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Documento 61988CJ0145

Acórdão do Tribunal (Sexta Secção) de 23 de Novembro de 1989.
Torfaen Borough Council contra B & Q plc.
Pedido de decisão prejudicial: Cwmbran Magistrates' Court - Reino Unido.
Interpretação dos artigos 30.º e 36.º do Tratado CEE - Proibição de exercício de actividades comerciais ao domingo.
Processo C-145/88.

Colectânea de Jurisprudência 1989 -03851

Identificador Europeu da Jurisprudência (ECLI): ECLI:EU:C:1989:593

61988J0145

ACORDAO DO TRIBUNAL (SEXTA SECCAO) DE 23 DE NOVEMBRO DE 1989. - TORFAEN BOROUGH COUNCIL CONTRA B & Q PLC. - PEDIDO DE DECISAO PREJUDICIAL: CWMBRAN MAGISTRATES'COURT - REINO UNIDO. - LIVRE CIRCULACAO DE MERCADORIAS - INTERPRETACAO DOS ARTIGOS 30 E 36 DO TRATADO CEE - PROIBICAO DE EXERCER ACTIVIDADES COMERCIAIS AO DOMINGO. - PROCESSO 145/88.

Colectânea da Jurisprudência 1989 página 03851
Edição especial sueca página 00241
Edição especial finlandesa página 00255


Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória

Palavras-chave


++++

Livre circulação de mercadorias - Restrições quantitativas - Medidas de efeito equivalente - Regulamentação que proíbe a abertura ao domingo de lojas de venda a retalho - Admissibilidade - Condição

(Tratado CEE, artigo 30.°)

Sumário


O artigo 30.° do Tratado deve ser interpretado no sentido de que a proibição nele prevista não se aplica a uma regulamentação nacional que proíbe a abertura ao domingo de lojas de venda a retalho quando os efeitos restritivos que dela possam resultar para as trocas comerciais comunitárias não ultrapassem o âmbito dos efeitos específicos de uma regulamentação desse tipo.

Com efeito, tais regulamentações, relativas aos horários de venda a retalho, aplicáveis indistintamente aos produtos nacionais e aos produtos importados, prosseguem um objectivo que se justifica à luz do direito comunitário, dado que, por um lado, constituem a expressão de determinadas opções políticas e económicas na medida em que visam garantir uma repartição das horas de trabalho e de descanso adaptada às especificidades socioculturais nacionais ou regionais e, por outro, não visam regular as correntes de trocas comerciais entre os Estados-membros.

Partes


No processo C-145/88,

que tem por objecto um pedido dirigido ao Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 177.° do Tratado CEE, pelo Cwmbran Magistrates' Court do Reino Unido, destinado a obter, no processo pendente neste órgão jurisdicional entre

Torfaen Borough Council, por um lado,

e

B&Q plc, antes B&Q (Retail) Limited, de Gwent, por outro,

uma decisão a título prejudicial sobre a interpretação dos artigos 30.° e 36.° do Tratado CEE,

O TRIBUNAL (Sexta Secção),

constituído pelos Srs. C. N. Kakouris, presidente de secção, F. A. Schockweiler, T. Koopmans, G. F. Mancini e M. Díez de Velasco, juízes,

advogado-geral: W. Van Gerven

secretário: D. Louterman, administradora

vistas as observações apresentadas:

- em representação da demandante no processo principal, por D. Robinson, Solicitor do Torfaen Borough Council,

- em representação da demandante no processo principal, por D. Vaughan, Queen' s Counsel, G. Barling, Barrister, e A. Askham, Solicitor,

- em representação do Reino Unido, por S. J. Hay, Treasury Solicitor,

- em representação da Comissão, por E. L. White, membro do seu Serviço Jurídico, na qualidade de agente,

visto o relatório para audiência e após a realização desta em 23 de Maio de 1989,

ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 29 de Junho de 1989,

profere o presente

Acórdão

Fundamentação jurídica do acórdão


1 Por despacho de 25 de Abril de 1988, que deu entrada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 24 de Maio de 1988, o Cwmbran Magistrates' Court do Reino Unido submeteu, nos termos do artigo 177.° do Tratado CEE, três questões prejudiciais relativas à interpretação dos artigos 30.° e 36.° do Tratado CEE, com o objectivo de verificar a compatibilidade dessas disposições com uma regulamentação nacional que proíbe o exercício de actividades comerciais ao domingo.

2 Essas questões foram suscitadas no âmbito de um litígio entre o Torfaen Borough Council (Conselho Municipal de Torfaen), adiante "Council", e a empresa B&Q plc, antes B&Q (Retail) Limited, adiante "B&Q", que explora centros de "do it yourself" e jardinagem.

3 O Council acusa a B&Q de ter violado as secções 47 e 59 do United Kingdom Shops Act 1950 ao abrir ao domingo as suas lojas de venda a retalho para se entregar a operações comerciais diversas das previstas no anexo V do Shops Act. A B&Q estaria, assim, sujeita a uma multa máxima de 1 000 UKL.

4 O anexo V do Shops Act enumera, com efeito, os artigos que, por derrogação, podem ser vendidos nas lojas ao domingo. Trata-se, designadamente, de bebidas alcoólicas, alguns produtos alimentares, tabaco, jornais e outros produtos de consumo corrente.

5 Perante o órgão jurisdicional nacional, a B&Q sustentou ser a secção 47 do Shops Act 1950 uma medida de efeito equivalente a restrições quantitativas à importação, na acepção do artigo 30.° do Tratado CEE, e que essa medida não se justifica nos termos do artigo 36.° do Tratado CEE, nem a título de qualquer "exigência imperativa".

6 O Council contestou que a restrição incidente sobre as operações comerciais ao domingo constituísse uma medida de efeito equivalente a uma restrição quantitativa, por se aplicar tanto aos produtos nacionais como aos importados e não prejudicar as importações.

7 O órgão jurisdicional nacional constatou, antes de mais, no caso vertente, que a proibição de abertura da loja ao domingo tinha como efeito reduzir o total das vendas da empresa, que cerca de 10% das mercadorias postas à venda pela empresa em causa provinham de outros Estados-membros e que, consequentemente, ocorreria uma correspondente redução das importações provenientes de outros Estados-membros.

8 Com base nestas constatações, o órgão jurisdicional nacional entendeu, em seguida, que o litígio suscitava problemas de interpretação do direito comunitário. Assim, submeteu ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

"1) Constitui medida de efeito equivalente a uma restrição quantitativa das importações, na acepção do artigo 30.° do Tratado, a proibição, feita por um Estado-membro, de os estabelecimentos de venda a retalho estarem abertos ao domingo para venda de mercadorias aos seus clientes, excepto em relação a determinados produtos especificados, cuja venda é permitida, tendo essa proibição como efeito reduzir, em termos absolutos, as vendas de mercadorias nesses estabelecimentos, incluindo as produzidas noutros Estados-membros e, consequentemente, reduzir o volume de importações de bens provenientes de outros Estados-membros?

2) Em caso de resposta afirmativa à primeira questão, está essa medida abrangida por alguma das excepções ao artigo 30.° previstas no artigo 36.°, ou por qualquer outra excepção prevista no direito comunitário?

3) A resposta às questões anteriores é afectada por qualquer factor susceptível tornar a medida em questão uma forma de discriminação arbitrária ou uma restrição dissimulada ao comércio entre Estados-membros ou uma medida desproporcional ou por qualquer outra razão injustificada?"

9 Para mais ampla exposição do enquadramento jurídico e dos factos no processo principal, da tramitação do processo e das observações escritas entregues ao Tribunal de Justiça, remete-se para o relatório para audiência. Estes elementos apenas serão adiante retomados na medida do necessário para a fundamentação do Tribunal.

Quanto à primeira questão

10 Pela primeira questão, o órgão jurisdicional nacional pretende saber se a noção de medidas de efeito equivalente a restrições quantitativas, na acepção do artigo 30.° do Tratado, abrange também disposições que proíbem a abertura ao domingo de lojas de venda a retalho, na medida em que dessa proibição resulta a redução em números absolutos do volume de vendas dessas lojas, designadamente de artigos importados de outros Estados-membros.

11 Constate-se, a título liminar, que uma regulamentação nacional que proíbe a abertura ao domingo das lojas de venda a retalho é indistintamente aplicável aos produtos importados e nacionais. Em princípio, a comercialização dos produtos importados de outros Estados-membros não passa a ser mais difícil do que a dos produtos nacionais.

12 Recorde-se, em seguida, que, no acórdão de 11 de Julho de 1985, Cinéthèque (processos apensos 60 e 61/84, Recueil, p. 2618), o Tribunal de Justiça considerou, a respeito de uma proibição de aluguer de videocassetes indistintamente aplicável aos produtos nacionais e importados, que ela apenas é compatível com o princípio da livre circulação de mercadorias consignado no Tratado desde que os eventuais entraves que ela cause às trocas comunitárias não vão além do necessário para garantir o objectivo visado e que esse objectivo se justifique à luz do direito comunitário.

13 Assim sendo, necessário se torna, pois, num caso como o presente, examinar em primeiro lugar se uma regulamentação como a que está em causa prossegue um objectivo que se justifica à luz do direito comunitário. A este respeito, o Tribunal de Justiça entendeu já, no seu acórdão de 14 de Julho de 1981, Oebel (155/80, Recueil, p. 1993), que uma regulamentação nacional relativa aos horários de trabalho, de fornecimento e venda no sector da padaria e pastelaria constitui uma opção de política económica e social legítima conforme com os objectivos de interesse geral prosseguidos pelo Tratado.

14 A mesma consideração é aplicável às regulamentações nacionais relativas aos horários de venda a retalho. Tais regulamentações constituem, com efeito, a expressão de determinadas opções políticas e económicas na medida em que visam garantir uma repartição das horas de trabalho e de descanso adaptada às especificidades socioculturais nacionais ou regionais cuja apreciação cabe, no estado actual do direito comunitário, aos Estados-membros. Além disso, tais regulamentações não visam regular as correntes de trocas comerciais entre esses estados.

15 Deve verificar-se, em segundo lugar, se os efeitos de uma regulamentação nacional desse tipo não vão além do que é necessário para a prossecução do objectivo visado. Com efeito, como se refere no artigo 3.° da Directiva 70/50 da Comissão, de 22 de Dezembro de 1969 (JO 1970, L 13, p. 29), as medidas nacionais que regulam a comercialização dos produtos ficam abrangidas pela proibição contida no artigo 30.° quando os seus efeitos restritivos sobre a livre circulação das mercadorias ultrapassam o âmbito dos efeitos específicos de uma regulamentação comercial.

16 A questão de saber se os efeitos de uma regulamentação nacional determinada não ultrapassam esse âmbito integra-se na apreciação dos factos, que compete ao órgão jurisdicional nacional.

17 Deve, pois, responder-se à primeira questão dizendo que o artigo 30.° do Tratado deve ser interpretado no sentido de que a proibição nele prevista não se aplica a uma regulamentação nacional que proíbe a abertura ao domingo de lojas de venda a retalho quando os efeitos restritivos que dela possam resultar para as trocas comerciais comunitárias não ultrapassem o âmbito dos efeitos específicos de uma regulamentação desse tipo.

Quanto às segunda e terceira questões

18 Atendendo à resposta dada à primeira questão, não há que responder às segunda e terceira questões.

Decisão sobre as despesas


Quanto às despesas

19 As despesas efectuadas pelo Governo do Reino Unido e pela Comissão das Comunidades Europeias, que apresentaram observações ao Tribunal, não são reembolsáveis. Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional nacional, compete a este decidir quanto às despesas.

Parte decisória


Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL (Sexta Secção),

pronunciando-se sobre as questões submetidas pelo Cwmbran Magistrates' Court do Reino Unido, por despacho de 25 de Abril de 1988, declara:

O artigo 30.° do Tratado deve ser interpretado no sentido de que a proibição nele prevista não se aplica a uma regulamentação nacional que proíbe a abertura ao domingo de lojas de venda a retalho quando os efeitos restritivos que dela possam resultar para as trocas comerciais comunitárias não ultrapassem o âmbito dos efeitos específicos de uma regulamentação desse tipo.

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