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Documento 62013CJ0192

Acórdão do Tribunal de Justiça (Primeira Secção) de 4 de setembro de 2014.
Reino de Espanha contra Comissão Europeia.
Recurso de decisão do Tribunal Geral – Fundo de Coesão – Redução da contribuição financeira – Adoção da decisão pela Comissão Europeia – Existência de um prazo – Incumprimento do prazo estabelecido – Consequências.
Processo C‑192/13 P.

Coletânea da Jurisprudência — Coletânea Geral

Identificador Europeu da Jurisprudência (ECLI): ECLI:EU:C:2014:2156

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção)

4 de setembro de 2014 ( *1 )

«Recurso de decisão do Tribunal Geral — Fundo de Coesão — Redução da contribuição financeira — Adoção da decisão pela Comissão Europeia — Existência de um prazo — Incumprimento do prazo estabelecido — Consequências»

No processo C‑192/13 P,

que tem por objeto um recurso de uma decisão do Tribunal Geral nos termos do artigo 56.o do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, interposto em 15 de abril de 2013,

Reino de Espanha, representado por A. Rubio González, na qualidade de agente,

recorrente,

sendo a outra parte no processo:

Comissão Europeia, representada por S. Pardo Quintillán e D. Recchia, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

recorrida em primeira instância,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção),

composto por: A. Tizzano, presidente de secção, A. Borg Barthet, E. Levits, S. Rodin e F. Biltgen (relator), juízes,

advogado‑geral: M. Wathelet,

secretário: M. Ferreira, administradora principal,

vistos os autos e após a audiência de 13 de março de 2014,

vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1

Com o presente recurso, o Reino de Espanha pede a anulação do acórdão do Tribunal Geral da União Europeia Espanha/Comissão (T‑235/11, EU:T:2013:49, a seguir «acórdão recorrido»), pelo qual este negou provimento ao seu recurso que tinha por objeto, a título principal, a anulação da Decisão C (2011) 1023 final da Comissão, de 18 de fevereiro de 2011, que reduz a contribuição financeira do Fundo de Coesão às fases de projeto designadas «Fornecimento e montagem de material ferroviário na Linha de Alta Velocidade Madrid‑Saragoça‑Barcelona‑Fronteira francesa. Lanço Madrid‑Lérida» (CCI 1999.ES.16.C.PT.001), «Linha ferroviária de Alta Velocidade Madrid‑Barcelona. Lanço Lérida‑Martorell (Plataforma, 1.a fase)» (CCI 2000.ES.16.C.PT.001), «Linha de Alta Velocidade Madrid‑Saragoça‑Barcelona‑Fronteira francesa. Acessos ferroviários à nova estação de comboios de Saragoça» (CCI 2000.ES.16.C.PT.003), «Linha de Alta Velocidade Madrid‑Barcelona‑Fronteira francesa. Lanço Lérida‑Martorell. Sublanço X‑A (Olérdola‑Avinyonet del Penedés)» (CCI 2001.ES.16.C.PT.007), «Novo acesso ferroviário de Alta Velocidade em Levante. Sublanço La Gineta‑Albacete (Plataforma)» (CCI 2004.ES.16.C.PT.014) (a seguir «decisão controvertida»), e, a título subsidiário, a anulação da mesma decisão na parte em que se refere às correções aplicadas pela Comissão Europeia.

Quadro jurídico

2

No acórdão recorrido, o Tribunal Geral descreveu o quadro jurídico da forma que se segue.

3

Nos termos do artigo 2.o, n.o 1, do Regulamento (CE) n.o 1164/94 do Conselho, de 16 de maio de 1994, que institui o Fundo de Coesão (JO L 130, p. 1), conforme alterado pelo Regulamento (CE) n.o 1264/1999 do Conselho, de 21 de junho de 1999 (JO L 161, p. 57), e pelo Regulamento (CE) n.o 1265/1999 do Conselho, de 21 de junho de 1999 (JO L 161, p. 62, a seguir «Regulamento n.o 1164/94 alterado»):

«O fundo apoia financeiramente projetos que contribuam para a realização dos objetivos fixados no Tratado da União Europeia, nos domínios do ambiente e das redes transeuropeias de infraestruturas de transportes, nos Estados‑Membros com um PNB per capita inferior a 90% da média comunitária, medido com base nas paridades do poder de compra, que tenham definido um programa que lhes permita preencher os requisitos de convergência económica estabelecidos no artigo [126.° TFUE].»

4

O artigo 8.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1164/94 alterado prevê:

«Os projetos financiados pelo fundo deverão respeitar as disposições dos Tratados e demais atos adotados para sua execução e as políticas comunitárias, incluindo as relativas à proteção do ambiente, aos transportes, às redes transeuropeias, à concorrência e à adjudicação de contratos públicos.»

5

O Anexo II do Regulamento n.o 1164/94 alterado, relativo às «Disposições de execução», inclui um artigo H, intitulado «Correções financeiras», que dispõe:

«1.

Se, após ter procedido às verificações necessárias, a Comissão conclui que:

a)

A execução de um projeto não justifica uma parte ou a totalidade da contribuição que lhe é concedida, nomeadamente no caso de incumprimento de uma das condições indicadas na decisão de concessão da contribuição, em especial de uma alteração importante que afete a natureza ou as condições de execução do projeto e para a qual não tenha sido solicitada a sua aprovação; ou

b)

Existe uma irregularidade quanto à contribuição do Fundo e o Estado‑Membro em causa não tomou as medidas corretivas necessárias,

suspenderá a contribuição referente ao projeto em causa e, mediante pedido fundamentado, solicitará ao Estado‑Membro que apresente as suas observações num prazo determinado.

Se o Estado‑Membro contestar as observações da Comissão, esta convidá‑lo‑á para uma reunião na qual ambas as partes envidarão esforços para chegar a acordo relativamente às referidas observações e às conclusões a extrair delas.

2.

No termo do prazo fixado pela Comissão e se não se tiver chegado a acordo dentro de três meses, esta decidirá, segundo o procedimento devido e tendo em conta as eventuais observações do Estado‑Membro:

[…]

b)

Efetuar as correções financeiras necessárias, suprimindo total ou parcialmente a contribuição concedida ao projeto.

Estas decisões respeitarão o princípio da proporcionalidade. Ao fixar o montante de uma correção, a Comissão atenderá à natureza da irregularidade ou da alteração, bem como à importância do potencial impacto financeiro das eventuais deficiências dos sistemas de gestão ou de controlo. Qualquer redução ou anulação da contribuição dará origem à devolução dos montantes pagos.

[…]

4.

A Comissão adotará as normas de execução dos n.os 1 a 3 e comunicá‑las‑á, para informação, aos Estados‑Membros e ao Parlamento Europeu.»

6

O artigo 18.o do Regulamento (CE) n.o 1386/2002 da Comissão, de 29 de julho de 2002, que estabelece as regras de execução do Regulamento (CE) n.o 1164/94 do Conselho no que respeita aos sistemas de gestão e de controlo e ao procedimento para a realização das correções financeiras aplicáveis às intervenções no quadro do Fundo de Coesão (JO L 201, p. 5), tem a seguinte redação:

«1.   O período em que o Estado‑Membro em causa pode responder a um pedido a título do n.o 1, primeiro parágrafo, do artigo H do [A]nexo II do Regulamento (CE) n.o 1164/94 para apresentar as suas observações é fixado em dois meses, salvo em casos devidamente justificados, em que a Comissão pode autorizar um período maior.

2.   Sempre que a Comissão proponha correções financeiras com base numa extrapolação ou numa base forfetária, o Estado‑Membro terá a possibilidade de demonstrar, através do exame dos processos em causa, que a dimensão real da irregularidade é inferior ao resultante da avaliação da Comissão. Com o acordo da Comissão, o Estado‑Membro pode limitar o alcance desse exame a uma parte ou a uma amostra adequada dos processos em causa.

Com exceção de casos devidamente justificados, o período suplementar concedido para esse exame não excederá dois meses após o período de dois meses referido no n.o 1. Os resultados de tal exame serão avaliados de acordo com o procedimento previsto no n.o 1, segundo parágrafo, do artigo H do [A]nexo II do Regulamento (CE) n.o 1164/94. A Comissão terá em conta quaisquer provas apresentadas pelo Estado‑Membro durante os períodos atrás mencionados.

3.   No caso de o Estado‑Membro contestar as observações da Comissão e de ter lugar uma reunião prevista no n.o 1, segundo parágrafo, do artigo H do [A]nexo II do Regulamento (CE) n.o 1164/94, o período de três meses durante o qual a Comissão pode tomar uma decisão, nos termos do n.o 2 do artigo H do [A]nexo II do mesmo regulamento, começará a contar a partir da data da referida reunião.»

Antecedentes do litígio e decisão controvertida

7

Os antecedentes do litígio foram expostos nos n.os 13 a 23 do acórdão recorrido e podem ser resumidos da seguinte forma.

8

Com a Decisão C (2000) 2113, de 13 de setembro de 2000, conforme alterada, a Comissão aprovou a concessão de uma contribuição financeira do Fundo de Coesão a algumas fases de projeto relativas à linha ferroviária de alta velocidade Madrid‑Barcelona (Espanha).

9

Por cartas de 23 de outubro de 2009 e 30 de março de 2010, bem como por três cartas de 21 de abril de 2010, respetivamente, a Comissão enviou ao Reino de Espanha uma proposta de cancelamento para cada uma dessas fases de projeto. Cada uma dessas propostas incluía correções financeiras em razão de irregularidades na aplicação da legislação sobre contratos públicos.

10

Como as autoridades espanholas expressaram o seu desacordo com as propostas de cancelamento da Comissão, por quatro cartas de 13 de maio de 2010, realizou‑se uma reunião em 23 de junho de 2010. Nesta reunião, foram entregues à Comissão um «memorando das autoridades administrativas relativo à proposta de correção financeira» e uma «lista de documentos enviada em resposta à proposta de correção financeira da Comissão Europeia relativa à proposta de cancelamento de projetos do Fundo de Coesão».

11

O Reino de Espanha enviou à Comissão informações complementares, por carta de 23 de julho de 2010.

12

Em 18 de fevereiro de 2011, a Comissão adotou a decisão controvertida.

13

Nessa decisão, de que o Reino de Espanha foi notificado em 21 de fevereiro de 2011, a Comissão constatou diversas irregularidades na aplicação da regulamentação da União relativa aos contratos públicos que afetavam as fases de projeto em causa e, consequentemente, reduziu a contribuição total concedida para as referidas fases em 31328947,63 euros.

Recurso no Tribunal Geral e acórdão recorrido

14

Por petição entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 29 de abril de 2011, o Reino de Espanha interpôs um recurso destinado, a título principal, à anulação da decisão controvertida e, a título subsidiário, à anulação da mesma decisão na parte em que se refere às correções aplicadas pela Comissão.

15

Em apoio desse recurso, o Reino de Espanha invocou, a título principal, dois fundamentos relativos, respetivamente, ao incumprimento, pela Comissão, do prazo previsto no artigo H, n.o 2, do Anexo II do Regulamento n.o 1164/94 alterado e à aplicação errada do artigo 20.o, n.o 2, da Diretiva 93/38/CEE do Conselho, de 14 de junho de 1993, relativa à coordenação dos processos de celebração de contratos nos setores da água, da energia, dos transportes e das telecomunicações (JO L 199, p. 84), e, a título subsidiário, um fundamento relativo a um erro de direito na aplicação do artigo 20.o, n.o 2, alínea f), desta diretiva.

16

Com o acórdão recorrido, o Tribunal Geral negou provimento ao recurso.

17

Relativamente ao primeiro fundamento, pelo qual o Reino de Espanha sustentou, em substância, que o cumprimento do prazo de três meses, previsto tanto no artigo H, n.o 2, do Anexo II do Regulamento n.o 1164/94 alterado como no artigo 18.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1386/2002, implica que a decisão de correção financeira devia ter sido adotada no prazo de três meses a contar da data da reunião ou, pelo menos, da data em que a Comissão recebeu as informações complementares do Governo espanhol, pelo que a decisão controvertida é intempestiva e, portanto, ilegal, o Tribunal Geral declarou, no n.o 32 do acórdão recorrido, que resulta do seu acórdão Grécia/Comissão (T‑404/05, EU:T:2008:510, n.o 44), o qual foi confirmado pelo despacho do Tribunal de Justiça Grécia/Comissão (C‑43/09 P, EU:C:2010:36), que o artigo H, n.o 2, do Anexo II do Regulamento n.o 1164/94 alterado não prevê nenhum prazo no qual a Comissão deve adotar a sua decisão. Tal interpretação resulta, aliás, explicitamente da redação desta disposição. O prazo de três meses a que faz referência respeita à obtenção de um acordo entre a Comissão e o Estado‑Membro em causa.

18

O Tribunal Geral prosseguiu, indicando, no n.o 33 do acórdão recorrido, que, embora seja verdade que a versão francesa da referida disposição enuncia que «[à] l’expiration d’un délai fixé par la Commission, dans le respect de la procédure applicable, en l’absence d’accord et compte tenu des observations éventuelles de l’État membre, la Commission décide, dans un délai de trois mois», todas as versões linguísticas desta disposição diversas da versão em língua francesa estão redigidas diferentemente, uma vez que a expressão «dentro de três meses» se refere à falta de acordo entre as partes. Ora, como resulta designadamente do acórdão Bacardi (C‑253/99, EU:C:2001:490, n.o 41 e jurisprudência aí referida), a necessidade de uma interpretação uniforme dos regulamentos da União exclui que um determinado texto seja considerado isoladamente, mas exige, em caso de dúvida, que seja interpretado e aplicado à luz das versões redigidas nas outras línguas oficiais.

19

Nestas condições, o prazo de três meses fixado no artigo H, n.o 2, do Anexo II do Regulamento n.o 1164/94 alterado permite ao Estado‑Membro em causa apresentar à Comissão, na sequência da reunião, informações complementares e à Comissão ter em conta tais informações, e esta «só decidirá se não tiver chegado a acordo com o Estado‑Membro dentro de três meses e tendo em conta as eventuais observações do Estado‑Membro» (n.o 34 do acórdão recorrido).

20

Quanto à tese apresentada pelo Reino de Espanha na audiência, em resposta a uma questão do Tribunal Geral, e exposta no n.o 35 do acórdão recorrido, segundo a qual coexistem dois prazos concomitantes que começam a contar a partir da data da reunião, a saber, um fixado no artigo H, n.o 2, do Anexo II do Regulamento n.o 1164/94 alterado, que respeita à obtenção de um acordo com o Estado‑Membro em causa, e outro, previsto no artigo 18.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1386/2002, que respeita à adoção, pela Comissão, de uma decisão com vista a proceder às correções necessárias, o Tribunal Geral considerou que a mesma não pode ser aceite.

21

Com efeito, declarou no n.o 36 desse acórdão que «o artigo 18.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1386/2002 se limita[va] a fixar a data a partir da qual começa[va] a contar o prazo para a tomada de decisão nos termos do artigo H, n.o 2, do Anexo II do Regulamento n.o 1164/94 [alterado]», mas, como resulta do n.o 32 do mesmo acórdão, a referida disposição não prevê «nenhum prazo no qual a Comissão deva adotar a sua decisão».

22

Assim, o Tribunal Geral considerou, no n.o 37 do acórdão recorrido, que, atendendo a que um regulamento de aplicação, como o Regulamento n.o 1386/2002, deve ser objeto, se possível, de uma interpretação conforme com as disposições do regulamento de base, não se pode aceitar uma interpretação do artigo 18.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1386/2002 que implica que a Comissão só dispõe de um prazo de três meses para adotar a decisão controvertida.

23

Por outro lado, acrescentou, no n.o 38 desse acórdão, que a interpretação dessas duas disposições preconizada «pelo Reino de Espanha privaria o artigo H, n.o 2, do Anexo II do Regulamento n.o 1164/94 [alterado] do seu efeito útil, uma vez que resultaria dessa interpretação que a Comissão, na hipótese da existência de dois prazos distintos mas concomitantes, seria obrigada a adotar uma decisão ao abrigo dessa disposição no prazo de três meses no decurso do qual tentaria chegar a acordo com o Estado‑Membro em causa».

24

O Tribunal Geral concluiu daqui, nos n.os 39 a 41 do acórdão recorrido, que, «uma vez que o artigo 18.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1386/2002 se limita a fixar a data a partir da qual começa a contar o prazo para a adoção de uma decisão nos termos do artigo H, n.o 2, do Anexo II do Regulamento n.o 1164/94 [alterado]», a circunstância de as versões nas línguas espanhola, dinamarquesa, alemã e neerlandesa do artigo 18.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1386/2002 se referirem ao prazo de três meses durante o qual a Comissão «deve adotar» ou «adota» uma decisão, enquanto a versão em língua eslovena do mesmo artigo se refere, mais genericamente, à «decisão nos termos do artigo H, n.o 2, do Anexo II desse regulamento» e as outras versões linguísticas desta disposição referem o prazo de três meses durante o qual a Comissão «pode» tomar uma decisão ao abrigo do artigo H, n.o 2, do Anexo II do referido regulamento» é desprovida de pertinência neste caso, pelo que o primeiro fundamento deve ser rejeitado.

25

O Tribunal Geral também rejeitou, respetivamente, nos n.os 44 a 72 e 76 a 108 do acórdão recorrido, os segundo e terceiro fundamentos invocados pelo Reino de Espanha.

Pedidos das partes no Tribunal de Justiça

26

No presente recurso, o Reino de Espanha pede ao Tribunal de Justiça que se digne:

anular o acórdão recorrido;

decidir definitivamente o litígio, anulando a decisão controvertida, e

condenar a Comissão nas despesas.

27

A Comissão pede ao Tribunal de Justiça que se digne:

negar provimento ao recurso na íntegra e

condenar o Reino de Espanha nas despesas.

Quanto ao presente recurso

28

Em apoio do seu recurso, o Reino de Espanha invoca dois fundamentos relativos a erros de direito cometidos pelo Tribunal Geral no que respeita, em primeiro lugar, ao incumprimento do prazo previsto no artigo H, n.o 2, do Anexo II do Regulamento n.o 1164/94 alterado para a adoção da decisão controvertida e, em segundo lugar, ao conceito de «adjudicação», na aceção da Diretiva 93/38.

Quanto ao primeiro fundamento

Argumentos das partes

29

O Reino de Espanha alega que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito ao considerar que o artigo H, n.o 2, do Anexo II do Regulamento n.o 1164/94 alterado não impõe um prazo à Comissão para a adoção da decisão controvertida.

30

Segundo este Estado‑Membro, a referida disposição deve, pelo contrário, ser entendida no sentido que impõe à Comissão, na falta de acordo com o Estado‑Membro em causa durante a reunião prevista no artigo H, n.o 1, do mesmo anexo, a tomada de uma decisão, no prazo de três meses, de reduzir o pagamento por conta ou efetuar correções financeiras.

31

Com efeito, o Reino de Espanha entende que só a interpretação que sustenta pode conferir um sentido e um efeito útil às disposições pertinentes.

32

Assim, o artigo H do Anexo II do Regulamento n.o 1164/94 alterado estabelece, no seu n.o 2, um prazo de três meses que começa a contar «no termo do prazo fixado pela Comissão», o qual só pode ser o prazo que figura no n.o 1, primeiro parágrafo, última parte da frase, do mesmo artigo, que dispõe que a Comissão «solicitará ao Estado‑Membro que apresente as suas observações num prazo determinado». Este prazo termina antes da reunião prevista no n.o 1 do referido artigo H e tem por objetivo permitir que a Comissão e o Estado‑Membro em causa cheguem a um acordo. Em contrapartida, o artigo 18.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1386/2002 refere‑se a outro prazo de três meses, ao remeter expressamente para o artigo H, n.o 2, do Anexo II do Regulamento n.o 1164/94 alterado, o qual começa a contar a partir da data da reunião prevista no Regulamento n.o 1164/94 alterado. Estas últimas disposições conjugadas têm por objetivo fixar o prazo no termo do qual a Comissão, no caso de as partes não chegarem a nenhum acordo, é obrigada a adotar uma decisão de correção financeira. Se o referido artigo 18.o, n.o 3, devesse ser interpretado no sentido de que se limita a fixar o ponto de partida do prazo de três meses destinado a permitir que as partes cheguem a acordo, o mesmo seria desprovido de efeito útil, uma vez que o artigo H do Anexo II do Regulamento n.o 1164/94 alterado estabelece claramente o momento em que termina o referido prazo.

33

Em consequência, se, no termo do prazo de três meses a contar da data da reunião, a Comissão não tiver adotado a decisão de correção financeira, esta instituição é obrigada a proceder ao pagamento e qualquer correção financeira efetuada, como no caso dos autos, depois de expirado o referido prazo é ilegal, uma vez que a Comissão já não dispõe do fundamento jurídico necessário para aplicar tal medida. Com efeito, não se pode considerar que a Comissão tem a possibilidade de determinar arbitrariamente o momento em que adota uma decisão de grande importância para o planeamento financeiro das autoridades nacionais em causa.

34

Acresce que tal interpretação permite aos Estados‑Membros, em conformidade com o princípio da segurança jurídica, saber, num prazo suficientemente breve e determinável antecipadamente, se as despesas incorridas são financiadas pelo Fundo de Coesão. A referida interpretação é aliás corroborada pelo facto de a Comunicação (2011) C 332/01 da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho e ao Tribunal de Contas, relativa às contas anuais da União Europeia — Exercício de 2010 (JO 2011, C 332, p. 1), referir, na página 63, a respeito da Política de Coesão, que «a Comissão dispõe de três meses a partir da data de uma audição formal com o Estado‑Membro (seis meses para os programas 2007‑2013) para adotar uma decisão formal de correção financeira, emitindo uma ordem de cobrança para obter o reembolso do Estado‑Membro».

35

Além disso, ao suportar o seu raciocínio, no n.o 32 do acórdão recorrido, por referência ao seu acórdão Grécia/Comissão (EU:T:2008:510) e ao despacho do Tribunal de Justiça Grécia/Comissão (EU:C:2010:36), o Tribunal Geral fez uma leitura incorreta dessas decisões, na medida em que, por um lado, como o Tribunal de Justiça salientou expressamente nesse despacho, o artigo 18.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1386/2002 não era aplicável ao projeto em causa no processo que deu origem a essas duas decisões e, por outro, o Tribunal de Justiça não se pronunciou sobre o mérito da questão jurídica atualmente suscitada pelo Reino de Espanha.

36

A Comissão contrapõe que, em primeiro lugar, o Reino de Espanha não explicou, no seu recurso, de que modo o Tribunal Geral cometeu um erro de direito ao invocar, no acórdão recorrido, o seu acórdão Grécia/Comissão (EU:T:2008:510) e o despacho do Tribunal de Justiça Grécia/Comissão (EU:C:2010:36). Entende que esta parte do fundamento só pode ser considerada um enunciado abstrato que não contém uma exposição de argumentos jurídicos congruentes que critiquem especificamente a apreciação feita a este respeito pelo Tribunal Geral e que, portanto, é inadmissível.

37

Em todo o caso, a referida parte é desprovida de fundamento, porquanto o Tribunal Geral não cometeu nenhum erro de direito ao basear o seu raciocínio na interpretação do Regulamento n.o 1164/94 alterado por ele feita nesse acórdão e que foi confirmada, de forma implícita, é verdade, mas necessária, pelo Tribunal de Justiça no despacho Grécia/Comissão (EU:C:2010:36), interpretação essa no sentido de que o artigo H, n.o 2, do Anexo II do referido regulamento não impõe à Comissão nenhum prazo para adotar a sua decisão de correção financeira.

38

Em segundo lugar, a Comissão considera que o Reino de Espanha se limita, em substância, a reiterar perante o Tribunal de Justiça a tese que já tinha defendido em primeira instância.

39

Em especial, segundo a Comissão, o presente recurso é inadmissível na medida em que, ao alegar que o período de três meses é um prazo no termo do qual a Comissão já não pode aplicar correções financeiras dado que expirou, o Reino de Espanha não explicou de que forma esta alegação está relacionada com o acórdão recorrido nem qual a violação cometida pelo Tribunal Geral a este respeito, pelo que a referida alegação constitui um simples pedido de reexame da petição apresentada em primeira instância.

40

Além disso, esta parte do fundamento é, em todo o caso, infundada. Antes de mais, mesmo admitindo que o Regulamento n.o 1164/94 alterado estabelece um prazo de três meses, a ultrapassagem desse prazo não pode acarretar a impossibilidade de ação por parte da Comissão. Com efeito, atendendo a que o referido regulamento visa assegurar que as despesas nacionais foram efetuadas pelos Estados‑Membros segundo as regras do direito da União, tal prazo só pode ser considerado indicativo, salvo prejuízo dos interesses de um Estado‑Membro, circunstância da qual o Reino de Espanha não fez prova neste caso. Em seguida, tendo em conta o facto de que, no caso em apreço, o Reino de Espanha, depois da reunião de 23 de junho de 2010, transmitiu à Comissão informações complementares em 23 de julho de 2010, o prazo de 6 meses e 16 dias entre esta última data e a data em que decisão controvertida foi adotada deve ser considerado absolutamente razoável. Por último, a interpretação defendida pelo Reino de Espanha é não só desprovida de fundamento, mas também ilógica e contraditória. Com efeito, foi acertadamente que o Tribunal Geral declarou que o prazo de três meses fixado no artigo H, n.o 2, do Anexo II do Regulamento n.o 1164/94 alterado só diz respeito à obtenção de um eventual acordo entre a Comissão e o Estado‑Membro em causa e que o artigo 18.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1386/2002 não pode ser interpretado no sentido de que impõe à Comissão um prazo de três meses para tomar uma decisão de correção financeira.

Apreciação do Tribunal de Justiça

– Quanto à admissibilidade

41

Relativamente à admissibilidade do primeiro fundamento, há que rejeitar as exceções de inadmissibilidade invocadas pela Comissão.

42

A este respeito, importa recordar que, em conformidade com o disposto nos artigos 256.° TFUE e 58.°, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, o recurso é limitado às questões de direito e deve ter por fundamento a incompetência do Tribunal Geral, irregularidades processuais perante este Tribunal Geral que prejudiquem os interesses do recorrente ou a violação do direito da União pelo Tribunal Geral (v., neste sentido, acórdão Comissão/Brazzelli Lualdi e o., C‑136/92 P, EU:C:1994:211, n.o 47).

43

Além disso, resulta dos artigos 256.° TFUE, 58.°, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça e 168.°, n.o 1, alínea d), e 169.°, n.o 2, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça que o recurso de uma decisão do Tribunal Geral deve indicar de modo preciso os elementos contestados do acórdão cuja anulação é pedida, bem como os argumentos jurídicos em que se apoia especificamente esse pedido (v., designadamente, acórdãos Bergaderm e Goupil/Comissão, C‑352/98 P, EU:C:2000:361, n.o 34; Interporc/Comissão, C‑41/00 P, EU:C:2003:125, n.o 15, e Reynolds Tobacco e o./Comissão, C‑131/03 P, EU:C:2006:541, n.o 49).

44

Assim, não respeita as exigências de fundamentação resultantes dessas disposições um recurso de segunda instância que se limita a repetir ou a reproduzir textualmente os fundamentos e os argumentos já apresentados no Tribunal Geral, incluindo os que eram fundados em factos expressamente rejeitados por esse órgão jurisdicional (v., designadamente, acórdão Interporc/Comissão, EU:C:2003:125, n.o 16). Com efeito, tal recurso constitui, na realidade, um pedido que visa obter um simples reexame da petição apresentada no Tribunal Geral, o que está fora da competência do Tribunal de Justiça (v., designadamente, acórdão Reynolds Tobacco e o./Comissão, EU:C:2006:541, n.o 50).

45

Contudo, quando um recorrente contesta a interpretação ou a aplicação do direito da União feita pelo Tribunal Geral, as questões de direito examinadas em primeira instância podem ser de novo discutidas no âmbito de um recurso de uma decisão do Tribunal Geral (acórdão Salzgitter/Comissão, C‑210/98 P, EU:C:2000:397, n.o 43). Com efeito, se um recorrente não pudesse basear o seu recurso em fundamentos e argumentos já utilizados no Tribunal Geral, o processo de recurso ficaria privado de uma parte do seu sentido (acórdão Interporc/Comissão, EU:C:2003:125, n.o 17).

46

Ora, o primeiro fundamento cumpre estas exigências.

47

Com efeito, no caso em apreço, o Reino de Espanha sustenta, em substância, que o Tribunal Geral violou o direito da União ao declarar que o artigo H, n.o 2, do Anexo II do Regulamento n.o 1164/94 alterado não impõe nenhum prazo à Comissão para adotar uma decisão de correção financeira.

48

Nestas condições, longe de se limitar a repetir argumentos já aduzidos perante o Tribunal Geral e a prosseguir um novo exame de mérito do seu pedido inicial, o Reino de Espanha contesta a resposta expressa deste órgão jurisdicional a uma questão de direito no acórdão recorrido, a qual pode ser objeto de fiscalização pelo Tribunal de Justiça no quadro do recurso de uma decisão do Tribunal Geral.

49

Com efeito, um recorrente pode interpor recurso de segunda instância, invocando, no Tribunal de Justiça, fundamentos com origem no próprio acórdão recorrido e que se destinem a criticá‑lo juridicamente (acórdão Stadtwerke Schwäbisch Hall e o./Comissão, C‑176/06 P, EU:C:2007:730, n.o 17).

50

Acresce que, contrariamente às alegações da Comissão, o Reino de Espanha indica claramente os argumentos jurídicos em que se apoiou a este respeito.

51

Daqui resulta que o primeiro fundamento do Reino de Espanha é admissível.

– Quanto ao mérito

52

Relativamente ao exame de mérito do primeiro fundamento, importa constatar que, como o Tribunal Geral salientou no n.o 33 do acórdão recorrido, o sentido do artigo H, n.o 2, do Anexo II do Regulamento n.o 1164/94 alterado diverge em função das versões linguísticas desta disposição.

53

Com efeito, resulta da versão em língua francesa desta disposição, por força da qual, na falta de acordo entre as partes, a Comissão decide «dans un délai de trois mois», que o prazo de três meses aí previsto diz respeito à adoção da decisão de correções financeiras.

54

Em contrapartida, nas outras versões linguísticas da mesma disposição, este prazo de três meses está associado à falta de acordo entre as partes.

55

Ora, é jurisprudência constante que, para assegurar uma interpretação e uma aplicação uniformes de um mesmo texto cuja versão numa língua da União Europeia diverge das estabelecidas nas outras línguas, a disposição em causa deve ser interpretada em função do contexto e da finalidade da regulamentação a que pertence (v., designadamente, acórdão DR e TV2 Danmark, C‑510/10, EU:C:2012:244, n.o 45 e jurisprudência aí referida).

56

A este propósito, no que se refere ao contexto em que se insere o artigo H, n.o 2, do Anexo II do Regulamento n.o 1164/94 alterado, importa salientar que o Fundo de Coesão foi instituído, em conformidade com o artigo 130.o D, segundo parágrafo, CE, pelo Regulamento n.o 1164/94 na sua versão inicial.

57

O artigo H, n.o 2, do Anexo II do referido regulamento na sua versão inicial limita‑se a prever que, se se confirmar a existência de uma irregularidade ou o incumprimento de uma das condições indicadas na decisão que concede a contribuição, a Comissão poderá reduzir, suspender ou suprimir a contribuição para a ação em causa, sem que, todavia, o exercício desta competência esteja confinado a um prazo.

58

Como indicado no n.o 3 do presente acórdão, a versão inicial do referido regulamento foi alterada, designadamente, pelo Regulamento n.o 1265/1999 que substituiu o texto desse artigo H do Anexo II pelo texto transcrito no n.o 5 deste acórdão, cujo n.o 2, primeiro parágrafo, é objeto do presente litígio. Esta alteração foi feita com base no artigo 16.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1164/94 na sua versão inicial, segundo o qual, o Conselho da União Europeia, deliberando sob proposta da Comissão nos termos do procedimento previsto no artigo 130.o D CE, reexaminará o referido regulamento antes do final de 1999.

59

Resulta do preâmbulo do Regulamento n.o 1265/1999, designadamente dos seus considerandos 1, 2, 4 e 5, que o referido Anexo II foi alterado a fim de aumentar a eficácia do Fundo de Coesão, simplificar o sistema de gestão financeira, prevendo, em simultâneo, um reforço do controlo das despesas efetivamente realizadas, bem como melhorar e sistematizar a cooperação entre a Comissão e o Estado‑Membro em causa em matéria de controlo dos projetos.

60

O Regulamento n.o 1164/94 assim alterado era aplicável no período compreendido entre 2000 e 2006. Com efeito, por um lado, os Regulamentos n.os 1264/1999 e 1265/1999, que alteraram o Regulamento n.o 1164/94 na sua versão inicial, entraram em vigor em 1 de janeiro de 2000 e, por outro, nos termos do artigo 1.o, ponto 11, do Regulamento n.o 1264/1999, o Regulamento n.o 1164/94 conforme alterado em 1999 devia ser reexaminado o mais tardar até 31 de dezembro de 2006.

61

O Regulamento n.o 1386/2002 foi adotado pela Comissão para estabelecer as regras de execução do Regulamento n.o 1164/94 alterado. Nos termos do seu artigo 23.o, o Regulamento n.o 1386/2002 entrou em vigor em 7 de agosto de 2002 e, por força do seu artigo 1.o, aplica‑se aos projetos aprovados pela primeira vez após 1 de janeiro de 2000.

62

Decorre do artigo 18.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1386/2002, que se refere explicitamente ao artigo H, n.o 2, do Anexo II do Regulamento n.o 1164/94 alterado, que a Comissão dispõe, por força do artigo H, n.o 2, de um prazo de três meses para tomar uma decisão de correção financeira, começando esse prazo a contar a partir da data da reunião.

63

Todas as versões linguísticas do artigo 18.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1386/2002 são concordantes neste sentido.

64

No mesmo período referido no n.o 60 do presente acórdão, o Regulamento (CE) n.o 1260/1999 do Conselho, de 21 de junho de 1999, que estabelece disposições gerais sobre os Fundos estruturais (JO L 161, p. 1), que, em conformidade com o seu artigo 2.o, era aplicável ao Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional, ao Fundo Social Europeu, ao Fundo Europeu de Orientação e de Garantia Agrícola, secção «Orientação», e ao Instrumento Financeiro de Orientação da Pesca, enunciava, no seu artigo 39.o, n.o 3, que, «[n]o termo do prazo fixado pela Comissão, na falta de acordo e de correções do Estado‑Membro, a Comissão pode decidir, no prazo de três meses, tendo em conta as eventuais observações do Estado‑Membro», reduzir o pagamento por conta ou efetuar as correções financeiras necessárias, suprimindo total ou parcialmente a participação dos Fundos na intervenção em causa.

65

No que respeita à redação da referida disposição nas suas diferentes versões linguísticas, não existem divergências comparáveis às descritas nos n.os 53 e 54 do presente acórdão.

66

Em termos comparáveis aos do artigo 18.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1386/2002, o artigo 5.o, n.o 3, do Regulamento (CE) n.o 448/2001 da Comissão, de 2 de março de 2001, que estabelece as regras de execução do Regulamento (CE) n.o 1260/1999 do Conselho no que respeita ao procedimento para a realização de correções financeiras aplicáveis às intervenções no quadro dos Fundos estruturais (JO L 64, p. 13), prevê que, no caso de o Estado‑Membro contestar as observações feitas pela Comissão e de ter lugar a reunião prevista no artigo 39.o, n.o 2, segundo parágrafo, do Regulamento n.o 1260/1999, «o período de três meses durante o qual a Comissão poderá decidir nos termos do n.o 3 do artigo 39.o do mesmo regulamento, começará a contar a partir da data da referida reunião».

67

Relativamente à questão de direito que é objeto do presente litígio, a redação desta disposição também não apresenta divergências entre as diferentes versões linguísticas deste regulamento.

68

O Regulamento n.o 1260/1999 foi revogado pelo Regulamento (CE) n.o 1083/2006 do Conselho, de 11 de julho de 2006, que estabelece disposições gerais sobre o Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional, o Fundo Social Europeu e o Fundo de Coesão (JO L 210, p. 25), o qual é aplicável, segundo o seu artigo 1.o, n.o 1, aos referidos Fundos, sem prejuízo das disposições específicas estabelecidas nos regulamentos que regem cada um desses Fundos.

69

As correções financeiras que podem ser adotadas pela Comissão são atualmente objeto de regras comuns a esses três Fundos, enunciadas nos artigos 99.° a 102.° do referido regulamento.

70

O artigo 100.o, n.o 5, intitulado «Procedimento», do Regulamento n.o 1083/2006 dispõe que, «[n]a falta de acordo, a Comissão toma, no prazo de seis meses a contar da data da audição, uma decisão sobre a correção financeira em questão, tendo em conta todas as informações e observações apresentadas durante o procedimento. Caso não seja realizada uma audição, o período de seis meses começa a correr dois meses após a data do convite enviado pela Comissão».

71

A este propósito, importa precisar que, por um lado, no que toca à questão que opõe as partes no presente litígio, o referido artigo 100.o, n.o 5, está redigido de forma idêntica nas diferentes versões linguísticas do Regulamento n.o 1083/2006 e que, por outro, nem o Regulamento (CE) n.o 1084/2006 do Conselho, de 11 de julho de 2006, que institui o Fundo de Coesão e que revoga o Regulamento (CE) n.o 1164/94 (JO L 210, p. 79), nem tão pouco o Regulamento (CE) n.o 1828/2006 da Comissão, de 8 de dezembro de 2006, que prevê as normas de execução do Regulamento (CE) n.o 1083/2006 e do Regulamento (CE) n.o 1080/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho relativo ao Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (JO L 371, p. 1), comportam disposições relativas ao procedimento em matéria de correções financeiras.

72

O mesmo se aplica ao Regulamento (UE) n.o 1303/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de dezembro de 2013, que estabelece disposições comuns relativas ao Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional, ao Fundo Social Europeu, ao Fundo de Coesão, ao Fundo Europeu Agrícola de Desenvolvimento Rural e ao Fundo Europeu dos Assuntos Marítimos e das Pescas, que estabelece disposições gerais relativas ao Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional, ao Fundo Social Europeu, ao Fundo de Coesão e ao Fundo Europeu dos Assuntos Marítimos e das Pescas, e que revoga o Regulamento (CE) n.o 1083/2006 do Conselho (JO L 347, p. 320). Com efeito, o seu artigo 145.o, n.o 6, dispõe que, «[p]ara aplicar as correções financeiras, a Comissão, através de atos de execução, decide sobre a correção financeira a aplicar, no prazo de seis meses, a partir da data da audição ou da data de receção das informações adicionais, quando o Estado‑Membro aceite fornecer essas informações após a audição. A Comissão considera todas as informações e observações apresentadas durante o procedimento. Caso não seja realizada uma audição, o período de seis meses principia dois meses após a data do convite para a participação na audição enviado pela Comissão».

73

Esta disposição apresenta um conteúdo comparável nas diferentes versões linguísticas do Regulamento n.o 1303/2013.

74

Por outro lado, o Regulamento (UE) n.o 1300/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de dezembro de 2013, relativo ao Fundo de Coesão e que revoga o Regulamento (CE) n.o 1084/2006 do Conselho (JO L 347, p. 281), não regula o procedimento aplicável em caso de correções financeiras. O mesmo se aplica ao projeto de Regulamento Delegado (UE) da Comissão que completa o Regulamento n.o 1303/2013, que foi transmitido ao Parlamento Europeu em 3 de março de 2014.

75

Dos desenvolvimentos precedentes resulta que só a regulamentação aplicável ao período inicial, compreendido entre 1994 e 1999, não fixa um prazo para a adoção de uma decisão de correção financeira pela Comissão.

76

Em contrapartida, constate‑se que, a partir do ano 2000, tanto o Regulamento n.o 1260/1999 como os Regulamentos n.os 1083/2006 e 1303/2013, que entraram em vigor, respetivamente, em 1 de janeiro de 2007 e 1 de janeiro de 2014, bem como os diversos regulamentos de aplicação dos referidos regulamentos adotados pela Comissão, fixam tal prazo.

77

Dado que o artigo H, n.o 2, do Anexo II do Regulamento n.o 1164/94 alterado, em vigor desde 1 de janeiro de 2000, apresenta divergências consoante as versões linguísticas desse regulamento, há, com efeito, que determinar o seu sentido exato por referência ao contexto em que esta disposição se insere, a saber, no presente caso, os regulamentos comparáveis em matéria de gestão dos Fundos da União.

78

Ora, afigura‑se que todos os regulamentos aplicáveis neste domínio a partir de 2000 confirmam a tese, defendida pelo Reino de Espanha, segundo a qual a Comissão deve adotar a decisão de correção financeira num determinado prazo, cujo cálculo pode efetivamente variar em função da regulamentação em vigor, mas cuja própria existência foi prevista sem nenhuma ambiguidade pelo legislador da União.

79

A circunstância de o Regulamento n.o 1260/1999 não se aplicar ao Fundo de Coesão enquanto tal não obsta, a este propósito, a tal interpretação, uma vez que o texto do artigo 39.o, n.o 3, do referido regulamento e o do artigo H, n.o 2, do Anexo II do Regulamento n.o 1164/94 alterado são praticamente idênticos e não se afigura justificado que, no segundo regulamento, o prazo esteja associado à falta de acordo entre as partes, enquanto, no primeiro regulamento, esse prazo se refere à tomada de decisão pela Comissão.

80

Uma interpretação neste sentido é justificada tanto mais que todos os regulamentos posteriores, tanto do Conselho como da Comissão, confirmam que a Comissão está obrigada a respeitar um determinado prazo quando adota uma decisão de correção financeira.

81

Tratando‑se mais concretamente do Regulamento n.o 1386/2002 que tem por objeto estabelecer as regras de execução do Regulamento n.o 1164/94 alterado de que faz parte a disposição que é objeto do presente litígio, importa acrescentar que o ponto de vista defendido pela Comissão e consagrado pelo Tribunal Geral nos n.os 36 e 39 do acórdão recorrido, segundo o qual o artigo 18.o do Regulamento n.o 1386/2002 se limita a fixar a data a partir da qual começa a contar o prazo para a tomada de decisão nos termos do artigo H, n.o 2, do Anexo II do Regulamento n.o 1164/94 alterado, não pode ser aceite, dado que o legislador da União não poderia ter fixado o ponto de partida de um prazo para a adoção de uma decisão ao abrigo do referido artigo H se esse prazo não existisse.

82

Consequentemente, há que considerar que, desde o ano 2000, a Comissão está obrigada a respeitar um prazo legal para adotar uma decisão de correção financeira.

83

Esta conclusão, que decorre de uma interpretação sistemática dos regulamentos pertinentes tanto do Conselho como da Comissão, é de resto também confirmada pela redação da passagem que figura na página 63 da Comunicação (2011) C 332/01 da própria Comissão, invocada pelo Reino de Espanha em apoio do seu recurso, como resulta do n.o 34 do presente acórdão.

84

A referida conclusão é também coerente com o objetivo, enunciado no artigo 161.o, primeiro parágrafo, CE, atual artigo 177.o TFUE, segundo o qual o legislador da União estabelece «as regras gerais […] aplicáveis [aos Fundos]», uma vez que esta abordagem deve conduzir necessariamente a uma harmonização das regras aplicáveis na matéria. Tal atuação impõe‑se por maioria de razão no que se refere às regras processuais. A este respeito, há que observar que, desde 2007, designadamente as regras processuais foram efetivamente uniformizadas no quadro de um regulamento do Conselho que estabelece disposições gerais para todos os Fundos da União. Ora, as regras processuais aí enunciadas corroboram inteiramente a interpretação segundo a qual a adoção de uma decisão de correção financeira está confinada a um prazo predeterminado pelo legislador.

85

Por outro lado, esta interpretação não é suscetível de afetar a coerência e a eficácia do procedimento de correção financeira previsto no direito da União, na medida em que o prazo previsto pelo legislador confere à Comissão um período de tempo suficiente para adotar a sua decisão, enquanto tem devidamente em conta as suas concertações com o Estado‑Membro em causa.

86

Pelo contrário, como resulta do considerando 5 do Regulamento n.o 1265/1999, o procedimento instituído pelo legislador da União em matéria de correções financeiras assenta numa cooperação entre o Estado‑Membro em causa e a Comissão, que deve ter por base o equilíbrio entres os direitos e as obrigações das partes. Ora, nestas condições, seria contrário a esta exigência de equilíbrio dos direitos e das obrigações das partes que, no âmbito deste procedimento, o Estado‑Membro estivesse obrigado a respeitar determinados prazos e a Comissão não.

87

Com efeito, é jurisprudência constante que o princípio da cooperação leal não só obriga os Estados‑Membros a adotar todas as medidas adequadas a garantir o alcance e a eficácia do direito da União, mas impõe igualmente às suas instituições deveres recíprocos de cooperação leal com os Estados‑Membros (v., neste sentido, despacho Zwartveld e o., C‑2/88 IMM, EU:C:1990:315, n.o 10).

88

Além disso, tratando‑se, neste caso, de decisões com impacto orçamental significativo, é do interesse tanto do Estado‑Membro em causa como da Comissão que o termo do procedimento de correção financeira seja previsível, o que pressupõe a fixação de um prazo preestabelecido para a adoção da decisão final. Importa também salientar que a ultrapassagem do prazo previsto para a adoção de uma decisão de correção financeira não é compatível com o princípio geral da boa administração.

89

Tendo em conta as considerações precedentes, há que concluir que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito ao declarar, nos n.os 32 e 36 do acórdão recorrido, que o artigo H, n.o 2, do Anexo II do Regulamento n.o 1164/94 alterado não prevê nenhum prazo no qual a Comissão deva adotar a sua decisão de correção financeira, dado que o prazo de três meses para o qual essa disposição remete respeita à obtenção de um acordo entre a Comissão e o Estado‑Membro em causa.

90

Daqui resulta que o primeiro fundamento do recurso é procedente e que o acórdão recorrido deve ser anulado, sem que seja necessário examinar o segundo fundamento do recurso.

Quanto ao recurso em primeira instância

91

Nos termos do artigo 61.o, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça, quando o recurso for julgado procedente, o Tribunal de Justiça anula a decisão do Tribunal Geral. Pode, nesse caso, decidir definitivamente o litígio, se este estiver em condições de ser julgado.

92

No caso em apreço, o Tribunal de Justiça dispõe dos elementos necessários para decidir definitivamente sobre o recurso de anulação da decisão controvertida interposto pelo Reino de Espanha no Tribunal Geral.

93

Como resulta dos n.os 56 a 89 do presente acórdão, a adoção, pela Comissão, de uma decisão de correção financeira está, desde 2000, sujeita ao cumprimento de um determinado prazo.

94

A duração desse prazo varia em função da regulamentação aplicável.

95

Assim, em aplicação das disposições conjugadas dos artigos H, n.o 2, do Anexo II do Regulamento n.o 1164/94 alterado e 18.°, n.o 3, do Regulamento n.o 1386/2002, o prazo no termo do qual a Comissão deve adotar uma decisão de correção financeira é de três meses a contar da data da reunião.

96

Em conformidade com o artigo 100.o, n.o 5, do Regulamento n.o 1083/2006, a Comissão decide sobre a correção financeira no prazo de seis meses a contar da data da reunião e, caso não seja realizada uma reunião, o período de seis meses começa dois meses após a data do convite enviado pela Comissão.

97

Por força do artigo 145.o, n.o 6, do Regulamento n.o 1303/2013, a Comissão decide sobre a correção financeira a aplicar, no prazo de seis meses, a partir da data da reunião ou da data de receção das informações adicionais, quando o Estado‑Membro aceite fornecer essas informações após a reunião. Caso não seja realizada uma reunião, o período de seis meses principia dois meses após a data do convite para a participação na reunião enviado pela Comissão.

98

A este respeito, importa precisar que, embora o Regulamento n.o 1265/1999, que alterou o Regulamento n.o 1164/94, tenha entrado em vigor em 1 de janeiro de 2000, resulta, no entanto, do artigo 108.o, segundo parágrafo, do Regulamento n.o 1083/2006 que o artigo 100.o deste último é aplicável a partir de 1 de janeiro de 2007, incluindo aos programas anteriores ao período de 2007‑2013. Isso está, aliás, conforme com o princípio segundo o qual as regras processuais são imediatamente aplicáveis após a sua entrada em vigor.

99

Quanto ao artigo 145.o do Regulamento n.o 1303/2013, este é aplicável, nos termos do artigo 154.o, segundo parágrafo, do mesmo regulamento, a partir de 1 de janeiro de 2014.

100

Ora, no caso em apreço, a reunião realizou‑se em 23 de junho de 2010, ao passo que a Comissão só adotou a decisão controvertida em 18 de fevereiro de 2011.

101

Nestas condições, afigura‑se que, no caso em apreço, a Comissão não respeitou o prazo de seis meses estabelecido pelo artigo 100.o, n.o 5, do Regulamento n.o 1083/2006.

102

Contrariamente ao que a Comissão alegou, a circunstância de a regulamentação pertinente não prever expressamente que, em caso de incumprimento do prazo estabelecido para a adoção de uma decisão de correção financeira, a Comissão já não pode adotar tal decisão é desprovida de pertinência, dado que a definição de um prazo dentro do qual deve ser adotada uma decisão desta natureza é, por si só, suficiente.

103

Acresce que o incumprimento das regras processuais relativas à adoção de um ato lesivo constitui uma violação das formalidades essenciais (v., neste sentido, acórdão Reino Unido/Conselho, 68/86, EU:C:1988:85, n.os 48 e 49), que cabe ao juiz da União suscitar mesmo oficiosamente (v., neste sentido, acórdãos Comissão/ICI, C‑286/95 P, EU:C:2000:188, n.o 51, e Comissão/Solvay, C‑287/95 P e C‑288/95 P, EU:C:2000:189, n.o 55). Ora, o facto de a Comissão não ter adotado a decisão controvertida no prazo estabelecido pelo legislador da União constitui uma violação das formalidades essenciais.

104

Por conseguinte, a decisão controvertida não foi validamente adotada e, consequentemente, deve ser anulada.

Quanto às despesas

105

Por força do disposto no artigo 184.o, n.o 2, do Regulamento de Processo, se o recurso for julgado procedente e o Tribunal de Justiça decidir definitivamente o litígio, decidirá igualmente sobre as despesas.

106

O artigo 138.o, n.o 1, do mesmo regulamento, aplicável ao processo que tenha por objeto um recurso de uma decisão do Tribunal Geral por força do artigo 184.o, n.o 1, desse regulamento, dispõe que a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo o Reino de Espanha obtido vencimento no âmbito do recurso da decisão do Tribunal Geral e tendo o recurso no Tribunal Geral sido julgado procedente, há que, em conformidade com o pedido do Reino de Espanha, condenar a Comissão a suportar, além das suas próprias despesas, as incorridas por este Estado‑Membro, tanto em primeira instância como no âmbito do presente recurso.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Primeira Secção) decide:

 

1)

O acórdão do Tribunal Geral da União Europeia Espanha/Comissão (T‑235/11, EU:T:2013:49) é anulado.

 

2)

A Decisão C (2011) 1023 final da Comissão, de 18 de fevereiro de 2011, que reduz a contribuição financeira do Fundo de Coesão aos projetos com a designação «Fornecimento e montagem de material ferroviário na Linha de Alta Velocidade Madrid‑Saragoça‑Barcelona‑Fronteira francesa. Lanço Madrid‑Lérida» (CCI 1999.ES.16.C.PT.001), «Linha ferroviária de Alta Velocidade Madrid‑Barcelona. Lanço Lérida‑Martorell (Plataforma, 1.a fase)» (CCI 2000.ES.16.C.PT.001), «Linha de Alta Velocidade Madrid‑Saragoça‑Barcelona‑Fronteira francesa. Acessos ferroviários à nova estação de comboios de Saragoça» (CCI 2000.ES.16.C.PT.003), «Linha de Alta Velocidade Madrid‑Barcelona‑Fronteira francesa. Lanço Lérida‑Martorell. Sublanço X‑A (Olérdola‑Avinyonet del Penedés)» (CCI 2001.ES.16.C.PT.007), «Novo acesso ferroviário de Alta Velocidade em Levante. Sublanço La Gineta‑Albacete (Plataforma)» (CCI 2004.ES.16.C.PT.014), é anulada.

 

3)

A Comissão Europeia é condenada a suportar as despesas do Reino de Espanha e as suas próprias despesas, tanto no processo em primeira instância como no âmbito do presente recurso.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: espanhol.

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