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Documento 61996CJ0147

Acórdão do Tribunal (Quinta Secção) de 22 de Junho de 2000.
Reino dos Países Baixos contra Comissão das Comunidades Europeias.
Recurso de anulação - Recusa da Comissão em inscrever um país ultramarino na lista provisória dos países terceiros prevista no artigo 23.º da Directiva 92/46/CEE - Acto impugnável.
Processo C-147/96.

Colectânea de Jurisprudência 2000 I-04723

Identificador Europeu da Jurisprudência (ECLI): ECLI:EU:C:2000:335

61996J0147

Acórdão do Tribunal (Quinta Secção) de 22 de Junho de 2000. - Reino dos Países Baixos contra Comissão das Comunidades Europeias. - Recurso de anulação - Recusa da Comissão em inscrever um país ultramarino na lista provisória dos países terceiros prevista no artigo 23.º da Directiva 92/46/CEE - Acto impugnável. - Processo C-147/96.

Colectânea da Jurisprudência 2000 página I-04723


Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória

Palavras-chave


Recurso de anulação - Actos susceptíveis de recurso - Conceito - Actos que produzem efeitos jurídicos obrigatórios - Actos preparatórios - Exclusão

[Tratado CE, artigo 173._ (que passou, após alteração, a artigo 230._ CE)]

Sumário


$$Só constituem actos ou decisões susceptíveis de serem objecto de recurso de anulação as medidas que produzem efeitos jurídicos obrigatórios susceptíveis de afectar os interesses dos recorrentes. Quando se trata de actos cuja elaboração se efectua em vários fases, nomeadamente no termo de um procedimento interno, em princípio só constituem actos impugnáveis as medidas que fixam definitivamente a posição da Comissão ou do Conselho, com exclusão das medidas intermédias cujo objectivo é preparar a decisão final.

Não pode constituir uma decisão susceptível de ser objecto de um recurso de anulação o acto que não é susceptível de produzir efeitos jurídicos e que também não visa produzir esses efeitos. Para determinar se um acto produz tais efeitos, há que atender à sua essência. (cf. n.os 25-27)

Partes


No processo C-147/96,

Reino dos Países Baixos, representado por M. A. Fierstra e J. S. van den Oosterkamp, consultores jurídicos adjuntos no Ministério dos Negócios Estrangeiros, na qualidade de agentes, 67, rue Bezuidenhoutseweg, Haia,

recorrente,

contra

Comissão das Comunidades Europeias, representada por P. J. Kuijper e T. van Rijn, consultores jurídicos, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo no gabinete de C. Gómez de la Cruz, membro do Serviço Jurídico, Centre Wagner, Kirchberg,

recorrida,

apoiada por

República Francesa, representada por C. de Salins, subdirectora na Direcção dos Assuntos Jurídicos do Ministério dos Negócios Estrangeiros, e G. Mignot, secretário dos Negócios Estrangeiros na mesma direcção, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo na Embaixada de França, 8 B, boulevard Joseph II,

e por

Conselho da União Europeia, representado por R. Torrent, J. Huber e G. Houttuin, membros do Serviço Jurídico, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo no gabinete de A. Morbilli, director-geral da Direcção dos Assuntos Jurídicos do Banco Europeu de Investimento, 100, boulevard Konrad Adenauer,

intervenientes,

que tem por objecto um recurso de anulação da decisão da Comissão, tomada sob a forma de uma carta de 26 de Fevereiro de 1996 notificada ao Ministro Presidente das Antilhas Neerlandesas, recusando a inscrição destas últimas na lista provisória de países terceiros estabelecida nos termos do artigo 23._, n._ 3, alínea a), da Directiva 92/46/CEE do Conselho, de 16 de Junho de 1992, que adopta as normas sanitárias relativas à produção de leite cru, de leite tratado termicamente e de produtos à base de leite e à sua colocação no mercado (JO L 268, p. 1),

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA

(Quinta Secção),

composto por: D. A. O. Edward, presidente de secção, L. Sevón (relator), P. J. G. Kapteyn, P. Jann e H. Ragnemalm, juízes,

advogado-geral: A. La Pergola,

secretário: H. von Holstein, secretário adjunto,

visto o relatório para audiência,

ouvidas as alegações das partes na audiência de 28 de Outubro de 1999, na qual o Governo neerlandês foi representado por M. A. Fierstra, o Governo francês por S. Seam, secretário dos Negócios Estrangeiros na Direcção dos Assuntos Jurídicos do Ministério dos Negócios Estrangeiros, na qualidade de agente, a Comissão por P. J. Kuijper e T. van Rijn, e o Conselho por G. Houttuin,

ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 14 de Dezembro de 1999,

profere o presente

Acórdão

Fundamentação jurídica do acórdão


1 Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 3 de Maio de 1996, o Reino dos Países Baixos pediu, nos termos do artigo 173._, primeiro parágrafo, do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 230._, primeiro parágrafo, CE), a anulação da decisão da Comissão, tomada sob a forma de uma carta de 26 de Fevereiro de 1996 notificada ao Ministro Presidente das Antilhas Neerlandesas (a seguir «carta controvertida»), recusando a inscrição destas últimas na lista provisória de países terceiros estabelecida nos termos do artigo 23._, n._ 3, alínea a), da Directiva 92/46/CEE do Conselho, de 16 de Junho de 1992, que adopta as normas sanitárias relativas à produção de leite cru, de leite tratado termicamente e de produtos à base de leite e à sua colocação no mercado (JO L 268, p. 1).

A regulamentação aplicável

2 O capítulo II da Directiva 92/46 inclui prescrições para os produtos comunitários destinados a ser utilizados no fabrico de produtos à base de leite ou de leite de consumo tratado termicamente. Para o efeito, o artigo 3._, n._ 1, da referida directiva fixa as exigências a que deve obedecer o leite cru destinado ao fabrico dos referidos produtos. É nomeadamente previsto no n._ 1, alínea a), desta disposição, que os Estados-Membros velarão por que o leite cru só seja utilizado para o fabrico de produtos à base de leite ou de leite de consumo tratado termicamente se satisfizer a exigência segundo a qual provém de animais e de explorações controladas regularmente pelas autoridades competentes.

3 O capítulo III da Directiva 92/46 inclui disposições que garantem que as importações de tais produtos em proveniência de países terceiros, para serem introduzidas no mercado comunitário, satisfazem os mesmos requisitos de protecção sanitária.

4 Para o efeito, o artigo 22._ da Directiva 92/46, que figura no seu capítulo III, prevê que «As condições aplicáveis às importações provenientes de países terceiros de leite cru, de leite tratado termicamente e de produtos à base de leite abrangidos pela presente directiva devem ser pelo menos equivalentes às previstas no capítulo II para a produção comunitária.»

5 Quanto à importação de produtos lácteos em proveniência de países terceiros, referidos no artigo 22._ da Directiva 92/46, o seu artigo 23._ dispõe:

«1. Para efeitos de execução uniforme do artigo 22._, serão aplicáveis as disposições dos números seguintes.

2. Só poderão ser importados para a Comunidade leite ou produtos à base de leite:

a) Provenientes de um país terceiro que conste de uma lista a elaborar nos termos da alínea a) do n._ 3;

...

3. De acordo com o processo previsto no artigo 31._, serão elaboradas:

a) Uma lista provisória de países terceiros ou de partes de países terceiros que estão em condições de fornecer aos Estados-Membros e à Comissão garantias equivalentes às previstas no capítulo II, bem como a lista dos estabelecimentos em relação aos quais estão em condições de oferecer essas garantias;

Esta lista provisória será elaborada a partir das listas dos estabelecimentos aprovados e inspeccionados pelas autoridades competentes depois de a Comissão se ter certificado previamente de que esses estabelecimentos cumprem os princípios e regras gerais contidos na presente directiva;

b) A actualização dessa lista em função dos controlos previstos no n._ 4;

...

4. Peritos da Comissão e dos Estados-Membros efectuarão controlos no local para verificar se as garantias oferecidas pelo país terceiro quanto às condições de produção e de colocação no mercado podem ser consideradas equivalentes às aplicadas na Comunidade.

...»

6 O processo definido no artigo 31._ da Directiva 92/46 prevê o recurso ao Comité Veterinário Permanente (a seguir «Comité Veterinário»), instituído pela Decisão 68/361/CEE do Conselho, de 15 de Outubro de 1968 (JO L 255, p. 23; EE 03 F3 p. 41). Nos termos dos n.os 2 e 3 desta disposição:

«2. O representante da Comissão... submeterá à apreciação do comité [veterinário] um projecto das medidas a tomar. O comité [veterinário] emitirá o seu parecer sobre essas medidas num prazo que o presidente pode fixar em função da urgência da questão em causa. O parecer será emitido por maioria, nos termos previstos no n._ 2 do artigo 148._ do Tratado para a adopção das decisões que o Conselho é chamado a tomar sob proposta da Comissão...

3. a) A Comissão adoptará as medidas projectadas e dar-lhes-á imediatamente aplicação desde que sejam conformes com o parecer do comité [veterinário].

b) Quando as medidas consideradas não estiverem em conformidade com o parecer do comité, ou na falta de parecer, a Comissão submeterá sem demora ao Conselho uma proposta relativa às medidas a tomar. O Conselho deliberará por maioria qualificada.

...»

7 A lista provisória prevista no artigo 23._, n._ 3, alínea a), da Directiva 92/42 foi adoptada pela Decisão 94/70/CE da Comissão, de 31 de Janeiro de 1994, que estabelece a lista provisória de países terceiros a partir dos quais os Estados-Membros autorizam as importações de leite cru, de leite tratado termicamente e de produtos à base de leite (JO L 36, p. 5). Esta decisão foi revogada e substituída pela Decisão 95/340/CE da Comissão, de 27 de Julho de 1995 (JO L 200, p. 38). É manifesto que as Antilhas Neerlandesas, que mantêm relações especiais com o Reino dos Países Baixos e fazem parte dos países e territórios ultramarinos (a seguir «PTU»), não foram inscritas nas listas estabelecidas por estas decisões.

8 O regime dos PTU encontra-se definido na parte IV do Tratado CE, intitulada «A associação dos países e territórios ultramarinos», que agrupa nomeadamente os artigos 131._ (que passou, após alteração, a artigo 182._ CE), 132._ (actual artigo 183._ CE), 133._ (que passou, após alteração, a artigo 184._ CE), 134._ e 135._ (actuais artigos 185._ CE e 186._ CE) bem como o artigo 136._ (que passou, após alteração, a artigo 187._ CE).

9 Com fundamento no artigo 136._, segundo parágrafo, do Tratado, o Conselho adoptou uma série de decisões relativas à associação dos PTU à Comunidade Económica Europeia. A Decisão 91/482/CEE do Conselho, de 25 de Julho de 1991, relativa à associação dos países e territórios ultramarinos à Comunidade Económica Europeia (JO L 263, p. 1, a seguir «decisão PTU»), é aplicável por um período de dez anos a contar de 1 de Março de 1990.

10 Na parte III da decisão PTU, intitulada «Instrumentos da cooperação PTU-CEE», o título I trata da cooperação comercial e o regime geral de trocas comerciais é regulado pelo capítulo 1 deste título, nomeadamente os artigos 101._ a 103._

11 Em especial, o artigo 102._ prevê que a Comunidade não aplicará à importação de produtos originários dos PTU nem restrições quantitativas nem medidas de efeito equivalente.

12 Além disso, o artigo 103._ prevê:

«1. O disposto no artigo 102._ é aplicável sem prejuízo das proibições ou restrições à importação, exportação ou trânsito justificadas por razões de moralidade pública, ordem pública, protecção da saúde e da vida das pessoas e animais ou de preservação das plantas...

2. Estas proibições ou restrições não devem constituir, em caso algum, nem um meio de discriminação arbitrária nem qualquer restrição dissimulada do comércio em geral.

...»

O recurso

13 Na sua petição, o Governo neerlandês alega que, enquanto as Antilhas Neerlandesas não figurarem na lista provisória de países terceiros prevista no artigo 23._, n._ 3, alínea a), da Directiva 92/46, os produtos lácteos delas originários não poderão ser importados na Comunidade. Acrescenta que, em consequência, deu início a discussões informais com a Comissão e, em seguida, solicitou uma reunião de parceria na acepção do artigo 234._, segundo parágrafo, da decisão PTU. Esta parceria constitui essencialmente uma concertação entre a Comissão, o Estado-Membro a que está sujeito um país ultramarino e as autoridades locais deste último. Segundo o referido governo, durante esta reunião, que ocorreu em 27 de Abril de 1995, as Antilhas Neerlandesas solicitaram à Comissão que enviasse uma missão de inspecção veterinária para apreciar a situação sanitária neste país ultramarino.

14 Posteriormente, o Governo das Antilhas Neerlandesas, por carta de 7 de Julho de 1995, convidou formalmente a Comissão a inscrever as Antilhas Neerlandesas na referida lista provisória.

15 Após uma troca de cartas entre o Governo das Antilhas Neerlandesas e a Comissão, a inspecção solicitada teve lugar em finais de Novembro de 1995. Foi elaborado um relatório (a seguir «relatório de inspecção») que foi submetido para observações ao referido governo por carta da Comissão de 29 de Janeiro de 1996.

16 Na sequência desta comunicação do relatório de inspecção, o Governo das Antilhas Neerlandesas adoptou, em 7 de Fevereiro de 1996, uma decisão ministerial de alcance geral («ministeriële beschikking», PB, 1996 n._ 34, a seguir «decisão ministerial») ao abrigo do artigo 6._ do Landsverordening In- en Uitvoer (PB, 1968 n._ 42). Como o Governo neerlandês afirma, esta decisão foi comunicada no mesmo dia à Comissão, por carta do Ministro Presidente das Antilhas Neerlandesas. O Governo neerlandês sustenta igualmente que esta decisão ministerial proíbe a exportação dos produtos lácteos das Antilhas Neerlandesas para o território aduaneiro comunitário sem autorização do ministro da Saúde Pública e da Higiene. Nos termos desta decisão, a autorização só seria concedida se a produção fosse realizada segundo as prescrições e em estabelecimentos equivalentes aos descritos no capítulo II da Directiva 92/46 para a produção comunitária. Além disso, tal autorização só seria concedida para produtos obtidos a partir de ingredientes provenientes da Comunidade ou de países terceiros constantes da lista prevista no artigo 23._, n._ 3, alínea a), da Directiva 92/46. E mais, deveria ser junto aos pedidos de autorização um certificado sanitário passado pelos serviços de higiene das Antilhas Neerlandesas. Esta decisão ministerial teria entrado imediatamente em vigor.

17 O Comité Veterinário evocou o relatório de inspecção durante a sua reunião de 13 e 14 de Fevereiro de 1996 e, na mesma, o representante da Comissão mencionou oralmente a decisão ministerial. Todavia, é sabido que, nessa reunião, o Comité Veterinário não formulou qualquer parecer relativo ao pedido de inscrição das Antilhas Neerlandesas na lista provisória de países terceiros prevista no artigo 23._, n._ 3, alínea a), da Directiva 92/46.

18 Em resposta à comunicação da decisão ministerial à Comissão, esta última dirigiu ao Ministro Presidente das Antilhas Neerlandesas a carta controvertida, assinada pelo director-geral da Agricultura, que estava redigida nos seguintes termos:

«Assunto: Relatório relativo a uma missão veterinária efectuada nas Antilhas Neerlandesas com vista à eventual autorização das importações, na Comunidade, de produtos à base de leite

...

Agradeço a sua carta de 7 de Fevereiro de 1996 relativa ao assunto em epígrafe.

A mesma exige, da minha parte, as seguintes observações:

Quanto ao vosso pedido destinado a eliminar no relatório as verificações relativas à saúde animal e à saúde pública, gostaria de sublinhar o seguinte:

...

Em consequência, não há qualquer razão para retirar estes elementos do relatório de missão. Tendo recebido a vossa carta muito tarde, o relatório foi apresentado na íntegra aos Estados-Membros... na reunião do Comité Veterinário Permanente de 14 de Fevereiro de 1996.

... A vossa carta indicava que se encontrava em anexo uma cópia da decisão ministerial [que fixa exigências sanitárias aplicáveis aos produtos lácteos]; infelizmente, por razões desconhecidas, não era esse o caso. Agradecia que enviasse um exemplar desse diploma à Comissão.

Apesar disso, considerou-se necessário especificar as medidas que podiam ser implementadas para velar por que a referida decisão ministerial seja plenamente aplicada e evitar o risco de utilização nos estabelecimentos aprovados de produtos não conformes às exigências europeias...

...

Por conseguinte, não se afigura oportuno, nesta fase, decidir da inclusão das Antilhas Neerlandesas na lista prevista pela directiva a não ser que as autoridades possam fornecer garantias suplementares adequadas.

...

Aguardo, com interesse, a vossa resposta.

...»

19 O recurso interposto pelo Governo neerlandês é dirigido contra esta carta, que é por ele considerada uma decisão da Comissão, na medida em que recusa a inscrição das Antilhas Neerlandesas na lista prevista no artigo 23._, n._ 3, alínea a), da Directiva 92/46.

20 Em apoio do seu recurso, o Governo neerlandês invoca sete fundamentos de anulação assentes na violação respectivamente dos artigos 3._, n._ 1, alínea a), e 31._ da Directiva 92/46 e, a título subsidiário, do artigo 190._ do Tratado CE (actual artigo 253._ CE), dos princípios do contraditório e da preparação diligente dos actos comunitários, do artigo 2._, n._ 2, do acordo relativo à aplicação de medidas sanitárias e fitossanitárias, constituído pelo anexo 1 A do acordo que institui a Organização Mundial do Comércio, do princípio da proporcionalidade bem como do artigo 103._ da decisão PTU.

21 A República Francesa e o Conselho, que pediram para intervir em apoio dos pedidos da Comissão, foram autorizados a intervir, respectivamente, por despachos do presidente do Tribunal de Justiça de 14 e 19 de Novembro de 1996.

Quanto à admissibilidade

22 Por requerimento separado, apresentado na Secretaria do Tribunal de Justiça em 5 de Julho de 1996, a Comissão suscitou, nos termos do artigo 91._, n._ 1, do Regulamento de Processo, uma questão prévia de inadmissibilidade porque a carta controvertida não podia de forma alguma ser considerada uma tomada de posição definitiva da Comissão, mas sim um acto preparatório constituindo uma etapa no iter que deve conduzir a uma decisão, o qual, em conformidade com jurisprudência assente do Tribunal de Justiça, não produz efeitos jurídicos e não é, assim, susceptível de ser impugnado com fundamento no artigo 173._ do Tratado.

23 Em contrapartida, o Governo neerlandês sustenta que a carta controvertida constitui uma decisão que produz efeitos jurídicos e, deste modo, um acto impugnável que afecta negativamente os interesses das Antilhas Neerlandesas, porque, por um lado, indefere o pedido de inscrição destas últimas na lista prevista no artigo 23._, n._ 3, alínea a), da Directiva 92/46 e, por outro, a exportação de produtos lácteos para Estados-Membros da Comunidade é entravada, quando resulta do relatório de inspecção que estes produtos são tratados nas Antilhas Neerlandesas em conformidade com as regras sanitárias adoptadas pela referida directiva.

24 A República Francesa e o Conselho, intervenientes, não se pronunciaram sobre a admissibilidade do recurso.

25 Para decidir da procedência da questão prévia de admissibilidade suscitada pela Comissão, há que recordar desde logo que resulta de uma jurisprudência constante que só constituem actos ou decisões susceptíveis de serem objecto de recurso de anulação, nos termos do artigo 173._ do Tratado, as medidas que produzem efeitos jurídicos obrigatórios susceptíveis de afectar os interesses dos recorrentes (v., nomeadamente, despachos de 8 de Março de 1991, Emerald Meats/Comissão, C-66/91 e C-66/91 R, Colect., p. I-1143, n._ 26; de 13 de Junho de 1991, Sunzest/Comissão, C-50/90, Colect., p. I-2917, n._ 12, e acórdão de 5 de Outubro de 1999, Países Baixos/Comissão, C-308/95, Colect., p. I-6513, n._ 26).

26 É, além disso incontestável que, quando se trata de actos cuja elaboração se efectua em vários fases, nomeadamente no termo de um procedimento interno, resulta desta mesma jurisprudência que em princípio só constituem actos impugnáveis as medidas que fixam definitivamente a posição da Comissão ou do Conselho no termo deste procedimento, com exclusão das medidas intermédias cujo objectivo é preparar a decisão final (v. acórdão de 11 de Novembro de 1981, IBM/Comissão, 60/81, Recueil, p. 2639, n._ 10). Além disso, segundo a mesma jurisprudência, não pode ser objecto de um recurso de anulação o acto que não é susceptível de produzir efeitos jurídicos e que também não visa produzir esses efeitos (v., nomeadamente, acórdão de 27 de Março de 1980, Sucrimex e Westzucker/Comissão, 133/79, Recueil, p. 1299; despacho de 17 de Maio de 1989, Itália/Comissão, 151/88, Colect., p. 1255, n._ 22, e acórdão Países Baixos/Comissão, já referido, n._ 27).

27 Ora, para determinar se um acto impugnado produz tais efeitos, há que atender à sua essência (v. acórdão IBM/Comissão, já referido, n._ 9).

28 No caso sub judice, resulta em primeiro lugar da primeira parte da carta controvertida que a Comissão responde ao pedido das Antilhas Neerlandesas referente à supressão de certas verificações constantes do relatório de inspecção. Com efeito, o autor da carta controvertida, depois de comentar esse pedido, conclui que não cabe suprimir os elementos contestados no relatório de inspecção e informa o Governo das Antilhas Neerlandesas de que, em razão da recepção intempestiva da sua carta de 7 de Fevereiro de 1996, o relatório de inspecção tinha sido apresentado ao Comité Veterinário na sua reunião de 13 e 14 de Fevereiro de 1996.

29 Quanto a esta parte da carta controvertida, verifica-se que a mesma não faz parte do objecto do litígio, dizendo este apenas respeito à recusa da Comissão em inscrever as Antilhas Neerlandesas na lista provisória de países terceiros prevista no artigo 23._, n._ 3, alínea a), da Directiva 92/46.

30 Cabe em seguida verificar que, na carta controvertida, a Comissão afirma, sem ser contestada pelo Governo neerlandês, que a decisão ministerial que, segundo este último, exigia, sob pena de proibição, para a exportação dos produtos lácteos para a Comunidade, uma autorização do Ministro da Saúde Pública e da Higiene não se encontrava em anexo à carta dirigida em 7 de Fevereiro de 1996 pelo Governo das Antilhas Neerlandesas à Comissão. Como esta última declara, não estava em condições, na data do envio da carta controvertida, de apreciar o conteúdo dessa decisão ministerial.

31 Esta verificação é corroborada por três elementos suplementares que resultam da carta controvertida: em primeiro lugar, o facto de esta incluir um pedido de envio, por um lado, de uma cópia da decisão ministerial e, por outro, de informações relativas à sua execução; em seguida, as reservas que a Comissão exprime ao indicar na referida carta que «não se afigura oportuno, nesta fase, decidir da inclusão das Antilhas Neerlandesas... a não ser que as autoridades possam fornecer garantias suplementares adequadas»; por fim, a fórmula final da carta demonstra claramente que o seu signatário esperava uma resposta. Face a estes elementos, a Comissão declara que também não dispunha, na data do envio da carta controvertida, dos dados necessários para tomar uma decisão com pleno conhecimento de causa quanto à inscrição das Antilhas Neerlandesas na lista prevista no artigo 23._, n._ 3, alínea a), da Directiva 92/46.

32 A este respeito, há que acrescentar, como o Governo neerlandês reconhece, tanto nas suas observações sobre a questão prévia de inadmissibilidade como na sua resposta a uma questão escrita colocada pelo Tribunal de Justiça, que o Governo das Antilhas Neerlandesas só informou a Comissão do modo de execução da decisão ministerial por uma carta de 20 de Maio de 1996, ou seja, em data posterior à da carta controvertida que constitui o acto impugnado.

33 O Governo neerlandês sustenta igualmente que a circunstância de o Comité Veterinário ter evocado, na sua reunião de 13 de 14 de Fevereiro de 1996, o relatório de inspecção significa que a Comissão se julgava em condições de ter uma opinião definitiva e, deste modo, de adoptar uma decisão com base nesta. Com efeito, segundo o Governo neerlandês, resulta da Directiva 92/46 que o Comité Veterinário só pode ser consultado se a Comissão tiver tomado a sua posição quanto à questão submetida ao referido comité.

34 A este respeito, basta verificar que o relatório de inspecção foi simplesmente evocado na referida reunião do Comité Veterinário, numa fase prévia à tomada de decisão. Com efeito, é manifesto que a apresentação deste relatório ao Comité Veterinário ocorreu sem que o representante da Comissão tivesse apresentado a este último, nos termos do artigo 31._, n._ 2, da Directiva 92/46, um projecto de medidas a tomar e sem que o comité tivesse formulado um parecer por maioria qualificada nos termos da mesma disposição. Daqui resulta que a inexistência tanto de um projecto de medidas a tomar como de um parecer do Comité Veterinário revela que, na data de apresentação do relatório de inspecção ao referido comité, a Comissão ainda não tinha tomado uma posição definitiva.

35 Nestas condições, verifica-se que a carta controvertida só tem carácter preparatório e não é, assim, susceptível de produzir efeitos jurídicos, nem visa produzir tais efeitos. Assim, não pode constituir uma decisão definitiva susceptível de ser objecto de recurso de anulação, tal decisão só podendo ser adoptada depois de o Comité Veterinário ter formulado o seu parecer.

36 Dado que não produziu qualquer efeito jurídico obrigatório quanto à inscrição das Antilhas Neerlandesas na lista provisória de países terceiros estabelecida nos termos do artigo 23._, n._ 3 alínea a), da Directiva 92/46, a carta controvertida não pode constituir um acto jurídico susceptível de ser impugnado na acepção da jurisprudência mencionada nos n.os 25 e 26 do presente acórdão.

37 Daqui resulta que o recurso deve ser julgado inadmissível.

Decisão sobre as despesas


Quanto às despesas

38 Por força do artigo 69._, n._ 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a Comissão pedido a condenação do Reino dos Países Baixos e tendo este sido vencido, há que condená-lo nas despesas. Além disso, segundo o artigo 69._, n._ 4, primeiro parágrafo, do mesmo regulamento, os Estados-Membros e as instituições que intervieram no litígio suportarão as suas próprias despesas.

Parte decisória


Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA

(Quinta Secção)

decide:

39 O recurso é julgado inadmissível.

40 O Reino dos Países Baixos é condenado nas despesas.

41 A República Francesa e o Conselho da União Europeia suportarão as suas próprias despesas.

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