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Documento 61998CJ0285

Acórdão do Tribunal de 11 de Janeiro de 2000.
Tanja Kreil contra República Federal da Alemanha.
Pedido de decisão prejudicial: Verwaltungsgericht Hannover - Alemanha.
Igualdade de tratamento entre homens e mulheres - Limitação do acesso das mulheres a empregos de carácter militar da Bundeswehr.
Processo C-285/98.

Colectânea de Jurisprudência 2000 I-00069

Identificador Europeu da Jurisprudência (ECLI): ECLI:EU:C:2000:2

61998J0285

Acórdão do Tribunal de 11 de Janeiro de 2000. - Tanja Kreil contra República Federal da Alemanha. - Pedido de decisão prejudicial: Verwaltungsgericht Hannover - Alemanha. - Igualdade de tratamento entre homens e mulheres - Limitação do acesso das mulheres a empregos de carácter militar da Bundeswehr. - Processo C-285/98.

Colectânea da Jurisprudência 2000 página I-00069


Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória

Palavras-chave


Política social - Trabalhadores masculinos e trabalhadores femininos - Acesso ao emprego e condições de trabalho - Igualdade de tratamento - Medidas derrogatórias justificadas por exigências da segurança pública - Submissão às normas do direito comunitário - Faculdade prevista no artigo 2._, n._ 2, da Directiva 76/207 - Alcance - Exclusão total de mulheres das unidades armadas da Bundeswehr alemã - Inadmissibilidade - Violação do princípio da proporcionalidade - Derrogação prevista no artigo 2._, n._ 3, da directiva - Inaplicabilidade

(Directiva 76/207 do Conselho, artigo 2._, n.os 2 e 3)

Sumário


$$Embora caiba aos Estados-Membros, que têm de aprovar as medidas adequadas para assegurar a sua segurança interna e externa, adoptar as decisões relativas à organização das suas forças armadas, daqui não resulta, no entanto, que tais decisões devam escapar totalmente à aplicação do direito comunitário. Não se pode, com efeito, sob pena de pôr em causa o carácter obrigatório e a aplicação uniforme do direito comunitário, admitir que o Tratado, fora das hipóteses específicas contidas em certas disposições, contenha uma reserva geral abrangendo qualquer medida adoptada por um Estado-Membro para salvaguarda da segurança pública. Tratando-se da Directiva 76/207, relativa à concretização do princípio da igualdade de tratamento entre homens e mulheres no que se refere ao acesso ao emprego, à formação e promoção profissionais e às condições de trabalho, ela é por consequência aplicável às medidas acima referidas.

Quando, no caso da organização das forças armadas na República Federal da Alemanha, as autoridades nacionais competentes fazem uso da faculdade que lhes é oferecida pelo artigo 2._, n._ 2, da directiva de excluir do seu âmbito de aplicação as actividades profissionais para as quais, em razão da sua natureza ou das condições do seu exercício, o sexo constitua uma condição determinante, elas não podem, sem ignorar o princípio da proporcionalidade, considerar de uma forma geral que a composição de todas as unidades armadas da Bundeswehr deve permanecer exclusivamente masculina. Com efeito, dado que as derrogações previstas por esta disposição só podem visar actividades específicas, uma tal exclusão, que se aplica à quase totalidade dos empregos militares da Bundeswehr, não pode ser considerada como uma medida derrogatória justificada pela natureza específica dos empregos em causa ou pelas condições especiais do seu exercício.

Tratando-se, por outro lado, da aplicação eventual do artigo 2._, n._ 3, da directiva, admitindo as diferenças de tratamento numa preocupação de protecção da mulher, a exclusão total de mulheres de qualquer emprego militar que inclua a utilização de armas não entra no âmbito destas diferenças.

Segue-se que a Directiva 76/207 opõe-se à aplicação de disposições nacionais, tais como as do direito alemão, que excluem de maneira geral as mulheres dos empregos militares que incluam a utilização de armas e que autorizam somente o seu acesso aos serviços de saúde e às formações de música militar.

(cf. n.os 15-16, 19-20, 27, 29-32 e disp.)

Partes


No processo C-285/98,

que tem por objecto um pedido dirigido ao Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 177._ do Tratado CE (actual artigo 234._ CE), pelo Verwaltungsgericht Hannover (Alemanha), destinado a obter, no litígio pendente neste órgão jurisdicional entre

Tanja Kreil

e

Bundesrepublik Deutschland,

uma decisão a título prejudicial sobre a interpretação da Directiva 76/207/CEE do Conselho, de 9 de Fevereiro de 1976, relativa à concretização do princípio da igualdade de tratamento entre homens e mulheres no que se refere ao acesso ao emprego, à formação e promoção profissionais e às condições de trabalho (JO L 39, p. 40; EE 05 F2 p. 70), nomeadamente do seu artigo 2._,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA,

composto por: G. C. Rodríguez Iglesias, presidente, J. C. Moitinho de Almeida e L. Sevón, presidentes de secção, P. J. G. Kapteyn, C. Gulmann, J.-P. Puissochet (relator), G. Hirsch, H. Ragnemalm e M. Wathelet, juízes,

advogado-geral: A. La Pergola,

secretário: L. Hewlett, administradora,

vistas as observações escritas apresentadas:

- em representação de T. Kreil, par J. Rothardt, advogado em Soltau,

- em representação do Governo alemão, por W.-D. Plesssing, Ministerialrat no Ministério Federal da Economia, e C.-D. Quassowski, Regierungsdirektor no mesmo ministério, na qualidade de agentes,

- em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por Jürgen Grunwald, consultor jurídico, na qualidade de agente,

visto o relatório para audiência,

ouvidas as alegações de T. Kreil, representada por J. Rothardt, do Governo alemão, representado por C.-D. Quassowski, do Governo italiano, representado por D. Del Gaizo, avvocato dello Stato, do Governo do Reino Unido, representado por J. E. Collins, Assistant Treasury Solicitor, na qualidade de agente, assistido por N. Pleming, QC, e da Comissão, representada por J. Grunwald, na audiência de 29 de Junho de 1999,

ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 26 de Outubro de 1999,

profere o presente

Acórdão

Fundamentação jurídica do acórdão


1 Por despacho de 13 de Julho de 1998, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 24 de Julho seguinte, o Verwaltungsgericht Hannover submeteu, nos termos do artigo 177._ do Tratado CE (actual artigo 234._ CE), uma questão prejudicial sobre a interpretação da Directiva 76/207/CEE do Conselho, de 9 de Fevereiro de 1976, relativa à concretização do princípio da igualdade de tratamento entre homens e mulheres no que se refere ao acesso ao emprego, à formação e promoção profissionais e às condições de trabalho (JO L 39, p. 40; EE 05 F2 p. 70, a seguir «directiva»), nomeadamente do seu artigo 2._

2 Essa questão foi suscitada no âmbito de um litígio que opõe T. Kreil à Bundesrepublik Deutschland, relativamente à recusa de admitir a interessada na Bundeswehr para ser empregada no serviço de manutenção (electromecânica de armas).

O enquadramento jurídico

3 O artigo 2._, n.os 1 a 3, da directiva estatui:

«1. O princípio da igualdade de tratamento, na acepção das disposições adiante referidas, implica a ausência de qualquer discriminação em razão do sexo, quer directa, quer indirectamente, nomeadamente pela referência à situação matrimonial ou familiar.

2. A presente directiva não constitui obstáculo à faculdade que os Estados-Membros têm de excluir do seu âmbito de aplicação as actividades profissionais e, eventualmente, as formações que a elas conduzam, e para as quais, em razão da sua natureza ou das condições do seu exercício, o sexo constitua um condição determinante.

3. A presente directiva não constitui obstáculo às disposições relativas à protecção da mulher, nomeadamente no que se refere à gravidez e à maternidade.»

4 Por força do artigo 9._, n._ 2, da directiva, «Os Estados-Membros devem proceder periodicamente a um exame das actividades profissionais referidas no n._ 2 do artigo 2._, com a finalidade de apreciar, tendo em consideração a evolução social, se se justificará manter as exclusões em questão. Devem comunicar à Comissão o resultado deste exame.»

5 Por força do artigo 12._a da Grundgesetz für Bundesrepublik Deutschland (Lei Fundamental da República Federal da Alemanha):

«(1) Os homens poderão, a partir dos dezoito anos completos, ser obrigados a servir nas forças armadas, na polícia federal das fronteiras ou numa unidade de protecção civil.

...

(4) Se, em situação de defesa, as necessidades em serviços civis dos estabelecimentos sanitários civis e dos hospitais militares fixos não puderem ser cobertas com base em voluntariado, poderão ser afectadas a esses serviços, por lei ou por virtude de uma lei, as mulheres com idades compreendidas entre os dezoito e os cinquenta anos completos. Não deverão em caso algum prestar serviço armado.»

6 As possibilidades de acesso das mulheres aos empregos militares da Bundeswehr regem-se, nomeadamente, pelo artigo 1._, n._ 2, da Soldatengesetz (lei relativa ao estatuto dos militares, a seguir «SG») e pelo artigo 3._a da Soltatenlaufbahnverordnung (regulamento da carreira militar, a seguir «SLV»), segundo os quais as mulheres só podem ser recrutadas com base num alistamento voluntário e unicamente para os serviços de saúde e para as formações de música militar.

O litígio no processo principal

7 T. Kreil, que tem uma formação em electrónica, apresentou, em 1996, a sua candidatura à admissão voluntária na Bundeswehr, exprimindo o desejo de ser afectada ao serviço de manutenção (electromecânica de armas). O seu pedido foi indeferido pelo centro de recrutamento, e, mais tarde, pela administração central do pessoal da Bundeswehr, em virtude de a lei excluir as mulheres dos empregos militares que impliquem a utilização de armas.

8 A interessada interpôs então recurso para o Verwaltunsgericht Hannover (tribunal administrativo de Hanôver), sustentando, nomeadamente, que a rejeição da sua candidatura por razões unicamente baseadas no sexo era contrária ao direito comunitário.

9 Entendendo que a solução do litígio requeria a interpretação da directiva, o Verwaltungsgericht Hannover decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«Verifica-se uma violação da Directiva do Conselho de 9 de Fevereiro de 1976 (76/207/CEE) - especialmente tendo em consideração o disposto no artigo 2._, n._ 2, desta directiva, nas disposições do § 1, n._ 2, terceira frase, da Soldatengesetz, na redacção de 15.2.1995 (BGBl. I, p. 1737) modificada ultimamente pela lei de 4.12.1997 (BGBl. I, p. 2846) e do § 3 a do Soldatenlaufbahnverordnung, na redacção publicada em 28.1.1998 (BGBl. I, p. 326) segundo as quais as mulheres quando se alistarem como voluntárias apenas podem ser chamadas para os serviços de saúde e de música militar, sendo, portanto, em qualquer caso, excluídas do serviço com armas?»

Quanto à questão prejudicial

10 Com esta questão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se a directiva se opõe à aplicação de disposições nacionais, tais como as do direito alemão, que excluem as mulheres dos empregos militares que impliquem a utilização de armas e que autorizam o seu acesso somente aos serviços de saúde e às formações de música militar.

11 T. Kreil sustenta que tal exclusão constitui uma discriminação directa contrária à directiva. Considera que não é admissível, à luz do direito comunitário, que uma lei ou um regulamento proíba a uma mulher o acesso à profissão que ela deseja exercer.

12 O Governo alemão considera, pelo contrário, que o direito comunitário não se opõe às disposições da SG e do SLV em causa, que são conformes com a norma constitucional que proíbe às mulheres a prestação de um serviço com armas. Em sua opinião, por um lado, o direito comunitário não regula, em princípio, as questões de defesa, que fazem parte do domínio da política externa e de segurança comum e que continuam na esfera de soberania dos Estados-Membros. Por outro, mesmo a supor que a directiva possa aplicar-se às forças armadas, as disposições nacionais em causa, que limitam o acesso das mulheres a certos empregos no Bundeswehr, podem ser justificadas por virtude do seu artigo 2._, n.os 2 e 3.

13 Os Governos italiano e o do Reino Unido, que apresentaram observações orais, sustentam principalmente que as decisões respeitantes à organização e à capacidade de combate das forças armadas não relevam do âmbito de aplicação do Tratado. A título subsidiário, alegam que o artigo 2._, n._ 2, da directiva permite justificar, em certas circunstâncias, a exclusão das mulheres do serviço em unidades combatentes.

14 A Comissão considera que a directiva, que é aplicável às relações de trabalho no serviço público, se aplica às relações de trabalho nas forças armadas. Entende que o artigo 2._, n._ 3, da directiva não pode justificar uma protecção mais forte das mulheres contra riscos que dizem respeito da mesma maneira aos homens e às mulheres. Quanto à questão de saber se o emprego solicitado por T. Kreil faz parte das actividades cuja natureza ou condições de exercício exigem como condição determinante, na acepção do artigo 2._, n._ 2, da directiva, que elas sejam exercidas por homens e não por mulheres, cabe, segundo a Comissão, ao órgão jurisdicional de reenvio responder-lhe no respeito do princípio da proporcionalidade e tendo em conta tanto a margem de apreciação deixada a cada Estado-Membro em função das suas particularidades próprias como o carácter progressivo da concretização do princípio da igualdade de tratamento entre homens e mulheres.

15 Antes de mais, tal como o Tribunal de Justiça salientou no n._ 15 do acórdão de 26 de Outubro de 1999, Sirdar (C-273/97, Colect., p. I-7403), cabe aos Estados-Membros, que têm de adoptar as medidas adequadas para garantirem a sua segurança interna e externa, tomar as decisões relativas à organização das suas forças armadas. Daqui não resulta, no entanto, que tais decisões devam escapar totalmente à aplicação do direito comunitário.

16 Com efeito, tal como o Tribunal de Justiça já declarou, o Tratado só prevê derrogações aplicáveis em caso de situações susceptíveis de pôr em causa a segurança pública nos artigos 36._, 48._, 56._, 223._ (que passaram, após alteração, a artigos 30._ CE, 39._ CE, 46._ CE e 296._ CE), e 224._ (actual artigo 297._ CE), os quais se referem a hipóteses excepcionais bem delimitadas. Daí não poderá deduzir-se que existe uma reserva geral, inerente ao Tratado, que exclua do âmbito de aplicação do direito comunitário todas as medidas tomadas por razões de segurança pública. Reconhecer a existência de tal reserva, para além das condições específicas estabelecidas nas disposições do Tratado, seria correr o risco de pôr em causa o carácter obrigatório e a aplicação uniforme do direito comunitário (v., neste sentido, acórdãos de 15 de Maio de 1986, Johnston, 222/84, Colect., p. 1651, n._ 26, e Sirdar, já referido, n._ 16).

17 Ora, o conceito de segurança pública, na acepção dos artigos do Tratado referidos no número anterior, cobre ao mesmo tempo a segurança interna de um Estado-Membro, como no processo principal em causa no acórdão Johnston, já referido, e a sua segurança externa, como no processo principal em causa no acórdão Sirdar, já referido (v., neste sentido, acórdãos de 4 de Outubro de 1991, Richardt e «Les Accessoires Scientifiques», C-367/89, Colect., p. I-4621, n._ 22, de 17 de Outubro de 1995, Leifer e o., C-83/94, Colect., p. I-3231, n._ 26, e Sirdar, já referido, n._ 17).

18 Além disso, algumas das derrogações previstas no Tratado dizem apenas respeito às regras relativas à livre circulação de mercadorias, de pessoas e de serviços, e não às disposições sociais do Tratado, entre as quais se integra o princípio da igualdade de tratamento entre homens e mulheres invocado por T. Kreil. De acordo com jurisprudência firmada, este princípio tem um alcance geral e a directiva aplica-se às relações de trabalho no sector público (v. acórdãos de 21 de Maio de 1985, Comissão/Alemanha, 248/83, Recueil, p. 1459, n._ 16, de 2 de Outubro de 1997, Gerster, C-1/95, Colect., p. I-5253, n._ 18, e Sirdar, já referido, n._ 18).

19 Segue-se que a directiva é aplicável numa situação tal como a que está em questão no processo principal.

20 Deve, em seguida, recordar-se que, nos termos do artigo 2._, n._ 2, da directiva, os Estados-Membros têm a faculdade de excluir do âmbito de aplicação da directiva as actividades profissionais para as quais, em razão da sua natureza ou das condições do seu exercício, o sexo constitua uma condição determinante, recordando-se, no entanto, que, como derrogação a um direito individual consagrado pela directiva, esta disposição é de interpretação estrita (v. acórdãos já referidos, Johnston, n._ 36, e Sirdar, n._ 23).

21 O Tribunal de Justiça reconheceu assim, por exemplo, que o sexo pode constituir uma condição determinante para empregos como os de guardas prisionais e chefes de guardas prisionais (acórdão de 30 de Junho de 1988, Comissão/França, 318/86, Colect., p. 3559, n.os 11 a 18), ou para determinadas actividades, como as de polícia, exercidas numa situação de graves perturbações internas (acórdão Johnston, já referido, n.os 36 e 37) ou ainda para o serviço em determinadas unidades combatentes especiais (acórdão Sirdar, já referido, n.os 29 a 31).

22 Um Estado-Membro pode reservar tais actividades, bem como a formação profissional que a elas conduzem, a homens ou a mulheres, consoante os casos. Nessa hipótese, os Estados-Membros são obrigados, como resulta do artigo 9._, n._ 2, da directiva, a proceder periodicamente a um exame das actividades profissionais em causa, com a finalidade de apreciar se, tendo em conta a evolução social, pode ainda ser mantida a derrogação ao regime geral da directiva (acórdãos já referidos, Johnston, n._ 37, e Sirdar, n._ 25).

23 Além disso, ao determinar o alcance de qualquer derrogação a um direito fundamental, como o direito à igualdade de tratamento entre homens e mulheres, é preciso, como recordou o Tribunal de Justiça no n._ 38 do acórdão Johnston, já referido, e no n._ 26 do acórdão Sirdar, já referido, respeitar o princípio de proporcionalidade, o qual faz parte dos princípios gerais do direito comunitário. Este princípio exige que as derrogações não ultrapassem os limites do adequado e necessário para atingir o fim prosseguido e exige a conciliação, na medida do possível, do princípio da igualdade de tratamento com as exigências da segurança pública que são determinantes para as condições de exercício das actividades em questão.

24 As autoridades nacionais competentes dispõem, todavia, e consoante as circunstâncias, de uma certa margem de apreciação quando adoptam medidas que entendem necessárias para garantir a segurança pública de um Estado-Membro (v. acórdãos, já referidos, Leifer e o., n._ 35, e Sirdar, n._ 27).

25 Importa, por conseguinte, como sublinhou o Tribunal de Justiça no n._ 28 do acórdão Sirdar, já referido, verificar se, nas circunstâncias do caso vertente, as medidas adoptadas pelas autoridades nacionais, na utilização da margem de apreciação que lhes é reconhecida, prosseguem, na realidade, o objectivo de garantir a segurança pública e se são adequadas e necessárias para o alcançar.

26 Tal como foi sublinhado nos n.os 5, 6 e 7 do presente acórdão, a recusa de admitir a recorrente no processo principal ao serviço da Bundeswehr em que desejava ser empregada tem por fundamento as disposições do direito alemão que prevêem a exclusão total das mulheres dos empregos militares que impliquem a utilização de armas e que autorizam somente o seu acesso aos serviços de saúde e às formações de música militar.

27 Tendo em conta o seu alcance, tal exclusão, que se aplica à quase totalidade dos empregos militares da Bundeswehr, não pode ser considerada como uma medida derrogatória justificada pela natureza específica dos empregos em causa ou pelas condições especiais do seu exercício. Ora, as derrogações previstas no artigo 2._, n._ 2, da directiva só podem visar actividades específicas (v., neste sentido, acórdão Comissão/França, já referido, n._ 25).

28 Além disso, tendo em conta a própria natureza das forças armadas, o facto de as pessoas que servem nessas forças poderem ser chamadas a utilizar armas não poderá justificar, por si só, a exclusão das mulheres do acesso aos empregos militares. Tal como especificou o Governo alemão, existe, aliás, nos serviços da Bundeswehr que são acessíveis às mulheres uma iniciação ao manejo de armas, destinada a permitir ao pessoal desses serviços defender-se e prestar socorro a outrem.

29 Nestas condições, mesmo tendo em conta a margem de apreciação de que dispõem quanto à possibilidade de manter a exclusão em causa, as autoridades nacionais não podiam, sem ignorar o princípio da proporcionalidade, considerar, de uma forma geral, que a composição de todas as unidades armadas do Bundeswehr devia permanecer exclusivamente masculina.

30 Finalmente, no tocante à aplicação eventual do artigo 2._, n._ 3, da directiva, também invocado pelo Governo alemão, esta disposição, tal como o Tribunal de Justiça salientou no n._ 44 do acórdão Johnston, já referido, visa assegurar, por um lado, a protecção da condição biológica da mulher e, por outro, as relações entre a mulher e o seu filho. Não permite, portanto, excluir as mulheres de um emprego pelo facto de que deveriam ser mais protegidas do que os homens contra riscos que são distintos das necessidades de protecção específicas da mulher, tais como as necessidades expressamente mencionadas.

31 Daí resulta que a exclusão total das mulheres de qualquer emprego militar que inclua a utilização de armas não entra no quadro das diferenças de tratamento admitidas pelo artigo 2._, n._ 3, da directiva numa preocupação de protecção da mulher.

32 Há, portanto que responder à questão prejudicial que a directiva se opõe à aplicação de disposições nacionais, tais como as do direito alemão, que excluem, de maneira geral, as mulheres dos empregos militares que incluam a utilização de armas e que autorizam o seu acesso somente aos serviços de saúde e às formações de música militar.

Decisão sobre as despesas


Quanto às despesas

33 As despesas efectuadas pelos Governos alemão, italiano e do Reino Unido bem como pela Comissão, que apresentaram observações ao Tribunal, não são reembolsáveis. Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional nacional, compete a este decidir quanto às despesas.

Parte decisória


Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA,

pronunciando-se sobre a questão submetida pelo Verwaltungsgericht Hannover, por despacho de 13 de Julho de 1998, declara:

A Directiva 76/207/CEE do Conselho, de 9 de Fevereiro de 1976, relativa à concretização do princípio da igualdade de tratamento entre homens e mulheres no que se refere ao acesso ao emprego, à formação e promoção profissionais e às condições de emprego, opõe-se à aplicação de disposições nacionais, tais como as do direito alemão, que excluem, de maneira geral, as mulheres dos empregos militares que incluam a utilização de armas e que autorizam o seu acesso somente aos serviços de saúde e às formações de música militar.

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