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Documento 62001CJ0111

    Acórdão do Tribunal (Quinta Secção) de 8 de Maio de 2003.
    Gantner Electronic GmbH contra Basch Exploitatie Maatschappij BV.
    Pedido de decisão prejudicial: Oberster Gerichtshof - Áustria.
    Convenção de Bruxelas - Artigo 21.º - Litispendência - Compensação.
    Processo C-111/01.

    Colectânea de Jurisprudência 2003 I-04207

    Identificador Europeu da Jurisprudência (ECLI): ECLI:EU:C:2003:257

    62001J0111

    Acórdão do Tribunal (Quinta Secção) de 8 de Maio de 2003. - Gantner Electronic GmbH contra Basch Exploitatie Maatschappij BV. - Pedido de decisão prejudicial: Oberster Gerichtshof - Áustria. - Convenção de Bruxelas - Artigo 21.º - Litispendência - Compensação. - Processo C-111/01.

    Colectânea da Jurisprudência 2003 página I-04207


    Sumário
    Partes
    Fundamentação jurídica do acórdão
    Decisão sobre as despesas
    Parte decisória

    Palavras-chave


    1. Convenção relativa à competência judiciária e à execução de decisões - Litispendência - Pedidos com o mesmo objecto - Critérios de apreciação - Tomada em consideração apenas das pretensões dos demandantes com exclusão dos fundamentos de defesa

    (Convenção de Bruxelas de 27 de Setembro de 1968, artigo 21.° )

    2. Convenção relativa à competência judiciária e à execução de decisões - Protocolo relativo à interpretação da Convenção pelo Tribunal de Justiça - Questões prejudiciais - Competência do Tribunal de Justiça - Limites - Questão sem elementos que demonstrem a necessidade de uma resposta - Inadmissibilidade

    (Convenção de Bruxelas de 27 de Setembro de 1968; protocolo de 3 de Junho de 1971)

    Sumário


    1. O artigo 21.° da Convenção de 27 de Setembro de 1968 relativa à competência judiciária e à execução de decisões em matéria civil e comercial, após as modificações introduzidas pela Convenção de 9 de Outubro de 1978 relativa à adesão do Reino da Dinamarca, da Irlanda e do Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte, pela Convenção de 25 de Outubro de 1982 relativa à adesão da República Helénica, pela Convenção de 26 de Maio de 1989 relativa à adesão do Reino de Espanha e da República Portuguesa e pela Convenção de 29 de Novembro de 1996 relativa à adesão da República da Áustria, da República da Finlândia e do Reino da Suécia, deve ser interpretado no sentido de que, para apreciar se duas acções intentadas entre as mesmas partes em órgãos jurisdicionais de Estados contratantes diferentes têm o mesmo pedido, há que apenas ter em conta as pretensões dos respectivos demandantes, com exclusão dos fundamentos de defesa aduzidos por um demandado.

    Por um lado, com efeito, esta disposição apenas refere os pedidos respectivos das demandantes em cada um dos litígios, e não os fundamentos de defesa eventualmente aduzidos por um demandado. Por outro lado, existe uma situação de litispendência a partir do momento em que a dois órgãos jurisdicionais de Estados contratantes diferentes forem, de modo definitivo, submetidas acções, ou seja, antes de os demandados terem podido apresentar a respectiva posição.

    ( cf. n.os 26-27, 32, disp. )

    2. No âmbito da cooperação entre o Tribunal de Justiça e os órgãos jurisdicionais nacionais, instituída pelo Protocolo de 3 de Junho de 1971 relativo à interpretação da Convenção de 27 de Setembro de 1968 relativa à competência judiciária e à execução de decisões em matéria civil e comercial, compete ao Tribunal de Justiça, em hipóteses excepcionais, examinar as condições em que os pedidos lhe são submetidos pelos órgãos jurisdicionais nacionais para verificar a sua própria competência. Efectivamente, o espírito de colaboração que deve presidir ao funcionamento do reenvio prejudicial implica que, por seu lado, o juiz nacional tenha em atenção a função confiada ao Tribunal de Justiça, que é contribuir para a administração da justiça nos Estados-Membros e não emitir opiniões consultivas sobre questões gerais ou hipotéticas.

    Para permitir ao Tribunal de Justiça fornecer uma interpretação do direito comunitário que seja útil, é indispensável que o órgão jurisdicional nacional explique as razões por que considera que uma resposta às suas questões é necessária para a solução do litígio.

    Assim, é inadmissível uma questão prejudicial que não fornece ao Tribunal de Justiça elementos suficientes que justifiquem a necessidade de uma resposta a essa questão.

    ( cf. n.os 34, 35, 37, 38, 40, 41 )

    Partes


    No processo C-111/01,

    que tem por objecto um pedido dirigido ao Tribunal de Justiça, nos termos do Protocolo de 3 de Junho de 1971 relativo à interpretação pelo Tribunal de Justiça da Convenção de 27 de Setembro de 1968 relativa à competência judiciária e à execução de decisões em matéria civil e comercial, pelo Oberster Gerichtshof (Áustria), destinado a obter, no litígio pendente neste órgão jurisdicional entre

    Gantner Electronic GmbH

    e

    Basch Exploitatie Maatschappij BV,

    uma decisão a título prejudicial sobre a interpretação do artigo 21.° da Convenção de 27 de Setembro de 1968, já referida (JO 1972, L 299, p. 32; EE 01 F1 p. 186), após as modificações introduzidas pela Convenção de 9 de Outubro de 1978 relativa à adesão do Reino da Dinamarca, da Irlanda e do Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte (JO L 304, p. 1, e - texto modificado - p. 77; EE 01 F2 pp. 131 e 166), pela Convenção de 25 de Outubro de 1982 relativa à adesão da República Helénica (JO L 388, p. 1; EE 01 F3 p. 234), pela Convenção de 26 de Maio de 1989 relativa à adesão do Reino de Espanha e da República Portuguesa (JO L 285, p. 1), e pela Convenção de 29 de Novembro de 1996 relativa à adesão da República da Áustria, da República da Finlândia e do Reino da Suécia (JO 1997, C 15, p. 1),

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção),

    composto por: M. Wathelet (relator), presidente de secção, C. W. A. Timmermans, A. La Pergola, P. Jann e S. von Bahr, juízes,

    advogado-geral: P. Léger,

    secretário: M.-F. Contet, administadora principal,

    vistas as observações escritas apresentadas:

    - em representação da Gantner Electronic GmbH, por A. Concin e H. Concin, Rechtsanwälte,

    - em representação da Basch Exploitatie Maatschappij BV, por T. Frad, Rechtsanwalt,

    - em representação do Governo austríaco, por H. Dossi, na qualidade de agente,

    - em representação do Governo italiano, por U. Leanza, na qualidade de agente, assistido por O. Fiumara, avvocato dello Stato,

    - em representação do Governo do Reino Unido, por G. Amodeo, na qualidade de agente, assistida por D. Lloyd Jones, QC,

    - em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por A.-M. Rouchaud e W. Bogensberger, na qualidade de agentes,

    visto o relatório para audiência,

    ouvidas as alegações da Gantner Electronic GmbH, da Basch Exploitatie Maatschappij BV, do Governo do Reino Unido e da Comissão na audiência de 10 de Julho de 2002,

    ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 5 de Dezembro de 2002,

    profere o presente

    Acórdão

    Fundamentação jurídica do acórdão


    1 Por despacho de 22 de Fevereiro de 2001, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 12 de Março seguinte, o Oberster Gerichtshof submeteu, ao abrigo do Protocolo de 3 de Junho de 1971 relativo à interpretação pelo Tribunal de Justiça da Convenção de 27 de Setembro de 1968 relativa à competência judiciária e à execução de decisões em matéria civil e comercial (a seguir «protocolo»), três questões prejudiciais sobre a interpretação do artigo 21.° da Convenção de 27 de Setembro de 1968, já referida (JO 1972, L 299, p. 32; EE 01 F1 p. 186), após as modificações introduzidas pela Convenção de 9 de Outubro de 1978 relativa à adesão do Reino da Dinamarca, da Irlanda e do Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte (JO L 304, p. 1, e - texto modificado - p. 77; EE 01 F2 pp. 131 e 166), pela Convenção de 25 de Outubro de 1982 relativa à adesão da República Helénica (JO L 388, p. 1; EE 01 F3 p. 234), pela Convenção de 26 de Maio de 1989 relativa à adesão do Reino de Espanha e da República Portuguesa (JO L 285, p. 1), e pela Convenção de 29 de Novembro de 1996 relativa à adesão da República da Áustria, da República da Finlândia e do Reino da Suécia (JO 1997, C 15, p. 1, a seguir «Convenção»).

    2 Estas questões foram suscitadas no âmbito de um litígio entre a sociedade de direito austríaco Gantner Electronic GmbH (a seguir «Gantner») e a sociedade de direito neerlandês Basch Exploitatie Maatschappij BV (a seguir «Basch») na sequência da ruptura das suas relações comerciais.

    Enquadramento jurídico

    A Convenção

    3 Resulta do seu preâmbulo que a Convenção tem por finalidade simplificar o reconhecimento e a execução recíprocos das decisões judiciais, em conformidade com o artigo 293.° CE, e reforçar na Comunidade a protecção jurídica das pessoas estabelecidas no seu território. O preâmbulo refere igualmente que, para esse fim, é necessário determinar a competência dos órgãos jurisdicionais dos Estados contratantes na ordem internacional.

    4 As regras relativas à competência estão previstas no título II da Convenção. A secção 8, intitulada «Litispendência e conexão», destina-se a evitar a contradição entre decisões e a assegurar, assim, uma boa administração da justiça na Comunidade.

    5 Nos termos do artigo 21.° da Convenção, relativo à litispendência:

    «Quando acções com o mesmo pedido e a mesma causa de pedir e entre as mesmas partes forem submetidas à apreciação de tribunais de diferentes Estados contratantes, o tribunal a que a acção foi submetida em segundo lugar suspende oficiosamente a instância, até que seja estabelecida a competência do tribunal a que a acção foi submetida em primeiro lugar.

    Quando estiver estabelecida a competência do tribunal a que a acção foi submetida em primeiro lugar, o segundo tribunal declara-se incompetente em favor daquele.»

    6 Nos termos do artigo 22.° da Convenção, referente à conexão:

    «Quando acções conexas forem submetidas a tribunais de diferentes Estados contratantes e estiverem pendentes em primeira instância, o tribunal a que a acção foi submetida em segundo lugar pode suspender a instância.

    Este tribunal pode igualmente declarar-se incompetente, a pedido de uma das partes, desde que a sua lei permita a apensação de acções conexas e o tribunal a que a acção foi submetida em primeiro lugar seja competente para conhecer das duas acções.

    Para efeitos do presente artigo, consideram-se conexas as acções ligadas entre si por um nexo tão estreito que haja interesse em que sejam instruídas e julgadas simultaneamente para evitar soluções que poderiam ser inconciliáveis se as causas fossem julgadas separadamente.»

    Os direitos nacionais

    7 Nos direitos neerlandês e austríaco, a compensação necessita sempre de uma declaração unilateral de uma parte à outra. A compensação legal, caracterizada pela extinção de pleno direito dos créditos recíprocos, existente nos outros direitos nacionais europeus, não existe em direito neerlandês e austríaco. A declaração pode ser indiferentemente feita por via extrajudicial ou no âmbito de um processo. Tem efeito retroactivo: os dois créditos considerarem-se extintos a partir do dia em que as condições da compensação se verificam, e não a partir do dia em que a declaração de compensação foi feita, limitando-se o tribunal a declarar que teve lugar a compensação.

    O litígio no processo principal e as questões prejudiciais

    8 A Gantner produz e comercializa relógios para pombos-correios. No âmbito das suas relações comerciais com a Basch, enviava-lhe a sua mercadoria para revenda nos Países Baixos.

    9 Considerando que a Basch não tinha pago o preço de venda das mercadorias entregues e facturadas até Junho de 1999, a Gantner pôs termo às relações comerciais entre as duas empresas.

    10 A Basch, por petição de 7 de Setembro de 1999, notificada à Gantner em 2 de Dezembro de 1999, intentou uma acção no Arrondissementsrechtbank Dordrecht (Países Baixos) destinada a obter a condenação da Gantner numa indemnização por perdas e danos no montante de 5 555 143,60 NLG (2 520 814,26 euros). Alega que, uma vez que a Gantner denunciou uma relação contratual que existia há mais de 40 anos, o prazo de denúncia deveria ter sido mais longo.

    11 Resulta do despacho de reenvio que a Basch entendia ser credora do montante de 5 950 962 NLG (2 700 428,82 euros). Contudo, subtraiu a essa quantia o montante de 376 509 NLG (170 852,34 euros), correspondente aos créditos da Gantner que considerava justificados, pelo que se limitou a reclamar judicialmente o montante de 5 555 143,60 NLG (2 520 814,26 euros). Procedeu, assim, a uma compensação por declaração de vontade.

    12 No processo que correu os seus termos no Arrondissementsrechtbank Dordrecht, a Gantner não opôs qualquer crédito aos pedidos da Basch.

    13 Por petição de 22 de Setembro de 1999, notificada à Basch em 21 de Dezembro de 1999, a Gantner intentou uma acção no Landesgericht Feldkirch (Áustria) destinada a obter a condenação da Basch a pagar-lhe o montante de 11 523 703,30 ATS (847 460,18 euros), correspondente ao preço de venda das mercadorias entregues à Basch até 1999 e que não foram pagas.

    14 A Basch pede que a acção seja julgada improcedente. Sustenta que a parte do crédito da Gantner que considerava justificada, ou seja, 170 852,34 euros, se tinha extinguido por compensação feita extrajudicialmente nos Países Baixos. Quanto ao saldo do pedido da Gantner (666 607,84 euros), a Basch alega que, se por absurdo o pedido fosse julgado procedente, estava, em qualquer caso, compensado com o saldo do seu próprio crédito resultante da indemnização por perdas e danos, objecto do litígio no Arrondissementsrechtbank Dordrecht. Além disso, a Basch requereu ainda ao Landesgericht a suspensão da instância, nos termos dos artigos 21.° , por litispendência ou, nos termos do artigo 22.° da Convenção, por conexão.

    15 O Landesgericht recusou-se a suspender a totalidade da instância. Contudo, decidiu suspender a instância em relação ao fundamento de defesa suscitado pela Basch e baseado na compensação com o crédito objecto do pedido no Arrondissementsrechtbank Dordrecht.

    16 A Basch recorreu para o Oberlandesgericht Innsbruck (Áustria) da decisão do Landesgericht de não suspender a totalidade da instância.

    17 Considerando que o fundamento de defesa baseado na compensação extrajudicial que a Basch tinha feito nos Países Baixos podia dar origem a uma relação de litispendência entre os dois litígios, o Oberlandesgericht anulou a decisão da primeira instância na parte em que julgou improcedente o pedido de suspensão da Basch baseado no artigo 21.° da Convenção. Em contrapartida, confirmou a improcedência do pedido de suspensão da instância da Basch baseado no artigo 22.° da Convenção, sendo esta decisão definitiva.

    18 A Gantner interpôs recurso desta decisão para o Oberster Gerichtshof.

    19 Este considera, em primeiro lugar, que as acções, respectivamente, da Basch e da Gantner não assentam em factos idênticos ou da mesma natureza. No órgão jurisdicional neerlandês, a Basch pediu a indemnização do seu prejuízo subsequente à denúncia ilícita pela Gantner de um alegado contrato de concessão. No processo que intentou posteriormente nos órgãos jurisdicionais austríacos, a Gantner pediu o pagamento do preço de venda das mercadorias fornecidas durante o período que precedeu a ruptura das relações comerciais. No plano conceptual, estas acções não se baseiam em apreciações contraditórias dos mesmos factos e actos, antes se baseando, cada uma delas, em factos e actos diferentes que deram lugar a direitos distintos.

    20 O Oberster Gerichtshof pergunta-se, contudo, se, tendo em conta que a jurisprudência do Tribunal de Justiça na matéria (v. acórdãos de 8 de Dezembro de 1987, Gubisch Maschinenfabrik, 144/86, Colect., p. 4861, n.os 16 a 18, e de 6 de Dezembro de 1994, Tatry, C-406/92, Colect., p. I-5439, n.os 30 a 34), não há que considerar que as condições da litispendência estão reunidas no caso concreto.

    21 Em segundo lugar, o Oberster Gerichtshof refere que a Basch invoca um contrato de duração indeterminada, enquanto a Gantner refere uma sucessão de contratos de venda.

    22 A este respeito, a acção intentada pela Basch no órgão jurisdicional neerlandês apenas suscita a questão da existência de um contrato de duração indeterminada a título preliminar. Importa, antes de mais, saber se a decisão a proferir pelo órgão jurisdicional neerlandês sobre o que a doutrina ainda maioritária na Áustria qualifica de simples questão prévia será ou não, posteriormente, vinculativa no processo na Áustria. O Oberster Gerichtshof sublinha que esta questão é muito controvertida no direito austríaco.

    23 Nestes termos, o Oberster Gerichtshof decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

    «1) O conceito de o mesmo pedido e a mesma causa de pedir constante do artigo 21.° da Convenção [...] abrange a excepção, aduzida pela demandada, consistente em ter extinguido, através de uma compensação extrajudicial, uma parte dos créditos reclamados, quando, segundo é alegado, a parte ainda não extinta deste contracrédito é objecto de um processo judicial que decorre entre as mesmas partes noutro Estado contratante e que resulta de uma acção anteriormente intentada?

    2) Para determinar se acções judiciais têm o mesmo pedido e a mesma causa de pedir, há que ter em conta unicamente os argumentos apresentados pela demandante no processo resultante de uma acção posteriormente intentada e, consequentemente, não ter em conta as excepções e pedidos da demandada, em especial o meio de defesa consistente na excepção processual da compensação de um crédito que é objecto de um processo judicial que decorre entre as mesmas partes noutro Estado contratante e que resulta de uma acção anteriormente intentada?

    3) A decisão relativa a um pedido de indemnização por perdas e danos por denúncia ilícita de um contrato de vigência indefinida é vinculativa num processo posterior entre as mesmas partes relativo à questão da existência desta relação obrigacional?»

    Quanto às duas primeiras questões prejudiciais

    24 Através das suas duas primeiras questões, que importa examinar em conjunto, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, se o artigo 21.° da Convenção deve ser interpretado no sentido de que, para apreciar se duas acções intentadas pelas mesmas partes em órgãos jurisdicionais de Estados contratantes diferentes têm o mesmo objecto, importa ter em conta não somente os pedidos das demandantes respectivas, mas também os fundamentos de defesa aduzidos por um demandado.

    25 A este respeito, deve antes de mais observar-se que, nos termos do artigo 21.° da Convenção, esta disposição é aplicada quando as partes em duas acções são as mesmas e quando aquelas têm a mesma causa de pedir e o mesmo pedido (v. acórdão Gubisch Maschinenfabrik, já referido, n.° 14). Além disso, o pedido, na acepção dessa mesma disposição, consiste no objecto da acção (v. acórdão Tary, já referido, n.° 41).

    26 Resulta, assim, da redacção do artigo 21.° da Convenção que esta apenas refere os pedidos respectivos das demandantes em cada um dos litígios, e não os fundamentos de defesa eventualmente aduzidos por um demandado.

    27 Em seguida, resulta do acórdão de 7 de Junho de 1984, Zelger (129/83, Recueil, p. 2397, n.os 10 a 15), que, desde que as condições substantivas enunciadas no n.° 25 do presente acórdão estejam reunidas, existe uma situação de litispendência a partir do momento em que a dois órgãos jurisdicionais de Estados contratantes diferentes forem, de modo definitivo, submetidas acções, ou seja, antes de os demandados terem podido apresentar a respectiva posição.

    28 Embora não seja aplicável ratione temporis ao processo principal, o Regulamento (CE) n.° 44/2001 do Conselho, de 22 de Dezembro de 2000, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial (JO L 12, p. 1), é susceptível de confirmar esta interpretação.

    29 Com efeito, este regulamento precisa, designadamente para efeitos da aplicação das regras em matéria de litispendência, quando é que se considera que uma acção foi submetida à apreciação do tribunal. Nos termos do artigo 30.° , uma acção está submetida à apreciação do tribunal na data em que é apresentado ao tribunal o acto que determina o início da instância ou um acto equivalente, desde que o requerente não tenha posteriormente deixado de tomar as medidas que lhe incumbem para que seja feita a citação ao requerido, ou, se o acto tiver de ser citado antes de ser apresentado ao tribunal, na data em que é recebido pela autoridade responsável pela citação, desde que o requerente não tenha posteriormente deixado de tomar as medidas que lhe incumbem para que o acto seja apresentado ao tribunal.

    30 Por último, importa sublinhar o carácter objectivo e automático do mecanismo da litispendência. Como o Governo do Reino Unido correctamente referiu, o artigo 21.° da Convenção define um sistema simples para determinar, no início do processo, qual dos órgãos jurisdicionais a que a acção foi submetida conhecerá efectivamente do litígio. O órgão jurisdicional a que a acção foi submetida em segundo lugar tem a obrigação de suspender oficiosamente a instância até que a competência do tribunal a que a acção foi submetida em primeiro lugar seja estabelecida. Uma vez esta estabelecida, deve considerar-se incompetente em favor deste último tribunal. A finalidade do artigo 21.° da Convenção seria ignorada se o conteúdo e a natureza das acções pudessem ser modificados por um demandado através de um pedido apresentado necessariamente em momento ulterior. Para além dos atrasos e dos custos, esta solução poderia levar, com efeito, a que o órgão jurisdicional inicialmente designado como competente, nos termos deste artigo, devesse em seguida declarar-se incompetente.

    31 Decorre dos elementos precedentes que, para apreciar se há litispendência entre dois litígios, não se pode ter em conta os fundamentos de defesa, seja qual for a natureza destes, designadamente os baseados na compensação, que um demandado pode ser levado a invocar posteriormente à apresentação definitiva do pedido ao órgão jurisdicional segundo as regras do direito nacional deste último.

    32 Face às considerações que precedem, importa responder às duas primeiras questões prejudiciais que o artigo 21.° da Convenção deve ser interpretado no sentido de que, para apreciar se duas acções intentadas entre as mesmas partes em órgãos jurisdicionais de Estados contratantes diferentes têm o mesmo pedido, há que apenas ter em conta as pretensões dos respectivos demandantes, com exclusão dos fundamentos de defesa aduzidos por um demandado.

    Quanto à terceira questão

    33 Com a terceira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se a decisão de um órgão jurisdicional de um Estado contratante que, para julgar uma acção, teve de apreciar a natureza jurídica das relações entre as partes, é vinculativa para o órgão jurisdicional de outro Estado contratante a que foi submetido posteriormente um litígio entre as mesmas partes no âmbito do qual a natureza jurídica precisa das mesmas relações contratuais é contestada.

    34 A título liminar, importa recordar que, segundo jurisprudência consagrada, no âmbito da cooperação entre o Tribunal de Justiça e os órgãos jurisdicionais nacionais instituída pelo artigo 234.° CE, compete exclusivamente ao juiz nacional, a quem foi submetido o litígio e que deve assumir a responsabilidade pela decisão jurisdicional a tomar, apreciar, tendo em conta as especificidades de cada processo, tanto a necessidade de uma decisão prejudicial para poder proferir a sua decisão como a pertinência das questões que coloca ao Tribunal de Justiça. Consequentemente, desde que as questões colocadas pelo juiz nacional sejam relativas à interpretação do direito comunitário, o Tribunal de Justiça é, em princípio, obrigado a decidir (v., nomeadamente, acórdãos de 15 de Dezembro de 1995, Bosman, C-415/93, Colect., p. I-4921, n.° 59; de 13 de Março de 2001, PreussenElektra, C-379/98, Colect., p. I-2099, n.° 38, e de 22 de Janeiro de 2002, Canal Satélite Digital, C-390/99, Colect., p. I-607, n.° 18).

    35 No entanto, o Tribunal de Justiça também indicou que, em casos excepcionais, lhe cabe examinar as condições em que os pedidos lhe são submetidos pelos órgãos jurisdicionais nacionais para verificar a sua própria competência (v. acórdãos já referidos PreussenElektra, n.° 39, e Canal Satélite Digital, n.° 19). Efectivamente, o espírito de colaboração que deve presidir ao funcionamento do reenvio prejudicial implica que, por seu lado, o juiz nacional tenha em atenção a função confiada ao Tribunal de Justiça, que é contribuir para a administração da justiça nos Estados-Membros e não emitir opiniões consultivas sobre questões gerais ou hipotéticas (acórdãos Bosman, já referido, n.° 60, e de 21 de Março de 2002, Cura Anlagen, C-451/99, Colect., p. I-3193, n.° 26).

    36 Assim, a recusa de decisão quanto a uma questão prejudicial submetida por um órgão jurisdicional nacional é possível, entre outros casos, quando o problema é hipotético ou ainda quando o Tribunal não dispõe dos elementos de facto e de direito necessários para responder utilmente às questões que lhe são colocadas (v., neste sentido, acórdãos já referidos PreussenElektra, n.° 39, e Canal Satélite Digital, n.° 19).

    37 Para permitir ao Tribunal de Justiça fornecer uma interpretação do direito comunitário que seja útil, o juiz nacional deve, previamente ao reenvio, determinar a matéria de facto do processo e resolver os problemas estritamente de direito nacional (v. acórdão de 10 de Março de 1981, Irish Creamery Milk Suppliers Association e o., 36/80 e 71/80, Recueil, p. 735, n.° 6). É igualmente indispensável que o órgão jurisdicional nacional explique as razões por que considera que uma resposta às suas questões é necessária para a solução do litígio (v. acórdãos de 12 de Junho de 1986, Bertini e o., 98/85, 162/85 e 258/85, Colect., p. 1885, n.° 6, e de 16 de Julho de 1992, Lourenço Dias, C-343/90, Colect., p. I-4673, n.° 19).

    38 Esta jurisprudência é transponível para o reenvio prejudicial previsto no protocolo (v., neste sentido, acórdãos de 27 de Fevereiro de 1997, Van den Boogaard, C-220/95, Colect., p. I-1147, n.° 16; de 20 de Março de 1997, Farrell, C-295/95, Colect., p. I-1683, n.° 11, e de 16 de Março de 1999, Castelletti, C-159/97, Colect., p. I-1597, n.° 14).

    39 A este respeito, importa referir que, no processo principal, foi submetida aos órgãos jurisdicionais austríacos uma acção para pagamento do preço de fornecimentos. Não resulta do despacho de reenvio em que medida a natureza jurídica precisa do contrato em que a Gantner se baseia é pertinente para decidir deste pedido.

    40 Nestas condições, há que declarar que o Tribunal de Justiça não dispõe de elementos suficientes que justifiquem a necessidade de uma resposta à terceira questão.

    41 Assim, esta questão é inadmissível.

    Decisão sobre as despesas


    Quanto às despesas

    42 As despesas efectuadas pelos Governos austríaco, italiano e do Reino Unido, bem como pela Comissão, que apresentaram observações ao Tribunal, não são reembolsáveis. Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional nacional, compete a este decidir quanto às despesas.

    Parte decisória


    Pelos fundamentos expostos,

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção),

    pronunciando-se sobre as questões submetidas pelo Oberster Gerichtshof, por despacho de 22 de Fevereiro de 2001, declara:

    O artigo 21.° da Convenção de 27 de Setembro de 1968 relativa à competência judiciária e à execução de decisões em matéria civil e comercial, após as modificações introduzidas pela Convenção de 9 de Outubro de 1978 relativa à adesão do Reino da Dinamarca, da Irlanda e do Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte, pela Convenção de 25 de Outubro de 1982 relativa à adesão da República Helénica, pela Convenção de 26 de Maio de 1989 relativa à adesão do Reino de Espanha e da República Portuguesa, e pela Convenção de 29 de Novembro de 1996 relativa à adesão da República da Áustria, da República da Finlândia e do Reino da Suécia, deve ser interpretado no sentido de que, para apreciar se duas acções intentadas entre as mesmas partes em órgãos jurisdicionais de Estados contratantes diferentes têm o mesmo pedido, há que apenas ter em conta as pretensões dos respectivos demandantes, com exclusão dos fundamentos de defesa aduzidos por um demandado.

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