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Documento 62001CJ0159

Acórdão do Tribunal (Quinta Secção) de 29 de Abril de 2004.
Reino dos Países Baixos contra Comissão das Comunidades Europeias.
Auxílios de Estado - Isenção parcial do imposto sobre os minerais a favor das culturas em estufa ou em substrato.
Processo C-159/01.

Colectânea de Jurisprudência 2004 I-04461

Identificador Europeu da Jurisprudência (ECLI): ECLI:EU:C:2004:246

Arrêt de la Cour

Processo C-159/01


Reino dos Países Baixos
contra
Comissão das Comunidades Europeias


«Auxílios de Estado – Isenção parcial do imposto sobre os minerais a favor das culturas em estufa ou em substrato»

Conclusões do advogado-geral P. Léger apresentadas em 12 de Junho de 2003
    
Acórdão do Tribunal de Justiça (Quinta Secção) de 29 de Abril de 2004
    

Sumário do acórdão

1.
Auxílios concedidos pelos Estados – Conceito – Diferenciação entre empresas em matéria de encargos – Exclusão – Condição – Diferenciação inerente ao sistema de encargos em questão – Ónus da prova que incumbe ao Estado‑Membro em causa

(Artigo 87.°, n.° 1, CE)

2.
Auxílios concedidos pelos Estados – Conceito – Isenção concedida no âmbito de um regime que comporta o pagamento de impostos mas não visa a obtenção de receitas fiscais – Irrelevância para efeitos de qualificação como auxílio

(Artigo 87.°, n.° 1, CE)

3.
Actos das instituições – Fundamentação – Obrigação – Alcance

(Artigo 253.° CE)

1.
Dado que o conceito de auxílio de Estado não visa as medidas que criam uma diferenciação entre empresas em matéria de encargos quando essa diferenciação resultar da natureza e da economia do sistema de encargos em causa, cabe ao Estado‑Membro que introduziu essa diferenciação demonstrar que é esse efectivamente o caso.

(cf. n.os  42, 43)

2.
O facto de uma medida estatal que prevê o pagamento de impostos por uma categoria de empresas não visar gerar receitas fiscais não é suficiente para fazer escapar desde logo a isenção, pela mesma prevista a favor de determinadas empresas, à qualificação como auxílio na acepção do artigo 87.° CE. Com efeito, o n.° 1 do referido artigo não faz a distinção segundo as causas ou os objectivos das intervenções estatais, mas define‑as em função dos seus efeitos.

(cf. n.° 51)

3.
O dever de fundamentação constitui uma formalidade essencial que se distingue da correcção da fundamentação, devendo esta ser apreciada à luz da legalidade material do acto controvertido. A fundamentação exigida pelo artigo 253.° CE deve ser adaptada à natureza do acto em causa e deixar transparecer, de forma clara e inequívoca, o raciocínio da instituição, autora do acto, por forma a permitir aos interessados conhecer as razões da medida adoptada e ao órgão jurisdicional competente exercer a sua fiscalização.

(cf. n.° 65)




ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção)
29 de Abril de 2004(1)

«Auxílios de Estado – Isenção parcial do imposto sobre os minerais a favor das culturas em estufa ou em substrato»

No processo C-159/01,

Reino dos Países Baixos, representado por J. van Bakel, na qualidade de agente, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

recorrente,

contra

Comissão das Comunidades Europeias, representada por D. Triantafyllou e H. van Vliet, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

recorrida,

que tem por objecto a anulação parcial da Decisão 2001/371/CE da Comissão, de 21 de Dezembro de 2000, relativa à isenção dos impostos sobre os minerais que os Países Baixos tencionam conceder no quadro da lei relativa ao estrume (JO 2001, L 130, p. 42),



O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção),,



composto por: P. Jann, exercendo funções de presidente da Quinta Secção, A. Rosas e S. von Bahr (relator), juízes,

advogado-geral: P. Léger,
secretário: M.-F. Contet, administradora principal,

ouvidas as alegações das partes na audiência de 29 de Janeiro de 2003, na qual o Reino dos Países Baixos foi representado por C. M. Wissels, na qualidade de agente, e a Comissão, por M. van Vliet,

ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 12 de Junho de 2003,

profere o presente



Acórdão



1
Por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal de Justiça em 11 de Abril de 2001, o Reino dos Países Baixos solicitou, ao abrigo do artigo 230.° CE, a anulação parcial da Decisão 2001/371/CE da Comissão, de 21 de Dezembro de 2000, relativa à isenção dos impostos sobre os minerais que os Países Baixos tencionam conceder no quadro da lei relativa ao estrume (JO 2001, L 130, p. 42, a seguir «decisão impugnada»).


Enquadramento jurídico

Regulamentação comunitária

2
O artigo 87.°, n.° 1, CE estabelece:

«Salvo disposição em contrário do presente Tratado, são incompatíveis com o mercado comum, na medida em que afectem as trocas comerciais entre os Estados‑Membros, os auxílios concedidos pelos Estados ou provenientes de recursos estatais, independentemente da forma que assumam, que falseiem ou ameacem falsear a concorrência, favorecendo certas empresas ou certas produções.»

3
A comunicação 98/C 384/03 da Comissão sobre a aplicação das regras relativas aos auxílios estatais às medidas que respeitam à fiscalidade directa das empresas (JO C 384, p. 3, a seguir «comunicação relativa aos auxílios de Estado no domínio da fiscalidade directa») esclarece, no ponto 2, que, no caso das medidas fiscais, se propõe fornecer esclarecimentos sobre a qualificação de auxílio nos termos do artigo 87.°, n.° 1, CE.

4
Segundo o ponto 16 da comunicação relativa aos auxílios de Estado no domínio da fiscalidade directa, «[o] critério principal para a aplicação do n.° 1 do artigo [87.°] [CE] a uma medida fiscal é, por conseguinte, o facto de essa medida instituir, a favor de determinadas empresas do Estado‑Membro, uma excepção à aplicação do sistema fiscal. Por conseguinte, há que determinar em primeiro lugar o regime comum aplicável. Depois, é necessário examinar se a excepção ou as diferenciações no âmbito de tal regime se justificam ‘pela natureza ou pela economia do sistema’ fiscal, isto é, se emanam directamente dos princípios fundadores ou directores do sistema fiscal do Estado‑Membro em causa. Se assim não for, a medida constitui um auxílio estatal».

5
No ponto 23 da mesma comunicação, esclarece‑se que «[o] carácter distinto de algumas medidas não significa necessariamente que as mesmas devem ser consideradas como auxílios estatais. É o caso das medidas cuja racionalidade económica as torna ‘necessárias ou funcionais em relação à eficácia do sistema fiscal’. No entanto, é ao Estado‑Membro que compete fornecer essa justificação».

6
Nos termos do ponto 5.5.1 das orientações da Comunidade relativas aos auxílios estatais no sector agrícola, de 1 de Fevereiro de 2000 (JO C 28, p. 2), após terem sido rectificadas em 12 de Agosto de 2000 (JO C 232, p. 17, a seguir «orientações»), a Comissão indica que:

«[…] normalmente, não aprova auxílios ao funcionamento que libertem as empresas, incluindo os produtores agrícolas, de despesas resultantes da poluição ou dos danos por elas causados. A Comissão só admitirá excepções a esse princípio quando as circunstâncias o justifiquem realmente.»

7
Segundo o anexo III da Directiva 91/676/CEE do Conselho, de 12 de Dezembro de 1991, relativa à protecção das águas contra a poluição causada por nitratos de origem agrícola (JO L 375, p. 1, a seguir «directiva sobre os nitratos»), que estabelece as medidas a incluir em determinados programas de acção:

«[…]

2. Estas medidas devem assegurar que em cada exploração agrícola ou pecuária a quantidade de estrume animal aplicado anualmente nas terras, incluindo pelos próprios animais, não exceda um montante específico por hectare.

A quantidade específica por hectare será a quantidade de estrume que contenha 170 kg de azoto. No entanto:

a)
Para o primeiro programa de acção quadrienal, os Estados‑Membros poderão autorizar uma quantidade de estrume que contenha até 210 kg de azoto;

b)
Durante e após o primeiro programa de acção quadrienal, os Estados‑Membros poderão estabelecer quantidades diferentes das acima referidas. Essas quantidades deverão ser fixadas de modo a não prejudicar a prossecução dos objectivos especificados no artigo 1.° e deverão ser justificadas com base em critérios objectivos […]

[…]

No caso de um Estado‑Membro permitir a utilização de quantidades diferentes ao abrigo da alínea b), informará disso a Comissão que procederá à análise da justificação de acordo com o procedimento estabelecido no artigo 9.°

[…]»

Regulamentação nacional

8
O regime de utilização dos fertilizantes é um sistema de tributação dos minerais denominado «Mineralenaangiftesysteem» (regime do imposto sobre os minerais, a seguir «regime MINAS»). Os direitos e obrigações aplicáveis por força do regime MINAS regem‑se pelos artigos 14.° a 54.° da Wet van 27 november 1986 houdende regelen inzake het verhandelen van meststoffen en de afvoer van mestoverschotten (lei de 27 de Novembro de 1986 que regulamenta o comércio dos fertilizantes e a evacuação dos excedentes de fertilizantes, Stbl. 1986, p. 590), com a redacção que lhe foi dada pela lei de 16 de Setembro de 1999 (Stbl. 1999, p. 406, a seguir «Meststoffenwet»).

9
O regime MINAS é um regime de regulação da utilização dos fertilizantes pela aplicação de «normas de perdas». Tem por finalidade reduzir as perdas de azoto e de fosfatos nas explorações agrícolas por infiltração no ambiente. Para atingir este objectivo, obriga o agricultor a não ocasionar perdas de azoto e de fosfatos que sejam nocivas para o ambiente.

10
O regime MINAS baseia‑se na ideia de uma utilização equilibrada do azoto e dos fosfatos pelos agricultores. A utilização de fosfatos e de azoto a montante da produção não deve ser mais importante que a evacuação desses minerais a jusante da produção, com uma perda tolerada. A «perda tolerada» é determinada pelas normas de perdas de azoto e de fosfatos que estão previstas na Meststoffenwet, e que foram definidas com a intenção de proteger o ambiente. Todos os agricultores têm de pagar um imposto, em conformidade com o capítulo IV dessa lei, quando a utilização a montante de azoto e de fosfatos numa exploração for mais importante do que a evacuação destes minerais, em medida superior às normas em matéria de perdas previstas pela referida lei.

11
As autoridades neerlandesas instituíram uma possibilidade de isenção ao abrigo do regeling van 12 januari 1999 van de Minister van Landbouw, Natuurbeheer en Visserij (regulamento de 12 de Janeiro de 1999 do Ministro da Agricultura, do Ambiente e das Pescas, Stbl. 1999, n.° 9, a seguir «regulamento de isenção»).

12
Em conformidade com o artigo 2.° do regulamento de isenção, as pequenas explorações de pecuária extensiva, chamadas «explorações hobby», beneficiam de isenção total.

13
Por força dos artigos 3.° a 9.° do regulamento de isenção, as explorações hortícolas que praticam a cultura em estufa ou em substrato estão isentas do imposto até ao limite de uma quantidade máxima de fertilizante tributável de 460 kg de fosfatos e de 800 kg de azoto por hectare da média da superfície de suporte da cultura ou do terreno efectivamente utilizados para a exploração através destas formas de cultura durante o ano civil.

14
Nos termos do artigo 11.°, alínea b), do regulamento de isenção, os viveiros que exerçam também uma cultura em estufa ou em substrato beneficiam da mesma isenção parcial, no que respeita aos fosfatos, que a prevista no artigo 3.° deste regulamento para as explorações hortícolas indicadas no número anterior.

15
Segundo o artigo 13.° do regulamento de isenção, essas isenções são aplicáveis com efeitos retroactivos a partir de 1 de Janeiro de 1998, o que corresponde à data de entrada em vigor do regime dos impostos instituído pelo capítulo IV da Meststoffenwet.


Matéria de facto na origem do litígio

16
Por carta de 7 de Outubro de 1999, registada em 13 de Outubro seguinte, o Reino dos Países Baixos notificou a Comissão de certas isenções dos impostos sobre os minerais introduzidas pela Meststoffenwet. Também lhe transmitiu informações complementares por carta de 10 de Janeiro de 2000.

17
Em primeiro lugar, as explorações hobby ficaram isentas dos impostos sobre os minerais. Em segundo lugar, as explorações hortícolas que praticam a cultura em estufa ou em substrato beneficiaram de uma isenção parcial dos referidos impostos. Em terceiro lugar, previu‑se uma isenção para os viveiros.

18
As autoridades neerlandesas alegaram que as isenções dos impostos em causa se justificavam pela «natureza ou pela economia do sistema» no sentido da comunicação sobre os auxílios estatais no domínio da fiscalidade directa, e que, portanto, não constituíam auxílios de Estado na acepção do artigo 87.°, n.° 1, CE.

19
No que respeita às explorações hortícolas e aos viveiros que praticam actividades hortícolas, as autoridades neerlandesas sustentaram que as isenções forfetárias de 460 kg de fosfatos e 800 kg de azoto previstas para as empresas em causa foram calculadas com base nos dados resultantes de uma pesquisa do centro de investigação sobre a floricultura e as plantas hortícolas de estufa relativa à absorção de fosfatos e de azoto pelas plantas de estufa. Esses dados revelaram que a absorção de fosfatos e de azoto pelas plantas cultivadas em estufa era, em média, de 460 kg de fosfatos e de 800 kg de azoto por ano e por hectare. Era, assim, claramente muito mais elevada do que a das plantas cultivadas ao ar livre. Isto explica‑se pelo facto de a produção de plantas em estufa ser oito vezes superior à de plantas ao ar livre. É a razão pela qual esses valores são superiores aos aplicados às empresas agrícolas e superiores às normas previstas pela directiva sobre os nitratos.

20
Por oficio de 20 de Março de 2000, a Comissão notificou ao Reino dos Países Baixos a sua decisão de dar início ao procedimento previsto no artigo 88.°, n.° 2, CE relativamente às isenções previstas.

21
No que respeita à isenção prevista a favor da horticultura, a Comissão observou que importava, tendo em conta a «natureza ou a economia do sistema», equiparar o terreno ou substrato utilizado aos terrenos agrícolas e aplicar as mesmas normas em matéria de utilização de minerais. No quadro de uma aplicação normal do regime de entradas e saídas, a igualdade de tratamento ficaria assim garantida e deixaria de se poder falar em auxílio de Estado. A Comissão observou que a utilização possível parecia ser muito mais elevada (460 kg de fosfatos e 800 kg de azoto por hectare). Em seu entender, portanto, não parecia haver qualquer razão inerente ao sistema para conceder a isenção proposta à horticultura.

22
No que respeita à isenção dos viveiros que desenvolvem actividades hortícolas, a Comissão sublinhou que não parecia existir qualquer razão para conceder a isenção prevista, na medida em que a mesma regulamentação se aplicava igualmente à horticultura ligada ao solo e à horticultura não ligada ao solo.

23
Por último, a Comissão indicou ter dúvidas quanto à compatibilidade da Meststoffenwet e do regulamento de isenção com a directiva sobre os nitratos.

24
Designadamente, a Comissão indicou que a quantidade autorizada de azoto para os viveiros e a horticultura se situa a um nível muito superior ao das normas da directiva sobre os nitratos (170 kg de azoto por hectare; a título excepcional, é autorizada, por um período de quatro anos, uma quantidade máxima de 210 kg). A Comissão sublinhou que, não existindo dados sobre a dispersão de nitratos na água e tendo em conta o facto de a quantidade permitida de azoto se situar muito acima das normas da referida directiva sobre os nitratos, tinha dúvidas quanto às consequências ambientais das isenções previstas.

25
Assim, a Comissão instaurou o procedimento previsto no artigo 88.°, n.° 2, CE. Convidou os interessados a apresentar as suas observações sobre a medida de auxílio em causa.

26
Por carta enviada à Comissão em 17 de Maio de 2000, o Reino dos Países Baixos apresentou as suas observações em resposta à abertura do procedimento. Em seu entender, a medida em causa, atentos os seus conteúdo e objectivo, não podia ser considerada uma medida fiscal cuja isenção constituía um auxílio de Estado na acepção do artigo 87.° CE. As autoridades neerlandesas também indicaram que as objecções da Comissão, ao abrigo da directiva sobre os nitratos, não deviam ser examinadas no âmbito de um procedimento relativo aos auxílios de Estado.


A decisão impugnada

27
No n.° 34 dos considerandos da decisão impugnada, a Comissão observa que, na ausência de informações adicionais, persistem as dúvidas que a levaram a dar início ao procedimento contra as isenções propostas pelo Reino dos Países Baixos.

28
A Comissão indica, no n.° 36 dos considerandos dessa decisão, que, no caso em apreço, um Estado‑Membro concede um auxílio a determinadas empresas dado que as mesmas são isentas do pagamento de certos impostos.

29
No n.° 38 da mesma decisão, a Comissão sublinha que as autoridades dos Países Baixos não apresentaram nenhum argumento novo no que diz respeito aos viveiros e às explorações hortícolas.

30
Por conseguinte, a Comissão mantém, no n.° 39 dos considerandos da decisão impugnada, as reservas que já havia formulado contra a isenção parcial das explorações hortícolas e dos viveiros que desenvolvem actividades hortícolas. No tocante à isenção da horticultura, é normal, atenta a natureza e o objectivo geral do sistema, a equiparação do terreno ou substrato utilizado aos terrenos agrícolas e aplicar as normas aplicáveis a esses terrenos agrícolas. No caso em apreço, todavia, as quantidades autorizadas eram muito superiores (460 kg de fosfatos e 800 kg de azoto por hectare). O imposto só é devido caso essas quantidades sejam excedidas. Assim, não há razão inerente ao sistema para que seja concedida a isenção prevista para a horticultura e as autoridades neerlandesas tão‑pouco apresentaram qualquer justificação desse tipo.

31
Segundo a Comissão, no n.° 40 dos considerandos da decisão impugnada, as isenções satisfaziam todas as condições dos pontos 9 e 10 da comunicação sobre os auxílios estatais no domínio da fiscalidade directa, comunicação essa que é aplicável por analogia. A medida em causa confere ao beneficiário uma vantagem que diminui os encargos que normalmente têm de suportar; essa vantagem é concedida pelo Estado (perda de receitas); a referida medida pode afectar as trocas comerciais entre Estados‑Membros, caso esse que se verifica quando o beneficiário exerce uma actividade económica que é objecto dessas trocas comerciais e, por último, a medida em causa é específica ou selectiva.

32
No n.° 41 dos considerandos da mesma decisão, a Comissão indica que esse tipo de auxílio deve ser considerado um auxílio ao funcionamento. Esse auxílio, que se limita a reduzir os custos normais de funcionamento do operador, só confere ao beneficiário uma vantagem económica limitada no tempo, que cessa de existir assim que são efectuados os pagamentos, podendo, nomeadamente, falsear a concorrência.

33
A Comissão sublinha, no n.° 42 dos considerandos da decisão impugnada, referindo‑se ao ponto 5.5.1 das orientações, que, em circunstâncias normais, os auxílios ao funcionamento não são autorizados. Esses auxílios só podem ser autorizados se forem temporários e degressivos, o que não se verifica no caso do auxílio em causa.

34
No n.° 43 dos considerandos da mesma decisão, a Comissão observa que os exames previstos nos artigos 87.° CE e 89.° CE compreendem, designadamente, uma verificação da compatibilidade com outros diplomas legais comunitários. Segundo a Comissão, um procedimento relativo aos auxílios de Estado nunca pode conduzir a um resultado contrário às normas específicas do Tratado CE, neste caso o artigo 174.° CE, nem à regulamentação comunitária adoptada com base nessas disposições. De qualquer modo, a Comissão considera que, independentemente da compatibilidade da regulamentação neerlandesa com a directiva sobre os nitratos, a vantagem em questão deve ser considerada um simples auxílio ao funcionamento.

35
À luz destas considerações, a Comissão conclui, no n.° 44 dos considerandos da decisão impugnada, que as isenções fiscais propostas a favor das explorações hobby, das explorações hortícolas e dos viveiros que desenvolvem actividades hortícolas não podem ser consideradas no interesse comunitário, pelo que não podem beneficiar da excepção prevista no n.° 3, alínea c), do artigo 87.° CE.

36
Os artigos 1.° a 3.° da decisão impugnada encontram‑se redigidos da seguinte forma:

«Artigo 1.°

As isenções de impostos que os Países Baixos prevêem conceder no quadro do regime MINAS em favor das ‘empresas‑hobby’ (‘hobbyisten’), das empresas hortícolas e dos viveiros que desenvolvem actividades hortícolas são incompatíveis com o mercado comum, pelo que o auxílio em causa não pode ser concedido.

Artigo 2.°

Os Países Baixos transmitirão à Comissão, no prazo de dois meses a contar da data da comunicação da presente decisão, as medidas adoptadas para execução da mesma.

Artigo 3.°

O Reino dos Baixos é o destinatário da presente decisão.»


Recurso no Tribunal de Justiça

37
O Reino dos Países Baixos pede ao Tribunal de Justiça que anule a decisão impugnada, na medida em que diz respeito à isenção a favor das explorações hortícolas e viveiros que praticam a cultura em estufa ou em substrato.

38
Em apoio do seu recurso, alega que a Comissão violou os artigos 87.° CE e 253.° CE ao considerar que a referida isenção constitui um auxílio de Estado incompatível com o mercado comum. O Reino dos Países Baixos sustenta, designadamente, que a isenção concedida à cultura em estufa ou em substrato não constitui um auxílio de Estado proibido, na medida em que se justifica pela economia e pela natureza do regime MINAS.

39
A Comissão pede ao Tribunal que negue provimento ao recurso e que condene o Reino dos Países Baixos nas despesas.


Quanto ao primeiro fundamento, decorrente da violação do artigo 87.°, n.° 1, CE

Quanto à primeira parte relativa à existência de uma vantagem que diminui os encargos das explorações que praticam a cultura em estufa ou em substrato

40
O Governo neerlandês sustenta que a isenção parcial do imposto sobre os minerais não confere qualquer vantagem às explorações que praticam a cultura em estufa ou em substrato, antes se destinando a tomar em consideração a natureza do regime MINAS. Indica que, em conformidade com a natureza desse regime, as explorações não têm que pagar impostos pelas quantidades de azoto e de fosfatos que são absorvidas pelas plantas cultivadas, sendo essas quantidades evacuadas da exploração quando as plantas daí são retiradas. Segundo este governo, a absorção de azoto e de fosfatos pelas plantas cultivadas em estufa ou em substrato é oito vezes superior à das plantas cultivadas no solo ao ar livre. Alega que isso resulta, por um lado, do facto de a cultura de plantas em estufa ou em substrato ser muito mais intensiva do que a agricultura no solo ao ar livre e, por outro, de a cultura de plantas em estufa ou em substrato ser independente das estações. Nestas circunstâncias, justificava‑se permitir aos empresários hortícolas em estufa ou em substrato incorporarem no solo, sem necessitar de pagar impostos, quantidades anuais de 460 kg de fosfatos e de 800 kg de azoto por hectare, quantidades bem mais elevadas do que as autorizadas para a agricultura no solo ao ar livre. O Governo neerlandês alega ter apresentado estes argumentos à Comissão ao longo do procedimento administrativo. Ora, a Comissão nunca explicou claramente as críticas concretas que fazia relativamente à isenção a favor da cultura de plantas em estufa ou em substrato.

41
A Comissão contesta esta última afirmação. Alega que desde o início solicitou ao Reino dos Países Baixos que justificasse o facto de as normas serem muito menos rigorosas para as explorações hortícolas do que para os agricultores tradicionais. Reiterou as suas dúvidas sobre essa justificação na sua decisão de proceder à abertura do procedimento. Nesta última decisão, também pediu ao Reino dos Países Baixos que lhe comunique todas as informações susceptíveis de serem úteis para efeitos da apreciação da referida isenção. Ora, este não demonstrou que a isenção concedida aos horticultores se justificava efectivamente devido à existência de taxas mais elevadas de absorção de azoto e de fosfatos pelas plantas produzidas nas explorações hortícolas. Segundo a Comissão, as quantidades anuais de 460 kg de fosfato e de 800 kg de azoto baseiam‑se num acordo celebrado entre as autoridades neerlandesas e os agricultores, o que não implica necessariamente normas estabelecidas de acordo com um ponto de vista puramente científico.

42
A este respeito, cabe indicar que o conceito de auxílio foi efectivamente interpretado pelo Tribunal de Justiça como não visando as medidas que criam uma diferenciação entre empresas em matéria de encargos quando essa diferenciação resultar da natureza e da economia do sistema de encargos em causa (v., neste sentido, acórdão de 2 de Julho de 1974, Itália/Comissão, 173/73, Colect., p. 709, n.° 33; de 17 de Março de 1993, Sloman Neptun, C‑72/91 e C‑73/91, Colect., p. I‑887, n.° 21; de 20 de Setembro de 2001, Banks, C‑390/98, Colect., p. I‑6117, n.° 3, e de 26 Setembro de 2002, Espanha/Comissão, C‑351/98, Colect., p. I‑8031, n.° 43).

43
Cabe ao Estado‑Membro que introduziu essa diferenciação entre empresas em matéria de encargos demonstrar que essa diferenciação se justifica efectivamente pela natureza e pela economia do sistema em causa.

44
No caso em apreço, importa observar, como o advogado‑geral refere nos n.os 68 e 69 das suas conclusões, que, embora pareça provável que, numa superfície de produção comparável, a cultura em estufa ou em substrato permita, num período de um ano, uma absorção de fosfatos e de azoto pelos vegetais mais elevada do que a cultura no solo ao ar livre, dos argumentos apresentados pelo Governo neerlandês não resulta que essa absorção seja oito vezes superior à das plantas cultivadas no solo ao ar livre e que corresponda às quantidades anuais médias de 460 kg de fosfatos e de 800 kg de azoto por hectare.

45
Dos elementos dos autos resulta que a Comissão informou o Governo neerlandês, ao longo do procedimento administrativo, de que não ficara convencida pela justificação da isenção controvertida baseada na muito maior absorção de azoto e de fosfatos pelas plantas cultivadas em estufa ou em substrato indicada no número anterior.

46
Nestas circunstâncias, as autoridades neerlandesas deveriam, para demonstrar que a isenção controvertida se justificava pela natureza e economia do sistema em causa, ter apresentado provas científicas do que afirmavam. Todavia, não apresentaram qualquer prova nesse sentido.

47
Assim, importa reconhecer que foi correctamente que a Comissão concluiu, nos n.os 39 e 40 dos considerandos da decisão impugnada, que a isenção controvertida não se justificava pela natureza e economia do regime MINAS, antes conferindo ao beneficiário uma vantagem que diminui os encargos que este devia normalmente de suportar.

48
Consequentemente, a primeira parte do primeiro fundamento não pode ser acolhida.

Quanto à segunda parte relativa à existência de um auxílio concedido pelo Estado ou através de recursos de Estado

49
O Governo neerlandês alega que a Comissão ignorou a natureza do regime MINAS na decisão impugnada. O regulamento de isenção para as culturas em estufa ou em substrato não é, pela sua própria natureza, uma vantagem conferida pelo Estado ou através de recursos de Estado. O referido regime também não visa gerar receitas fiscais para o Estado, mas regular o comportamento dos agricultores e, mais concretamente, fazê‑los adoptar medidas para reduzir o consumo de adubos e a sua disseminação no ambiente a um nível aceitável. O regime MINAS deve ser considerado um instrumento de conservação do património natural comparável às coimas e às multas. O Governo neerlandês sustenta que, na medida em que o Estado renuncia a receitas provenientes dos impostos devido a essa isenção, trata‑se de impostos que não se relacionam com a poluição efectiva do solo.

50
Antes de mais, o Tribunal de Justiça já declarou, no n.° 47 do presente acórdão, que foi correctamente que a Comissão concluiu que a isenção controvertida a favor da cultura em estufa e em substrato constitui uma vantagem que diminui os encargos dos agricultores que praticam este tipo de cultura.

51
Cabe sublinhar, em seguida, que o argumento do Governo neerlandês segundo o qual o regime MINAS não visa gerar receitas fiscais não é suficiente para fazer escapar de repente a isenção controvertida à qualificação de auxílio na acepção do artigo 87.° CE. Com efeito, o n.° 1 do referido artigo não faz a distinção segundo as causas ou os objectivos das intervenções estatais, mas define‑as em função dos seus efeitos (acórdãos de 29 de Fevereiro de 1996, Bélgica/Comissão, C‑56/93, Colect., p. I‑723, n.° 79; de 26 de Setembro de 1996, França/Comissão, C‑241/94, Colect., p. I‑4551, n.° 20, e de 17 de Junho de 1999, Bélgica/Comissão, C‑75/97, Colect., p. I‑3671, n.° 25).

52
No caso em apreço, o Governo neerlandês não contesta que a isenção controvertida conduz a uma perda de receitas que deviam ter revertido a favor do orçamento de Estado. Limita‑se a sustentar que essa isenção não autoriza o beneficiário desta a poluir mais o solo do que o agricultor tradicional que está integralmente sujeito ao imposto sobre os minerais.

53
Ora, a argumentação segundo a qual a isenção a favor da cultura em estufa ou em substrato não conduz a uma maior poluição do solo do que a agricultura tradicional em virtude de uma muito maior absorção de fosfatos e de azoto pelas plantas cultivadas em estufa ou em substrato do que pelas plantas cultivadas no solo ao ar livre, foi rejeitada pelo Tribunal no âmbito da primeira parte deste fundamento.

54
Consequentemente, a segunda parte do primeiro fundamento não pode ser acolhida.

Quanto à terceira para relativa à afectação das trocas comerciais entre os Estados‑Membros

55
O Governo neerlandês alega que as trocas comerciais só seriam afectadas ou a concorrência falseada se às explorações que praticam este tipo de cultura nos Países Baixos se conferisse o direito de utilizar mais adubos no solo do que aos outros agricultores. Não é o que se verifica no caso em apreço, pois a isenção controvertida visa a quantidade de minerais nos adubos utilizados que em seguida saem da exploração em virtude da evacuação dos produtos vegetais e, portanto, não poluem o solo.

56
Antes de mais, importa indicar, como sublinhado pelo advogado‑geral no n.° 88 das suas conclusões, que a argumentação do Governo neerlandês assenta na premissa de que a isenção controvertida se justifica pela natureza e pela economia do regime MINAS, na medida em que corresponde às quantidades de minerais absorvidas pelas plantas cultivadas e que são evacuadas da exploração sem poluir o solo. Ora, o Tribunal já rejeitou esta argumentação no quadro da apreciação da primeira parte deste fundamento.

57
O Governo neerlandês não tenta pôr em causa, por outras razões, a justeza das conclusões da Comissão, enunciadas nos n.os 40 e 41 dos considerandos da decisão impugnada, segundo as quais a isenção controvertida pode afectar as trocas comerciais dos produtos hortícolas, que são objecto de transacções consideráveis a nível internacional, e que a isenção controvertida, por diminuir os custos normais de exploração do beneficiário, pode falsear a concorrência.

58
Consequentemente, a terceira parte do primeiro fundamento não pode ser acolhida.


Quanto ao segundo fundamento, decorrente da compatibilidade da isenção controvertida com a directiva sobre os nitratos

59
O Governo neerlandês alega que a Comissão baseou a decisão impugnada numa violação da directiva sobre os nitratos. Ora, esta instituição não podia fundar uma decisão sobre auxílios de Estado numa violação da referida directiva.

60
A este propósito, importa indicar que a Comissão se baseou na existência de um auxílio de Estado incompatível com o mercado comum nos termos do artigo 87.°, n.° 1, CE. No quadro da sua apreciação, a Comissão concluiu, nos n.os 41 e 42 dos considerandos da decisão impugnada, que a isenção controvertida devia ser considerada um auxílio ao funcionamento, destinado a diminuir os custos normais dos empresários em causa, que não cumpria as condições exigidas para beneficiar de uma derrogação nos termos do artigo 87.°, n.° 3, CE ou nos termos das orientações.

61
Embora seja verdade que a Comissão, no n.° 43 dos considerandos da decisão impugnada, recordou a jurisprudência segundo a qual um procedimento relativo a um auxílio de Estado nunca pode conduzir a um resultado contrário às normas específicas do Tratado (acórdão de 15 de Junho de 1993, Matra/Comissão, C‑225/91, Colect., p. I‑3203, n.° 41), concluiu que, independentemente de qual possa ser a compatibilidade da regulamentação nacional com a directiva sobre os nitratos, a vantagem devia ser considerada um simples auxílio ao funcionamento.

62
Nestas condições, a Comissão não baseou a decisão impugnada numa violação da directiva sobre os nitratos.

63
Há que, por conseguinte, julgar o segundo fundamento improcedente.


Quanto ao terceiro fundamento, decorrente da violação do dever de fundamentação

64
O Governo neerlandês acusa a Comissão de não ter apresentado as razões pelas quais considera que as isenções anuais de 460 kg de fosfatos e de 800 kg de azoto por hectare a favor da cultura em estufa ou em substrato eram demasiado elevadas.

65
A este propósito, cabe recordar que o dever de fundamentação constitui uma formalidade essencial que se distingue da correcção da fundamentação, devendo esta ser apreciada à luz da legalidade material do acto controvertido. Segundo jurisprudência constante, a fundamentação exigida pelo artigo 253.° CE deve ser adaptada à natureza do acto em causa e deixar transparecer, de forma clara e inequívoca, o raciocínio da instituição, autora do acto, por forma a permitir aos interessados conhecer as razões da medida adoptada e ao órgão jurisdicional exercer a sua fiscalização (v., designadamente, acórdãos de 13 de Março de 1985, Países Baixos e Leeuwarder Papierwarenfabriek/Comissão, 296/82 e 318/82, Recueil, p. 809, n.° 19; de 14 de Fevereiro de 1990, Delacre e o./Comissão, C‑350/88, Colect., p. I‑395, n.° 15; de 29 de Fevereiro de 1996, Bélgica/Comissão, C‑56/93, Colect., p. I‑723, n.° 86, e de 2 de Abril de 1998, Comissão/Sytraval e Brink’s France, C‑367/95 P, Colect., p. I‑1719, n.° 63).

66
No caso em apreço, a Comissão esclareceu, designadamente nos n.os 34, 38 e 39 dos considerandos da decisão impugnada, que, na ausência de outros dados e de novos argumentos das autoridades neerlandesas, era norma, atenta a natureza e o objectivo geral do sistema, equiparar o solo ou o substrato utilizados aos terrenos agrícolas e aplicar as normas aplicáveis a esses terrenos agrícolas.

67
Importa sublinhar que esta fundamentação está adaptada à natureza do acto em causa e revela de forma clara e inequívoca o raciocínio da Comissão por forma a permitir ao Reino dos Países Baixos conhecer as razões da medida adoptada e ao Tribunal exercer a sua fiscalização.

68
Nestas condições, o terceiro fundamento também deve ser julgado improcedente.

69
Como nenhum dos fundamentos invocados pelo Governo neerlandês foi julgado procedente, há que, consequentemente, negar provimento ao presente recurso.


Quanto às despesas

70
Nos termos do artigo 69.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a Comissão pedido a condenação do Reino dos Países Baixos e tendo este sido vencido, há que condená‑lo nas despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção)

decide

1)
É negado provimento ao recurso.

2)
O Reino dos Países Baixos é condenado nas despesas.

Jann

Rosas

von Bahr

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 29 de Abril de 2004.

O secretário

O presidente

R. Grass

V. Skouris


1
Língua do processo: neerlandês.

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