EUR-Lex Access to European Union law

Back to EUR-Lex homepage

This document is an excerpt from the EUR-Lex website

Document 52017AE6154

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Recomendação de decisão do Conselho que autoriza a abertura de negociações com vista a uma convenção que estabelece um tribunal multilateral para a resolução de litígios em matéria de investimento» [COM(2017) 493 final]

EESC 2017/06154

JO C 110 de 22.3.2019, p. 145–155 (BG, ES, CS, DA, DE, ET, EL, EN, FR, HR, IT, LV, LT, HU, MT, NL, PL, PT, RO, SK, SL, FI, SV)

22.3.2019   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 110/145


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Recomendação de decisão do Conselho que autoriza a abertura de negociações com vista a uma convenção que estabelece um tribunal multilateral para a resolução de litígios em matéria de investimento»

[COM(2017) 493 final]

(2019/C 110/27)

Relator:

Philippe DE BUCK

Correlatora:

Tanja BUZEK

Consulta

13.12.2017 (Comissão Europeia)

Base jurídica

Artigo 207.o do TFUE

Competência

Secção REX

Adoção em secção

23.11.2018

Adoção em plenária

12.12.2018

Reunião plenária n.o

539

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

206/3/3

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O CESE reconhece plenamente que a resolução de litígios entre os investidores e o Estado (RLIE) em tratados de comércio e investimento se tornou cada vez mais controversa para algumas partes interessadas em termos de legitimidade, coerência e transparência. As críticas incluem, entre outras, considerações de ordem processual e substantiva.

1.2.

O CESE participou ativamente no debate em torno da reforma e modernização da proteção do investimento. Adotou os pareceres REX/464 e REX/411, nos quais manifestou várias preocupações e formulou recomendações.

1.3.

Por conseguinte, o CESE congratula-se com os esforços envidados pela Comissão Europeia no sentido de uma reforma multilateral da RLIE sob os auspícios da Comissão das Nações Unidas para o Direito Comercial Internacional (CNUDCI) e considera essencial que a UE permaneça aberta a todas as abordagens e ideias que surgiram em matéria de reforma da resolução de litígios entre os investidores e o Estado.

1.4.

O CESE congratula-se, em particular, com o compromisso no sentido de uma maior transparência, permitindo às organizações não governamentais acompanhar e inclusivamente participar nos debates.

1.5.

O CESE considera fundamental que o Grupo de Trabalho III da CNUDCI receba os contributos de todas as partes interessadas num esforço de maior inclusividade, e defende que é necessário melhorar o processo de convite das partes interessadas, assegurando um maior equilíbrio entre estas. Além disso, o CESE insta a Comissão a envidar todos os esforços para associar ativamente o CESE aos trabalhos do Grupo de Trabalho III.

1.6.

O CESE sempre reconheceu que o investimento direto estrangeiro (IDE) é um importante contributo para o crescimento económico, sendo necessário que os investidores estrangeiros beneficiem de uma proteção global contra a expropriação direta e a discriminação e gozem de direitos equivalentes aos dos investidores nacionais.

1.7.

No entanto, o CESE também sempre sublinhou que não se deve pôr em causa o direito de os Estados-Membros legislarem no interesse público.

1.8.

No contexto da criação de um tribunal multilateral de investimento (TMI), o CESE sublinha que há uma série de questões fundamentais que têm de ser abordadas: o âmbito de aplicação, a proteção do interesse público, a acessibilidade e a relação com os tribunais nacionais.

1.9.

O âmbito de aplicação: embora considere que seria preferível uma abordagem mais holística que abrangesse as preocupações relativas tanto aos aspetos substantivos como aos processuais da proteção do investimento, o CESE observa que o âmbito de aplicação foi limitado aos aspetos processuais da resolução de litígios entre os investidores e os Estados.

1.10.

O interesse público: o CESE considera fundamental que o TMI em nada afete a capacidade da UE e dos Estados-Membros de cumprirem as suas obrigações decorrentes de acordos internacionais em matéria de ambiente, direitos humanos e trabalho, bem como de proteção dos consumidores, e preveja garantias processuais contra ações que visem a legislação de interesse público nacional. Por conseguinte, o CESE entende que tal só pode ser suficientemente alcançado mediante a inclusão de uma cláusula de hierarquia e de uma exceção de interesse público.

1.11.

Direitos de terceiros e pedidos reconvencionais: o CESE considera a permissão de observações amicus curiae um primeiro passo, cabendo, no entanto, garantir que estas são devidamente tidas em consideração pelos juízes; congratula-se com o facto de o mandato prever a possibilidade de intervenções de terceiros e recomenda analisar o papel destes terceiros, que podem ser residentes locais, trabalhadores, sindicatos, grupos de proteção do ambiente ou consumidores.

1.12.

Relação com os tribunais nacionais: o CESE considera que o TMI não pode, em circunstância alguma, afetar negativamente o sistema judicial da UE e a autonomia do direito da UE. Assinala que as partes interessadas têm posições divergentes sobre a questão da relação entre os tribunais nacionais e o TMI; não obstante, incentiva a Comissão Europeia a estudar de forma mais aprofundada a questão do esgotamento das vias de recurso locais e a forma como esta regra poderia funcionar no contexto do tribunal multilateral de investimento.

1.13.

Independência e legitimidade dos juízes: a nomeação de juízes a título permanente é considerada um fator essencial para começar a estabelecer jurisprudência, ao mesmo tempo que as suas qualificações exigem conhecimentos comprovados num leque alargado de ramos do direito. O CESE congratula-se com os compromissos de definir critérios claros e de alto nível para assegurar o Estado de direito e a confiança do público e solicita que o processo de seleção seja transparente e sujeito aos princípios do controlo público.

1.14.

Um sistema eficaz: embora deva haver um secretariado incumbido de gerir eficazmente o TMI, este deve estar dotado de recursos suficientes para o seu funcionamento, e os custos administrativos devem ser cobertos pelas partes numa base equitativa tendo em conta diferentes critérios. As PME devem beneficiar do mesmo nível de proteção e de acesso aos mecanismos de resolução de litígios mediante condições e custos razoáveis e todas as decisões do TMI devem ter força executiva e ser tornadas públicas.

1.15.

Elevado nível de proteção e eventual período de transição: é importante notar que nenhum dos acordos celebrados pela UE ou os Estados-Membros será automaticamente colocado sob a jurisdição de um tribunal multilateral de investimento e que durante um eventual período de transição os procedimentos de resolução de litígios acordados continuam a aplicar-se, a fim de assegurar um elevado nível de proteção dos investimentos, dada a constitucionalidade e a viabilidade de um TMI ao abrigo da legislação da UE.

2.   Contexto

2.1.

Desenvolvido por mais de 3 200 acordos desde a década de 1970, o sistema de proteção do investimento inclui cláusulas substantivas de proteção do investimento e cláusulas relativas ao procedimento de resolução de litígios, que preveem um mecanismo através do qual os investidores estrangeiros podem intentar ações contra os Estados de acolhimento (resolução de litígios entre os investidores e o Estado, RLIE) em conformidade com as disposições jurídicas previstas nos acordos.

2.2.

O CESE chama a atenção para uma publicação recente no âmbito dos documentos de trabalho da Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Económicos (OCDE) sobre o investimento internacional, da autoria do analista político Joachim Pohl, intitulada «Societal benefits and costs of International Investment Agreements — A critical review of aspects and available empirical evidence» [Custos e benefícios para a sociedade dos acordos de investimento internacionais — Análise crítica de certos aspetos e dos dados empíricos disponíveis] (1).

2.3.

Nos últimos anos, a reforma da RLIE tem ocupado um lugar central no debate sobre a política de investimento da UE, tendo o sistema de proteção do investimento sido alvo de crescente controvérsia, com várias partes interessadas a apontarem o dedo à sua legitimidade, coerência e transparência. As críticas incluem, entre outras, considerações de ordem processual e substantiva.

2.4.

Estas preocupações foram expressas em particular em duas consultas públicas organizadas pela Comissão Europeia — a primeira durante as negociações sobre a Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento (PTCI) (2) em 2014 e a segunda no âmbito dos esforços multilaterais para a reforma da resolução de litígios em matéria de investimentos (3) em 2017.

2.5.

Na sua resolução de 8 de julho de 2015 relativa à PTCI, o Parlamento Europeu convidou a Comissão a «substituir o sistema de resolução de litígios entre os investidores e os Estados por um novo sistema de resolução de litígios entre os investidores e os Estados sujeito aos princípios e ao controlo democráticos, mediante o qual os eventuais processos sejam tratados de forma transparente por juízes profissionais, independentes e nomeados pelo poder público em audições públicas e que inclua um mecanismo de recurso capaz de garantir a coerência das decisões judiciais e o respeito da competência dos tribunais da UE e dos Estados-Membros e que não permita que os interesses privados comprometam os objetivos das políticas públicas» (4).

Evolução a nível da UE

2.6.

Em resposta aos críticos do atual sistema de RLIE e à insistência da sociedade civil na necessidade de o reformar, a Comissão propôs o Sistema de Tribunais de Investimento (STI), que consiste num sistema de resolução de litígios entre os investidores e o Estado, e incluiu-o no Acordo Económico e Comercial Global UE-Canadá (CETA) e nos acordos de comércio livre entre a UE e Singapura e a UE e o Vietname.

2.7.

Neste contexto, é prevista uma disposição específica no artigo 8.29 do CETA, que insta as partes a ponderarem a possibilidade de instituírem um tribunal multilateral de investimento (TMI) no futuro: «As Partes, em conjunto com outros parceiros comerciais, procedem à instituição de um tribunal multilateral de investimento e de um mecanismo de recurso para a resolução de litígios em matéria de investimento. Quando da instituição desse mecanismo multilateral, o Comité Misto CETA adota uma decisão que estabelece que os litígios em matéria de investimento ao abrigo da presente secção devem ser decididos mediante recurso ao referido mecanismo multilateral e adota as disposições transitórias adequadas».

2.8.

No entanto, ainda nenhum dos acordos supramencionados foi ratificado e há um processo pendente no Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) relacionado com o STI previsto no CETA (5), cuja decisão demorará vários meses.

2.9.

O CESE regista que o Acordo de Parceria Económica UE-Japão não inclui qualquer capítulo relativo à proteção do investimento, dado que o Japão não pôde aceitar a proposta da UE sobre o STI.

Participação do CESE

2.10.

Ao longo deste processo, o Comité Económico e Social Europeu (CESE) tem participado ativamente no debate sobre a modernização e a reforma da proteção do investimento, e o sistema de RLIE em particular, o que inclui a organização de duas audições públicas em junho de 2016 (6) e, mais recentemente, em fevereiro de 2018 (7). Neste contexto, o CESE adotou o Parecer REX/464 — Posição do CESE sobre questões-chave específicas da PTCI (8), bem como o Parecer REX/411 — Proteção dos investidores e resolução de litígios entre os investidores e o Estado nos acordos comerciais e de investimento da UE com países terceiros (9).

2.11.

O CESE reconheceu que o investimento direto estrangeiro (IDE) é um importante contributo para o crescimento económico, sendo necessário que os investidores estrangeiros beneficiem de uma proteção global contra a expropriação direta e a discriminação e tenham direitos equivalentes aos dos investidores nacionais.

2.12.

Ao mesmo tempo, o CESE sublinhou que o direito que assiste ao Estado de regulamentar em prol do interesse público é primordial e não pode ser posto em causa pelas cláusulas de nenhum acordo de investimento internacional (AII). Impõe-se, assim, a introdução de uma cláusula inequívoca que estipule horizontalmente este direito.

2.13.

Em conclusão, o CESE considerou que a proposta da Comissão Europeia relativa ao STI é um passo na direção certa, mas deve ser melhorada em vários domínios para que esse sistema possa funcionar como um órgão judicial internacional independente. Por outro lado, o CESE tomou nota de que certas partes interessadas questionam a necessidade de um sistema separado de arbitragem em matéria de investimento, no âmbito de sistemas jurídicos nacionais que funcionam devidamente e estão bem desenvolvidos.

2.14.

No seu Parecer — Proteção dos investidores e resolução de litígios entre os investidores e o Estado nos acordos comerciais e de investimento da União Europeia com países terceiros (10), o CESE suscita várias questões que dizem mais especificamente respeito à RLIE, nomeadamente: conflito de interesses e parcialidade dos árbitros; ações improcedentes; natureza do setor da arbitragem; utilização da RLIE sem procurar outras vias de recurso; utilização desnecessária da RLIE entre países com sistemas judiciais desenvolvidos; eventual incompatibilidade da RLIE com o direito da UE; e opacidade dos procedimentos.

Nível multilateral

2.15.

Simultaneamente, estão também em curso debates a nível multilateral sobre a reforma da RLIE. Em 10 de julho de 2017, na sequência de um pedido formal de muitos dos seus membros, incluindo os Estados-Membros da União Europeia (11), a Comissão das Nações Unidas para o Direito Comercial Internacional (CNUDCI) decidiu criar o Grupo de Trabalho III, liderado pelos governos, cujo mandato o autoriza a i) identificar e ter em conta as preocupações relativas à RLIE; ii) determinar se é desejável uma reforma tendo em conta os eventuais problemas identificados; e iii) caso o grupo de trabalho conclua que é desejável uma reforma, desenvolver soluções pertinentes a recomendar à Comissão Europeia (12).

2.16.

Numa perspetiva mais ampla, a Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (CNUCED) também contribui para o debate em curso sobre a reforma da RLIE, proporcionando uma análise do atual sistema de AII e recomendações para a modernização dos mesmos, nomeadamente promover a interpretação conjunta das disposições dos acordos, alterar ou substituir acordos desatualizados, referenciar normas mundiais, atuar a nível multilateral e denunciar ou abandonar antigos acordos (13).

2.17.

Segundo estatísticas da CNUCED, que foram salientadas na audição pública do CESE realizada em fevereiro de 2018, 107 acordos de investimento que continham cláusulas de RLIE foram rescindidos sem serem substituídos nos últimos anos. No ano passado, o número de acordos de investimento que foram rescindidos foi superior ao número de acordos celebrados (14). O CESE constata que alguns países começaram a reconsiderar a sua abordagem da RLIE.

2.18.

O CESE salienta que, para além da reforma da RLIE, vários instrumentos políticos podem também contribuir para assegurar um enquadramento viável para os investimentos, nomeadamente:

reforço dos sistemas judiciais nacionais;

fornecimento de seguros aos investidores, nomeadamente através da Agência Multilateral de Garantia dos Investimentos do Banco Mundial;

prevenção de litígios;

formas mais conciliadoras de resolução de litígios, como a mediação;

promoção do investimento; e

resolução de litígios entre Estados.

2.19.

Por último, o CESE toma nota da Resolução 26/9 do Conselho dos Direitos Humanos das Nações Unidas, de 26 de junho de 2014, nos termos da qual decidiu estabelecer um grupo de trabalho intergovernamental aberto sobre empresas transnacionais e outras empresas no âmbito dos direitos humanos, cujo mandato consiste em elaborar um instrumento internacional juridicamente vinculativo para regulamentar, no direito internacional em matéria de direitos humanos, as atividades de empresas transnacionais e outras empresas (15). Este «tratado vinculativo das Nações Unidas», que está atualmente a ser debatido pelos seus membros, visa codificar as obrigações internacionais em matéria de direitos humanos aplicáveis às atividades de empresas transnacionais. O CESE considera que tal poderá ter efeitos futuros no contexto dos acordos comerciais e de investimento.

Mandato da Comissão

2.20.

Em 13 de setembro de 2017, a Comissão Europeia publicou a recomendação de decisão do Conselho que autoriza a abertura de negociações com vista a uma convenção que estabelece um tribunal multilateral para a resolução de litígios em matéria de investimento (16). O mandato, com a redação que lhe foi dada pelos Estados-Membros, foi adotado pelo Conselho em 20 de março de 2018 (17).

2.21.

As diretrizes de negociação adotadas visam a criação de um tribunal permanente com juízes independentes que possam tomar decisões constantes, previsíveis e coerentes sobre litígios em matéria de investimento entre investidores e Estados com base em acordos bilaterais ou multilaterais, quando ambas as partes (ou pelo menos duas das partes) nesses acordos tenham concordado em submetê-los à jurisdição do tribunal. É também prevista uma instância de recurso. De um modo geral, o tribunal deve funcionar de forma transparente, eficiente e eficaz em termos de custos, inclusivamente quando da nomeação de juízes. O tribunal deve também permitir a intervenção de terceiros (incluindo, por exemplo, organizações laborais ou ambientais interessadas).

3.   Observações na generalidade

3.1.

O CESE saúda os esforços da Comissão Europeia no sentido de uma reforma multilateral da resolução de litígios entre os investidores e o Estado. Reconhece igualmente a dinâmica mais ampla da reforma da RLIE, os esforços multilaterais desenvolvidos sob a égide da CNUDCI, bem como diferentes esforços nacionais.

3.2.

O CESE considera fundamental que a UE permaneça aberta a todas as opções para a reforma da RLIE, especialmente tendo em conta as várias outras abordagens e ideias que emergiram em relação à reforma da RLIE. As propostas formuladas por outros países e organizações devem ser tidas em conta e analisadas, nomeadamente pelo Grupo de Trabalho III da CNUDCI.

3.3.

Neste contexto, o CESE toma nota de que a consulta pública realizada pela Comissão Europeia sobre as opções para uma reforma multilateral da resolução de litígios em matéria de investimento incidiu sobretudo em questões técnicas relativas à criação de um TMI permanente. O CESE sublinha que as partes interessadas têm posições bastante díspares sobre a consideração ou não de opiniões alternativas pela avaliação da Comissão Europeia.

3.4.

Embora o processo de negociação relativo à criação de um TMI não tenha ainda sido lançado, e se preveja um processo moroso e complexo, o CESE saúda o empenho reforçado da Comissão Europeia em prol da transparência, em especial a publicação do projeto de mandato de negociação. O CESE louva o Conselho pela publicação do mandato final aprovado pelos Estados-Membros. Trata-se de um passo importante para garantir que os debates e as eventuais negociações decorrem de forma transparente, responsável e inclusiva.

3.5.

A realização de debates sob a égide da CNUDCI constitui, sobretudo em termos de transparência, um passo na direção certa, uma vez que permite às organizações não governamentais acompanhar os debates e até participar nos mesmos. Não obstante, o CESE assinala que nem todas as partes interessadas pertinentes tiveram acesso aos debates e que mais organizações — representantes de empresas, sindicatos e outras organizações de interesse público — devem ser convidadas pela CNUDCI no âmbito do Grupo de Trabalho III O processo de decisão deve ser totalmente transparente e baseado no consenso.

3.6.

O CESE considera fundamental que o grupo de trabalho acolha os contributos de todas as partes interessadas num esforço para reforçar a inclusividade e que o processo de seleção das partes interessadas deve ser melhorado e mais equilibrado. Neste contexto, apela à Comissão Europeia para que assegure uma participação mais ativa do CESE.

3.7.

A criação de um TMI é um projeto a longo prazo que requer o empenho de uma massa crítica de Estados dispostos a serem partes no tribunal. Por conseguinte, a UE deve empreender todos os esforços diplomáticos necessários para convencer países terceiros a participarem nessas negociações. O CESE considera particularmente importante que este projeto seja também realizado e apoiado pelos países em desenvolvimento.

3.8.

Qualquer futuro TMI teria como objetivo agilizar o procedimento de resolução de litígios em ações intentadas entre investidores e Estados no âmbito de um leque alargado de acordos internacionais em vigor em matéria de investimento. Embora exista uma certa semelhança entre as cláusulas substantivas de proteção do investimento em tratados bilaterais em matéria de investimentos ou em acordos de comércio livre com capítulos sobre a proteção do investimento, é difícil alcançar a plena harmonização do sistema.

3.9.

Tal exigiria uma reforma mais ampla. Embora ainda não esteja implementado, e esteja a ser examinado pelo TJUE, o STI, conforme previsto no CETA (18) e nos acordos de comércio livre entre a UE e Singapura (19), a UE e o Vietname e a UE e o México, e noutros que se seguirão (20), poderá proporcionar experiência e contribuir para o desenvolvimento de regras para um TMI.

3.10.

O objetivo da recomendação da Comissão Europeia é criar um novo sistema de resolução de litígios entre os investidores e os Estados. O CESE reconhece que várias preocupações manifestadas pela sociedade civil podem ser abordadas pelo novo sistema. No entanto, algumas questões fundamentais permanecem em aberto e exigem maior clarificação.

Questões fundamentais

3.11.

Reconhecendo que o processo de reforma multilateral da RLIE se encontra ainda nas suas fases iniciais, várias questões fundamentais são levantadas pelas partes interessadas no contexto da criação de um TMI. Estas questões concentram-se em torno de aspetos relativos ao âmbito de aplicação — a reforma abrangerá os elementos substantivos ou os elementos processuais da proteção do investimento, ou ambos —, à acessibilidade — os investidores só poderão intentar ações no âmbito de um TMI ou poderão fazê-lo também no âmbito de outras instâncias —, e ao esgotamento das vias de recurso internas — será ou não necessário esgotar primeiro as vias de recurso internas disponíveis antes de um investidor poder intentar uma ação no âmbito de um futuro TMI. O presente parecer analisa estas questões.

3.12.

Quanto a estas questões, o CESE salienta que a eventual criação de um TMI deve ter em conta tanto o princípio da subsidiariedade como o artigo 1.o do TUE, que prevê que «as decisões serão tomadas de uma forma tão aberta quanto possível e ao nível mais próximo possível dos cidadãos» (21).

3.13.

O CESE toma nota das preocupações com a possibilidade de o TMI resultar na expansão do sistema de RLIE sem que primeiro sejam adequadamente abordadas as preocupações existentes a respeito do STI, incluindo a sua compatibilidade com o direito da UE. O CESE partilha a opinião de que um tribunal internacional de investimento não deve, em nenhuma circunstância, tornar-se um substituto geral para a resolução de litígios internos em países com sistemas judiciais adequados.

3.14.

Várias partes interessadas expressaram sérias reservas quanto a uma reforma do procedimento antes de avaliar o direito substantivo a aplicar por um futuro TMI e à atribuição de poderes a um órgão multilateral institucionalizado para interpretar estas normas. De igual modo, existem receios de que tal possa criar uma nova base de poder jurídico em si mesma. Outras partes interessadas concordam com o ponto de vista da Comissão Europeia de que o direito substantivo está definido nos acordos subjacentes.

4.   Âmbito de aplicação da reforma proposta: entre as cláusulas substantivas de proteção e o procedimento de resolução de litígios

4.1.

O CESE constata que o âmbito de aplicação da reforma multilateral proposta foi limitado aos aspetos processuais da resolução de litígios entre os investidores e o Estado.

4.2.

O CESE, embora considere que seria preferível uma abordagem mais holística, abrangendo as preocupações relativas a aspetos substantivos e processuais da proteção do investimento, reconhece a complexidade dessa abordagem e a necessidade de reunir apoio político a nível multilateral.

4.3.

Atendendo aos debates realizados sob a égide da CNUDCI, o Grupo de Trabalho III identificou vários desafios, incluindo a questão de saber se é possível avançar para uma reforma processual da resolução de litígios entre os investidores e o Estado antes de uma reforma de fundo. A CNUDCI considera esta tarefa difícil, mas não impossível. Neste contexto, o Grupo de Trabalho III analisará questões que possam estar relacionadas com o processo mas, ao mesmo tempo, possam afetar de modo significativo a legitimidade e a coerência do sistema no seu conjunto, designadamente: um código de conduta para árbitros, financiamento de terceiros e procedimentos paralelos.

4.4.

A proteção substantiva do investimento é normalmente concedida através de alguns princípios, designadamente: tratamento nacional, tratamento de nação mais favorecida (NMF), tratamento justo e equitativo e garantia de transferência de capital. No entanto, existem limitações às ações intentadas por investidores estrangeiros para resolução de litígios. Por exemplo, as ações não podem basear-se apenas no fundamento do lucro cessante ou unicamente numa alteração da legislação nacional.

4.5.

Os Estados adotam medidas diferentes para dar resposta às preocupações manifestadas. Estas medidas variam entre abordagens mais holísticas, nomeadamente o desenvolvimento de novos modelos de acordos que visam reformar os elementos substantivos e processuais da proteção do investimento, e abordagens mais específicas que se concentram na reforma da componente substantiva ou da componente processual da proteção do investimento. O CESE observa que a UE já começou a promover uma abordagem mais holística, pelo menos a nível bilateral, através do STI.

4.6.

O objetivo expresso pela Comissão Europeia é o de que, uma vez criado, o TMI se torne o modelo normalizado para a resolução de litígios em matéria de investimento em todos os futuros acordos da UE e, em última análise, substitua os mecanismos processuais nos acordos de investimento da UE e dos Estados-Membros em vigor.

4.7.

Neste contexto, se vier a ter lugar, a criação de um TMI deverá reformar o sistema de RLIE em vigor, de uma forma que, por um lado, assegure uma proteção eficaz dos investimentos diretos estrangeiros e, por outro, aborde plenamente as preocupações suscitadas pelas partes interessadas. Importa notar que, a este respeito, foram alcançados progressos consideráveis, em particular no contexto dos mais recentes e modernos acordos de comércio livre negociados pela UE.

5.   O interesse público

5.1.

O CESE considera fundamental que o TMI em nada afete a capacidade da UE e dos Estados-Membros de cumprir as suas obrigações decorrentes de acordos internacionais em matéria de ambiente, direitos humanos e trabalho, bem como de proteção dos consumidores.

5.2.

Antes de mais, o acordo que institui o TMI deverá conter uma cláusula de hierarquia que garanta que, em caso de incoerência entre um acordo de investimento internacional e qualquer acordo internacional em matéria ambiental, social ou de direitos humanos que vincule uma das partes num litígio, prevalecem as obrigações decorrentes do acordo internacional em matéria ambiental, social ou de direitos humanos, de molde a evitar que seja dada primazia aos acordos de investimento (22). Esta cláusula é particularmente importante para assegurar que as partes no TMI dispõem da liberdade necessária para alcançar os objetivos ao abrigo do Acordo de Paris, que exige uma alteração significativa da regulamentação para concretizar uma transição energética bem-sucedida.

5.3.

São necessárias garantias processuais contra ações que visem legislação de interesse público nacional para garantir que o direito das partes de regulamentar em prol do interesse público, da forma que entendam adequada, se sobrepõe à proteção do investidor. O CESE entende que tal só pode ser suficientemente conseguido através da inclusão de uma exceção de interesse público. Contudo, essa exceção deve ser acompanhada das necessárias garantias contra a utilização abusiva por motivos protecionistas. Neste contexto, o direito de regulamentar no domínio da proteção social tem de ser expressamente mencionado nos acordos coletivos, onde se incluem os acordos tripartidos e/ou de aplicação geral (erga omnes), a fim de evitar que os mesmos possam ser interpretados como uma violação das expectativas legítimas de um investidor (23).

5.4.

O CESE assinala que o artigo 8.18, n.o 3, do CETA já garante que um investidor não pode intentar uma ação se o investimento tiver sido realizado através de comportamento doloso, encobrimento, corrupção ou um ato que configure um desvio de processo. Um possível futuro acordo que institua o TMI deverá assegurar o alargamento desta cláusula à legislação aplicável em matéria de fraude, violações dos direitos humanos e violações do direito (internacional) social, do ambiente e do consumidor.

5.5.

Deverão também ser incluídos critérios rigorosos para evitar ações improcedentes e garantir a rápida rejeição de processos infundados no regulamento interno do TMI. A existência de procedimentos de tramitação prejudicial acelerada para rejeitar ações improcedentes é importante, uma vez que abordará uma das críticas contra o atual sistema, evitando, no futuro, a sua utilização de forma abusiva. Além disso, uma tal tramitação acelerada para as ações destituídas de fundamento jurídico contribuirá para a redução dos custos de funcionamento do tribunal.

5.6.

O CESE assinala que um ponto de preocupação levantado durante a sua audição pública foi a possibilidade de os litígios serem financiados por terceiros. O financiamento por terceiros pode não servir os objetivos iniciais dos acordos de investimento e pode resultar em incentivos perversos. Por conseguinte, o CESE recomenda que se estude o impacto e a necessidade de financiamento por terceiros e a sua regulamentação no âmbito do TMI (24).

6.   Direitos de terceiros e pedidos reconvencionais

6.1.

O CESE considera que a permissão de observações amicus curiae (25), que atualmente já são possíveis no âmbito de um número significativo de procedimentos de RLIE, constitui um primeiro passo bem-vindo para assegurar um sistema equilibrado e justo. No entanto, o CESE entende que é essencial assegurar que a convenção que estabelece o TMI não só garanta a admissibilidade das observações amicus curiae, como também exija que os juízes as tenham em devida consideração nas suas deliberações.

6.2.

O CESE congratula-se, por conseguinte, com a inclusão da possibilidade de intervenção de terceiros no mandato do TMI. Contudo, o CESE recomenda que se analise o papel dos terceiros para além das atuais regras da CNUDCI, a fim de assegurar um sistema equilibrado e justo e direitos efetivos para os terceiros afetados, que podem ser habitantes locais, trabalhadores, sindicatos, grupos ambientais ou consumidores.

6.3.

O CESE acolhe com agrado os esforços desenvolvidos pela Comissão Europeia, no contexto da proposta relativa à criação de um tribunal de investimentos no quadro da PTCI, no sentido de assegurar a possibilidade de intervenção de terceiros, bem como a clarificação, no mandato, de que tais intervenções estarão abertas a todas as partes interessadas que tenham um interesse legítimo num processo. O CESE solicita à Comissão Europeia que assegure que os critérios vigentes no âmbito do TMI não sejam desnecessariamente restritivos e permitam um acesso justo aos processos, no pleno respeito e no espírito das obrigações da UE ao abrigo da Convenção de Aarhus.

6.4.

Algumas partes interessadas são de opinião que o TMI deveria também poder pronunciar-se sobre ações intentadas por terceiros, bem como sobre pedidos reconvencionais apresentados por Estados contra investidores, como acontece atualmente ao abrigo do antigo sistema de RLIE. Esta matéria suscita uma série de questões jurídicas e práticas que têm de ser cuidadosamente analisadas. Por exemplo, esta possibilidade depende da legislação aplicável, ou seja, as disposições substantivas incluídas nos acordos submetidos à jurisdição do tribunal.

6.5.

O CESE solicita à Comissão Europeia que assegure que, no mínimo, o TMI não fecha a porta a ações de terceiros afetados contra investidores estrangeiros. Para este efeito, a convenção que estabelece o TMI poderia conter disposições que admitissem tais ações nos casos em que as partes num acordo internacional tenham acordado na competência jurisdicional do TMI em tais litígios.

7.   Relação com os tribunais nacionais

7.1.

O CESE considera que o TMI não pode, em circunstância alguma, afetar negativamente o sistema judicial da UE e a autonomia do direito da UE. O CESE recorda que, no Parecer REX/411, afirmou que há fortes preocupações quanto à relação da RLIE com o ordenamento jurídico da UE, tanto em termos dos Tratados da UE como do direito constitucional. Por conseguinte, para que a RLIE respeite o direito da UE, o CESE considerou «imperativo que o Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) se pronuncie formalmente, sob a forma de um parecer, antes de as instituições competentes tomarem uma decisão e antes da entrada em vigor provisória de quaisquer acordos de investimento internacionais negociados pela Comissão Europeia».

7.2.

Neste contexto, o CESE chama a atenção para dois casos examinados pelo TJUE, que se basearam no antigo sistema de arbitragem em matéria de RLIE e são pertinentes para a discussão. Em primeiro lugar, no seu Parecer 2/15, de 16 de maio de 2017, sobre o Acordo de Comércio Livre entre a UE e Singapura, o TJUE determinou que a UE não dispõe de competência exclusiva em matéria de RLIE, considerando que a RLIE «subtrai litígios à competência jurisdicional dos Estados-Membros». Em segundo lugar, no seu Acórdão no processo C-284/16, Slowakische Republik contra Achmea BV, sobre acordos de investimento intra-UE, o TJUE considerou que a RLIE subtrai litígios à competência dos órgãos jurisdicionais dos Estados-Membros da UE e, por conseguinte, ao sistema de vias de recurso jurisdicionais no sistema jurídico da UE.

7.3.

O CESE louva o Governo belga pela solicitação de um parecer nos termos do artigo 218.o, n.o 11, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE) sobre a compatibilidade do sistema judicial em matéria de investimento incluído no CETA com os Tratados da UE, como solicitado no seu Parecer — Posição do CESE sobre questões-chave específicas das negociações relativas à Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento (PTCI) (26). O CESE manifesta a esperança de que o Parecer 1/17 do TJUE forneça às instituições da UE a muito necessária orientação sobre questões importantes de direito constitucional europeu.

7.4.

O CESE está ciente de que algumas partes interessadas consideram que a forma mais eficaz de preservar os poderes dos tribunais nacionais é limitar o recurso ao tribunal multilateral de investimento aos Estados e organizações internacionais como a UE. Além disso, a resolução de litígios entre Estados é o mecanismo-padrão de resolução de litígios ao abrigo do direito internacional público, já foi utilizada em vários acordos de investimento e deve, por conseguinte, ser privilegiada em relação ao direito em matéria de investimento. O CESE assinala que outras partes interessadas consideram que a resolução de litígios entre os investidores e o Estado é uma opção mais eficaz no caso do investimento, proporcionando, em seu entender, uma resolução de litígios neutra, despolitizada e eficaz em termos de custos. Tem sido o sistema-padrão para a resolução de litígios em matéria de investimento desde o seu estabelecimento há várias décadas.

7.5.

O CESE observa que a questão da relação entre os tribunais nacionais e o tribunal multilateral de investimento é vista de forma diferente por várias partes interessadas. Enquanto umas consideram que o tribunal multilateral de investimento deve ser utilizado como último recurso, depois de obrigatoriamente se terem esgotado as vias de recurso internas, outras defendem que a abordagem «no U-turn» (sem retorno) atualmente seguida pela Comissão Europeia constitui também uma boa base no âmbito do tribunal multilateral de investimento.

7.6.

Ao abrigo da abordagem «no U-turn», o investidor tem o direito de recorrer diretamente aos tribunais locais ou ao STI/TMI. Contudo, depois de concluído num destes foros, o processo não pode ser reaberto pelo investidor noutro foro. Algumas partes interessadas consideram que esta abordagem responde com sucesso às preocupações suscitadas pelo facto de os investidores terem a possibilidade de procurar reparação em múltiplos foros pela mesma alegada violação. Assinalam também que vários acordos de investimento internacionais seguem esta abordagem (27). De acordo com uma análise apresentada pela CNUCED (28), a cláusula «no U-turn» visa impedir a simultaneidade de uma ação internacional interposta por um investidor que alega violações do AII e de processos nacionais movidos pela filial do investidor alegando violações de um contrato ou do direito interno.

7.7.

O requisito de esgotar primeiro as vias de recurso internas é um princípio fundamental do direito internacional consuetudinário e do direito internacional em matéria de direitos humanos. Existem também vários acordos de investimento celebrados pelos Estados-Membros da UE com países terceiros que exigem expressamente que os demandantes esgotem as vias de recurso nacionais (29). A lógica subjacente a esta regra é a de conceder ao Estado em que a violação ocorreu uma oportunidade de repará-la pelos seus próprios meios, no quadro do seu sistema jurídico interno, e aplica-se sempre que processos internacionais e internos têm por objetivo a obtenção do mesmo resultado (30). O Tribunal Internacional de Justiça considerou que esta regra é tão importante que não pode ser entendida como tendo sido implicitamente derrogada por um acordo internacional (31). Assim, algumas partes interessadas consideram importante que esta regra seja explicitamente integrada no acordo que estabelece o TMI.

7.8.

Tendo em conta a reflexão acima, o CESE incentiva a Comissão Europeia a estudar de forma mais aprofundada a questão do esgotamento das vias de recurso locais e a forma como esta regra poderia funcionar no contexto do TMI.

8.

Independência e legitimidade dos juízes

8.1.

Qualquer que seja a sua estrutura institucional (uma organização internacional autónoma ou vinculada a uma instituição existente), a independência do TMI deve ser salvaguardada. A nomeação de juízes a título permanente é considerada um fator essencial para começar a estabelecer jurisprudência, melhorando, assim, a previsibilidade e abandonando progressivamente a abordagem do sistema de RLIE, frequentemente considerada ad hoc.

8.2.

Se a criação do TMI for por diante, o objetivo final deverá ser dotá-lo de juízes permanentes. Nas fases iniciais da sua criação, o tribunal deverá poder organizar-se de modo autónomo, tendo em conta o número de processos que irá tratar. Tal depende do número de partes originais na convenção que estabelece o tribunal e do número de acordos que colocam sob a sua jurisdição.

8.3.

Embora o método de nomeação dos juízes não esteja previsto nas recomendações da Comissão Europeia para um mandato, o CESE congratula-se com os compromissos assumidos na definição de critérios claros e de alto nível, incluindo critérios relativos às qualificações dos candidatos e ao respeito de um código de conduta, como a Magna Carta dos Juízes (32), que devem assegurar a inexistência de conflitos de interesses e a independência dos juízes. Este aspeto é essencial para assegurar o Estado de direito e a confiança dos cidadãos.

8.4.

No que diz respeito às qualificações dos juízes, devem ser exigidos conhecimentos comprováveis não só no domínio do direito internacional público, mas também em domínios como a legislação e a resolução de litígios em matéria de investimento, consumidores, ambiente, direitos humanos e trabalho. Estas qualificações são fundamentais para assegurar que os juízes possuem a experiência necessária para tratar os diferentes tipos de processos, relativos a diferentes setores e tipos de investimentos, que serão movidos no âmbito da competência do tribunal, sendo capazes de compreender na íntegra e analisar de forma adequada o contexto jurídico.

8.5.

Além disso, o CESE apoia um processo de nomeação dos juízes que seja transparente e cumpra critérios que assegurarão a representação equitativa de todas as partes na convenção que estabelece o tribunal. O processo de seleção deve ser transparente e estar sujeito aos princípios do controlo público.

8.6.

Assegurar a transparência, a acessibilidade da informação ao público em geral, bem como às partes interessadas, por exemplo através da acreditação, constitui outro elemento crucial para aumentar a credibilidade e a legitimidade do sistema. As regras da CNUDCI em matéria de transparência da arbitragem entre os investidores e o Estado e a Convenção das Nações Unidas sobre a transparência da arbitragem entre os investidores e o Estado baseada nos tratados («Convenção da Maurícia sobre Transparência») devem proporcionar um nível de base para as regras de transparência num futuro TMI.

9.   Um sistema eficaz

9.1.

Deve existir um secretariado responsável pela administração eficaz do TMI. Embora ainda não seja claro se o tribunal será uma organização nova ou estará vinculado a uma organização internacional existente, é necessário assegurar a afetação de recursos suficientes para o funcionamento do secretariado.

9.2.

O projeto de mandato propõe que os custos administrativos sejam suportados pelas partes numa base equitativa, tendo em conta diversos critérios, nomeadamente o nível de desenvolvimento económico das partes, o número de acordos abrangido por cada parte e o volume dos fluxos ou existências de investimento internacionais de cada parte.

9.3.

No que diz respeito à repartição dos custos relacionados com a decisão dos processos (excluindo a remuneração dos juízes que se propõe que seja fixa), o projeto de mandato nada refere. O CESE solicita o esclarecimento desta questão.

9.4.

Um montante substancial do investimento direto estrangeiro (IDE) é gerido por pequenas e médias empresas (PME), que necessitam do mesmo nível de proteção e de acesso à resolução de litígios em condições e a custos razoáveis.

9.5.

Deve ser igualmente ponderada a possibilidade de disponibilizar um mecanismo de conciliação destinado a ajudar as partes a resolver um litígio de forma amigável.

9.6.

Todas as decisões do TMI devem ter caráter executório e ser publicamente divulgadas.

10.   Nível elevado de proteção e eventual período de transição

10.1.

Importa observar que, para que um acordo seja submetido à jurisdição do tribunal, é indispensável que ambas as partes no acordo o consintam previamente. Na realidade, isto significa que nenhum dos acordos assinados pela UE ou pelos Estados-Membros da UE será automaticamente submetido à jurisdição do tribunal sem o acordo da terceira parte.

10.2.

A este respeito, durante um eventual período de transição entre o atual sistema de RLIE e o STI, e até ao estabelecimento de um TMI, continuarão a aplicar-se os procedimentos de resolução de litígios acordados a fim de garantir um nível elevado de proteção dos investimentos, dada a sua constitucionalidade e viabilidade ao abrigo do direito da UE, na pendência do caso submetido à apreciação do TJUE pela Bélgica (33).

Bruxelas, 12 de dezembro de 2018.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Luca JAHIER


(1)  http://www.oecd-ilibrary.org/finance-and-investment/societal-benefits-and-costs-of-international-investment-agreements_e5f85c3d-en

(2)  http://trade.ec.europa.eu/consultations/index.cfm?consul_id=179

(3)  http://trade.ec.europa.eu/consultations/index.cfm?consul_id=233.

(4)  https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/?uri=CELEX%3A52015IP0252

(5)  Em 6 de setembro de 2017, a Bélgica solicitou um parecer do Tribunal de Justiça da União Europeia sobre a compatibilidade do STI com i) a competência exclusiva do TJUE na interpretação definitiva do direito da União Europeia; ii) o princípio geral da igualdade e o requisito do «efeito prático» da legislação da União Europeia; iii) o direito de acesso aos tribunais; e iv) o direito a um poder judicial independente e imparcial (https://diplomatie.belgium.be/sites/default/files/downloads/ceta_summary.pdf).

(6)  https://www.eesc.europa.eu/en/agenda/our-events/events/public-hearing-framework-eesc-own-initiative-opinion-position-eescspecific-key-issues-ttip-negotiations

(7)  https://www.eesc.europa.eu/en/agenda/our-events/events/multilateralinvestment-court-hearing

(8)  Ver o Parecer do CESE — Posição do CESE sobre questões-chave específicas das negociações relativas à Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento (PTCI) (JO C 487 de 28.12.2016, p. 30).

(9)  Ver o Parecer de Iniciativa do CESE — Proteção dos investidores e resolução de litígios entre os investidores e o Estado nos acordos comerciais e de investimento da União Europeia com países terceiros (JO C 332 de 8.10.2015, p. 45). O parecer inclui um anexo que faz referência a um possível instrumento multilateral de resolução de litígios entre investidores e Estados.

(10)  Ver nota 9.

(11)  Não sendo um Estado, a UE não é membro da CNUDCI, mas reforçou o estatuto de observador no seu âmbito.

(12)  http://daccess-ods.un.org/access.nsf/Get?OpenAgent&DS=A/CN.9/WG.III/WP.142&Lang=E

(13)  http://unctad.org/en/PublicationsLibrary/diaepcb2017d3_en.pdf

(14)  «IIA Issues Note: Recent Developments in the International Investment Regime» [Nota sobre questões relativas aos AII: Evolução recente do sistema de investimento internacional], CNUCED, maio de 2018, disponível em http://investmentpolicyhub.unctad.org/Publications/Details/1186

(15)  http://www.ohchr.org/EN/HRBodies/HRC/WGTransCorp/Pages/IGWGOnTNC.aspx

(16)  http://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/?uri=COM:2017:493:FIN

(17)  http://data.consilium.europa.eu/doc/document/ST-12981-2017-ADD-1-DCL-1/pt/pdf

(18)  https://www.eesc.europa.eu/en/agenda/our-events/events/multilateral-investment-court-hearing

(19)  No Parecer 2/15 de 16 de maio de 2017, o Tribunal de Justiça da União Europeia esclareceu a natureza do Acordo de Comércio Livre entre a UE e Singapura, declarando quais as partes do acordo são de exclusiva competência da UE e quais as que são da denominada «competência partilhada», que requerem ratificação pelos parlamentos nacionais (https://curia.europa.eu/jcms/upload/docs/application/pdf/2017-05/cp170052pt.pdf).

(20)  Por exemplo, o Acordo de Comércio Livre entre a UE e o Chile (atualmente em processo de atualização), o Acordo de Parceria Económica UE-Japão (celebrado em 2017, não contém um capítulo sobre proteção do investimento, mas foi acordado pelas partes que a questão será debatida e abordada no futuro), bem como os futuros acordos de comércio livre com a Austrália e a Nova Zelândia.

(21)  Esta regra é igualmente parte integrante dos tratados internacionais em matéria de direitos humanos, incluindo a Convenção Europeia dos Direitos Humanos (CEDH).

(22)  Para uma análise crítica de anteriores processos de RLIE, ver Andreas Kulick, Global Public Interest in International Investment Law [Interesse público global no direito internacional em matéria de investimento] (Cambridge University Press 2012), p. 225-306.

(23)  Ver nota 8.

(24)  http://ccsi.columbia.edu/work/projects/third-party-funding-in-investor-state-dispute-settlement/

(25)  Amicus curiae significa, literalmente, «amigo do tribunal». Uma pessoa que tenha manifesto interesse no objeto de uma ação, ou opinião significativa a respeito, mas que não seja parte no litígio, pode solicitar ao tribunal autorização para apresentar observações, supostamente em nome de uma parte, mas que na realidade sugerem uma fundamentação coerente com o seu próprio ponto de vista. Para mais informações consultar: https://legal-dictionary.thefreedictionary.com/amicus+curiae

(26)  Ver nota 8.

(27)  Muitos acordos celebrados pelos Estados Unidos e pelo Canadá incluem disposições «no U-turn». É o caso, por exemplo, do artigo 26.o do Tratado Bilateral em matéria de Investimentos entre o Canadá e a Jordânia, celebrado em 2009, relativo às condições prévias para a submissão de um pedido de arbitragem.

(28)  UNCTAD Series on Issues in International Investment Agreements II, «Investor-State Dispute Settlement» [Coleção da CNUCED sobre questões relativas aos acordos de investimento internacionais II, Resolução de litígios entre os investidores e o Estado], CNUCED, 2014, disponível em http://unctad.org/en/PublicationsLibrary/diaeia2013d2_en.pdf

(29)  Ver, por exemplo, o artigo 5.o do Tratado Bilateral em matéria de Investimentos entre a Alemanha e Israel de 1976, o artigo 8.o do Tratado Bilateral em matéria de Investimentos entre o Egito e a Suécia de 1978, o artigo 7.o do Tratado Bilateral em matéria de Investimentos entre a Roménia e o Sri Lanca de 1981, o artigo 8.o do Tratado Bilateral em matéria de Investimentos entre a Albânia e a Lituânia de 2007, o artigo XI do Tratado Bilateral em matéria de Investimentos entre o Uruguai e a Espanha de 1992 e o artigo X do Tratado Bilateral em matéria de Investimentos entre o Uruguai e a Polónia de 1991.

(30)  Tribunal Internacional de Justiça, processo Interhandel (Suíça c. Estados Unidos da América), exceções, Acórdão de 21 de março de 1959, Coletânea 1959, p. 6, 27. Disponível em http://www.icj-cij.org/docket/files/34/2299.pdf, 27.

(31)  Tribunal Internacional de Justiça, processo Elettronica Sicula S.p.A. (ELSI) (Estados Unidos da América c. Itália), Acórdão de 20 de julho de 1989, Coletânea 1989, p. 15, 28 ILM 1109 (julho 20), ponto 50.

(32)  https://rm.coe.int/16807482c6

(33)  Ver nota 5.


Top