdão, que as vantagens podem ser tidas em conta em relação a qualquer mercado e serviço que beneficie da existência do acordo em causa e, no n.o 176 do referido acórdão, que existe um nexo entre os titulares de cartões e os comerciantes. A LBG considera, assim, que o Tribunal Geral errou ao ignorar, por um lado, as importantes vantagens que o sistema MasterCard e as CIM oferecem aos titulares de cartões e, por outro, o caráter biface do sistema e a otimização do sistema que as CIM contribuem para alcançar.

221

As recorrentes aderem ao raciocínio da LBG e acrescentam que a fundamentação do acórdão recorrido é circular, contraditória e insuficiente na medida em que confirma a não tomada em consideração, pela decisão controvertida, das vantagens das CIM para os titulares de cartões. Em especial, nos n.os 107, 110 e 118 desse acórdão, o Tribunal Geral terá reconhecido que os titulares de cartões suportariam custos mais elevados na hipótese de as CIM serem suprimidas ou reduzidas; nos n.os 178 e 233 do referido acórdão, que uma contrapartida financeira dos comerciantes é justificada para os serviços fornecidos pelos bancos de emissão a estes últimos; e, nos n.os 182 e 228 desse mesmo acórdão, que a função das CIM que implica uma redução dos custos para os titulares de cartões deve ser tida em conta no âmbito do artigo 81.o, n.o 3, CE. É, assim, impossível compreender como é que o Tribunal Geral concluiu em seguida que «a crítica das recorrentes relativa à insuficiente tomada em consideração das vantagens das CIM para os titulares de cartões é, em todo o caso, inoperante».

222

As recorrentes sustentam igualmente que o Tribunal Geral se contradisse, no n.o 233 do acórdão recorrido, ao reconhecer que uma contrapartida financeira se afigura justificada para os serviços que os bancos de emissão prestam aos comerciantes, apesar de não ser possível demonstrar com precisão em que medida, e ao sustentar que a MasterCard não «identific[ou] os serviços fornecidos pelos bancos de emissão de cartões de débito, de pagamento único ou de crédito suscetíveis de constituir benefícios objetivos para os comerciantes».

223

As recorrentes acrescentam que, mesmo admitindo que não conseguiram fornecer provas suficientes de que os comerciantes beneficiam de vantagens objetivas apreciáveis, proporcionadas pelas CIM, o Tribunal Geral não explica as razões por que, à luz da jurisprudência referida no n.o 228 do acórdão recorrido, os dois primeiros requisitos, previstos no artigo 81.o, n.o 3, CE, não poderiam ser preenchidos baseando‑se unicamente nas vantagens que as CIM proporcionam aos titulares de cartões, nem as razões por que todas as categorias de consumidores devem beneficiar da mesma parte do lucro.

224

Além dos fundamentos de inadmissibilidade mais gerais apresentados pela Comissão, como expostos no n.o 210 do presente acórdão, esta instituição alega que a segunda parte do segundo fundamento do recurso subordinado da LBG está insuficientemente alicerçada. A LBG contesta certas constatações factuais relativas à inexistência de ganhos de eficácia ou à parte equitativa do lucro para os utilizadores sem, com isso, alegar uma desvirtuação.

225

Quanto ao mérito, a Comissão considera que a existência de ganhos de eficácia em vários mercados não garante que uma parte equitativa do lucro reverta a favor dos utilizadores, em conformidade com o segundo requisito previsto no artigo 81.o, n.o 3, CE. A não atribuição de uma parte equitativa do lucro é uma constatação de facto não suscetível de recurso. Em todo o caso, a LBG não explica por que razão a conclusão do Tribunal Geral relativa à atribuição de uma parte equitativa do lucro aos consumidores é juridicamente errada. O caráter interdependente dos mercados no sistema biface não enfraquece, segundo a Comissão, a regra geral de que uma parte equitativa dos ganhos de eficácia deve pelo menos ser atribuída aos consumidores lesados pela restrição em causa.

226

Além disso, segundo a Comissão, o Tribunal Geral não ignorou as vantagens para os detentores de cartões, a maximização da produção do sistema e o caráter biface do sistema, mas, nos n.os 208 a 229 do acórdão recorrido, simplesmente rejeitou os argumentos a este respeito. As constatações de facto sobre esta questão não são suscetíveis de recurso e, de qualquer forma, não revelam nenhum erro de direito.

– Apreciação do Tribunal de Justiça

227

A exceção de inadmissibilidade suscitada pela Comissão, segundo a qual a segunda parte do segundo fundamento do recurso subordinado da LBG está insuficientemente alicerçada, não pode ser acolhida. Com efeito, basta salientar que a LBG identificou o número preciso do acórdão recorrido que contém o alegado erro de direito, ou seja, o n.o 233, e sustentou a sua argumentação invocando outros números precisos do referido acórdão, bem como os argumentos jurídicos em seu apoio. Daqui se conclui que a argumentação da LBG a este respeito responde às exigências das disposições e da jurisprudência citadas nos n.os 215 e 216 do presente acórdão.

228

Deve igualmente salientar‑se que, contrariamente ao que sustenta a Comissão, nesta segunda parte, a LBG não se limita a pôr em causa a apreciação dos factos efetuada em primeira instância, mas suscita, em substância, a questão de saber quais os mercados que se pode considerar que geram vantagens objetivas, suscetíveis de ser tidas em conta para efeitos da análise do primeiro requisito previsto no artigo 81.o, n.o 3, CE. Esta questão constitui uma questão de direito admissível na fase do recurso.

229

Quanto ao mérito, há que recordar que a LBG, apoiada pelas recorrentes, acusa, em substância, o Tribunal Geral de se ter centrado apenas nas vantagens que as CIM conferem aos comerciantes, ignorando, assim, as vantagens que o sistema MasterCard e as CIM conferem aos titulares de cartões, bem como o caráter biface do sistema e a otimização deste sistema que as CIM contribuem para alcançar.

230

Há que rejeitar desde já o argumento segundo o qual o Tribunal Geral ignorou erradamente as vantagens decorrentes do sistema MasterCard para os titulares de cartões. A este respeito, há que recordar que qualquer decisão de uma associação de empresas que se afigure contrária às disposições do artigo 81.o, n.o 1, CE, só pode ser objeto de uma isenção ao abrigo do n.o 3 deste artigo se preencher os requisitos previstos nessa disposição, incluindo o requisito de contribuir para melhorar a produção ou a distribuição dos produtos ou para promover o progresso técnico ou económico (v., neste sentido, acórdão Remia e o./Comissão, EU:C:1985:327, n.o 38). Por outro lado, como resulta dos n.os 89 e 90 do presente acórdão, quando não for possível dissociar uma decisão de uma associação de empresas da operação ou da atividade principal a que está associada sem comprometer a respetiva existência e objetivos, há que analisar a compatibilidade com o artigo 81.o CE desta decisão juntamente com a compatibilidade da operação ou da atividade principal de que é acessória.

231

Em contrapartida, verificando‑se que tal decisão não é objetivamente necessária à realização de uma operação ou de uma atividade determinada, apenas as vantagens objetivas decorrentes especificamente da referida decisão podem ser tidas em conta no âmbito do artigo 81.o, n.o 3, CE (v., por analogia, acórdão Remia e o./Comissão, EU:C:1985:327, n.o 47).

232

No caso vertente, como resulta dos n.os 78 a 121 do presente acórdão, o Tribunal Geral concluiu, sem cometer um erro de direito, no n.o 120 do acórdão recorrido, que as CIM não apresentavam um caráter objetivamente necessário ao funcionamento do sistema MasterCard. À luz desta conclusão, foi também corretamente que o Tribunal Geral concluiu, no n.o 207 do referido acórdão, que a análise do primeiro requisito imposto pelo artigo 81.o, n.o 3, CE exige um exame das vantagens objetivas sensíveis decorrentes especificamente das CIM e não do sistema MasterCard no seu conjunto. Daqui decorre que o argumento segundo o qual o Tribunal Geral errou ao ignorar as vantagens decorrentes do sistema MasterCard para os titulares de cartões não pode ser acolhida.

233

No que respeita ao argumento de que o Tribunal Geral ignorou a otimização do sistema MasterCard que as CIM contribuem para alcançar, importa recordar que, nos n.os 208 a 219 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral analisou a argumentação das recorrentes assente no papel das CIM na compensação entre as vertentes «emissão» e «aquisição» do sistema e concluiu pela rejeição do argumento segundo o qual as CIM contribuem para aumentar a produção do referido sistema. Daqui se conclui que o argumento da LBG, a este respeito, se baseia numa leitura errada do acórdão recorrido e é, portanto, improcedente.

234

Quanto aos argumentos segundo os quais o Tribunal Geral errou ao ignorar o caráter biface do sistema e as vantagens decorrentes das CIM para os titulares de cartões, antes de mais, é jurisprudência constante que a melhoria, na aceção do primeiro requisito previsto no artigo 81.o, n.o 3, CE, não pode ser identificada com quaisquer vantagens que os participantes tirem do acordo em causa para a respetiva atividade de produção ou de distribuição. Esta melhoria deve, designadamente, apresentar vantagens objetivas sensíveis, de modo a compensar os inconvenientes que o acordo comporta no plano da concorrência (v. acórdão Consten e Grundig/Comissão, 56/64 e 58/64, EU:C:1966:41, 502).

235

Em seguida, há que recordar que o exame de um acordo, para determinar se contribui para melhorar a produção ou a distribuição dos produtos ou para promover o progresso técnico ou económico e se permite obter vantagens objetivas sensíveis, deve fazer‑se à luz dos argumentos de facto e dos elementos de prova apresentados pelas empresas (v., neste sentido, relativamente a um pedido de isenção ao abrigo do artigo 81.o, n.o 3, CE, acórdão GlaxoSmithKlein Services e o./Comissão e o., C‑501/06 P, C‑513/06 P, C‑515/06 P et C‑519/06 P, EU:C:2009:610, n.o 102).

236

Para esse exame, pode ser necessário tomar em conta as características e as eventuais especificidades do setor em que o acordo em causa foi celebrado, se essas características e especificidades forem determinantes para o resultado do exame (v. acórdão GlaxoSmithKline Services e o./Comissão e o., EU:C:2009:610, n.o 103). Por outro lado, à luz do artigo 81.o, n.o 3, CE, é o caráter favorável da incidência no conjunto dos consumidores nos mercados relevantes que deve ser tomado em consideração (v., neste sentido, acórdão AsnefEquifax e Administración del Estado, EU:C:2006:734, n.o 70).

237

Donde se conclui que, perante um sistema de caráter biface como o sistema MasterCard, para apreciar se uma medida que, em princípio, infringe a proibição prevista no artigo 81.o, n.o 1, CE — ao criar efeitos restritivos em relação a um dos dois grupos de consumidores associado a esse sistema — pode preencher o primeiro requisito previsto no artigo 81.o, n.o 3, CE, há que ter em conta o sistema em que essa medida se inscreve, incluindo, se necessário, a totalidade das vantagens objetivas decorrentes da referida medida não apenas no mercado no qual a restrição tenha sido constatada mas também no mercado que compreende o outro grupo de consumidores associado ao referido sistema, em especial quando, como no caso em apreço, é pacífico que há interação entre as duas vertentes do sistema em causa. Para este efeito, há que apreciar, sendo caso disso, se essas vantagens são suscetíveis de compensar os inconvenientes que essa mesma medida comporta no plano da concorrência.

238

Todavia, no caso em apreço, o argumento da LGB de que o Tribunal Geral errou ao ignorar o caráter biface do sistema não pode ser acolhido. Como foi salientado no n.o 233 do presente acórdão, nos n.os 208 a 219 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral analisou a argumentação das recorrentes acerca do papel das CIM na compensação entre as vertentes «emissão» e «aquisição» do sistema MasterCard e, para esse efeito, reconheceu especificamente, no n.o 210 do referido acórdão, que havia interação entre essas duas vertentes. O facto de ter concluído pela rejeição do argumento segundo o qual as CIM contribuem para aumentar a produção do referido sistema em nada altera o facto de o Tribunal Geral, ao proceder à sua análise, ter tomado em consideração o caráter biface do sistema em causa.

239

Do mesmo modo, quando analisou as vantagens decorrentes das CIM de que beneficiariam os comerciantes, o Tribunal Geral teve igualmente em conta o caráter biface do sistema, designadamente nos n.os 222 e 223 do acórdão recorrido, onde reconheceu que o aumento do número de cartões em circulação pode aumentar a utilidade do sistema MasterCard para os comerciantes, embora, no âmbito da sua apreciação soberana dos factos, o Tribunal Geral tenha concluído que o risco de efeitos negativos para os comerciantes se afigura tanto mais elevado quanto maior for o número de cartões em circulação.

240

Em especial, no que respeita ao argumento em que a LBG alega que o Tribunal Geral não tomou em consideração as vantagens decorrentes das CIM para os titulares de cartões, não se pode deixar de observar que, à luz do que foi exposto nos n.os 234 a 237 do presente acórdão, o Tribunal Geral era obrigado, em princípio, ao apreciar o primeiro requisito previsto no artigo 81.o, n.o 3, CE, a ter em conta o conjunto dos benefícios objetivos decorrentes das CIM, não apenas no mercado relevante, ou seja, o mercado da aquisição, mas também no mercado distinto conexo da emissão.

241

Resulta do exposto que, na hipótese de o Tribunal Geral ter constatado a existência de vantagens objetivas sensíveis decorrentes das CIM para os comerciantes, embora estas não se afigurassem, em si mesmas, suficientes para compensar os efeitos restritivos constatados nos termos do artigo 81.o, n.o 1, CE, o conjunto das vantagens nos dois mercados de utilizadores no sistema MasterCard, incluindo, portanto, no dos titulares de cartões, poderia, eventualmente, ter justificado as CIM se, consideradas globalmente, tais vantagens fossem suscetíveis de compensar os efeitos restritivos dessas comissões.

242

No entanto, como foi recordado no n.o 234 do presente acórdão, o exame do primeiro requisito, previsto no artigo 81.o, n.o 3, CE, levanta a questão de saber se as vantagens proporcionadas pela medida em causa são suscetíveis de compensar os inconvenientes que dela decorrem. Assim, no caso de, como aqui acontece, terem sido apurados efeitos restritivos num só mercado de um sistema biface, as vantagens decorrentes da medida restritiva num mercado distinto conexo também associado ao referido sistema não podem, por si só, ser suscetíveis de compensar os inconvenientes resultantes desta medida na falta de provas da existência de vantagens objetivas sensíveis imputáveis à dita medida no mercado relevante, nomeadamente, como resulta dos n.os 21 e 168 a 180 do acórdão recorrido, quando os consumidores que se encontram nos referidos mercados não são substancialmente os mesmos.

243

Com efeito, no caso em apreço, e sem que tivesse sido suscitada uma desvirtuação a este respeito, o Tribunal Geral concluiu, no n.o 226 do acórdão recorrido, não haver provas da existência de vantagens objetivas decorrentes das CIM de que os comerciantes beneficiassem. Nestas circunstâncias, não havia que proceder a um exame das vantagens decorrentes das CIM para os titulares de cartões, uma vez que tais vantagens não são, por si sós, suscetíveis de compensar os inconvenientes resultantes dessas comissões. Foi portanto com razão que, no n.o 229 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral concluiu que «a crítica das recorrentes relativa à insuficiente tomada em consideração das vantagens das CIM para os titulares de cartões é, em todo o caso, inoperante».

244

A argumentação das recorrentes, exposta no n.o 221 do presente acórdão, segundo a qual a fundamentação do acórdão recorrido é circular, contraditória e insuficiente quanto a este aspeto, não pode ser acolhida.

245

Com efeito, mesmo que o Tribunal Geral tivesse reconhecido, na sua análise da necessidade objetiva das CIM, que existiam vantagens para os titulares de cartões, suscetíveis, em princípio, de ser tidas em conta nos termos do artigo 81.o, n.o 3, CE, não havia que proceder, como resulta dos n.os 240 a 243 do presente acórdão, a um exame dessas vantagens no caso em apreço. O raciocínio do Tribunal Geral sobre este aspeto, em particular no n.o 229 do acórdão recorrido, não é portanto contraditório.

246

Quanto ao argumento, que figura no n.o 222 do presente acórdão, segundo o qual o Tribunal Geral se contradisse no n.o 233 do acórdão recorrido, há que observar que este argumento assenta numa citação seletiva, resultando assim de uma leitura errada desse acórdão. Com efeito, através da expressão «contrapartida financeira», o Tribunal Geral referiu‑se não, como sugerem as recorrentes, a vantagens objetivas para os comerciantes mas às MSC. Por conseguinte, o Tribunal Geral não reconheceu que uma contrapartida financeira dos comerciantes pelos custos suportados pelos bancos de emissão para o fornecimento dos serviços fosse justificada, limitando‑se a declarar que as recorrentes deviam identificar as vantagens que poderiam ser consideradas justificativas das MSC.

247

No que respeita ao argumento das recorrentes segundo o qual o Tribunal Geral não explica por que razão os dois primeiros requisitos, previstos no artigo 81.o, n.o 3, CE, não poderiam estar preenchidos baseando‑se unicamente nas vantagens que as CIM proporcionam aos titulares de cartões, basta remeter para os n.os 240 a 245 do presente acórdão.

248

Finalmente, na medida em que as recorrentes acusam o Tribunal Geral de não ter explicado a razão pela qual todas as categorias de consumidores devem beneficiar da mesma parte do lucro resultante das CIM, basta observar que essa crítica assenta numa leitura errada do acórdão recorrido. Com efeito, o Tribunal Geral de modo nenhum afirmou que cada um dos grupos de utilizadores deveria beneficiar da mesma parte desse benefício, tendo‑se limitado a indicar que os comerciantes, visto constituírem um dos dois grupos de utilizadores visados pelos cartões de pagamento, deviam igualmente beneficiar de vantagens objetivas sensíveis, imputáveis às CIM. Assim, ao utilizar o termo «igualmente», no n.o 228 do referido acórdão, o Tribunal Geral teve razão ao indicar que os comerciantes deviam beneficiar das CIM «bem como» os titulares de cartões, e não «na mesma medida» que estes últimos.

249

Assim, há que concluir pela improcedência da argumentação das recorrentes segundo a qual o Tribunal Geral não fundamentou suficientemente a não tomada em consideração das vantagens decorrentes das CIM para os titulares de cartões.

250

Atendendo ao que precede, a segunda parte do segundo fundamento do recurso subordinado da LBG deve ser afastada.

Quanto à terceira parte do segundo fundamento do recurso subordinado da LBG

– Argumentação das partes

251

Com a terceira parte do segundo fundamento do seu recurso subordinado, a LBG sustenta que o Tribunal Geral deixou entender, no n.o 233 do acórdão recorrido, que os únicos elementos que podem ser tidos em consideração para verificar se as CIM são fixadas num nível adequado são a compensação, pelos comerciantes, dos encargos suportados pelos bancos de emissão pelos serviços prestados aos comerciantes e os outros rendimentos auferidos pelos bancos de emissão. A LBG critica à Comissão a sua abordagem restritiva no caso em apreço, abordagem que essa instituição parece também ter adotado no processo Visa CIM [processo COMP/39.398 — Visa MIF, C (2010) 8760]. Remetendo para as observações escritas que apresentou ao Tribunal Geral para efeitos do artigo 81.o, n.o 3, CE, a LBG sustenta que a Comissão deveria ter seguido a abordagem que adotou noutros domínios comparáveis, em que aceitou justificações bem mais amplas nos termos do artigo 81.o, n.o 3, CE.

252

A LBG sustenta que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito ao aprovar um critério demasiado rigoroso para efeitos do artigo 81.o, n.o 3, CE, que não toma em consideração as vantagens significativas decorrentes do sistema MasterCard e das CIM para os titulares de cartões e os comerciantes. Além disso, a metodologia do Tribunal Geral não poderia funcionar na prática, pois exigiria provas precisas para justificar níveis de CIM específicos, provas essas que não são suscetíveis de ser apresentadas. Nem a Comissão nem o Tribunal Geral forneceram explicações sobre a metodologia precisa que a MasterCard deveria seguir para fixar as CIM num nível justificável. Esta incerteza é motivo de importantes preocupações para os operadores e é suscetível de prejudicar os consumidores, bloqueando a inovação no mercado.

253

Além das exceções de inadmissibilidade mais gerais apresentadas pela Comissão, como expostas no n.o 210 do presente acórdão, a Comissão considera que os argumentos invocados em apoio da terceira parte do segundo fundamento do recurso subordinado da LBG, quanto à pretensa falta de orientações dadas pelo Tribunal Geral, são inoperantes.

254

Quanto ao mérito, a Comissão considera que o argumento da LBG relativo à pretensa falta de orientações sobre o nível justificável das CIM implica uma inversão do ónus da prova e não suscita nenhum erro de direito. Considera que a LBG se contradiz quando remete para o n.o 233 do acórdão recorrido, relativo às provas que as recorrentes poderiam ter fornecido para satisfazer o primeiro requisito previsto no artigo 81.o, n.o 3, CE. Por último, a referência ao processo Visa CIM, mencionado no n.o 251 do presente acórdão, não é pertinente no âmbito do presente recurso.

– Apreciação do Tribunal de Justiça

255

Em primeiro lugar, quanto ao argumento da LGB segundo o qual a Comissão adotou uma abordagem demasiado restritiva no caso em apreço, à semelhança do que fez no processo Visa CIM mencionado no n.o 251 do presente acórdão, basta constatar que este argumento não indica minimamente os elementos criticados do acórdão recorrido e, consequentemente, é inadmissível.

256

Em seguida, o argumento através do qual a LBG acusa o Tribunal Geral de ter cometido um erro de direito ao aprovar um critério demasiado rigoroso que não toma em conta as vantagens significativas decorrentes do sistema MasterCard e das CIM para os titulares de cartões e os comerciantes é, em substância, idêntico aos que já foram examinados no âmbito da segunda parte do segundo fundamento do recurso subordinado da LBG. O referido argumento deve, assim, ser rejeitado pelas razões já expostas nos n.os 227 a 250 do presente acórdão.

257

Por último, quanto aos argumentos segundo os quais a metodologia seguida pelo Tribunal Geral não poderia funcionar na prática, pois exige provas precisas para justificar níveis de CIM específicos que não são suscetíveis de ser produzidos, e ao facto de nem a Comissão nem o Tribunal Geral terem fornecido explicações sobre a metodologia precisa que a MasterCard deveria adotar para fixar as CIM num nível justificável, há que reconhecer que estes argumentos não visam acusar o Tribunal Geral de ter cometido um erro de direito, pelo que são inadmissíveis.

258

A terceira parte do segundo fundamento do recurso subordinado da LBG deve, portanto, ser afastada. Assim, há que rejeitar o segundo fundamento do recurso subordinado da LBG na totalidade.

259

Resulta de todas as considerações precedentes que deve ser negado provimento ao recurso principal bem como aos dois recursos subordinados interpostos pela RBS e pela LBG.

Quanto às despesas

260

Por força do disposto no artigo 184.o, n.o 2, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, se o recurso for julgado improcedente, o Tribunal de Justiça decide sobre as despesas.

261

Nos termos do disposto no artigo 138.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, aplicável, mutatis mutandis, aos processos de recursos de decisões do Tribunal Geral por força do artigo 184.o, n.o 1, do mesmo regulamento, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido.

262

Tendo as recorrentes sido vencidas nos seus fundamentos de recurso e tendo a Comissão pedido a condenação das recorrentes, há que ordenar que estas suportarão, além das suas próprias despesas, as despesas efetuadas pela Comissão no âmbito do recurso principal.

263

No que respeita aos recursos subordinados, tendo a RBS e a LBG sido vencidas e tendo a Comissão pedido a sua condenação, há que as condenar a suportar, além das suas próprias despesas, as despesas efetuadas pela Comissão no âmbito dos seus recursos subordinados respetivos.

264

Por outro lado, resulta de uma leitura conjugada dos artigos 140.°, n.o 3, e 184.°, n.o 1, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça que, no presente caso, há que ordenar que as recorrentes suportarão as suas próprias despesas relativas aos dois recursos subordinados e que a RBS e a LBG suportarão as suas próprias despesas relativas ao recurso subordinado interposto pela outra parte.

265

Em conformidade com o artigo 184.o, n.o 4, deste regulamento, a HSBC, a MBNA, o BRC e a EuroCommerce suportarão as suas próprias despesas relativas ao recurso principal e aos recursos subordinados. Não tendo participado nos processos perante o Tribunal de Justiça, a Banco Santander SA não pode ser condenada nas despesas daqueles.

266

Nos termos do artigo 140.o, n.o 1, do referido regulamento, aplicável, mutatis mutandis, aos processos de recursos de decisões do Tribunal Geral por força do artigo 184.o, n.o 1, do mesmo regulamento, os Estados‑Membros que intervenham no processo devem suportar as respetivas despesas. Em conformidade com estas disposições, o Reino Unido suportará as suas próprias despesas.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Terceira Secção) decide:

 

1)

É negado provimento ao recurso principal e aos recursos subordinados.

 

2)

A MasterCard Inc., a MasterCard International Inc. e a MasterCard Europe SPRL são condenadas a suportar, além das suas próprias despesas relativas ao recurso principal e aos recursos subordinados, as despesas da Comissão Europeia relativas ao recurso principal.

 

3)

A Royal Bank of Scotland plc, a Bank of Scotland plc e a Lloyds TSB Bank plc são condenadas a suportar, além das suas próprias despesas, as despesas da Comissão Europeia relativas aos respetivos recursos subordinados.

 

4)

A HSBC Bank plc, a MBNA Europe Bank Ltd, o British Retail Consortium, a EuroCommerce AISBL e o Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte suportam as suas próprias despesas.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: inglês.

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