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Documento 62003CJ0117

Acórdão do Tribunal (Segunda Secção) de 13 de Janeiro de 2005.
Società Italiana Dragaggi SpA e outros contra Ministero delle Infrastrutture e dei Trasporti e Regione Autonoma Friuli Venezia Giulia.
Pedido de decisão prejudicial: Consiglio di Stato - Itália.
Directiva 92/43/CEE - Preservação dos habitats naturais - Fauna e flora selvagens - Lista nacional dos sítios susceptíveis de serem identificados como sítios de importância comunitária - Medidas de conservação.
Processo C-117/03.

Colectânea de Jurisprudência 2005 I-00167

Identificador Europeu da Jurisprudência (ECLI): ECLI:EU:C:2005:16

Arrêt de la Cour

Processo C‑117/03

Società Italiana Dragaggi SpA e o.

contra

Ministero delle Infrastrutture e dei Trasporti e Regione Autonoma del Friuli Venezia Giulia

(pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Consiglio di Stato)

«Directiva 92/43/CEE – Preservação dos habitats naturais – Fauna e flora selvagens – Lista nacional dos sítios susceptíveis de serem identificados como sítios de importância comunitária – Medidas de conservação»

Conclusões da advogada‑geral J. Kokott apresentadas em 8 de Julho de 2004 

Acórdão do Tribunal de Justiça (Segunda Secção) de 13 de Janeiro de 2005 

Sumário do acórdão

Ambiente – Preservação dos habitats naturais bem como da fauna e da flora selvagens – Directiva 92/43 – Zonas especiais de conservação – Sítios constantes das listas nacionais, susceptíveis de serem identificados como sítios de importância comunitária – Medidas de protecção – Não aplicação das medidas previstas no artigo 6.°, n.os 2 a 4 – Obrigação de os Estados‑Membros salvaguardarem o seu interesse ecológico

(Directiva 92/43 do Conselho, artigos 4.°, n.° 5, e 6, n.os 2 a 4)

O artigo 4.°, n.° 5, da Directiva 92/43, relativa à preservação dos habitats naturais e da fauna e da flora selvagens, deve ser interpretado no sentido de que as medidas de protecção previstas no artigo 6.°, n.os 2 a 4, dessa directiva apenas se impõem em relação aos sítios que, nos termos do artigo 4.°, n.° 2, terceiro parágrafo, da directiva, estejam inscritos na lista de sítios seleccionados como sítios de importância comunitária, decidida pela Comissão segundo o procedimento referido no artigo 21.° dessa directiva. Consequentemente, estas medidas não se aplicam aos sítios que constam das listas nacionais enviadas à Comissão nos termos do artigo 4.°, n.° 1, da directiva.

Contudo, por força da mesma directiva, os Estados‑Membros estão obrigados, no que respeita aos sítios referidos em último lugar, susceptíveis de serem identificados como sítios de importância comunitária, e, em especial, aos que alojam tipos de habitats naturais prioritários ou espécies prioritárias, a tomar medidas de protecção adequadas, à luz do objectivo de conservação referido pela directiva, para salvaguardar o interesse ecológico pertinente que esses sítios revestem a nível nacional.

(cf. n.os 21, 22, 25, 28‑30 e disp.)




ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção)
13 de Janeiro de 2005(1)


«Directiva 92/43/CEE – Preservação dos habitats naturais – Fauna e flora selvagens – Lista nacional dos sítios susceptíveis de serem identificados como sítios de importância comunitária – Medidas de conservação»

No processo C‑117/03,que tem por objecto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 234.º CE, apresentado pelo Consiglio di Stato (Itália), por decisão de 17 de Dezembro de 2002, entrado no Tribunal de Justiça em 18 de Março de 2003, no processo

Società Italiana Dragaggi SpA e o.

contra

Ministero delle Infrastrutture e dei Trasporti, Regione Autonoma del Friuli Venezia Giulia ,



O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção),,



composto por: C. W. A. Timmermans, presidente de secção, C. Gulmann (relator), J.‑P. Puissochet, N. Colneric e J. N. Cunha Rodrigues, juízes,

advogada‑geral: J. Kokott,
secretário: M. Múgica Arzamendi, administradora principal,

vistos os autos e após a audiência de 9 de Junho de 2004,vistas as observações escritas apresentadas:

em representação da Società Italiana Dragaggi SpA, agindo em nome próprio e na qualidade de mandatária da Associazione Temporanea di Imprese Mantovani SpA e HAM BV, por R. Titomanlio, avvocato,

em representação da Regione Autonoma del Friuli Venezia Giulia, por G. Marzi, avvocato,

em representação da República Francesa, por C. Mercier, na qualidade de agente,

em representação do Reino da Suécia, por A. Kruse, na qualidade de agente,

em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por M. van Beek e L. Cimaglia, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões da advogada-geral apresentadas na audiência de 8 de Julho de 2004,

profere o presente



Acórdão



1
O pedido de decisão prejudicial tem por objecto a interpretação dos artigos 4.°, n.° 5, 6.°, n.° 3, e 21.° da Directiva 92/43/CEE do Conselho, de 21 de Maio de 1992, relativa à preservação dos habitats naturais e da fauna e da flora selvagens (JO L 206, p. 7, a seguir «directiva»).

2
Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe, designadamente, a Società Italiana Dragaggi SpA (a seguir «Dragaggi») ao Ministero delle Infrastrutture e dei Trasporti (Ministério das Infra‑Estruturas e dos Transportes) e à Regione autonoma Friuli‑Venezia Giulia (Região Autónoma de Friul‑Venécia Júlia), a propósito da anulação, por parte da administração adjudicante, de um contrato de empreitada relativo a trabalhos de dragagem e de descarga de sedimentos num aterro no porto de Monfalcone.


Quadro jurídico

A legislação comunitária

3
De acordo com o sexto considerando da directiva, «para assegurar o restabelecimento ou a manutenção dos habitats naturais e das espécies de interesse comunitário num estado de conservação favorável, há que designar zonas especiais de conservação, a fim de estabelecer uma rede ecológica europeia coerente de acordo com um calendário definido».

4
Nos termos do artigo 3.°, n.° 1, da directiva, «[é] criada uma rede ecológica europeia coerente de zonas especiais de preservação denominada ‘Natura 2000’. Esta rede, formada por sítios que alojam tipos de habitats naturais constantes do anexo I e habitats das espécies constantes do anexo II, deve assegurar a manutenção ou, se necessário, o restabelecimento dos tipos de habitats naturais e dos das espécies em causa num estado de conservação favorável, na sua área de repartição natural».

5
O artigo 4.° tem a seguinte redacção:

«1.     Com base nos critérios estabelecidos no anexo III (fase 1) e nas informações científicas pertinentes, cada Estado‑Membro proporá uma lista dos sítios, indicando os tipos de habitats naturais do anexo I e as espécies do anexo II (nativas do seu território) que tais sítios alojam. [...]

A lista será enviada à Comissão nos três anos subsequentes à notificação da directiva, ao mesmo tempo que as informações relativas a cada sítio. [...]

2.       Com base nos critérios constantes do anexo III (fase 2) e no âmbito de cada uma das cinco regiões biogeográficas a que se refere a alínea c), subalínea iii), do artigo 1.° e do conjunto do território a que se refere o n.° 1 do artigo 2.°, a Comissão elaborará, em concertação com cada Estado‑Membro, e a partir das listas dos Estados‑Membros, um projecto de lista dos sítios de importância comunitária do qual constarão os que integrem um ou mais tipos de habitats naturais prioritários ou uma ou mais espécies prioritárias.

Os Estados‑Membros cujos sítios que integrem tipos de habitats naturais e espécies prioritários representem mais de 5% do território nacional podem, mediante acordo da Comissão, solicitar que os critérios referidos no anexo III (fase 2) sejam aplicados com mais flexibilidade na selecção do conjunto dos sítios de importância comunitária existentes no seu território.

A lista dos sítios seleccionados como de importância comunitária, que indique os que integram um ou mais tipos de habitats naturais prioritários ou uma ou mais espécies prioritárias, será elaborada pela Comissão segundo o procedimento a que se refere o artigo 21.°

3.       A lista referida no número anterior será elaborada num prazo máximo de seis anos a contar da notificação da presente directiva.

4.       A partir do momento em que um sítio de importância comunitária tenha sido reconhecido nos termos do procedimento previsto no n.° 2, o Estado‑Membro em causa designará esse sítio como zona especial de conservação, o mais rapidamente possível e num prazo de seis anos [...].

5.       Logo que um sítio seja inscrito na lista prevista no terceiro parágrafo do n.° 2 ficará sujeito ao disposto nos n. os  2, 3 e 4 do artigo 6.°»

6
Nos termos do anexo III, fase 2, n.° 1, da directiva «[t]odos os locais identificados pelos Estados‑Membros na fase I que abriguem tipos de habitat natural e/ou espécies prioritários serão considerados locais de importância comunitária».

7
O artigo 6.° da directiva dispõe que:

«[…]

2.       Os Estados‑Membros tomarão as medidas adequadas para evitar, nas zonas especiais de conservação, a deterioração dos habitats naturais e dos habitats de espécies, bem como as perturbações que atinjam as espécies para as quais as zonas foram designadas, na medida em que essas perturbações possam vir a ter um efeito significativo, atendendo aos objectivos da presente directiva.

3.       Os planos ou projectos não directamente relacionados com a gestão do sítio e não necessários para essa gestão, mas susceptíveis de afectar esse sítio de forma significativa, individualmente ou em conjugação com outros planos e projectos, serão objecto de uma avaliação adequada das suas incidências sobre o sítio no que se refere aos objectivos de conservação do mesmo. Tendo em conta as conclusões da avaliação das incidências sobre o sítio e sem prejuízo do disposto no n.° 4, as autoridades nacionais competentes só autorizarão esses planos ou projectos depois de se terem assegurado de que não afectarão a integridade do sítio em causa e de terem auscultado, se necessário, a opinião pública.

4.       Se, apesar de a avaliação das incidências sobre o sítio ter levado a conclusões negativas e na falta de soluções alternativas, for necessário realizar um plano ou projecto por outras razões imperativas de reconhecido interesse público, incluindo as de natureza social ou económica, o Estado‑Membro tomará todas as medidas compensatórias necessárias para assegurar a protecção da coerência global da rede Natura 2000. O Estado‑Membro informará a Comissão das medidas compensatórias adoptadas.

No caso de o sítio em causa abrigar um tipo de habitat natural e/ou uma espécie prioritária, apenas podem ser evocadas razões relacionadas com a saúde do homem ou a segurança pública ou com consequências benéficas primordiais para o ambiente ou, após parecer da Comissão, outras razões imperativas de reconhecido interesse público.»

8
O artigo 21.° da directiva prevê que as medidas projectadas são adoptadas de acordo com um procedimento de comité.

9
Segundo o artigo 23.° da directiva, a transposição da mesma para o direito interno, pelos Estados‑Membros, deve ser realizada no prazo de dois anos a contar da notificação da directiva. Essa notificação foi efectuada em 10 de Junho de 1992.

A legislação nacional

10
A directiva foi transposta para a ordem jurídica italiana pelo Decreto n.° 357 do Presidente da República, de 8 de Setembro de 1997 intitulado «Regulamento para execução da Directiva 92/43/CEE relativa à conservação dos habitats naturais bem como da fauna e da flora selvagens» (GURI n.° 248, «supplemento ordinario n.° 219/L», de 23 de Outubro de 1997, a seguir «Decreto n.° 357/97»).

11
Em especial, o artigo 4.° do Decreto n.° 357/97 associa as medidas de conservação dos sítios à elaboração, por parte da Comissão, da lista dos sítios de importância comunitária.


Litígio no processo principal e questão prejudicial

12
Foi adjudicado à Dragaggi, em 14 de Maio de 2001, um contrato de empreitada relativo a trabalhos de dragagem e de descarga de sedimentos num aterro no porto de Monfalcone.

13
Quatro meses mais tarde, a administração adjudicante anulou todo o processo de adjudicação do concurso, pelo facto de o aterro destinado a acolher os sedimentos resultantes dos referidos trabalhos ser qualificado como sítio de interesse comunitário, devendo ser sujeito a avaliação das incidências por força da legislação nacional pertinente. Ora, tal avaliação não podia, segundo a autoridade competente, ser positiva.

14
A Dragaggi contestou, perante o Tribunale amministrativo regionale del Friuli Venezia Giulia (Itália), a legalidade da decisão de anulação da adjudicação. Sustentou, designadamente, que o procedimento de classificação, como sítio de importância comunitária, do sítio «Foce del Timavo» (foz do Timavo), onde se situa o aterro abrangido pelos projectos de dragagem, ainda não estava terminado. Com efeito, apesar de as autoridades italianas terem proposto à Comissão uma lista de sítios, entre os quais o da foz do Timavo, ela não tinha ainda adoptado a lista comunitária, em conformidade com o artigo 4.°, n.° 2, terceiro parágrafo, da directiva. Por isso, a obrigação de realizar uma avaliação prévia dos projectos que têm uma incidência significativa sobre o sítio não era ainda aplicável.

15
Na sua sentença, aquele órgão jurisdicional julgou inadmissível o argumento baseado na inaplicabilidade ao projecto em causa do procedimento de avaliação das incidências. Segundo o Tribunale amministrativo regionale del Friuli Venezia Giulia, quando um Estado‑Membro tenha identificado, como no caso em apreço, um sítio que aloje um habitat prioritário e que o tenha feito constar da lista proposta à Comissão, esse sítio deve, segundo o anexo III, fase 2, n.° 1, da directiva, ser considerado de importância comunitária. Assim, está sujeito, por força do artigo 4.°, n.° 5, da directiva, às medidas de protecção a que se refere o artigo 6.°, n. os  2 a 4, dessa mesma directiva, e, designadamente, à avaliação das incidências prevista no n.° 3.

16
Segundo o referido órgão jurisdicional, esta abordagem é a única capaz de atribuir um significado lógico à directiva que, na medida em que se destina a proteger habitats ou espécies em perigo de desaparecimento e de extinção, deve poder ser directamente aplicada, mesmo que apenas como meio de salvaguarda. Por outro lado, os actos que propõem a classificação da foz do Timavo como sítio prioritário, e em especial o decreto do Ministro do Ambiente de 3 de Abril de 2000, não foram impugnados.

17
Considerando que era necessária uma avaliação das incidências, o Tribunale amministrativo regionale del Friuli Venezia Giulia acolheu as outras críticas da Dragaggi baseadas na falta de consulta do público interessado na realização do projecto, por as soluções alternativas às definidas no projecto não terem sido tomadas em consideração antes de se proceder à anulação dos actos do concurso e por a autoridade competente não ter avaliado a possibilidade de expressar uma apreciação positiva sujeita a condições.

18
A Dragaggi interpôs recurso da sentença do Tribunale amministrativo regionale del Friuli Venezia para o Consiglio di Stato. Reiterou, em especial, perante este último, a argumentação segundo a qual o artigo 4.°, n.° 5, da directiva apenas impõe a aplicação das medidas de conservação referidas no artigo 6.° da mesma directiva após a elaboração da lista comunitária. Entende que esta posição é confirmada pelo artigo 4.° do Decreto n.° 357/97, que preceitua que as medidas de preservação devem ser adoptadas nos três meses que se seguem à inscrição do sítio na lista elaborada pela Comissão.

19
O Consiglio di Stato salienta que, na medida em que a inscrição dos sítios de importância comunitária que alojem habitats prioritários parece ser um acto de natureza meramente declarativa, que não exige o exercício de qualquer poder discricionário por parte do órgão comunitário, a interpretação do artigo 4.°, n.° 5, da directiva adoptada pelo Tribunale amministrativo regionale del Friuli Venezia Giulia não deve ser considerada manifestamente infundada.

20
Nestas condições, o Consiglio di Stato decidiu suspender a instância e colocar ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«O artigo 4.°, n.° 5, da Directiva 92/43/CEE do Conselho, de 21 de Maio de 1992, deve ser interpretado no sentido de que as medidas previstas no artigo 6.°, especialmente a prevista no artigo 6.°, n.° 3, da mesma directiva, são obrigatórias para os Estados‑Membros só depois da aprovação definitiva, em sede comunitária, da lista dos sítios nos termos do artigo 21.°, ou, pelo contrário, deve ser interpretado no sentido de que, independentemente da determinação do momento a partir do qual devem ser aplicadas as medidas de conservação, é necessário fazer uma distinção entre inscrições declarativas e constitutivas (incluindo‑se entre as primeiras as relativas aos sítios prioritários), e de que, com o objectivo de salvaguardar o efeito útil da directiva destinada à conservação dos habitats, só no caso de identificação por um Estado‑Membro de um sítio de importância comunitária com tipos de habitats naturais ou espécies prioritárias se deve considerar que existe a obrigação de sujeitar a avaliação os planos e projectos com incidências significativas sobre o sítio, mesmo antes da elaboração pela Comissão do projecto de lista dos sítios ou da adopção definitiva da referida lista nos termos do artigo 21.° da directiva e, em substância, a partir da apresentação da lista nacional?»


Quanto à questão prejudicial

21
Há que referir que, por força do artigo 4.°, n.° 5, da directiva, o regime de protecção das zonas especiais de conservação previsto no artigo 6.°, n. os  2 a 4, da directiva se aplica a um sítio quando este último, em conformidade com o artigo 4.°, n.° 2, terceiro parágrafo, da directiva, esteja inscrito na lista dos sítios seleccionados como sítios de importância comunitária, elaborada pela Comissão nos termos do procedimento referido no artigo 21.° dessa directiva.

22
O facto de, segundo o anexo III, fase 2, n.° 1, da directiva, todos os sítios identificados pelos Estados‑Membros na fase 1 desse mesmo anexo, que alojem tipos de habitats naturais e/ou de espécies prioritárias, serem considerados sítios de importância comunitária não é susceptível de tornar aplicável, no que lhes diz respeito, o regime de conservação previsto no artigo 6.°, n. os  2 a 4, da directiva, antes de constarem, em conformidade com o seu artigo 4.°, n.° 2, terceiro parágrafo, na lista de sítios de importância comunitária decidida pela Comissão.

23
A tese contrária invocada pelo órgão jurisdicional de reenvio, segundo a qual, quando um Estado‑Membro tenha identificado, como sucedeu no caso em apreço no processo principal, um sítio que aloje um habitat prioritário e o tenha incluído na lista proposta à Comissão em aplicação do artigo 4.°, n.° 1, da directiva, esse sítio deve ser considerado de importância comunitária, tendo em conta o anexo III, fase 2, n.° 1, da directiva, e está, desde logo, sujeito, por força do artigo 4.°, n.° 5, da directiva, às medidas de protecção referidas no seu artigo 6.°, n. os  2 a 4, não procede.

24
Com efeito, por um lado, essa tese é contrária à redacção do artigo 4.°, n.° 5, da directiva, que associa expressamente a aplicação das referidas medidas de protecção ao facto de o sítio em causa estar inscrito, em conformidade com o artigo 4.°, n.° 2, terceiro parágrafo, da directiva, na lista de sítios de importância comunitária elaborada pela Comissão. Por outro lado, a referida tese pressupõe que, quando um sítio tenha sido identificado por um Estado‑Membro como alojando tipos de habitats naturais ou espécies prioritárias e que tenha sido incluído na lista proposta à Comissão nos termos do artigo 4.°, n.° 1, da directiva, a Comissão está obrigada a inscrever aquele sítio na lista de sítios de importância comunitária que decide segundo o procedimento referido no artigo 21.° da directiva e ao qual o artigo 4.°, n.° 2, terceiro parágrafo, da directiva faz referência. Se assim fosse, a Comissão, no decurso da elaboração, em acordo com cada Estado‑Membro, de um projecto de lista dos sítios de importância comunitária, nos termos do artigo 4.°, n.° 2, primeiro parágrafo, da directiva, estaria impedida de considerar a não inclusão nesse projecto de qualquer sítio proposto por um Estado‑Membro como alojando tipos de habitats naturais ou espécies prioritárias, mesmo na hipótese de considerar, não obstante o parecer contrário do Estado‑Membro em causa, que um determinado sítio não aloja tipos de habitats naturais e/ou espécies prioritárias, referidos no anexo III, fase 2, n.° 1, da directiva. Ora, tal situação seria contrária, designadamente, ao artigo 4.°, n.° 2, primeiro parágrafo, da directiva, lido em conjugação com o anexo III, fase 2, n.° 1, desta última.

25
Resulta portanto do que precede que o artigo 4.°, n.° 5, da directiva deve ser interpretado no sentido de que as medidas de protecção previstas no artigo 6.°, n. os  2 a 4, da directiva apenas se impõem em relação aos sítios que, nos termos do artigo 4.°, n.° 2, terceiro parágrafo, da directiva, estejam inscritos na lista de sítios seleccionados como sítios de importância comunitária, elaborada pela Comissão segundo o procedimento referido no artigo 21.° dessa directiva.

26
Contudo, daí não se conclui que os Estados‑Membros não devam proteger os sítios a partir do momento em que os proponham, nos termos do artigo 4.°, n.° 1, da directiva, na lista nacional que é transmitida à Comissão, como sítios susceptíveis de serem identificados como sítios de importância comunitária.

27
Com efeito, na falta de protecção adequada desses sítios a partir desse momento, a realização dos objectivos de conservação dos habitats naturais assim como da fauna e da flora selvagens, tal como indicados designadamente no sexto considerando da directiva e no seu artigo 3.°, n.° 1, corria o risco de ficar comprometida. Tal situação seria tanto mais grave quanto seriam abrangidos tipos de habitats naturais prioritários ou espécies prioritárias que, por força das ameaças que pesam sobre eles, poderiam beneficiar, tal como foi preconizado no quinto considerando da directiva, de uma rápida execução das medidas que têm por objecto a sua conservação.

28
No caso em apreço, há que recordar que das listas nacionais dos sítios susceptíveis de serem identificados como sítios de importância comunitária devem constar os sítios que revestem, a nível nacional, um interesse ecológico relevante, tendo em conta o objectivo de conservação dos habitats naturais, bem como da fauna e da flora selvagens, prosseguido pela directiva (v. acórdão de 7 de Novembro de 2000, First Corporate Shipping, C‑371/98, Colect., p. I‑9235, n.° 22).

29
Verifica‑se, consequentemente, que, no que se refere aos sítios susceptíveis de serem identificados como sítios de importância comunitária, mencionados nas listas nacionais transmitidas à Comissão, entre os quais podem constar, designadamente, sítios que alojam tipos de habitats naturais prioritários ou espécies prioritárias, os Estados‑Membros estão, por força da directiva, obrigados a tomar medidas de protecção que sejam adequadas para salvaguardar o referido interesse ecológico.

30
Consequentemente, deve responder‑se à questão colocada, declarando que:

O artigo 4.°, n.° 5, da directiva deve ser interpretado no sentido de que as medidas de protecção previstas no artigo 6.°, n. os  2 a 4, da directiva apenas se impõem em relação aos sítios que, nos termos do artigo 4.°, n.° 2, terceiro parágrafo, da directiva, estejam inscritos na lista de sítios seleccionados como sítios de importância comunitária, decidida pela Comissão segundo o procedimento referido no artigo 21.° dessa directiva.

No que se refere aos sítios susceptíveis de serem identificados como sítios de importância comunitária, que figuram nas listas nacionais transmitidas à Comissão e, em especial, aos sítios que alojam tipos de habitats naturais prioritários ou espécies prioritárias, os Estados‑Membros estão, por força da directiva, obrigados a tomar medidas de protecção que sejam adequadas, à luz do objectivo de conservação referido pela directiva, para salvaguardar o interesse ecológico pertinente que esses sítios revestem a nível nacional.


Quanto às despesas

31
Revestindo o processo quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efectuadas com a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça, que não sejam as das referidas partes, não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Segunda Secção) declara:

O artigo 4.°, n.° 5, da Directiva 92/43/CEE do Conselho, de 21 de Maio de 1992, relativa à preservação dos habitats naturais e da fauna e da flora selvagens, deve ser interpretado no sentido de que as medidas de protecção previstas no artigo 6.°, n. os  2 a 4, dessa directiva apenas se impõem em relação aos sítios que, nos termos do artigo 4.°, n.° 2, terceiro parágrafo, da directiva, estejam inscritos na lista de sítios seleccionados como sítios de importância comunitária, decidida pela Comissão das Comunidades Europeias segundo o procedimento referido no artigo 21.° dessa directiva.

No que se refere aos sítios susceptíveis de serem identificados como sítios de importância comunitária, que figuram nas listas nacionais transmitidas à Comissão e, em especial, aos sítios que alojam tipos de habitats naturais prioritários ou espécies prioritárias, os Estados‑Membros estão, por força da Directiva 92/43, obrigados a tomar medidas de protecção que sejam adequadas, à luz do objectivo de conservação referido pela directiva, para salvaguardar o interesse ecológico pertinente que esses sítios revestem a nível nacional.

Assinaturas.


1
Língua do processo: italiano.

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