Este documento é um excerto do sítio EUR-Lex
Documento 62007CJ0204
Judgment of the Court (Third Chamber) of 25 July 2008. # C.A.S. SpA v Commission of the European Communities. # Appeals - EEC-Turkey Association Agreement - Regulation (EEC) No 2913/92 - Community Customs Code - Repayment and remission of import duty - Fruit juice concentrate from Turkey - Movement certificates - Falsification - Special situation. # Case C-204/07 P.
Acórdão do Tribunal de Justiça (Terceira Secção) de 25 de Julho de 2008.
C.A.S. SpA contra Comissão das Comunidades Europeias.
Recurso de decisão do Tribunal de Primeira Instância - Acordo de Associação CEE-Turquia - Regulamento (CEE) n.º 2913/92 - Artigo 239.º - Código Aduaneiro Comunitário - Reembolso e dispensa de direitos de importação - Concentrados de sumo de fruta provenientes da Turquia - Certificados de circulação - Falsificação - Situação especial.
Processo C-204/07 P.
Acórdão do Tribunal de Justiça (Terceira Secção) de 25 de Julho de 2008.
C.A.S. SpA contra Comissão das Comunidades Europeias.
Recurso de decisão do Tribunal de Primeira Instância - Acordo de Associação CEE-Turquia - Regulamento (CEE) n.º 2913/92 - Artigo 239.º - Código Aduaneiro Comunitário - Reembolso e dispensa de direitos de importação - Concentrados de sumo de fruta provenientes da Turquia - Certificados de circulação - Falsificação - Situação especial.
Processo C-204/07 P.
Colectânea de Jurisprudência 2008 I-06135
Identificador Europeu da Jurisprudência (ECLI): ECLI:EU:C:2008:446
ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção)
25 de Julho de 2008 ( *1 )
«Recurso de decisão do Tribunal de Primeira Instância — Acordo de Associação CEE-Turquia — Regulamento (CEE) n.o 2913/92 — Artigo 239.o — Código Aduaneiro Comunitário — Reembolso e dispensa de direitos de importação — Concentrados de sumo de fruta provenientes da Turquia — Certificados de circulação — Falsificação — Situação especial»
No processo C-204/07 P,
que tem por objecto um recurso de decisão do Tribunal de Primeira Instância nos termos do artigo 56.o do Estatuto do Tribunal de Justiça, interposto em 16 de Abril de 2007,
C.A.S. SpA, representada por D. Ehle, Rechtsanwalt,
recorrente,
sendo a outra parte no processo:
Comissão das Comunidades Europeias, representada por M. Patakia e S. Schønberg, na qualidade de agentes, assistidos por M. Núñez Müller, Rechtsanwalt, com domicílio escolhido no Luxemburgo,
recorrida em primeira instância,
O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção),
composto por: A. Rosas, presidente de secção, J. N. Cunha Rodrigues, J. Klučka, P. Lindh e A. Arabadjiev (relator), juízes,
advogada-geral: V. Trstenjak,
secretário: Katarzyna Sztranc-Sławiczek, administradora,
vistos os autos e após a audiência de 10 de Janeiro de 2008,
ouvidas as conclusões da advogada-geral na audiência de 13 de Março de 2008,
profere o presente
Acórdão
1 |
Através do seu recurso, a C.A.S. SpA (a seguir «recorrente») pede a anulação do acórdão do Tribunal de Primeira Instância das Comunidades Europeias de 6 de Fevereiro de 2007, CAS/Comissão (T-23/03, Colect., p. II-289, a seguir «acórdão recorrido»), que negou provimento ao seu recurso de anulação do artigo 2.o da Decisão da Comissão de 18 de Outubro de 2002 (REC 10/01, a seguir «decisão recorrida»), relativa a um pedido de dispensa de direitos de importação. |
Quadro jurídico
Regulamentação relativa ao acordo de associação
2 |
O presente processo enquadra-se no contexto do Acordo que cria uma Associação entre a Comunidade Económica Europeia (CEE) e a Turquia, assinado em 12 de Setembro de 1963 em Ancara pela República da Turquia, por um lado, e pelos Estados-Membros da CEE e pela Comunidade, por outro. O acordo de associação foi concluído, aprovado e confirmado em nome da Comunidade pela Decisão 64/732/CEE do Conselho, de 23 de Dezembro de 1963 (JO 1964, 217, p. 3685; EE 11 F1 p. 18; a seguir «acordo de associação»). Entrou em vigor em 1 de Dezembro de 1964. |
3 |
O acordo de associação compreende uma fase preparatória que permite à República da Turquia, nos termos do artigo 3.o, reforçar a sua economia, com o auxílio da Comunidade Europeia, uma fase transitória consagrada, segundo o seu artigo 4.o, ao estabelecimento progressivo de uma união aduaneira e à aproximação das políticas económicas e uma fase final que, nos termos do seu artigo 5.o, assenta na união aduaneira e implica o reforço da coordenação das políticas económicas. |
4 |
A fase final prevista pelo acordo de associação entrou em vigor em 31 de Dezembro de 1995 [Decisão n.o 1/95 do Conselho de Associação CE-Turquia, de 22 de Dezembro de 1995, relativa à execução da fase final da união aduaneira (JO 1996, L 35, p. 1). As decisões do Conselho de Associação adoptadas durante a fase transitória eram igualmente aplicáveis às importações visadas pela decisão recorrida, uma vez que foram efectuadas entre 5 de Abril de 1995 e 20 de Novembro de 1997. |
5 |
Entre estas decisões encontra-se, em particular, a Decisão n.o 5/72, de 29 de Dezembro de 1972, relativa aos métodos de cooperação administrativa para aplicação dos artigos 2.o e 3.o do protocolo adicional ao acordo de Ancara (JO 1973, L 59, p. 74). |
6 |
O artigo 11.o desta decisão dispõe que os Estados-Membros e a República da Turquia se prestam assistência mútua, por intermédio das respectivas administrações aduaneiras, no controlo da autenticidade e da exactidão dos certificados, tendo em vista assegurar a correcta aplicação das disposições da presente decisão. |
7 |
O artigo 12.o desta mesma decisão prevê que «[a República da] Turquia, os Estados-Membros e a Comunidade tomam cada um as medidas necessárias à execução do disposto nesta decisão». |
8 |
A Decisão n.o 1/95 regulamenta de forma detalhada a execução da fase final da união aduaneira, respeitando o seu anexo 7 à assistência mútua em matéria aduaneira entre as autoridades administrativas competentes da Comunidade e as da República da Turquia. |
9 |
Os artigos 3.o e 7.o deste anexo prevêem normas que regulam, respectivamente, a assistência que essas autoridades devem prestar a pedido de uma delas e a execução desse pedido de assistência. |
10 |
Além disso, nos termos do artigo 15.o da Decisão n.o 1/96 do Comité de Cooperação Aduaneira CE-Turquia, de 20 de Maio de 1996, que introduz normas de execução da Decisão n.o 1/95 (JO L 200, p. 14), os Estados-Membros e a República da Turquia prestar-se-ão assistência mútua, com vista a assegurar a correcta aplicação das disposições da decisão, através das respectivas administrações aduaneiras e no âmbito da assistência mútua prevista no anexo 7 da Decisão n.o 1/95, no controlo da autenticidade e da exactidão dos certificados. |
11 |
Por outro lado, o artigo 13.o, n.o 2, da Decisão n.o 1/96 dispõe: «A estância aduaneira em que é efectuado o fraccionamento emite um extracto do certificado A. TR. para cada parte da remessa fraccionada, utilizando para o efeito um certificado A. TR. A casa ‘12’ do extracto deve conter a indicação do número de registo, a data, a estância e o país de emissão do certificado inicial […]» |
Regulamentação relativa ao reembolso e à dispensa de direitos aduaneiros
12 |
O artigo 239.o, n.o 1, do Regulamento (CEE) n.o 2913/92 do Conselho, de 12 de Outubro de 1992, que estabelece o Código Aduaneiro Comunitário (JO L 302, p. 1, a seguir «CAC»), dispõe: «Pode-se proceder ao reembolso ou à dispensa do pagamento dos direitos de importação […] em situações […]:
|
13 |
O artigo 905.o, n.o 1, do Regulamento (CEE) n.o 2454/93 da Comissão, de 2 de Julho de 1993, que fixa determinadas disposições de aplicação do Regulamento n.o 2913/92 (JO L 253, p. 1, a seguir «regulamento de aplicação do CAC»), prevê: «Sempre que a autoridade aduaneira decisória, à qual foi apresentado o pedido de reembolso ou de dispensa do pagamento em conformidade com o n.o 2 do artigo 239.o do [CAC], não puder decidir com base no artigo 899.o e o pedido se apresentar acompanhado de justificações susceptíveis de constituir uma situação especial resultante de circunstâncias que não impliquem nem artifício nem negligência manifesta por parte do interessado, o Estado-Membro a que pertence esta autoridade transmitirá o caso à Comissão para que seja tratado de acordo com o procedimento previsto nos artigos 906.o a 909.o […]» |
14 |
O artigo 904.o, alínea c), do regulamento de aplicação do CAC dispõe: «Não é concedido o reembolso ou a dispensa do pagamento de direitos de importação quando, segundo o caso, o único motivo invocado em apoio do pedido de reembolso ou de dispensa do pagamento for: […]
|
15 |
O artigo 220.o, n.o 2, alínea b), do CAC dispõe que não se efectuará um registo de liquidação a posteriori quando o registo da liquidação do montante dos direitos legalmente devidos não tiver sido efectuado em consequência de um erro das próprias autoridades aduaneiras, que não podia ser razoavelmente detectado pelo devedor, tendo este, por seu lado, agido de boa fé e observado todas as disposições previstas pela regulamentação em vigor no que se refere à declaração aduaneira. |
Antecedentes do litígio
16 |
A recorrente é uma sociedade de direito italiano, filial a 95,1% da sociedade Steinhauser GmbH, com sede em Ravensburg (Alemanha). A actividade principal da recorrente consiste na transformação de concentrados de sumos de frutos importados; paralelamente, exerce a actividade de importadora desses produtos para Itália. |
17 |
De acordo com os factos apurados pelo Tribunal de Primeira Instância, entre 5 de Abril de 1995 e 20 de Novembro de 1997, a recorrente importou e introduziu em livre prática na Comunidade sumo de maçã e sumo de pêra concentrados, que foram declarados como provenientes e originários da Turquia. A importação, para a Comunidade, desse tipo de produto foi efectuada por meio de certificados A. TR. 1, pelo que esses produtos beneficiaram da isenção de direitos aduaneiros prevista no acordo de associação e no protocolo adicional, assinado em 23 de Novembro de 1970 em Bruxelas e concluído, aprovado e confirmado em nome da Comunidade pelo Regulamento (CEE) n.o 2760/72 do Conselho, de 19 de Dezembro de 1972 (JO L 293, p. 1; EE 11 F1 p. 213). |
18 |
O serviço aduaneiro de Ravenna (Itália) efectuou uma fiscalização documental a posteriori da autenticidade do certificado A. TR. 1 D 141591, apresentado pela recorrente numa das operações de importação ocorridas no período acima referido. Em conformidade com as disposições aplicáveis nesta matéria, o pedido de verificação da autenticidade do referido certificado foi enviado às autoridades turcas. |
19 |
Por ofício de 15 de Maio de 1998, as autoridades turcas informaram o serviço aduaneiro de Ravenna que resultava da fiscalização efectuada que o certificado não era autêntico, uma vez que não tinha sido emitido pelas autoridades aduaneiras turcas. Por outro lado, anunciaram que seriam efectuadas outras fiscalizações. |
20 |
Consequentemente, as autoridades italianas procederam à fiscalização a posteriori de 103 certificados A. TR. 1 apresentados pela recorrente em diversas operações de importação. |
21 |
Por ofício de 10 de Julho de 1998, a Representação Permanente da República da Turquia na União Europeia (a seguir «Representação Permanente turca») informou a Comissão de que 22 certificados A. TR. 1 apresentados pela recorrente e enumerados no anexo junto a esse ofício, relativos às exportações da sociedade turca Akman para Itália, eram falsos. |
22 |
Na sequência deste ofício, entre 12 e 15 de Outubro de 1998, bem como a 30 de Novembro e a 2 de Dezembro de 1998, a Unidade de Coordenação da Luta Antifraude (UCLAF) da Comissão, a antecessora do Organismo Europeu de Luta Antifraude (OLAF), procedeu a inspecções na Turquia. |
23 |
Por ofício de 8 de Março de 1999, a Representação Permanente turca informou o serviço aduaneiro de Ravenna de que 32 certificados A. TR. 1 apresentados pela recorrente (a seguir «certificados controvertidos»), incluindo 18 certificados enumerados no anexo ao ofício de 10 de Julho de 1998, não tinham sido elaborados nem validados pelas autoridades turcas. Os ditos certificados vêm referidos no anexo do referido ofício. |
24 |
Seguidamente, a falta de autenticidade ou a irregularidade de um número significativo de certificados A. TR. 1 foi objecto de abundante correspondência entre a Comissão, as autoridades turcas e as autoridades italianas, na qual figuram, designadamente, as cartas das autoridades turcas de 22 de Abril de 1999 e 16 de Julho de 1999. |
25 |
As autoridades aduaneiras italianas entenderam que decorria de toda essa correspondência que as autoridades turcas consideravam que 48 certificados A. TR. 1, nos quais se incluíam os certificados controvertidos, não eram autênticos ou eram inexactos. |
26 |
Concretamente, os certificados controvertidos eram considerados «falsos», uma vez que não tinham sido emitidos nem validados pelas estâncias aduaneiras turcas. Em contrapartida, os outros 16 certificados (correspondentes a direitos aduaneiros no montante total de 1904763758 ITL, isto é, 983728,38 euros) eram qualificados de «inválidos», uma vez que, embora tivessem sido emitidos pelas autoridades aduaneiras turcas, as mercadorias em causa não eram originárias da Turquia. |
27 |
Como todos os 48 certificados tinham sido qualificados de «falsos» ou de «inválidos», as mercadorias abrangidas pelos mesmos não podiam beneficiar do tratamento preferencial dado às importações de produtos agrícolas turcos. Consequentemente, as autoridades aduaneiras italianas exigiram à recorrente os direitos aduaneiros devidos, no montante total de 5200954129 ITL, isto é, 2686068,63 euros. |
28 |
Por carta de 28 de Março de 2000, a recorrente, baseando-se nos artigos 220.o, n.o 2, alínea b), 236.o e 239.o do CAC, requereu aos serviços aduaneiros de Ravenna que não fosse efectuado um registo de liquidação a posteriori e o «reembolso» dos direitos de importação exigidos. Em apoio do seu pedido, a recorrente invocava a sua boa fé, os erros indetectáveis das autoridades competentes e as faltas imputáveis a estas. |
29 |
Na sequência do pedido da recorrente, as autoridades italianas solicitaram à Comissão que decidisse se se justificava, por um lado, nos termos do artigo 220.o, n.o 2, alínea b), do CAC, não efectuar o registo de liquidação a posteriori dos direitos de importação exigidos à recorrente e, por outro, nos termos do artigo 239.o do CAC, conceder o «reembolso» desses direitos. |
30 |
Por ofício de 3 de Junho de 2002, a Comissão solicitou algumas informações complementares às autoridades italianas, que responderam por ofício de 7 de Junho de 2002. |
31 |
Por ofício de 25 de Julho de 2002, a Comissão informou a recorrente da sua intenção de não dar uma resposta favorável ao seu pedido. Porém, antes de tomar uma decisão definitiva, a Comissão convidou a recorrente a dar-lhe a conhecer as suas eventuais observações e a consultar o processo, para tomar conhecimento dos documentos não confidenciais. |
32 |
Em 6 de Agosto de 2002, os representantes da recorrente consultaram o processo administrativo nas instalações da Comissão. Além disso, assinaram uma declaração em que confirmavam terem tido acesso aos documentos referidos no anexo da mesma. |
33 |
Em 18 de Outubro de 2002, a Comissão adoptou a decisão recorrida, de que a recorrente foi notificada em 21 de Novembro de 2002. Em primeiro lugar, a Comissão concluiu que se justificava ter em consideração os direitos de importação objecto do pedido. |
34 |
Em segundo lugar, a Comissão concluiu que se justificava que se efectuasse o «reembolso» dos direitos de importação quanto à parte do pedido relativa aos 16 certificados «inválidos», na medida em que a recorrente se encontrava, a esse respeito, numa situação especial na acepção do artigo 239.o do CAC. |
35 |
Em terceiro lugar, no que respeita aos 32 certificados controvertidos, a Comissão concluiu, ao invés, que as circunstâncias invocadas pela recorrente não eram susceptíveis de gerar uma situação especial na acepção do artigo 239.o do CAC. Consequentemente, a Comissão decidiu, no artigo 2.o da decisão recorrida, que não se justificava que se procedesse ao «reembolso» dos direitos de importação correspondentes a esses certificados, no montante de 1702340,25 euros. |
Recurso no Tribunal de Primeira Instância e acórdão recorrido
36 |
Por petição entrada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 29 de Janeiro de 2003, a recorrente pediu a anulação do artigo 2.o da decisão recorrida. |
37 |
Em apoio dos seus pedidos, invocou três fundamentos, relativos à violação, respectivamente, dos direitos de defesa, do artigo 239.o do CAC e do artigo 220.o, n.o 2, alínea b), do CAC. |
38 |
O Tribunal de Primeira Instância negou provimento ao recurso na sua totalidade. |
Quanto ao primeiro fundamento
39 |
Com o primeiro fundamento, a recorrente alega que os seus direitos de defesa foram violados no decurso do procedimento administrativo, na medida em que, embora tivesse tido acesso ao processo que continha os documentos em que a Comissão baseou a decisão recorrida, não teve acesso, porém, a documentos que tinham uma importância decisiva para a apreciação global que a Comissão fez da situação. |
40 |
Todavia, o Tribunal de Primeira Instância julgou esse fundamento improcedente pelos motivos expostos nos n.os 87 a 102 do acórdão recorrido. |
Quanto ao segundo fundamento
41 |
O segundo fundamento, relativo à violação do artigo 239.o do CAC, articula-se em torno de quatro vertentes. A primeira diz respeito à qualificação incorrecta do certificado de circulação A. TR. 1 D 437214. Nas segunda e terceira vertentes são indicadas faltas graves alegadamente cometidas pelas autoridades turcas e pela Comissão, para demonstrar a existência de uma situação especial na acepção do artigo 239.o do CAC. Por último, a quarta vertente diz respeito à inexistência de negligência manifesta por parte da recorrente e à apreciação dos riscos comerciais. |
42 |
No que respeita à primeira vertente deste fundamento, após lembrar que a determinação da origem das mercadorias se baseia numa repartição das competências entre as autoridades do Estado de exportação e as do Estado de importação, no sentido de que as autoridades do Estado de exportação determinam a origem, o Tribunal de Primeira Instância, antes de mais, examinou a correspondência trocada entre a Comissão e as autoridades italianas e turcas. |
43 |
A este respeito, o Tribunal de Primeira Instância referiu no n.o 122 do acórdão recorrido que a Comissão se baseou essencialmente no ofício das autoridades turcas ao serviço aduaneiro de Ravenna, de 8 de Março de 1999, no tocante à parte da decisão recorrida relativa aos certificados em causa. |
44 |
Contudo, ao comparar o teor deste ofício com o teor das comunicações subsequentes das autoridades turcas, o Tribunal de Primeira Instância determinou, nos n.os 124 a 128 do acórdão recorrido, existirem ambiguidades no que respeita à qualificação do certificado D 437214 e que a Comissão não podia validamente concluir, antes de adoptar a decisão recorrida, que o certificado fora falsificado. |
45 |
Porém, com base num ofício de 22 de Agosto de 2003, isto é, posterior à decisão recorrida, no qual as autoridades turcas confirmaram as suas conclusões constantes do ofício de 8 de Março de 1999, o Tribunal de Primeira Instância declarou que essa consideração não é suficiente, por si só, para anular a decisão recorrida, porque a recorrente não tinha qualquer interesse legítimo na anulação de uma decisão com fundamento em vício de forma quando, na sequência dessa anulação, só podia ser adoptada uma nova decisão, idêntica, quanto ao mérito, à que tinha sido anulada. |
46 |
Em seguida, o Tribunal de Primeira Instância examinou a segunda vertente do segundo fundamento, relativa a várias alegações de faltas imputadas às autoridades turcas, que assentam essencialmente na tese de que os certificados controvertidos foram efectivamente emitidos e autenticados pelas referidas autoridades. |
47 |
Neste contexto, o Tribunal de Primeira Instância declarou, nos n.os 150 a 152 do acórdão recorrido, que, por um lado, a verificação do carácter original ou falsificado dos documentos emitidos pelas autoridades turcas é da competência exclusiva destas autoridades e que, por outro, estas autoridades tinham concluído que os certificados controvertidos eram falsificados. Em seguida, rejeitou o argumento da recorrente, de que os cunhos dos carimbos e as assinaturas apostas nos certificados controvertidos demonstram que provavelmente foram emitidos e autenticados pelas autoridades turcas. |
48 |
Por último, observou que a conservação de registos dos certificados emitidos pelas autoridades turcas não está expressamente prevista no acordo de associação nem nas suas disposições de aplicação. |
49 |
Não obstante, o Tribunal reconheceu que o anexo II, ponto II, n.o 12, da Decisão n.o 1/96 prevê a inscrição, na casa 12 dos certificados A. TR. 1, do número do documento e que o artigo 13.o dessa mesma decisão prevê que, no caso do fraccionamento de certificados, na casa 12 mencionar-se-á, em especial, o número de registo do certificado inicial. |
50 |
Todavia, considerou que isso não implica que se trate de certificados autênticos, porque os falsários teriam todo o interesse em utilizar, nos certificados falsificados, um número de registo correspondente a um certificado regular. |
51 |
No que respeita à terceira vertente do segundo fundamento, relativa a uma série de alegações de faltas imputadas à Comissão, o Tribunal baseou-se nas investigações efectuadas pela UCLAF na Turquia para concluir que a Comissão efectivamente velou pela boa aplicação do acordo de associação. |
52 |
O Tribunal observou igualmente, no n.o 240 do acórdão recorrido, que a recorrente não logrou demonstrar que a Comissão se tinha deparado com dificuldades no âmbito da assistência administrativa acordada com as autoridades turcas, que teriam justificado a consulta do Conselho de Associação ou do comité misto da união aduaneira CE-Turquia (a seguir «comité misto»). |
53 |
Seguidamente, o Tribunal de Primeira Instância declarou que nem o acordo de associação, nem as decisões do Conselho de Associação, nem as disposições comunitárias aplicáveis prevêem qualquer obrigação de comunicar espécimes de carimbos e de assinaturas entre as partes contratantes, de informar os importadores no caso de dúvidas quanto à validade de transacções aduaneiras efectuadas por estes no quadro de um regime preferencial, ou de adopção de um determinado método de investigação pela UCLAF. |
54 |
A quarta vertente do segundo fundamento, respeitante à inexistência de negligência manifesta da recorrente, foi rejeitada como irrelevante pelo Tribunal de Primeira Instância, após ter salientado que a Comissão não se pronunciou, na parte da decisão recorrida relativa aos certificados falsificados, sobre a questão da diligência ou negligência da recorrente. |
Quanto ao terceiro fundamento
55 |
O Tribunal de Primeira Instância rejeitou também o terceiro fundamento, relativo à violação do artigo 220.o, n.o 2, alínea b), do CAC, dado que a recorrente não logrou demonstrar que o comportamento das autoridades competentes tinha contribuído para a emissão ou a aceitação dos certificados controvertidos, que se verificou serem falsos. |
Quanto às medidas de organização do processo e às diligências de instrução requeridas
56 |
Finalmente, o Tribunal de Primeira Instância rejeitou as provas oferecidas e as diligências de instrução requeridas pela recorrente, tais como, designadamente, o pedido para convidar a Comissão a apresentar todos os documentos que a recorrente afirma não ter podido consultar no âmbito do acesso ao processo administrativo. |
Pedidos das partes
57 |
Com o seu recurso, a recorrente pede que o Tribunal de Justiça se digne:
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58 |
A Comissão pede que o Tribunal de Justiça se digne:
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Quanto ao recurso
59 |
A recorrente invoca nove fundamentos em apoio do seu recurso. |
60 |
Em primeiro lugar, sustenta que o Tribunal de Primeira Instância cometeu um erro de direito ao estabelecer a repartição de competências entre o Estado de exportação e o Estado de importação, na medida em que as autoridades turcas, contrariamente ao que declarou o Tribunal de Primeira Instância, não têm competência exclusiva para examinar a autenticidade dos certificados controvertidos. |
61 |
Em segundo lugar, a recorrente invoca a violação do seu direito de acesso ao processo que não pode ser limitado apenas aos documentos em que a Comissão baseou a sua decisão recorrida. |
62 |
Os terceiro e quarto fundamentos são relativos à repartição errada do ónus da prova pelo facto de o Tribunal ter posto inteiramente a seu cargo esse ónus, não admitindo as provas que ofereceu e as diligências de instrução que requereu. |
63 |
Constituem objecto do quinto fundamento os erros na qualificação jurídica dos incumprimentos por parte das autoridades turcas e da Comissão. A este respeito, a recorrente faz várias acusações, relativas à apreciação dos certificados controvertidos enquanto inexactos ou não autênticos, à falta de transmissão dos espécimes dos carimbos e das assinaturas, à violação do dever de alertar os importadores, à forma como foram conduzidas as investigações na Turquia e à não divulgação do registo dos certificados controvertidos. |
64 |
Com o seu sexto fundamento, critica o acórdão recorrido na medida em que afirma que a Comissão não estava obrigada a consultar o comité misto nem o Conselho de Associação. |
65 |
O não reconhecimento do seu interesse legítimo quanto à anulação da decisão recorrida relativamente ao certificado A. TR. 1 D 437214 é objecto do sétimo fundamento do recurso, enquanto a não apreciação de considerações de equidade e dos riscos no acórdão recorrido é objecto do oitavo fundamento. |
66 |
Finalmente, no nono fundamento, a recorrente critica o Tribunal de Primeira Instância por ter violado o artigo 220.o, n.o 2, alínea b), do CAC. |
Observações preliminares
67 |
Há que notar, em primeiro lugar, que a recorrente alegou, na audiência, que a execução do artigo 2.o da decisão recorrida só foi parcialmente suspensa, uma vez que já tinha pago uma parte dos direitos de importação correspondentes aos certificados controvertidos. Ora, trata-se, por conseguinte, tanto do reembolso de direitos de importação, no que respeita às quantias que foram pagas pela recorrente, como de dispensa desses direitos, no que respeita aos direitos liquidados a posteriori mas não pagos pela recorrente. |
68 |
Em segundo lugar, importa sublinhar que a recorrente invocou, em apoio do seu recurso, várias acusações baseadas tanto na violação das normas formais essenciais como na violação das normas materiais. Todavia, à luz das circunstâncias particulares do caso em apreço e além dos fundamentos relativos à violação do direito de acesso ao processo e do artigo 220.o, n.o 2, alínea b), do CAC, estas acusações, no essencial, impugnam efectivamente a aplicação feita pelo Tribunal de Primeira Instância do artigo 239.o do CAC, designadamente no que respeita à existência de uma situação especial na acepção desse mesmo artigo. Por conseguinte, importa examinar, antes de mais, todas estas acusações. |
Quanto à violação do artigo 239.o do CAC
Argumentos das partes
69 |
A recorrente critica, no essencial, a qualificação jurídica efectuada pelo Tribunal de Primeira Instância dos incumprimentos imputáveis, por um lado, às autoridades turcas e, por outro, à Comissão. |
70 |
Quanto aos incumprimentos por parte das autoridades turcas, a recorrente considera que o Tribunal de Primeira Instância cometeu um erro de direito em vários aspectos:
|
71 |
No que concerne aos incumprimentos imputados à Comissão, a recorrente alega que existem suficientes indícios objectivos de violações sistemáticas e voluntárias por parte das autoridades turcas, que deviam ter justificado o reforço do controlo do regime preferencial pela Comissão. |
72 |
A recorrente entende igualmente, baseando-se no artigo 93.o do regulamento de aplicação do CAC e no artigo 4.o da Decisão n.o 1/96, que a República da Turquia e a Comissão estavam juridicamente obrigadas, também durante o período em questão, isto é, 1995/1997, a transmitir os espécimes dos carimbos utilizados pelas autoridades aduaneiras turcas às autoridades aduaneiras competentes. |
73 |
Sublinha que o Tribunal de Primeira Instância também cometeu um erro de direito ao não ter concluído que a Comissão estava obrigada a avisar os importadores de concentrados de sumo de fruta, o mais tardar até final de 1994 ou início de 1995, das irregularidades cometidas na Turquia no âmbito da emissão de certificados A. TR. 1., e que estava igualmente obrigada a consultar o comité misto ou o Conselho de Associação. |
74 |
Além disso, a UCLAF não cumpriu as suas obrigações de proceder a uma investigação correcta na Turquia, dado que não adoptou determinados métodos de investigação. |
75 |
Por fim, a recorrente critica o Tribunal de Primeira Instância por não ter tido em conta o facto de ser contrário ao princípio da equidade, que serve de base ao artigo 239.o do CAC, dada a relação entre o operador económico e a Administração, permitir que a recorrente sofra o prejuízo que decorre da decisão recorrida. |
76 |
A Comissão considera, a título preliminar, que os fundamentos invocados pela recorrente, no que respeita aos incumprimentos que lhe são imputados a ela e às autoridades turcas, não se referem a questões jurídicas, mas contêm apreciações factuais que não podem ser objecto de um recurso para o Tribunal de Justiça. |
77 |
Além disso, afirma que, à luz das normas jurídicas aplicáveis ao caso vertente, nem a Comissão nem a República da Turquia estavam obrigadas a transmitir espécimes de carimbos ou de assinaturas, nem tão-pouco a manter registos dos certificados A. TR. 1. |
78 |
No que diz respeito ao dever de avisar os importadores, a Comissão recorda que as importações controvertidas no presente processo datam do período compreendido entre Abril de 1995 e Novembro de 1997, ao passo que as dúvidas quanto à autenticidade e à veracidade do conteúdo dos certificados turcos A. TR. 1 só surgiram posteriormente, a saber, depois de 1998. |
79 |
Sublinha igualmente que não existia qualquer motivo para consultar o comité misto ou o Conselho de Associação no caso em apreço, dada a cooperação constante e irrepreensível das autoridades turcas. |
Apreciação do Tribunal de Justiça
— Quanto à admissibilidade
80 |
Nos termos do disposto nos artigos 225.o, n.o 1, CE e 58.o, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça, o recurso é limitado às questões de direito e apenas pode ter por fundamentos a incompetência do Tribunal de Primeira Instância, irregularidades processuais no Tribunal de Primeira Instância que prejudiquem os interesses do recorrente ou a violação do direito comunitário por este último (v., designadamente, acórdão de 28 de Fevereiro de 2008, Neirinck/Comissão, C-17/07 P, n.o 73). |
81 |
Em apoio do seu recurso, a recorrente invoca várias circunstâncias que, em sua opinião, são constitutivas de uma situação especial na acepção do artigo 239.o do CAC. |
82 |
Segundo jurisprudência assente, uma situação especial é dada como provada quando resulte das circunstâncias do caso concreto que o devedor se encontra numa situação excepcional relativamente aos outros operadores que exercem a mesma actividade (v., neste sentido, acórdãos de 25 de Fevereiro de 1999, Trans-Ex-Import, C-86/97, Colect., p. I-1041, n.os 21 e 22, e de 7 de Setembro de 1999, De Haan, C-61/98, Colect., p. I-5003, n.os 52 e 53). Ora, é à luz dessas circunstâncias que importa examinar a questão de saber se estas são constitutivas de uma situação especial na acepção do artigo 239.o do CAC. |
83 |
As acusações feitas no âmbito do recurso equivalem, assim, a criticar a aplicação do artigo 239.o do CAC feita pelo Tribunal de Primeira Instância no acórdão recorrido, pelo facto de ter declarado que as circunstâncias do caso vertente não são constitutivas de uma situação especial. Esta qualificação jurídica é uma questão de direito que compete ao Tribunal de Justiça examinar no âmbito de um recurso. |
84 |
Por conseguinte, a questão prévia de admissibilidade suscitada pela Comissão deve ser afastada. |
— Quanto ao mérito
85 |
Importa sublinhar desde logo que, segundo jurisprudência assente, o artigo 239.o do CAC constitui uma cláusula geral de equidade (v., designadamente, acórdão de 3 de Abril de 2008, Militzer & Münch, C-230/06, Colect., p. I-1895, na Colectânea, n.o 50). |
86 |
De acordo com o disposto no artigo 239.o do CAC, o devedor tem direito ao reembolso ou à dispensa dos direitos aduaneiros, desde que estejam preenchidos dois requisitos, ou seja, a existência de uma situação especial e a inexistência de negligência manifesta e de artifício da sua parte. |
87 |
Cabe precisar que não é objecto do presente recurso a diligência da recorrente e a inexistência de artifício da sua parte. Com efeito, como observou o Tribunal de Primeira Instância no n.o 295 do acórdão recorrido, a Comissão não se pronunciou, na parte da decisão recorrida relativa aos certificados controvertidos, sobre a questão da diligência ou da negligência da recorrente. |
88 |
No que diz respeito à existência de uma situação especial na acepção do artigo 239.o do CAC, esta é dada como provada, conforme se recordou no n.o 83 do presente acórdão, quando resulte das circunstâncias do caso concreto que o devedor se encontra numa situação excepcional relativamente aos outros operadores que exercem a mesma actividade e que, na ausência dessas circunstâncias, não teria sofrido o prejuízo ligado à liquidação a posteriori dos direitos aduaneiros (v., neste sentido, acórdão de 26 de Março de 1987, Coopérative agricole d'approvisionnement des Avirons, 58/86, Colect., p. 1525, n.o 22). |
89 |
Assim, a fim de determinar se as circunstâncias do caso concreto são constitutivas de uma situação especial que não implica negligência nem artifício por parte do interessado na acepção do artigo 239.o do CAC, a Comissão deve apreciar todos os factos pertinentes (v., neste sentido, acórdão de 15 de Maio de 1986, Oryzomyli Kavallas e Oryzomyli Agiou Konstantinou/Comissão, 160/84, Colect., p. 1633, n.o 16). |
90 |
Esta obrigação implica, num caso como o dos autos, em que o devedor invocou, em apoio do seu pedido de reembolso ou de dispensa dos direitos de importação, a existência de determinadas faltas graves por parte das autoridades turcas e da Comissão no âmbito da aplicação do acordo de associação, que a Comissão fará incidir a sua apreciação, ao examinar este pedido, no conjunto dos factos relativos aos certificados controvertidos de que tomou conhecimento no quadro da sua função de vigilância e de controlo da aplicação correcta do referido acordo. |
91 |
Esta conclusão é, aliás, reforçada pelo artigo 904.o, alínea c), do regulamento de aplicação do CAC que prevê que não é concedido o reembolso ou a dispensa do pagamento de direitos de importação quando o «único motivo» invocado em apoio do pedido de reembolso ou de dispensa do pagamento for a apresentação, ainda que de boa fé, para a concessão de um tratamento pautal preferencial, de documentos que posteriormente se verificou serem falsos, falsificados ou não válidos para a concessão desse tratamento. Por outras palavras, a apresentação de certificados falsos, falsificados ou não válidos não é constitutiva, em si mesma, de uma situação especial na acepção do artigo 239.o do CAC. |
92 |
Ao invés, outras circunstâncias invocadas em apoio de um pedido de reembolso ou de dispensa dos direitos de importação, como o controlo deficiente por parte da Comissão da aplicação correcta do acordo de associação, podem constituir essa situação especial. |
93 |
Ora, embora a Comissão disponha de uma margem de apreciação no que respeita à aplicação do artigo 239.o do CAC, não pode abstrair-se do seu dever de ponderar efectivamente, por um lado, o interesse da Comunidade no pleno respeito das disposições da regulamentação aduaneira, seja comunitária ou vinculativa para a Comunidade, e, por outro, o interesse do importador de boa fé em não suportar os prejuízos que ultrapassem o risco comercial normal. |
94 |
Esta ponderação encontra-se subjacente à economia do referido artigo 239.o que constitui, conforme se recordou no n.o 85 do presente acórdão, uma cláusula geral de equidade. Por consequência, quando examina um pedido de reembolso ou de dispensa dos direitos de importação, a Comissão não pode validamente contentar-se em avaliar o comportamento e as actuações do importador e do exportador. Deve ainda ter em conta, designadamente, a incidência do seu próprio comportamento, na situação concreta do caso, no âmbito do seu dever de vigilância e de controlo. |
95 |
A este respeito, deve sublinhar-se que decorre do artigo 211.o CE que a Comissão, enquanto guardiã do Tratado CE e dos acordos celebrados ao abrigo deste, está obrigada a assegurar-se da correcta aplicação por um país terceiro das obrigações que contraiu por força de um acordo concluído com a Comunidade, através dos meios previstos pelo acordo ou pelas decisões adoptadas nos termos deste. |
96 |
Esta obrigação resulta também do próprio acordo de associação e de várias decisões adoptadas para a sua aplicação. Assim, o artigo 7.o deste acordo, em conjugação com o artigo 211.o CE, exige que a Comissão tome todas as medidas gerais ou especiais destinadas a assegurar o cumprimento das obrigações que decorrem do referido acordo. |
97 |
Além disso, nos termos do artigo 24.o deste mesmo acordo, a Comissão está representada no seio do Conselho de Associação e participa, enquanto representante da Comunidade, nos diferentes comités, instituídos por esse conselho, a fim de assegurar a continuidade da cooperação necessária ao bom funcionamento do acordo. Assim, em conformidade com o disposto no artigo 52.o, n.o 2, da Decisão n.o 1/95, a Comissão pode consultar o comité misto no caso de surgirem dificuldades para a Comunidade ou para a República da Turquia na aplicação desta decisão. |
98 |
De resto, a Comissão dispõe de uma Representação Permanente na Turquia, o que lhe permite, pelo menos, ser informada, com fiabilidade, acerca das evoluções jurídicas nesse Estado e, mais concretamente, acerca do estado de aplicação do referido acordo. |
99 |
Importa igualmente referir que, no âmbito da sua obrigação de vigilância e de controlo da aplicação correcta do acordo de associação, a Comissão dispõe de importantes poderes. |
100 |
Assim, a Comissão, em conformidade com o disposto no artigo 3.o, do anexo 7, da Decisão n.o 1/95, pode pedir às autoridades turcas todos os esclarecimentos úteis para permitir assegurar a correcta aplicação da legislação aduaneira. |
101 |
Esta instituição pode igualmente, nos termos do n.o 4, alínea a), desse mesmo artigo, pedir às autoridades turcas que tomem as medidas necessárias para exercer uma vigilância especial sobre as pessoas singulares ou colectivas relativamente às quais hajam motivos razoáveis para se crer que cometem ou tenham cometido operações contrárias à legislação aduaneira. |
102 |
Além disso, de acordo com o artigo 7.o, n.os 3 e 4, do referido anexo, os funcionários da Comissão devidamente autorizados podem recolher informações, nas estâncias respectivas das autoridades aduaneiras turcas, relativas às operações contrárias à legislação aduaneira ou estar presentes aquando da realização das investigações efectuadas no território turco, com o acordo e nas condições previstas por estas autoridades. |
103 |
Aliás, o mesmo resulta do artigo 15.o da Decisão n.o 1/96, nos termos do qual, com vista a assegurar a correcta aplicação das disposições desta decisão, os Estados-Membros e a República da Turquia prestar-se-ão assistência mútua para o controlo da autenticidade e da exactidão dos certificados, através das respectivas administrações aduaneiras e no âmbito da assistência mútua prevista no anexo 7 da Decisão n.o 1/95. |
104 |
Por consequência, a Comissão não pode validamente afirmar, como fez na audiência, que se encontra na mesma situação que a recorrente no que se refere à verificação dos factos que se desenrolaram num país terceiro, ou seja, na Turquia. Compete-lhe, pelo contrário, exercer plenamente os poderes de que dispõe em virtude das disposições do acordo de associação e das decisões adoptadas para a sua aplicação, a fim de cumprir as suas obrigações de vigilância e de controlo da aplicação correcta do referido acordo. |
105 |
Este exercício dos poderes impõe-se por maioria de razão numa situação em que as exportações para o mesmo porto comunitário, isto é, o de Ravenna, através da mesma sociedade exportadora turca, durante o mesmo período de referência, tinham sido efectuadas, segundo consta do acórdão recorrido, tanto com certificados inexactos como com certificados não autênticos. |
106 |
O exercício pleno dos poderes de que dispõe a Comissão no âmbito do seu dever de vigilância e de controlo da aplicação correcta do acordo de associação impõe-se igualmente pelo facto de as apreciações feitas pelas autoridades turcas quanto à não autenticidade ou inexactidão dos certificados controvertidos revelarem certas ambiguidades ou, pelo menos, certas incoerências. |
107 |
Assim, como declarou o Tribunal de Primeira Instância nos n.os 120 a 128 do acórdão recorrido, uma comparação entre o teor do ofício de 8 de Março de 1999 das autoridades turcas e o teor das comunicações subsequentes dessas mesmas autoridades, como o ofício da Representação Permanente turca à UCLAF de 22 de Abril de 1999, revela ambiguidades no que respeita ao carácter alegadamente não autêntico do certificado D 437214. |
108 |
No que concerne aos dois outros certificados A. TR. 1, cuja autenticidade foi avaliada pelas autoridades turcas no âmbito do mesmo exercício de verificação a posteriori, mesmo que não façam parte dos certificados controvertidos, o Tribunal de Primeira Instância constatou igualmente, nos n.os 198 a 201 do acórdão recorrido, certas incoerências, visto que as autoridades turcas os qualificaram, em diferentes fases do processo, como falsificados, como incorrectos, ou ainda como parcialmente incorrectos. |
109 |
Por outro lado, como decorre do acórdão recorrido, a utilização de termos diferentes pelas referidas autoridades para descrever o resultado das suas verificações dos certificados, como, designadamente, «falsos» (ofício da Representação Permanente turca à UCLAF de 10 de Julho de 1998, mencionado no n.o 41 do acórdão recorrido), «não […] correctos e não […] emitidos e autenticados pela […] estância aduaneira [turca]» (ofício da Direcção-Geral Aduaneira turca de 8 de Março de 1999, mencionado no n.o 123 do acórdão recorrido), «incorrectos e […] não emitidos de acordo com as regras de origem» (ofício da Representação Permanente turca à UCLAF de 22 de Abril de 1999, mencionado no n.o 124 do acórdão recorrido), «incorrecto[s]» (ofício da Direcção-Geral Aduaneira turca de 16 de Julho de 1999, mencionado no n.o 200 do acórdão recorrido), suscitaram igualmente ambiguidades. |
110 |
Além do mais, os termos divergentes utilizados pelas autoridades turcas na sua correspondência com a Comissão e com as autoridades aduaneiras italianas não correspondem às noções de «autenticidade» e de «exactidão» previstas no artigo 11.o da Decisão n.o 5/72 e no artigo 15.o da Decisão n.o 1/96. |
111 |
As ambiguidades e as incoerências acima descritas deviam ter levado a Comissão a interrogar-se sobre as apreciações feitas pelas autoridades turcas. Competia à Comissão, nestas condições, assegurar-se, no âmbito das suas funções de vigilância e de controlo da aplicação correcta do acordo de associação, que as autoridades turcas tinham qualificado, de forma correcta, os ditos certificados como incorrectos ou como não autênticos. |
112 |
No entanto, não se pode deixar de observar que a Comissão não exerceu plenamente os poderes que lhe foram conferidos pelo acordo de associação e pelas suas disposições de aplicação. |
113 |
Desde logo, embora seja verdade que a UCLAF efectuou duas investigações na Turquia entre 12 e 15 de Outubro de 1998, bem como entre 30 de Novembro e 2 de Dezembro de 1998, há que observar que o Tribunal de Primeira Instância declarou erradamente, no n.o 218 do acórdão recorrido, que nenhum elemento de prova permitia estabelecer que a UCLAF não tinha podido efectuar uma investigação aprofundada, nomeadamente junto da administração aduaneira de Mersin. Resulta claramente dos relatórios de missão da UCLAF de 9 e 23 de Dezembro de 1998 que entre as organizações visitadas pelos investigadores na Turquia não consta a estância aduaneira a partir da qual os produtos em causa foram exportados para a Comunidade, isto é, a de Mersin. Assim, não puderam verificar a autenticidade ou falta dela dos certificados controvertidos. Com efeito, os dois relatórios de missão da UCLAF de 9 e 23 de Dezembro de 1998 não tratam da questão de saber se os certificados controvertidos foram efectivamente falsificados ou se, pelo contrário, foram erradamente emitidos pelas autoridades turcas. |
114 |
Esta afirmação é confirmada por carta de 9 de Dezembro de 1998, ou seja, posteriormente às investigações efectuadas pela UCLAF na Turquia, na qual o director da UCLAF, Sr. Knudsen, pediu «insistentemente» às autoridades turcas que dessem o seu acordo a uma verificação conjunta na estância aduaneira de Mersin a fim de obter pormenores sobre todas as exportações de concentrados de sumo de frutas efectuadas pela sociedade Akman desde o final de 1993. |
115 |
Não se pode contestar, a este respeito, que, para efectuar uma verificação nas estâncias respectivas das autoridades aduaneiras turcas, a Comissão devia, em conformidade com o disposto no artigo 7.o, n.o 3, do anexo 7 da Decisão n.o 1/95, ter o acordo das referidas autoridades. Basta sublinhar que a Comissão nunca referiu qualquer falta de acordo por parte das autoridades turcas que a tenham impedido de efectuar esse controlo no local. |
116 |
Em seguida, resulta dos n.os 244 a 259 do acórdão recorrido que a Comissão não exigiu das autoridades turcas os espécimes dos cunhos dos carimbos utilizados na estância aduaneira de Mersin e não os transmitiu às autoridades aduaneiras dos Estados-Membros. O Tribunal de Primeira Instância concluiu a este respeito que, durante todo o período em que se realizaram as importações controvertidas, a República da Turquia e a Comissão não estavam sujeitas a qualquer obrigação de fornecer mutuamente os espécimes dos cunhos dos carimbos utilizados pelas estâncias aduaneiras. |
117 |
Ora, é a comunicação dos espécimes dos cunhos dos carimbos e das assinaturas utilizados nessas estâncias aduaneiras que permite efectuar uma vigilância efectiva quanto ao respeito das normas aduaneiras relativas às preferências pautais. |
118 |
A obrigação que incumbe à Comissão de garantir que o acordo de associação seja correctamente aplicado exige que a Comissão, e através dela as autoridades aduaneiras dos Estados-Membros, disponha sempre de todos os elementos que lhe permitam proceder a um controlo eficaz, constituindo indiscutivelmente esses elementos os espécimes dos cunhos dos carimbos e das assinaturas. |
119 |
Deve igualmente sublinhar-se que, contrariamente ao que declarou o Tribunal de Primeira Instância no n.o 255 do acórdão recorrido, resulta sem qualquer ambiguidade do teor do artigo 15.o, n.o 1, da Decisão n.o 1/96, conforme alterado pela Decisão n.o 2/97 do Comité de Cooperação Aduaneira CE-Turquia, de 30 de Maio de 1997 (JO L 249, p. 18), que entrou em vigor em 1 de Setembro de 1997, ou seja, durante o período em que se realizaram as importações controvertidas, que «[a]s autoridades aduaneiras dos Estados-Membros, da Comissão e da [República da] Turquia fornecer-se-ão, através da Comissão […], espécimes dos cunhos dos carimbos utilizados nas respectivas estâncias aduaneiras para a emissão de certificados de circulação A. TR.». |
120 |
De qualquer modo, mesmo antes da entrada em vigor desta decisão, a Comissão, com vista a permitir a aplicação correcta do acordo de associação, devia ter solicitado às autoridades turcas que lhe fornecessem os referidos espécimes com base no artigo 3.o do anexo 7 da Decisão n.o 1/95, que a autoriza a pedir «todos os esclarecimentos úteis para permitir que aquela assegure a correcta aplicação da legislação aduaneira». |
121 |
O facto de a República da Turquia ter voluntariamente transmitido os cunhos dos carimbos utilizados para os certificados A. TR. 1, como constatou o Tribunal de Primeira Instância no n.o 258 do acórdão recorrido, não põe em causa a conclusão de que a Comissão não cumpriu a sua obrigação de exigir que as autoridades lhe fornecessem os espécimes dos cunhos dos carimbos e das assinaturas utilizados na estância aduaneira de Mersin e de, por sua vez, os comunicar às autoridades aduaneiras dos Estados-Membros. |
122 |
Por último, resulta igualmente dos n.os 153 a 160 do acórdão recorrido que a Comissão se limitou simplesmente a observar que não está expressamente prevista no acordo de associação nem nas suas disposições de aplicação a conservação, na Turquia, dos registos em que se inscrevem os certificados aduaneiros e que, de qualquer modo, a eventual existência desses registos não implica que se trate de certificados autênticos, uma vez que os falsificadores têm todo o interesse em utilizar para os certificados falsificados um número de registo correspondente a um certificado regular. O Tribunal de Primeira Instância admitiu esta fundamentação nos n.os 161 e 162 do acórdão recorrido. |
123 |
Esta tese não pode, contudo, proceder. Há que sublinhar, a este respeito, que o registo dos certificados emitidos pelas autoridades aduaneiras é uma prática indispensável nas trocas internacionais. Com efeito, a falta destes registos ameaça privar de eficácia todo o controlo a posteriori dos certificados emitidos pelas autoridades aduaneiras respectivas. |
124 |
Por outro lado, a obrigação de as autoridades turcas registarem os certificados A. TR. 1 decorre, contrariamente ao que declarou o Tribunal de Primeira Instância no n.o 161 do acórdão recorrido, das disposições de aplicação do acordo de associação. Com efeito, o artigo 13.o da Decisão n.o 1/96 prevê que, no caso de fraccionamento dos certificados, na casa 12 mencionar-se-á, em especial, o número de registo do «certificado inicial». Ora, mesmo que o artigo 13.o seja aplicável ao caso concreto do fraccionamento dos certificados, é claro que, na casa 12 do formulário do certificado A. TR. 1 deve figurar o número de registo do «certificado inicial», ou seja, que o certificado inicial deve, em todo o caso, ser igualmente registado nos registos aduaneiros do Estado de exportação. |
125 |
A afirmação do Tribunal de Primeira Instância que consta do n.o 162 do acórdão recorrido, segundo a qual os falsificadores têm todo o interesse em utilizar um número de registo correspondente a um certificado regular que tenha já sido registado, não pode liberar a Comissão da sua obrigação de garantir a aplicação correcta do acordo de associação. |
126 |
Pelo contrário, uma vez que esta afirmação implica uma dupla importação na Comunidade efectuada ao abrigo dos certificados A. TR. 1 com o mesmo número de registo, um autêntico e outro não autêntico, a Comissão devia ter verificado se essa dupla importação na Comunidade ao abrigo de certificados A. TR. 1 com o mesmo número de registo tinha efectivamente ocorrido. Ora, pode deduzir-se dos argumentos apresentados pela Comissão, tanto no Tribunal de Primeira Instância como no Tribunal de Justiça, que não foi esse o caso. |
127 |
Além disso, uma vez que nenhuma das duas missões da UCLAF foi realizada na estância aduaneira de Mersin, conforme foi recordado no n.o 113 do presente acórdão, também não puderam verificar a existência desses registos, assim como a inscrição ou falta de inscrição dos certificados controvertidos nesses registos. |
128 |
Decorre de todas as considerações precedentes que a Comissão não cumpriu as suas obrigações de vigilância e de controlo da aplicação correcta do acordo de associação. |
129 |
Ora, se não tivesse havido este incumprimento por parte da Comissão, as falsificações dos certificados controvertidos poderiam ter sido descobertas e elucidadas desde as primeiras importações na Comunidade e a escala das perdas financeiras, tanto para o orçamento comunitário como para a recorrente, poderia ter sido limitada. Aliás, a Comissão teria assim podido, desde a descoberta destas falsificações, alertar os importadores em tempo útil e consultar, eventualmente, o comité misto. |
130 |
Em todo o caso, se a Comissão tivesse exercido plenamente os poderes de que dispõe no âmbito do acordo de associação, as dúvidas quanto à não autenticidade ou exactidão dos certificados controvertidos poderiam ter sido dissipadas e a sua autenticidade ou não autenticidade poderia ter sido determinada com certeza. |
131 |
Daqui decorre que este incumprimento por parte da Comissão é constitutivo de uma situação especial na acepção do artigo 239.o do CAC. |
132 |
Por conseguinte, ao declarar que a existência de uma situação especial na acepção do artigo 239.o do CAC não foi demonstrada, o Tribunal de Primeira Instância aplicou incorrectamente o artigo 239.o, tendo, portanto, cometido um erro de direito. |
133 |
Consequentemente, este fundamento é procedente. |
134 |
À luz do exposto, não é necessário examinar os fundamentos relativos à violação do direito de acesso ao processo e à violação do artigo 220.o, n.o 2, alínea b), do CAC. |
Consequências da anulação do acórdão recorrido
135 |
Nos termos do artigo 61.o, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça, quando o recurso for julgado procedente, o Tribunal de Justiça anula a decisão do Tribunal de Primeira Instância. Pode, nesse caso, decidir definitivamente o litígio, se estiver em condições de ser julgado. É o que acontece no caso em apreço. |
136 |
Resulta de todas as considerações desenvolvidas nos n.os 86 a 133 do presente acórdão que a Comissão cometeu um erro manifesto de apreciação ao considerar que os requisitos previstos no artigo 239.o do CAC não estavam preenchidos e que, consequentemente, não havia que proceder ao reembolso ou à dispensa de direitos de importação relativos aos certificados controvertidos. Importa, por conseguinte, anular o artigo 2.o da decisão recorrida. |
Quanto às despesas
137 |
Nos termos do artigo 122.o, primeiro parágrafo, do Regulamento de Processo, se o recurso for julgado procedente e o Tribunal de Justiça decidir definitivamente o litígio, decidirá igualmente sobre as despesas. |
138 |
Nos termos do disposto no artigo 69.o, n.o 2, do mesmo regulamento, aplicável aos recursos de decisões do Tribunal de Primeira Instância por força do artigo 118.o do mesmo regulamento, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a recorrente pedido a condenação da Comissão e tendo esta sido vencida, há que condená-la nas despesas das duas instâncias. |
Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Terceira Secção) decide: |
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Assinaturas |
( *1 ) Língua do processo: alemão.