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Jornal Oficial da União Europeia, C 309, 16 de Dezembro de 2006


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ISSN 1725-2482

Jornal Oficial

da União Europeia

C 309

European flag  

Edição em língua portuguesa

Comunicações e Informações

49.o ano
16 de Dezembro de 2006


Número de informação

Índice

Página

 

II   Actos preparatórios

 

Comité Económico e Social Europeu

 

428.a reunião plenária de 5 e 6 de Julho de 2006

2006/C 309/1

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre A regulação da concorrência e os consumidores

1

2006/C 309/2

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre Implementar o Programa Comunitário de Lisboa: Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Mais Investigação e Inovação — Investir no Crescimento e no Emprego: Uma Abordagem ComumCOM(2005) 488 final

10

2006/C 309/3

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo a medicamentos de terapias avançadas e que altera a Directiva 2001/83/CE e o Regulamento (CE) n.o 726/2004(COM(2005) 567 final — 2005/0227 (COD))

15

2006/C 309/4

Parecer do Comité Económico e Social e Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Aplicar o programa comunitário de Lisboa: Uma estratégia para a simplificação do quadro regulamentarCOM(2005) 535 final

18

2006/C 309/5

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que estabelece o Código Aduaneiro Comunitário (Código Aduaneiro Modernizado)COM(2005) 608 final — 2005/0246 (COD)

22

2006/C 309/6

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o Livro Branco: A política no domínio dos serviços financeiros para o período 2005-2010COM(2005) 629 final

26

2006/C 309/7

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de decisão do Conselho que aprova a adesão da Comunidade Europeia ao Acto de Genebra do Acordo da Haia, relativo ao registo internacional de desenhos ou modelos industriais, adoptado em Genebra a 2 de Julho de 1999COM(2005) 687 final — 2005/0273 (CNS) e a — Proposta de regulamento do Conselho que altera os Regulamentos (CE) n.o 6/2002 e (CE) n.o 40/94 para que a adesão da Comunidade Europeia ao Acto de Genebra do Acordo da Haia, relativo ao registo internacional de desenhos ou modelos industriais, produza efeitosCOM(2005) 689 final — 2005/0274 (CNS)

33

2006/C 309/8

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que estabelece as regras de participação de empresas, centros de investigação e universidades em acções no âmbito do sétimo programa-quadro e as regras de difusão dos resultados da investigação (2007-2013)COM(2005) 705 final — 2005/0277 (COD)

35

2006/C 309/9

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de Regulamento do Conselho (Euratom) que estabelece as regras de participação de empresas, centros de investigação e universidades em acções no âmbito do sétimo programa-quadro da Comunidade Europeia da Energia Atómica e as regras de difusão dos resultados da investigação (2007-2011)COM(2006) 42 final — 2006/0014 (CNS)

41

2006/C 309/0

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de regulamento do Conselho que revoga o Regulamento (CEE) n.o 4056/86, que determina as regras de aplicação aos transportes marítimos dos artigos 85.o e 86.o do Tratado, e que altera o Regulamento (CE) n.o 1/2003 por forma a tornar o seu âmbito de aplicação extensível aos serviços internacionais de cabotagem e de tramp COM(2005) 651 final/2 — 2005/0264 (CNS)

46

2006/C 309/1

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre Segurança aérea

51

2006/C 309/2

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa aos resíduosCOM(2005) 667 final — 2005/0281 (COD)

55

2006/C 309/3

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu — Plano de acção 2006-2008 para a simplificação e a melhoria da Política Comum da PescaCOM(2005) 647 final

60

2006/C 309/4

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Estratégia Temática sobre a Utilização Sustentável dos Recursos NaturaisCOM(2005) 670 final — [SEC(2005) 1683 + SEC(2005) 1684]

67

2006/C 309/5

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de directiva do Conselho que diz respeito à luta contra a cochonilha de São JoséCOM(2006) 123 final — 2006/0040 (CNS)

71

2006/C 309/6

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre Riscos e problemas do aprovisionamento em matérias-primas da indústria europeia

72

2006/C 309/7

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo ao Sistema Europeu de Estatísticas Integradas de Protecção Social (ESSPROS)COM(2006) 11 final — 2006/0004 (COD)

78

2006/C 309/8

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre as Relações entre a União Europeia e a Comunidade Andina de Nações

81

2006/C 309/9

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o Futuro da dimensão setentrional

91

2006/C 309/0

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Política Europeia de Vizinhança.

96

2006/C 309/1

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de decisão do Conselho relativa ao sistema de recursos próprios das Comunidades Europeias (//CE, Euratom)COM(2006) 99 final — 2006/0003 (CNS)

103

2006/C 309/2

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de directiva do Conselho relativa à isenção do imposto sobre o valor acrescentado e dos impostos especiais de consumo cobrados sobre as mercadorias importadas por viajantes provenientes de países terceirosCOM(2006) 76 final — 2006/0021 (CNS)

107

2006/C 309/3

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões Aplicar o programa comunitário de Lisboa: Promover o espírito empreendedor através do ensino e da aprendizagemCOM(2006) 33 final

110

2006/C 309/4

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o Livro Branco sobre a Política de Comunicação EuropeiaCOM(2006) 35 final

115

2006/C 309/5

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre Coesão social: dar conteúdo a um modelo social europeu

119

2006/C 309/6

Parecer do Comité Económico e Social sobre o Papel das organizações da sociedade civil na aplicação da política comunitária de coesão e desenvolvimento regional

126

2006/C 309/7

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de regulamento do Conselho relativo à constituição de uma empresa comum para a realização do sistema europeu de gestão do tráfego aéreo de nova geração (SESAR)COM(2005) 602 final — 2005/0235 (CNS)

133

2006/C 309/8

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre O futuro dos serviços de interesse geral

135

PT

 


II Actos preparatórios

Comité Económico e Social Europeu

428.a reunião plenária de 5 e 6 de Julho de 2006

16.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 309/1


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «A regulação da concorrência e os consumidores»

(2006/C 309/01)

Em 14 de Julho de 2005, o Comité Económico e Social Europeu decidiu, em conformidade com o disposto no n.o 2 do artigo 29.o do Regimento, elaborar um parecer sobre: «A regulação da concorrência e os consumidores».

Incumbida a Secção Especializada de Mercado Único, Produção e Consumo da preparação dos correspondentes trabalhos, emitiu parecer em 31 de Maio de 2006. Relatora: (SÁNCHEZ MIGUEL).

Na 428.a reunião plenária de 5 e 6 de Julho de 2006 (sessão de 5 de Julho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 134 votos a favor, sem votos contra e 2 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Conclusões e recomendações

1.1

A livre concorrência pressupõe um benefício para todos os intervenientes no mercado, especialmente para os consumidores. No entanto, o incumprimento das disposições legais que regem esta matéria tem sido especialmente nocivo para as empresas concorrentes por neutralizar o efeito das regras estabelecidas, que prevêem sanções para atenuar as consequências económicas da falta de concorrência entre elas.

1.2

Os consumidores não dispunham antes de instrumentos jurídicos apropriados derivados das regras da concorrência que lhes permitissem intervir ou reclamar por danos causados no mercado por práticas concorrenciais proibidas. Somente a partir das grandes mudanças verificadas no mercado interno, especialmente a partir da liberalização de sectores económicos de interesse geral, é que se começou a debater a necessidade de instrumentos que permitissem aos consumidores participar na política da concorrência.

1.3

O primeiro passo neste sentido foi a nomeação na DG Concorrência de um funcionário de ligação com os consumidores a quem as organizações de consumidores se podem dirigir para tratar de questões em que a sua opinião tenha pertinência. Hoje, três anos mais tarde, a sua eficácia está limitada, pelo simples facto de não dispor de meios para executar essa sua tarefa.

1.4

Entretanto, nos sectores liberalizados mais importantes, a livre concorrência sofreu nítidas restrições que provocam um efeito de exclusão das empresas concorrentes e de limitação evidente dos direitos económicos dos consumidores. Um dos motivos deste impacto negativo é a dimensão nacional adoptada pela maioria dos Estados-Membros na liberalização, com o regresso ao proteccionismo nacional das empresas. A Comissão terá de dispor dos meios necessários para pôr cobro a esta situação.

1.5

O n.o 2 do artigo 153.o do TCE confere à Comissão a base legislativa para o estabelecimento de uma acção horizontal de defesa dos consumidores nas políticas comunitárias e, em especial, a de concorrência, por forma a garantir que as regras de aplicação dos artigos 81.o e 82.o do TCE salvaguardem os seus interesses, junto das empresas concorrentes, afectados pelo incumprimento das regras da concorrência. Por seu turno, os Estados-Membros deverão dar esta mesma finalidade às suas regras nacionais.

1.6

Nesta ordem de ideias, é preciso definir acções que garantam a indemnização pelos danos e prejuízos causados eventualmente por práticas proibidas, especialmente nos seus direitos económicos.

1.7

Além disso, urge reforçar os sistemas de informação e de consulta dos consumidores. Para manter o funcionário de ligação com os consumidores, a DG Concorrência terá de dotá-lo dos meios necessários para poder realizar o seu trabalho. Por outro lado, a DG SANCO deverá convidar os organismos com quem colabora a melhorar a qualidade da sua intervenção nas questões da concorrência que tocam directamente os interesses dos consumidores. Neste contexto, entendemos que a Rede Europeia da Concorrência pode adaptar a sua actividade para incorporar as informações e observações que as organizações de consumidores nacionais ou comunitárias queiram aduzir para aumentar a eficiência da política de concorrência nos mercados e para verem reconhecidos os seus direitos económicos.

2.   A orientação actual da política de concorrência europeia

2.1

A livre concorrência é um princípio básico da economia de mercado que tem como premissa a liberdade de iniciativa dos agentes económicos e, em geral, de todas as pessoas que lhe têm acesso. A necessidade de definir regras compatíveis com a livre concorrência no mercado e com os direitos de todas os seus intervenientes esteve na origem das disposições do Tratado que serviram de base à sua regulamentação. A Comissão Europeia salientou (1), em plena época de liberalizações, o imperativo de encontrar um equilíbrio entre os interesses das empresas e os dos consumidores, ao contemplar novas situações económicas não previstas nas regras da concorrência. Anunciou, simultaneamente, o seu propósito de tornar eficazes os instrumentos voluntários e de promover o diálogo entre consumidores e empresas, para aumentar a sua confiança no mercado, visto a concorrência não bastar como instrumento para alcançar este objectivo.

2.2

A situação actual apresenta algumas novidades, todas elas referidas no Relatório da Comissão sobre a Política de Concorrência 2004 (2) e na intervenção da comissária Kroes (3). Em ambos os casos sobressai a necessidade de articular a acção dos sectores essenciais para o mercado interno e a competitividade em torno da Agenda de Lisboa, mas muito particularmente dos interesses dos consumidores e, sobretudo, das implicações que têm para os seus direitos os cartéis e os monopólios. Esta posição pode ser encarada como o primeiro passo para a incorporação da defesa dos consumidores nas medidas de regulação do mercado, na óptica da procura e não unicamente da oferta, como antes sucedia.

2.3

Convém assinalar que a definição da política de concorrência deverá caber à UE, mas em colaboração com os Estados-Membros, não só por ser aplicável ao mercado único e, por conseguinte, a operações transfronteiriças, mas também porque visa harmonizar as regras nacionais. Isto para evitar que as políticas nacionais assumam um carácter proteccionista que favoreça os próprios mercados e discrimine os seus concorrentes. As instâncias comunitárias desempenham aqui um papel fundamental, sobretudo a Comissão que é competente não só pela apresentação de propostas legislativas reguladoras da concorrência, como também pelo controlo das concentrações e dos auxílios estatais, em que faz prevalecer sempre o interesse geral sobre o interesse nacional.

2.4

Face à liberalização de sectores de interesse geral e à regulação dos serviços financeiros, procurou-se estabelecer uma relação entre a política de concorrência e outras políticas da Comissão, designadamente a dos consumidores. Assim, o último Relatório da Concorrência de 2004 menciona como um dos objectivos da aplicação rigorosa desta política a defesa mais consequente dos interesses dos consumidores e o reforço da sua confiança no mercado interno.

2.5

Não obstante esta declaração de princípios, depreende-se da análise das várias disposições de aplicação da política europeia que foram poucas as mudanças concretas. Com efeito, a posição agora adoptada é idêntica à defendida em fases anteriores. Em 2003, por ocasião do Dia Europeu da Concorrência (4), anunciou-se a nomeação na DG Concorrência de um «funcionário de ligação com os consumidores», cuja actuação abrange todos os capítulos da concorrência e a quem cabe zelar pelos interesses dos consumidores. Além disso, têm sido publicados folhetos informativos (5) que orientam e informam os consumidores sobre o conteúdo da política de concorrência, principalmente nos pontos em que esta toca de perto os seus interesses.

2.6

Mais especificamente, as funções do Funcionário de Ligação com os Consumidores incluem (6):

servir de contacto para as organizações de consumidores e para os consumidores individuais (7);

estabelecer contactos mais regulares e globais com as organizações de consumidores e em especial com o Grupo Consultivo dos Consumidores Europeus (GCCE);

alertar os grupos de consumidores para os casos de concorrência em que o seu contributo poderá ser útil e aconselhá-los sobre o modo como podem dar o seu contributo e exprimir os seus pontos de vista;

contactar as autoridades nacionais de concorrência (ANC) a respeito de questões relativas à defesa dos consumidores.

2.7

Esta orientação da política de concorrência, que tem igualmente em conta os interesses dos consumidores, deveria ser aplicada horizontalmente para evitar uma compartimentação de competências demasiado estrita entre as DG Concorrência e a DG SANCO. Para esse efeito, seria conveniente uma coordenação permanente entre as várias políticas, não só europeias como também entre estas e as nacionais, para lograr uma livre concorrência de mercado propícia aos agentes económicos e sociais e aos consumidores.

3.   Políticas de concorrência da UE que afectam os consumidores

3.1

Pode-se afirmar que a política de concorrência conheceu recentemente uma evolução fundamental, e não só graças à influência considerável da globalização da economia, mas também à indispensável conciliação entre a liberalização de sectores dos serviços com outros objectivos de interesse público, designadamente, os que consistem em assegurar o pluralismo e a fiabilidade dos prestadores desses serviços. A política de concorrência comprometeu-se a desempenhar um papel importante face aos objectivos de competitividade definidos na Agenda de Lisboa. Estes colocam a tónica no bom funcionamento da economia de mercado e, sobretudo, das concentrações económicas, que são fundamentais para o êxito da economia europeia perante os nossos concorrentes internacionais, mas sem coarctar os direitos dos concorrentes europeus e, especialmente, dos consumidores europeus.

3.2

A necessidade de concretizar a política de concorrência que afecta os consumidores obriga a examinar os capítulos que a regulam, ou seja, os que correspondem aos artigos do Tratado e às suas modalidades de aplicação, que, em alguns casos, foram objecto de modificações recentes e, noutros, estão pendentes de aprovação.

3.3   Acordos e práticas restritivas

3.3.1

Os acordos entre empresas são uma componente das relações de mercado que servem para facilitar o seu bom funcionamento. Mas esta possibilidade nem sempre é utilizada para fins de concorrência, muito antes pelo contrário. No momento da criação do mercado comum, considerou-se necessário proibi-los desde que tivessem por finalidade evitar, restringir ou falsear a livre concorrência. O mesmo se passa com as associações de empresas, cuja forma mais significativa são os cartéis, que funcionam através de uniões de empresas sem coordenação aparente entre elas. Estas são proibidas sempre que a sua actividade limitar ou impedir a livre concorrência.

3.3.2

Tanto para os acordos como para as decisões de associação de empresas, a base jurídica é de carácter contratual, o que cria obrigações entre as partes. Em ambos os casos a sua validade é condicionada pelo respeito das disposições legais aplicáveis. O problema são os efeitos sobre terceiros e, muito especialmente, sobre as regras que regem a concorrência no mercado.

3.3.3

Com efeito, a finalidade da regulamentação é proibir os resultados finais, ou seja, limitar a concorrência, mas vai mais longe por declarar nulos e sem qualquer efeito todos os acordos ou decisões de associação, com as consequências práticas que isso implica para a indemnização, pelos danos causados aos concorrentes, e à economia em geral, pela distorção do funcionamento dos mercados.

3.3.4

Dada a complexidade das situações surgidas com a aplicação das disposições do artigo 81.o do Tratado, tanto no mercados nacionais como no mercado interno europeu, a Comissão elaborou o chamado «pacote de modernização» (8), que permite adequar as disposições do Tratado à doutrina jurisprudencial dos tribunais e ao elevado número de situações surgidas à medida que vão sendo aplicadas.

3.3.5

Também foram modernizadas as disposições sobre isenção por categoria (9). Este regulamento contém novas disposições de isenção em função das necessidades actuais do mercado e, concretamente, quando se trata de acordos de transferência de tecnologia. É essencial elaborar uma regulamentação clara que facilite os acordos entre empresas, mas sem correr o risco de proibição. Para tal, convém fixar os limites destes acordos e, sobretudo, garantir que os consumidores não sejam em caso algum prejudicados por tais isenções.

3.4   Abuso da posição dominante

3.4.1

O artigo 82.o do Tratado proíbe que uma ou mais empresas explorem de forma abusiva uma posição dominante no mercado comum ou numa parte substancial deste. Estamos perante uma disposição que não impede a posição dominante em si (a tendência tem sido até encorajar as concentrações económicas que permitem às empresas europeias concorrer com as demais à escala mundial), mas pretende antes impedir que a preponderância assim adquirida seja usada para impor condições aos concorrentes, eliminando a concorrência. Neste caso, a disposição contida no artigo 82.o não se preocupa com a origem da situação de domínio, contrariamente ao que acontece com o artigo 81.o que se interessa pela origem do acordo ou das decisões de associação para declará-los nulos.

3.4.2

A posição dominante não produz os mesmos efeitos das práticas concertadas, já que parece não influir na concorrência, a qual pode já estar limitada pela inexistência de concorrentes ou pela sua fraca posição no mercado. No entanto, é necessário intervir em defesa do consumidor que ficará à mercê das condições fixadas pela empresa em posição dominante em questão (10).

3.4.3

Neste sentido, a Comissão tem vindo a intervir nos sectores mais importantes que, face à sua liberalização tardia, gozavam de uma posição dominante na maioria dos países da UE, como por exemplo o sector das telecomunicações (11), ou que, pelo seu carácter extremamente inovador no plano tecnológico, não enfrentavam uma concorrência real, como é o caso da Microsoft (12). Ficou decidido que, em ambos os casos, se tratava de abuso da posição dominante. No primeiro caso, por abuso na fixação dos preços da prestações de serviços de telecomunicações (13). Esta decisão foi também significativa por afectar um sector económico sujeito a priori à regulação estatal e a Comissão ter, portanto, entendido que deveria intervir mesmo estando os preços ao abrigo de uma regulação sectorial.

3.4.4

No segundo caso, o da Microsoft, a questão era mais delicada por se tratar de uma empresa norte-americana beneficiando de um quase monopólio na utilização dos seus sistemas informáticos. Não obstante, a Comissão decidiu que a empresa tinha infringido o artigo 82.o por abuso da posição dominante no mercado dos sistemas de exploração de PC ao negar-se a dar informação sobre a interoperabilidade e, sobretudo, pela venda conjunta obrigatória de Windows Media Player e de Windows. A Comissão não só lhe infligiu uma avultada multa por infracção muito grave, mas impôs-lhe também a adopção de uma série de medidas que consistiam na divulgação dos seus sistemas operacionais e na venda em separado das várias componentes do sistema operacional Windows PC.

3.5   Controlo das concentrações

3.5.1

O Tratado CE não contém nenhum artigo concreto com disposições aplicáveis às concentrações de empresas, em primeira instância, por não existir este tipo de operação económica e, mais tarde, porque os poderes públicos dos Estados-Membros apoiaram os processos de concentração de empresas com o fito de tornar as suas empresas nacionais mais competitivas. Contudo, sempre que se verificasse que estas concentrações davam origem a posições dominantes, eram aplicáveis os artigos 81.o e 82.o, mas com uma ressalva, já que estas concentrações não eram controladas a priori, só no caso de abuso da posição dominante.

3.5.2

Para colmatar esta lacuna e tornar possível um controlo efectivo, o Conselho adoptou diversos regulamentos com base nos artigos 83.o e 308.o do TCE que lhe dão poderes adicionais para lograr os objectivos da Comunidade no caso da livre concorrência, até chegar ao actual Regulamento 139/2004 (14) que alterava e melhorava o Regulamento (CE) n.o 1310/97 (15) e, sobretudo, integrava a jurisprudência derivada do Acórdão Gencor/Comissão (16).

3.5.3

O novo regulamento altera, designadamente, aspectos da concorrência, com a remessa para as autoridades nacionais dos processos que se prestam a isso na opinião da Comissão ou de pelo menos três Estados-Membros. Tal permite descongestionar em grande medida o trabalho das autoridades comunitárias da concorrência, embora entendamos que isso não deve ser possível se o processo não afectar uma parte substancial do mercado interno. Se for este o caso, seria mais fácil evitar a limitação da concorrência e defender os interesses das partes envolvidas, sobretudo dos consumidores.

3.5.4

Entre as alterações introduzidas por este novo regulamento convém assinalar a definição mais clara das concentrações, não só através dos limiares quantitativos do artigo 1.o, mas também dos limiares conceptuais do artigo 2.o. Assim, é possível saber exactamente em que situação se pode falar de posição dominante e, sobretudo, de redução substancial da concorrência.

3.5.5

Não convém negligenciar os aspectos relacionados com alterações relevantes dos procedimentos, mais concretamente, o prolongamento dos prazos para a remessa dos processos aos Estados-Membros, permitindo uma intervenção mais eficaz das partes interessadas, sempre na condição de serem respeitadas as disposições nacionais. O mesmo se aplica aos prazos fixados às partes requerentes porventura demasiado rígidos neste caso (15 dias úteis a partir do início do procedimento), o que as impossibilita de conhecer as alegações recebidas eventualmente pela Comissão. Seja como for, importa salientar que em nenhuma fase do procedimento está prevista a intervenção dos consumidores. Além disso, desapareceu do texto legal a consideração dos interesses dos trabalhadores das empresas em causa, bem como a questão do emprego, entre os aspectos que permitem avaliar as concentrações.

3.6   Tipos de limitação da concorrência

3.6.1

Tanto no artigo 81.o como no artigo 82.o, o legislador comunitário enumera de uma forma não exaustiva o que entende por práticas proibidas, tratando o primeiro de práticas concertadas e o segundo do abuso da posição dominante. Convém esclarecer desde já que estas listas não são exaustivas, são apenas uma amostra das práticas correntes que correspondem a estes dois comportamentos das empresas. Isto significa que é possível detectar outras práticas com os mesmos efeitos e sujeitas, por conseguinte, à mesma proibição.

3.6.2

A enumeração dos tipos de práticas abusivas é muito semelhante nos dois artigos:

fixar preços;

limitar ou controlar a produção, a distribuição, o desenvolvimento técnico ou os investimentos;

repartir os mercados ou as fontes de abastecimento;

aplicar, relativamente a parceiros comerciais, condições desiguais no caso de prestações equivalentes;

subordinar a celebração de contratos à aceitação de prestações suplementares.

3.6.3

Pode classificar-se as práticas abusivas em duas categorias que melhor reflectem a situação:

a)

Abuso concorrencial: categoria que reúne um grande número de práticas anti-concorrenciais, tais como a recusa de fornecimento, a fixação de preços baixos inferiores ao preço real, os prémios de fidelidade ou a discriminação nos preços. Este comportamento tem um efeito económico já que restringe ou impede a concorrência no mercado ou numa parte substancial do mesmo;

b)

Abuso ou exploração desleal para com as empresas que dependem da posição dominante de outra ou outras para a aquisição de bens ou serviços, devido a preços desleais, discriminação, ineficácia ou negligência ou mesmo abusos do direito de propriedade industrial;

3.6.4

Um dos critérios mais frequentes é a fixação de preços, devendo este conceito ser interpretado no sentido lato, ou seja, descontos, margens, condições de pagamento ou saldos, mas também a não apresentação de orçamentos prévios, o não respeito dos preços de catálogo e a recusa de venda a preços diversos dos estabelecidos. Em todos estes casos, os prejudicados são os consumidores, não obstante as regras específicas que os protegem, que se vêem numa posição de inferioridade em relação às empresas que detêm uma posição dominante no mercado e são geralmente os seus únicos fornecedores.

3.7   Evolução da concorrência em alguns sectores liberalizados

A política de concorrência definida no TCE adapta-se aos sectores tradicionais da economia europeia. As suas modalidades de aplicação têm, com efeito, evoluído para acompanhar a nova realidade económica que exigia maior competitividade. Os procedimentos que levaram à liberalização de sectores importantes do mercado repercutiram-se negativamente nos consumidores, se tivermos em conta que, na maioria dos casos, um serviço público passou a ser fornecido por empresas com uma posição dominante nos seus respectivos mercados e obrigadas a enfrentar uma concorrência mais acirrada.

3.7.1   Energia

3.7.1.1

Nos últimos anos, assistimos a um enorme avanço na liberalização do sector europeu de energia (electricidade e gás) que, até há pouco tempo, fazia parte do sector público e era, como tal, controlado pelo Estado no atinente às condições e às tarifas de abastecimento. A Comissão previu a abertura do mercado para os clientes não domésticos, a partir de Julho de 2004 e para os clientes domésticos, a partir de Julho de 2007. A primeira previsão não se cumpriu inteiramente e, como está a situação agora, a total liberalização do consumo doméstico será impraticável.

3.7.1.2

A situação é complexa e o desempenho das redes privatizadas, sobretudo no mercado da electricidade, é deficiente, com as empresas a investirem o mínimo possível na manutenção das redes, o que tem consequências evidentes para os utentes e provoca frequentes cortes de abastecimento.

3.7.1.3

No entanto, o actual regulamento da electricidade (17), que fomenta o comércio transfronteiriço de electricidade, poderia servir para aumentar a concorrência no mercado interno através de um mecanismo de compensação favorável aos operadores dos sistemas de transporte e da fixação de tarifas não discriminatórias, transparentes e não relacionadas com a distância.

3.7.1.4

Posteriormente, a Comissão criou na Rede Europeia da Concorrência um subgrupo incumbido das questões energéticas para debater e elaborar um acordo sobre a aplicação das regras de concorrência comunitárias aos mercados da energia.

3.7.2   Telecomunicações

3.7.2.1

O sector das telecomunicações conheceu em 2002 (18) uma renovação legislativa essencialmente devido à modernização do conjunto das normas que regem as comunicações electrónicas para adaptar as redes às novas tecnologias. A transposição foi desigual nos vários Estados-Membros. O nono relatório (19) sobre a aplicação do pacote regulamentar das comunicações electrónicas na UE dedicou, por isso, atenção especial à transposição destas normas para a legislação nacional e às tarefas a cumprir pelas autoridades nacionais de regulação (ARN).

3.7.2.2

Deste relatório se depreende que o número de operadores se manteve mais ou menos estável, tendo muitos deles redireccionado os seus esforços para os mercados internos. Por outro lado, a pressão da concorrência entre os operadores parece ter-se transferido dos mercados internacionais e das chamadas de longa distância para o segmento das chamadas locais, com um recuo gradual dos operadores tradicionais. Este facto beneficiou os consumidores com chamadas mais baratas, mas houve certos abusos da sua posição inicial no momento de assinarem novos contratos.

3.7.2.3

A vigilância dos mercados das telecomunicações para determinar a situação da concorrência permite controlar, em certa medida, os operadores em posição dominante e impor-lhes obrigações específicas, impedindo-os assim de cometer abusos na fixação de condições e de preços aos consumidores. A Comissão fez um bom trabalho ao seguir de perto a aplicação da Directiva 2002/77/CE em cada um dos Estados-Membros (20), no intuito de corrigir as deficiências detectadas que, além de limitarem a concorrência, afectavam os interesses dos consumidores.

3.7.3   Transportes

O sector dos transportes deve ser analisado em função dos vários modos utilizados. Trataremos aqui principalmente dos sectores aéreo, ferroviário e marítimo. Estes sectores têm sofrido profundas alterações, especialmente com a preocupação de proteger os passageiros, no primeiro caso, e a segurança marítima, no terceiro.

3.7.3.1   Transporte aéreo

3.7.3.1.1

Em 2003, a Comissão encetou o diálogo com o sector da aviação civil, com o objectivo de elaborar uma posição comum na aplicação da política de concorrência às alianças e às fusões em curso no sector. Neste mesmo ano, ficou manifesta a necessidade de alterar o Regulamento (CE) 1/2003 para completar as disposições relativas ao tráfego aéreo entre a União e os países terceiros, com o objectivo de criar um «céu aberto» que permitisse intervir nas alianças entre as companhias aéreas europeias e as dos países terceiros, designadamente dos EUA. Durante este período, a Comissão examinou vários acordos entre empresas alguns dos quais se revelaram incompatíveis com as regras de concorrência (21), enquanto outros tiveram de ser modificados no seu âmbito e vigência.

3.7.3.1.2

Neste mesmo período foi aprovado o Regulamento que consagra os direitos dos passageiros (22).

3.7.3.2   Transporte ferroviário

3.7.3.2.1

O Regulamento 1/2003 autorizava as autoridades nacionais da concorrência a aplicar as regras destinadas a salvaguardar a concorrência no sector ferroviário. A partir desse momento, as autoridades, comunitárias e nacionais, teriam de definir as questões de interesse comum face à liberalização do sector ferroviário, em colaboração com as DG Transporte e Energia.

3.7.3.2.2

O primeiro pacote de directivas para a sua liberalização visava a livre circulação do transporte transfronteiriço de mercadorias por caminho-de-ferro, bem como a criação de um quadro de referência para o acesso tanto aos serviços de carga como de transporte de passageiros, com o estabelecimento de trajectos, tarifas, etc.

3.7.3.2.3

Do segundo pacote fazia parte a liberalização dos mercados nacionais de carga, bem como do mercado nacional e internacional do transporte de passageiros.

3.7.3.2.4

O objectivo global era chegar a um consenso na aplicação da legislação da concorrência ao sector ferroviário, a fim de evitar que as autoridades nacionais e a Comissão adoptem decisões contraditórias.

3.7.3.3   Transporte marítimo

3.7.3.3.1

O sector marítimo é um dos que comporta mais isenções por categorias, especialmente no âmbito das conferências e dos consórcios marítimos, em conformidade com as disposições do Regulamento (CE) 823/2000, actualmente em revisão (23), as quais procuram desenvolver o n.o 3 do artigo 81.o do TCE que permite obter autorização para o procedimento de oposição, na condição de notificar previamente a Comissão.

3.7.3.3.2

Na prática, houve consórcios que utilizaram este instrumento para realizar objectivos não cobertos pela isenção, como a fixação de preços, o que levou a Comissão (24) a intervir para limitar o âmbito dos acordos. O Tribunal de Primeira Instância (TPICE) (25) pronunciou-se em termos semelhantes sobre um acordo entre empresas de transporte marítimo que subentendia a não concessão de descontos aos seus clientes relativamente às tabelas publicadas de taxas e sobretaxas.

3.8   Consequências para os consumidores da liberalização dos sectores analisados

3.8.1

Os procedimentos que levaram à liberalização dos sectores supramencionados à escala nacional tiveram um efeito negativo, na óptica do mercado interno. Redundaram, com efeito, na criação de oligopólios que privaram os consumidores de uma concorrência genuína que contribuísse para a descida dos preços e favorecesse a concorrência entre empresas. Seria, pois, de toda a conveniência que a Comissão examinasse o impacto das concentrações nos sectores liberalizados, sobretudo para os consumidores.

3.8.2

Em termos gerais, a falta de transparência, as tarifas elevadas e injustificadas impostas à indústria e aos consumidores particulares, bem como a integração vertical das empresas não deram lugar a uma concorrência real nos mercados liberalizados. Com efeito, em inúmeros casos, as condições dos contratos dos consumidores não correspondiam às regras estabelecidas para contratos-tipo.

3.8.3

Este problema é perceptível nos instrumentos de que dispõem os consumidores para fazerem valer os seus direitos face a estas empresas, em especial, através de acções jurídicas derivadas das regras da concorrência, em particular os artigos 81.o e 82.o do Tratado. As reclamações dirigidas às autoridades da concorrência, à Comissão e às instâncias nacionais partem preponderantemente de empresas, não havendo qualquer decisão do TJCE em reacção a um recurso interposto por particulares.

3.8.4

O Livro Verde «Acções de indemnização devido à violação das regras comunitárias no domínio antitrust» (26) apresentado pela Comissão fornecerá aos consumidores um instrumento que abordaremos em detalhe no parecer que o CESE tenciona elaborar.

4.   A defesa dos consumidores perante a política de concorrência

4.1

É evidente que os consumidores possuem um estatuto jurídico específico que estipula os seus direitos e as suas obrigações (27). O n.o 2 do artigo 153.o do TCE estabelece que «as exigências em matéria de defesa dos consumidores serão tomadas em conta na definição e execução das demais políticas e acções da Comunidade». Trata-se de uma política horizontal que, por definição, deverá enquadrar-se em todas as políticas que afectam os consumidores. Não há dúvida que, no contexto da política de concorrência, os consumidores são parte integrante do mercado a que se dirige já que representam a procura dentro deste.

4.1.1

Neste capítulo procuraremos determinar que direitos reconhecidos aos consumidores são afectados pela política de concorrência e de que maneira, mais particularmente as consequências do desrespeito destas regras no mercado interno. É essencial considerar os consumidores como parte interessada para salvaguardar os seus interesses, sempre que a Comissão seja chamada a intervir em casos concretos para impor as regras do mercado.

4.2   Direitos económicos

4.2.1

O conceito de direitos económicos dos consumidores remete para a ausência de prejuízo mensurável no plano económico que impeça o consumidor ou o utente de utilizar e desfrutar dos bens e serviços adquiridos nas condições acordadas com a empresa. O princípio fundamental que rege esta matéria é a boa fé e o justo equilíbrio entre as partes, de tal modo que qualquer acto ou cláusula que o contrarie poderá ser considerado abusivo ou lesivo dos interesses do consumidor.

4.2.2

A relação entre a política de protecção da concorrência e a liberdade de escolha do consumidor tem sido uma das principais preocupações da legislação comunitária. Isso fica evidente tanto no n.o 3 do artigo 85.o como no actual artigo 81.o do TCE, segundo o qual apenas são autorizadas práticas concertadas quando, apesar de restringirem a concorrência, representarem uma vantagem para os consumidores. Um dos exemplos mais característicos é a repartição de zonas geográficas entre concorrentes, a fim de cobrir o mercado na sua íntegra, mesmo nos sectores em que não seja rentável.

4.2.3

Para controlar o mercado, na óptica da defesa do consumidor, é necessário verificar a possível existência de acordos horizontais (acordos voluntários, acordos sobre preços, centrais de compras, partilha de mercados, etc.), bem como de acordos verticais ou de contratos que regulam as relações entre produtores, importadores, etc. Também é digno de nota o abuso da posição dominante conseguida graças a práticas que dificultam ou impedem a entrada de concorrentes, bem como à fixação de preços demasiado altos ou demasiado baixos, de preços de expulsão dos concorrentes ou ao favorecimento de uns clientes em relação a outros.

4.2.4

A Comissão apresenta sistematicamente, todos os anos, um relatório anual, numerosas decisões relativas a suspeitas de práticas concertadas e ao abuso da posição dominante, bem como alguns acórdãos do TJCE, que marcam em muitos casos mudanças na interpretação das regras e obrigam até a alterar a legislação.

4.2.5

Nos últimos anos, têm vindo a diminuir os casos tratados pela Comissão, principalmente devido à acção resoluta das autoridades nacionais de concorrência nos seus mercados e, muito especialmente, à supressão definitiva do sistema de notificação. No âmbito da DG Concorrência foram resolvidos 24 casos por decisão formal, um número pouco elevado se comparado com o controlo das concentrações que levou a um grande número de decisões formais (231) (28) consentâneas com o sistema de notificação. Na nova etapa, este número será menor, pelo facto da grande maioria dos casos de concentrações ser da competência das autoridades nacionais.

4.2.6

Entre os processos tratados, vários diziam directamente respeito aos consumidores ou tinham para eles um interesse particular. As decisões individuais tiveram por objecto os sectores da telefonia móvel, da radiodifusão e das linhas aéreas (29), enquanto as iniciativas sectoriais se aplicaram aos sectores dos transportes, às profissões liberais, aos veículos a motor e aos meios de comunicação (30). Tratava-se em ambos os casos de abusos de preços, o que deu lugar à aplicação do artigo 82.o relativo à fixação de preços de expulsão e abusivos para o fornecimento de bens e serviços (31).

4.3   O direito de informação e de participação

4.3.1

Dependendo a eficácia da política dos consumidores da sua participação nas políticas que lhes dizem respeito, é imprescindível implicá-los em todas as políticas de que têm sido até agora excluídos. Na Estratégia da Política dos Consumidores para 2002-2006 (32) já se previa, designadamente, a participação adequada das organizações de consumidores nas políticas da UE. De facto, um ano mais tarde, foi nomeado na DG Concorrência um funcionário de ligação com os consumidores.

4.3.2

As organizações de consumidores passaram a dispor de um fórum: o Comité dos Consumidores que é o mecanismo de intervenção na política específica dos consumidores. Este terá, contudo, de desenvolver-se para participar noutras políticas. O desafio actual é adquirirem a possibilidade e a capacidade de contribuirem para as iniciativas comunitárias em todas as fases do processo de decisão da UE. Será necessário prever requisitos mínimos que lhes permitam participar nos órgãos consultivos, tal como sucede já na agricultura, e sobretudo nos órgãos recentemente criados, como o de transportes, energia, telecomunicações, ou em qualquer outro que se venha a constituir.

4.3.3

No âmbito aqui tratado não existe ainda formalmente qualquer forma de participação. Os consumidores nem sequer são consultados nas questões consideradas de seu interesse pelo Tratado. Referimo-nos às isenções de práticas concertadas (n.o 3 do artigo 81.o) e às práticas abusivas que limitam a produção, a distribuição ou o desenvolvimento técnico em prejuízo dos consumidores (alínea b) do artigo 82.o). Cabe, portanto, tanto à DG Concorrência como às organizações dos consumidores definir os mecanismos de participação e consulta, através de regras acordadas em comum e que terão um impacto no mercado interno, tal como previa o Livro Branco sobre a Governança Europeia (33).

4.3.4

Esta responsabilidade compete igualmente à DG SANCO que poderia intervir, por intermédio de um grupo consultivo permanente, nas questões da concorrência que afectam os direitos dos consumidores.

4.3.5

O direito dos consumidores a informação sobre a concorrência foi reforçado com a nomeação de um funcionário de ligação com os consumidores. As organizações europeias de consumidores são informadas regularmente, dispondo as organizações nacionais e os consumidores particulares de um sítio na Internet que inclui mesmo um modelo de reclamação (34) pelos prejuízos causados eventualmente pelas empresas em virtude de actuações contrárias à concorrência.

5.   Órgãos representativos

O CESE considera que, para concretizar o direito de informação e de participação dos consumidores, é preciso assegurar, por um lado, que estes sejam legitimamente representados pelas suas organizações e, por outro, definir o órgão em que esta participação se realize efectivamente, como se assinala nos pontos seguintes.

5.1   Dos consumidores

5.1.1

As organizações de consumidores estão sujeitas às regras nacionais que exigem o respeito de critérios mínimos para o seu reconhecimento e legitimação. Neste caso, poderão invocar os seus direitos sempre que os consumidores se sentirem prejudicados por qualquer prática proibida.

5.1.2

Ao nível europeu, são reconhecidas para todos os efeitos as organizações que se encontram registadas na DG SANCO, as quais são informadas e consultadas e implicadas em todos os casos considerados da sua competência.

5.1.3

Esta legitimidade, um tanto exclusiva, pode colocar problemas em questões da concorrência, por se tratar normalmente da violação dos direitos tangíveis dos consumidores, incluindo os limitados a certos territórios e a certos temas. Seria conveniente debater amplamente o conceito de legitimidade para poder intervir nesta matéria.

5.2   A Rede Europeia da Concorrência

5.2.1

O Regulamento 1/2003/CE (35), bem como o chamado «pacote de modernização», definiram as possibilidades de cooperação entre a Comissão e as autoridades da concorrência, no âmbito da Rede Europeia da Concorrência (REC) (36). Esta iniciou os seus trabalhos em 2003, com um grupo incumbido de estudar as questões mais gerais, como o funcionamento e o sistema de comunicação dentro da rede. A Rede está neste momento totalmente operacional. É constituída por 14 subgrupos que se ocupam de problemas sectoriais (37).

5.2.2

O Regulamento (CE) n.o 1/2003 confere à REC meios que lhe permitem prestar assistência mútua e agir em conformidade com as instruções da autoridade competente e, mais geralmente, reunir todas as informações necessárias para a resolução dos processos. Além disso, a REC procede às inspecções solicitadas pelas autoridades nacionais, cujos resultados são transmitidos segundo o procedimento estabelecido, para que todas as partes envolvidas lhe possam ter acesso.

5.2.3

É extremamente importante a intervenção da REC no programa de clemência da UE, uma vez que todos os Estados-Membros assinaram uma declaração em que se comprometiam a respeitar o conteúdo das regras estabelecidas na Comunicação acima referida. A REC é, portanto, um instrumento muito útil para os tribunais nacionais competentes em matéria de concorrência, a quem incumbe igualmente manter actualizada a jurisprudência do TJCE (38).

5.2.4

A comunicação indispensável entre a REC, as autoridades da concorrência e os tribunais permite disseminar a informação sobre cartéis e abusos da posição dominante e sobre os trâmites necessários. Deste modo, é possível decidir com mais rapidez quem deve ocupar-se da instrução do processo.

5.2.5

Graças à actuação da REC, é também possível detectar infracções. A sua acção, de certo modo preventiva, reduz os efeitos negativos sobre os concorrentes e os consumidores. Uma das suas funções mais importantes é a intervenção nos procedimentos de isenção, onde é preciso avaliar se o resultado é favorável aos consumidores e se o acordo deve incluir uma referência aos benefícios concretos que estes esperam dele.

Bruxelas, 5 de Julho de 2006.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Plano de acção para a política dos consumidores 1999-2001 (COM(1998) 696 final).

(2)  SEC(2005) 805 final de 17.6.2005. Parecer do CESE — INT/281, relator: MALOSSE.

(3)  Londres, 15 de Setembro de 2005 nas jornadas «European Consumer and Competition Day».

(4)  Em Roma, 6 de Dezembro de 2003, o comissário Monti anunciou a nomeação de Rivière Martí para esta função.

(5)  A política de concorrência da UE e os consumidores. Serviço de Publicações do Luxemburgo.

(6)  Ver «XXXIII Relatório sobre a Política de Concorrência — 2003», p. 6 e seguintes — SEC(2004) 658 final, de 4.6.2004. Parecer do CESE in JO C 268 de 19.9.2000.

(7)  Endereço electrónico: comp-consumer-officer@cec.eu.int.

(8)  Regulamento (CE) n.o 1/2003 do Conselho de 16 de Dezembro de 2002 relativo à execução das regras de concorrência estabelecidas nos artigos 81.o e 82.o do Tratado e, posteriormente, alterado pelo Regulamento (CE) n.o 411/2004 (JO L 68 de 6.3.2004); Regulamento (CE) n.o 773/2004 da Comissão de 7 de Abril de 2004 relativo à instrução de processos pela Comissão para efeitos dos artigos 81.o e 82.o do Tratado CE (JO L 123 de 27.4.2004, p. 18). Além disso, foi publicada uma série de comunicações e de orientações com o objectivo de definir as relações entre as autoridades responsáveis pelas questões da concorrência e a Comissão e entre esta e as autoridades judiciais.

(9)  Regulamento (CE) n.o 772/2004 da Comissão, de 27 de Abril de 2004, relativo à aplicação do n.o 3 do artigo 81.o do Tratado a categorias de acordos de transferência de tecnologia (JO L 123 de 27.4.2004, p.11).

(10)  Na ausência de uma definição no Tratado, a jurisprudência do TJCE teve de definir o conceito de posição dominante. Trata-se, segundo este Tribunal, de uma posição económica ocupada por uma ou mais empresas que lhes permite impedir a verdadeira concorrência no mercado, mediante um comportamento independente dos seus concorrentes, dos seus clientes e dos consumidores.

(11)  Processo Deutsche Telekom AG, COMP/C-1/37.451 in JO L 263 de 14.10.2003, p. 9.

(12)  Processo Microsoft COMP/37/792.

(13)  A Deutsche Telekom reduziu sensivelmente as suas tarifas partilhadas das linhas para os serviços de acesso à Internet de banda larga na sua rede fixa.

(14)  Regulamento (CE) n.o 139/2004 do Conselho de 20 de Janeiro de 2004 relativo ao controlo das concentrações de empresas in JO L 24 de 29.1.2004; Regulamento (CE) n.o 802/2004 da Comissão de 7 de Abril de 2004 relativo à aplicação do Regulamento (CE) n.o 139/2004 (JO L 133 de 30.4.2004, p.1).

(15)  O Regulamento (CE) n.o 4064/89 (JO L 395 de 30.1.1998, p. 1), bem como as alterações nele incluídas pelo Acto de Adesão da Áustria, da Finlândia e da Suécia, foram modificados pelo Regulamento citado. Deste modo, o novo regulamento é uma reformulação de todos os textos legais, bem como da alteração dos artigos que foram objecto de interpretação jurisprudencial.

(16)  Processo T-112/96 em que o TJCE definiu os conceitos de «posição dominante» e de «redução substancial da concorrência» por forma a serem contempladas situações cuja interpretação colocava antes problemas, como por exemplo a dos oligopólios.

(17)  Regulamento (CE) n.o 1228/2003 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de Junho de 2003, relativo às condições de acesso à rede para o comércio transfronteiriço de electricidade (JO L 176 de 15/07/2003).

(18)  Directiva 2002/77/CE (JO L 108 de 24/04/2002).

(19)  COM(2003) 715 final.

(20)  Ver um resumo das acções no XXXIII Relatório da Comissão sobre a política da concorrência 2003, p. 40 e seguintes.

(21)  A Comissão recusou a autorização ao acordo entre a Air France e a Alitalia, na sua primeira versão, tendo solicitado o parecer de outras partes interessadas. No caso da British Airways e da Iberia, a Comissão limitou a seis anos a vigência do acordo.

(22)  Regulamento (CE) n.o261/2004 (JO L 46 de 17.02.2004).

(23)  JO C 233 de 30/09/2003, p. 8.

(24)  Processo Wallenius/Wilhelmsen/Hyundai, 2002.

(25)  Processo IV/34.018 (JO L 268 de 20/10/2000, p. 1).

(26)  COM(2005) 672 final de 19/12/2005.

(27)  Parecer do CESE — INT/263 — AC 594/2006, relator: Pegado Liz.

(28)  Ver Relatório Anual de 2003, p. 191 e seguintes.

(29)  Ver Caixa 3 do Relatório Anual 2003, p. 29, relativa a abusos de preços nas telecomunicações; Caixa 2 do Relatório Anual 2004, p.28; Venda de direitos desportivos com vista à sua utilização nas redes 3G in Relatório Anual 2004, p. 43.

(30)  Ver Relatório Anual 2004 — Transportes, p.52; Profissões liberais in Relatório Anual 2003, p. 60; Distribuição e reparação de veículos automóveis in Relatório Anual, p. 44.

(31)  O processo British Telecomunications in JO L 360 teve especial relevância por ser ainda um monopólio estatal.

(32)  Comunicação da Comissão sobre a «Estratégia da Política dos Consumidores para 2002-2006» COM(2002) 208 final.

(33)  COM(2001) 248 final.

(34)  http://europa.eu.int/comm/consumers/redress/out_of_court/eej_net/index_en.htm

(35)  Regulamento (CE) n.o 16/2002 do Conselho, de 16 de Dezembro de 2002, relativo à execução das regras de concorrência estabelecidas nos artigos 81.o e 82.o do Tratado, posteriormente alterado pelo Regulamento (CE) n.o 411/2004(JO L 68 de 06/03/2004, p. 1).

(36)  Comunicação da Comissão sobre a cooperação no âmbito da rede de autoridades de concorrência (JO C 101 de 27.4.2004).

(37)  Em 2004, os subgrupos trataram 298 processos (99 provenientes da Comissão e 199 das autoridades nacionais da concorrência).

(38)  Comunicação da Comissão sobre a cooperação entre a Comissão e os tribunais dos Estados-Membros da UE na aplicação dos artigos 81.o e 82.o do Tratado CE. JO C 101 de 27/04/2004.


16.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 309/10


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «Implementar o Programa Comunitário de Lisboa: Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Mais Investigação e Inovação — Investir no Crescimento e no Emprego: Uma Abordagem Comum»

COM(2005) 488 final

(2006/C 309/02)

Em 12 de Outubro de 2005, a Comissão Europeia decidiu, nos termos do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Mercado Único, Produção e Consumo, que emitiu parecer em 31 de Maio de 2006, sendo relatora Lucia FUSCO.

Na 428.a reunião plenária de 5 e 6 de Julho de 2006 (sessão de 5 de Julho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 152 votos a favor e 3 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Antecedentes e síntese da Comunicação da Comissão

1.1

A Comunicação da Comissão tem por finalidade apresentar uma abordagem comum  (1) à investigação e à inovação no quadro da implementação do programa de Lisboa, inscrito nas decisões tomadas pelo Conselho Europeu de Lisboa em Março de 2000, que estabelece o objectivo de a UE se tornar, até 2010, a «economia baseada no conhecimento mais dinâmica e competitiva do mundo, capaz de garantir um crescimento económico sustentável, com mais e melhores empregos e com maior coesão social». Este Conselho confirmou o projecto proposto pela Comissão na sua Comunicação «Rumo a um Espaço Europeu da Investigação» (2).

1.2

O Conselho Europeu de Barcelona, na sua resolução de Março de 2002, colocou o objectivo de aumentar o investimento da UE na investigação e desenvolvimento (I&D) até atingir 3 % do PIB em 2010, assim como de aumentar a proporção do financiamento privado até 2/3, e o Conselho Europeu de Bruxelas, em Março de 2003, exigiu acções concretas.

1.3

Na sua Comunicação de 30 de Abril de 2003«Investir na investigação: um plano de acção para a Europa», a Comissão enuncia as acções exigidas aos níveis nacional e europeu. Em conformidade com uma primeira Comunicação, de Setembro de 2002, «Mais investigação na Europa — Objectivo: 3 % do PIB» (3). Os primeiros números oficiais relativos à I&D mostram que, em 2003, «a intensidade I&D estava quase estagnada em 1,93 % do PIB da UE-25». Apenas a Finlândia e a Suécia atingiram o objectivo.

1.4

O Conselho Europeu empenhou-se na Estratégia Relançada de Lisboa (4) em Março de 2005. Esta vontade política comum foi reafirmada em Outubro de 2005, em Hampton Court, na reunião informal dos Chefes de Estado e de Governo europeus, para responder à considerável necessidade de mais competitividade face a uma concorrência globalizada.

1.5

A Comissão toma a sua primeira iniciativa, desde a sua adesão à estratégia relançada de Lisboa, sobre a Sociedade Europeia da Informação 2010 (5), requerendo dos Estados-Membros que definam as prioridades nacionais da Sociedade da Informação nos seus programas nacionais de reforma até meados de Outubro de 2005, a fim de contribuírem para os objectivos enunciados na Comunicação sobre i2010.

1.6

A justificação das opções e acções propostas reside no contraste entre os contextos externo e interno: por um lado, uma concorrência mundial intensa; por outro, rigidez e fragmentação nos mercados nacionais face à necessidade de construção de um espaço único europeu e de mobilidade de trabalhadores altamente qualificados. Reconhecendo as suas limitadas competências na matéria, a Comissão procura ter, sobretudo, um papel de «catalisador».

1.7

A Comunicação pretende reforçar as ligações entre investigação e inovação, através de uma política de investigação orientada para a produção de novos conhecimentos e suas aplicações, assim como para o enquadramento da investigação, e uma política de inovação que se concentre na tradução do conhecimento em valor económico e sucesso comercial. Na abordagem para uma melhor regulação, qualquer medida que tenha impacto potencial sobre a competitividade será objecto de uma avaliação de impacto.

1.8

A avaliação que acompanha a Comunicação considera três opções de política e escolhe a última (6):

nada fazer,

uma política de integração,

uma abordagem comum.

1.9

O plano de acção proposto pela Comissão é composto por quatro partes:

investigação e inovação no centro das políticas da UE,

investigação e inovação no centro do financiamento da UE,

investigação e inovação no centro da empresa,

melhores políticas de investigação e inovação.

1.10

Dezanove acções distribuem-se por 3 áreas principais: política pública e regulação, finanças e fiscalidade (7) e o papel dos operadores privados (8).

1.11

Afigura-se que esta comunicação prossegue na via da comunicação anterior, de 2003, mas a Comissão acrescenta-lhe a necessidade de os programas nacionais de reforma (PNR) adoptarem decididamente a investigação e a inovação como uma prioridade. Estes PNR serão, pois, apoiados por financiamentos comunitários orientados para actividades de interesse europeu, por conselhos para um desenvolvimento coordenado das políticas e por plataformas melhoradas para a aprendizagem mútua, em todas as regiões onde a cooperação transnacional proporcione um elevado valor acrescentado. Os esforços em I&D são reconhecidos no Pacto de Estabilidade, no qual estas despesas são autorizadas para além dos 3 % de défice.

1.12

O CESE tem igualmente em conta o relatório Esko Aho, ainda que este não seja objecto da presente consulta, observando que no ponto 3.1., «Investir mais no conhecimento e na inovação», da Comunicação ao Conselho Europeu da Primavera de 2006, a Comissão não faz referência ao COM(2005) 488 final, mas ao relatório Esko Aho. O CESE lamenta que este último não tenha sido objecto de consulta nem de avaliação prévia, pelo que o inclui no presente debate.

1.13

Em Outubro de 2005, em Hampton Court, foi nomeado um grupo de 4 pessoas, coordenado por Esko AHO. O relatório de Janeiro de 2006, apresentado à Comissão Europeia com vista ao Conselho Europeu da Primavera de 2006, formula recomendações para acelerar a implementação das iniciativas organizadas aos níveis europeu e nacional a favor da investigação e da inovação. Este relatório tem por base a Comunicação aqui apreciada, mas prefere propor a integração (opção 2, SEC(2005) 1289). Em Março de 2006, o relatório foi apresentado ao Conselho Competitividade e ao Conselho Europeu de Bruxelas. Este último reconheceu a importância do relatório Aho e solicitou à Comissão que o avaliasse até Setembro de 2006. (9)

2.   Observações na generalidade

2.1

O CESE recebe com satisfação a presente Comunicação, cujo ponto de partida é a Parceria para o Crescimento e o Emprego, porque procura cobrir todo o domínio da investigação e da inovação, incluindo a inovação não tecnológica. A comunicação indica acções que ultrapassam os 3 % de Barcelona (10) e descreve em termos gerais os compromissos assumidos pela Comunidade, pormenorizando as medidas de apoio à investigação e à inovação que estão em vias de ser tomadas (11).

2.2

Como refere a Comunicação, a concorrência mundial para atrair o investimento na investigação e inovação aumenta constantemente, incluindo nas economias emergentes como a China, a Índia e o Brasil. «A distância entre a Europa e os Estados Unidos em termos de investimento na investigação já excede 120 mil milhões de euros por ano e está a aumentar rapidamente» (12). Para a Europa, a escala da concorrência é tal que nenhum Estado-Membro pode ter sucesso isoladamente. As sinergias transnacionais constituem o único caminho para promover a investigação e a inovação e para transformar estas últimas em crescimento e emprego. Além disso, a investigação e a inovação são necessárias para tornar a economia da UE mais sustentável, encontrando soluções para o crescimento económico, o desenvolvimento social e a protecção ambiental.

2.3

Com o Plano de Acção, a maior parte dos Estados-Membros começaram a introduzir medidas nacionais para estimular a I&D no sector privado e a estabelecer metas que levarão o investimento na investigação aos 2,6 % do PIB em 2010. Os benefícios fiscais adquirem aqui uma importância especial (13). No entanto, a intensidade da investigação na UE estará mais ou menos estagnada, incluindo no sector privado. A situação é preocupante.

2.4

A justificação das acções abre o debate sobre as comparações em termos de produtividade entre os Estados da UE e outros países.

2.4.1

Em primeiro lugar, há várias definições de produtividade (a relação entre a quantidade produzida de um bem ou de um serviço e o número de unidades de um factor de produção utilizado). A medida mais frequentemente utilizada é uni-factorial — o trabalho — tendo como indicador a produção horária por trabalhador no sector industrial, mais fácil de obter, mas parcial, e colocando o capital como factor exógeno ao processo de produção.

2.4.2

Em segundo lugar, importa não generalizar na comparação entre a Europa e os Estados Unidos, mas distinguir as diferenças importantes por sector e por Estado, mesmo no interior de um país como os Estados Unidos. Há sectores e países europeus competitivos, com crescimentos substanciais da sua produtividade. No caso da UE no seu conjunto, segundo O'Mahony e van Ark (2003), os cálculos dos custos por unidade de trabalho no sector transformador sugerem que a UE não é competitiva face aos Estados Unidos nos sectores de alta tecnologia, mas que o é noutros. No entanto, são os baixos salários dos países terceiros, e não os Estados Unidos, a principal fonte de concorrência nas indústrias tradicionais, o que exerce pressões difíceis sobre a UE. A visão de Dosi, Llerena e Labini (2005) é mais crítica e considera a necessidade de uma política industrial europeia como não-tabu.

2.4.3

Em terceiro lugar, a produção multifactorial ou total factor productivity (TFP) seria a melhor medida, «obtida ajustando o PIB pelas diferenças em todos os inputs utilizados» (Calderon, 2001), e permitiria uma melhor comparação entre países. Para explicar as diferenças de produtividade entre países, estudos empíricos classificaram os determinantes de ganhos na produtividade da mão-de-obra e/ou factor total em três grupos. Porém, dada a interdependência entre os países, Calderon afirma que as diferenças no TPF entre países parecem ser devidas à velocidade de difusão tecnológica (pelo comércio, o investimento directo estrangeiro ou a migração) (14).

2.4.4

Se assegurar a rapidez da difusão faz a diferença, as PME inovadoras seriam, então, indispensáveis à difusão, construindo simultaneamente os novos mercados. Pela mesma razão, a escolha das prioridades estratégicas para a investigação e a inovação poderia promover uma difusão mais rápida dos conhecimentos.

2.4.5

Por último, assegurar o pessoal qualificado e a localização dos investimentos das empresas constitui uma preocupação tanto nos Estados Unidos como na Europa, sobretudo face à China, também ela confrontada com a falta de 75 mil trabalhadores muito qualificados para passar a uma economia de serviços.

2.5

Dito isto, haveria duas visões macro, marcando as escolhas políticas. Por um lado, haveria necessidades urgentes de inovação ao nível organizativo, condição necessária da inovação técnica (Lam 2005 e OCDE 2005), igualmente válida para as instituições europeias (Sachwald 2005, Sapir e outros 2003, Esko Aho 2006); por outro lado, a razão pela qual as empresas não investem o suficiente na I&D e na inovação na Europa seria a falta de um mercado «innovation-friendly», ou receptivo à inovação, onde possam ser lançados novos produtos e serviços (Esko Aho 2006). O CESE observa, porém, que o espírito empreendedor e a aceitação de riscos continuam a ser indispensáveis.

2.6

A insuficiência do mercado enquanto gerador de inovação é amplamente reconhecida na literatura desde Arrow (1962) e Dasgupta e Stiglitz (1980). Os programas-quadro da Comissão têm-se baseado, em grande parte, na racionalidade de um apoio activo de nível micro na I&D das empresas, por uma mistura de apoio à I&D e de promoção da cooperação para superar os obstáculos mais desencorajadores (facilitação da busca de parceiros e promoção de dinâmicas conjuntas que produzam, entre outras, vantagens de market entry, de downstreaming e de economias de escala). No entanto, estas iniciativas não têm sido suficientes para fazer arrancar uma dinâmica sustentável de inovação em toda a UE.

2.7

O CESE saúda, portanto, a ênfase da Comissão nos níveis meso, sectorial e transfronteiras. Os instrumentos de parcerias, redes, cachos, aglomerações, fóruns e diálogos aumentam a importância das linkages, efeitos externos e spillovers entre empresas e organizações, assim como em termos geográficos, para facilitar a inovação. Estes espaços de coordenação poderão identificar mais facilmente os factores de impacto no nível de investimentos em inovação, assim como os estrangulamentos.

2.8

No entanto, a abordagem e as acções propostas não são acompanhadas por indicações orçamentais, sabendo-se que, para as pôr em prática, serão necessários recursos e capacidades de coordenação consideráveis. Além disso, na mesma página da sua Comunicação ao Conselho da Primavera de 2006 em que a Comissão faz a única referência à comunicação aqui em apreço, a Comissão recorda que «as propostas legislativas apenas começarão a produzir efeitos práticos após terem sido adoptadas pelo Conselho e pelo Parlamento. Além disso, muitas acções de financiamento estão dependentes da finalização e aplicação das perspectivas financeiras 2007-2013». As próprias acções propostas «são unicamente de natureza indicativa».

2.9

O CESE convida a Comissão a dar, logo que possível, indicações orçamentais, incluindo um sistema claro de acompanhamento e avaliação desta Comunicação com uma data precisa, por exemplo, em 2008. Além disso, o CESE considera necessário um relatório da Comissão que inclua todos os relatórios dos grupos de peritos directamente relacionados com a Comunicação, assim como uma avaliação das recomendações feitas. Estas indicações deverão ser coerentes com a opção e as acções escolhidas. Por último, para o esforço de superação da fragmentação existente, seria desejável haver um mapping de pessoas responsáveis pela coordenação das acções propostas no COM(2005) 488 a todos os níveis, regiões, Estados-Membros e instituições europeias. A Comissão fez esforços consideráveis nas Trendcharts por país, onde são descritas as instituições de investigação e inovação, o que poderá ser utilizado como base para o referido mapping. Seria igualmente interessante reflectir sobre as experiências de «virtual agency» nos Estados Unidos no domínio da investigação e inovação.

2.10

O CESE observa, além disso, que os conceitos principais (investigação, inovação, conhecimento e tecnologia) não são definidos na Comunicação. Ora, a Comunicação socorreu-se da investigação transeuropeia para chegar a estas definições. O Eurostat e a OCDE definiram a inovação. O último «European Innovation Scorebord» sobre o rácio entre inputs e outputs de inovação desenvolve o conceito de «innovation efficiency», considerando a I&D como um input para a inovação. Além disso, seria necessário fazer uma melhor distinção entre as acções destinadas à investigação e à inovação enquanto tais e as políticas de promoção de condições para criar a inovação (por exemplo, formação, recepção e enquadramento dos recursos humanos móveis, apoio às PME e regiões menos desenvolvidas por ocasião de um uptake de TIC, em que os custos são proporcionalmente mais significativos do que para outros actores). Ou seja, trata-se de estabelecer a distinção entre a inovação entendida como novos produtos e serviços no mercado e a inovação como processo. A primeira é uma condição necessária mas não suficiente para um crescimento endógeno dinâmico.

2.11

O acompanhamento que o CESE faz desta matéria é muito activo, com diversos pareceres sobre o vasto campo abordado pelo COM 488. Por falta de espaço, o CESE recorda apenas resumidamente os seus pareceres, especificamente, sobre o espaço europeu da investigação, onde já estavam incluídos todos os temas do COM 488 (CESE 595/2000), em especial nos pontos 7, («Investigação e inovação técnica») e 8 («Intercâmbio de pessoal entre as instituições de investigação e a indústria»).

2.12

O parecer CESE 724/2001 sobre ciência e sociedade salientava o papel da investigação fundamental na maior parte das grandes descobertas. O parecer do CESE sobre a Europa e a investigação fundamental (15) e a sua correlação com a investigação aplicada sublinha a questão das patentes no ponto 2.5 — no qual o CESE chama a atenção para a urgência de criar um sistema de patente «europeia» que, tal como nos Estados Unidos, conceda um período de graça entre a publicação científica de uma descoberta e a patente de utilização da mesma descoberta. Esta patente comunitária deve ser de obtenção rápida e a baixo custo. O CESE lamenta o seu atraso, devido a questões linguísticas.

2.13

O parecer do CESE sobre Investigadores no Espaço Europeu da Investigação (16) apoia a Carta Europeia do Investigador, assim como, no ponto 5.4, o imperativo do intercâmbio entre a academia e a indústria, e recomenda uma melhor valorização dos peritos com anos de experiência, além da compatibilidade e reconhecimento dos diversos elementos da segurança social e da residência, factores que são associados, no ponto 5.5.5, no contexto da manutenção da «coesão familiar». O seu parecer sobre a ciência e tecnologia (17) incide sobre o 7.o programa-quadro de investigação, de que o CESE refere a importância, o financiamento e a organização em sub-programas e 9 temas de investigação sobre os quais o CESE (18) emitiu pareceres específicos (19).

2.14

No seu parecer sobre a competitividade e a inovação 2007-2013 (20), o CESE refere a importância da participação das PME e dos parceiros sociais na inovação (21). Ambos devem estar empenhados para haver uma inovação bem sucedida. O seu parecer em curso sobre o quadro político para reforçar a indústria transformadora da UE saúda a tónica sectorial, mas recorda que a coordenação necessita de recursos e que não há orçamento, e espera que a qualificação dos trabalhadores, que continua a constituir um tema intersectorial, receba a atenção necessária. Esta política industrial mais integrada é muito importante: ela «emprega mais de 34 milhões de pessoas e representa mais de 80 % das despesas de investigação e desenvolvimento do sector privado na União Europeia».

3.   Observações na especialidade

3.1

O CESE aprova, em particular, os esforços da Comissão em prol de um sistema competitivo europeu de propriedade intelectual e no que respeita às regras de difusão dos resultados da investigação (2007-2013), e recomenda que se dê uma atenção especial à gestão das patentes de inovação através dos instrumentos referidos no ponto 2.7.

3.2

Um sistema melhor de difusão de conhecimentos é vital para a competitividade. Importa salientar a iniciativa dos Centros de Ligação para a Inovação e a ideia da Comissão de utilizar vouchers para PME do CIP, para serviços de consultoria sobre as estratégias de inovação das empresas. Os clusters transfronteiriços facilitariam esta difusão e a sua importância será reconhecida numa próxima comunicação sobre os clusters na Europa. Em 2006, começará a ser construída uma base de dados sobre os clusters.

3.3

O CESE insiste na importância da dimensão social da inovação e da valorização do capital humano e social como produtor de investigação e de inovação e espera que a próxima versão do Manual de Oslo (OCDE-Eurostat) inclua estatísticas que tenham estes aspectos em conta, incluindo indicadores sobre o capital humano qualificado e sobre locais — universidades e outros institutos de educação, bem como plataformas mistas indústria/organismos do Estado/universidades — enquanto produtores de inovação.

3.4

No que se refere aos auxílios estatais à inovação, que teriam um considerável efeito de alavanca nas despesas de investigação das empresas, o CESE congratula-se com a atenção dedicada às PME e solicita à Comissão que veja a criação de emprego como investimento na investigação e na inovação, se os postos de trabalho tiverem estas como finalidade precisa. O CESE sublinha igualmente a necessidade de promover a criação de PME («start-ups») inovadoras servindo-se de instrumentos como o capital de risco e garantindo o envolvimento do Fundo Europeu de Investimento.

3.5

Um factor importante na inovação é dispor de recursos humanos adaptados a todos os níveis, tendo em conta a concorrência global referida no ponto 2.4.5. A Comunicação centra-se nos recursos científicos. Ora, importa tratar também o emprego qualificado não científico. Convém igualmente equilibrar a oferta e a procura das características e saberes específicos segundo as necessidades dos sectores. Para chegar a soluções eficazes e rápidas, será útil a participação de todos os parceiros sociais e stakeholders interessados. O CESE solicita à Comissão que abra o debate sobre este tema.

3.6

Do mesmo modo, para obter mobilidade, será necessário recorrer a cartas de competências europeias comuns, necessárias a cada sector ou tema, sem esquecer a dimensão qualitativa da educação (valores, igualdade de oportunidades). Uma vez que as DG Emprego e Educação e Cultura se ocupam igualmente do tema «recursos humanos», será importante integrar as suas iniciativas em matéria de investigação e inovação nesta Comunicação, a fim de cobrir todo o âmbito.

3.7

O CESE exorta a Comissão a promover a investigação e a inovação em todos os sectores possíveis: os problemas de competitividade não existem apenas no sector das altas tecnologias. A gestão estratégica das mudanças que se seguem a um uptake maciço de novas tecnologias nas PME poderá ser integrada nas acções propostas. A participação dos parceiros sociais e de outros stakeholders será para isso essencial.

3.8

O CESE está de acordo com o relatório Esko Aho quanto ao facto de as empresas com mais de 250 trabalhadores não receberem a atenção necessária; uma das razões prováveis é a definição de PME ser excessivamente restritiva em relação às dos Estados Unidos e do Japão. O CESE considera que, para criar uma economia europeia da inovação com coesão social, é necessário dedicar uma atenção especial ao financiamento das PME inovadoras. Não surpreende ver a região Praxis de Emilia Romagna como uma das mais activas, ainda que outros indicadores de inovação em Itália sejam menos favoráveis. Do mesmo modo, os serviços de apoio às empresas devem ser especializados para responderem às características próprias das PME, nas suas diversas formas (cooperativas, outras empresas de economia social, etc.).

3.9

O CESE gostaria que a Comissão mencionasse as acções em matéria de investigação e inovação com outras regiões. A Comissão adopta já uma visão mundial nas TrendCharts e em várias outras iniciativas. Depois da Comunicação 346, de 25 de Junho de 2001, sobre «A dimensão internacional do espaço europeu da investigação», a parte INCO do 6.o PQ favoreceu expressamente a participação de países terceiros, o que teria continuidade no 7.o PQ. Estas acções poderão ser valorizadas numa vertente específica do conjunto proposto. Também o papel dos meios urbanos e das metrópoles na inovação merece mais estudos.

3.10

O CESE recomenda à Comissão que avalie o timing entre investimento tecnológico, liberalização e reestruturação, uma vez que as empresas, e sobretudo as maiores, deverão considerar as alterações de controlo ao mesmo tempo que as necessidades de investimento na investigação e inovação (por exemplo, no tema da energia, transportes e indústrias de redes).

3.11

O CESE adverte de que poderá ser necessário encontrar um justo equilíbrio entre a promoção da inovação no que respeita ao marketing e licensing conjunto de novos produtos e serviços pelas empresas e o direito da concorrência.

3.12

O CESE considera a inovação como um INPUT para uma economia competitiva com coesão social e não como um resultado final em si mesmo. Embora sabendo que se trata de um desafio, o CESE insta a Comissão a criar estatísticas e a promover estudos para melhor quantificar a ligação entre inovação, competitividade e coesão social, a fim de avaliar os resultados de forma clara e eficaz e de os comunicar aos cidadãos europeus de forma convincente. Como já outros disseram: fazer uma construção ambiciosa, missões tecnologicamente audaciosas, justificáveis pelo seu valor intrínseco social e político (Dosi e outros, 2005).

3.13

Além disso, considerando a inovação como um sistema, o CESE solicita à Comissão que se coordene com o Banco Europeu de Investimento (BEI), a fim de assegurar as sinergias entre os programas deste último, o Fundo Europeu de Investimento, o 7.o programa-quadro de investigação e o programa-quadro para a competitividade e a inovação (CIP), para que a inovação seja um sistema dinâmico e bem estruturado.

Bruxelas, 5 de Julho de 2006.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  SEC (2005) 1289, Anexo ao documento COM (2005) 488 final; Avaliação de impacto, em que a Comissão escolhe a 3.a opção da abordagem comum.

(2)  JO C 204 de 18/7/2000.

(3)  COM(2002) 499 final.

(4)  «Trabalhando juntos para o crescimento e o emprego. Um novo começo para a Estratégia de Lisboa» (COM(2005) 24 final) de 2.2.2005 e «Acções Comuns para o Crescimento e o Emprego: o Programa Comunitário de Lisboa» (COM(2005) 330 final) de 20.7.2005.

(5)  COM(2005) 229 final e SEC(2005) 717 de 1 de Junho de 2005«i2010 — Uma sociedade da informação europeia para o crescimento e o emprego», para a promoção do crescimento e do emprego nas indústrias da sociedade da informação e na comunicação social. A Comunicação centra-se no sector da economia da UE que responde por 40 % do aumento da produtividade e 25 % do aumento do PIB na UE.

(6)  SEC (2005) 1289, Avaliação de impacto.

(7)  Mobilização dos recursos públicos e privados; benefícios fiscais, Fundos estruturais europeus, acesso das PME ao financiamento.

(8)  Parcerias universidade-indústria, pólos e «clusters», serviços pró-activos de apoio às empresas e serviços inovadores.

(9)  Conclusões da Presidência do Conselho Europeu de Bruxelas, 23 e 24 de Março de 2006.

(10)  INI/2006/2005: 12/10/2005, segundo a análise do COM(2005) 488 final pelo Parlamento Europeu.

(11)  SEC(2005) 1253 anexo ao COM(2005) 488 final, «Sem implementação».

(12)  COM(2003) 226 final, ponto 2.

(13)  Oito Estados-Membros já os instituíram, representando 13 % do investimento directo na investigação nesses países.

(14)  Ibid, Calderon 2001, p.19.

(15)  JO C 110 de 30/4/2004.

(16)  JO C 110 de 30/4/2004.

(17)  JO C 157 de 26/6/2005.

(18)  JO C 65 de 17/3/2006.

(19)  Nanotecnologias, biotecnologia, investigação sobre saúde, tecnologias da informação, investigação energética (incluindo a investigação sobre fusão nuclear), espaço e investigação sobre segurança.

(20)  JO C 65 de 17/3/2006.

(21)  «98 % das empresas europeias são PME (pequenas e médias empresas) que criam 55 % dos postos de trabalho do sector privado. É enorme o potencial das PME para a inovação nos processos de produção, produtos e serviços».


16.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 309/15


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo a medicamentos de terapias avançadas e que altera a Directiva 2001/83/CE e o Regulamento (CE) n.o 726/2004»

(COM(2005) 567 final — 2005/0227 (COD))

(2006/C 309/03)

Em 10 de Janeiro de 2006, o Conselho da União Europeia decidiu, em conformidade com o artigo 95.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Mercado Único, Produção e Consumo, que emitiu parecer em 31 de Maio de 2006, sendo relator BEDOSSA.

Na 428.a reunião plenária de 5 e 6 de Julho de 2006 (sessão de 5 de Julho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 150 votos a favor e 1 abstenção, o seguinte parecer.

1.   Resumo

1.1

A proposta de Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo a medicamentos de terapias avançadas e que altera a Directiva 2001/83/CE e o Regulamento (CE) n.o 726/2004 é acolhida com agrado.

1.2

Com efeito, num contexto em que os progressos científicos, especialmente nos domínios das biotecnologias, se aceleram, afigura-se importante assegurar clarificação, rigor e competência.

1.3

O objectivo da proposta é, ao mesmo tempo, permitir constituir um conjunto coerente ao nível das terapias avançadas, colmatar o actual vazio regulamentar e reforçar uma avaliação específica da Agência Europeia de Medicamentos nestas novas disciplinas. Assim, poder-se-á:

dar uma resposta adequada aos pedidos dos doentes e às expectativas das empresas interessadas na investigação e desenvolvimento no âmbito da medicina regenerativa;

assegurar um nível elevado de protecção da saúde dos doentes europeus;

garantir segurança jurídica global, sem prejuízo de um bom nível de flexibilidade no plano técnico, que permita a adaptação às realidades da evolução científica e tecnológica.

1.4

Para ter em conta as particularidades dos medicamentos de terapias avançadas, o quadro jurídico aprovado deverá ser exaustivo, sólido e aplicável em todos os Estados-Membros.

1.5

Foi escolhido o regulamento porque este se afigura o instrumento jurídico mais apropriado, tanto mais que, enquanto não for instaurado um regime legislativo específico, não poderão ser resolvidos os problemas de saúde pública que ainda se colocam na União Europeia no que respeita aos medicamentos de terapias avançadas.

1.6

Não obstante, este projecto de regulamento apresenta alguns aspectos que podem gerar dificuldades na aplicação em razão da definição dada no projecto de directiva relativa aos dispositivos médicos; é necessário que o texto definitvo clarifique as várias interrogações e eventuais dúvidas:

qual o interesse desta nova regulamentação, se os medicamentos de terapias avançadas utilizados na terapia génica e na terapia celular estão já abrangidos pelas directivas específicas dos produtos farmacêuticos;

as definições contidas na alínea b) do artigo 2.o, em especial, afiguram-se complicadas e a sua função é principalmente acessória;

é evidente, também, que uma legislação farmacêutica nacional pode impedir a aplicação de uma legislação europeia;

teria sido preferível, neste caso, optar por uma abordagem mais flexível, seguindo o procedimento dos reconhecimentos recíprocos;

a questão dos produtos autólogos no sector hospitalar e de origem não industrial coloca igualmente a questão dos produtos «de fronteira» de outras origens e de aplicação europeia.

2.   Observações na generalidade

2.1

O exame da proposta de regulamento, artigo por artigo, suscita alguns comentários, interrogações ou recomendações. Relativamente ao artigo 2.o, «Definições» (1):

2.2

As definições relativas à terapia genética e à terapia celular somática não colocam geralmente problemas, porque o recuo e a experiência permitiram chegar a consensos; estes produtos são classificados como medicamentos e já estão regulamentados como tal na Comunidade.

2.2.1

A definição de um produto da engenharia de tecidos afigura-se mais complexa. A actual redacção do n.o 1, alínea b) do art. 2.o, ao afirmar que um produto da engenharia de tecidos «contém ou é constituído por tecidos ou células …» sem especificar «como parte integrante», engloba, de facto, nos medicamente de terapia avançada os dispositivos médicos que contêm por «uma acção acessória» produtos de engenharia de tecidos e esvazia do seu significado tudo o que a directiva prevê sobre dispositivos médicos, actualmente em discussão.

2.2.2

Do mesmo modo, a redacção do n.o 1, alínea b), do art. 2.o pode originar problemas de aplicação, em particular de sobreposição com a directiva sobre dispositivos médicos. Dado que os produtos de engenharia de tecido entram no âmbito da legislação sobre fármacos, seria desejável que se fizesse referência à sua acção primária de tratamento ou prevenção das doenças, ou de modificação das funções fisiológicas através de uma acção farmacológica, imunológica ou metabólica, e não se limitasse às propriedades de «regenerar, reconstituir ou substituir um tecido humano», propriedades que são também próprias de alguns tipos de dispositivos médicos

2.3

Há que sublinhar o esforço feito para definir com a maior precisão possível «produto da engenharia celular». No entanto, a diferença em relação à terapia celular (enxertos de medula, enxertos de células estaminais, enxertos de sangue de cordão umbilical, etc.) não é claramente estabelecida.

2.4

Para tentar clarificar esta definição, o Comité propõe como pistas de reflexão exemplos de produtos actualmente considerados provenientes da engenharia de tecidos. Deste modo será possível melhorar a compreensão, tanto mais que ninguém ignora a existência de um debate e de controvérsia, nomeadamente no que se refere às células estaminais embrionárias.

2.5

Para além da questão das células estaminais embrionárias humanas, os aspectos éticos já não colocam qualquer problema.

2.6

O foco principal da controvérsia é o modo de produção das células estaminais. É especialmente a produção destas células por meio de transferência nuclear (dito de outra forma, por clonagem) que levanta questões éticas consideráveis e, até hoje, não foi possível encontrar um consenso na União Europeia. As reticências habitualmente formuladas referem-se aos riscos de clonagem reprodutiva, de tráfico de ovócitos e de comercialização de partes do corpo humano.

2.7

Com efeito, estas práticas são explicitamente condenadas pela Convenção Europeia sobre Bioética (Convenção de Oviedo, 1998) e pelo Comité Internacional de Bioética (UNESCO, 1997).

2.8

Na ausência de um consenso entre os Estados-Membros da União Europeia, a utilização de células estaminais embrionárias humanas é, consequentemente, da responsabilidade de cada Estado-Membro.

2.9

Deste modo, a precisão conferida aos considerandos (2) é essencial, uma vez que tem visivelmente em conta a realidade do debate e recorda que este texto que regulamenta a nível comunitário os medicamentos de terapias avançadas não está vocacionado para «interferir com as decisões tomadas pelos Estados-Membros quanto à possibilidade de se utilizar qualquer tipo de células de origem humana, como as células estaminais embrionárias, ou células de origem animal».

2.10

Do mesmo modo, o texto tão-pouco está vocacionado para «afectar a aplicação de legislação nacional que proíba ou restrinja a venda, o fornecimento ou a utilização de medicamentos que contenham, sejam constituídos ou derivem dessas células».

3.   Observações na especialidade

3.1

A harmonização, no plano dos princípios, em relação a todos os outros medicamentos biotecnológicos modernos actualmente regulamentados a nível comunitário passa por um procedimento centralizado de autorização e, portanto, por uma avaliação científica única da qualidade, da segurança e da eficácia dos medicamentos de terapias avançadas.

3.2

Contudo, pela sua própria natureza, estas terapias avançadas requerem procedimentos pré-clínicos e clínicos em relação aos tratamentos da medicina clássica, nomeadamente em matéria pericial, de plano de gestão de riscos e de farmacovigilância pós-autorização de introdução no mercado.

3.3

O projecto de regulamento que nos é apresentado para parecer sublinha pertinentemente a necessidade de se desenvolverem, no Comité dos Medicamentos para Uso Humano (CMUH (3)), conhecimentos especializados específicos para a avaliação destes produtos, associando aos grupos de avaliação, nomeadamente, as associações de doentes.

3.4

A proposta de criação de um Comité das Terapias Avançadas (CTA (4)) que o Comité dos Medicamentos para Uso Humano da Agência Europeia de Medicamentos deverá consultar sobre tudo o que se relacione com a avaliação dos dados relativos aos medicamentos de terapias avançadas, antes de emitir o seu parecer científico final, é determinante.

3.5

Com efeito, a criação deste Comité das Terapias Avançadas permitirá reunir, no contexto de escassez que se conhece, os melhores peritos actualmente disponíveis a nível comunitário em matéria de medicamentos de terapias avançadas e os representantes seleccionados das partes interessadas..

3.6

A criação do Comité é inteiramente justificada, porque permitirá definir, para além dos procedimentos científicos, as normas de boa prática clínica e de boa prática de fabrico, e acompanhar a sua avaliação até à autorização de introdução no mercado e posteriormente.

3.7

A invocação do princípio segundo o qual «os tecidos ou células de origem humana contidos nos medicamentos de terapias avançadas [devem] ser colhidos de dádivas voluntárias e não remuneradas» é importante; é uma forma de contribuir para dar resposta à permanente preocupação em torno das normas de segurança dos tecidos e células, para evitar riscos de comercialização de partes do corpo humano e, portanto, para a protecção da saúde humana.

3.8

É confirmado o papel de aconselhamento da Agência Europeia de Medicamentos, e este papel será determinante a todos os níveis, seja na produção de medicamentos de terapias inovadoras, nas boas práticas de fabrico ou nas regras relativas ao resumo das características do produto, à rotulagem ou à informação sobre as especificidades técnicas, ou ainda quando haja que delimitar a fronteira com outros domínios (como o dos cosméticos ou de certos dispositivos médicos) susceptíveis de surgir com a evolução da ciência.

3.8.1

Alguns constatam que os procedimentos utilizados podem implicar custos elevados, enquanto que as autorizações nacionais são de natureza mais económica, e levantam o problema dos períodos de transição nacionais mais longos (5 anos), quando o período de transição na União Europeia é de apenas 2 anos. Este risco político de procedimento nacional descentralizado pode dificultar o acesso por falta de disponibilidade, podendo tê-lo uns e outros não.

3.9

Por último, o aspecto económico é oportunamente abordado nesta proposta (5). Na concorrência global no sector das indústrias da saúde, é essencial que a União Europeia ocupe plenamente o seu lugar, tanto ao nível do mercado interno como ao nível extracomunitário.

3.10

A imprevisibilidade económica ligada às incertezas e à evolução rápida em matéria científica, bem como os custos consideráveis dos estudos, provocam grandes atrasos nos investimentos de vulto e duradouros no domínio do medicamento e, especificamente, no dos medicamentos de terapias avançadas.

3.11

Além disso, são frequentemente pequenas e médias empresas que realizam estes estudos, necessários para demonstrar a qualidade e a segurança não clínica dos medicamentos de terapias avançadas, que muitas vezes não são fruto de experiências anteriores no campo farmacêutico (trata-se geralmente de «spin-off» de laboratórios de biotecnologia ou de produtores de dispositivos médicos).

3.12

A proposta de introduzir, para apoiar e incentivar a realização destes estudos, um «sistema de avaliação e de certificação dos dados resultantes, independentemente de qualquer pedido de autorização de introdução no mercado» afigura-se pertinente.

3.12.1

No entanto, a engenharia dos tecidos permite obter produtos elaborados por PME, por empresas nascentes, por «spin-offs», e não pela indústria farmacêutica, o que suscita, desde logo, algumas observações:

O que abrange este regulamento para se tornar operacional? Não irá gerar grandes debates, quando as tecnologias utilizadas são promissoras?

A composição do CTA suscita igualmente o problema da sua dependência do CMUH, uma vez que é constituído por um representante por Estado-Membro.

O quadro legislativo utilizado é pouco adequado, porque se trata de produtos farmacêuticos não convencionais que obrigam a alterações de outros textos.

A precaução relativamente à utilização de células estaminais pode provocar o veto dos países interessados, uma vez que, se a redacção não for a mais adequada, os problemas surgirão nos pormenores.

3.13

É de apoiar, e mesmo de incentivar o objectivo de procurar facilitar a avaliação de qualquer pedido posterior de autorização de introdução no mercado com base nos mesmos dados.

3.14

No entanto, importa estar atento e, se necessário, adaptar essa disposição de forma a ter em conta uma evolução rápida dos dados científicos (duração da validade dos dados e condições da sua manutenção, por exemplo), proteger continuamente a saúde dos doentes e, mais genericamente, manter o respeito das regras éticas.

3.15

O relatório previsto sobre «a execução do presente regulamento após a experiência adquirida» poderá ser a ocasião de um debate no seio das instâncias envolvidas (em especial o Comité das Terapias Avançadas e a comissão de avaliação dos produtos de medicina humana).

3.15.1

No entanto, a subordinação do CTA ao CMUH, um mecanismo original de peritos sob as ordens do CMUH, torna os procedimentos muito mais pesados e pode provocar contradições porventura evitáveis.

3.16

De um modo mais geral, o relatório previsto (Capítulo 8, artigo 25.o) poderá incluir não só «informações exaustivas sobre os diferentes tipos de medicamentos de terapias avançadas autorizados nos termos do presente regulamento» mas também informações e resultados relativos aos incentivos previstos no capítulo 6 (artigos 17.o, 18.o e 19.o): «Pareceres científicos», «Recomendação científica sobre a classificação em terapias avançadas» e «Certificação de dados sobre a qualidade e de dados não clínicos».

4.   Conclusões

4.1

Na sua globalidade, esta proposta de regulamento é pertinente e útil. Em benefício dos doentes, permite acompanhar a evolução científica e estabelecer as definições e as condições de utilização dos medicamentos de terapias avançadas.

4.1.1

Se, do ponto de vista do doente, estas novas tecnologias permitem grandes esperanças na eliminação do sofrimento humano, para dar resposta a uma expectativa legítima, nomeadamente na utilização da medicina regenerativa, a vigilância destas investigações deve ser feita com recurso a testes essenciais, cujos protocolos devem permitir uma garantia de segurança absoluta para os doentes. Dever-se-ia, por conseguinte, ter como objectivo principal não só um nível elevado de protecção da saúde dos doentes europeus (ponto 2.1 da justificação), como também uma garantia de qualidade clínica. Do mesmo modo, não se pode omitir a questão dos resíduos não utilizados, tendo sempre presente o aspecto ambiental.

4.2

Este texto é importante, nomeadamente em matéria de terapia genética e de terapia celular somática. As precauções tomadas, tanto ao nível das definições como da aplicação dos produtos da engenharia de tecidos, acentuam bem o facto de que o regulamento proposto — num contexto em que o debate ético não está encerrado, porque, no fundo, se trata de uma certa leitura do humanismo — não tem por ambição arbitrar esse debate nem para ele contribuir contornando as deliberações próprias de cada Estado-Membro.

4.2.1

O regulamento proposto cria as condições necessárias para evitar a lacuna regulamentar que existe, ao mesmo tempo, no projecto de directiva relativa aos dispositivos médicos e no projecto de regulamento. A avaliação do risco, como princípio geral, cobre o âmbito de aplicação dos medicamentos de terapias avançadas e dos dispositivos médicos. Uma complicação pode surgir dos produtos combinados (isto é dos dispositivos médicos contendo elementos de engenharia de tecidos): neste caso, convém garantir a qualidade e segurança, devendo a avaliação incidir igualmente a eficácia da utilização de um medicamento inovador no dispositivo médico correspondente.

4.3

O Comité emite parecer favorável à Proposta de Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo a medicamentos de terapias avançadas e que altera a Directiva 2001/83/CE e o Regulamento (CE) n.o 726/2004, indicando os pontos críticos para os quais é necessário encontrar soluções claras e que assegurem a correcta aplicação da directiva.

Bruxelas, 5 de Julho de 2006.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  COM(2005) 567 final.

(2)  COM(2005) 567 final, considerando 6.

(3)  CMUH: Comité dos Medicamentos para Uso Humano.

(4)  CAT: Committee for Advanced Therapies.

(5)  Ver COM(2005) 567 final, considerando 23.


16.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 309/18


Parecer do Comité Económico e Social e Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Aplicar o programa comunitário de Lisboa: Uma estratégia para a simplificação do quadro regulamentar»

COM(2005) 535 final

(2006/C 309/04)

Em 9 de Dezembro de 2005, a Comissão Europeia decidiu, nos termos do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos do Comité, a Secção de Mercado Único, Produção e Consumo emitiu parecer em 31 de Maio de 2006. (Relator: B. CASSIDY).

Na 428.a reunião plenária, realizada em 5 e 6 de Julho de 2006 (sessão de 5 de Julho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 146 votos a favor e 6 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Conclusões e recomendações do CESE

1.1

O presente parecer foi elaborado na sequência de uma consulta da Comissão e constitui o seguimento da Comunicação da Comissão Europeia de Março de 2005 sobre A melhoria do quadro regulamentar para o crescimento e o emprego na União Europeia  (1).

1.2

A simplificação deverá resultar num quadro regulamentar de elevada qualidade, mais fácil de compreender e mais convivial.

1.3

Além de aumentar a observância da legislação da UE e de reforçar assim a sua legitimidade.

1.4

O Comité considera que os Estados-Membros têm a grande responsabilidade de garantir que as disposições da UE sejam adequadamente transpostas para as respectivas legislações nacionais e aplicadas. O Comité reconhece que o Acordo Interinstitucional sobre «Legislar Melhor» (2) constitui um «código de conduta» que ajuda os Estados Membros a melhorar a transposição e aplicação das directivas comunitárias. Importa que os quadros regulamentares nacionais daí resultantes para as empresas, os trabalhadores, os consumidores e a sociedade civil em geral, sejam equilibrados a nível dos conteúdos e simultaneamente simplificados ao máximo.

1.5

O Comité pretende que os agentes socioprofissionais sejam associados aos procedimentos de simplificação regulamentar ditos de «comitologia», de acordo com um modelo semelhante ao dos comités SLIM, mas de maneira mais sistemática e a montante desta regulamentação, em vez de a posteriori, tal como se deu com as experiências SLIM.

1.6

O Comité gostaria que houvesse mais consultas entre a Comissão e as partes interessadas, à semelhança do que levou à elaboração da comunicação em apreço. O Comité entende que isto constituiria uma ajuda material para a «co-regulação» (3) que é referida no ponto 3 d) da comunicação, mas lastima, todavia, a falta de referência à «auto-regulação» (4), que é algo que o CESE tem vindo a solicitar há algum tempo (5).

1.6.1

Em relação à «auto-regulação», o Comité não pode deixar de reconhecer o perigo de ela não implicar a adopção de regulamentação coerciva para os intervenientes e de lhes permitir assim firmar acordos voluntários, aos quais se poderão ou não ater.

1.7

O Tribunal de Justiça Europeu está a desempenhar um papel cada vez maior na interpretação das directivas da Comunidade Europeia e tem-se defrontado com a necessidade de interpretar a formulação por vezes ambígua de directivas que brotam do processo de «co-decisão». O TJE também é cada vez mais solicitado a fornecer directrizes aos tribunais nacionais quando as actividades de uns e de outros são complementares. O Comité toma nota dos progressos realizados pelo TJE na redução de 12 % do número de processos pendentes sobre os Estados-Membros que não notificaram, que aplicaram de maneira incorrecta e que não observaram as directivas comunitárias.

1.8

O Comité reconhece a importância desta comunicação da Comissão para a aplicação do programa de Lisboa, no qual os progressos foram lamentavelmente vagarosos devido à relutância dos governos dos Estados-Membros de realizar os compromissos assumidos no quadro de Lisboa.

1.9

O CESE congratula-se em particular com o empenho da Comissão de fazer uma utilização mais ampla das tecnologias da informação, e faz votos por que a Comissão garanta que, quaisquer que sejam as disposições adoptadas para a melhoria das TI, estas serão compatíveis com as disposições nacionais (ou que as disposições nacionais serão compatíveis com as da UE!).

1.10

O CESE sempre apoiou a Declaração das Seis Presidências «Avançar com a reforma regulamentar na Europa», de 7 de Dezembro de 2004 (6), e espera que as presidências seguintes apoiem esta declaração (7).

1.11

O CESE tem conhecimento dos relatórios do Parlamento Europeu sobre a melhoria da regulamentação e do relatório Gargani em particular sobre uma «Estratégia de simplificação do quadro regulamentar» (8).

1.12

O Comité reconhece que a actual Comissão está a envidar esforços decididos para utilizar a experiência adquirida com as iniciativas sectoriais SLIM e BEST. O quadro de acção (Fevereiro 2003-Dezembro 2004) conduziu à avaliação de cerca de 40 sectores políticos e à adopção pela Comissão de cerca de 40 propostas de simplificação. Até hoje, ainda estão pendentes 9 propostas de simplificação relacionadas com este programa.

1.13

O Comité reconhece que o alargamento da União Europeia a 25 Estados-Membros também aumentou o peso legislativo tanto para os serviços da Comissão, como para as burocracias dos novos Estados-Membros.

1.14

A simplificação e a melhoria da legislação são actividades complementares que envolvem o Conselho e o Parlamento, bem como a Comissão, e que contam com os conselhos do CESE e do CR quando necessário.

1.15

O Comité reitera o apoio que foi frequentemente expresso em pareceres anteriores sobre a importância de aliviar os pesos regulamentar e financeiro sobre as empresas, especialmente as PME.

2.   Introdução

2.1

Há vários anos que o Comité tem vindo a emitir pareceres sobre a simplificação, desde um pedido do Conselho Europeu apresentado em 1995, quando foi criado um grupo de trabalho para examinar os meios de que se dispunha para simplificar a regulamentação da UE.

Nesta série de pareceres, o CESE concluiu que:

devia haver diálogo entre o CESE e o Comité das Regiões, bem como com os Conselhos Económicos e Sociais dos Estados-Membros;

o processo de simplificação não precisava de novas ideias; precisava sim de uma aplicação eficaz das ideias que já tinham sido apresentadas pelas instituições europeias e pelo Conselho Europeu de Lisboa;

Cada proposta legislativa devia obedecer aos seguintes critérios:

as disposições são claras e facilmente compreensíveis para os seus destinatários?

os objectivos das disposições são perfeitamente unívocos?

as disposições são compatíveis com a legislação existente?

o âmbito das disposições deve ser tão amplo quanto o previsto?

os prazos de cumprimento são realistas e dão às empresas e às outras partes interessadas tempo suficiente para se adaptarem?

que procedimentos de revisão foram previstos para assegurar uma aplicação equilibrada e para rever a eficácia e os custos?

havia bastante apoio por parte das partes interessadas à ideia de mais auto– e co-regulação;

não tinham sido exploradas de modo adequado as possibilidades de reduzir os desnecessários preciosismos e particularidades da regulamentação, de maneira a abrir possibilidades à co– e à auto-regulação (9).

2.2

Há uma necessária interacção entre simplificação e melhor aplicação e cumprimento. A presente Comunicação da Comissão dá indícios de ter tido em conta algumas das conclusões dos anteriores relatórios do CESE em que se reconhece que «a simplificação não é uma questão nova». A série de Comunicações da Comissão remonta a 1997, i.e., a dois anos depois do primeiro pedido de simplificação que fora apresentado pelo CESE.

3.   Síntese da comunicação da Comissão

3.1

A Comunicação reconhece a necessidade de simplificação, não só ao nível comunitário mas também ao nível nacional, de maneira a facilitar a vida dos cidadãos e dos operadores, bem como por uma questão de vantagens em termos de custos.

3.2

Uma parte importante da nova estratégia de simplificação ao nível da UE é uma revisão do acervo. Esta estratégia estabelece um programa evolutivo ambicioso de 3 anos (2005-2008) baseado na experiência prática das partes interessadas e com uma abordagem baseada numa avaliação sectorial aprofundada e contínua.

3.3

A maneira como a Comissão aborda a simplificação baseia-se em cinco instrumentos (10):

a)

revogação — eliminação da legislação irrelevante ou obsoleta;

b)

codificação — consolidação de um acto e de todas as suas alterações num novo instrumento sem alterar a substância;

c)

reformulação — consolidação como anteriormente, mas com algumas alterações de substância;

d)

modificação da abordagem regulamentar — identificação de uma abordagem mais eficaz do ponto de vista jurídico do que a actual, i.e., substituição de um regulamento por uma directiva;

e)

reforço da utilização das tecnologias da informação  (11) — facilitar a utilização das TI para melhorar a eficácia.

3.4

A Comunicação da Comissão reconhece que o seu êxito depende apenas do apoio que receber das outras instituições da UE e, acima de tudo, dos Estados-Membros. Uma parte importante seria o reconhecimento, por estes últimos, da necessidade de se manterem, tanto quanto possível, fiéis à directivas de origem adoptadas através do processo de co-decisão e de não acrescentarem elementos não previstos («gold plating»).

3.5

A Comunicação tem em conta os resultados do processo de consulta alargado aos Estados-Membros e às partes interessadas. A conclusão do processo é de que as propostas da UE:

Clarifiquem e melhorem a legibilidade da legislação;

Actualizem e modernizem o quadro regulador;

Reduzam os custos administrativos;

Reforcem a coerência do acervo;

Melhorem a proporcionalidade (12) do acervo.

Para as partes interessadas, o último destes elementos é provavelmente uma das principais preocupações.

A Comissão apresenta uma lista de 222 medidas de simplificação no Anexo 2 da sua Comunicação. O seu programa de simplificação abrange o período 2005-2008.

3.6

A primeira directiva sobre o direito das sociedades (68/151/CEE) foi simplificada, actualizada e modernizada em 2003 para maximizar as possibilidades dos instrumentos e tecnologias informáticos modernos e para reforçar a transparência em relação às empresas de responsabilidade pública limitada. Todavia, a directiva alterada pode muito bem ser incluída como um possível exercício de reformulação ou codificação. No final do ano transacto, foi iniciado um processo de consulta pública para recolher as opiniões das partes interessadas sobre estas opções.

4.   Observações na generalidade

4.1

A «simplificação» não pode fundamentalmente ser entendida como meio de obter uma diminuição da regulamentação «pela porta do cavalo». A simplificação administrativa não pode minar ou erodir normas sociais existentes.

4.2

O Comité congratula-se com a Comunicação e apoia a Comissão quando esta salienta que o êxito da simplificação do quadro regulamentar depende tanto dos Estados-Membros e das respectivas entidades reguladoras como das instituições europeias.

4.2.1

Seria útil a elaboração de um Código de Conduta conforme foi proposto em pareceres anteriores do CESE (13) (ver Anexo I).

4.2.2

O CESE recorda o facto de que o êxito do programa de simplificação não dependerá apenas da capacidade da Comissão de apresentar propostas, mas também da capacidade do co-legislador de adoptar, num prazo razoável, as propostas de simplificação apresentadas pela Comissão.

4.2.3

Recorde-se que o Acordo Interinstitucional sobre «Legislar Melhor» estipula no seu ponto 36 que «nos seis meses seguintes à entrada em vigor do presente acordo, o Parlamento Europeu e o Conselho, aos quais competirá adoptar no final as propostas de actos simplificados na sua qualidade de autoridade legislativa, deverão, por seu lado, alterar os seus métodos de trabalho criando, por exemplo, estruturas ad hoc especialmente incumbidas da simplificação legislativa».

4.3

A Comunicação reconhece a importância, para as PME e os consumidores, da iniciativa de simplificação. Uma legislação comunitária ou nacional demasiado complexa impede que os consumidores conheçam bem os seus direitos e as suas possibilidades de defesa.

4.4

O Comité saúda igualmente o empenho da Comissão na melhoria do processo de avaliação de impacto, não só em termos de encargos para as empresas, mas também do impacto nos consumidores, nos grupos desfavorecidos (por exemplo, os deficientes) e no ambiente. No espírito do objectivo expresso no processo de Lisboa, de criar «mais crescimento e mais emprego», outra medida bastante meritória seria proceder à avaliação do impacto destas medidas nos trabalhadores e na taxa de emprego. Especialmente bem-vinda é a sugestão de que devia haver um maior recurso ao sistema do «balcão único», e a referência feita, em certas directivas, aos testes virtuais e de auto-avaliação no contexto dos veículos a motor.

4.5

Seria útil que a Comissão pudesse apresentar uma avaliação de impacto para justificar a sua retirada de propostas, à semelhança do que está a fazer neste momento para as novas propostas.

5.   Observações na especialidade

5.1

A Comunicação implica que o processo de adaptar as directivas aos progressos técnicos («comitologia») precisa de ser mais transparente, o que é frequentemente solicitado pelo Parlamento Europeu. Todavia, os Estados-Membros têm uma responsabilidade neste domínio. O trabalho de comitologia é realizado por «peritos nacionais» e há bastantes indícios que levam a concluir que estes «peritos» não têm em conta os pontos de vista dos seus governos nas suas actividades de comitologia (um exemplo disto é a Directiva «Aves» de 1979, à qual os anexos técnicos foram acrescentados por «peritos» depois dos ministros terem aprovado a directiva no Conselho.

5.2

Deve ser evidenciada a importância da simplificação para os consumidores, os parceiros sociais e as outras partes interessadas. Os conflitos entre a legislação nacional de aplicação e as directivas comunitárias originais nas quais se baseia a primeira aumentam sensivelmente a carga de trabalho do Tribunal de Justiça Europeu, cujo papel é a «interpretação», mas que cada vez mais se vê confrontado com a necessidade de tratar de aspectos particulares que não foram considerados ou em relação aos quais o requisito da unanimidade no Conselho não permitiu um texto satisfatório, por exemplo sobre questões de tributação. É todavia problemático que o Tribunal de Justiça Europeu assuma crescentemente o papel de decisor político. Não só lhe faltam bases políticas claras, como está a exceder os limites do seu mandato. Ao fazê-lo, toma decisões que deviam ser tomadas por instâncias eleitas democraticamente.

5.3

O CESE reconhece que a própria Comissão fez um esforço e houve várias centenas de revogações e de declarações de obsolescência que deveriam ter contribuído de maneira significativa para reduzir o volume do acervo sem reduzir necessariamente os encargos para as empresas, os trabalhadores, os consumidores ou as outras partes interessadas. O Comité reconhece que ainda existem domínios em que é necessária mais legislação ao nível da UE sobre a protecção do ambiente e os direitos dos trabalhadores, dos consumidores e dos grupos desfavorecidos (por exemplo, os deficientes ou outras minorias), e uma garantia de que todos estes grupos tenham acesso aos benefícios do mercado único.

5.3.1

Por outro lado, o sistema mais frequentemente utilizado até hoje é a actualização. Embora isto permita a introdução de certas alterações necessárias para actualizar os regulamentos, o objectivo da simplificação nem sempre é alcançado; na verdade, pelo contrário, as medidas são por vezes sobrepostas, de forma que em alguns Estados-Membros coexistem regulamentos antigos e novos, confundindo as partes interessadas. As entidades responsáveis pela aplicação da lei nos Estados-Membros poderão ficar na dúvida se estão ou não a actuar de concerto com as suas instituições jurídicas.

5.3.2

As medidas de simplificação de cada proposta de simplificação do programa evolutivo deveriam ser claramente formuladas na respectiva exposição de motivos e, se necessário, na avaliação de impacto que a acompanha. Os serviços da Comissão deveriam acompanhar cuidadosamente estas propostas durante o processo interinstitucional de tomada de decisões para garantir que a dimensão de simplificação é preservada, tal como o exigem os acordos interintitucionais (sobre a «técnica de codificação» (14), a «técnica de reformulação» (15) e a «melhoria de legislação» (16)).

5.4

O Comité chama novamente a atenção para a longa série de pareceres sobre a necessidade de melhorar a regulamentação e a simplificação, em particular para o seu parecer mais recente sobre «Legislar Melhor» (17), que foi elaborado em resposta a um pedido de parecer exploratório da Presidência do Reino Unido.

5.5

O Comité reitera a aspiração frequentemente manifestada de que o processo de melhoria regulamentar e de simplificação se mantenha depois da Declaração das Seis Presidências (18).

Bruxelas, 5 de Julho de 2006.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  COM(2005) 97 de 16.03.2005.

(2)  JO C 321 de 31.12.2003.

(3)  JO C 321 de 31.12.2003.

(4)  JO C 321 de 31.12.2003.

(5)  Relatório de informação sobre «A situação actual da co-regulação e da auto-regulação no mercado único», CESE 1182/2004 final de 11.01.2005 — Relator: VEVER.

(6)  Uma declaração conjunta das presidências irlandesa, holandesa, luxemburguesa, britânica, austríaca e finlandesa da UE.

(7)  2007: Alemanha Janeiro a Junho; Portugal Julho a Dezembro; 2008: Eslovénia, Janeiro a Junho; França Julho a Dezembro.

(8)  A6-0080/2006 adoptado em 16/5/2006.

(9)  Relatório de informação sobre «O estado actual da co-regulação e da auto-regulação no mercado único», CESE 1182/2004 final de 11.01.2005 — Relator: VEVER.

(10)  Plano de acção sobre a «Simplificação e melhoria do quadro regulamentar» COM(2002) 278 final e Codificação do Acervo Comunitário, COM(2001) 645 final.

(11)  A Comissão propõe elaborar uma iniciativa no âmbito da administração pública em linha com o lançamento de um Plano de Acção em 2006.

(12)  A regulação deve ser proporcional aos objectivos a atingir.

(13)  (JO C 125 de 27.05.2002)

(JO C 14 de 16.01.2001).

(14)  JO C 102 de 04.04.1996.

(15)  JO C 77 de 28.03.2002.

(16)  JO C 321 de 31.12.2003.

(17)  CESE 1068/2005 — JO n.o C 24 de 31.01.2006 — Relator Retureau.

(18)  Avançar com a reforma regulamentar na Europa — Uma declaração conjunta das presidências irlandesa, holandesa, luxemburguesa, britânica, austríaca e finlandesa da União Europeia, de 07.12.2004.


16.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 309/22


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que estabelece o Código Aduaneiro Comunitário (Código Aduaneiro Modernizado)»

COM(2005) 608 final — 2005/0246 (COD)

(2006/C 309/05)

Em 17 de Janeiro de 2006, o Conselho decidiu, de harmonia com o disposto no artigo 95.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Mercado Único, Produção e Consumo, que emitiu parecer em 31 de Maio de 2006, sendo relator U. BURANI.

Na 428.a reunião plenária de 5 e 6 de Julho de 2006 (sessão de 5 de Julho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 152 votos a favor, 1 voto contra e 3 abstenções, o seguinte parecer.

1.   Introdução: princípios inspiradores do novo Código

1.1

O programa de acção para as alfândegas da Comunidade (Alfândega 2007), que o Conselho adoptou em 2002, incluía entre as principais acções uma revisão radical do Código Aduaneiro Comunitário em vigor (Regulamento do Conselho (CEE) n.o 2913/92), que se tinha tornado obsoleto devido à evolução registada nos mercados e nas tecnologias, à adopção de diversos Tratados e, sobretudo, aos sucessivos alargamentos da União Europeia.

1.2

A ideia de propor um Código totalmente renovado assenta na consideração de que o antigo Código, todavia vigente, «Não acompanhou as alterações radicais ocorridas no contexto do comércio internacional, nem a evolução das atribuições das alfândegas». A proposta em apreço é coerente com as políticas comunitárias — em particular com os princípios do mercado interno e da protecção dos consumidores, bem como com a Estratégia de Lisboa — e constituiu a base para posteriores medidas de racionalização dos regimes e procedimentos aduaneiros, bem como de adequação das disposições em função da criação de normas comuns entre os sistemas informáticos dos Estados-Membros.

1.2.1

Na opinião da Comissão, este conjunto de medidas permitirá aplicar as orientações do Conselho em matéria de e-Government e da iniciativa «Legislar melhor», para além de realizar uma série de objectivos concretos, como aumentar a segurança das fronteiras externas, reduzir o risco de fraude e aumentar a coerência com as demais políticas comunitárias e, em particular, a política fiscal.

1.3

O novo Código foi elaborado no quadro da Estratégia de Lisboa, que tem por objectivo tornar a Europa «um local mais atractivo para investir e trabalhar»; é também coerente com as propostas apresentadas pela Comissão — e aprovadas pelo Conselho, em Dezembro, de 2003 — para a criação de um ambiente simplificado e sem papéis. Para além disso, a orientação do Conselho é também aplicada na proposta paralela de decisão relativa «a um quadro sem papel para as alfândegas e o comércio» (COM(2005) 609, de 30.11.2005), sobre a qual o Comité emitirá outro parecer.

1.4

As inovações do novo Código não são apenas de carácter formal ou de mera actualização; de bem maior importância são na realidade as alterações que se introduzem nas orientações de política aduaneira. Nos últimos vinte anos, as alfândegas registaram uma progressiva diminuição das suas funções em termos de percepção de direitos, com um correspondente e significativo aumento das suas responsabilidades na aplicação de medidas não pautais sobre segurança, controlo da imigração clandestina, combate à contrafacção, lavagem de dinheiro, tráfico de estupefacientes, higiene, saúde, ambiente e protecção dos consumidores, além da cobrança do IVA e dos impostos especiais de consumo. Todavia, o documento da Comissão não menciona de modo explícito, relativamente ao termo «segurança», uma função colateral que seguramente virá a caber às alfândegas, isto é, a de uma valiosa ajuda em matéria de controlo de tráfico de armas e de combate ao terrorismo. Esta omissão transforma-se em verdadeira carência no atinente aos sistemas de informação, questão que o CESE analisa no ponto 3.1.3.1.

1.5

Outra inovação consiste na adopção de procedimentos informatizados. No Código em vigor já estão previstos esses procedimentos — e são largamente adoptados por quase todos os Estados-Membros — mas continuam a ser facultativos tanto para as alfândegas nacionais como para os utilizadores. Em contrapartida, o novo Código não prevê a sua obrigatoriedade, passo indispensável para a supressão do suporte em papel, objectivo da iniciativa paralela referida no ponto 1.3.

1.6

A elaboração de um novo Código está em consonância com as políticas da Comissão e respeita aos procedimentos estabelecidos sobre viabilidade, transparência e avaliação de impacto. O CESE congratula-se por terem sido consultados os sectores da sociedade civil interessados e por os respectivos pareceres terem sido em grande medida favoráveis. Concorda com a Comissão quanto ao cumprimento das bases legais e dos princípios de subsidiariedade e de proporcionalidade, ao passo que se reserva a possibilidade de aduzir ulteriormente algumas observações em matéria de avaliação de impacto.

1.7

A Comissão analisou quatro diversas abordagens na matéria optando, no final, por uma solução que prevê uma colaboração reforçada dos sistemas informáticos aduaneiros nacionais. Esta escolha justifica-se, segundo a Comissão, pela necessidade de respeitar o princípio de subsidiariedade e a constatação da pouca disponibilidade dos Estados-Membros para aceitarem uma solução assente num sistema europeu centralizado. O CESE toma nota desta escolha forçada, embora frisando que esta última opção teria representado uma solução mais fiável, mais simples e menos onerosa para os utilizadores. Quando ao princípio de subsidiariedade, a sua aplicação teria tido tendência para ser mais a nível europeu que nacional.

2.   Observações na generalidade

2.1

Em Fevereiro do ano transacto, o CESE analisou uma «Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que altera o Regulamento (CEE) n.o 2913/92 do Conselho, que estabelece o Código Aduaneiro Comunitário» (1), que já propunha inovações em matéria de eliminação do suporte papel e de gestão integrada das fronteiras externas. O Comité nota com satisfação que os princípios enunciados na referida proposta, e que considerou largamente positivos, foram mantidos na proposta em apreço e concretamente traduzidos em disposições sobre as quais, mais uma vez, se pronuncia favoravelmente.

2.2

O conjunto das novas disposições concede uma maior atenção aos direitos e exigências dos operadores o que se traduz, sobretudo, numa série de disposições que têm em conta, se for o caso, os possíveis danos decorrentes dos procedimentos. Tal sensibilidade é prova, tanto da simplificação da legislação, como da fusão dos regimes aduaneiros, que são reduzidos dos actuais treze para três: importação, exportação e regimes especiais. Assim, graças ao trabalho de redacção, foram alterados, integrados ou transferidos para as disposições de aplicação mais de dois terços dos 258 artigos do Código em vigor, passando de 258 para 200 artigos.

2.2.1

O CESE reconhece que a Comissão efectuou um trabalho delicado e laborioso, respeitando os princípios gerais do mercado único e com nítido respeito pelos direitos e necessidades dos operadores. Todavia, sublinha que a falta de um regulamento de aplicação, cuja redacção é competência da própria Comissão, deixa por agora alguma incerteza sobre diversas normas. Por isso, o Comité deseja que seja elaborado e rapidamente adoptado um novo regulamento de aplicação.

3.   Observações na especialidade

3.1   Título I: disposições gerais

3.1.1

O artigo 3.o enumera os territórios nacionais que compõem o território aduaneiro da Comunidade. O artigo não aduz observações especiais, salvo pela dúvida que surge devido ao n.o 3, onde se afirma que «Determinadas disposições da legislação aduaneira podem ser aplicadas fora do território aduaneiro da Comunidade, quer no âmbito de legislação específica quer no âmbito de convenções internacionais». A segurança jurídica não permite que numa lei se possa falar de «determinadas disposições» sem precisar, no próprio texto ou num anexo, de que disposições se trata. Por razões jurídicas — e também por exigência de transparência — é necessário indicar de forma explícita e pormenorizada a que territórios e a que legislações é feita referência. Demasiadas são as vezes em que escapam ao cidadão — bem como aos peritos — isenções e derrogações concedidas em diversas ocasiões e de diversas formas: frequentemente, tais isenções e tais derrogações constituem uma verdadeira distorção da concorrência, e nem sempre temporal.

3.1.2

Em geral, o intercâmbio e a protecção dos dados e das informações (artigos 5.o, 6.o e 7.o) não suscitam observações particulares, dado que a legislação proposta cabe na protecção normal que as administrações públicas outorgam à vida privada dos cidadãos e à confidencialidade empresarial. O CESE considera muito favoráveis as disposições do artigo 8.o, ao estabelecer que as autoridades aduaneiras devem fornecer informações sobre a aplicação da legislação aduaneira, bem como promover a transparência, colocando gratuitamente à disposição dos operadores — através da Internet — as decisões legislativas e administrativas, além dos formulários de requerimento.

3.1.2.1

No entanto, o n.o 1 do artigo 5.o, que impõe a utilização de meios electrónicos para todos os intercâmbios de dados, documentos, decisões e notificações entre os operadores económicos e as autoridades aduaneiras, requer uma reflexão específica. Esta disposição, inteiramente aceitável quando diz respeito a empresas ou operadores profissionais, pode causar dificuldades se o importador (ou, mais raramente, o exportador) for um privado e não necessariamente um «operador económico». O problema não é de forma alguma secundário, numa fase em que o volume de compras de produtos por Internet ou por correspondência em países terceiros aumenta de forma exponencial. O CESE toma nota do facto de que a matéria está a ser examinada segundo o procedimento da comitologia e sugere que os privados sejam explicitamente incluídos entre os que estão habilitados, em conformidade com o artigo 93.o, a apresentar declarações sumárias. Também haveria que modificar as disposições do artigo 94.o, que atribuem às autoridades aduaneiras a possibilidade de aceitar declarações sumárias de importação em suporte papel, mas só em circunstâncias excepcionais. Como alternativa ou como aditamento, poder-se-ia analisar a possibilidade de alargar aos particulares a declaração simplificada ocasional, em suporte papel que se estabelece no artigo 127.o.

3.1.2.2

Sempre em matéria de meios electrónicos, mas de forma mais geral, o CESE chama a atenção para os elevados custos do novo procedimento informático integrado. Esses custos devem ocorrer no curto prazo, ao passo que uma parte considerável dos benefícios (especialmente os de caracter qualitativo) só serão perceptíveis a médio e longo prazo. Alguns Estados-Membros parecem já preocupados tanto com os encargos que devem assumir, como com a obrigação de respeitarem os prazos de arranque dos novos sistemas. Outros, particularmente os mais avançados em matéria de informatização, consideram dispendioso mudar o seu sistema, acabado de adoptar, para adoptarem o sistema comum. O CESE pretende transmitir essas perplexidades, que a Comissão deverá ter em conta, mas todavia considera que o interesse da Europa em ter um sistema aduaneiro eficiente e moderno merece alguns sacrifícios individuais, com possíveis auxílios quanto a recursos, que se deveriam limitar a casos precisos e devidamente justificados.

3.1.3

O artigo 10.o prevê que os Estados-Membros colaborem com a Comissão tendo em vista «o desenvolvimento, manutenção e utilização de um sistema electrónico comum de registo e de manutenção de dados» relativo a todos os operadores e às autorizações concedidas. As dúvidas sobre a natureza e o funcionamento do sistema esfumam-se com o artigo 194.o: cada Estado-Membro mantém o seu próprio sistema de informação e garante a interoperabilidade com os sistemas dos demais Estados-Membros de acordo com regras e normas estabelecidas pela Comissão, assistida pelo Comité do Código Aduaneiro. A data de entrada em vigor do sistema será 30 de Junho de 2009. O CESE considera que um sistema assente em bases de dados nacionais que se intercambiam reciprocamente — uma vez garantida a interoperabilidade, informação e actualizações — pode vir a revelar-se difícil de gerir e, além disso, caro. Sobretudo, é muito improvável que tal sistema possa estar em funcionamento na data prevista. Na avaliação do impacto, a Comissão considera que o custo adicional da aplicação do sistema será de 40 a 50 milhões de euros anuais, um número optimista segundo diversos peritos.

3.1.3.1

Há, além disso, uma lacuna evidente e de importância vital no projecto deste sistema ou, pelo menos, na sua formulação. Com efeito, não se faz qualquer referência a uma possibilidade estruturada de acesso aos sistemas informáticos das autoridades incumbidas de lutar contra o terrorismo e a criminalidade organizada, obviamente no pleno respeito das normas sobre protecção da vida privada e das actividades produtivas. Por diversas ocasiões, e por diversas vezes, o CESE sublinhou este aspecto. Desde há muitos anos que o Conselho evoca a necessidade de colaboração entre as diversas autoridades,isto é, polícia criminal e financeira, alfândegas, serviços secretos, OLAF e Europol mas, lamentavelmente, até agora sem grandes resultados.

3.1.4

O artigo 11.o, referente ao representante aduaneiro, suscita particular interesse. O artigo dispõe que este representante pode incumbir-se do «cumprimento dos actos e formalidades previstos na legislação aduaneira» agindo em nome e por conta de outrem (representação directa) ou em nome próprio (representação indirecta). O n.o 2 impõe que o representante aduaneiro esteja estabelecido no território aduaneiro da Comunidade. No entanto, o CESE frisa que a Comissão, na exposição de motivos, afirma que «Foram alteradas as regras sobre os representantes, sendo suprimidas as restrições anteriormente em vigor, dado serem incompatíveis com um ambiente informatizado e com os princípios do mercado único.» Dever-se-ia deduzir que o representante aduaneiro dispõe de uma autorização única (passaporte comunitário) que o habilita a actuar em todo o território da Comunidade e em nome de qualquer operador, onde quer que esteja estabelecido. Seria útil redigir este artigo, de forma mais explicita, fazendo eventualmente menção a uma regulamentação diferente, que trate das modalidades de criação de um registo, lista ou outro meio, à imagem do disposto pelo operador económico autorizado, a que o ponto seguinte se refere.

3.1.5

Outra figura interessante é a de operador económico autorizado (artigos 4.o e 13.o a 16.o) que, na prática, é uma empresa (raramente uma única pessoa) que apresenta especiais garantias de seriedade, solvabilidade e competências profissionais tais que as autoridades aduaneiras dos Estados-Membros lhe concedem o direito a um certo número de facilitações no que respeita aos controlos e procedimentos aduaneiros. A Comissão reserva-se o direito de precisar, com base no disposto no citado artigo 196.o, as modalidades de concessão do estatuto de operador económico autorizado. O CESE toma nota destas disposições, destinadas a agilizar o comércio internacional e a criação de um ambiente favorável aos intercâmbios; todavia, observa que muito dependerá das condições para a concessão do estatuto e das normas para evitar eventuais abusos. Além disso, também não está claro se à figura do operador económico autorizado será concedido ou não o «passaporte europeu».

3.1.6

As disposições do artigo 22.o constituem um passo decisivo para a harmonização dos regimes aduaneiros, ao obrigar os Estados-Membros — embora em termos bastante «flexíveis» — a determinarem sanções administrativas ou penais em caso de incumprimento da legislação aduaneira comunitária. O CESE reconhece a necessidade de conseguir ter uma regulamentação harmonizada neste matéria delicada. Todavia, tem dúvidas sobre qual será o acolhimento que os Estados-Membros darão às tentativas de impor regras ou directrizes em matéria penal, um domínio no qual são de esperar resistências ou, pelo menos, reservas.

3.1.7

Os artigos 24.o, 25.o e 26.o tratam dos recursos por via administrativa (o artigo 23.o exclui a legislação penal), para os quais se estabelece um procedimento em duas fases: a primeira perante as autoridades aduaneiras e a segunda perante uma instância superior, judicial ou outra. Em caso de sanções, é aplicado o princípio geral «solve et repete», salvo quando as autoridades aduaneiras considerarem que a medida imposta poderia causar «prejuízo irreparável» para o recorrente: sinal de atenção às necessidades do cidadão, que o CESE regista com satisfação.

3.1.8

O artigo 27.o estabelece o óbvio princípio de dar às autoridades aduaneiras a possibilidade de efectuar todo o tipo de controlos: físico, administrativo, contabilístico ou estatístico. Estabelece ainda a instauração de um sistema electrónico para a gestão do risco, com o objectivo de «identificar e avaliar os riscos e criar as medidas necessárias para a sua prevenção». Este sistema, que os Estados-Membros, em colaboração com a Comissão, deverão aplicar o mais tardar até 30 de Junho de 2009, será também regulado pelas normas que a Comissão adoptar com base no artigo 196.o. O CESE congratula-se com esta iniciativa e espera que a Comissão tenha sondado devidamente a disponibilidade de todos os Estados-Membros para aplicar um sistema que será presumivelmente dispendioso e difícil de gerir.

3.1.9

O artigo 30.o isenta de controlos e de formalidades aduaneiras as bagagens de mão e as bagagens de porão das pessoas que efectuem um voo intracomunitário sem prejuízo, no entanto, dos controlos de segurança e dos controlos decorrentes das proibições ou restrições prescritas pelos Estados-Membros. Tal é o mesmo que dizer que a isenção só se aplica em países que não tenham estabelecido proibições ou restrições. Visto que limitações existem sempre e em todo o lado, nem que fosse apenas para as mercadorias sujeitas a impostos especiais, na prática a norma geral carece de sentido e as alfândegas continuarão a poder controlar sempre as bagagens, quer sejam de mão, quer de porão.

4.   Título seguintes, de II a VIII: formalidades e procedimentos aduaneiros

4.1

Os Títulos de II a VIII tratam de formalidades e procedimentos aduaneiros, retomando em larga medida o conteúdo do Código em vigor. O CESE não pretende efectuar um exame pormenorizado desta matéria, já amplamente debatida no decurso das consultas das partes interessadas efectuadas antes da redacção do texto. Assim, limita-se a comentar alguns artigos de interesse especial.

4.2

O artigo 55.o estabelece que a dívida aduaneira é constituída mesmo nos casos de contrabando ou tráfico ilegal (definidos como «importação ou exportação mesmo quando for relativa a mercadorias que estão sujeitas a uma medida de proibição ou de restrição aplicáveis à importação ou à exportação»): os direitos aduaneiros são todavia devidos, sem prejuízo de outras medidas penais ou administrativas. Em contrapartida, são isentos de dívida aduaneira a moeda falsa e os estupefacientes que não façam parte dos circuitos autorizados. Evidentemente, esse tráfico só é considerado sob o ponto de vista penal, excepto quando a legislação de um Estado-Membro preveja que os direitos aduaneiros devam servir de base à determinação de sanções pecuniárias. Apesar de um parecer contrário do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias, o CESE não considera que as administrações aduaneiras devam perder uma receita legítima, renunciando a constituir uma dívida aduaneira — sanções administrativas e penais aparte — pelo menos no atinente aos estupefacientes, determinando o seu valor a preços de mercado. O facto de uma importação de droga ser um acto criminoso não deixa de ser sempre uma importação (ilegal). Em suma, compreende-se a isenção relativa a moeda falsa, mas não a relativa a estupefacientes.

4.3

De acordo com o artigo 61.o, as autoridades aduaneiras podem exigir do devedor a prestação de uma garantia, a fim de assegurar o pagamento de uma dívida aduaneira. O artigo 64.o estabelece que uma das formas autorizadas para a prestação de garantia é a fiança e o artigo 66.o precisa que o fiador pode ser «um banco ou outra instituição financeira oficialmente acreditados na Comunidade». Esta disposição é importante, visto que reconhece que qualquer banco ou instituição financeira de qualquer Estado-Membro pode prestar uma fiança válida para as autoridades aduaneiras de outro Estado-Membro. Trata-se de um princípio importante e já em vigor, mas que muitas vezes as alfândegas de diversos Estados-Membros entravam. Todavia, falta compreender o significado da expressão «oficialmente acreditados na Comunidade» que, na opinião do CESE, é um pleonasmo e é confusa: os bancos e as instituições financeiras estabelecidos na Comunidade já dispõem de «passaporte europeu», sem necessidade de mais precisões.

4.4

Sempre em matéria de fiança, o artigo 83.o estabelece que, em conformidade com o procedimento previsto no artigo 196.o, a Comissão pode adoptar medidas com vista a assegurar o pagamento junto dos fiadores no âmbito de um «regime especial». No entanto, não há indicações sobre o conteúdo e o alcance desse regime especial. Se é uma referência ao pedido de execução do fiador «ao primeiro pedido»,não se está certamente perante algo de novo, dado que tal tipo de garantia já existe e está previsto mesmo em outras regulamentações (por exemplo, o regulamento financeiro da UE); Se, pelo contrário, se pensa em outras fórmulas, seria bom precisá-las, dado que o custo de uma fiança varia conforme o risco e as modalidades de execução por parte do fiador.

4.5

O artigo 83.o também estabelece que serão cobrados juros de mora sobre o montante dos direitos, correspondentes ao período compreendido entre o termo do prazo fixado e a data do pagamento. O artigo 84.o contempla o caso contrário, quando são as autoridades aduaneiras que têm que reembolsar o importador ou o exportador. Nesse caso, é afirmado expressamente que nenhum juro será devido nos primeiros três meses. O CESE sublinha a manifesta e inadmissível disparidade de tratamento entre a autoridade pública e o cidadão.

5.   Título IX: Comité do Código Aduaneiro e disposições finais

5.1

As disposições deste Título são fundamentais para compreender a estrutura do Código e o seu alcance. A chave é o artigo 196.o, que estabelece que para a aplicação do regulamento, «a Comissão é assistida pelo Comité do Código Aduaneiro», adiante designado por «Comité,» que actua com referência «aos artigos 4.o e 7.o da Decisão 1999/468/CE, tendo em conta o disposto no seu artigo 8.o». Na prática, isto significa que a Comissão tem o poder de regulamentar, embora com a assistência do Comité, todas as matérias do Código Aduaneiro, o que cabe no procedimento comunitário normal. Nesta matéria, o CESE nada tem a objectar. Deseja, no entanto, que as regras que venham a ser adoptadas respeitem as necessidades dos utilizadores e sejam suficientemente flexíveis para se poderem adequar rapidamente à evolução da técnica, da tecnologia e das práticas comerciais.

5.2

Em conformidade com o procedimento previsto no artigo 196.o, a Comissão (artigo 194.o) pode adoptar medidas que prevejam:

regras e normas para a interoperabilidade dos sistemas aduaneiros;

casos e condições em que a Comissão pode adoptar decisões para solicitar aos Estados-Membros que revoguem ou alterem uma decisão;

medidas de aplicação complementares, sempre que tal se afigure necessário, nomeadamente nos casos em que a Comunidade aceite compromissos ou assuma obrigações decorrentes de acordos internacionais que impliquem a adaptação das disposições do Código.

5.2.1

Assim, os poderes da Comissão são bastante vastos e incluem a faculdade de determinar por si própria (segundo travessão) os casos e as condições em que pode solicitar aos Estados-Membros que revoguem ou alterem uma decisão. O CESE observa que, em relação aos aspectos previstos no primeiro e terceiro travessões, a Comissão exerce a sua função institucional de coordenação e de execução das decisões adoptadas ou apoiadas pelo Conselho; no caso do segundo travessão, está-se perante o exercício do poder de tipo inabitual — ainda que, tudo somado, esteja justificado pelas circunstâncias e, certamente, não suscite críticas por parte do CESE.

5.2.2

De maneira geral, o CESE frisa que a decisão de controlar todos os tipos de operações realizadas pelos cidadãos, incluindo as operações comerciais e aduaneiras, tem influência no livre trânsito e decorre de opções políticas, repartidas em função dos domínios de competência entre a UE e os Estados-Membros. Evidentemente, é à Comissão que cabe executar estas opções.

5.2.3

O CESE espera que a reforma iniciada no domínio aduaneiro não ponha em questão o equilíbrio necessário entre a liberdade de comércio e a segurança dos utilizadores e consumidores finais, no pleno respeito das competências profissionais do pessoal das alfândegas e dos que trabalham para os importadores e exportadores.

Bruxelas, 5 de Julho de 2006.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  JO C 110, de 30/04/2004.


16.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 309/26


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o «Livro Branco: A política no domínio dos serviços financeiros para o período 2005-2010»

COM(2005) 629 final

(2006/C 309/06)

Em 1 de Dezembro de 2005, a Comissão decidiu, nos termos do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre o «Livro Branco: A política no domínio dos serviços financeiros para o período 2005-2010».

A Secção Especializada de Mercado Único, Produção e Consumo, encarregada de preparar os correspondentes trabalhos, emitiu parecer em 31 de Maio de 2006 com base no projecto do relator Edgardo Maria IOZIA.

Na 428.a reunião plenária de 5 e 6 de Julho de 2006 (sessão de 5 de Julho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 152 votos a favor, 1 voto contra e 9 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Conclusões e propostas

1.1

O CESE concorda com a proposta da Comissão de dedicar o próximo quinquénio à consolidação dinâmica do sector financeiro, mediante a aplicação e o reforço da legislação vigente e evitando, ao mesmo tempo, uma sobreposição de demasiados actos normativos (o denominado gold-plating), respeitando o espírito da Estratégia de Lisboa e a especificidade do modelo social europeu.

1.2

O CESE considera ainda essencial examinar com atenção o papel e a actividade das autoridades de supervisão, fomentando a melhor coordenação possível, como previsto para os comités de nível 3 do processo Lamfalussy.

1.2.1

O CESE considera que, nas actuais condições, é prematuro criar uma autoridade única de supervisão europeia, que poderia contribuir, no futuro, para a integração dos mercados, mas considera útil que se proponha, neste momento, às autoridades europeias a determinação de uma autoridade de supervisão principal, que seria a do país de origem da sociedade-mãe, a quem seria confiada a tarefa de supervisionar também as actividades das sociedades afiliadas e das sociedades controladas nos outros países da União. As vantagens para as empresas de dimensão europeia e para os consumidores são evidentes.

1.3

O aumento da eficiência das transacções financeiras está na base do crescente peso que as actividades financeiras têm na economia (é a chamada «financeirização» da economia). Se, por um lado, a financeirização da economia se traduz por interessantes possibilidades de desenvolvimento económico e de emprego no sector financeiro, por outro lado, também pode ter consequências negativas para a economia em geral. A importância dos mercados bolsistas animados pela «shareholder value» pode entrar em rota de colisão com estratégias industriais. As pressões comerciais e financeiras sobre os empresários podem condicionar problemas no longo prazo e desencadear uma Oferta Pública de Aquisição (OPA) irreflectida que, nessas condições, leva muitas vezes à destruição de riqueza no curto prazo, como a experiência tem demonstrado.

1.3.1

Não se deve, porém, esquecer que, na sequência do processo de consolidação, se assiste, pelo menos a médio-curto prazo, a uma redução do emprego no sector financeiro que gera crescente insegurança nos trabalhadores. O CESE destaca a necessidade de se ter em conta as repercussões sociais dos processos de consolidação e exorta os Estados-Membros a adoptarem sistemas de apoio social adequados e a apoiarem planos de formação e de reconversão profissional, indispensáveis à realização dos objectivos previstos na Estratégia de Lisboa.

1.4

O CESE aprova os objectivos de simplificação, codificação e clarificação para se «legislar melhor» e aplaude, neste contexto, o compromisso da Comissão de manter consultas permanentes, frequentes e abertas com todos os interessados e de fazer preceder cada proposta de uma avaliação específica de impacto que foque também a dimensão social e ambiental e os factores externos sobre todo o sistema económico.

1.4.1

O CESE solicita que os trabalhos em torno do Plano de Acção para os Serviços Financeiros sejam objecto de maior visibilidade e de debate mais aprofundado que transcenda os círculos de especialistas.

1.5

O CESE concorda com a iniciativa proposta pela Comissão de apresentar uma comunicação/recomendação sobre os OICVM (organismos de investimento colectivo em valores mobiliários) para procurar ultrapassar os obstáculos ainda existentes na livre circulação desses instrumentos financeiros.

1.6

Será essencial reforçar a informação, a cultura financeira e o conhecimento dos consumidores. A intenção da Comissão de lançar acções específicas juntamente com as associações europeias de consumidores é oportuna, mas a Comissão deveria actuar mais junto dos Estados-Membros para levá-los a adoptar formas mais vinculativas de envolvimento das partes interessadas no nível nacional. O CESE declara-se disposto a colaborar nestas iniciativas, mediante uma intervenção específica junto das associações de consumidores e dos conselhos económicos e sociais nacionais.

1.7

Em virtude das diferenças entre os Estados-Membros, as actuais regras de supervisão impõem às empresas obrigações consideráveis em matéria de elaboração de balanços de contas e de relatórios de informação sobre a empresa. A adopção das normas internacionais de relato financeiro (IFRS) pode ser a ocasião adequada para uniformizar, a nível europeu, esses deveres de informação. O CESE faz notar que o IASB, organismo de normalização internacional privado, não reflecte totalmente a realidade económica mundial e espera que ela se abra à cooperação internacional com outros parceiros, como por exemplo a Comissão Europeia.

1.8

Quanto às s propostas de directivas sobre o mercado de retalho, o CESE pronunciar-se-á especificamente sobre a directiva do crédito ao consumo, a aprovar em breve, e sobre os serviços de pagamento, quanto aos quais está a elaborar um parecer. Todavia, no que toca os empréstimos hipotecários, o CESE, apesar de partilhar os objectivos, manifesta-se extremamente céptico quanto à possibilidade real de criar, a curto prazo, um mercado integrado dos empréstimos. Quanto aos sistemas de liquidação e compensação, o CESE veria com agrado a adopção de uma directiva-quadro.

1.9

A Comissão exprimiu perplexidade quanto à adopção do dito «26.o regime» no sector dos serviços financeiros. O CESE toma nota e declara-se pronto a avaliar, depois de criadas, as condições para uma aplicabilidade efectiva, a qual deverá ter sempre em consideração os interesses e as vantagens reais para os consumidores.

1.10

Quanto às iniciativas futuras, o CESE realça:

a utilidade de uma intervenção no âmbito dos OICVM, destinada à harmonização das normas das apólices associadas a unidades de participação com os outros produtos financeiros,

a importância de se garantir o acesso a uma conta bancária,

e a necessidade de se eliminar os obstáculos à mobilidade das contas bancárias transfronteiriças.

1.11

O CESE está convicto da elevada qualidade das normas europeias em matéria de regulamentação dos serviços financeiros, pelo que a UE pode aspirar a tornar-se a referência nesta matéria para todos os outros países. A Europa deveria entrar em diálogo, não só com os países da nova industrialização (por exemplo, Índia, Brasil e China), como proposto pela Comissão, mas também com os países em vias de desenvolvimento que necessitam de grande ajuda para desenvolverem o mercado dos seus serviços financeiros.

1.12

O CESE apoia todas as instituições europeias e nacionais no combate à criminalidade e ao terrorismo, incluindo quando a Comissão solicita que o sistema financeiro colabore plena e continuamente com as autoridades competentes. O CESE apoia e reitera tal apelo às instituições financeiras, mas também às autoridades competentes, as quais deverão informar sobre o seguimento dado às informações recebidas dos intermediários financeiros.

2.   Preâmbulo

2.1

O Livro Branco sobre a política dos serviços financeiros para 2005-2010 identifica alguns objectivos a realizar para promover a consolidação dinâmica do sector destes serviços, na certeza de que um mercado financeiro eficiente é um elemento fundamental para a prossecução de uma estratégia de desenvolvimento e de crescimento económico. A palavra de ordem do Livro Branco é a «consolidação dinâmica», que fixa o objectivo de remover os obstáculos remanescentes à livre circulação de serviços financeiros e de capitais, não obstante os importantes resultados já conseguidos com o Plano de Acção para os Serviços Financeiros 1999-2005 (PASF).

2.2

O papel essencial que a regulamentação desempenha no funcionamento dos mercados financeiros legitima a atenção e a ênfase com as quais o Livro Branco se detém na necessidade de aplicar e reforçar a legislação existente, evitando simultaneamente uma sobreposição de demasiados actos normativos, sobretudo da parte dos Estados-Membros (o denominado gold-plating).

2.3

A análise do quadro normativo não pode prescindir de uma reflexão sobre os limites, as competências e a responsabilidade de coordenação das autoridades de supervisão na UE. Na fase actual, a manutenção de uma base nacional de supervisão pode revelar-se a melhor forma de protecção e de garantia para os consumidores e investidores, mas não se podem menosprezar dois importantes problemas que esta abordagem de fundo coloca.

2.3.1

O exercício de uma supervisão não integrada no nível supranacional limita fortemente a integração dos mercados. É, portanto, necessário estimular e consolidar uma cooperação o mais estreita possível entre as autoridades dos Estados-Membros. Com efeito, a gestão dos riscos nos grandes bancos europeus com actividade em vários Estados-Membros é feita a nível do grupo numa base consolidada. As autoridades de supervisão estão em condições de avaliar correctamente o perfil de risco destes grandes grupos europeus.

2.3.2

A manutenção de fortes prerrogativas a nível da supervisão nacional não deve servir de pretexto para o aumento dos obstáculos à «consolidação dinâmica» a nível da UE, os quais devem ser, segundo o Livro Branco, gradualmente eliminados.

3.   Observações na generalidade

3.1

Em parecer recente, o CESE formulou observações sobre o Livro Verde sobre a política no domínio dos serviços financeiros (2005-2010). Uma vez que o Livro Branco retoma muitas das propostas avançadas no primeiro, o CESE reitera as considerações já formuladas, retomando-as sinteticamente no presente parecer (1).

3.1.1

O Livro Branco sublinha as potencialidades de desenvolvimento económico e do emprego no sector dos serviços financeiros. O Comité nota, contudo, que se deve reflectir atentamente e com realismo neste pressuposto essencial do documento, tendo presentes diversos factos já bem documentados.

3.2

O processo de consolidação do sector pode promover uma maior eficiência e economias de escala que poderão, em última análise, beneficiar os detentores de participações de capital de risco dos intermediários (mediante o aumento dos lucros do capital investido) e os beneficiários dos serviços financeiros (mediante a redução dos custos dos mesmos).

3.3

Paralelamente, há, porém, ampla prova empírica que aponta para uma redução do emprego no sector financeiro na sequência de processos de consolidação, o que gera uma crescente insegurança nos trabalhadores. Não se pode ocultar o facto de que os planos industriais apresentados por ocasião de fusões e aquisições destacam, sobretudo, as economias decorrentes de menores custos com o pessoal. No imediato, os processos de consolidação traduzem-se por uma perda nítida de postos de trabalho, mas deve-se, contudo, reconhecer que estes abrem espaço ao desenvolvimento de serviços e domínios de actividade inovadores que, por seu turno, terão um impacto positivo no emprego. Ao reduzirem-se os obstáculos que impedem os fornecedores de serviços financeiros de desfrutar plenamente das sinergias das fusões transfronteiriças, permitir-se-ia aos bancos prestar os seus serviços a custos inferiores, o que possibilitaria uma política de preços mais favorável aos clientes, favorecendo, portanto, um aumento da procura. Assim, conseguir-se-ia estimular o investimento da parte dos intermediários financeiros, o que teria igualmente repercussões positivas para o emprego. Estes novos postos de trabalho, com excepção de sectores particulares como os centros de chamadas (call center) e os serviços de retaguarda (back office), carecem, regra geral, de profissionais com perfis mais qualificados e melhor remunerados.

3.4

Assim, mesmo admitindo que a consolidação do sector não tenha repercussões negativas absolutas no emprego, o Comité destaca enfaticamente que não se pode ignorar o fosso temporal e de diversidade de qualificações profissionais que existe entre a perda dos postos de trabalho existentes e a criação de novos. Num momento em que se transfere a ênfase da protecção dos postos de trabalho para as possibilidades de encontrar um emprego, os Estados-Membros deveriam dar prioridade não só à existência de sistemas de apoio social adequados, mas também ao apoio a planos de formação e de reconversão profissional.

3.5

Se os trabalhadores compreenderem que as suas qualificações e as suas competências são facilmente utilizáveis mesmo num contexto económico em rápida evolução, aceitarão de melhor grado a menor estabilidade dos postos de trabalho que a «consolidação dinâmica» do sector comporta. Esta constatação deve levar a encarar a formação profissional, não como um instrumento de contenção da instabilidade social, mas sim como um elemento essencial e imprescindível para o êxito a longo prazo do plano de «consolidação dinâmica» e, mais em geral, da Estratégia de Lisboa, que visa transformar a economia europeia na mais importante «economia do conhecimento» do mundo. Há ainda que criar uma rede social adequada que contribua para mitigar os efeitos, muitas vezes graves, de tais fases de transição.

4.   Observações na especialidade

4.1   Melhorar o enquadramento normativo

4.1.1

Os três princípios que regem o processo para melhorar o enquadramento normativo são: a simplificação, a codificação e a clarificação. É importante prosseguir neste rumo para garantir a necessária coerência das disposições, simplicidade de aplicação e uniformidade na transposição.

4.1.2

O CESE aprova a proposta da Comissão sobre «legislar melhor» e concorda, em particular, com o compromisso assumido de manter consultas frequentes e abertas com todos os interessados e de fazer preceder sempre todas as propostas de uma avaliação de impacto centrada nos custos/benefícios económicos em sentido lato, isto é, incluindo também a dimensão social e ambiental. É, igualmente, importante o compromisso a assumir com o Conselho e o Parlamento para melhorar a qualidade da legislação e os factores externos relativos a todo o sistema económico.

4.1.3

O CESE partilha da opinião da Comissão sobre o desafio que representa quer uma transposição correcta e atempada quer a subsequente aplicação correcta da legislação europeia pelos 25 Estados-Membros, tendo igualmente em conta alargamentos posteriores, e concorda também com a exigência de se travar o gold-plating , ou seja a adopção unilateral de outras normas que vão contra o princípio do mercado único. De facto, a injustificada diversidade de regras nacionais para protecção dos consumidores constitui um dos principais obstáculos à integração dos serviços financeiros em toda a UE.

4.1.4

O CESE considera também fundamental verificar posteriormente (avaliação ex-post ) se as regras deram os frutos esperados e se, pelo menos para os sectores abrangidos pelo processo «Lamfalussy», os mercados evoluíram como previsto.

4.1.5

A verificação da coerência entre a legislação comunitária e a nacional deve ser feita a partir dos sectores mais relevantes ou onde possa haver mais problemas de harmonização e consolidação normativa, como no caso da distribuição e da publicidade dos Organismos de Investimento Colectivo em Valores Mobiliários (OICVM). O aumento da concorrência e da eficiência neste sector passa necessariamente também por uma maior margem de manobra a nível distributivo e comercial, fortemente entravada por um quadro normativo que não está ainda bem definido. Portanto, a iniciativa da Comissão de preparar uma comunicação/recomendação para 2006 e um Livro Branco sobre «asset management» para Novembro é particularmente oportuna.

4.1.6

A Comissão irá propor a compilação numa única directiva das dezasseis directivas em vigor sobre o sector dos seguros. O CESE apoia esta proposta de codificação, considerando-a como um excelente exemplo que deve ser seguido igualmente noutros domínios, mediante a adopção de actos legislativos que condensem, simplifiquem e reordenem as diversas matérias tratadas em várias directivas.

4.1.7

O CESE considera, igualmente, útil recorrer a processos de infracção sempre que se tenha registado uma transposição ou uma aplicação incorrectas das normas europeias; nota, contudo, que, nos últimos tempos, a Comissão tem sido muito condicionada pelo Conselho e tem recorrido cada vez menos a estes procedimentos.

4.1.8

O melhoramento e a racionalização no sector dos serviços financeiros a retalho não podem descurar o problema da informação, da educação e do conhecimento dos consumidores, elementos, na verdade, essenciais à eficácia de qualquer quadro normativo. É assaz oportuna, portanto, a intenção de lançar acções específicas a nível europeu com as associações que representam os consumidores e com os representantes do sector financeiro, mas a Comissão deveria empenhar-se mais para que, a nível nacional, tais práticas passem a ser, se não obrigatórias, pelo menos fortemente recomendadas. O boletim europeu para os consumidores é, em princípio, uma excelente iniciativa, mas há, porém, que estar consciente de que os instrumentos de informação devem ter como característica a proximidade real com o consumidor. O CESE solicita à Comissão que actue junto do Conselho e do Parlamento para examinarem formas mais vinculativas de envolvimento das partes interessadas no nível nacional, a exemplo do que se pretende realizar a nível europeu. O desenvolvimento do FIN-NET (mecanismo extrajudicial para resolução de litígios no domínio dos serviços financeiros), instrumento actualmente desconhecido da maior parte dos consumidores, vai no rumo certo. Na perspectiva de uma revisão do papel deste instrumento, o CESE recomenda que se envolvam as organizações dos consumidores e da sociedade civil, bem como os actores sociais e mostra-se pronto a apoiar a iniciativa mediante, por exemplo, uma intervenção específica junto das associações de consumidores e dos conselhos económicos e sociais nacionais.

4.1.9

Numa altura em que a Comissão insiste na importância da difusão da informação, sobretudo entre consumidores, investidores e trabalhadores do sector financeiro, o CESE afirma que não se pode subestimar o problema da língua em que são redigidos os documentos. A Comissão deve estar mais atenta a este problema, envidando todos os esforços necessários para disponibilizar, no maior número de línguas possível, pelo menos os documentos essenciais.

4.1.10

O CESE aprecia a atenção dada aos consumidores e ao pessoal dos estabelecimentos bancários e financeiros e o compromisso quanto à sua consulta regular sobre os temas que lhes dizem respeito. O valor acrescentado da integração dos mercados reside na satisfação do consumidor, mas dando-se a necessária atenção ao impacto social das decisões tomadas. Porém, no passado, as directivas em matéria financeira nem sempre foram conformes a esta abordagem. As observações propostas no ponto «Observações na generalidade» pretendem reiterar com veemência esta perspectiva de análise.

4.1.11

Quanto à interacção com outros domínios da política económica europeia, o CESE já sublinhou como o regime do IVA para os grandes grupos europeus (2) pode ser um obstáculo ao reforço dos serviços financeiros, pelo que apraz-lhe verificar que a Comissão tenha manifestado intenção de apresentar uma proposta legislativa neste domínio. No entanto, há que dar particular atenção à avaliação do impacto económico, social e ambiental que pode ter um processo, mesmo que desejável, de harmonização do regime do IVA. Não obstante, o CESE já observou que a actual situação pode constituir um obstáculo à plena integração e ao pleno desenvolvimento do mercado financeiro. Ademais, pretende, deste modo, chamar a atenção para o caso da externalização ( outsourcing ) que pode ser particularmente instigada por um quadro fiscal não harmonizado, com repercussões negativas para o emprego, a qualidade dos serviços e a fiabilidade global do sistema. O CESE espera que seja feita uma reflexão aprofundada sobre esta questão, uma vez que os resultados desta prática são muitas vezes pouco satisfatórios.

4.2   Assegurar uma estrutura normativa e de supervisão adequada

4.2.1

O objectivo de se conseguir uma maior coordenação entre as autoridades de supervisão dos mercados é sem dúvida partilhado. Este objectivo pode ser facilitado mediante um papel gradualmente mais incisivo dos comités de nível 3, harmonizando as competências dos membros, no âmbito do «processo Lamfalussy», para completar o quadro normativo europeu. Tal permitiria não só aliviar o trabalho da Comissão, assim como diminuir o risco de gold-plating por parte dos Estados-Membros ou das autoridades de supervisão.

4.2.2

O CESE considera prematuro, na fase actual, pensar numa única autoridade de supervisão europeia a que se possa atribuir a responsabilidade de coordenação das acções de vigilância. No entanto, considera que as autoridades de supervisão nacionais devem cooperar activa e continuamente, procurando estabelecer protocolos de conduta e de acção comuns. A confiança mútua que daí advirá será um primeiro passo para lançar um processo que conduza, no futuro, à criação de uma autoridade de supervisão europeia para os grandes grupos financeiros, bancários e de seguros com actividade em vários Estados-Membros. Uma primeira decisão importante deve dizer respeito à determinação de uma autoridade de supervisão principal, no país onde se encontra a sede social da sociedade-mãe, que seria incumbida da responsabilidade de supervisionar as sociedades afiliadas e as sociedades controladas nos outros países europeus. As multinacionais e as autoridades de supervisão podem efectivamente tirar partido do mercado único, evitando deste modo a multiplicação da apresentação de relatórios e de documentos de informação e a observância de diferentes regulamentações nacionais.

4.2.3

O método utilizado, por exemplo, na directiva sobre o abuso de mercado deve ser incentivado. A apresentação de um projecto de directiva muito pormenorizado possibilitou que as transposições fossem muito homogéneas e permitiu deixar aos reguladores uma responsabilidade importante, que foi, igualmente, partilhada a nível europeu, identificando as actividades específicas a transferir entre as diversas autoridades de supervisão.

4.2.4

A adopção das normas internacionais de relato financeiro (IFRSInternational Financing Reporting Standards ) foi uma ocasião importante para uniformizar e fazer convergir para normas modernas a representação contável da gestão das empresas. Pode também vir a ser a ocasião de uniformizar a nível europeu o tipo de dados que os intermediários devem fornecer às respectivas autoridades de supervisão. O CESE entende que a adopção das IFRS elimina todos os pretextos para adiamentos ou atrasos na prossecução deste objectivo, pré-requisito indispensável a uma coordenação e a uma cooperação eficientes e eficazes da actividade de supervisão a nível europeu. No entanto, estas devem estar alinhadas com os objectivos correspondentes no projecto europeu «Solvency II». As empresas que ainda não harmonizaram os seus balanços de contas e os seus balanços consolidados com as IFRS não devem, contudo, ficar em desvantagem em relação às empresas sujeitas a esta obrigação.

4.3   Iniciativas legislativas presentes e futuras

4.3.1   Iniciativas legislativas presentes

4.3.1.1

A banca de retalho está abrangida por três iniciativas muito importantes. No que diz respeito aos empréstimos hipotecários, o CESE (3) já exprimiu algumas reticências bem fundamentadas quanto à possibilidade concreta de integrar o mercado, à luz das implicações jurídicas e das dificuldades substanciais evidenciadas em recente parecer. O CESE está à espera de conhecer as orientações da Comissão e as suas respostas às objecções levantadas.

4.3.1.2

As alterações propostas pela Comissão à directiva sobre o consumo, ora no Parlamento, melhoram a precedente proposta, embora não satisfazendo plenamente os consumidores. O CESE aguarda poder conhecer o resultado dos debates, fazendo votos de que em breve a directiva seja aprovada.

4.3.1.3

A directiva sobre os serviços de pagamento também assume um papel importante. Existe ainda uma certa ambiguidade em relação aos serviços de pagamento transfronteiriços. O sistema financeiro deve sujeitar-se às regras de concorrência, transparência e comparabilidade elaboradas pela DG da Concorrência. A construção da Zona Europeia Única de Pagamentos (SEPA) até 2010 é um objectivo ambicioso e útil, que tornará mais eficientes os pagamentos transfronteiriços e protegerá os consumidores. No entanto, há que ter em consideração que já existem sistemas eficientes e pouco onerosos (por exemplo, o sistema de débito directo) a funcionar em alguns Estados-Membros. Ao realizar-se a SEPA, há que ter em conta os interesses dos utentes e oferecer um valor acrescentado. Está em curso no CESE a elaboração de um parecer específico sobre serviços de pagamento, em que serão mencionadas as apreciações do Comité.

4.3.1.4

A revisão do conceito de participação qualificada, mediante intervenção nos artigos 16.o e 15.o respectivamente da directiva sobre os bancos e da directiva sobre os seguros, é uma iniciativa essencial para impedir que uma qualquer autoridade de supervisão possa entravar o desenvolvimento equilibrado do mercado interno, refugiando-se no pretexto da gestão prudencial dos sistemas financeiros. O CESE entende que a melhor garantia da estabilidade de um sistema consiste no melhoramento da sua eficiência, em vez da colocação de limitações à transferência do controlo das empresas.

4.3.1.5

Quanto aos sistemas de liquidação e compensação, a ausência de um quadro de referência normativa contribuiu para a manutenção de fortes deseconomias e de verdadeiros abusos. As compensações e as liquidações transfronteiriças são mais caras e menos eficazes do que as nacionais. O CESE veria favoravelmente a adopção de uma directiva-quadro com o objectivo de aumentar a capacidade competitiva dos operadores europeus, inclusive em relação aos seus concorrentes internacionais. Um mercado eficiente e bem regulado atrai os investimentos e a Europa necessita de investimento se pretende perseguir realmente os objectivos de crescimento económico e emprego.

4.3.2   Reflexões presentes

4.3.2.1

O CESE concorda com a avaliação da Comissão sobre os obstáculos injustificados à plena aplicação da circulação do capital e dos investimentos transfronteiriços.

4.3.2.2

A Comissão exprimiu perplexidade quanto ao dito «26. o regime» no sector dos serviços financeiros. O princípio da harmonização mínima levou, por outro lado, a muitas diferenças. O princípio do país de origem foi um instrumento formidável de liberalização e de concorrência no âmbito da UE. Este princípio é, de facto, tanto mais aceite totalmente pelos Estados-Membros, quanto mais consolidada está a confiança mútua em relação à qualidade da legislação interna de cada Estado-Membro. Nesta perspectiva, o objectivo de plena harmonização legislativa é um importante motor que alimenta e consolida as referidas relações de confiança, que estão na base do surgimento gradual de uma cultura comum, a qual deverá levar à harmonização das cláusulas essenciais dos contratos de serviços financeiros. O CESE nota, aliás, que até hoje não foi invocada nenhuma prova da aplicabilidade (efectiva) do 26.o regime e que a Comissão deveria, em qualquer caso, efectuar um exame aprofundado da sua aplicação. Em parecer recente, o CESE afirma: (o 26.o regime) poderia ser uma opção praticável apenas após se verificar, mediante estudo aprofundado da legislação e dos contratos dos 25 Estados Membros, que o instrumento «paralelo» não se infringe nem os regulamentos nem a legislação respectivos. Em qualquer caso, as regras de normalização não devem obstar à oferta de novos produtos, travando a inovação. (4).

4.3.3   Iniciativas futuras

4.3.3.1

Em recente parecer sobre o Livro Verde de Julho de 2005, o CESE realçou a utilidade de uma iniciativa sobre os OICVM  (5). «Os fundos de investimento deparam-se com produtos financeiros, como as apólices associadas a unidades de participação, considerados comparáveis pelos investidores, não obstante a sua regulamentação ser bastante diferente. Esta situação pode implicar distorções nas escolhas dos investidores, com consequências negativas em termos de custos e de riscos dos investimentos efectuados. O Comité considera que não se pode atacar o problema reduzindo a concorrência ou diminuindo as restrições e as garantias exigidas aos fundos de investimento. É desejável, pelo contrário, que se ajustem em alta as normas para que os produtos financeiros que, na realidade, são considerados como uma alternativa directa aos fundos de investimento sejam sujeitos a exigências regulamentares comparáveis às que se aplicam a estes fundos.». A assimetria das obrigações entre fundos e apólices associadas a unidades de participação, o desenvolvimento meramente parcial do passaporte europeu, em razão dos obstáculos que algumas autoridades de supervisão continuam a interpor, a escassa transparência em matéria dos custos, e em particular os de saída, a fragmentação do mercado e os custos relativamente elevados são alguns dos problemas mencionados. Ademais, o CESE vê com preocupação o desenvolvimento em alguns Estados-Membros de fundos de capital garantido sem qualquer obrigação da sociedade de gestão deter fundos próprios adequados, o que em caso de evolução particularmente desfavorável do mercado pode levar a uma situação de protecção não adequada dos consumidores. O CESE solicita à Comissão que colmate esta lacuna, fixando para as sociedades proponentes de fundos de capital garantido obrigações adequadas em matéria de fundos próprios bem como um nível específico e adequado de vigilância. A pressão para se atingir uma melhor eficiência dos OICVM é particularmente sentida pelo CESE, sobretudo pelo facto de que, enquanto elemento significativo dos esquemas de fundos de pensão, estes podem dar um contributo importante para a solução de um problema justamente recordado no início do Livro Branco, a saber, o financiamento do enorme défice no regime de pensões presente na maior parte das economias europeias.

4.3.3.2

O CESE concorda com a Comissão quanto à importância, não apenas económica, do acesso a uma conta bancária. Na economia moderna, ser titular de uma conta bancária atribui de facto ao indivíduo uma espécie de cidadania económica. Nalguns países da União, este direito de cidadania é reconhecido por lei, obrigando o sistema financeiro a garantir a prestação de serviços de base a custos mínimos de acesso. Noutros países da UE, as empresas estão cada vez mais conscientes desta situação e oferecem, por poucos euros por mês, um «pacote» de serviços associado à conta corrente.

4.3.3.3

O projecto de eliminar os obstáculos à mobilidade das contas correntes transfronteiriças é de admirar e pode contribuir para reduzir os preços aplicados pelos bancos. À luz da possibilidade de se abrirem contas em linha, este projecto pode tornar verdadeiramente alcançável o objectivo de assegurar a mobilidade intra-europeia das contas. Há, no entanto, que ter em conta que nem todos os consumidores têm condições para utilizar as tecnologias informáticas. A Comissão deveria procurar encontrar uma solução satisfatória também para estas pessoas, que normalmente pertencem aos grupos sociais mais vulneráveis. Realça-se, portanto, que apenas a consolidação de uma colaboração real e construtiva entre as autoridades de supervisão pode concretizar verdadeiramente esta hipótese. Em Maio de 2006 (6), a Comissão decidiu incumbir um grupo de peritos de analisar a questão da mobilidade dos clientes em relação às contas bancárias, dando seguimento às propostas formuladas no Livro Branco.

4.4   A dimensão externa

4.4.1

O ambicioso objectivo da Comissão de tornar a Europa líder na determinação de normas a nível global é seguramente partilhado. Em conformidade com as recomendações da ronda negocial de Doha, o CESE espera ainda que a Europa lidere os países mais desenvolvidos no compromisso de prestar aos menos desenvolvidos uma assistência técnica e financeira adequada, tanto no plano normativo como no da aplicação dos acordos e das normas adoptadas. A progressão da integração internacional deve ter, igualmente, em conta as exigências das economias mais vulneráveis, que necessitam de atrair investimento. O CESE espera que a Comissão tenha bem presentes estas exigências na negociação e no diálogo com as outras economias mais avançadas.

4.4.2

O CESE compromete-se a lutar activamente contra a utilização criminosa dos sistemas financeiros e apoia a Comissão e as outras instituições europeias no combate a quaisquer formas de criminalidade, frequentemente, aliás, relacionadas com o terrorismo internacional. O crime económico manifesta-se de inúmeras maneiras: fraudes empresariais e comerciais, branqueamento de capitais, evasão fiscal, corrupção. Muitas vezes utiliza os canais dos serviços financeiros para completar a acção criminosa. O CESE lança um apelo às instituições financeiras para que dêem uma real ajuda às autoridades competentes, as quais deverão, por seu turno, dar respostas adequadas às comunicações recebidas das instituições financeiras. Caso estas estejam, de facto, suficientemente informadas sobre o seguimento dado às informações fornecidas às autoridades a propósito de transacções suspeitas, estarão mais inclinadas a continuar e a incrementar os esforços necessários.

Bruxelas, 5 de Julho de 2006.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  JO C 65 de 17.3.2006.

(2)  JO C 65 de 17.3.2006.

(3)  JO C 65 de 17.3.2006.

(4)  JO C 65 de 17.3.2006.

(5)  JO C 110 de 17.5.2006.

(6)  Decisão da Comissão, de 16 de Maio de 2006, que cria um grupo de peritos sobre a mobilidade dos clientes em relação às contas bancárias (JO L 132 de 19.05.2006, p. 37).


16.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 309/33


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de decisão do Conselho que aprova a adesão da Comunidade Europeia ao Acto de Genebra do Acordo da Haia, relativo ao registo internacional de desenhos ou modelos industriais, adoptado em Genebra a 2 de Julho de 1999»

COM(2005) 687 final — 2005/0273 (CNS)

e a

«Proposta de regulamento do Conselho que altera os Regulamentos (CE) n.o 6/2002 e (CE) n.o 40/94 para que a adesão da Comunidade Europeia ao Acto de Genebra do Acordo da Haia, relativo ao registo internacional de desenhos ou modelos industriais, produza efeitos»

COM(2005) 689 final — 2005/0274 (CNS)

(2006/C 309/07)

Em 17 de Fevereiro de 2006, o Conselho decidiu, nos termos dos artigos 308.o e 300.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Em 14 de Fevereiro de 2006, o Conselho decidiu, nos termos do artigo 308.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a

«Proposta de regulamento do Conselho que altera os Regulamentos (CE) n.o 6/2002 e (CE) n.o 40/94 para que a adesão da Comunidade Europeia ao Acto de Genebra do Acordo da Haia, relativo ao registo internacional de desenhos ou modelos industriais, produza efeitos»

COM(2005) 689 final — 2005/0274 (CNS).

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos do Comité, a Secção Especializada de Mercado Único, Produção e Consumo emitiu parecer em 31 de Maio de 2006, tendo sido relator Bryan CASSIDY.

Na 428.a reunião plenária, realizada em 5 e 6 de Julho de 2006 (sessão de 5 de Julho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 155 votos a favor, 3 votos contra e 2 abstenções, o presente parecer.

1.   Síntese das conclusões e recomendações do CESE

As duas propostas da Comissão estão relacionadas, pelo que serão examinadas num único documento do CESE.

O CESE apoia plenamente as propostas da Comissão.

2.   Pontos principais das propostas da Comissão

2.1

As propostas em apreço procuram estabelecer uma ligação entre o sistema de desenhos ou modelos comunitários e o sistema de Haia de registo internacional de desenhos ou modelos industriais, mediante a adesão da Comunidade Europeia ao Acto de Genebra do Acordo da Haia. A primeira proposta prende-se com a adesão ao Acto, ao passo que a segunda altera os regulamentos pertinentes para este fim.

2.2

O sistema de Haia baseia-se no Acordo da Haia relativo ao registo internacional de desenhos ou modelos industriais. Este acordo é constituído por três actos distintos: o Acto de Londres de 1934, o Acto de Haia de 1960 e o Acto de Genebra de 1999. Os três actos são autónomos e as respectivas disposições substantivas coexistem. As partes contratantes podem decidir subscrever apenas um dos actos, dois deles ou os três.Tornam-se automaticamente membros da União da Haia, que tem neste momento 42 partes contratantes, incluindo 12 Estados-Membros da UE (1).

2.3

A adesão permitiria aos criadores de toda a CE proteger os seus novos desenhos ou modelos originais em qualquer país signatário do Acto de Genebra através de um único pedido. Seria outra forma de os requerentes protegerem os seus desenhos ou modelos, que passariam a ter protecção disponível ao nível nacional, comunitário, através do registo de desenho ou modelo comunitário, e internacional, através do sistema de Haia.

2.4

O resultado seria um sistema mais simples, mais eficiente economicamente e mais eficaz em matéria de custos. Segundo o sistema de Haia, os requerentes não são obrigados a apresentar traduções dos documentos, não têm de pagar taxas individuais aos institutos e agentes nos diferentes países, nem têm de estar atentos aos diferentes prazos para renovação dos pedidos nacionais. Pelo contrário, deposita-se um único pedido, num único local com pagamento de uma taxa única que dá lugar a direitos múltiplos internacionais sobre um desenho ou modelo registado nos países signatários do Acto de Genebra.

2.5

O sistema de desenhos ou modelos comunitários permite aos criadores proteger novos desenhos ou modelos originais que se caracterizem pela sua aparência visual, mediante a concessão de monopólios individuais a desenhos ou modelos registados, que são uniformes e válidos em toda a CE. Em cada Estado-Membro também existem direitos sobre um desenho ou modelo registado, mas o sistema comunitário é o meio mais económico e adequado para obter uma protecção uniforme em toda a Comunidade para qualquer empresa com actividade no mercado europeu.

2.6

O Acordo da Haia relativo ao registo internacional de desenhos ou modelos industriais prevê um sistema, gerido pela Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI), mediante o qual a apresentação de um único pedido sobre um desenho ou modelo juntamente com o pagamento de uma taxa única resultarão numa multiplicidade de desenhos ou modelos registados nos vários Estados que são partes contratantes. O sistema de Haia pode ser utilizado por qualquer residente ou nacional ou por qualquer empresa estabelecida num Estado parte do Acordo. Actualmente, a OMPI não recebe pedidos apresentados via os institutos nacionais. A apresentação de pedidos directamente à OMPI evita confusões e duplicações, bem como a possibilidade de pagamento excessivo ao Instituto para a Harmonização do Mercado Interno.

2.7

Uma das vantagens do sistema de Haia prende-se com o facto de facilitar a alteração da protecção do modelo ou desenho, bem como a sua renovação findo o prazo.

2.8

O Acto de Genebra do Acordo da Haia entrou em vigor em 23 de Dezembro de 2003. Para além de algumas modificações para tornar o sistema mais acessível, permite a adesão de organizações intergovernamentais, como a CE, ao sistema de Haia. Presentemente, 19 países sãos partes do Acto de Genebra, incluindo a Suíça, Singapura e Turquia. Vários Estados-Membros ainda não assinaram e/ou ratificaram este acto.

2.9

O Acto de Genebra só permite a apresentação de pedidos numa das duas línguas oficiais: o inglês e o francês.

2.10

Os Estados Unidos deverão aderir ao Acto em Novembro de 2006; a adesão tanto dos EUA como da UE deverá incentivar outros grandes parceiros comerciais (China, Japão, Coreia) a aderir, permitindo registos em vários países importantes.

2.11

A proposta estabelece uma ligação entre a CE, considerada como um único país ao abrigo do Acto e do sistema de Haia, aumentando, desta forma, a sua utilidade.

3.   Observações na especialidade

3.1

A proposta de decisão do Conselho [COM(2005) 687 final] permite à CE actuar como um único país na União de Haia em relação ao sistema de desenhos ou modelos comunitários. A alteração do Regulamento (CE) n.o 6/2002 (regulamento dos desenhos ou modelos comunitários) faz com que a adesão ao Acto de Genebra produza efeitos.

3.2

A alteração do Regulamento (CE) n.o 40/94 (regulamento sobre a marca comunitária) permite ao Instituto para a Harmonização do Mercado Interno, em Alicante, receber taxas sobre desenhos ou modelos registados ao abrigo do Acto de Genebra.

3.3

O artigo 308.o do Tratado CE é a base jurídica da proposta de alteração destes dois regulamentos comunitários.

3.4

O Parlamento Europeu é consultado. As duas propostas não estão sujeitas ao processo de co-decisão.

3.5

O Conselho delibera por unanimidade.

4.   Custos

4.1

Não se espera que esta proposta acarrete custos adicionais, uma vez que altera regulamentos directamente aplicáveis nos Estados-Membros.

4.2

Actualmente, os registos de desenhos ou modelos estão sujeitos a taxas de apresentação do pedido e taxas de renovação em cada país onde são solicitados. Geralmente, uma taxa típica nacional de apresentação do pedido não chega aos 100 euros, mas para apresentação de um pedido internacional deve-se acrescentar o custo e os inconvenientes do câmbio monetário.

Bruxelas, 5 de Julho de 2006.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  São eles: Bélgica, Estónia, França, Alemanha, Grécia, Hungria, Itália, Letónia, Luxemburgo, Países Baixos, Eslovénia e Espanha. Em si, a UE não é actualmente membro do sistema de Haia.


16.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 309/35


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que estabelece as regras de participação de empresas, centros de investigação e universidades em acções no âmbito do sétimo programa-quadro e as regras de difusão dos resultados da investigação (2007-2013)»

COM(2005) 705 final — 2005/0277 (COD)

(2006/C 309/08)

Em 1 de Março de 2006 o Conselho decidiu consultar o Comité Económico e Social Europeu, nos termos do artigo167.o e do n.o 2 do artigo 172.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, sobre a proposta supramencionada.

La Secção Especializada de Mercado Único, Produção e Consumo, que emitiu parecer em 31 de Maio de 2006, sendo relator G. WOLF.

Na 428.a reunião plenária de 5 e 6 de Julho de 2006 (sessão de 5 de Julho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 152 votos a favor, 1 voto contra e 3 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Resumo

1.1

A proposta da Comissão refere-se às condições, regras e procedimentos segundo os quais as empresas, centros de investigação, universidades e outras entidades jurídicas podem receber apoio no âmbito do sétimo programa-quadro de IDT.

1.2

O Comité acolhe favoravelmente a maior parte das regras propostas e considera que estas representam melhorias capazes de promover uma considerável simplificação dos procedimentos administrativos. Neste contexto, o Comité recomenda que haja igualmente uma maior normalização e uma aplicação mais coerente das regras de execução internas da Comissão, que ainda não foram adoptadas (no que se refere aos critérios aplicáveis, por exemplo).

1.3

Entretanto, e uma vez que ainda se aguardam as regras de execução internas da Comissão, alguns dos efeitos específicos da regulamentação proposta não podem ser ainda avaliados. Nestes casos (por exemplo, no do reembolso de custos adicionais), o Comité recomenda que se mantenham as regras vigentes, pelo menos por enquanto, para que os beneficiários de subvenções não as percam.

1.4

O Comité acolhe favoravelmente os novos limites máximos de apoio aos beneficiários de subvenções e suas respectivas áreas de actividade, congratulando-se em particular com o facto de estes conduzirem a uma melhoria dos apoios às PME.

1.5

O Comité recomenda tratamento igual para todas as instituições de investigação financiadas principalmente pelo Estado, independentemente do seu estatuto jurídico.

1.6

O Comité recomenda que, futuramente, seja dada às partes contratantes maior liberdade na negociação das disposições contratuais, bem como na escolha dos instrumentos. Isto aplica-se, em especial, aos direitos de acesso a conhecimentos novos e preexistentes detidos por uma das partes. Os direitos de acesso a título gratuito devem ser aqui oferecidos como opção, mas não de forma incondicional — como foi proposto para determinados casos.

1.7

Para mais detalhes, ver capítulo 4.

2.   Introdução

2.1

Na sua proposta relativa ao sétimo programa-quadro de actividades em matéria de IDT (2007 — 2013) (1), adiante designado «7.o PQ», a Comissão definiu os objectivos, conteúdo, temas e orçamento do seu apoio à investigação, desenvolvimento tecnológico e actividades de demonstração durante este período. O Comité já adoptou pareceres sobre o programa-quadro (2) e sobre as propostas preparatórias e de acompanhamento, em especial para os programas específicos (3).

2.2

A proposta da Comissão aqui discutida incide sobre as condições, regras e procedimentos que se aplicam à participação de empresas, universidades, centros de investigação e outras entidades jurídicas em acções no âmbito do sétimo programa-quadro, no contexto do apoio a título do programa.

2.3

Um aspecto importante que importa aqui referir é o facto de a Comissão tencionar simplificar os procedimentos administrativos relacionados com o financiamento da investigação. Esta intenção foi favoravelmente acolhida e apoiada em anteriores pareceres; o Comité, pela sua parte, reitera a sua anterior recomendação de que os procedimentos devem ser simplificados e desburocratizados, melhorando assim a eficácia do programa de investigação europeu: «Os esforços e os custos ligados actualmente à apresentação e ao deferimento das propostas são demasiado elevados e causam problemas aos utilizadores do mundo científico e industrial. É fundamental que os proponentes sintam que vale a pena apresentar propostas e se vejam compensados pelos riscos associados a este procedimento. Isto aplica-se especialmente às entidades de menores dimensões, como as PME, ou aos grupos de investigação mais pequenos adstritos às universidades e aos centros de investigação» (4). Segundo afirma a Comissão, as regras de participação propostas visam promover esta simplificação.

2.4

A proposta da Comissão explica que as regras aplicáveis visam assegurar que o financiamento comunitário da investigação e desenvolvimento no âmbito do 7.o PQ seja o mais eficiente, eficaz e equitativo possível.

2.5

As regras propostas para a participação de empresas, centros de investigação e universidades devem, portanto «proporcionar um enquadramento coerente e transparente com vista a garantir uma execução eficiente e um acesso fácil de todos os participantes ao sétimo programa-quadro». Visam promover a participação de uma vasta gama de empresas, centros de investigação e universidades, bem como das regiões ultraperiféricas da Comunidade.

3.   Teor do documento da Comissão

3.1

A proposta da Comissão relativa às regras de participação no âmbito do sétimo programa-quadro visa aplicar muitos aspectos dessa simplificação e desenvolver princípios estabelecidos no sexto programa-quadro (6.o PQ). Alguns aspectos importantes são objecto de breve resumo neste capítulo.

3.2

A proposta da Comissão aborda os seguintes aspectos: disposições introdutórias, condições de participação em acções indirectas e respectivos procedimentos, contribuição financeira da Comunidade, regras de difusão e utilização dos resultados da investigação, direitos de acesso a conhecimentos novos ou preexistentes e o papel do Banco Europeu de Investimento

3.3   Condições de participação em acções indirectas

3.3.1

Devem participar nas acções indirectas um mínimo de três entidades jurídicas, cada uma das quais estabelecida num Estado-Membro ou Estado associado, mas não podendo qualquer delas estar estabelecida no mesmo Estado-Membro ou Estado associado.

3.3.2

Para acções de coordenação e apoio e acções para a formação e progressão na carreira dos investigadores, a condição mínima é a participação de uma entidade jurídica.

3.3.3

No que diz respeito a acções indirectas de apoio a projectos de investigação de «fronteira» da iniciativa dos investigadores, financiados no âmbito do Conselho Europeu de Investigação, a condição mínima é a participação de uma entidade jurídica estabelecida num Estado-Membro ou Estado associado.

3.4   Contribuição financeira da Comunidade

3.4.1

A contribuição financeira da Comunidade para actividades de investigação e desenvolvimento tecnológico pode atingir um máximo de 50 % dos custos totais elegíveis.

3.4.1.1

No entanto, no caso de entidades públicas, estabelecimentos de ensino secundário e superior e organizações de investigação (5), a contribuição pode atingir um máximo de 75 % dos custos totais elegíveis.

3.4.2

Para actividades de demonstração, a contribuição financeira da Comunidade pode atingir um máximo de 50 % dos custos totais elegíveis.

3.4.3

Para actividades apoiadas por acções de investigação de fronteira, acções de coordenação e apoio e acções para a formação e progressão na carreira dos investigadores, a contribuição financeira da Comunidade pode atingir um máximo de 100 % dos custos totais elegíveis.

3.4.4

Para a gestão e certificados de auditoria, bem como outras actividades não abrangidas pelos n.os 1, 2 e 3 do artigo 33.o, a contribuição financeira da Comunidade pode atingir um máximo de 100 % dos custos totais elegíveis.

3.4.5

Para a contribuição financeira da Comunidade para redes de excelência, é proposto um montante fixo específico. Segundo as regras de participação, este montante é calculado em função do número de investigadores a integrar na rede de excelência e da duração da acção.

3.5   Outras regras

As regras fixam os procedimentos de publicação de convites à apresentação de propostas, bem como os procedimentos de apresentação, avaliação, selecção e aprovação de propostas.

O processo de avaliação desenvolvido ao longo dos programas-quadro precedentes manter-se-á sem alterações substanciais. A Comissão elaborará um modelo de convenção de subvenção que estabelecerá os direitos e obrigações dos participantes face à Comunidade e entre si.

São propostas três formas de subvenção: reembolso dos custos elegíveis, montantes fixos e financiamento a taxa fixa. Para acções de investigação de fronteira, o conselho científico do Conselho Europeu de Investigação proporá modalidades de financiamento adequadas.

3.6

Deverá manter-se o máximo de continuidade possível no que diz respeito à difusão e utilização e aos direitos de acesso (propriedade, protecção, publicação, difusão e utilização e direitos de acesso a conhecimentos novos e preexistentes). As alterações devem dar mais flexibilidade aos participantes à medida que os seus projectos avançam. Mantém-se a possibilidade de excluir os conhecimentos preexistentes e de definir termos e condições diferentes dos estabelecidos pelas regras. A coerência dos requisitos de difusão e publicação foi melhorada.

3.7

Tal como no 6.o PQ, os participantes num consórcio terão a responsabilidade de executar plenamente as tarefas que lhes forem confiadas, mesmo que um dos participantes não consiga cumprir as tarefas que lhe tenham sido atribuídas. Contudo, o princípio da responsabilidade financeira conjunta estabelecido no 6.o PQ para a maioria das acções é retirado. Em função de uma avaliação dos riscos inerentes para o orçamento comunitário decorrentes do financiamento da investigação europeia, poderá ser criado um mecanismo destinado a cobrir o risco financeiro do não reembolso por um participante de montantes devidos à Comunidade. Por conseguinte, apenas serão solicitadas garantias bancárias no caso raro em que o pré-financiamento represente mais de 80 % da subvenção.

4.   Observações na especialidade

4.1

Simplificação. O Comité apoia os objectivos, extremamente importantes, de simplificação de todos os procedimentos até agora utilizados pela Comissão ou por esta exigidos aos executantes de IDT. O Comité considera os seus comentários como uma contribuição construtiva para a prossecução dos objectivos e está ciente de que esta não é fácil, tendo em conta as regras orçamentais gerais e a exigência de transparência — uma exigência que o próprio Comité igualmente subscreve. Seria especialmente importante que, em projectos-piloto escolhidos no quadro das possibilidades legais, se introduzissem mais simplificações administrativas: as experiências daí resultantes poderiam ser um apoio à decisão de medidas futuras.

4.1.1

Melhorias. O Comité reconhece que a Comissão se esforçou para atingir este objectivo e para assegurar que a Comunidade dê o melhor apoio possível à investigação. Neste contexto, considera que muitos aspectos da presente proposta representam melhorias claras dos procedimentos existentes, por exemplo, no que se refere ao reembolso dos custos (artigos 30.o e 31.o) e às formas de subvenção, bem como às convenções de subvenção, contratos e cartas de nomeação (artigos 18.o e 19.o); no entanto, neste último caso, as novas regras só representarão uma melhoria se o pagamento e, sobretudo, o sistema de relatórios forem igualmente simplificados. A este respeito, o Comité remete para as suas anteriores recomendações (6) sobre simplificação, referentes, nomeadamente, à harmonização dos procedimentos exigidos pela Comissão em relação a outras instâncias de financiamento ou supervisão em termos de conteúdo e de calendário (7).

4.1.2

Normalização. O esforço de normalização dos procedimentos aplicados ou exigidos pela Comissão — por exemplo, relativamente aos riscos de financiamento e de crédito — serve igualmente o objectivo de simplificação. No interesse do mercado único e também no de uma maior segurança jurídica, o Comité está inteiramente de acordo (8). Infelizmente, a normalização total só será conseguida se os diferentes beneficiários de subvenções, como as universidades, nos vários Estados-Membros, aplicarem, por seu lado, sistemas contabilísticos harmonizados.

4.2

Outras regras. Para conseguir a simplificação e a normalização, a Comissão terá de adoptar outras medidas, que apenas são mencionadas na proposta, por exemplo, no n.o 4 do artigo 16.o: «A Comissão adoptará e publicará regras destinadas a assegurar uma verificação coerente da existência e estatuto jurídico dos participantes em acções indirectas, bem como da sua capacidade financeira». Uma vez que estas regras, adiante referidas como «regras de execução internas da Comissão», ainda não foram adoptadas, é cedo para avaliar, em certos casos, o impacto que as correspondentes propostas da Comissão terão.

4.2.1

Interpretação e critérios coerentes. Além disso, o Comité espera que haja uma interpretação coerente das regras de execução internas da Comissão, em especial das que se referem aos aspectos jurídicos e financeiros dos projectos, em todos os serviços da Comissão envolvidos, permitindo mais progressos no sentido da simplificação e da normalização e assegurando que os executantes de IDT não são prejudicados comparativamente às disposições actuais. De uma maneira geral, o Comité recomenda uma maior clarificação das disposições de execução internas da Comissão, para colmatar quaisquer lacunas da proposta da Comissão, no interesse da segurança jurídica.

4.2.2

Medidas de apoio. Contudo, os serviços de assistência e «centros de coordenação» propostos ou já mantidos pela Comissão devem assegurar que as mensagens enviadas pela Comissão sejam coerentes e uniformes. O Comité considera esta medida importante e útil. No entanto, importa assegurar igualmente uma abordagem coerente nos procedimentos internos da Comissão e nas exigências e decisões dos funcionários encarregados dos projectos.

4.2.3

Requisitos de apresentação de relatórios. Por exemplo, é também importante evitar, salvo em casos excepcionais e bem justificados, situações em que os funcionários responsáveis pelos projectos peçam relatórios intercalares, para além daqueles que são exigidos pelas regras e em que tenham de ser incluídas várias versões da mesma informação em diferentes relatórios (9). É igualmente importante normalizar os requisitos de apresentação de relatórios, não só no aspecto formal, mas também em termos de conteúdo.

4.2.4

Avaliação intercalar. Tendo em conta que o sétimo programa-quadro irá vigorar sete anos, o Comité recomenda igualmente a realização de uma avaliação intercalar a meio deste período, não só dos programas mas também das regras de repartição, para que se possam efectuar ajustamentos que sejam necessários.

4.2.5

Funcionários responsáveis pelos projectos. Outra necessidade importante para a simplificação e normalização e para os procedimentos administrativos em geral, que também serve para manter a necessária continuidade (ver o ponto seguinte), é a de os funcionários encarregados dos projectos terem conhecimentos especializados na matéria em questão e conhecerem as pessoas envolvidas; os funcionários responsáveis não podem confinar-se a um papel meramente administrativo e devem ter um conhecimento profundo da matéria e da informação existente. O Comité remete para as suas recomendações (10) a este respeito, que tem reiterado em diversas ocasiões (11).

4.3

Continuidade. Dado que qualquer alteração das regras implica uma quebra da continuidade e fricção adicional, é importante ponderar cuidadosamente se as alterações propostas pela Comissão se irão efectivamente traduzir numa melhoria significativa da eficácia, capaz de compensar essa quebra, ou se será melhor manter as regras existentes. O Comité reconhece que a proposta da Comissão pretende manter muitas regras que provaram ser eficazes. Contudo, no caso de algumas das alterações propostas, não é líquido que estas representem uma melhoria das regras existentes. Nestes casos, o Comité recomenda que se dê preferência à continuidade.

4.4

Contribuição financeira da Comunidade — declaração de custos e reclamação. Sob reserva de esclarecimento satisfatório das questões ainda em aberto (por ex. ponto 4.5), o Comité considera que as propostas da Comissão representam uma melhoria substancial, pelo que lhes dá o seu apoio.

4.4.1

PME. O Comité congratula-se especialmente como o aumento (n.o 1, segundo parágrafo, do artigo 33.o) dos limites máximos de financiamento, por exemplo, para as PME  (12), de 50 % para 75 %. Considera este, em parte, um reflexo das suas anteriores recomendações no sentido de se oferecer mais e melhores incentivos para uma maior participação das PME no sétimo programa-quadro de IDT e de se promover a constituição de redes mais estreitas de PME e centros de investigação (13).

4.4.2

Estabelecimentos de ensino superior, etc. O Comité congratula-se, também aqui, com o aumento do limite máximo da contribuição para 75 % no caso de organismos públicos, de estabelecimentos de ensino secundário e superior e de organizações de investigação (também n.o 1, segundo parágrafo, do artigo 33.o). A este respeito, recomenda que o artigo 33.o seja redigido com maior precisão, a fim de estabelecer uma distinção mais clara entre parceiros com e sem fins lucrativos.

4.4.3

Taxas médias para custos de pessoal. O Comité considera que o estabelecimento de taxas médias por parte do participante para custos de pessoal pode contribuir para a simplificação (n.o 3, alínea a), do artigo 31.o).

4.4.4

Custos de gestão. No interesse da manutenção da necessária continuidade, o Comité congratula-se igualmente com o facto de se manter o reembolso de 100 % dos custos de gestão. No entanto a proposta da Comissão de eliminar incondicionalmente o anterior limite máximo de 7 % para este tipo de despesa poderá causar problemas, a menos que, por qualquer outro meio, se apliquem normas mais restritivas aos custos de gestão necessários. Admite-se que o anterior limite máximo de 7 % tenha sido considerado excessivamente baixo, uma vez que a administração, coordenação, etc. exigem um grande volume de despesa, e que esse limite deva, portanto, ser aumentado. No entanto, não se pode permitir que o reembolso ilimitado de todos os custos administrativos resulte numa inflação indesejada, e não numa redução dos custos de gestão.

4.5

Custos adicionais para universidades. Segundo a proposta da Comissão, as universidades e instituições de investigação similares deixarão de poder receber o reembolso a 100 % dos seus chamados custos adicionais (14). Embora sejam propostos outros modelos contabilísticos, o Comité crê que a proposta pode causar problemas, uma vez que estas instituições normalmente não dispõem de sistemas de contabilidade analítica adequados para calcular os custos totais (15). Além disso, ainda é cedo para dizer se a possível alternativa de uma taxa fixa proposta pela Comissão irá agravar significativamente esses problemas, uma vez que as regras de execução internas da Comissão ainda não foram adoptadas (ver supra). Por conseguinte, se estas instituições não podem calcular os custos totais, o Comité recomenda a manutenção da regra actual de 100 % de reembolso dos custos adicionais, pelo menos até haver a certeza de que outros modelos contabilísticos (16) não conduzirão a um prejuízo para estas instituições comparativamente às condições existentes.

4.6

Estatuto jurídico das organizações de investigação. O Comité considera que as organizações de investigação financiadas principalmente pelo Estado devem ter tratamento igual em todos os aspectos (e em todos os artigos do regulamento, nomeadamente, no n.o 1 do artigo 33.o e no n.o 2 do artigo 38.o), independentemente do seu estatuto jurídico. Isto significa, por exemplo, que as organizações de investigação sem fins lucrativos ou os centros de investigação de direito privado que recebam do Estado o seu financiamento principal (17) devem ser colocadas em pé de igualdade com as organizações de direito público. Em última instância, a escolha do estatuto jurídico mais apropriado para estas instituições de investigação é da competência legislativa dos Estados-Membros e certamente que não deverá resultar em qualquer diferenciação de financiamento da investigação pela Comunidade.

4.7

Propriedade intelectual. As regras propostas nos artigos 39.o a 43.o visam garantir que os direitos de propriedade intelectual decorrentes de resultados financiados pelos contribuintes da União Europeia não possam ser transferidos para empresas de fora da Europa sem qualquer controlo.

4.7.1

Software de código-fonte aberto. De uma maneira geral, a única possibilidade que o software desenvolvido no âmbito de projectos de investigação financiados pela Comunidade tem de se tornar amplamente disponível e utilizado e, desse modo, produzir novas versões ou serviços comerciais, é ser oferecido como software de código-fonte aberto. Para este efeito, o consórcio deverá ter a maior liberdade possível no que se refere a condições de autorização.

4.8

Direitos de acesso. Os direitos de acesso (artigos 48.o-52.o) (18) a conhecimentos preexistentes ou novos detidos pelas partes não se referem a conhecimentos preexistentes ou novos detidos por uma das partes (por exemplo, uma universidade ou um centro de investigação), mas apenas aos conhecimentos preexistentes ou novos resultantes do trabalho ou actividade preparatória das entidades organizativas ou grupos envolvidos no projecto conjunto em questão e que sejam necessários para os outros participantes na acção indirecta completarem o seu trabalho. O Comité congratula-se, portanto, com o artigo 48.o, que permite que esta questão seja clarificada separadamente para cada projecto, através da elaboração de listas positivas e/ou negativas  (19) acordadas por todas as partes contratantes. Além disso, as listas positivas podem ser igualmente utilizadas para prevenir a revelação da existência de conhecimentos preexistentes que devam ser mantidos confidenciais. Contudo, para não retardar desnecessariamente o arranque do projecto, faria sentido estabelecer um prazo de até seis meses a contar do início do projecto para a elaboração dessas listas.

4.9

Acesso gratuito a conhecimentos preexistentes ou novos. O Comité tem reservas em relação a regulamentos que concedam sem excepção acesso incondicional a conhecimentos preexistentes ou novos a título gratuito. De uma maneira geral, recomenda que seja dada aos parceiros do projecto a maior liberdade possível para estabelecerem os acordos mais apropriados. Pode fazer sentido, por exemplo, conceder direitos de acesso gratuito aos executantes de IDT.

4.9.1

Direitos de acesso a conhecimentos existentes para fins de execução de uma acção. Em princípio, é de saudar a proposta de conceder aos executantes de IDT acesso gratuito aos conhecimentos preexistentes sempre que isso seja essencial para a execução de uma acção indirecta. No entanto, em certos casos, um regulamento exclusivo deste tipo pode causar dificuldades aos executantes em questão. O Comité recomenda, portanto, a alteração da última frase do n.o 2 do artigo 50.o  (20).

4.9.2

Conhecimentos existentes e direitos de protecção de utilização de conhecimentos novos e de direitos de protecção. Contudo a proposta de conceder aos executantes de IDT acesso gratuito aos conhecimentos preexistentes sempre que isso seja essencial para a utilização de conhecimentos novos pode causar problemas. Os conhecimentos preexistentes foram adquiridos utilizando os recursos próprios dos executantes de IDT, os recursos de anteriores organismos de financiamento ou os recursos públicos dos respectivos Estados-Membros, e estão sujeitos a obrigações e condições específicas (21). Se a regra proposta pela Comissão for aplicada, existe o risco de executantes de IDT particularmente poderosos e executantes com elevado nível de potencial tecnológico não poderem ou não quererem participar, ficando por isso excluídos da participação. O Comité recomenda, portanto, a eliminação ou a alteração do n.o 5 do artigo 51.o  (22).

4.9.3

Investigação «de fronteira». Embora a maior parte da actividade de investigação e desenvolvimento considerada como investigação «de fronteira» se exerça no domínio da investigação fundamental, a distinção entre investigação fundamental e investigação aplicada é muitas vezes (23) imprecisa, como o Comité já assinalou em diversas ocasiões. Por isso, são de esperar neste caso os mesmos resultados negativos acima referidos. O Comité recomenda, portanto, a eliminação do n.o 1 do artigo 52.o ou a sua alteração em conformidade (24).

4.9.4

Grupos específicos. Na proposta da Comissão não é definido o trabalho dos grupos específicos, o qual não deve, de forma alguma, ser confundido com a definição de investigação de fronteira ou mesmo considerado como a mesma coisa.

4.10

Livre escolha dos instrumentos. O Comité reitera as suas recomendações (25) de que os projectos não devem ser antecipadamente vinculados a instrumentos específicos e que «os beneficiários devem poder adaptar os instrumentos à estrutura e à dimensão que lhes pareçam mais adequadas para cada projecto. Só assim poderá evitar-se que os projectos se tornem dependentes das imposições dos instrumentos, em vez de corresponderem às necessidades técnico-científicas. Os instrumentos devem estar ao serviço das condições de trabalho e aos objectivos da I&D, e não o contrário.» Para este efeito, deve ser mantida a opção pelos projectos específicos orientados de investigação (STREP), porque são um instrumento especialmente adequado para apoiar a participação de PME e pequenos grupos de investigação.

4.11

Abandono do princípio da responsabilidade financeira conjunta. O Comité vê com agrado que o princípio da responsabilidade financeira conjunta seja abandonado; recorda que já se referiu aos problemas que este suscita nas suas recomendações relativas ao sexto programa-quadro (26).

4.11.1

Fundo para prevenção de riscos. O Comité apoia, portanto, a proposta de constituição de um fundo para prevenção de riscos, destinado a cobrir possíveis incumprimentos, sendo retida, para o efeito, uma pequena percentagem da contribuição financeira para acções indirectas (n.o 1 do artigo 38.o). No entanto, seria aconselhável que a Comissão especificasse, aquando da publicação da proposta, as várias percentagens, em função do nível de risco esperado. O Comité também vê com agrado que os possíveis excedentes dos montantes atribuídos à cobertura dos riscos sejam reembolsados ao programa-quadro e constituam receitas afectadas.

4.11.2

Isenções. Contudo, o Comité recomenda que o n.o 2 do artigo 38.o isente desta obrigação todas as instituições de investigação financiadas principalmente pelo Estado, independentemente do seu estatuto jurídico (27).

4.11.3

Abandono de projecto. O Comité considera dever referir também a responsabilidade técnica solidária dos participantes no projecto (ver n.o 4 do artigo 18.o). Na opinião do Comité, mesmo um consórcio deve ter a possibilidade de decidir abandonar um projecto se despesas excessivas ou considerações científicas ou técnicas determinarem que a sua continuação deixa de ser justificada ou razoável. Os números 4 e 5 do artigo 18.o devem ser alterados em conformidade.

4.12

Comités de programa. Segundo a proposta da Comissão, os comités de programa responsáveis pela racionalização dos procedimentos deixarão de ter a função de aprovar o financiamento dos projectos propostos. No entender do Comité, isto só deveria acontecer quando a Comissão seleccionasse projectos com base na avaliação de assessores. Caso contrário, os programas de trabalho e as dotações orçamentais continuariam dependentes da aprovação do comité de programa competente. (Um compromisso possível seria o de apresentar, depois de concluída a avaliação do comité de programa, um «pedido de plano de execução», para este discutir e adoptar formalmente.) De qualquer forma, isto não atrasaria o processo, uma vez que o comité de programa já não teria de tomar decisões sobre projectos específicos.

4.13

Convenção de subvenção. A disposição aplicável (n.o 8 do artigo 19.o) faz referência à Carta Europeia do Investigador e ao Código de Conduta para o Recrutamento de Investigadores. O Comité gostaria de assinalar que a referida Carta constitui apenas uma recomendação, pelo que não é vinculativa. Além disso, o Comité observa que, embora acolhendo favoravelmente muitos elementos da Carta, recomendou a sua revisão, em especial por conter demasiadas regras e alguns critérios que não são claros (28).

4.14

Banco Europeu de Investimento. O Comité congratula-se com a proposta de concessão de uma subvenção ao Banco Europeu de Investimento para cobertura do risco associado aos empréstimos em apoio aos objectivos de investigação estabelecidos no âmbito do sétimo programa-quadro e das regras respectivas. Estes empréstimos devem ser concedidos, em especial, a projectos de demonstração (por exemplo, nos domínios da investigação em matéria de energia ou de segurança).

Bruxelas, 5 de Julho de 2006.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  COM(2005) 119 final.

(2)  COM(2005) 439, 440, 441, 442, 443, 444, 445 final.

(3)  JO C 65 de 17.03.2006 e CESE 583/2006.

(4)  JO C 65 de 17.03.2006.

(5)  A expressão «organizações de investigação» é definida no n.o 3 do artigo 2.o da proposta da Comissão; noutras partes da proposta, as expressões «organizações de investigação» e «centros de investigação» são utilizadas como sinónimos.

(6)  JO C 110 de 30.04.2004,

JO C 157 de 28.06.2005,

JO C 65 de 17.03.2006, CESE 583/2006.

(7)  JO C 157 de 28.06.2005: Evitar o paralelismo e a sobreposição de instâncias.

(8)  Indo além do proposto pela Comissão. seria desejável criar um padrão, um modelo de procedimento de pagamento de todas as medidas comunitárias de apoio — incluindo o programa CIP e os fundos estruturais.

(9)  Ver as últimas duas notas de rodapé.

(10)  Por exemplo, no ponto 9.8.4 do JO C 204 de 18.7.2000.

(11)  Ver nota de rodapé 6.

(12)  E também para organismos públicos, estabelecimentos de ensino secundário e superior e organizações de investigação.

(13)  A este respeito, o Comité remete para a sua recomendação sobre a introdução de um período de graça para patentes; no entanto, não será necessário associar um direito de prioridade na publicação científica. Ver CESE 319/2004, pontos 2.5 e seguintes, JO C 110, 30.4.2004.

(14)  Modelo de custos adicionais: cálculo dos custos adicionais directos elegíveis das partes contratantes, mais uma taxa fixa para custos indirectos, segundo o modelo de custos adicionais. No sexto programa-quadro de IDT (6.o PQ), esta taxa fixa corresponde a 20 % de todos os custos adicionais directos, menos os custos relativos a subcontratação.

(15)  Modelo de custos totais: cálculo dos custos directos e indirectos elegíveis das partes contratantes segundo o modelo de custos totais; modelo de taxa fixa: cálculo dos custos directos elegíveis das partes contratantes, mais uma taxa fixa para custos indirectos, segundo o modelo de taxa fixa dos custos totais. A taxa fixa corresponde a 20 % de todos os custos directos, menos os custos relativos a subcontratação. No 6.o PQ, em todos estes três modelos de custos, os custos totais são calculados simplesmente como a soma dos custos directos e indirectos.

(16)  Em todo o caso, no que diz respeito às actividades de IDT, a possível taxa fixa para cobrir os custos indirectos (custos totais) do artigo 32.o deve ser de pelo menos 20 % dos custos directos elegíveis, excluindo os custos relativos à subcontratação. Esta regra foi aplicada no sexto programa-quadro de IDT aos sistemas de cálculo da taxa fixa dos custos totais e dos custos adicionais e deve ser mantida por razões de continuidade e, sobretudo, para não afectar os diferentes sistemas contabilísticos das organizações participantes.

(17)  É o caso, por exemplo, na Alemanha, de organizações de investigação como a Helmholtz-Gemeinschaft, a Fraunhofer-Gesellschaft, a Leibniz-Gemeinschaft ou a Max-Planck-Gesellschaft e, nos Países Baixos, da Nederlandse Organisatie voor Wetenschappelijk Onderzoek (NWO).

(18)  O Comité assinala que, quando comparada com a versão inglesa, a versão alemã da proposta da Comissão apresenta lapsos de tradução no n.o 1 do artigo 50.o e no n.o 1 do artigo 51.o. O parecer do Comité refere-se à versão correcta em inglês.

(19)  Lista positiva: lista de conhecimentos ou áreas de conhecimento que podem ser tornados acessíveis. Lista negativa: lista de conhecimentos ou áreas de conhecimento que NÃO podem ser tornados acessíveis.

(20)  Uma sugestão possível para a última frase do n.o 2 do artigo 50.o seria: «No entanto, os executantes de IDT concederão direitos de acesso a conhecimentos preexistentes a título gratuito, salvo em caso de excepções justificadas, acordadas por todos os participantes antes da sua adesão à convenção de subvenção».

(21)  Na Alemanha, por exemplo, à lei relativa aos inventos dos trabalhadores.

(22)  Uma sugestão possível seria: «Os executantes de IDT concederão, a título gratuito, direitos de acesso aos conhecimentos preexistentes necessários para a utilização dos novos conhecimentos gerados na acção indirecta, salvo acordo em contrário de todos os participantes antes da sua adesão à convenção de subvenção».

(23)  Por exemplo, na microbiologia, na tecnologia laser e nas TIC.

(24)  O n.o 1 do artigo 52.o poderia ter a seguinte redacção: «No caso de acções de investigação de fronteira, os direitos de acesso a conhecimentos novos para fins de execução do projecto serão concedidos a título gratuito. Os direitos de acesso a conhecimentos novos para fins de utilização serão concedidos em condições equitativas e razoáveis ou a título gratuito, conforme acordado por todos os participantes antes da sua adesão à convenção de subvenção.»

(25)  Ponto 3.4, JO C 157 de 28.6.2005.

(26)  JO C 94, 18.4.2002.

(27)  Ver supra, tratamento igual para todas as instituições de investigação financiadas principalmente pelo Estado.

(28)  JO C 65 de 17.03.2006.


16.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 309/41


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de Regulamento do Conselho (Euratom) que estabelece as regras de participação de empresas, centros de investigação e universidades em acções no âmbito do sétimo programa-quadro da Comunidade Europeia da Energia Atómica e as regras de difusão dos resultados da investigação (2007-2011)»

COM(2006) 42 final — 2006/0014 (CNS)

(2006/C 309/09)

Em 8 de Março de 2006, o Conselho decidiu, ao abrigo dos artigos 7.o e 10.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia da Energia Atómica, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

A Secção Especializada de Mercado Único, Produção e Consumo, incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, emitiu parecer em 31 de Maio de 2006, com base no projecto do relator A. PEZZINI.

Na 428.a reunião plenária de 5 e 6 de Julho de 2006 (sessão de 5 de Julho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 156 votos a favor, 3 votos contra e 4 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Conclusões e recomendações

1.1

O CESE é favorável às propostas da Comissão sobre as novas regras de participação das empresas, centros de investigação e universidades em acções no âmbito do 7.o PQ de investigação, desenvolvimento e formação no sector nuclear e na difusão dos seus resultados, para o período 2007-2011.

1.2

As propostas destinam-se a simplificar e a racionalizar os procedimentos e os métodos para a realização concreta da Estratégia de Lisboa, tal como foi redefinida pelos Conselhos Europeus de 2005 e de Março de 2006, e a responder às necessidades dos diversos agentes da investigação e dos utilizadores finais. Todavia, a avaliação final do êxito destas medidas só poderá ser feita depois de as regras de aplicação estarem concluídas.

1.3

Até ao Capítulo III inclusive, as propostas da Comissão são quase idênticas às apresentadas pelo 7.o PQ para a investigação, o desenvolvimento e a formação no sector não nuclear (1), mudando apenas a numeração (2). Assim, o Comité remete para o parecer adoptado a este respeito, relembrando e insistindo nas observações nele contidas (3), igualmente válidas para a proposta em análise até ao Capítulo III inclusive.

1.4

Em particular, o Comité considera que o programa europeu de fusão nuclear deve ser considerado um modelo de verdadeira integração dos esforços comunitários e de plena coordenação das acções no quadro do Acordo Europeu para o Desenvolvimento da Fusão (EFDA) e nos contratos de associação.

1.4.1

Este programa desempenha um papel fundamental para a UE no âmbito da investigação da energia de fusão, concretiza-se num apoio comunitário constante sob a forma de recursos financeiros e de capital humano e é enriquecido com uma elevada sustentabilidade ambiental graças às actividades do projecto ITER/DEMO (4).

1.5

O Comité está convencido de que a energia nuclear (5), que corresponde a aproximadamente um terço da energia eléctrica produzida hoje na União (6), contribui para a independência e a segurança dos abastecimentos de energia (7) e para um desenvolvimento económico europeu sustentável, no respeito pelos Acordos de Quioto; todavia, isto é na condição de que sejam aplicados padrões sempre melhores, mais eficientes e seguros de tratamento dos resíduos, e de que se possa desenvolver uma investigação e uma indústria europeia competitiva no âmbito da tecnologia nuclear e dos serviços.

1.6

O Comité considera apropriados os níveis de financiamento comunitário indicados para as actividades de investigação, formação e demonstração, coordenação e apoio, bem como para as redes de excelência e para o regime financeiro previsto para a investigação sobre a energia de fusão.

1.6.1

O CESE sublinha a necessidade de promover a investigação e a aplicação de tecnologias limpas e seguras, segundo as exigências e as características de cada Estado-Membro, e recomenda o respeito pelas decisões de vários Estados-Membros que não consideram a energia nuclear como uma solução para as suas futuras necessidades energéticas e que têm este aspecto em conta nos seus programas de investigação.

1.7

O CESE destaca o papel das acções de formação e das oportunidades previstas para o desenvolvimento da carreira dos investigadores, e sublinha que estas acções se revestem de especial importância para o sector privado, a sociedade civil e os cidadãos.

1.8

O CESE considera fundamental garantir, para a participação no 7.o PQ EURATOM e nos seus programas específicos, um quadro de regras que seja simples, legível, compreensível, claro e transparente e, sobretudo, que seja capaz de dar certezas aos potenciais participantes, especialmente aos de menores dimensões, sobre os princípios e os critérios que regulam o acesso, a avaliação, a selecção, a formulação dos contratos e a gestão dos projectos.

1.8.1

O CESE lastima que isto nem sempre seja evidente na proposta de regulamento e considera, todavia, que a eficácia de tais regras deve ser avaliada por peritos independentes após um período razoável e que o relatório de avaliação deve ser transmitido ao Conselho e ao Comité.

1.9

O Comité entende que é indispensável a avaliação e a difusão dos resultados da investigação, para respeitar o princípio da melhor relação custo/benefício que é aplicável aos contribuintes europeus. A este propósito, o Comité recorda que deve ser sempre encontrado um justo equilíbrio entre, por um lado, a protecção dos interesses comunitários, das sensibilidades, inclusivamente de defesa, dos Estados-Membros e dos direitos de propriedade intelectual e industrial e, por outro lado, os riscos igualmente importantes em que se poderá incorrer no caso de uma insuficiente difusão da informação científica e técnica neste sector.

1.9.1

Por último, o Comité considera indispensável reforçar o serviço de apoio ao utilizador IPR (IPR-HELPDESK) para uma assistência pontual e proactiva, orientada para os potenciais participantes nos contratos de subvenção e para as acções indirectas de apoio à formação e desenvolvimento dos investigadores, assim como para a fase de preparação e celebração de acordos de consórcio.

2.   Justificação

2.1

O CESE congratula-se com o facto de o pedido de consulta lhe ter sido apresentado dentro dos prazos e está perfeitamente ciente das suas competências exclusivas, em matéria consultiva, relativamente ao Tratado EURATOM. O CESE atribui grande importância a estas competências devido ao carácter extremamente sensível de que a energia nuclear se reveste para a sociedade, bem como da necessidade de uma informação e de uma consulta adequadas.

2.2

De facto, a energia atómica suscita uma problemática extremamente difícil em termos de envolvimento dos cidadãos, devido aos riscos significativos e aos problemas de tratamento dos resíduos que comporta.

2.2.1

O CESE pretende que seja evidenciado o cuidado de reforçar os modelos de avaliação das prestações e da segurança/fiabilidade neste sector, instituindo mecanismos permanentes de informação, consulta e formação.

2.2.2

Trata-se de organizar melhor o processo de governação, para definir as opções estratégicas mais oportunas e responder às preocupações dos cidadãos sobre a energia atómica e as suas consequências a longo prazo.

2.3

O Comité já teve o ensejo de se manifestar (8) sobre as soluções apresentadas pela Comissão em matéria de simplificação (9) dos procedimentos administrativos e de redução dos encargos correspondentes no âmbito das propostas de decisão relativas respectivamente ao 7.o PQ CE e ao 7.o PQ EURATOM, adoptados em 6 de Abril de 2005.

2.3.1

A Comissão referiu como «factores críticos de sucesso» dez medidas fundamentais que devem ser aplicadas para simplificar os procedimentos de acesso, de participação e de gestão do 7.o PQ. Quanto a este tema, o CESE sublinhou que os procedimentos actuais de pedidos e de autorizações são demasiado complexos e onerosos, sendo fontes de dificuldades para os utilizadores do mundo da ciência e da indústria. A participação no programa europeu de investigação deve ser conveniente para os agentes interessados (10) e compensar os riscos que comporta a apresentação de um dossier de candidatura.

2.3.2

Além disso, o CESE insistiu na importância de associar mais as PME ao processo de investigação, desenvolvimento e inovação, e sublinhou que as perspectivas de êxito das PME, criadas precisamente para desenvolver e comercializar novos produtos de alta tecnologia, assentam em particular na colocação à disposição de um capital de realização e de um capital de risco suficientes. Para tal, todavia, é preciso que, também neste contexto, os procedimentos não ultrapassem um certo limite aceitável e adaptado às PME (11).

2.3.3

Os pontos assinalados pelos serviços da Comissão em matéria de simplificação dos procedimentos regulamentares dizem respeito ao seguinte:

um leque reduzido de estruturas de financiamento que garanta a continuidade com os instrumentos do 6.o PQ e uma grande flexibilidade de utilização,

uma comunicação de elevada qualidade, completa e atempada, e de interpretação unívoca e uniforme dos objectivos e modalidades de aplicação, quer para o 7.o PQ CE como para o 7.o PQ EURATOM,

a racionalização das indicações exigidas aos participantes, com a extensão das modalidades de apresentação em duas fases, além da utilização sistemática dos instrumentos de comunicação informática,

a protecção dos interesses financeiros da UE, sem a imposição de ónus excessivos aos participantes, reduzindo ao mínimo o controlo a priori e baseando-se numa lista única de critérios pré-definidos,

a autonomia operacional para os consórcios, graças a contratos que permitam uma grande flexibilidade e uma utilização generalizada do financiamento a taxas fixas, com base nos custos reais e em auditorias externas independentes,

processos de selecção mais rápidos que substituam o procedimento de comitologia por outro procedimento mais simples baseado no procedimento de informação,

uma utilização mais eficiente dos recursos orçamentais dedicados à I&D, com uma coordenação mais estreita com as outras políticas previstas na Estratégia de Lisboa; e com a redução dos custos de administração/gestão comunitária de projectos, previstos para as actividades de I&D,

uma utilização generalizada de financiamento a custo fixo dentro de um quadro simplificado de fórmulas de financiamento comunitário,

a eliminação do actual modelo de relatório sobre os custos dos projectos, modelo este que provou ser excessivamente complexo, acompanhado de uma definição clara dos custos elegíveis,

o estabelecimento das taxas de intervenção comunitárias por tipo de actividade (investigação, desenvolvimento, demonstração, formação, divulgação e utilização dos resultados, transferência dos conhecimentos...) que correspondam a cada actividade, com limites máximos por tipo de actividade que se refiram ao consórcio a não a cada participante.

2.4

Além disso, o regulamento em apreço apresenta várias alterações em relação ao regulamento precedente (12) no que diz respeito, em particular, ao seguinte: objectivo da proposta; definições; confidencialidade; avaliação, selecção e atribuição das propostas; tipos de subvenções; reembolso dos custos elegíveis; limites dos contributos financeiros comunitários; riscos dos consórcios; difusão, utilização e direitos de acesso; para o Acordo Europeu sobre o Desenvolvimento da Fusão; Acordo sobre a Mobilidade do Pessoal.

2.4.1

Em relação às secções comuns a esta proposta e à proposta relativa ao 7.o PQ CE (Proposta de Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que estabelece as regras de participação das empresas, centros de investigação e universidades nas acções no âmbito do sétimo programa-quadro e a difusão dos resultados da investigação (2007-2013) (13), o Comité remete para o seu parecer em fase de elaboração (14) sobre esta última proposta.

2.5

O Comité concorda com os limites estabelecidos para o financiamento da investigação nuclear e para a formação; no caso de PME, de organismos públicos, de institutos de formação, de universidades e de organismos de investigação (15), congratula-se em particular com a possibilidade de passar de um limite de contributo máximo de 50 % para 75 %, bem como com o facto de as acções de coordenação, apoio, formação e desenvolvimento da carreira dos investigadores poderem atingir 100 % dos custos totais elegíveis.

2.5.1

Além disso, o Comité recomenda que se resumam num anexo à proposta os vários tipos de actividades e a respectiva taxa de intervenção máxima prevista, bem como as eventuais possibilidades de cumulação, especialmente para as estruturas de investigação, com outros tipos de intervenções comunitárias (Fundos Estruturais, etc.).

3.   Observações na generalidade sobre as regras de participação no 7.oPQ EURATOM

3.1

Para as regras de participação no 7.o PQ EURATOM e seus programas específicos, o CESE considera que é fundamental garantir um quadro simples, legível, compreensível, claro e transparente e em todas as línguas comunitárias. Este quadro deve garantir em particular aos potenciais participantes, especialmente aos organismos de menores dimensões, certezas sobre os princípios e os critérios que regulam a disponibilidade, as condições de participação, a apresentação e a avaliação das propostas de projectos, a classificação e as obrigações contratuais, as taxas e os sistemas de repartição do co-financiamento comunitário, a protecção da propriedade industrial e intelectual e a utilização e difusão dos conhecimentos, sem prejuízo das disposições específicas sobre a prioridade temática relativa à energia de fusão.

3.1.1

Em particular, o Comité recomenda que sejam novamente inseridos, de forma explícita, os critérios de selecção e de adjudicação para as acções indirectas referidas no artigo 14.o, salvo eventuais critérios específicos particulares. Estes critérios gerais são:

a excelência científica e tecnológica e o grau de inovação,

a capacidade de realização da acção indirecta e de gestão eficaz dos recursos e competências,

a pertinência em relação aos objectivos do programa específico e do programa de trabalho;

o valor acrescentado europeu, massa crítica de recursos aplicados e contributo para as políticas comunitárias,

a qualidade do plano de avaliação e difusão dos conhecimentos, o potencial de divulgação da inovação e a clareza do projecto de gestão da propriedade intelectual,

o respeito pelos princípios éticos e pela igualdade entre homens e mulheres.

3.2

O Comité já tomou posição sobre os temas gerais relativos à simplificação e à racionalização dos programas-quadro de investigação nuclear comunitária, nos seus pareceres sobre o 7.o PQ EURATOM e sobre os dois programas específicos relativos, respectivamente, à energia nuclear, com particular referência à investigação sobre a energia de fusão, e às actividades de investigação nuclear do Centro Comum de Investigação. Está neste momento a ser elaborado pelo Comité um parecer (16) sobre uma proposta de regras de participação relativas ao 7.o PQ de investigação comunitária não nuclear.

3.3

No que diz respeito às regras sobre o programa EURATOM, o Comité faz questão de insistir, em particular, na necessidade de uma simplificação mais radical das formalidades de apresentação dos dossiers.

3.3.1

Por outro lado, o Comité congratula-se por ter sido eliminada da proposta em apreço a responsabilidade solidária a seu tempo prevista no 6.o PQ EURATOM e que podia constituir um obstáculo significativo à participação de pequenos e médios organismos (empresas, universidades, etc.), tendo sido substituída por um montante a definir, que deverá rondar 1 % do contributo comunitário (17), para prevenir os riscos de falta de cobertura dos consórcios (art. 37.o). De facto, uma parte importante das actividades de investigação do sector EURATOM também pode ser confiada a pequenos e médios organismos, para os quais estas regras podiam ter constituído um grande obstáculo à participação.

3.4

O CESE manifesta reservas sobre as muitas derrogações possíveis às regras de participação estabelecidas nos mais de 50 artigos propostos, bem como sobre as consideráveis possibilidades de diferentes critérios e regulamentações que seriam estabelecidas nos programas de trabalho anuais, nos programas específicos e nos convites à apresentação de propostas. Estas derrogações aplicam-se em particular ao seguinte: número de participantes e condições adicionais de acesso (art. 11.o); critérios de avaliação, selecção e aprovação (art. 14.o n.o 1); derrogações à publicação de convites à apresentação de propostas (art. 13.o); critérios de avaliação com possibilidades de estabelecer critérios específicos adicionais (art. 14.o, n.o 2); contributo financeiro comunitário para as redes de excelência (art. 34.o, n.o 1 e 3).

3.4.1

No que toca às redes de excelência, em particular, o Comité sublinha a sua preocupação com a determinação da contribuição fixa, uma vez que pode revelar-se fictícia e desfasada da realidade. Esta situação poderia prejudicar o desenvolvimento das redes de excelência, necessário para alcançar os objectivos concretos do programa.

3.5

O Comité sublinha que a necessária flexibilidade de gestão e definição das necessidades de cada projecto não deveria ser em detrimento da clareza, certeza e transparência das condições de participação exigidas, dos critérios de avaliação e selecção pré-definidos e de um quadro seguro para os financiamentos e co-financiamentos propostos.

3.6

O Comité considera que, quando o acordo de subvenção dá a possibilidade ao consórcio de investigação de utilizar os concursos públicos para efectuar algumas obras ou alargar algumas actividades, estes concursos devem ser organizados de acordo com as regras estabelecidas pela Comissão, para garantir o máximo de transparência e acesso à informação.

3.7

O CESE sublinha a importância das disposições de controlo e acompanhamento dos programas e das acções indirectas de investigação, demonstração, coordenação e formação no sector nuclear; por outro lado, o Comité sugere o estabelecimento, para estas funções e para as funções de gestão dos convites à manifestação de interesse, avaliação, selecção, seguimento contratual e auditoria dos projectos elegíveis para financiamento um limite máximo de despesas que não deverá exceder, em custos globais, um montante compreendido entre 7 % e 10 % dos recursos comunitários globais do 7.o PQ EURATOM. Isto com o objectivo de reservar o máximo dos recursos para as actividades primárias propriamente ditas de investigação, demonstração e formação, bem como para a obtenção de resultados práticos que possam ser transferidos para aplicações de mercado, o que constitui o objectivo final de um programa-quadro comunitário de investigação.

3.7.1

A este respeito, o Comité recomenda que a recolha, arquivo e gestão dos dados desta monitorização sejam inseridos num banco de dados integrado, no âmbito da prestação interoperável de serviços pan-europeus de administração em linha a administrações públicas, empresas e cidadãos (IDABC) (18).

3.8

O Comité acolhe favoravelmente as indicações da Comissão quanto aos tipos de subvenções propostos para o reembolso dos custos elegíveis: montante fixo e financiamento a taxa fixa; sugere todavia que seja esclarecida a metodologia mais adaptada, inclusivamente em relação com a simplificação dos custos elegíveis, e que seja anexado à proposta de regulamento um prospecto sobre as várias opções, de modo a facilitar a compreensão por parte dos utilizadores potenciais.

3.9

Em relação aos vários tipos de contributos financeiros comunitários, em conformidade com os artigos 32.o e 34.o, o Comité recomenda que estes sejam resumidos numa tabela anexa à proposta, juntamente com a respectiva taxa de intervenção máxima prevista e com as eventuais possibilidades de cumulação, especialmente para as infra-estruturas de investigação, com as intervenções a título dos Fundos Estruturais do Banco Europeu de Investimento e do Fundo Europeu de Investimentos, sem esquecer o que está previsto na iniciativa Jeremie (19), que deveria facilitar a participação das entidades de menores dimensões no 7.o PQ EURATOM.

3.10

Quanto às regras propostas sobre difusão, avaliação e direitos de acesso aos conhecimentos, não obstante a distinção entre conhecimentos prévios e adquiridos e as derrogações no sector militar e de segurança, o Comité considera que é indispensável reforçar o serviço de apoio ao utilizador IPR (IPR HELPDESK) para garantir uma assistência pontual e proactiva aos potenciais participantes em contratos de subvenção (cfr. art. 18.o, n.o 5 e 6, bem como o art. 19.o e 21.o) e para as acções indirectas de apoio à formação e ao desenvolvimento dos investigadores, bem como para a preparação e celebração de acordos de consórcio que estabelecem regras suplementares (art. 23.o) relativas à difusão e avaliação dos resultados e aos direitos de propriedade intelectual.

3.11

Por último, em relação à área temática da «investigação da energia de fusão», em dois pareceres mencionados anteriormente, o Comité deu grande relevo à importância da investigação da fusão termonuclear controlada no contexto do projecto ITER, do programa preparatório DEMO e dos estudos sobre confinamento (20).

3.11.1

O Comité regista que a taxa anual de base do contributo financeiro da Comunidade, que foi proposto para a referida área temática, não deve superar 20 % ao longo de todo o período em que se mantém em vigor o 7.o PQ EURATOM. O Comité considera esta taxa de base como a alavanca necessária para um contributo essencial, por parte dos Estados-Membros, para um programa comunitário bem coordenado (ver ponto 1.4) capaz de constituir a base, o ponto de apoio e o contributo indispensáveis para a empresa comum ITER e DEMO. Embora esta taxa possa ser adequada no início, é duvidoso que seja suficiente ao longo de toda a duração do programa enquanto incentivo para um contributo financeiro necessário e satisfatório dos Estados-Membros. Por conseguinte, o Comité recomenda que, como medida cautelar, esta taxa seja aumentada para 25 %, que ainda assim seria apenas metade ou um terço (no que se refere ao artigo 32.o, n.o 1) do contributo financeiro que, de outra forma, seria concedido pela Comunidade. O Comité considera ainda que, por regra, deveriam ser aplicados os limites máximos.

3.11.2

No que toca ao contributo máximo de financiamento comunitário de 40 % proposto para os projectos específicos de cooperação no âmbito dos contratos de associação (com apoio prioritário para as iniciativas ITER/DEMO e para outras no contexto do Acordo sobre a Mobilidade de Pessoal), o Comité duvida que, a longo prazo, esta taxa seja suficiente para beneficiar do necessário co-financiamento por parte dos Estados-Membros para todos os projectos ou acções pretendidos. Neste contexto, o Comité remete para o n.o 2 do artigo 52.o.

4.   Observações na especialidade

4.1

O Comité põe em causa a supressão da Subsecção 1 «Convites à apresentação de propostas» da disposição sobre a possibilidade de preceder estes convites por convites à manifestação de interesse, para que seja possível identificar e avaliar com precisão os objectivos e as necessidades da acção e evitar despesas administrativas inúteis, tanto a nível de preparação de propostas que não poderão ser adoptadas, como a nível da selecção e avaliação das mesmas pela Comissão e por avaliadores independentes.

4.2

Os convites à manifestação de interesse poderiam ser acompanhados pela organização de «Dias de Informação dos Proponentes», destinados a aproximar e a fazer participar os potenciais utilizadores científicos e industriais na definição da acção de política comunitária de investigação nuclear.

4.3

O CESE sublinha os riscos potenciais no caso de uma difusão insuficiente da informação científica e técnica neste sector. Embora reconheça que é necessário formular algumas reservas sobre esta matéria, considera que esta questão deve permanecer aberta. Isto poderia concretizar-se através da definição de um protocolo técnico muito preciso dos conteúdos e das modalidades de difusão, que tenha em conta as exigências de segurança e de fiabilidade, salvaguardando ao mesmo tempo a máxima transparência.

4.4

Segundo o CESE, seria importante uma informação e difusão mais amplas das regras que orientam, por um lado, a verificação da existência de condições essenciais e, por outro lado, o estatuto jurídico dos participantes. De igual modo, devem ser disponibilizadas algumas regras claras e compreensíveis a todos os agentes da investigação, sobre os procedimentos simplificados previstos para a apresentação, em duas fases, das propostas, os critérios e dos requisitos dos dois níveis de avaliação.

4.4.1

Tais regras deveriam ser postas à disposição, não só dos peritos de avaliação, mas também dos proponentes, segundo critérios e análises unívocos e uniformes.

4.5

Além disso, o CESE pretende sublinhar a pertinência de organizar acções de formação e informação sobre a segurança/fiabilidade da energia nuclear não só para os investigadores, mas também para os representantes da sociedade civil e para todos os cidadãos, bem como de reforçar os instrumentos e os procedimentos de desenvolvimento de modelos fiáveis e incontestáveis, para avaliar a fiabilidade e a segurança da energia atómica.

4.6

Relativamente à avaliação dos resultados da investigação, à sua difusão e à protecção da propriedade intelectual e industrial, há um certo número de regras e de salvaguardas previstas na proposta de regulamento, nos contratos de subvenção, nos acordos de consórcio, no artigo 24. o e nas outras disposições do Tratado EURATOM  (21) , nos contratos de associação, no Acordo Europeu de Desenvolvimento da Fusão, na empresa comum ITER e nos respectivos acordos internacionais, bem como em acordos multilaterais como o Acordo sobre a Mobilidade do Pessoal. No entanto, o Comité preconiza ainda a mais ampla difusão possível de um«Guia do IPR-EURATOM destinado ao proponente» revisto que defina, de modo claro e transparente, as obrigações e as oportunidades para os potenciais participantes nas actividades de investigação, demonstração, formação e desenvolvimento do 7.o PQ EURATOM.

Bruxelas, 5 de Julho de 2006.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  COM(2005) 705 final.

(2)  Há algumas excepções: por exemplo, as disposições sobre a investigação de fronteira.

(3)  Por exemplo, as observações sobre a forma jurídica dos organismos de investigação, os direitos de acesso aos conhecimentos, os direitos de propriedade intelectual, o reembolso dos custos, as formas de financiamento e a simplificação, as concessões de subvenção, os princípios gerais da Carta Europeia dos Investigadores e sobre o estatuto jurídico dos institutos de investigação.

(4)  Ver igualmente o ponto 3.11.

(5)  JO C 110 de 30.04.2004 — Relator: Cambus.

(6)  Energia produzida na UE-25 em 2004: Nuclear 31,2 %; Gás Natural 24,3 %; Petróleo 17,1 %; Hulha 13,1 %; Linhite 10,2 %. Energia primária 4,1 %. Consumo de energia no mesmo período: Petróleo 39,2 %; Gás Natural 25,4 %; Nuclear 14,8 %; Hulha 13,7 %; Linhite 4,9 %. Energia primária 2,0 % (Eurostat, Energia, 5/2006).

(7)  Em 2004, as importações brutas — Taxa de dependência energética — na UE-25 corresponderam a 53,8 %, incluindo 33,2 % para o petróleo e os produtos petrolíferos. Dependência energética dos quatro maiores Estados-Membros da UE: Alemanha 64,6 %; França 54,3 %; Reino Unido 5,2 %. O único Estado-Membro da UE que não tem dependência energética é a Dinamarca, com um activo de 53,5 % (Eurostat, Energia, 5/2006).

(8)  Cfr. JO C 65 de 17.03.06 — Relator: Wolf.

(9)  COM(2005) 119 final — SEC(2005) 430/431 de 6 de Abril de 2005.

(10)  Ver JO C 65 de 17.03.06, ponto 1.11 — Relator: Wolf.

(11)  Ver. JO C 65 de 17.03.06, ponto 1.12 e 4.15.2 — Relator: Wolf.

(12)  Regulamento Euratom 2322/2002 do Conselho.

(13)  COM(2005) 705 final, de 23.12.2005.

(14)  Ver CESE 577/2006 (INT/309) — Relator: Wolf.

(15)  Ver CESE 577/2006, ponto 4.6 (INT/309) — relator: Wolf.

(16)  Idem nota 9.

(17)  Ver CESE 557/2006, ponto 4.4.4 (INT/309) — Relator: Wolf.

(18)  Ver JO C 80 de 30.03.04 sobre IDABC (Interoperable Delivery of European eGovernment Services to Public Administrations, Businesses and Citizens).

(19)  Ver JO C 110 de 09.05.2006 — Relator: Pezzini.

(20)  Ver JO C 65 de 17.03.2006 — Relator Wolf, ponto 6.1 e seguintes.

(21)  Cfr. nota 10.


16.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 309/46


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de regulamento do Conselho que revoga o Regulamento (CEE) n.o 4056/86, que determina as regras de aplicação aos transportes marítimos dos artigos 85.o e 86.o do Tratado, e que altera o Regulamento (CE) n.o 1/2003 por forma a tornar o seu âmbito de aplicação extensível aos serviços internacionais de cabotagem e de tramp»

COM(2005) 651 final/2 — 2005/0264 (CNS)

(2006/C 309/10)

Em 10 de Fevereiro de 2006, o Conselho da União Europeia decidiu, nos termos do artigo 83.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Transportes, Energia, Infra-estruturas e Sociedade da Informação que emitiu parecer em 30 de Maio de 2006, sendo relatora Anna Bredima-Savopoulou.

Na 428.a reunião plenária de 5 e 6 de Julho de 2006 (sessão de 5 de Julho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 156 votos a favor, 1 voto contra e 7 abstenções, o seguinte parecer.

1.   Conclusões e recomendações

1.1

O CESE subscreve a abordagem proposta para tornar o âmbito de aplicação do Regulamento (CE) n.o 1/2003 (1) (aplicação das regras em matéria de concorrência) extensível aos serviços de cabotagem e de tramp. Regista com agrado as conversações em curso entre a Comissão e a indústria de transportes marítimos sobre a aplicação dos artigos 81.o e 82.o aos serviços de tramp. Não havendo reclamações nem jurisprudência no sector de tramp, será necessária mais informação sobre o seu funcionamento e os seus acordos. O CESE congratula-se, portanto, com a iniciativa da Comissão de promover um estudo sobre as características económicas e jurídicas do sector de tramp. Por razões de segurança jurídica, o CESE insta a Comissão a fornecer orientações (antes de suprimir a exclusão do âmbito de aplicação do Regulamento 1/2003) relativamente à auto-avaliação da compatibilidade com o direito da concorrência da UE das várias forma de acordos de cooperação no sector de tramp.

1.2

No que se refere ao sector dos transportes marítimos regulares, o CESE toma nota da proposta da Comissão de revogar a isenção por categoria a favor das conferências marítimas previstas nas regras de concorrência do Tratado CE, com base em que as quatro condições cumulativas do n.o 3 do artigo 81.o do Tratado CE já não estão preenchidas. A Comissão entende que esta revogação resultará em custos de transporte mais baixos, preservando a fiabilidade dos serviços em todas as rotas, e no aumento da competitividade da indústria europeia. O CESE reserva a sua posição para a expressar no momento em que seja conhecido o efeito sustentável da revogação proposta.

1.3

O CESE recomenda à Comissão que atenda ao aspecto de segurança (perda de qualidade do transporte marítimo nas águas europeias) — para além dos factores de competitividade — quando revogar a isenção por categoria a favor das conferências marítimas.

1.4

O CESE recomenda que a Comissão tenha igualmente em consideração o aspecto dos recursos humanos (impacto no emprego dos marítimos europeus), para além dos factores meramente competitivos, quando revogar a isenção por categoria a favor das conferências marítimas.

1.5

O CESE regista a intenção da Comissão de publicar orientações apropriadas sobre a concorrência no sector dos transportes marítimos a fim de facilitar a transição para um regime totalmente concorrencial. A Comissão tenciona adoptar as orientações até ao final de 2007. Antes desta adopção, a Comissão publicará, em Setembro de 2006 — como medida transitória no âmbito da elaboração das orientações –, um documento de reflexão sobre os transportes marítimos regulares. O CESE insta a Comissão a elaborar as orientações em estreito contacto com as partes interessadas e a informar em conformidade as instituições europeias pertinentes.

1.6

A proposta da Comissão é resultado de um processo de reapreciação, iniciado em 2003, que envolveu todas as instituições da UE pertinentes e as partes interessadas. A Comissão encarregou consultores independentes de realizar três estudos com o objectivo de analisar as questões suscitadas pela revogação da isenção por categoria a favor das conferências, cujas conclusões estão publicadas no sítio Web da DG Concorrência.

1.7

O CESE tomou igualmente nota do facto de a proposta da Comissão de revogar a isenção por categoria a favor das conferências marítimas se basear unicamente no artigo 83.o do Tratado (regras de concorrência), se bem que a base jurídica do Regulamento 4056/86 seja o artigo 83.o (regras de concorrência) em articulação com o n.o 2 do artigo 80.o (política de transportes) do Tratado CE. O CESE gostaria de receber informação do Serviço Jurídico do Parlamento Europeu sobre a questão de saber se as considerações no plano dos transportes se subordinam às considerações no plano da concorrência e se aquele serviço mantém o ponto de vista do seu anterior parecer sobre a dupla base jurídica (2).

1.8

Antecipando possíveis conflitos de leis resultantes de instrumentos jurídicos de outras jurisdições, o CESE insta a Comissão a criar uma disposição nas orientações para a resolução desses problemas. Tal disposição minimizará as fricções e conduzirá a soluções mutuamente aceitáveis ao nível internacional.

1.9

O CESE toma nota de que a Comissão reconhece que o direito da concorrência não é aplicado da mesma maneira em todas as jurisdições e que há divergências. A Comissão também reconhece a crescente importância da cooperação internacional entre autoridades responsáveis pela aplicação do direito da concorrência.

1.10

O CESE congratula-se com o facto de a Comissão prosseguir uma política bifacetada que consiste, por um lado, em reforçar a cooperação bilateral com os principais parceiros comerciais da Comunidade Europeia e, por outro lado, em analisar os meios de desenvolver a cooperação multilateral no domínio da concorrência. O CESE exorta, portanto, a Comissão, a intensificar esforços para assegurar que esta cooperação e este diálogo contribuam para identificar potenciais problemas resultantes da revogação do Regulamento 4056/86 na UE e para resolver esses problemas de forma construtiva, respeitando as especificidades de outros sistemas jurídicos. Na verdade, é vital para o comércio internacional a coerência, entre os diferentes países, do tratamento dado aos serviços de transportes regulares.

1.11

O CESE insta a Comissão a ter em conta, na elaboração das orientações sobre a concorrência no sector marítimo, os resultados do diálogo e da cooperação entre si e os seus principais parceiros comerciais.

1.12

O CESE regista a referência feita, na exposição de motivos da proposta da Comissão, aos elementos a seguir enunciados, e defende que estes devem ser tidos em conta na elaboração das orientações sobre concorrência no sector marítimo:

Reconhece-se que os serviços de transporte marítimo desempenham um papel fundamental no desenvolvimento da economia da UE, sendo 90 % do seu comércio externo e 43 % do seu comércio intracomunitário transportado por via marítima.

A actual tendência para a contentorização alterou profundamente os transportes marítimos regulares desde a adopção do Regulamento 4056/86. Esta resultou num aumento do número e da dimensão dos navios de contentores totalmente celulares e à preponderância das redes de transporte globais, o que contribuiu para a popularidade de novos acordos operacionais e para a diminuição da importância das conferências marítimas.

O sistema de conferências — que funcionou durante 150 anos — ainda é objecto de acordos multilaterais e bilaterais, de que são signatários Estados-Membros da UE e a Comunidade. O CESE toma nota de que a Comissão reconhece que, em consequência destes acordos, a data de revogação do n.o 3, alíneas b) e c), do artigo 1.o, e dos artigos 3.o a 8.o e 26.o do Regulamento 4056/86 deve ser prorrogada por um período de dois anos, a fim de permitir a denúncia ou a revisão destes acordos com países terceiros.

1.13

O CESE considera que a Comissão deve ter igualmente em conta, ao revogar o Regulamento 4056/86, os interesses das pequenas e médias empresas. Estas empresas constituem a coluna dorsal da economia da UE e desempenham um importante papel no contexto da Estratégia de Lisboa revista. Os mercados devem permanecer abertos à concorrência actual e potencial, incluindo por parte de pequenos e médios operadores de transportes marítimos.

1.14

O CESE entende que, embora a consolidação possa ter efeitos positivos para a indústria da UE (ganhos de eficiência, economias de escala, redução de custos), é necessária prudência para evitar que a mesma consolidação — que pode seguir-se à revogação do Regulamento 4056/86 — resulte numa diminuição do número de operadores nos mercados relevantes, ou seja, em menos concorrência.

1.15

No contexto do novo regime, O CESE convida as duas partes interessadas ao nível europeu — transportadores e carregadores — a iniciarem conversações sobre questões de interesse mútuo.

2.   Introdução

2.1   Tendências actuais e legislação em vigor

2.1.1

Os serviços de transporte marítimo são fundamentais para o desenvolvimento da economia da UE, sendo 90 % do seu comércio externo e 43 % do seu comércio intracomunitário transportado por via marítima. O transporte marítimo é uma actividade internacional e globalizada desde a antiguidade. Presta, basicamente, dois tipos de serviços: o transporte regular e o tramp, que funcionam, respectivamente, como os autocarros e os táxis dos mares. A frota de bandeira da UE corresponde a 25 % da frota mundial e os armadores da UE controlam mais de 40 % da frota mundial. Outros 40 % da frota mundial pertencem a países do Pacífico. Os transportes marítimos da UE e os seus clientes (fretadores e carregadores) operam num ambiente altamente competitivo nos mercados europeus e ultramarinos.

2.1.2

O Regulamento 4056/86 estabelece as regras de aplicação, aos serviços regulares de transportes marítimos de e para os portos da Comunidade, das disposições em matéria de concorrência (artigos 81.o e 82.o do Tratado). Todavia, os serviços de tramp estão excluídos do âmbito de aplicação do Regulamento 4056/86. Inicialmente, o regulamento tinha duas funções. Continha disposições processuais para a aplicação das regras de concorrência da CE ao sector dos transportes marítimos. Esta função tornou-se redundante a partir de 1 de Maio de 2004, quando os serviços regulares de transportes passaram a estar sujeitos às regras gerais de aplicação do Regulamento 1/2003. Este regulamento, no entanto, não se aplica aos serviços internacionais de tramp e cabotagem. Em segundo lugar, o Regulamento 4056/86 estabelece determinadas disposições específicas relativas à concorrência no sector marítimo e, nomeadamente, uma isenção por categoria a favor das conferências marítimas, que lhes permite, em determinadas condições, fixar preços e regular capacidades.

2.2   O sector dos transportes marítimos regulares

2.2.1

O mercado dos transportes marítimos regulares evoluiu consideravelmente desde a adopção do Regulamento (CEE) n.o 4056/86. A contínua tendência no sentido de uma maior utilização dos contentores levou a um aumento do número e dimensão dos navios de contentores totalmente celulares e à preponderância das redes de transporte globais, numa resposta à evolução dos modelos de comércio a nível mundial. O aumento da importância de novos acordos operacionais foi acompanhado de uma diminuição da importância das conferências e a um aumento considerável das companhias independentes. Noutras partes do mundo, como os EUA, a introdução do Ocean Shipping Reform Act (OSRA), de 1999, alterou as regras que permitiam às conferências que serviam o mercado americano estabelecer contratos de serviços confidenciais. Presentemente, as redes de transporte mundiais operam principalmente nas rotas Leste–Oeste e nas rotas Norte–Sul, enquanto os pequenos e médios transportadores operam sobretudo nas rotas Norte–Sul e nos serviços europeus de cabotagem.

2.2.2

O Código de Conduta das Conferências Marítimas da CNUCED destinava-se inicialmente a regular o sistema das conferências marítimas em operações entre países desenvolvidos e países em desenvolvimento (3). Treze Estados-Membros da UE e a Noruega ratificaram, aprovaram ou aderiram ao Código de Conduta e Malta assinou-o mas não o ratificou (4). É referido em vários acordos entre a UE e países terceiros e no acervo comunitário (Regulamentos 954/79, 4055/86, 4056/86 e 4058/86). Apesar da sua redundância para o transporte marítimo regular, em termos jurídicos, o Código da CNUCED continua a existir.

2.2.3

Os utilizadores dos serviços de transporte (carregadores e transitários) põem sistematicamente em causa o sistema de conferências, que consideram não proporcionar serviços eficientes e fiáveis adequados às suas necessidades. O ESC (5), em especial, considera que a revogação da isenção por categoria a favor das conferências irá permitir melhores parcerias entre clientes e prestadores de serviços, proporcionando soluções logísticas favoráveis à competitividade internacional das empresas da UE. Do mesmo modo, os consumidores beneficiariam de preços ligeiramente inferiores, graças à redução das taxas aplicadas aos produtos importados pela UE. Os armadores, pelo contrário, têm sido da opinião de que as conferências marítimas contribuíram para a estabilidade do serviço e de que o sistema de conferências lhes tem permitido — tanto no plano global como no regional — enfrentar as condições de instabilidade (por motivos sazonais ou geográficos, ou devido às condições climatéricas) da maior parte das rotas. Entretanto, os transportadores globais (membros da ELAA (6)) e o ESC iniciaram um diálogo com a Comissão, assistindo-a no desenvolvimento de um sistema alternativo que esteja em conformidade com as regras de concorrência da CE.

2.2.4

Em 2003, a Comissão lançou um processo de análise do Regulamento (CEE) n.o 4056/86 para determinar a possibilidade de assegurar serviços marítimos regulares fiáveis através de meios menos restritivos do que a fixação horizontal de preços e a regulação das capacidades. Para este efeito, a Comissão publicou um documento de consulta em Março de 2003 e organizou uma audição pública com as partes interessadas em Dezembro do mesmo ano. Além disso, a Comissão publicou um documento para discussão em Junho de 2004 e um Livro Branco em Outubro, a que se seguiram extensas consultas com as partes interessadas. O Parlamento Europeu (7) e o CESE (8) emitiram os seus pareceres sobre o Livro Branco em 1 de Dezembro de 2005 e 16 de Dezembro de 2004, respectivamente, tendo ambos concordado em que a revisão era uma opção preferível à revogação. Em Dezembro de 2005, a Comissão apresentou uma proposta de regulamento que revoga o Regulamento 4056/86.

2.3   O sector dos serviços não regulares de transporte marítimo (tramp)

2.3.1

Embora quase 80 % do transporte de mercadorias a granel, secas ou líquidas, seja operado a nível mundial por serviços de tramp, para a maioria este sector é praticamente desconhecido. As principais características do transporte marítimo não regular são: mercados competitivos a nível mundial, modelo de concorrência quase perfeita, procura volátil e imprevisível, grande número de pequenas empresas, modelos comerciais globais, facilidade de entrada e saída, forte rentabilidade, sensibilidade à evolução dos mercados e às necessidades dos carregadores. Em geral, o mercado do transporte marítimo não regular é muito fragmentado e satisfaz as necessidades de carregadores e fretadores sem prejudicar as normas de concorrência internacionais ou europeias. A ausência de reclamações relativas a este sector é mais uma prova da sua elevada competitividade e das suas características satisfatórias. Em virtude do exposto, o Regulamento (CEE) n.o 4056/86 exclui os serviços não regulares de transporte marítimo do seu âmbito de aplicação. Os artigos 81.o e 82.o do Tratado CE aplicam-se directamente a este sector. Além disso, os serviços internacionais de tramp (e de cabotagem) estão excluídos do âmbito de aplicação do Regulamento 1/2003 (execução das regras de concorrência).

2.4   Proposta da Comissão

2.4.1

Tendo em conta as alterações da estrutura do mercado e da indústria desde 1986, o Comissão Europeia concluiu que as quatro condições cumulativas estabelecidas no n.o 3 do artigo 81.o do Tratado CE para a concessão de uma isenção por categoria a favor das conferências marítimas já não estão preenchidas. Por este motivo a Comissão propôs a revogação do Regulamento 4056/86 na sua totalidade e, nomeadamente, da isenção por categoria a favor das conferências marítimas (artigos 3.o a 8.o, 13.o e 26.o). Certas disposições redundantes serão igualmente revogadas, em conformidade com a política global da Comunidade Europeia de redução e simplificação da legislação comunitária (artigos 2.o e 9.o). A Comissão entende que esta revogação terá como resultado reduzir os custos de transporte, preservando a fiabilidade dos serviços em todas as rotas, para melhorar a competitividade da indústria europeia.

2.4.2

Antes de revogar a isenção por categoria a favor das conferências marítimas, a Comissão tenciona publicar orientações sobre a concorrência no sector dos transportes marítimos, a fim de facilitar a transição para um regime totalmente concorrencial. A Comissão tenciona adoptar estas orientações até ao final de 2007. Antes desta adopção, a Comissão publicará, em Setembro de 2006 — como medida transitória no âmbito da elaboração das orientações –, um documento de reflexão sobre os transportes marítimos regulares

2.4.3

A proposta da Comissão de revogação do Regulamento 4056/86 contém igualmente uma proposta de alteração do Regulamento 1/2003 de forma a incluir os serviços de cabotagem e os serviços de tramp no âmbito de aplicação deste Regulamento.

3.   Observações na generalidade

3.1

O CESE considera que a questão em apreço merece uma abordagem equilibrada, que tenha em conta os seguintes factores: os benefícios da concorrência para a competitividade da indústria da UE, as alterações do comércio mundial e os seus efeitos na prestação de serviços de transporte, as implicações do transporte internacional para os principais parceiros comerciais da UE e para os países em desenvolvimento, os pontos de vista dos transportadores e transitários globais e os pontos de vista dos pequenos e médios transportadores e transitários.

3.2   Serviços de cabotagem e de tramp

3.2.1

Os serviços de tramp operam num mercado global em condições de perfeita concorrência. Esta característica única do sector de tramp, reconhecida por profissionais e académicos, foi igualmente reconhecida pela UE no Regulamento 4056/86. O CESE reconhece a necessidade de incluir este sector no âmbito de aplicação das regras de concorrência previstas no Regulamento 1/2003 e, por isso, subscreve a abordagem proposta. O CESE congratula-se com a iniciativa da Comissão de promover um estudo sobre as características económicas e jurídicas do sector de tramp. Por razões de segurança jurídica, o CESE insta a Comissão a fornecer orientações (antes de eliminar a exclusão do âmbito de aplicação do Regulamento 1/2003) relativas à auto-avaliação da compatibilidade com o direito da concorrência da UE das várias formas de acordo de cooperação no sector de tramp. O facto de não haver reclamações nem jurisprudência no sector de tramp constitui uma prova do seu funcionamento em perfeitas condições de concorrência. Para estabelecer referências jurídicas para a sua auto-avaliação em função das regras de concorrência da CE, será necessária mais informação sobre o funcionamento e os acordos. O CESE aprecia o diálogo entre a Comissão e o sector dos transportes marítimos sobre a aplicação dos artigos 81.o e 82.o aos serviços de tramp.

3.2.2

Quanto à cabotagem marítima, o CESE concorda com a solução proposta, ou seja, a inclusão da cabotagem no âmbito de aplicação do Regulamento 1/2003. A grande maioria dos acordos existentes neste sector não afecta o comércio intracomunitário nem provoca restrições da concorrência.

3.2.3

À luz do exposto, o CESE aprova a abordagem da Comissão para o tratamento futuro dos serviços de cabotagem e de tramp.

3.3   Sector dos transportes marítimos regulares

3.3.1

No que se refere ao sector dos transportes marítimos regulares, o CESE regista a proposta da Comissão de revogar a isenção por categoria a favor das conferências marítimas, por já não se encontrarem preenchidas as quatro condições cumulativas do n.o 3 do artigo 81.o do Tratado. A Comissão entende que esta revogação resultará em custos de transporte mais baixos, preservando a fiabilidade dos serviços em todas as rotas e melhorando a competitividade da indústria europeia. O CESE reserva a sua posição para a expressar no momento em que seja conhecido o efeito sustentável da revogação proposta.

3.3.2

O CESE toma nota da intenção da Comissão de publicar orientações adequadas sobre a concorrência no sector dos transportes marítimos, a fim de facilitar a transição para um regime plenamente concorrencial. O CESE insta a Comissão a elaborar as orientações em estreito contacto com as partes interessadas e a informar em conformidade as instituições europeias pertinentes.

3.3.3

A proposta da Comissão é resultado de um processo de reapreciação, iniciado em 2003, que envolveu todas as instituições da UE pertinentes e as partes interessadas. A Comissão encarregou consultores independentes de realizar três estudos com o objectivo de analisar as questões suscitadas pela revogação da isenção por categoria a favor das conferências, cujas conclusões estão publicadas no sítio Web da DG Concorrência

3.3.4

O CESE toma igualmente nota do facto de a proposta da Comissão de revogar a isenção por categoria a favor das conferências marítimas se basear unicamente no artigo 83.o do Tratado (regras de concorrência), se bem que a base jurídica do Regulamento 4056/86 seja o artigo 83.o (regras de concorrência) em articulação com o n.o 2 do artigo 80.o (política de transportes) do Tratado CE.

3.3.5

O CESE toma nota de que a Comissão reconhece que o direito da concorrência não é aplicado da mesma maneira em todas as jurisdições do mundo e que existem divergências. A Comissão também reconhece a crescente importância da cooperação internacional entre autoridades responsáveis pela aplicação do direito da concorrência.

3.3.6

O CESE congratula-se com o facto de a Comissão prosseguir uma política bifacetada que consiste, por um lado, em reforçar a cooperação bilateral com os principais parceiros comerciais da Comunidade Europeia e, por outro lado, em analisar os meios de desenvolver a cooperação multilateral no domínio da concorrência. O CESE exorta, portanto, a Comissão, a intensificar esforços para assegurar que esta cooperação e este diálogo contribuam para identificar potenciais problemas resultantes da revogação do Regulamento 4056/86 na UE e para resolver esses problemas de forma construtiva, respeitando as especificidades de outros sistemas jurídicos. Na verdade, é vital para o comércio internacional a coerência, entre os diferentes países, do tratamento dado aos serviços de transportes regulares.

3.3.7

O CESE insta a Comissão a ter em conta, na elaboração das orientações sobre a concorrência no sector marítimo, os resultados do diálogo e da cooperação entre si e os seus principais parceiros comerciais.

3.3.8

O CESE regista a referência feita, na exposição de motivos da proposta da Comissão, aos elementos a seguir enunciados, e mantém que estes devem ser tidos em conta na elaboração das orientações sobre concorrência no sector marítimo:

Reconhece-se que os serviços de transporte marítimo desempenham um papel fundamental no desenvolvimento da economia da UE, sendo 90 % do seu comércio externo e 43 % do seu comércio intracomunitário transportado por via marítima.

A actual tendência para a contentorização alterou profundamente os transportes marítimos regulares desde a adopção do Regulamento 4056/86. Esta resultou num aumento do número e da dimensão dos navios de contentores totalmente celulares e à preponderância das redes de transporte globais, o que contribuiu para a popularidade de novos acordos operacionais e para a diminuição da importância das conferências marítimas.

O sistema de conferências — que funcionou durante 150 anos — ainda é objecto de acordos multilaterais e bilaterais, de que são signatários Estados-Membros da UE e a Comunidade. O CESE toma nota de que a Comissão reconhece que, em consequência destes acordos, a data de revogação do n.o 3, alíneas b) e c) do artigo 1.o, e dos artigos 3.o a 8.o e 26.o do Regulamento 4056/86 deve ser prorrogada por um período de dois anos, a fim de permitir a denúncia ou a revisão destes acordos com países terceiros.

3.3.9

O CESE recomenda que a Comissão tenha igualmente em consideração o elemento humano (impacto no emprego dos marítimos europeus), para além dos factores meramente competitivos, quando revogar a isenção por categoria a favor das conferências marítimas. O CESE solicita à Comissão que avalie a amplitude deste impacto, especialmente através de consulta ao Comité de Diálogo Social Sectorial sobre Transporte Marítimo.

3.3.10

O CESE recomenda à Comissão que atenda ao aspecto de segurança (perda de qualidade do transporte marítimo nas águas europeias) — para além dos factores de competitividade — quando revogar a isenção por categoria a favor das conferências marítimas.

3.3.11

O CESE considera que a Comissão deve ter igualmente em conta, ao revogar o Regulamento 4056/86, os interesses das pequenas e médias empresas. Estas empresas constituem a coluna dorsal da economia da UE e desempenham um importante papel no contexto da Estratégia de Lisboa revista. Os mercados devem permanecer abertos à concorrência actual e potencial, incluindo por parte de pequenos e médios operadores de transportes marítimos.

3.3.12

O CESE mantém que, embora a consolidação possa ter efeitos positivos para a indústria da UE (ganhos de eficiência, economias de escala, redução de custos), é necessária prudência para evitar que a mesma consolidação — que pode seguir-se à revogação do Regulamento 4056/86 — resulte numa diminuição do número de operadores nos mercados relevantes, ou seja, em menos concorrência.

3.3.13

No contexto do novo regime, o CESE convida as duas partes interessadas ao nível europeu — transportadores e carregadores — a iniciarem conversações sobre questões de interesse mútuo.

4.   Observações na especialidade

4.1   Base jurídica

4.1.1

O CESE assinala que o Regulamento 4056/86 tem uma dupla base jurídica (n.o 2 do artigo 80.o e artigos 81.o, 82.o e 83.o, relativos às políticas de transporte e à concorrência, respectivamente), enquanto que a proposta mantém apenas uma (artigos 81.o-82.o). O CESE nota igualmente que a base jurídica única é defendida pelo Serviço Jurídico do Conselho. O CESE gostaria de receber informação do Serviço Jurídico do Parlamento Europeu sobre a questão de saber se as considerações no plano dos transportes se subordinam às considerações no plano da concorrência e se aquele serviço mantém o ponto de vista do seu anterior parecer sobre a dupla base jurídica (Dezembro de 2005).

4.2   Conflito de leis

4.2.1

A Comissão propõe a supressão do artigo 9.o do Regulamento 4056/86, por considerar que uma revogação da isenção por categoria a favor das conferências marítimas não suscitará o risco de possíveis conflitos de leis internacionais. A Comissão argumenta que tal conflito de leis só poderá ocorrer se uma jurisdição proibir algo que outra jurisdição exige. A Comissão não tem conhecimento da existência de qualquer sistema jurídico que imponha uma tal obrigação aos operadores de serviços regulares.

4.2.2

Antecipando possíveis conflitos de leis resultantes de instrumentos jurídicos de outras jurisdições, o CESE insta a Comissão a criar uma disposição nas orientações para a resolução desses problemas. Tal disposição minimizará as fricções e conduzirá a soluções mutuamente aceitáveis ao nível internacional.

Bruxelas, 5 de Julho de 2006.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Regulamento (CE) n.o 1/2003 relativo à execução das regras de concorrência estabelecidas nos artigos 81.o e 82.o do Tratado (JO L 1 de 4.1.2003, p.1); parecer do CESE: JO C 155/2001, p. 73.

(2)  A6-0314/2005 de 01/12/2005.

(3)  Para mais informação sobre o Código de Conduta das Conferências Marítimas da CNUCED e sobre o Regulamento 954/79, ver o parecer do CESE, JO C 157, 28/06/2005, p. 130.

(4)  Ver o documento sobre a situação dos tratados multilaterais publicado pelo Secretariado da CNUCEC em

http://www.unctad.org/en/docs/tbinf192.en.pdf (página 4.)

(5)  ESC= European Shippers' Council (Conselho Europeu de Carregadores).

(6)  ELAA= European Liner Affairs Association

(7)  A6-0314/2005 de 01/12/2005.

(8)  Parecer do CESE : JO C 157, de 28/06/2005, p. 130.


16.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 309/51


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «Segurança aérea»

(2006/C 309/11)

Em 19 de Janeiro de 2006, o Comité Económico e Social Europeu decidiu elaborar, nos termos do n.o 2 do artigo 29.o do Regimento, um parecer sobre «Segurança aérea».

Foi encarregada da preparação dos trabalhos relativos a esta matéria a Secção Especializada de Transportes, Energia, Infra-Estruturas e Sociedade da Informação, que emitiu parecer em 30 de Maio de 2006, sendo relator T. McDONOGH.

Na 428.a reunião plenária de 5 e 6 de Julho de 2006 (sessão de 5 de Julho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 155 votos a favor, 2 votos contra e 3 abstenções, o seguinte parecer.

1.   Recomendações

1.1

Os membros da tripulação de cabina deverão ser titulares de um certificado ou de licença emitido por uma autoridade competente de modo a assegurar a competência no exercício das suas funções (segurança, aspectos médicos, gestão dos passageiros, etc.) e garantir as qualificações técnicas para cada tipo de avião em que devam trabalhar.

1.2

A Agência Europeia para a Segurança da Aviação (AESA) deve ponderar cuidadosamente antes de conceder aos fornecedores de equipamento autonomia para aprovar concepções de componentes sem recorrer à AESA ou aos fabricantes de aeronaves.

1.3

As companhias aéreas não europeias deveriam ser aprovadas pela AESA antes de serem autorizadas a voar para a Europa ou a sobrevoar o espaço aéreo europeu.

1.4

Deveria existir apenas uma entidade reguladora — a AESA. Isto permitiria a futura harmonização dos regulamentos dos aeródromos e evitaria, na medida do possível, a distorção da concorrência entre aeroportos da UE e de países terceiros. A AESA deveria ser reforçada e deveriam ser-lhe atribuídos mais poderes, como os da Conferência Europeia da Aviação Civil (CEAC).

1.5

A AESA deveria ponderar na melhor forma de a indústria proteger da pirataria informática a segurança e integridade das comunicações, a transmissão de dados e os sistemas de aviónica a bordo, tais como os pacotes electrónicos de voo (PEV).

1.6

A AESA deve assegurar que a futura evolução de aeronaves, nomeadamente os aviões executivos ligeiros, seja sujeita a regulamentação que garanta que os proprietários e os pilotos têm suficientes horas de voo antes de serem autorizados a pilotá-los. Serão estabelecidos tectos de 25 000 pés ou mais para os aviões executivos ligeiros, os quais deverão cumprir as normas operacionais e de manutenção dos aviões comerciais de maiores dimensões.

1.7

A AESA deverá estabelecer os necessários protocolos antes de pensar em aprovar voos de aeronaves não tripuladas (ANT) fora do espaço aéreo reservado.

1.8

Deveriam ser feitas despistagens aleatórias de álcool e drogas à tripulação de voo e de cabina.

1.9

A AESA deveria igualmente assegurar que as entidades reguladoras locais são devidamente qualificadas para o exercício da função e dispõem de recursos humanos e financeiros suficientes.

1.10

A AESA deveria efectuar um estudo científico aprofundado sobre os efeitos na tripulação de voo e de cabina do cansaço, do stress e da trombose venosa profunda.

1.11

Deveriam ser revistos a política e os procedimentos para a concessão da licença de piloto de aviação geral e a certificação dos aparelhos da aviação geral.

1.12

A AESA deveria garantir a introdução de uma licença europeia de aviação geral com os averbamentos e classificações referentes à aeronave a pilotar.

1.13

A segurança da tripulação, dos passageiros e dos residentes nas áreas afectadas pelos corredores aéreos deve prevalecer sobre considerações de ordem política no que toca à interdição de companhias aéreas utilizarem o espaço aéreo europeu.

2.   Introdução

2.1

Com a colaboração dos Estados-Membros e dos seus peritos, foi publicada uma lista negra de 96 companhias aéreas, 93 das quais estão sujeitas a interdições e 3 a restrições operacionais. Além disso, a França considera a introdução de um novo sistema de rótulos de segurança que poderiam ser utilizados na publicidade.

2.2

A Europa sofre pressões no sentido de melhorar a legislação em matéria de segurança aérea desde que, no princípio de 2004, um avião charter da companhia Flash Airlines se despenhou no Mar Vermelho, provocando 148 mortos, na sua maioria turistas franceses. A queda dessa aeronave realçou a falta de coordenação entre governos sobre a partilha de informações de segurança, pois só nessa altura se soube que a companhia Flash Airlines tinha sido interditada pelas autoridades aeronáuticas suíças.

2.3

Para que a lista negra surta o efeito pretendido, é crucial que haja consistência e harmonização entre os Estados-Membros no que toca às normas operacionais das companhias aéreas. Os Estados-Membros devem evitar uma situação em que, por motivos económicos e sociais, um país decida que uma companhia aérea que conste da lista «poderá ser marginalmente aceite» nos seus aeroportos, enquanto os outros Estados-Membros consideram as suas normas inaceitáveis.

2.4

Foi solicitada, porém, a intervenção de Bruxelas em alguns conflitos, nomeadamente quando a Turquia se mostrou indignada com a decisão de alguns governos europeus liderados pelos Países Baixos de suspenderem temporariamente os direitos de aterragem à Onur Air, uma companhia aérea turca de baixo custo, por razões de segurança. Por outro lado, está a ser constantemente solicitado à Grécia que avance nas investigações do acidente do avião da Helios Airways ocorrido durante um voo com origem em Larnaca, Chipre.

2.5

Suscitam preocupação as questões ligadas às normas de manutenção geral, formação das tripulações e horas de voo, períodos de descanso, medidas de poupança de combustível, redução do ruído e, ainda, controlo do tráfego aéreo.

2.6

O aumento da concorrência no sector da aviação e a situação financeira precária de muitas companhias aéreas aumentaram a pressão sobre as tripulações no sentido de descolarem em condições em que normalmente não o fariam e, por outro lado, a voarem em aparelhos não em perfeitas condições de navegabilidade. A regulamentação da UE obriga as companhias aéreas a providenciar alojamento aos passageiros por uma noite ou a indemnizá-los pelos atrasos, pelo que é cada vez maior a pressão exercida sobre as tripulações para levantarem voo. Tudo isto afecta a segurança. Há ainda o problema de muitas autoridades aeronáuticas nacionais tenderem a ignorar a aplicação de muita regulamentação quando se trata da companhia aérea nacional.

2.7

Apesar da interdição em vários países europeus por razões de segurança, uma determinada companhia aérea continua a voar para Bruxelas e Paris. A Suíça, com a sua tradicional obsessão pelo sigilo comercial, proibira 23 companhias de atravessarem o seu espaço aéreo, mas os nomes e até mesmo o número de companhias em causa foram mantidos confidenciais.

3.   Efeitos da fadiga e segurança do desempenho

3.1

A fadiga tem sido apontada como a causa de inúmeros acidentes de aviação nos últimos anos e é um problema persistente para as tripulações de aeronaves de todas as dimensões. Mas como pode um piloto saber quando é que está demasiado cansado para voar? Até que ponto os ciclos de sono, a desidratação, a nutrição e as doenças afectam a capacidade de identificar e reagir à fadiga?

3.2

Os pilotos que atravessam vários fusos horários estão sujeitos a sofrer de fadiga e a ver a sua capacidade de julgamento afectada. Está previsto poderem usufruir de períodos de descanso nos voos de longo curso, mas para tal necessitam de instalações adequadas, tais como camas, etc.

3.3

Está mais do que provado que a fadiga afecta a segurança. Um relatório recente do Departamento Nacional da Segurança dos Transportes sobre o acidente fatal em Kirksville, Missouri, em 19 de Outubro de 2004, sublinhava que «atendendo à insuficiência de tempo de descanso nocturno, ao facto de terem de se apresentar ao serviço muito cedo, à duração do dia de trabalho, ao número de voos efectuados, às condições difíceis — aproximações de não-precisão controladas manualmente a baixa altitude e visibilidade reduzida — com que os pilotos se confrontam durante os longos dias de trabalho, é provável que a fadiga contribua para a degradação das suas prestações e da capacidade de decidir».

3.4

Seja como for, nenhum piloto com uma experiência razoável pode negar já ter tido ocasionalmente de lutar contra um momento de fadiga ou que este tenha de alguma forma afectado o seu desempenho. A qualidade do sono durante os períodos de descanso é muito importante.

3.5

O regime alimentar e a nutrição desempenham também um papel importante. Por exemplo, qualquer piloto, desde um jovem estudante ao comandante prestes a reformar-se, afirmará que a bebida de eleição entre pilotos é o café. O café é um estimulante que reforça temporariamente a vigilância; a fadiga faz parte dos sintomas que se manifestam com a falta de café. Além disso, o café é diurético, o que faz com que o corpo liberte mais líquidos do que os que ingere, provocando desidratação, que, por sua vez, pode causar fadiga.

3.6

Juntamente com o cansaço, o tédio é um grande problema em voos de longo curso, em que as aeronaves são quase totalmente automáticas. Para manter a tripulação vigilante, algumas companhias aéreas, em particular em voos transsiberianos, insistem na necessidade de reiniciar o piloto automático de hora a hora.

3.7

Muitos dos acidentes de aviação devem-se a erros do piloto, sendo a fadiga uma das principais causas.

3.8

Está previsto a AESA encarregar-se do processo de licenciamento e substituir as actuais JAA neste domínio. Contudo, a utilização na Europa de licenças da Organização da Aviação Civil Internacional (ICAO) obtidas por pilotos nos Estados Unidos não será afectada por esta alteração.

4.   Tripulação de cabina

4.1

Qualquer melhoria nos requisitos de descanso para a tripulação de voo deveria — quando possível — aplicar-se também à tripulação de cabina, que deve estar perfeitamente vigilante, a fim de prevenir uma eventual ocorrência em matéria de segurança ou actuar em caso de emergência.

4.2

A tripulação de cabina deveria possuir formação adequada em reanimação, dominar a sua língua materna, ter pelo menos o nível 4 da ICAO em Inglês e ser capaz de facilitar a comunicação com os passageiros em caso de emergência.

5.   Controlo do tráfego aéreo

5.1

O CESE já manifestou o seu ponto de vista quanto ao controlo do tráfego aéreo (CTA) e problemas conexos (1). O sistema SESAR proposto, se e quando for introduzido, deveria aumentar a segurança. Esta questão é abordada noutro documento do CESE (2), mas não invalida o facto de a Europa necessitar de um sistema de CTA uniformizado, que ultrapasse os limites de todos os países e em que o Eurocontrol seja reconhecido como «Entidade Reguladora Federal», à semelhança, por exemplo, da Administração da Aviação Federal (FAA), nos Estados Unidos. A concessão do primeiro contrato no âmbito do programa TMA2010+ do Eurocontrol é acolhida favoravelmente.

5.2

A normalização e a introdução na Europa de sistemas integrados são necessárias no interesse da segurança.

5.3

É também desejável introduzir certificação de pessoal da electrónica de segurança área.

6.   Manutenção de aeronaves

6.1

Alguns Estados-Membros parecem ter dificuldades em conformar a sua legislação nacional com as normas europeias da Parte 66. As licenças de manutenção emitidas pelos Estados têm por base os requisitos das Autoridades Comuns da Aviação (JAA) e foram adoptadas para a legislação nacional, conferindo-lhes um carácter juridicamente vinculativo. Todavia, no âmbito do sistema da AESA, as regras de concessão de licenças estão sujeitas à legislação comunitária. A sua aplicação aparenta ser um processo moroso e sujeito a recurso.

6.2

Em 2005, os 25 Estados-Membros da UE beneficiaram todos de uma derrogação em virtude da qual poderiam protelar até Setembro de 2005 a conformidade com as disposições da Parte 66. Os prazos estabelecidos pela AESA para cumprimento das regras de segurança devem ser aplicados ou, pelo menos, deveriam ser acordados prazos entre todas as partes interessadas, com vista a evitar a necessidade de prolongamento de prazos ou períodos de transição.

6.3

O CESE gostaria de saber se há qualquer disposição que permita à AESA vigiar, se necessário, os serviços de manutenção que as transportadoras de baixo custo confiam a estruturas de manutenção situadas em países terceiros.

6.4

Há que prever o tempo necessário para as inspecções no solo, em particular durante a rotação do avião. Os 25 minutos atribuídos em média aos voos de pequeno curso não podem certamente ser considerados tempo suficiente em todos os casos.

6.5

É necessário prever recursos adequados e destacar para a manutenção pessoal qualificado que utilize apenas peças certificadas.

6.6

A autoridade aeronáutica nacional deveria efectuar inspecções aleatórias com vista a certificar-se de que as normas estão a ser cumpridas.

7.   Companhias aéreas

7.1

As companhias aéreas devem ser financeiramente sólidas e dispor de financiamentos adequados antes de lhes ser concedida licença de início de actividade. Os Estados-Membros deveriam também acompanhar regularmente o seu desempenho financeiro, por forma a garantir que não há falhas.

7.2

As companhias devem ter experiência e uma gestão competente.

8.   Competências da Agência Europeia para a Segurança da Aviação

8.1

Presentemente a Comissão Europeia pretende aumentar mais as competências da AESA no domínio da regulamentação (incluindo segurança e interoperabilidade) dos aeroportos, gestão do tráfego aéreo e serviços de navegação aérea.

8.2

O CESE apoia a AESA criada pelo Regulamento n.o 1592/200/CE e considera que um quadro europeu de procedimentos e autorizações para aeronaves e equipamentos emitidos por uma autoridade única melhoraria certamente a segurança e a eficiência aéreas na Europa.

8.3

A AESA tem agora oportunidade de abordar a questão das normas e das práticas recomendadas da ICAO (SARP — Standard and recommended Practices) e as anomalias provocadas pelas práticas recomendadas e pelas práticas normalizadas, que constam dos anexos da Convenção ICAO.

9.   Licenças de aviação geral

9.1

As licenças dos pilotos de helicópteros privados que voam no espaço aéreo europeu emitidas pela FAA deveriam ter de ser validadas pela AESA.

9.2

Todas as aeronaves da aviação geral devem conformar-se com as normas da UE estabelecidas pela AESA antes de serem autorizadas a voar no espaço aéreo europeu.

10.   Segurança dos sistemas de aviónica

10.1

A AESA deveria elaborar directrizes/normas para proteger o equipamento ou redes específicas contra «actos de interferência ilícita», de acordo com a definição da ICAO.

10.2

Para além de uma maior utilização de Ethernet (LAN) e IP, são áreas igualmente vulneráveis:

a utilização crescente por passageiros, companhias aéreas e CTA, para fins de comunicação, de tecnologias de transmissão de dados ar-terra;

o uso mais generalizado de transferência de dados e de software através de redes a bordo de aeronaves e entre locais em terra, para fins de produção, distribuição, manutenção ou actualização;

a multiplicação de vírus de software e ataques de pirataria informática, mais a pesquisa de dados confidenciais através de redes interligadas.

11.   Aeronaves não tripuladas (ANT)

11.1

A AESA deve ser dotada dos poderes necessários para regular este sector da indústria, não apenas do ponto de vista da aeronavegabilidade e da concepção mas também da certificação dos operadores de terra, sistemas de lançamento, etc.

11.2

Toda a regulamentação aplicável às aeronaves convencionais deve ser considerada obrigatória para as ANT e deveriam ser consultados todos os utilizadores do espaço aéreo que possam ser afectados por este tipo de actividade.

12.   AESA

12.1

A AESA é a entidade de regulamentação geral da União Europeia. Estabelece os princípios e as normas de segurança aérea na UE. Não dispõe dos recursos financeiros e humanos necessários e não tem poder para fazer respeitar as normas.

12.2

Depende das diversas entidades reguladoras nacionais no que toca à aplicação das normas e da regulamentação.

12.3

Tal situação equivale a auto-regulação. Não é provável que alguma autoridade nacional de regulamentação adopte medidas repressivas contra uma companhia aérea sob a sua jurisdição, excepto em caso de extrema gravidade.

12.4

As entidades reguladoras nacionais são igualmente responsáveis por todas as aeronaves registadas no país e pertencentes a companhias aéreas que nele tenham escritórios. Muitas vezes estas aeronaves e tripulações têm a sede e são geridas a partir de outros países da UE, o que torna problemática a aplicação adequada da regulamentação.

12.5

O facto de a AESA solicitar às autoridades reguladoras nacionais que apliquem as suas decisões poderia levar a uma execução não uniforme das regras e da regulamentação na UE devido a interpretações divergentes. Poderia também favorecer o aparecimento de pavilhões de conveniência no sector do transporte aéreo, sempre que uma interpretação da regulamentação parecesse ser mais permissiva num país do que nos outros.

12.6

Por outro lado, a autoridade encarregada de regulamentar a segurança dos aeroportos, a CEAC, tem competência para verificar o cumprimento das normas a nível local, competência essa que deveria ser da AESA.

12.7

Actualmente, a AESA é financiada pelas receitas das certificações, prevendo-se, consequentemente, um prejuízo de 15 milhões de euros para 2006. É fundamental, pois, que os governos centrais prevejam os fundos necessários para assegurar o futuro da AESA.

Bruxelas, 5 de Julho de 2006.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Transportes aéreos: Licença comunitária de controlador de tráfego aéreo, pacote legislativo relativo ao céu único europeu (relator: T. McDonogh), JO C 234 de 22-9-2005, p. 0017-0019.

(2)  Empresa Comum — SESAR, CESE 379/2006 relator: T. McDonogh.


16.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 309/55


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa aos resíduos»

COM(2005) 667 final — 2005/0281 (COD)

(2006/C 309/12)

Em 24 de Fevereiro de 2006, o Conselho decidiu, nos termos do artigo 175.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente emitiu parecer em 24 de Maio de 2006 (Relator: S. BUFFETAUT).

Na 428.a reunião plenária de 5 e 6 de Julho de 2006 (sessão de 5 de Julho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 114 votos a favor e 4 abstenções, o seguinte parecer.

1.   Conclusões

1.1

O CESE aprova a vontade da Comissão de modernizar, simplificar e adaptar a legislação em matéria de resíduos. Aprova, em particular, a abordagem e o espírito da estratégia para a prevenção e reciclagem de resíduos. A vontade de conseguir uma aplicação geral e em termos de igualdade da legislação deve ser apoiada, com vista a evitar distorções em matéria de ambiente, saúde pública e concorrência no mercado dos resíduos. Sublinha a importância da clareza e precisão das definições e dos anexos para evitar os recursos e os processos judiciais. Lamenta, porém, a falta de ambição do texto em matéria de prevenção de resíduos. Sublinha que toda a vontade de alcançar um verdadeiro desenvolvimento sustentável num contexto de escassez e aumento do custo das matérias-primas implica uma política de prevenção e recuperação de resíduos eficaz. Recomenda, todavia, o desenvolvimento de instrumentos à escala europeia com vista a atingir os objectivos fixados, tanto num plano qualitativo como quantitativo. A este respeito, o texto revela uma verdadeira fraqueza. Além disso, a Comissão parece considerar que a simplificação dos procedimentos de requerimento de licenças de exploração das instalações de tratamento encorajará a reciclagem. Esta abordagem está errada e terá consequências ambientais negativas e comporta riscos para a saúde. Ademais, não é conforme aos princípios de Aarhus em matéria de informação do público no que respeita aos resíduos. Com efeito, a licença implica elementos técnicos relacionados com a protecção do ambiente, é pública e envolve medidas de obrigação de informação e de controlo. Não é um entrave ao desenvolvimento do tratamento e da reciclagem, mas, pelo contrário, possui as garantias necessárias sob o controlo do respeito das normas e da aplicação das melhores técnicas disponíveis para as administrações.

1.2

No mesmo sentido, considera pertinente a introdução do conceito de ciclo de vida na política de resíduos, assim como a abordagem em matéria de diminuição de descargas, a recuperação de composto e de energia, reciclagem não poluente e prevenção de resíduos.

1.3

No que toca à proposta de directiva, o CESE considera que a vontade de subsidiariedade, afirmada de modo tão absoluto, corre o risco de estar em contradição com a vontade de ter uma legislação aplicada de forma geral e harmonizada em toda a União Europeia.

1.4

Solicita com veemência que a fusão/revogação da directiva resíduos perigosos não resulte num enquadramento e protecção da saúde pública menos eficazes e considera que o texto, na actual redacção, não oferece garantias suficientes. Seria conveniente precisar, no mínimo, que as misturas de resíduos perigosos e que as isenções de licença não são autorizados para este tipo de resíduos. Com efeito, é a classificação «perigoso» ou «não perigoso» que rege designadamente as precauções e as obrigações específicas em matéria de transporte e de tratamento dos resíduos. Qualquer banalização neste domínio não pode ser considerada como um progresso em matéria de protecção do ambiente.

1.5

Assinala que a reciclagem que deve ser incentivada é a que não implica impacto ambiental negativo e permite uma recuperação efectiva de matérias.

1.6

Tem verdadeiras dúvidas quanto à pertinência do procedimento de comitologia na definição de determinados critérios específicos com vista a estabelecer quando é que um resíduo deixa de o ser.

1.7

Considera que algumas definições permanecem incertas (nomeadamente a de produtor e a de valorização). Conviria definir, por um lado, a recuperação «matéria» que conduz à «reciclagem matéria» com possível saída do estatuto de resíduo para certos fluxos e, por outro, a valorização energética, sem possibilidade de sair do estatuto de resíduos, para conseguir uma aplicação homogénea da directiva incineração ao conjunto dos resíduos valorizados por meio térmico, seja por incineração ou por co-incineração. No respeitante à incineração dos resíduos, será desejável encorajar os elevados rendimentos de valorização energética para obter a qualificação de valorização, mas surpreende que tal disposição se aplique exclusivamente à incineração e não às outras valorizações energéticas. Assim, no que diz respeito à incineração de resíduos, este processo de tratamento deve ser considerado uma valorização apenas nos casos em que daí possa resultar elevado nível de eficácia energética.

1.8

Lamenta, com veemência, a ausência de propostas em matéria de instrumentos financeiros unificados para toda a União.

1.9

Lamenta igualmente a inexistência no texto de uma obrigação em matéria de condições de trabalho e de saúde dos trabalhadores do sector.

2.   Introdução

2.1

A política de resíduos é uma das mais antigas políticas ambientais da União Europeia, uma vez que a actual directiva-quadro data de 1975. Contudo, em trinta anos, o contexto económico e social geral, as práticas, as tecnologias, as políticas nacionais e locais, a consciência colectiva no que toca ao problema dos resíduos evoluíram consideravelmente. A construção constante da legislação europeia em matéria de resíduos, desde 1975, acelerou nos anos 90 com a modificação da directiva-quadro em 1991, seguida da adaptação de uma série de directivas sobre determinados processos de tratamento e gestão de alguns fluxos de resíduos.

2.2

A legislação em vigor foi submetida à prova do tempo; surgiram lacunas ou imprecisões, litígios e jurisprudências destacaram as dificuldades de interpretação e uma complexidade legislativa que se deve, em parte, à fragmentação da legislação em diferentes textos que se referem uns aos outros.

2.3

Simultaneamente, desenvolveu-se uma verdadeira economia dos resíduos. As actividades de gestão e reciclagem de resíduos tornaram-se sectores económicos plenos, que gozam de uma taxa de crescimento elevada e geram um volume de negócios estimado em mais de 100 mil milhões de euros para a Europa a 25.

2.4

A União Europeia cresceu e crescerá ainda mais. Os novos Estados-Membros vivem uma situação difícil neste domínio, dada a importância da deposição de resíduos. Por conseguinte, é natural que a Comissão Europeia pretenda abordar a questão dos resíduos com uma nova reflexão, sem rejeitar porém o espírito da legislação em vigor, perturbando profundamente a sua estrutura.

2.5

Nesse sentido, acaba de publicar uma comunicação sobre a estratégia temática para a prevenção e reciclagem de resíduos e de propor uma nova directiva relativa aos resíduos (1): uma fixa as orientações políticas e a filosofia geral da Comissão, a outra é a sua tradução legislativa concreta.

3.   Uma política renovada

3.1

A reflexão da Comissão subjacente à estratégia temática parte da constatação de que apesar de se realizarem progressos sensíveis em matéria de resíduos há trinta anos, o volume dos resíduos continua a aumentar, os níveis de reciclagem e valorização são insuficientes e os mercados correspondentes têm dificuldades em desenvolver-se. De resto, além dos textos específicos relativos aos resíduos, as directivas IPPC desempenharam certamente um papel positivo.

3.2

Além disso, o tratamento dos resíduos contribui, em certa medida, para problemas ambientais e gera custos económicos.

3.3

Por último, a legislação europeia permanece imprecisa em determinados pontos, o que leva a contenciosos e divergências na sua aplicação de um país para o outro.

3.4

Como são tratados actualmente os resíduos municipais? As melhores estatísticas dizem respeito aos resíduos municipais, que representam cerca de 14 % do total dos resíduos produzidos: 49 % são depositados em aterros, 18 % são incinerados e 33 % reciclados e submetidos a compostagem. A situação é ainda muito díspar entre alguns Estados-Membros onde 90 % dos resíduos são depositados em aterros e outros onde este valor é de apenas 10 %. Diferenças semelhantes são observadas ainda em outras categorias de resíduos.

3.5

Globalmente, a União Europeia está numa situação em que, independentemente de progressos certos, os volumes globais de resíduos estão a aumentar e o montante total de resíduos depositados em aterros não diminui, ou diminui pouco, apesar dos progressos na reciclagem e na incineração. No que toca à prevenção de resíduos, podemos considerar que as políticas empreendidas não permitiram resultados concretos.

3.6

Desde logo, é óbvio que os objectivos da política comunitária actualmente em vigor permanecem válidos — limitar os resíduos, promover a sua reutilização, reciclagem e valorização com vista a reduzir o impacto negativo no ambiente e contribuir para uma melhor utilização dos recursos — mas que deverá alcançar-se uma maior eficácia dos dispositivos.

3.7

Nesse sentido, a Comissão propõe vias de acção que consideram tanto a técnica legislativa como a reflexão e a própria concepção do que deveria ser uma política de resíduos, a melhoria das informações e a definição de normas comuns. Na estratégia de prevenção e reciclagem de resíduos, a Comissão preconiza:

a evolução para uma sociedade da reciclagem que evita a produção de resíduos quando possível e que explora plenamente os recursos materiais e energéticos contidos nos resíduos,

a insistência na aplicação geral da legislação com vista a evitar as disparidades na interpretação e aplicação da legislação e garantir que os objectivos que constam da legislação existente são alcançados atempadamente pelos Estados-Membros,

a simplificação e modernização da legislação em vigor,

a introdução do conceito de ciclo de vida na política de resíduos de forma a considerar o seu potencial contributo para a redução do impacto ambiental da utilização dos recursos;

a aplicação de uma política de prevenção de resíduos mais ambiciosa e mais eficaz;

a melhoria da informação e a difusão de conhecimentos no domínio da prevenção;

o desenvolvimento de normas comuns de referência para enquadrar o mercado europeu de reciclagem;

o reforço da política de reciclagem.

3.8

Com estas modificações na legislação e concepção da política de resíduos, a Comissão espera uma diminuição do volume de resíduos depositados em aterros, uma melhor recuperação de composto e de energia a partir de resíduos e a melhoria da reciclagem no plano qualitativo e quantitativo. Nesse sentido, espera-se uma maior valorização dos resíduos, um aumento na chamada «hierarquia dos resíduos», bem como um contributo da política dos resíduos para uma melhor utilização dos recursos.

Qual é a primeira tradução legislativa dos objectivos anunciados pela estratégia temática?

4.   A proposta de directiva referente aos resíduos: uma alteração, não uma transformação

4.1

O artigo 1.o da proposta enuncia os objectivos da Comissão, duplos e interdependentes:

por um lado, «estabelecer medidas destinadas a reduzir os impactos ambientais gerais, relacionados com a utilização de recursos, decorrentes da geração e gestão dos resíduos».

por outro, e pelos mesmos motivos, estabelecer igualmente que os Estados-Membros devem adoptar medidas, prioritariamente, para a prevenção ou redução da produção de resíduos e da sua nocividade e, em segundo lugar, para a valorização de resíduos «mediante operações de reutilização, reciclagem e outras operações de valorização».

4.2

Para atingir este objectivo, a Comissão não considera necessário alterar em profundidade o quadro legislativo em vigor mas apenas fazer algumas alterações com vista a melhorar o quadro legal actual e colmatar lacunas existentes. A proposta de directiva é apenas um aspecto da aplicação da estratégia e outras propostas dela resultantes surgirão posteriormente. Em todo o caso, a política europeia em matéria de resíduos tem necessariamente por base a subsidiariedade. Para a sua eficácia, há que levar a cabo uma série de acções desde o nível comunitário até ao nível municipal, onde muito foi já passado à prática. A Comissão considera que o respeito pelo princípio da subsidiariedade não traduz de forma alguma a diminuição do nível de ambição no domínio do ambiente.

4.3

Nesse sentido, a proposta apresenta-se como uma revisão da directiva (75/442/CEE). É uma fusão da directiva relativa aos resíduos perigosos (91/689/CEE) com a directiva-quadro, revogando-a simultaneamente, portanto. Revoga igualmente a directiva relativa à eliminação dos óleos usados (75/439/CEE) integrando porém na directiva quadro a obrigação específica de recolha.

4.4

As principais alterações referem-se a:

introdução de um objectivo ambiental;

clarificação das noções de valorização e eliminação;

clarificação das condições para a mistura de resíduos perigosos;

introdução de um procedimento para clarificar quando é que um resíduo deixa de o ser, para uma selecção de fluxos de resíduos;

introdução de normas mínimas ou de um procedimento para o estabelecimento de normas mínimas relativamente a uma série de operações de gestão de resíduos;

introdução de um requisito de elaboração de programas nacionais de prevenção de resíduos.

4.5

Por conseguinte, convém saber se as propostas de alterações legislativas permitirão atingir os objectivos globais definidos pela estratégia e corrigir as actuais insuficiências e faltas de precisão.

5.   Observações gerais sobre a proposta de directiva relativa aos resíduos

5.1

Esta nova proposta era esperada há muito tempo e deveria tornar-se a base da política ambiental europeia em matéria de gestão de resíduos para o conjunto das partes interessadas. Nesse sentido, propôs-se ao CESE fazer a sua análise. Considerando a experiência adquirida desde 1991, esperava-se que o novo texto melhorasse a situação actual, bem como as falhas do texto anterior e da estratégia a adoptar na Europa em matéria de desenvolvimento sustentável, que supõe uma política de gestão, recuperação, reciclagem e valorização de resíduos, num contexto de escassez de matérias-primas e recursos energéticos.

5.2

Criticou-se muitas vezes a falta de precisão e clareza da legislação em vigor (nomeadamente nos anexos e definições). Da mesma forma, lamentou-se muitas vezes a falta de aplicação homogénea das directivas e regulamentos na União, bem como as diferentes abordagens segundo o Estado-Membro. A revisão do regulamento sobre as transferências transfronteiriças destacou recentemente os problemas levantados por esta situação.

5.3

Que leitura e análise pode o CESE fazer do texto proposto pela directiva quadro? Poderemos interrogarmo-nos sobre se o nível de ambição da Comissão não será menor do que na Comunicação de 2003 intitulada «Rumo a uma estratégia temática para a prevenção e reciclagem de resíduos» (2). A abordagem escolhida em matéria de subsidiariedade parece um pouco minimalista e pode conduzir a divergências de aplicação da legislação. Além disso, a acção a levar a cabo na matéria pelas partes interessadas económicas e sociais foi ignorada.

5.4   Sobre a simplificação da legislação:

5.4.1

Propõe-se a fusão da directiva sobre os resíduos perigosos com a directiva-quadro. A este respeito, há que garantir que os resíduos perigosos serão objecto de um enquadramento mais rigoroso do que outros resíduos, sobretudo considerando que, paralelamente, o REACH deverá ser aplicado a todas as substâncias no mercado. A directiva sobre os óleos usados é simplesmente revogada, uma vez que, na prática, o benefício ambiental do texto não estava definido no que se refere à transformação destes óleos. Por outro lado, as disposições referentes à sua recolha serão mantidas.

5.4.2

Poderíamos igualmente assinalar que, desde a definição dos critérios de perigosidade, a Comissão ainda não elaborou os documentos de acompanhamento necessários: testes normalizados, limites de concentração para uma exploração correcta da lista de resíduos.

5.4.3

As propostas de derrogação que constam do texto para as operações de valorização parecem pouco prudentes e deveriam ser questionadas em alguns sectores. Com efeito, ainda recordamos os incidentes de mistura de resíduos perigosos com substâncias naturais para a preparação de alimento para animais. Estes incidentes poderiam generalizar-se a partir do momento em que se abandonasse a rastreabilidade, os controlos necessários para uma gestão correcta dos resíduos. Por último, seria conveniente que a Comissão abordasse a questão de saber se as revogações propostas (Subsecção 2 — revogações) não são contrárias às disposições da Convenção de Aarhus referentes à informação do público e sua participação em matéria de tratamento de resíduos.

6.   Observações na especialidade

6.1   Definições mais correctas

6.1.1

Na directiva actual faltam boas definições sobre um determinado número de pontos. O número de recursos ao Tribunal Europeu de Justiça é suficientemente eloquente para nos convencer disso mesmo. O texto novo é melhor a este nível? Poderá haver dúvidas quanto a alguns aspectos.

6.1.2

A definição de produtor, retirada do texto anterior (3) deve ser alterada. Como admitir que aquele que altera a natureza de um resíduo se torne o seu novo «produtor»? Trata-se apenas de um gestor/ tratador («traiteur») e, como tal, deve integrar a cadeia de rastreabilidade. Caso contrário abrir-se-ia a porta à «desclassificação» dos resíduos e à diluição da responsabilidade do verdadeiro produtor do resíduo. Além disso, deveria, pelo menos, referir-se a «responsabilidade alargada do produtor» (de produtos colocados no mercado).

6.1.3

No quadro do regulamento transfronteiriço (4) que visa manter as exportações, a Comissão insistiu nas operações de substituição que não são definidas, assim como os «comerciantes e correctores» deste regulamento.

6.1.4

A reciclagem é definida mas a definição de recuperação, no que toca à valorização, não está clara. Conviria definir, por um lado, a recuperação de «matéria» que conduz à «reciclagem de matéria» e, por outro, a valorização energética. No primeiro caso, o fim do ciclo de tratamento pode resultar no fim do estatuto de resíduo, ainda que o mesmo não seja válido no caso da valorização energética. Com efeito, no que toca à protecção do ambiente, a valorização energética dos resíduos rege-se pela Directiva Incineração. Se os resíduos deixam de ter esse estatuto, as regras de protecção do ambiente deixam de lhes ser aplicáveis.

6.2   Objecto

6.2.1

O objecto da directiva é e deve continuar a ser a protecção do ambiente e da saúde.

6.2.2

De uma forma geral, a Comissão tende a dar muita importância à abertura do mercado, que é apenas um dos aspectos de uma política de resíduos.

6.2.3

O CESE considera necessário tomar decisões claras no debate sobre como definir o quadro normativo que permitiria aos mecanismos do mercado orientar a gestão dos resíduos para uma melhoria do ambiente, desenvolvendo os conceitos de eco-eficiência e eco-gestão para as nossas actividades produtivas e de serviço. Com efeito, a gestão dos resíduos é um mercado regulado e regulamentado, cujos objectivos principais são a protecção do ambiente e da saúde e a preservação dos recursos. Por conseguinte, tem em conta o impacto económico, social e ambiental. A protecção do ambiente é um elemento essencial que favorece a criação de emprego e a competitividade, criando possibilidades de inovação e de novos mercados. Poderemos interrogar-nos sobre se a subsidiariedade constitui a abordagem ideal. É ainda sintomático constatar que a própria Comissão, na sua Comunicação sobre a estratégia temática, apesar de afirmar que determinadas operações de reciclagem podem ser prejudiciais para o ambiente, propõe que os Estados-Membros submetam todos os resíduos a um tratamento de valorização. Por conseguinte, há que precisar que se trata de um mercado de reciclagem não poluente que convém incentivar por exigências comuns desenvolvidas a nível europeu.

6.2.4

 «Esquece-se» igualmente, tal como já acontecia no texto anterior, de manter na «hierarquia» que a eliminação em condições adequadas pode ser benéfica para o ambiente, mesmo mantendo disposições operativas com este objecto. Como resultado, o novo texto é menos claro do que o anterior no que toca a este ponto.

6.2.4.1

A directiva-quadro deve permanecer a base de uma gestão dos resíduos eficaz e pertinente, que inclua todos os sectores. A sua aplicação e, por conseguinte, os meios para reforçar a estratégia de reciclagem estão ainda por definir.

6.2.5

Como pista de reflexão, tinha proposto a execução de instrumentos financeiros para apoiar e favorecer uma gestão eficaz dos resíduos, da sua reciclagem e valorização. A execução destes instrumentos à escala europeia poderia ter sido incentivada sob reserva de homogeneidade. Não há propostas nesta matéria devido à dificuldade de obter unanimidade sobre uma proposta semelhante no Conselho. A escolha de não apresentar propostas nesta matéria é, sem dúvida, realista, mas não deixa de traduzir uma certa timidez da Comissão que poderia ter proposto o desenvolvimento de um método de coordenação aberta.

6.3   Resíduos perigosos

6.3.1

A questão da fusão/revogação foi abordada nas considerações gerais, no que toca ao seu próprio princípio.

6.3.2

É curioso constatar que no artigo que se refere à separação destes resíduos se fala apenas de mistura.

6.3.3

Mais do que todos os outros, estes resíduos devem ser enquadrados por uma legislação e rastreabilidade fortes. A diluição no ambiente deve ser claramente impossibilitada pela regulamentação. Há que garantir ainda que a fusão/ revogação da directiva resíduos perigosos não diminui o nível de protecção da saúde pública. No mínimo, poderia dizer-se que, por definição, toda a «mistura que inclua resíduos perigosos» será considerada perigosa, excepto se o resultado for uma destoxificação química. Qualquer tipo de diluição deverá ser rejeitada.

6.4   Rede de instalações de eliminação

6.4.1

O texto propõe que os Estados-Membros se coordenem para aperfeiçoar uma rede de instalações de eliminação. Como pedir que se invista neste domínio se os Estados-Membros não podem aplicar os instrumentos necessários para que as instalações não permaneçam em sub-actividade? Com efeito, um operador poderia «exportar» os resíduos para outro país por motivo de valorização. Por conseguinte, convém que as regras nesta matéria sejam particularmente precisas e não impliquem efeitos perversos.

6.4.2

O princípio de proximidade deve ser estudado e explicado à luz do princípio de autosuficiência. Com efeito, estes dois princípios são indissociáveis numa gestão sustentável dos resíduos.

6.5   Prevenção

6.5.1

A directiva não inclui qualquer obrigação para com os Estados-Membros no que se refere à vertente social da prevenção. Esta vertente suporia a consideração do eventual impacto nas condições de trabalho e saúde dos trabalhadores, bem como o lançamento de verdadeiras campanhas de informação. A prevenção também é uma questão de cidadania. Seria igualmente desejável fazer avançar a reflexão sobre duas vertentes: qualitativa e quantitativa, uma vez que, em matéria económica, o qualitativo (apesar de menos dogmático do que o quantitativo), gera progresso e bom desempenho.

6.6   Os anexos

6.6.1

Foram introduzidas poucas alterações, com a excepção da abordagem da eficácia energética apenas das incineradoras de resíduos domésticos. Curiosamente, nada consta sobre as obrigações das «co-incineradoras». Para mais, a incineração de resíduos domésticos apenas poder ser considerada uma valorização nos casos em que daí possa resultar um elevado nível de eficácia energética. De facto, se determinados resíduos não podem ser recuperados, há que evitar que unidades de incineração rudimentares e pouco eficazes em termos de recuperação de energia útil beneficiem das disposições sobre a valorização. A incineração tornar-se-ia então numa solução fácil que poderia resultar em exportações de resíduos, uma situação que, pelo contrário, é necessário evitar.

Bruxelas, 5 de Julho de 2006.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  COM(2005) 666 final.

(2)  COM(2003) 301 final.

(3)  Directiva 91/156/CEE do Conselho, de 18.03.91, que altera a Directiva 75/442/CEE relativa aos resíduos.

(4)  Regulamento (CEE) n.o 259/93 do Conselho, de 1 de Fevereiro de 1993, relativo à fiscalização e ao controlo das transferências de resíduos no interior, à entrada e à saída da Comunidade.


16.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 309/60


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu — Plano de acção 2006-2008 para a simplificação e a melhoria da Política Comum da Pesca»

COM(2005) 647 final

(2006/C 309/13)

Em 23 de Janeiro de 2006, a Comissão Europeia decidiu, nos termos do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente emitiu parecer em 24 de Maio de 2006, sendo relator Gabriel SARRÓ IPARRAGUIRRE.

Na 428.a reunião plenária de 5 e 6 de Julho de 2006 (sessão de 5 de Julho), o Comité Económico e Social Europeu aprovou por 164 votos a favor, sem votos contra e 1 abstenção, o presente parecer.

1.   Conclusões e recomendações

1.1

Como afirmou já em anteriores pareceres, o CESE apoia o processo de simplificação da legislação comunitária e saúda a publicação do plano de acção 2006-2008 para a simplificação e a melhoria da Política Comum da Pesca. O objectivo do presente parecer é contribuir para a extraordinária missão que a Comissão se propõe de melhorar a legislação comunitária no domínio da pesca.

1.2

Para o êxito do processo de simplificação é indispensável uma estreita colaboração com o sector pesqueiro através do apoio e do incentivo aos contactos com os organismos de consulta da Comissão, ou seja, os Conselhos Consultivos Regionais (CCR), o Comité Consultivo da Pesca e da Aquicultura (CCPA) e o Comité Paritário para os Problemas Sociais na Pesca Marítima.

1.3

O CESE entende que a primeira prioridade da Comissão deve ser consolidar a legislação em vigor. Em seguida, deve procurar alcançar os objectivos anunciados na comunicação, que merecem o aplauso do CESE:

a)

promover a clareza dos textos actuais, simplificá-los e torná-los mais acessíveis;

b)

reduzir os encargos e os custos administrativos das administrações públicas;

c)

diminuir encargos administrativos e outras obrigações para os profissionais.

1.4

O CESE também considera acertada a escolha dos dois âmbitos e actos legislativos em que se concentra o plano de acção: a conservação e a gestão dos recursos haliêuticos e o controlo das actividades de pesca. Posteriormente, a Comissão deverá prosseguir com o processo de simplificação e melhoria do resto da PCP.

1.5

No que toca à ficha 1, referente aos TAC e quotas e ao esforço de pesca, o Comité considera adequadas as medidas propostas, as quais dão um tratamento diferenciado aos diversos aspectos da política de conservação, sua organização em grupos homogéneos e seu desenvolvimento através de planos de gestão plurianuais. Todavia, entende que o prazo entre a data de entrega dos pareceres científicos e a data do Conselho de Dezembro, no qual são fixados os TAC e quotas e outras medidas de gestão relevantes, é muito curto e insuficiente para efectuar as consultas e obter o consenso necessário. É por isso que o Comité apela a que o prazo entre a publicação dos pareceres científicos e a tomada de decisões seja prolongado.

1.6

Quanto à ficha 2, que propõe a simplificação das medidas técnicas, o CESE receia que a Comissão possa vir a assumir competências que hoje cabem ao Conselho e de que seja a necessária harmonização das normas da Política Comum da Pesca seja comprometida caso os Estados-Membros sejam autorizados a adoptar medidas técnicas locais.

1.7

Quanto à possibilidade, também contemplada na ficha 2, de autorizar os Estados-Membros a adoptarem medidas técnicas locais, considera o CESE que o Conselho deveria aprovar também o solicitado pelos Estados-Membros para evitarem desigualdades e discriminações entre os repectivos pescadores.

1.8

O Comité concorda com as medidas propostas pela Comissão nas fichas 3, 4 e 5 a fim de simplificar o processo de recolha e gestão de dados e de tornar mais eficazes as medidas de controlo. Para a elaboração destas medidas é essencial a coordenação entre a Comissão e a Agência Comunitária de Controlo das Pescas. O CESE entende que deve haver um período de transição para a utilização das tecnologias de informação, necessário para definir o processo em coordenação com os técnicos, os profissionais do sector e os Estados-Membros, assegurar todas as garantias de sigilo comercial, obter a confiança e a adesão dos interessados, testar o processo em condições reais, contribuir para suportar os custos suplementares impostos pela utilização de novos materiais e, desta forma, assegurar o êxito desta campanha de simplificação.

1.9

O CESE acolhe com especial favor a proposta da Comissão, avançada na ficha 6, de eliminar a obrigação de apresentar relatórios supérfluos ou pouco úteis, com vista a reduzir a carga burocrática para os pescadores e os Estados-Membros.

1.10

O Comité tem como necessárias as medidas de simplificação anunciadas na ficha 7 e propõe à Comissão a elaboração de um acordo-tipo que sirva de base à negociação dos acordos de pesca com países terceiros e à introdução e emissão de licenças de pesca por via electrónica.

1.11

Na opinião do CESE, a luta contra a pesca ilícita, não declarada e não regulamentada (INDNR), que é um dos objectivos da PCP, deveria ter sido igualmente mencionada no plano de acção sob a forma de um objectivo dedicado a um processo de combate à INDNR tão simples e eficaz quanto possível. Esse processo deveria concentrar-se no acesso aos mercados de consumo, no reforço das competências do Estado do porto correspondente e na interdição dos transbordos no alto mar.

1.12

Por último, o CESE entende que o trabalho necessitado pelo plano de acção 2006-2008 é de tal envergadura que não pode ser realizado no espaço de três anos, pelo que recomenda que a Comissão reveja o plano antes do final de 2007.

2.   Justificação

2.1

Desde o início do século que a Europa se tem entregado à portentosa missão de melhorar toda a sua legislação para torná-la mais eficaz e transparente.

2.2

O desenvolvimento da União Europeia ao longo da segunda metade do século passado converteu o seu enquadramento legislativo num amplo corpus normativo que constitui o «acervo» comunitário.

2.3

Este acervo foi sendo aumentado com as legislações adoptadas para as diferentes políticas comunitárias e constitui no seu todo um quadro regulador da actividade da UE.

2.4

Actualmente, a Comissão, em conformidade com o mandato outorgado pelo Conselho, está empenhada numa acção coordenada com as outras instituições comunitárias para simplificar e melhorar o quadro regulamentar da legislação da UE.

2.5

Esta acção de simplificação e melhoria da legislação da UE integra-se plenamente na Estratégia de Lisboa revista para o crescimento e o emprego na Europa e centra-se, por isso, nos elementos do acervo que condicionam a competitividade das empresas europeias.

2.6

Atendendo a que as pequenas e médias empresas (PME) europeias representam 99 % do total das empresas da UE e dois terços dos postos de trabalho, a simplificação e a melhoria da legislação comunitária revestem para elas uma importância essencial, dado que reduzirão a carga legislativa e administrativa que actualmente suportam.

2.7

A Comissão prevê estabelecer, no âmbito desta estratégia de simplificação e melhoria da legislação comunitária, um programa permanente e contínuo de simplificação nos sectores da agricultura, do ambiente, da saúde e da segurança no trabalho, da pesca, da fiscalidade, das alfândegas, das estatísticas e do direito laboral.

2.8

A comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu — Plano de acção 2006-2008 para a simplificação e a melhoria da Política Comum da Pesca lança este programa permanente e contínuo para a PCP entre 2006 e 2008.

2.9

Enquanto representante institucional da sociedade civil organizada, o CESE, que manifestou já à Comissão, em anteriores pareceres, o seu apoio à simplificação da legislação europeia, aplaude a publicação deste plano de acção e emite o presente parecer com o objectivo de contribuir para o extraordinário trabalho da Comissão e de a animar a prosseguir.

3.   Historial

3.1

O Conselho Europeu de Lisboa de 23 e 24 de Março de 2000 incumbiu a Comissão de elaborar um plano de acção com vista a uma estratégia mais coordenada de simplificação do quadro legislativo. Este mandato foi posteriormente confirmado pelos Conselhos Europeus de Estocolmo (23 e 24 de Março de 2001), Laeken (8 e 9 de Dezembro de 2001) e Barcelona (15 e 16 de Março de 2002).

3.2

Nesta linha, a Comissão publicou em Julho de 2001 um Livro Branco sobre a Governança Europeia (1), o qual incluía uma secção consagrada à melhoria da qualidade da legislação. Este Livro Branco foi submetido a uma ampla consulta pública até 31 de Março de 2002.

3.3

No parecer que elaborou sobre esta comunicação, o CESE afirmou defender «as propostas do Livro Branco de simplificar e acelerar o processo legislativo europeu; de facto, as normas comunitárias são cada vez mais complexas e, por vezes, tendem a adicionar-se à regulamentação nacional existente em lugar de simplificá-la e harmonizá-la» (2).

3.4

A Comissão propôs em Junho de 2002 um plano de acção para simplificar e melhorar o quadro legislativa, que mais uma vez submeteu ao parecer das demais instituições comunitárias (3).

3.5

O plano de acção apela claramente a que, em complemento das três fases principais do ciclo legislativo (apresentação da proposta pela Comissão, debate da mesma no Parlamento Europeu e no Conselho, e aplicação do instrumento jurídico pelos Estados-Membros), se conclua um acordo interinstitucional para melhorar a qualidade da legislação comunitária.

3.6

A simplificação da legislação da UE, iniciada em anos anteriores, recebeu em Fevereiro de 2003 um novo impulso com a comunicação da Comissão «Actualizar e simplificar o acervo comunitário» (4). Partindo desta comunicação, a Comissão deu início a um vasto programa de identificação de actos legislativos passíveis de simplificação, consolidação e codificação, programa esse ainda hoje em curso.

3.7

A comunicação da Comissão «Legislar melhor para o crescimento e o emprego na União Europeia» (5), de Março de 2005, foi o corolário do Acordo interinstitucional «Legislar melhor», firmado em 16 de Dezembro de 2003 pelo Parlamento Europeu, pelo Conselho e pela Comissão, cujo objectivo principal é melhorar a qualidade da legislação comunitária e a sua transposição para as legislações nacionais (6).

3.8

Finalmente, em Outubro de 2005, a Comissão publicou, para aplicação do programa de Lisboa, a comunicação «Estratégia de simplificação do quadro regulador» (7), que lançou os planos de acção para as diferentes políticas comunitárias através de programas de simplificação contínuos.

3.9

Paralelamente ao exaustivo trabalho de simplificação e melhoria do acervo comunitário de legislação e do ambiente regulador, a Comissão enviou ao Conselho e ao Parlamento Europeu a comunicação «Perspectivas de simplificação e de melhoria do ambiente regulador da política comum da pesca» (8).

3.10

Esta última comunicação e as ora apresentadas pela Comissão como «Plano de acção 2006-2008 para a simplificação e a melhoria da Política Comum da Pesca» constituem o objecto do presente parecer.

3.11

O CESE, cônscio da complexidade de simplificar e melhorar toda a legislação comunitária, exorta a Comissão a prosseguir na via já encetada e a respeitar os prazos estipulados para alcançar os objectivos que se propôs.

4.   Observações na generalidade

4.1   Legislação comunitária no domínio da pesca 1983-2002

4.1.1

A legislação comunitária no sector fora introduzida pela Política Comum da Pesca de 1983. A legislação imposta por essa política era insuficiente e demasiado complexa, dado que as suas normas de gestão da pesca se baseavam na conversão directa de conclusões científicas em disposições jurídicas, que a comunicação com o sector comunitário das pescas era praticamente inexistente e que o processo de decisão entre Comissão, Conselho e Parlamento Europeu era demasiado moroso.

4.1.2

Qualquer evolução, passada ou presente, deve ter em conta que a legislação para o sector engloba, por um lado, um conjunto heterogéneo de pescarias e, por outro, componentes diversas como estruturas, conservação e ambiente, recursos externos, mercados e controlos. Esta diversidade torna necessária uma grande quantidade de regulamentos, ou pelo menos de regulamentos muito extensos e de difícil interpretação.

4.1.3

Acresce que o processo de decisão do Conselho, que no final de cada ano fixa TAC e quotas, dificulta a realização de todas as consultas necessárias e a observância de prazos adequados entre as decisões e as datas de aplicação, o que por sua vez ocasiona grande número de alterações aos regulamentos publicados.

4.1.4

A necessária acumulação de alterações às diferentes disposições que regulamentam a Política Comum da Pesca dificulta para o cidadão comum e para os pescadores a leitura de textos redigidos por peritos, que elaboram as disposições jurídicas muitas vezes com base em textos científicos de difícil interpretação.

4.1.5

Noutros casos, as negociações no Conselho e no Parlamento Europeu resultam num texto final mais complexo ainda do que as propostas originais.

4.1.6

Por último, algumas das disposições foram inscritas em regulamentos de um nível jurídico e político superior ao estritamente necessário, o que dificulta a sua alteração e simplificação.

4.1.7

O CESE reconhece que, embora as causas de muitas destas situações continuem a verificar-se, a Comissão está ciente delas e tem tomado as medidas necessárias para as corrigir, como já sucedeu em 1992 com a alteração da PCP de 1983 e com o plano de acção 2006-2008 agora apresentado após a reforma da PCP em 31 de Dezembro de 2002.

4.2   Legislação comunitária actual no domínio da pesca

4.2.1

A reforma da Política Comum da Pesca de 31 de Dezembro de 2002 (9) implica necessariamente a simplificação da mesma, tendo já sido tomadas várias medidas de revogação e regulamentação, declaração de expiração e revisão sistemática do quadro legislativo.

4.2.2

A proposta de regulamento que cria um Fundo Europeu para as Pescas (10), sobre a qual o Comité emitiu já parecer favorável, constitui um bom exemplo da planificação desta iniciativa de simplificação, ao substituir ou concentrar num só regulamento os quatro que regulavam os Programas de Orientação Plurianuais (POP) e o Instrumento Financeiro de Orientação da Pesca (IFOP).

4.2.3

Em 2004 e 2005, a Comissão foi adoptando uma série de actos legislativos que contribuirão para facilitar a reforma e a simplificação da PCP. Cumpre destacar os seguintes:

O Fundo Europeu para as Pescas;

A Agência Comunitária de Controlo das Pescas;

A criação dos Conselhos Consultivos Regionais (CCR);

Medidas financeiras comunitárias para a aplicação da Política Comum da Pesca e o direito marítimo.

Além disso, a Comissão investiu numa ampla reflexão, com numerosos contactos e debates, que culminou na apresentação da comunicação anteriormente referida «Perspectivas de simplificação e de melhoria do ambiente regulador da política comum da pesca».

4.2.4

Dessa comunicação se deduz que para melhorar o ambiente regulador da Política Comum da Pesca não basta diminuir o número de regulamentos, mas é preciso também:

promover a clareza dos textos actuais, simplificá-los e torná-los mais acessíveis;

reduzir os encargos e os custos administrativos das administrações públicas;

diminuir encargos administrativos e outras obrigações para os profissionais.

4.2.5

O CESE entende que a Comissão, em qualquer acção destinada a promover a clareza dos textos, deve empenhar-se sobretudo na consolidação dos mesmos. As referências constantes a outros regulamentos de anos anteriores dificulta enormemente a compreensão dos textos.

4.2.6

De acordo com a comunicação referida, é patente que alguns elementos da PCP tornam especialmente difícil o seu cumprimento, como é o caso do controlo das actividades de pesca, entravado pela divergência na sua aplicação entre os diferentes Estados-Membros, ou das medidas de conversação dos recursos, devido à aplicação simultânea de disposições de gestão distintas.

4.2.7

A análise deixa claro que, sem negar a complexidade inerente à gestão da pesca comunitária, a legislação em vigor se tornou, progressivamente, demasiado complexa.

4.2.8

O CESE é de opinião que a Comissão deve promover a melhoria e a simplificação da legislação da PCP dando especial destaque ao controlo das actividades piscatórias e às medidas de conversação dos recursos. Neste sentido, haverá que reforçar a actuação da Agência Comunitária de Controlo das Pescas, recentemente criada.

4.3   Plano de acção 2006-2008 para a simplificação e a melhoria da Política Comum da Pesca

4.3.1

Na sequência dos trabalhos realizados com base nas diferentes comunicações acima citadas, o Conselho solicitou à Comissão a elaboração de um plano de acção plurianual que obedecesse a todos os requisitos definidos e promovesse a simplificação e a melhoria da PCP. Em resposta a esta solicitação, a Comissão apresentou em Dezembro de 2005 a comunicação — Plano de acção 2006-2008 para a simplificação e a melhoria da Política Comum da Pesca (11).

4.3.2

O plano de acção proposto pela Comissão inclui:

Uma metodologia de simplificação e melhoria da PCP;

Uma definição das iniciativas a simplificar e melhorar prioritariamente.

4.3.3

O plano de acção é assaz simples nas suas linhas gerais. Indica os âmbitos (controlos, esforço de pescas, financiamento) em que se propõe actuar simplificando e melhorando os textos legislativos. Para cada um desses âmbitos, especifica as medidas necessárias, quem deve intervir no processo de simplificação e os prazos a observar no período 2006-2008. Por último, estabelece três categorias de actos para cada um dos âmbitos a tratar:

Actos legislativos cuja revisão foi já iniciada;

Actos legislativos que serão elaborados nos próximos anos;

Actos legislativos em vigor mas a simplificar prioritariamente.

4.3.4

É nestes últimos que o plano de acção 2006-2008 se concentra essencialmente. Todos encerram disposições jurídicas aplicáveis às medidas de gestão e controlo das actividades de pesca.

4.3.5

O CESE considera acertada a selecção destes dois domínios para as acções prioritárias do plano de acção, já que é sobretudo em torno deles que se foi gerando a complexidade da legislação actual. Posteriormente, a Comissão deverá prosseguir com o processo de simplificação e melhoria do resto da PCP.

4.3.6

Os actos legislativos cuja revisão já foi iniciada e aos quais foram aplicados certos princípios de simplificação seguirão os seus trâmites com base no plano de acção. É o caso do Fundo Europeu para as Pescas, ou das disposições gerais em matéria de autorização da pesca nas águas de um país terceiro no âmbito de um acordo de pesca. Ambos estes actos legislativos, já simplificados pela Comissão, auferiram parecer positivo do CESE.

4.3.7

O plano de acção prevê que os novos actos legislativos a elaborar nos próximos anos respeitem sistematicamente os objectivos fixados em matéria de simplificação.

4.3.8

O Comité apoia o plano de acção 2006-2008, que considera adequado nas suas linhas gerais. Não obstante, a execução do plano descrito no anexo ao plano de acção requererá um grande esforço de simplificação para poder ser concluído dentro dos prazos estipulados. Serão primordiais a cooperação e o entendimento com os Estados-Membros, o Parlamento Europeu, o sector das pescas, através dos seus CCR, o Comité Consultivo da Pesca e da Aquicultura (CCPA) e o Comité de Diálogo Sectorial Pesca.

4.3.9

O plano de acção concentra-se prioritariamente nos domínios e nos actos legislativos seguintes:

Conservação dos recursos haliêuticos:

TAC/quotas, esforço de pesca;

Medidas técnicas de protecção dos juvenis de organismos marinhos;

Recolha e gestão dos dados para a PCP.

Controlo das actividades de pesca:

Controlo — Acervo legislativo;

Controlo — Informatização;

Obrigações em matéria de elaboração de relatórios;

Autorizações de pesca fora das águas comunitárias.

4.3.10

Cada um destes sete actos legislativos está descrito no Anexo ao plano de acção sob a forma de uma ficha que explica as medidas de simplificação previstas para melhorar o ambiente regulador vigente e o quadro administrativo correspondente. Para medida é apresentada a programação prevista, com os intervenientes que nela participarão, bem como a lista dos instrumentos jurídicos que devem ser simplificados e dos documentos de referência relevantes para a simplificação.

4.3.11

O CESE considera, após análise detida de cada uma das fichas, que a revisão e a simplificação propostas são adequadas e que o plano de acção 2006-2008, se posto em prática dentro dos prazos indicados e observando todos os passos indicados nas fichas, permitirá uma enorme melhoria da legislação da UE no domínio da pesca.

4.3.12

A ficha 1 do plano de acção propõe medidas de simplificação para TAC/quotas — esforço de pesca. Basicamente, incide sobre a simplificação dos regulamentos anuais do Conselho que estabelecem para o ano seguinte as possibilidades de pesca e as disposições relativas às condições de exploração dos recursos haliêuticos, orientando as decisões para grupos homogéneos e definindo planos de gestão plurianuais dos mesmos.

4.3.13

O CESE julga correctas as medidas de simplificação propostas na ficha 1, considerando fundamental o tratamento diferenciado dos diferentes aspectos da política de conservação, sua regulamentação em grupos homogéneos e sua efectuação através de planos de gestão plurianuais.

4.3.13.1

Todavia, o CESE entende que o prazo entre a data de entrega dos pareceres científicos e a data do Conselho de Dezembro, no qual são fixados os TAC e quotas e outras medidas de gestão relevantes (como a limitação do esforço de pesca), é um entrave à realização de todas as consultas e da concertação necessárias. A legislação resultante deste processo de decisão precipitado e complexo pode resultar em imperfeições técnicas ou jurídicas que tornem necessários regulamentos correctores, os quais vêm complicar ainda mais a legislação e a respectiva aplicação. A insuficiente consulta de profissionais e de outros interessados compromete seriamente a compreensão, a aceitação e a aplicação da legislação e, logo, a sua eficácia.

4.3.13.2

Da mesma forma, o CESE entende que o processo de decisão sobre as medidas de gestão das organizações regionais de pesca (ORP) enferma também de um prazo insuficiente entre a apresentação do parecer científico e a reunião do órgão de decisão. Esse prazo insuficiente leva aos mesmos efeitos já assinalados no ponto anterior.

4.3.13.3

No que se refere à abordagem por «grupos homogéneos» proposta pela Comissão, o CESE considera-a pertinente, sobretudo se a mesma significar, como espera o Comité, uma abordagem por «pescaria homogénea» e uma legislação a dois níveis: um regulamento-quadro horizontal e um regulamento de aplicação por pescaria.

4.3.13.4

Por outro lado, a experiência revela que os planos de recuperação e os planos de gestão plurianuais permitem uma consulta alargada e uma boa concertação com os interessados. Tais planos, uma vez adoptados, simplificam o processo de decisão dos anos de aplicação. No entanto, o CESE considera que importa respeitar a actual repartição de competências entre o Conselho e a Comissão e prever a possibilidade de revisão à luz dos critérios que permitem avaliar o estado das populações em questão.

4.3.14

Para o CESE, a revisão do processo de decisão das medidas de gestão dos recursos, essencial para a simplificação da legislação e para a melhoria da sua eficácia, exige que o prazo de entrega dos pareceres e recomendações científicos (do Conselho Internacional para o Estudo do Mar (CIEM) e do Comité Consultivo para a Gestão das Pescas (ACFM) para as águas comunitárias, dos comités científicos das ORP para as águas não comunitárias) seja antecipado, permitindo assim uma verdadeira consulta dos CCR e da CCPA. Pode também implicar a distribuição do «pacote TAC e quotas» entre diferentes formações do Conselho e a mudança do ano de gestão a fim de o aproximar do ano biológico e adequá-lo melhor às necessidades do mercado. Trata-se, pois, de um processo global, sem se limitar apenas a uma concentração inicial dos recursos. Deve ser analisado em todos os seus aspectos e conduzir a uma concertação tão ampla quanto possível com os Estados-Membros, os profissionais do sector e os restantes interessados.

4.3.15

A ficha 2 visa reformar a legislação vigente em matéria de protecção dos juvenis de organismos marinhos, mediante o agrupamento gradual das medidas técnicas por pescarias. Embora o CESE apoie este método de agrupamento por pescaria para todas as medidas de gestão, considera que ele deve ser prioritariamente aplicado às medidas técnicas. O sistema proposto pela Comissão baseia-se na restruturação do dispositivo jurídico que regulamenta essas medidas, passando o Conselho a determinar as orientações gerais e a Comissão os aspectos técnicos em mais pormenor. O CESE confessa-se preocupado ante uma simplificação que confira à Comissão competências que hoje pertencem ao Conselho. Nesse sentido, defende que mesmo que a legislação seja elaborada de acordo com a proposta, a decisão final continue a caber ao Conselho.

4.3.16

No que toca à eventualidade de autorizar os Estados-Membros a adoptar medidas técnicas locais, previstas na ficha 2, o CESE observa que tal autorização pode gerar desigualdades e discriminação entre pescadores de Estados-Membros diferentes em caso de abuso ou de falta de controlos adequados, em detrimento da necessária harmonização das normas da Política Comum de Pesca. Assim, entende que as iniciativas dos Estados-Membros a este respeito devem também ser submetidas à aprovação do Conselho.

4.3.17

Para a aplicação na prática das medidas propostas, a Comissão considera necessário promover as consultas prévias do sector, avaliar os resultados das medidas técnicas aplicadas, definir melhor alguns conceitos técnicos, produzir folhetos e documentos de informação, recorrer às tecnologias da informação e reduzir as obrigações em matéria de apresentação de relatórios pelos pescadores. O CESE, sem pôr em causa a pertinência destas acções, recorda à Comissão que o recurso às tecnologias da informação para a recolha e gestão dos dados requer um processo de adaptação e um apoio financeiro que permitam adequar as embarcações às novas tecnologias. O CESE entende que deve haver um período de transição razoável para definir o processo em coordenação com os técnicos, os profissionais do sector e os Estados-Membros, assegurar todas as garantias de sigilo comercial, obter a confiança e a adesão dos interessados, testar o processo em condições reais, contribuir para suportar os custos suplementares impostos pela utilização de novos materiais e, desta forma, assegurar o êxito desta campanha de simplificação.

4.3.18

A ficha 3 propõe a simplificação dos textos jurídicos sobre recolha e gestão de dados para a PCP. Tal como na ficha 2, esta simplificação implica a restruturação do dispositivo jurídico actual em um regulamento geral a adoptar pelo Conselho e um regulamento de aplicação, com os aspectos técnicos e administrativos, a adoptar pela Comissão. O CESE reitera a apreensão manifestada no ponto 4.3.15 quanto à assunção pela Comissão de competências do Conselho.

4.3.19

Na ficha 3, a Comissão propõe a elaboração de um programa plurianual de recolha e gestão de dados a fim de diminuir a carga administrativa para os Estados-Membros. O Comité julga oportuna e necessária a proposta da Comissão, sem prejuízo das reservas expressas no ponto 4.3.17.

4.3.20

A ficha 4 propõe a revisão da actual legislação em matéria de controlos e a adequação dos regulamentos em vigor à reforma da PCP. O CESE atribui enorme importância à revisão dos regulamentos em matéria de controlos a fim de harmonizar as diferentes normas e evitar interpretações díspares. Todas as disposições de inspecção e controlo devem ser assaz claras no que respeita aos conceitos de inspecção, aos métodos de realização da inspecção e às formas concretas de as efectuar. Em qualquer dos casos, o Comité apela a que a simplificação da legislação em matéria de controlos tenha sempre em conta a existência da Agência Comunitária de Controlo das Pescas.

4.3.21

Na ficha 5, a Comissão propõe a revisão da totalidade das disposições sobre controlo e informatização e prevê a elaboração de regulamentos assim que o Conselho tenha tomado uma decisão quanto à proposta de regulamento relativo ao registo e à transmissão electrónica de dados sobre as actividades de pesca e aos sistemas de teledetecção (12). O mesmo vale para a informatização da gestão dos acordos de pesca com países terceiros sobre as licenças de pesca e para os dados de captura e esforço de pesca relacionados com esses acordos. Posto que reconheça a conveniência desta informatização dos sistemas de controlo, o CESE reitera as considerações expendidas no ponto 4.3.17 quanto à necessidade de um período de transição para a aplicação das tecnologias da informação.

4.3.22

A ficha 6 prevê a revisão do conjunto do corpo legislativo da PCP, a fim de eliminar as disposições que criam obrigações em matéria de elaboração de relatórios com pouco ou nenhuma utilidade para a boa execução da PCP. O CESE considera necessário eliminar a obrigação de apresentar relatórios supérfluos ou pouco úteis, com vista a reduzir a carga burocrática para os pescadores e os Estados-Membros.

4.3.23

Por último, a ficha 7 contempla a simplificação da autorização de pesca fora das águas comunitárias com base na revisão dos dispositivos relativos à gestão dos acordos de pesca com países terceiros. A simplificação envolve a reorganização do dispositivo jurídico actual, devendo o Conselho definir os princípios básicos e a Comissão os aspectos técnicos e administrativos. O Comité tem como necessárias estas medidas de simplificação e propõe à Comissão a elaboração de um acordo-tipo que sirva de base à negociação dos acordos de pesca com países terceiros e à introdução e emissão de licenças de pesca por via electrónica.

4.3.24

O CESE entende que a simplificação e a melhoria da PCP para as frotas que operam fora das águas comunitárias requer igualmente uma abordagem por pescaria e um tratamento inteiramente específico a todos os níveis: frota, autorizações, licenças, declarações, etc. Com efeito, as embarcações que arvoram pavilhões dos Estados-Membros e que pescam fora das águas comunitárias devem ter direitos e obrigações adaptados às capturas que efectuam e à zona em que actuam. O CESE apela, pois, a que a Comissão inclua no seu plano de acção este objectivo, que não deve limitar-se unicamente ao capítulo «acordos de pesca» (ou acordos de associação). Assinala, a este propósito, o Comité a necessidade de cumprimento da cláusula social aceite pelos interlocutores sociais comunitários.

4.3.25

A concluir, o CESE considera que a luta contra a pesca ilícita, não declarada e não regulamentada (INDNR), que é um dos objectivos da PCP (sobretudo na sua dimensão externa), deveria ter sido igualmente mencionada no plano de acção sob a forma de um objectivo dedicado a um processo de combate à INDNR tão simples e eficaz quanto possível. Esse processo deveria concentrar-se no acesso aos mercados de consumo, no reforço das competências do Estado do porto correspondente e na interdição dos transbordos no alto mar.

5.   Observações na especialidade

5.1

O plano de acção 2006-2008 descrito na comunicação da Comissão é de enorme importância para melhorar a legislação comunitária em matéria de pesca. O CESE não tem conhecimento, nos domínios do controlo e da gestão dos recursos haliêuticos, de outros actos legislativos complementares relevantes que considere devam ser acrescentados aos propostos pela Comissão, pelo que a exorta a rever estes sem demora.

5.2

Para o Comité, de entre todos os actos legislativos a melhorar e simplificar assume especial importância o relativo aos TAC/quotas e esforço de pesca para o desenvolvimento de planos de gestão plurianuais.

5.3

A execução do plano de acção 2006-2008 poderá obrigar a Comissão a elaborar novos regulamentos de aplicação. O CESE tem para si que este aumento do número de regulamentos não é necessariamente problemático, contanto que os novos regulamentos sejam mais simples, mais bem orientados para as pescarias afectadas, mais acessíveis e tão bem consolidados quanto possível.

5.4

Sobre este último aspecto, o Comité chama a atenção da Comissão para a dificuldade de interpretar a legislação actual no domínio da pesca, que inclui inumeráveis remissões para outros regulamentos, directivas e comunicações. A consolidação de textos é essencial para a sua fácil leitura e compreensão.

5.5

Para a aplicação das normas de controlo é essencial a coordenação entre a Comissão e a Agência Comunitária de Controlo das Pescas. A Agência Comunitária de Controlo das Pescas deve intervir para resolver as diferenças de interpretação da legislação comunitária de controlo das pescas pelos Estados-Membros, queixa muito frequente entre os pescadores.

5.6

A terminar, o Comité considera que a informatização da legislação comunitária no domínio da pesca é essencial para o acesso universal aos textos comunitários por via electrónica. Não obstante, a integração das novas tecnologias da informação nas embarcações de pesca deve efectuar-se sem custos para os pescadores e sempre de forma progressiva, já que alguns tipos de equipamento informático podem revelar-se inadequados nas embarcações.

5.7

O Comité encoraja a Comissão a enfrentar todas as dificuldades com que se deparará na execução do plano de acção, que será necessário e benéfico para o sector comunitário das pescas.

Bruxelas, 5 de Julho de 2006.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  COM(2001) 428 final de 30.7.2001.

(2)  JO C 125 de 27 de Maio de 2002, pág. 61 (COM(2001) 428 final «Governança Europeia — Um Livro Branco»).

(3)  COM(2002) 278 final de 5.6.2002 — Plano de acção «Simplificar e melhorar o ambiente regulador».

(4)  COM(2003) 71, de Fevereiro de 2003.

(5)  COM(2005) 97, de Março de 2005.

(6)  JO C 321, de 31.12.2003, e Rectificação, JO C 4, de 8.1.2004.

(7)  COM(2005) 535, de Outubro de 2005 «Aplicar o Programa Comunitário de Lisboa — Estratégia de simplificação do quadro regulador».

(8)  COM(2004) 820 de 15.12.2004.

(9)  Regulamento (CE) n.o 2371/2002 do Conselho.

(10)  COM(2004) 497 final.

(11)  COM(2005) 647 final, de 8.12.2005.

(12)  COM(2004) 724 final.


16.12.2006   

PT

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C 309/67


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Estratégia Temática sobre a Utilização Sustentável dos Recursos Naturais»

COM(2005) 670 final — [SEC(2005) 1683 + SEC(2005) 1684]

(2006/C 309/14)

Em 21 de Dezembro de 2005, nos termos do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, o Conselho decidiu consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente, que emitiu parecer em 24 de Maio de 2006 sendo relator L. RIBBE.

Na 428.a reunião plenária de 5 e 6 de Julho de 2006 (sessão de 5 de Julho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 157 votos a favor, 2 votos contra e 6 abstenções o seguinte parecer.

1.   Síntese das conclusões e das recomendações do Comité

1.1

O CESE apoia no geral a comunicação da Comissão sobre a «Estratégia Temática sobre a Utilização Sustentável dos Recursos Naturais» e subscreve o objectivo nela formulado de melhorar a produtividade e a eficiência dos recursos naturais, o que significa não só continuar a dissociar o crescimento económico do consumo desses recursos como também reduzir simultaneamente o impacto ambiental desse consumo.

1.2

O CESE relembra a sua posição, há dois anos transmitida à Comissão, segundo a qual qualquer estratégia da Comissão neste domínio terá de se dedicar com igual empenho à questão dos recursos não renováveis. Uma crítica central do CESE incide precisamente no facto de este documento da Comissão não o fazer.

1.3

No entender do CESE, a estratégia teria de conter dados inequívocos sobre os recursos não renováveis, que teriam sem dúvida de ir além do horizonte temporal para ela previsto (25 anos). O CESE considera assim oportuno completar a estratégia e prolongar o seu período de vigência para 50 a 100 anos, notando contudo que tal implicará fixar fases intermédias para a sua execução.

1.4

Por outro lado, há que ter em conta que para a preservação de certos recursos naturais (os recursos haliêuticos, por exemplo) já não é possível desperdiçar mais tempo e que é urgente tomar medidas concretas nesta área.

1.5

Para uma verdadeira estratégia ter êxito é indispensável começar por formular objectivos claros e tangíveis e definir de seguida instrumentos concretos, com designações claras, para alcançar os primeiros (é nisso que consiste uma estratégia). Mas é em vão que se procuram no documento da Comissão os ditos objectivos claros ou os respectivos instrumentos concretos, e isso deve-se certamente ao facto de não poder haver uma estratégia capaz de englobar a multiplicidade dos recursos naturais existentes. Para tanto, são realmente precisas estratégias sectoriais específicas, como as que a Comissão está já em parte a elaborar.

1.6

O CESE não pode, pois, considerar a comunicação da Comissão uma estratégia no verdadeiro sentido do termo, vendo-a antes como uma filosofia de fundo, certamente correcta e meritória, mas incapaz de se materializar recorrendo apenas às bases de dados nela propostas ou às equipas de peritos nela previstas.

2.   Elementos principais e contexto do parecer

2.1

Em 1.10.2003 a Comissão Europeia publicou uma comunicação ao Conselho e ao Parlamento Europeu intitulada «Para uma Estratégia Temática sobre a Utilização Sustentável dos Recursos Naturais» (1), na qual se examinavam as bases dessa estratégia e se iniciava um primeiro processo de consulta dos círculos da sociedade nela interessados.

2.2

Na altura, no parecer de 28 de Abril de 2004 sobre a utilização sustentável dos recursos naturais (2), o CESE apoiou basicamente a proposta da Comissão.

2.3

Em 21.12.2005 a Comissão apresentou então ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao CESE e ao CR a «Estratégia Temática sobre a Utilização Sustentável dos Recursos Naturais», cujo documento (3) é objecto do presente parecer.

2.4

Também desta vez o CESE acolhe favoravelmente a proposta de «estratégia» que lhe é apresentada, examinando-a em combinação com a estratégia de desenvolvimento sustentável. Todavia, a seu ver, para responder de forma duradoura aos desafios que se colocam, qualquer estratégia europeia para a preservação dos recursos naturais terá necessariamente de contemplar tanto os recursos renováveis como os não renováveis. Assim, se bem que a comunicação avance claramente no bom sentido, o CESE não considera suficientes as iniciativas e acções nela descritas.

3.   Observações sobre o teor da comunicação da Comissão

3.1

A análise que a Comissão faz dos problemas a resolver não permite distinguir claramente as suas duas comunicações. É afirmado que:

o funcionamento da nossa economia depende da existência e, por conseguinte, da disponibilidade, de recursos naturais, sejam eles regenerativos ou não,

os recursos naturais são importantes para a nossa qualidade de vida,

os actuais modelos de utilização de recursos não poderão ser preservados, mesmo se «a Europa melhorou significativamente a eficiência dos materiais»,

uma dissociação mais radical entre crescimento económico e utilização/consumo dos recursos se torna, por conseguinte, urgente, e que

a utilização ineficiente dos recursos e a sobreexploração dos recursos renováveis constituem travões a longo prazo para o crescimento.

3.2

O documento em causa acentua contudo mais resolutamente ainda que não se trata apenas de dissociar o crescimento económico da afectação dos recursos, mas também de reduzir o impacto ambiental da utilização (reduzida ou a reduzir) dos mesmos, uma espécie de dupla estratégia que a Comissão já há anos, antes da decisão sobre a estratégia em favor do desenvolvimento sustentável, definiu como «conceito do “factor dez”».

3.3

O que precede pode ser ilustrado através do seguinte exemplo: as centrais a carvão modernas já produzem actualmente, graças ao seu rendimento acrescido, um quilowatt-hora de corrente com uma utilização mínima de recursos. Mas os esforços para reduzir a poluição prosseguem, procurando-se, por exemplo, reduzir o impacto ambiental de cada tonelada de carvão recorrendo às chamadas centrais «de impacto neutro», nas quais o CO2 produzido é «fixado» e armazenado a nível subterrâneo.

3.4

A «estratégia» em exame mostra que o pressuposto da eficiência na utilização de qualquer recurso natural é elevado a princípio geral, o que o CESE muito aprecia.

Observações críticas do CESE

3.5

Muito embora o CESE apoie totalmente a abordagem da Comissão, não pode deixar de fazer algumas observações bastante críticas sobre a «estratégia» em causa:

3.6

A Comissão refere na sua comunicação que importa distinguir entre recursos renováveis e não renováveis e que é nos primeiros (como, por exemplo, nos recursos haliêuticos ou dos recursos de água doce) que residem os problemas prioritários.

3.7

A Comissão sublinha que a utilização dos recursos foi tema dos debates sobre a política ambiental europeia dos últimos 30 anos (e continua a sê-lo) e que «na década de 1970, na sequência das primeiras crises petrolíferas […] a escassez dos recursos naturais e os limites ao crescimento […] era uma preocupação importante», mas admite que «a escassez não se revelou tão problemática a nível ambiental como então previsto» e que «o mundo não esgotou os combustíveis fósseis, e o mercado, através do mecanismo de preços, regulou a escassez».

3.8

Com efeito, o problema ambiental não reside em primeiro lugar no facto de um recurso não regenerativo escassear, estar ainda disponível ou deixar de o estar. O problema ambiental — e é precisamente este o postulado da Comissão — provém das consequências da utilização e da sobreexploração dos recursos (para o clima, por exemplo). Do ponto de vista ambiental, não deveria pois considerar-se problemático que a energia solar armazenada sob a forma de petróleo, carvão ou gás se esgotasse. Não obstante, o CESE alerta para o facto de uma eventual indisponibilidade dos recursos não renováveis constituir um problema dramático para a economia — e nessa medida, também um problema social — com consequências consideráveis para o nível de vida das pessoas. Isso significa que a questão que se coloca não é apenas o impacto ambiental da utilização dos recursos, mas necessariamente também o potencial acesso das gerações actual e futuras aos recursos naturais. Daí que um dos principais desafios das próximas décadas no quadro do debate sobre o desenvolvimento sustentável seja o de dever garantir a disponibilidade dos recursos às gerações futuras. A questão da escassez dos recursos não é por isso, no entender do CESE, uma questão exclusivamente ambiental, mas uma questão de desenvolvimento sustentável, que, como é do conhecimento geral, engloba critérios ambientais, sociais e económicos.

3.9

A referência feita pela Comissão ao «mercado», que reage ao escassear da oferta com um agravamento dos preços, está perfeitamente correcta. Os impressionantes aumentos do preço do petróleo registados nos últimos meses, que afectaram seriamente a economia europeia, não se devem de certeza apenas ao facto de se prever um esgotamento desses recursos não renováveis a longo prazo, mas sobretudo ao poder que os produtores — em parte monopólios — exercem sobre o mercado, bem como às instabilidades políticas verificadas nos países que mais dispõem destes recursos.

3.10

O CESE gostaria de remeter para as observações por ele formuladas há dois anos, num parecer sobre um projecto da Comissão nesta matéria: uma «estratégia» que apenas visa os próximos 25 anos e não contempla, ou só superficialmente, a escassez (ou extinção), absolutamente previsível a longo prazo, de certos recursos não renováveis fundamentais (como é o caso dos combustíveis fósseis) dá um sinal político errado à sociedade. Na opinião do CESE, a disponibilidade dos recursos não renováveis constitui um critério decisivo para assumir de forma responsável os critérios de desenvolvimento sustentável exigidos.

3.11

O CESE lembra neste contexto que muitos sectores económicos não dependem só da disponibilidade dos combustíveis fósseis, mas também do seu fornecimento «barato». As economias organizadas em função desta dependência são as que terão maiores dificuldades de adaptação. Nessa medida, o CESE subscreve uma vez mais a afirmação da Comissão de que «a utilização ineficiente dos recursos constitui [um travão] […] para o crescimento».

3.12

De momento, ainda será em parte possível compensar o aumento dos preços dos recursos com medidas de eficiência energética, mas em muitos sectores, como o dos transportes e da energia, a escassez e os preços extremamente elevados poderão obrigar a adaptações estruturais de muito maior envergadura. Podendo estas requerer investimentos extremamente elevados, há que proceder quanto antes aos ajustes necessários, a fim de evitar erros na atribuição dos recursos financeiros.

3.13

Um exemplo de semelhante visão estratégica a longo prazo é o anúncio feito pelo governo sueco da sua intenção de, por um lado, abandonar a energia nuclear e, por outro, começar a prescindir do consumo do petróleo. É evidente que tal caminhada só é concebível a longo prazo, mas o primeiro passo deve ser dado quanto antes, de forma a evitar toda e qualquer ruptura futura para a economia e a sociedade.

3.14

O CESE considera que uma estratégia da UE devia colocar activamente este tipo de questões, mas ela não o faz, pelo que ele se pergunta se isso não se deverá ao facto de o período de 25 anos previsto pela Comissão para esta estratégia da UE ser demasiado curto. Já o CESE não pode aceitar que a Comissão refira que não é em princípio de esperar uma escassez grave dos recursos não renováveis durante esse período e contorne assim toda a questão destes recursos. É preciso que a Comissão forneça dados claros sobre a situação dos recursos não renováveis e que o faça para além do actual horizonte temporal da estratégia. Tal obrigará a prolongar à partida o período de vigência da estratégia para 50 a 100 anos, o que, na perspectiva da utilização dos recursos, constitui um período ainda relativamente curto. É claro que perante um período dessa extensão haveria que fixar etapas intermédias para a execução parcial dos objectivos a longo prazo. O CESE recorda que a Comissão anunciou um procedimento semelhante numa comunicação de 2005 (4).

3.15

Nesta sua comunicação, a Comissão designa como objectivo geral da estratégia o de «reduzir os impactos ambientais negativos decorrentes da utilização dos recursos naturais numa economia em crescimento». Ora ninguém na Europa iria opor-se a um objectivo tão geral e tão vago.

3.16

A Comissão prescinde conscientemente de fixar «objectivos estratégicos […] nesta fase incial» da estratégia. O CESE considera isso fundamentalmente errado. Por um lado, não estamos em fase inicial nenhuma, pois os problemas são conhecidos desde há anos, senão mesmo há décadas. Por outro, o CESE tem lembrado por diversas ocasiões que uma estratégia não pode ter sucesso se não enunciar objectivos claros. Isto porque uma estratégia é, por definição, um plano para alcançar objectivos previamente estabelecidos. Se faltam os objectivos, ou se estes são formulados de forma não vinculativa ou demasiado geral, é a própria política que fica sem saber que instrumentos políticos utilizar nem quando.

3.17

Por isso o CESE não vê a «Estratégia Temática sobre a Utilização Sustentável dos Recursos Naturais» como uma verdadeira estratégia, mas sim — saliente-se — como uma muito acertada filosofia de fundo, para a qual falta ainda conceber estratégias diferenciadas para os diferentes recursos naturais.

3.18

O CESE constata ainda a óbvia impossibilidade de tratar global e exaustivamente todos os recursos naturais numa só estratégia. A matéria em causa é simplesmente demasiado complexa. Daí parecer-lhe indispensável integrar esta (correcta) filosofia de fundo tanto em estratégias individualizadas específicas, como também na política geral. É, aliás, precisamente por isso que a Comissão anunciou, praticamente em paralelo com a apresentação da «estratégia» em exame, uma «Estratégia temática de prevenção e reciclagem de resíduos» (5) (e indirectamente também dos recursos naturais), bem como uma «Estratégia temática de protecção do solo». As decisões estratégicas pertinentes têm de estar ancoradas nas respectivas políticas sectoriais.

3.19

Tal permitiria a todos os interessados identificar mais claramente que estratégia visa o quê. Por outro lado, dispor de exemplos concretos permitiria estabelecer transversalmente elos com outras estratégias e políticas sectoriais a nível da UE e dos Estados-Membros e fixar mais claramente as respectivas responsabilidades, o que, por sua vez, daria mais garantias da concretização dos ditos objectivos estratégicos.

3.20   Quatro iniciativas para a concretização dos objectivos

A Comissão enuncia na sua comunicação quatro novas iniciativas, destinadas a estabelecer as bases da estratégia a seguir nos próximos 25 anos:

a «constituição da base de conhecimentos», que inclui a criação de um «centro de dados para os responsáveis políticos»;

a «aferição dos progressos», pela qual se entende o desenvolvimento de diversos indicadores até 2008;

a «dimensão interna», através da qual a Comissão propõe, por um lado, que cada Estado-Membro da UE desenvolva medidas e programas nacionais sobre a utilização sustentável dos recursos naturais, e prevê, por outro, a criação de um «Fórum de Alto Nível, composto por funcionários superiores, responsáveis pelo desenvolvimento da política de recursos naturais nos Estados-Membros» e integrando representantes da Comissão, como também, «conforme adequado» (seja o que for que isto quer dizer) organizações de consumidores, ONG ambientais, indústria, meio académico, etc.);

e a «dimensão global», através da qual se prevê a criação de um «painel internacional».

3.21

O CESE não duvida da pertinência e da utilidade de semelhantes centros de dados e novos painéis de peritos. Quanto mais sabemos e quantas mais pessoas, sobretudo com responsabilidades políticas, se ocuparem desta matéria, melhor é.

3.22

E, no entanto, o CESE não pode deixar de perguntar à Comissão se ela acredita ter elaborado uma «estratégia» capaz de exercer uma verdadeira influência política. Isto porque as medidas descritas não lograrão de modo algum resolver os problemas descritos.

3.23

As medidas anunciadas dão antes a impressão de que não é possível criar qualquer base da acção política sem ampliar primeiro a «base de conhecimentos». Ora, no entender do CESE, isso seria menos uma estratégia consistente de acção do que uma estratégia de protelamento das decisões políticas. A Comissão devia fazer tudo para evitar deixar essa impressão.

3.24

É sabido desde há anos que os recursos haliêuticos têm sido totalmente sobreexplorados. A Comissão reage anualmente a esta ameaça com a exigência, absolutamente justificada, de prever reduções das quotas de pesca para contornar a sobrepesca de certas espécies, como é o caso do bacalhau (6). Sem êxito. E não é tão pouco com uma nova «base de conhecimentos» nem com novos painéis de peritos que o problema se resolverá de futuro.

3.25

O CESE espera pois que, no que toca a certos recursos naturais, designadamente à preservação dos recursos haliêuticos, não se continue a falar eternamente, mas que se passe finalmente à acção.

3.26

E ao exprimir-se assim, mais não pretende o CESE do que sublinhar a «insuficiência» dos «instrumentos» propostos pela Comissão no âmbito desta estratégia.

3.27

Já no parecer sobre o documento preparatório da Comissão, como também noutros pareceres seus sobre questões de desenvolvimento sustentável, energia ou transportes, o CESE solicitou à Comissão que:

por um lado, mencionasse que objectivos claros, isto é, quantificáveis, pretende a política alcançar;

e, por outro, designasse claramente os instrumentos — em particular os fiscais — com que pretende atingir esses objectivos (refira-se de passagem, a título de exemplo, a quantidade de vezes que Comité solicitou à Comissão que mostrasse como pretende proceder à tão debatida internalização dos custos externos).

3.28

Mas, até agora, nem sombra de resposta da Comissão. Continuamos tão distantes dos objectivos concretos (como, por exemplo, do «conceito do “factor dez”» (7)) como da descrição e da avaliação dos instrumentos.

3.29

O CESE considera pois necessário que, sempre que fale em «estratégia», a Comissão indique claramente com que instrumentos de influência política e outras medidas necessárias pretende alcançar os objectivos específicos que tem em mente.

3.30

O CESE remete finalmente neste contexto para o seu parecer, adoptado em Maio de 2006, sobre o «Reexame da estratégia em favor do desenvolvimento sustentávelUma plataforma de acção» (8), no qual também aborda esta problemática.

Bruxelas, 5 de Julho de 2006.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  COM(2003) 572 final, de 01.10.03.

(2)  JO C 117, de 30.4.04.

(3)  COM(2005) 670 final, de 21.12.05.

(4)  COM(2005) 37 final. Cf. as observações do CESE sobre esta matéria, que figuram no seu parecer sobre a «Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu sobre o reexame da Estratégia em favor do Desenvolvimento SustentávelUma plataforma de acção» (CESE 361/2006).

(5)  COM(2005) 666 final.

(6)  O que não levou porém ainda a banir o bacalhau em extinção dos menus das cantinas das instituições europeias.

(7)  Cf. COM(1999) 543 de 24.11.99, p. 16. ponto 4.4: Uma utilização e uma gestão eficientes dos recursos e parecer do CESE sobre a Comunicação da Comissão «Ambiente da Europa: Que orientações para o futuro? Avaliação Global do Programa Comunitário de Política e Acção relacionado com o Ambiente e o Desenvolvimento SustentávelPara um Desenvolvimento Sustentável», JO C 204 de 18/7/2000, pp. 59-67.

(8)  COM(2005) 658, NAT/304 — Projecto de parecer sobre a «Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu sobre o reexame da estratégia em favor do desenvolvimento sustentávelUma plataforma de acção» (CESE 361/2006).


16.12.2006   

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C 309/71


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de directiva do Conselho que diz respeito à luta contra a cochonilha de São José»

COM(2006) 123 final — 2006/0040 (CNS)

(2006/C 309/15)

Em 2 de Maio de 2006, o Conselho decidiu, em conformidade com os artigos 37.o e 94.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente emitiu parecer em 24 de Maio de 2006 sendo relator Martin SIECKER.

Na 428.a reunião plenária de 5 e 6 de Julho de 2006 (sessão de 5 de Julho), o Comité Económico e Social Europeu aprovou o presente parecer por 166 votos a favor, 2 votos contra e 1 abstenção.

1.   Introdução

1.1

O objectivo da presente proposta consiste em proceder a uma codificação da Directiva 69/466/CEE do Conselho, de 8 de Dezembro de 1969, que diz respeito à luta contra a cochonilha de São José. A nova directiva substituirá os diversos actos nela integrados. A presente proposta preserva integralmente o conteúdo dos actos codificados, limitando-se a reuni-los e apenas com as alterações formais exigidas pelo próprio processo de codificação.

2.   Observações na generalidade

2.1

O Comité considera extremamente útil a reunião dos textos numa única directiva. O Comité, à semelhança da Comissão, atribui, no contexto da Europa dos cidadãos, uma grande importância à simplificação e clarificação da legislação comunitária, a fim de torná-la mais acessível e fácil de compreender pelo cidadão comum, dando-lhe novas oportunidades e a possibilidade de beneficiar dos direitos específicos que lhe são atribuídos.

2.2

Tendo sido garantido que a codificação não conteria qualquer alteração de fundo e se destinaria exclusivamente a simplificar e clarificar a legislação comunitária, o Comité subscreve este objectivo e, à luz destas garantias, aplaude a proposta.

Bruxelas, 5 de Julho de 2006.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


16.12.2006   

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C 309/72


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «Riscos e problemas do aprovisionamento em matérias-primas da indústria europeia»

(2006/C 309/16)

Em 14 de Julho de 2005, o Comité Económico e Social Europeu decidiu, nos termos do n.o 2 do artigo 29.o do Regimento, elaborar um parecer sobre: «Riscos e problemas do aprovisionamento em matérias-primas da indústria europeia».

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Comissão Consultiva das Mutações Industriais, que emitiu parecer em 22 de Maio de 2006, sendo relator VOSS e co-relator GIBELLIERI.

Na 428.a reunião plenária de 5 e 6 de Julho de 2006 (sessão de 5 de Julho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 157 votos a favor e 7 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Conclusões e recomendações

1.1

As recomendações devem ser encaradas como directrizes para decisões políticas destinadas a pôr em prática uma política de recursos, de investigação e desenvolvimento, e uma política externa viradas para o futuro, tanto à escala comunitária como nacional. A realização dos objectivos de Lisboa, segundo os quais a União Europeia deverá tornar-se, até ao final do decénio, no espaço económico mais competitivo e dinâmico, requer uma política industrial inovadora, em consonância com critérios sociais e ambientais, que exigem disponibilidade para mudanças estruturais. A necessária transformação industrial deve ser definida de uma forma pró-activa e como estratégia integrante de um desenvolvimento sustentável. Isto implica não só a definição do processo de criação de valor de acordo com uma utilização eficiente dos materiais e a necessidade de gerir parcimoniosamente todos os recursos, como também a substituição progressiva de recursos não renováveis por outros que o sejam. Da aplicação destas duas estratégias decorre o desenvolvimento de uma nova perspectiva industrial que assenta na inovação tecnológica, da qual resultam postos de trabalho seguros e de elevado valor para a indústria e serviços conexos.

1.2

O aprovisionamento em matérias-primas é prioritariamente assegurado, nas economias de mercado, pelos agentes económicos. Não obstante, é no plano político que são definidas as condições-quadro para uma elevada segurança de aprovisionamento e desenvolvida acção nos domínios da indústria, da investigação, do mercado de trabalho e do ambiente para assegurar um aprovisionamento sustentável em matérias-primas. É que através de um reforço da promoção das novas tecnologias não só se influencia positivamente a competitividade e a conjuntura do mercado de trabalho, como também se promove a conversão para uma economia sustentável.

1.3

As análises dos ciclos de vida, que estão na base de uma política sustentável de matérias-primas, contribuem para aumentar a eficiência na extracção das matérias-primas minerais e metálicas e reduzir o impacto ambiental da sua transformação, bem como para desenvolver os processos de reciclagem e substituir progressivamente matérias-primas que estão disponíveis em quantidades limitadas e que agravam o efeito de estufa, através de uma maior utilização — desde que tecnicamente possível — de fontes de energia compatíveis com o ambiente, pobres em carbono, renováveis e sem repercussões no clima, ou de tecnologias que tornam a sua utilização mais eficiente e com menos emissões de carbono. Isto deverá ser alcançado, sobretudo, através de uma política da UE e dos governos dos Estados-Membros orientada para objectivos concretos. O CESE é de opinião que ambas as estratégias — aumento da eficiência e substituição — oferecem a possibilidade de reduzir a dependência de matérias-primas importadas.

1.4

Dado o significativo crescimento do consumo mundial de matérias-primas, poderão surgir futuramente estrangulamentos no seu aprovisionamento, pelo menos no tocante a algumas matérias-primas. As transformações do mercado mundial requerem uma política económica pró-activa da UE e dos seus Estados-Membros. Para a garantia do aprovisionamento em matérias-primas — cuja responsabilidade cabe prioritariamente à indústria — poderão contribuir as instituições da UE, através de uma política activa no domínio do comércio, da investigação e das relações externas, e os Estados-Membros, mediante a sua política nacional no domínio das matérias-primas e da energia, a fim de evitar uma deslocalização da produção para o estrangeiro. O Comité Económico e Social Europeu exorta os Estados-Membros da UE a formularem as linhas de base de uma política europeia para as matérias-primas e a energia, e a assumirem a sua responsabilidade por uma política sustentável de matérias-primas na Europa.

1.5

O Comité Económico e Social Europeu defende que a UE, em estreita cooperação com os Estados-Membros e todos os grupos interessados, deve zelar para que o aprovisionamento da indústria europeia em matérias-primas não corra qualquer risco e estas estejam disponíveis no mercado mundial a preços adequados. Para alcançar este objectivo, deve a União Europeia tomar medidas contra as práticas de concorrência desleal e tentativas proteccionistas, tanto no âmbito de organizações multilaterais, como a OMC, a OCDE e a OIT, como bilaterais. Um instrumento fulcral na consecução deste objectivo é o diálogo intensivo com os agentes políticos e industriais com influência nos mercados de matérias-primas.

1.6

É convicção do Comité que a indústria europeia preenche todas as condições para fazer resolutamente face aos actuais e futuros desafios resultantes de transformações estruturais na concorrência global. A Europa é um pólo industrial competitivo e continuará a sê-lo, evoluindo no sentido de um espaço económico sustentável, desde que conduza uma política global inovadora que tenha em conta a prosperidade económica e inclua uma ponderação equilibrada dos impactos sociais e ambientais.

1.7

Por último, importa referir que, dado o elevado grau de industrialização da Europa, o aprovisionamento em matérias-primas desempenha um papel relevante na prossecução dos objectivos de Lisboa. A dependência relativamente elevada da Europa da importação de matérias-primas fósseis, metálicas e minerais comporta riscos que se prendem não só com a segurança do aprovisionamento, mas também com a evolução dos preços das matérias-primas face ao consumo mundial. A economia e a política poderão adoptar medidas de precaução, através de iniciativas concretas que visem aumentar a eficiência dos recursos, promover a inovação tecnológica no domínio das matérias-primas e da reciclagem, substituir as matérias-primas não renováveis por outras que o sejam e diversificar a oferta de matérias-primas, impondo o recurso a fontes intra-europeias. Relativamente ao carvão, a questão reside também em saber se o recurso a tecnologias do carvão não poluentes (clean coal) neutras em termos climáticos, é exequível. A simples garantia da disponibilidade das matérias-primas a preços concorrenciais afigura-se insuficiente. Quanto à dimensão externa, limitar significativamente o uso crescente de fontes de energia fósseis dever ser um objectivo político global. O papel da União Europeia neste processo será definido nos próximos meses.

2.   Descrição do problema

2.1

As matérias-primas surgem no início de uma cadeia ramificada de criação de valor. Em tempo de crescente globalização, as matérias-primas são uma condição da funcionalidade e das possibilidades de desenvolvimento e crescimento da economia. Isto é válido tanto para as fontes de energia como para muitas matérias-primas metálicas, minerais e biológicas que são factores de produção primários indispensáveis à indústria. A dependência da Europa da importação de determinadas matérias-primas não tem sido, até à data, objecto de uma reflexão acurada, e foi o aumento dos respectivos preços que nos tornou conscientes dessa situação. A explosão dos preços das fontes de energia fósseis, do coque e do aço são exemplos flagrantes.

2.2

É habitual ter-se apenas uma ideia vaga da importância de cada matéria-prima. Isto poderá resultar do facto de, no conjunto dos recursos, ser atribuída às matérias-primas uma importância secundária, embora estas, ao contrário de outros factores de produção, não sejam, na sua maioria, substituíveis a curto prazo. Os défices de aprovisionamento, ou mesmo a interrupção dos fornecimentos, induzem pois, frequentemente, correspondentes quebras de produção. As oscilações de preços nos mercados de matérias-primas repercutem-se quase integralmente nos custos dos sectores produtivos a jusante, influenciando toda a economia. Neste contexto, também não são despiciendos os aspectos sociais.

2.3

Com o crescimento galopante da economia verificado noutras regiões do planeta (China, Índia, etc.), aumentou drasticamente, no último decénio, o recurso às fontes de energia e a matérias-primas destinadas à indústria.

2.4

É importante referir também a distribuição regional das matérias-primas e a discrepância entre a localização das reservas e o local de utilização. Neste contexto, a Europa, em especial, é já hoje uma região com uma elevada necessidade de matérias-primas e de fontes de energia fósseis, e uma dependência das importações que irá subir ainda mais no futuro.

2.5

O motor da economia europeia é o aprovisionamento energético. Dado o carácter finito de um grande número de fontes, as dramáticas subidas dos preços, a influência de eventos bélicos ou políticos na segurança do aprovisionamento e a frequente ineficácia das «políticas energéticas» nacionais no contexto mundial, é muito elevado o risco a que Europa está hoje exposta.

3.   A situação mundial

3.1

Analisamos em seguida — a título de exemplo, embora o que foi dito se aplique a muitas matérias-primas — a situação, sobretudo, das fontes de energia, dado que neste sector a evolução crítica da situação tem grande actualidade (oscilações do preço do petróleo, interrupção do fornecimento de gás natural russo), há um conjunto de dados de boa qualidade e estão já a ser debatidas medidas políticas.

3.2

A extracção mundial de petróleo aumentou, em 2004, para 3 847 megatoneladas. Desde que se iniciou a exploração industrial do petróleo, e até ao final de 2004, já havia sido extraído um total de cerca de 139 gigatoneladas de petróleo a nível mundial, das quais metade nos últimos 22 anos. Já se extraiu, portanto, mais de 46 % do petróleo convencional localizado nas reservas comprovadamente existentes.

3.3

O papel da China merece referência especial neste contexto, dado que este país passou, nos últimos 20 anos, de exportador líquido a importador líquido de crude e, no futuro, ver-se-á obrigado a recorrer cada vez mais aos recursos disponíveis a nível mundial em virtude do seu crescimento económico galopante.

3.4

Mas houve ainda outros acontecimentos, como a guerra no Iraque, os furacões na América e a ausência de investimentos, que conduziram a estrangulamentos na capacidade de extracção e de transporte, bem como quebras temporárias de aprovisionamento provocadas por greves e pela especulação, que contribuíram para um aumento perceptível do preço do petróleo e, posteriormente, do gás natural. Apesar disso, os preços reais — isto é, depois de descontada a taxa de inflação — são ainda inferiores aos que vigoravam no princípio da década de 1980.

3.5

Paralelamente a estas oscilações de preços, deve também ponderar-se a questão da disponibilidade das fontes de energia fósseis. No final de 2004, as jazidas de petróleo convencional atingiam um total de cerca de 381 gigatoneladas. Numa perspectiva regional, os países do Médio Oriente detêm cerca de 62 % das reservas mundiais, a América cerca de 13 % e a CEI (Comunidade de Estados Independentes) quase 10 %. Cabe notar, todavia, que na América do Norte foram já extraídos quase dois terços das reservas estimadas, enquanto que na CEI se extraiu mais de um terço e no Médio Oriente ainda só um pouco menos de um quarto.

3.6

No que respeita ao gás natural, a situação não é muito diferente. As jazidas potenciais de gás natural convencional a nível mundial perfazem cerca de 461 mil milhões de metros cúbicos, correspondendo o seu potencial energético aproximadamente ao potencial total do petróleo. Mais de metade das reservas de gás natural estão concentradas em três países (Rússia, Irão e Qatar), mas conta-se com a existência de reservas de gás natural com cerca de 207 mil milhões de metros cúbicos. Até agora foram extraídos menos de 18 % das reservas comprovadas de gás natural. O consumo de gás natural atingiu em 2004 um recorde histórico de cerca de 2,8 mil milhões de metros cúbicos. Os maiores consumidores de gás natural foram os Estados Unidos, seguidos pela Rússia, a Alemanha, a Grã-Bretanha, o Canadá, o Irão e a Itália.

3.7

As maiores reservas disponíveis são as do carvão. Com base no consumo mundial de carvão verificado em 2004, as reservas de hulha eram, no início de 2005, ainda suficientes para mais 172 anos e as de linhite para mais 218 anos. O carvão detinha em 2004 uma quota de 27 % no consumo mundial de energia primária. Apenas o consumo de petróleo ultrapassava este valor, correspondendo a quota da hulha a 24 % e a da linhite a 3 %. Em 2004, o carvão foi a principal matéria-prima energética a nível mundial na produção de energia eléctrica, com uma quota de cerca de 37 %.

3.8

A distribuição das jazidas de hulha é mais equilibrada do que as de petróleo ou gás natural. Embora também neste sector a Rússia detenha uma parte considerável das reservas globais, verifica-se simultaneamente que as regiões notoriamente menos providas de petróleo e gás natural — a América do Norte, a Ásia, a Austrália e a África do Sul — possuem significativas jazidas de hulha. Aliás, verifica-se uma concentração substancial das reservas mundiais de carvão, pois quase três quartos destas estão na posse de apenas quatro países: Estados Unidos da América, Rússia, China e Índia. Ao contrário do que se passa com o petróleo e com o gás, a UE também dispõe de importantes jazidas de carvão, embora a sua qualidade apresente variações consideráveis. No caso do carvão de coque, que é produzido em poucas regiões e cuja procura mundial é relativamente constante, os mercados internacionais absorvem cerca de 35 % da sua produção total. Porém, no conjunto da produção mundial de carvão, apenas 16 % são actualmente transaccionados no mercado internacional. No que respeita à oferta para exportação, há uma elevada concentração em certos países e verifica-se também uma concentração crescente a nível de empresas. Assim, mais de 60 % do carvão de coque para exportação é originário da Austrália, e, só por si, a China responde por 50 % de todas as exportações de coque.

3.9

A evolução do preço do carvão nos últimos decénios foi comparável à do petróleo e do gás, embora o seu teor energético seja claramente inferior. Precisamente do ponto de vista da matéria-prima, importa não esquecer que o carvão não só pode ser usado como fonte de energia ou como um imprescindível agente redutor na produção de ferro fundido em bruto, mas tem também aplicações muito diversificadas como combustível, como ingrediente na indústria química, ou no fabrico de materiais de construção. Convém ter presente, todavia, que, por razões de protecção ambiental, a utilização do carvão deve assentar, sempre que possível, em tecnologias modernas, limpas e eficientes, bem como em tecnologias para a separação e armazenamento de CO2, dada a elevadíssima emissão de gases causadores do efeito de estufa.

3.10

Para evidenciar ainda mais a actualidade da segurança do aprovisionamento, recorde-se as declarações feitas, em Novembro de 2005, na publicação World Energy Outlook (Perspectivas para a Energia Mundial) da Agência Internacional de Energia (AIE), sobre o aumento contínuo e acentuado do consumo mundial de energia. A manter-se inalterado o comportamento dos consumidores, a procura mundial de energia subiria em mais de 50 % até 2030, para 16,3 mil milhões de toneladas equivalentes de petróleo. O que aconteceu no início de 2006, quando a interrupção dos fornecimentos de gás natural russo à Ucrânia originou também uma diminuição dos fornecimentos à Europa Central e Ocidental, pode ser visto como uma primeira advertência para cenários possíveis no futuro em matéria de abastecimento, se a dependência europeia da energia importada continuar a crescer. Pela mesma razão, a aplicação do que preconizam os dois Livros Verdes da Comissão, respectivamente sobre segurança de aprovisionamento e eficiência energética, bem como um debate amplo e construtivo sobre o novo Livro Verde «Estratégia Europeia para a Energia» devem constituir um objectivo prioritário.

3.11

Neste contexto, cabe frisar que o prognóstico da AIE é incompatível com a protecção do clima. Em prejuízo das necessárias reduções da emissão de gases com efeito de estufa, a fim de proteger o clima, a projecção da AIE significaria um aumento das emissões de CO2 num mínimo de 52 % até 2030. Em consequência, limitar significativamente as emissões de carbono resultantes do uso crescente de fontes de energia fósseis dever ser uma tarefa política global. O papel da União Europeia neste processo deverá ser definido nos próximos meses.

3.12

Como possível solução para o problema do efeito de estufa, tem sido apontada, nos mais diferentes quadrantes, a energia nuclear. Para além da questão do risco, também aqui se levanta a questão da segurança do aprovisionamento. As reservas mundiais de urânio estão distribuídas por poucos países. As regiões onde a extracção de urânio é actualmente mais importante são a Austrália, a América do Norte, alguns países africanos e a Comunidade de Estados Independentes. Acresce que, é possível virem a ser descobertas reservas na China e na Mongólia. Um aumento na utilização pela China da energia atómica para fins pacíficos poderia conduzir, num prazo de 30 anos, a uma penúria de urânio.

3.13

Cerca de 12 % do petróleo é usado na produção petroquímica. Os plásticos constituem um importante grupo de produtos fabricados por esta indústria. Em 2004 foram produzidos 224 milhões de toneladas de plástico em todo o mundo, dos quais 23,6 % na Europa Ocidental. Segundo os actuais prognósticos, o consumo mundial de plástico irá aumentar ainda mais a nível mundial e espera-se, até 2010, uma subida de 4,5 % no respectivo consumo anual per capita. Os principais mercados em expansão são a Europa Oriental e o Sudeste Asiático.

3.14

A par das fontes de energia fóssil, os minérios representam também uma importante matéria-prima para a economia europeia, com destaque para o minério de ferro. Em 2004 foram produzidos mais de mil milhões de toneladas de aço no mundo. Em comparação com outros materiais, verifica-se que a produção de aço é claramente superior. No que respeita à exploração de minérios, constata-se que, em 2004, foram utilizados 1,25 mil milhões de toneladas de minério de ferro; numa escala em que os valores estão separados por diferenças na ordem de uma ou duas potências de dez, vêm a seguir o minério de bauxite, com 146 milhões de toneladas, o minério de crómio, com 15,5 milhões de toneladas, o minério de zinco, com 9 milhões de toneladas, e o minério de manganésio com 8,2 milhões de toneladas.

3.15

As reservas de minério de ferro consideradas economicamente viáveis foram avaliadas pela Sociedade Geológica Americana em cerca de 80 mil milhões de toneladas de ferro, o que representa mais de cem vezes as actuais necessidades. Porém, se incluirmos as reservas classificadas actualmente como economicamente inviáveis, o volume total das reservas aumenta para cerca de 180 mil milhões de toneladas de ferro. Apesar destas grandes reservas, pressupõe-se que o minério de ferro será também transaccionado no futuro a um preço elevado. Uma das razões é o facto de três grandes empresas (a CVRD, a BHP e a Rio Tinto) dominarem o mercado, com uma quota de mais de 75 % do minério de ferro extraído a nível mundial. Além disso, há que considerar também a possibilidade de estrangulamentos no transporte marítimo, que resultam em custos elevados de transporte e, logo, em preços de custo à partida mais elevados do minério de ferro destinado à siderurgia europeia.

3.16

Para assegurar a produção europeia de ferro e de aço, deve ser tida igualmente em conta a disponibilidade de carvão e coque. As exportações de coque dos EUA irão sofrer uma quebra, o que, por seu turno, fará aumentar a quota de mercado do Canadá e da Austrália. Todavia, para garantir o aprovisionamento mundial é necessário ampliar permanentemente as capacidades destes países. A China, através do reforço da produção de coque, verá acrescido o seu papel de fornecedora deste produto, embora outros países também venham a ampliar a sua capacidade de produção de coque destinada ao mercado nacional através de novas instalações.

3.17

A sucata é também uma matéria-prima importante na produção de aço. O comércio mundial de sucata expandiu-se claramente nos últimos anos, mas a procura não consegue acompanhar a oferta, dada a grande durabilidade dos produtos de aço, pelo que a actual tensão no mercado de sucata irá agravar-se. Embora nos últimos meses se tenha verificado um abrandamento desta tensão, prevê-se que os preços da sucata, que haviam triplicado entre 2002 e 2004, venham a registar novos aumentos a longo prazo.

3.18

Outras matérias-primas metálicas, como o manganésio, o crómio, o níquel, o cobre, o titânio e o vanádio, são importantes materiais de liga, que influenciam grandemente as características dos materiais de base. Estes metais, como o paládio, que é uma matéria-prima importante para o sector da alta tecnologia, têm de ser importados pela Europa.

3.19

Tanto no caso das matérias-primas já referidas como no de muitas outras, verifica-se que a oferta actual é suficiente, pelo que as subidas de preços actualmente registadas não indiciam um esgotamento dos recursos a médio prazo. Isto não significa, porém, que sejam de excluir alterações da oferta e da procura e que as oscilações de preços sejam fortuitas, uma vez que a oferta de matérias-primas é pouco flexível a curto prazo, devido ao longo tempo exigido para concretizar projectos de exploração com utilização intensiva de capital. Assim, é perfeitamente possível que, em situações de maior procura de matéria-prima, haja escassez e aumento dos preços. O mesmo é válido para as capacidades de transporte, que limitam igualmente a disponibilidade das matérias-primas importadas. Embora a suficiência de reservas e recursos reduza, em termos globais, os riscos de perturbações quantitativas ao nível do aprovisionamento, não proporciona qualquer protecção contra subidas perceptíveis de preços a curto e médio prazo. As intervenções políticas, assim como os comportamentos monopolistas e oligopolistas de empresas com uma posição dominante no mercado, não devem ser ignorados numa avaliação geral dos riscos, do ponto de vista do aprovisionamento e dos preços nos mercados internacionais de matérias-primas.

3.20

Isto é tanto mais válido quanto grande parte da actividade extractiva, não só de importantes fontes de energia mas também de matérias-primas metálicas, se concentra em determinadas regiões e empresas do planeta, e esta concentração regista um aumento claro desde o início da década de 1990, pelo menos no caso das matérias-primas metálicas. Note-se, por exemplo, que o Chile quase conseguiu triplicar a sua quota na produção de minério de cobre em relação a 1990 e que quase 40 % da bauxite é extraída na Austrália. Também o Brasil conseguiu aumentar consideravelmente a sua posição como fornecedor de bauxite, tendo-se tornado o seu segundo maior produtor e reforçado, desse modo, o lugar de destaque ocupado pela América do Sul na extracção de minérios de metais. O mesmo ocorre com o minério de ferro, do qual cerca de 30 % se extrai no Brasil. O único Estado-Membro da União Europeia que apresenta uma capacidade de exploração de minério de ferro digna de menção é a Suécia, embora a sua quota represente apenas cerca de 1,6 % da produção mundial.

4.   A indústria europeia

4.1

Como sempre, a indústria tem, pelo seu contributo para o emprego e a criação de valor, um grande significado na economia da União Europeia. É o elo mais importante na cadeia de criação de valor no que respeita aos produtos transformados e, sem a presença destes produtos, a prestação de muitos serviços não faria qualquer sentido. A produção industrial não perderá, portanto, a sua importância como fonte de prosperidade, pelo que é indispensável garantir o aprovisionamento de matérias-primas para a indústria. No que respeita às matérias-primas fósseis e a muitas matérias-primas metálicas, verifica-se uma distribuição desigual entre reservas e utilização. Isto poderá levar, através de estruturas oligopolistas nos países fornecedores, ao aparecimento de distorções do mercado também na Europa. Para reduzir a dependência europeia das importações no futuro, devem ser adoptadas medidas adequadas para todas as matérias-primas, como preconiza o Livro Verde sobre a segurança do aprovisionamento em energia.

4.2

As estatísticas mostram diferenças nítidas entre as empresas industriais europeias, tanto a nível da eficiência na utilização das matérias-primas como da eficiência energética. Por isso se pode afirmar que há possibilidades de realizar economias na Europa que deverão ser exploradas, prioritariamente, para reduzir a dependência global e fortalecer a actividade de desenvolvimento.

4.3

Há um sector que vê o futuro de forma positiva, apesar de depender da importação das suas matérias-primas: é a indústria europeia do aço, que denota capacidade de competir no mercado mundial, uma vez que já superou a fase de reestruturação e extraiu daí os devidos ensinamentos. Através deste processo de consolidação, criou-se uma estrutura que também proporciona às empresas a possibilidade de realizarem lucros adequados, inclusivamente em períodos económicos difíceis. Noutros países, como a China e a Índia, a necessária reestruturação está ainda por fazer.

4.4

Justamente na UE, a indústria do aço dispõe de uma cadeia de criação de valor intacta e operacional, na qual o aço desempenha um papel central. A este facto somam-se vantagens no domínio das infra-estruturas e da logística. O mercado europeu do aço funciona num espaço relativamente pequeno e com boas capacidades técnicas de ligação às redes ferroviárias, marítimas e rodoviárias internacionais, espaço que reúne fornecedores e clientes, com as correspondentes vantagens competitivas.

4.5

Além disso, as empresas europeias do sector do aço têm envidado grandes esforços e investido elevadas quantias na protecção ambiental e na eficiência energética. Apresentam a maior taxa de reciclagem a seguir aos Estados Unidos e utilizam grandes quantidades de sucata nos seus produtos, conseguindo assim poupar recursos. Também o consumo de agentes redutores nos altos-fornos é claramente inferior ao de muitos países não europeus.

4.6

Apesar deste ambiente positivo que se vive na indústria siderúrgica europeia, importa ter presente que, em resultado da dependência de matérias-primas importadas, dos elevados preços da energia e do reforço das medidas de protecção ambiental, é possível que, sobretudo a fase líquida, a médio prazo deixe de ser realizada na Europa e seja deslocalizada para regiões que possam oferecer um aprovisionamento garantido de matérias-primas e de energia a preços vantajosos. Dado que esta situação não se verifica apenas no sector do ferro, mas também no do alumínio e de outros metais, poderá ocorrer uma perda significativa de postos de trabalho na Europa, que só poderá ser compensada através da investigação e desenvolvimento nos domínios da eficiência energética e da utilização de recursos, assim como através do desenvolvimento de produtos inovadores e da prestação de serviços industriais. Uma deslocalização da fase líquida para países com normas ambientais menos exigentes e preços de energia baixos não contribui para um «desenvolvimento sustentável», a nível mundial, e apenas agrava a posição europeia.

5.   Cenários para matérias-primas alternativas e tendências tecnológicas

5.1

Se o crescimento da economia mundial continuar a assentar predominantemente, como até aqui, no uso de matérias-primas fósseis, é de prever, mesmo antes do esgotamento das respectivas fontes, um agravamento dos problemas climáticos devido ao aumento das emissões de gases com efeito de estufa. Assim, a AIE prevê, no seu estudo «Panorama da energia mundial em 2006», um aumento das emissões de CO2 a nível mundial de mais de 52 % até 2030, face a 2004. A esta visão contrapõem-se estimativas que indicam que as emissões mundiais de CO2 dos países industrializados terão de ser reduzidas em 80 % até 2050, para podermos manter, de forma sustentável, as alterações climáticas em níveis suportáveis pelo ser humano e o ambiente. São, portanto, necessárias tecnologias que permitam obter uma redução clara das emissões responsáveis pelo efeito de estufa.

5.2

O aumento do recurso a fontes de energia renováveis é frequentemente apontado como a primeira opção para reduzir os gases com efeito de estufa. Neste contexto, a União Europeia surge como precursora quando declara como objectivo indicativo para 2010, no Livro Branco sobre as energias renováveis (1), uma penetração de 12 % das fontes de energia renováveis (FER) na energia primária. Contudo, para se alcançar este objectivo não são apenas necessários novos investimentos nas áreas da biomassa e das energias eólica e solar. É necessário, sobretudo, diminuir claramente o crescimento do consumo de energia registado até agora. O potencial de economia deve ser aproveitado em todos os níveis da criação de valor e do consumo, bem como na eliminação. A promoção selectiva dos progressos técnicos viabiliza assim a possibilidade de reduzir no futuro as emissões de gases com efeito de estufa, aumentando também a competitividade da indústria europeia.

5.3

Em 2005, a Agência Europeia do Ambiente chegou à conclusão de que, em 2030, poderão estar disponíveis entre 230 e 300 megatoneladas equivalentes de petróleo por ano (que correspondem a 9,6 ou 12,6 × 1019 Joule) de biomassa, sem efeitos negativos para o ambiente, obtendo-se igualmente uma ampla auto-suficiência da União Europeia em produtos agrícolas. Isto equivaleria a cerca de 20 % da actual utilização primária de energia na UE-25, resultando na reciclagem anual de 100 megatoneladas equivalentes de petróleo em resíduos, 40 a 60 megatoneladas equivalentes de petróleo em produtos florestais e 90 a 140 megatoneladas equivalentes de petróleo provenientes de produtos agrícolas. Além da obtenção de energia a partir de matérias-primas biógenicas, poderia também produzir-se uma vasta gama de produtos que actualmente, e por razões de preço, são relegados para nichos de mercado. Combinações inteligentes de matérias-primas e de produtos transformados e novas estratégias de reciclagem poderiam, por exemplo, tornar competitivos, a breve trecho, os biomateriais.

5.4

Afigura-se necessária, a nível mundial, uma utilização crescente de matérias-primas renováveis. Até aqui, as fontes de energia e matérias-primas renováveis foram insuficientemente tidas em conta na promoção da investigação e da tecnologia. Face à actual relação entre preços e custos, há que garantir um maior desenvolvimento do mercado e da técnica através de múltiplas medidas de introdução no mercado.

5.5

Relativamente às potencialidades da biomassa agrícola, há que ter em conta a dramática evolução da extensão de terra arável por habitante do planeta. A área para cultivo de cereais actualmente disponível é aproximadamente igual à de 1970, mas nessa data o planeta tinha menos quase três mil milhões de pessoas, o que significa que em 1970 havia cerca de 0,18 hectares de terra arável per capita, ao passo que hoje essa área não atinge 0,11 hectares. Esta tendência irá acentuar-se, porque a erosão, a salinização ou a desertificação provocam a perda anual de cerca de sete milhões de hectares de terras aráveis, e mais de um quarto de todos os solos cultivados são considerados em risco.

5.6

Segundo estimativas da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), os países desenvolvidos terão de duplicar, nos próximos vinte anos, as suas importações de cereais, o que provocará escassez e encarecimento no futuro. Assim, a necessidade de forragens destinadas à pecuária e a procura de matérias-primas renováveis no Primeiro Mundo irá concorrer, de uma forma mais acentuada, com as necessidades alimentares dos países em desenvolvimento. A necessidade de forragens para a pecuária poderia ser diminuída através da redução do consumo de carne, o que poderia conduzir a uma maior disponibilidade de calorias na alimentação, uma vez que nas forragens se perde cerca de 90 % do conteúdo energético. Por conseguinte, trata-se sobretudo de induzir uma melhor utilização das plantas e seus componentes que contenham linhocelulose e produtos derivados (conhecidos vulgarmente por madeira, palha e erva). Tendo em conta as importantes necessidades que surgirão em matéria de investigação e desenvolvimento, é também urgentemente necessária uma mudança de paradigma no programa-quadro de investigação da UE, que permita adoptar como base as energias e matérias-primas renováveis e a eficiência.

5.7

Perante o exposto, entende-se por que motivo a transição da indústria para fontes de energia e matérias-primas renováveis resolverá apenas uma parte do problema. Serão utilizadas novas tecnologias, que consumirão menos energia e matérias-primas do que actualmente para obter uma eficiência comparável à actual. Foi deste modo que se conseguiu reduzir, nas últimas quatro décadas, em cerca de 50 % o consumo de energia e as emissões de CO2 na indústria do aço. A fim de poder aproveitar outras potencialidades de economia, o consórcio ULCOS (Ultra Low CO 2 Steelmaking — fabrico de aço com emissões drasticamente reduzidas de CO2), criado pela indústria europeia do aço e organizações de investigação, planeia conseguir uma forte redução das emissões, realizando assim um progresso assinalável no objectivo de criar um processo de produção de aço mais eficiente em termos energéticos. Actualmente já existe um processo de redução, desenvolvido na década de 1980, que permite diminuir os requisitos de qualidade do carvão e as emissões de CO2 até um máximo de 30 % em comparação com o processo que utiliza altos-fornos.

5.8

O aumento da eficiência é a estratégia que se afigura mais prometedora para obter uma redução de custos, proteger os recursos e garantir os postos de trabalho, uma vez que na indústria transformadora os custos com materiais representam, em média, 40 % dos custos totais e constituem o maior factor de custo. A utilização eficiente das matérias-primas contribui, sem prejuízo do resultado económico, para reduzir não só os custos, como também o impacto ambiental, através de um menor consumo de recursos. Às empresas podem ser oferecidos, através de iniciativas e programas estatais, incentivos para uma melhoria da eficiência — sob a forma, por exemplo, de projectos de investigação e concursos — o que as estimularia a aproveitarem estas potencialidades. Precisamente nas pequenas e médias empresas, deve haver uma sensibilização para eventuais possibilidades de obter eficiência e economias no uso de materiais, designadamente recorrendo à promoção de métodos adequados de gestão, como o EMAS (sistema comunitário de ecogestão e auditoria) e a norma ISO 14001.

5.9

O recurso às reservas de matérias-primas existentes na União Europeia, sobretudo de carvão, deve processar-se em moldes tecnicamente exigentes. Um novo aumento das capacidades só poderá ser defensável em termos de protecção ambiental se se adoptar também nesse quadro a abordagem Clean Coal (tecnologia limpa do carvão).

5.10

As inovações tecnológicas no desenvolvimento de novos materiais, com características aperfeiçoadas, na produção, transformação e utilização, assim como o aumento das taxas de reciclagem, oferecem uma nova solução para a dependência de matérias-primas importadas. Devem conjugar-se aumentos substanciais da eficiência das matérias-primas com o desenvolvimento de produtos inovadores. Esta perspectiva conduz a modificações na procura de diferentes matérias-primas no mercado. Poderão, assim, surgir potencialidades de crescimento industrial induzidas por iniciativas de investigação, que proporcionem vantagens não só industriais como também ao nível do emprego e do ambiente, por comparação com os processos tradicionais.

5.11

Paralelamente à economia directa na indústria, convém analisar eventuais potencialidades de economia nos sectores doméstico e dos transportes. Os edifícios de baixo consumo energético ou de energia passiva permitem obter importantes economias em energia primária, tanto no aquecimento como na refrigeração e, em combinação com a utilização de tecnologias eficientes ao nível do fornecimento, como a caldeira de gás de condensação ou as bombas de calor, seria possível atingir um potencial de economia energética de até 90 % da média actual. No que respeita ao transporte individual, é viável obter economias pela optimização das tecnologias de motorização e a mudança de comportamento dos utilizadores, que permitiriam multiplicar por quatro os resultados.

Bruxelas, 5 de Julho de 2006.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Comunicação da Comissão — Energia para o futuro: fontes de energia renováveis — Livro Branco para uma Estratégia e um Plano de Acção Comunitários.


16.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 309/78


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo ao Sistema Europeu de Estatísticas Integradas de Protecção Social (ESSPROS)»

COM(2006) 11 final — 2006/0004 (COD)

(2006/C 309/17)

Em 10 de Fevereiro de 2006 decidiu o Conselho consultar o Comité Económico e Social Europeu, ao abrigo do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, sobre a proposta supramencionada.

A Secção Especializada de Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania, encarregada da preparação dos correspondentes trabalhos, emitiu parecer em 2 de Junho de 2006. Foi relatora Sylvia SCIBERRAS.

Na 428.a reunião plenária, de 5 e 6 de Julho de 2006 (sessão de 5 de Julho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou o presente parecer por 162 votos a favor e 5 abstenções.

1.   Recomendações

1.1

O CESE assinala que, para reforçar a dimensão social da Estratégia de Lisboa, os Estados-Membros devem dar maior peso político, através do novo enquadramento, ao objectivo de modernização e melhoria da protecção social. A dimensão social é essencial para enfrentar os desafios postos pela globalização e pelo envelhecimento da população. Os diferentes objectivos da Estratégia de Lisboa, designadamente o crescimento económico sustentável, mais e melhor emprego e maior coesão social têm de ser igualmente apoiados e defendidos (1).

1.2

Para o CESE, o Sistema Europeu de Estatísticas Integradas de Protecção Social (ESSPROS) é importante no quadro dos métodos abertos de coordenação nas áreas da inclusão social e das pensões.

1.3

É necessária uma abordagem analítica baseada em indicadores fiáveis e comparáveis. Esta é essencial para dar uma imagem fidedigna do progresso feito ou não na consecução dos objectivos. O CESE crê que, além da simplificação estatística para uma maior eficácia, é necessário o desenvolvimento de indicadores qualitativos.

1.4

Um Estado-Membro pode achar difícil financiar a recolha dos dados estatísticos necessários. Tem de se ter, pois, em consideração a capacidade de cada Estado-Membro para reunir a informação. Além disso, os custos para cada Estado-Membro deste mandato não financiado, apesar de mínimos, devem ser estimados antecipadamente. Apraz ao CESE que a Comissão preveja ajuda financeira aos Estados-Membros para introduzir aperfeiçoamentos no sistema existente.

1.5

É também importante que se reflictam na escolha dos indicadores critérios não-monetários, baseados nas necessidades humanas, como o acesso, a qualidade e a participação (2).

1.6

O cotejo rigoroso das estatísticas é também importante para os governos dos Estados-Membros com vista à adaptação dos actuais sistemas de segurança social às necessidades das respectivas sociedades e para dar resposta às necessidades dos sectores da sociedade que não estão abrangidos por esses mesmos sistemas de protecção social.

1.7

Contribui igualmente para que sejam estabelecidos programas destinados a grupos sociais vulneráveis, tendo em vista, em especial, erradicar a pobreza infantil, e para aumentar o conhecimento destes mesmos programas.

1.8

A cooperação política no domínio da protecção social, em todos os Estados-Membros, deu, nos últimos anos, um enorme passo em frente. O objectivo da acção proposta de harmonizar os dados nas estatísticas comunitárias de protecção social só pode ser atingido pela Comunidade e não pelos Estados-Membros isoladamente.

1.9

Os resultados da Estratégia de Lisboa podem ser avaliados através de indicadores e pela apreciação do desempenho económico assim como do programa de emprego e crescimento. É necessário ligar esses indicadores aos indicadores de protecção social. É a melhor maneira de avaliar os resultados de toda a Estratégia de Lisboa.

2.   Introdução

2.1

Para atingir os objectivos estabelecidos na Estratégia de Lisboa, a dimensão de protecção social tem de ser analisada e as suas várias metas e os seus diferentes elementos tornados visíveis e comparáveis. O novo quadro de coordenação aberta da protecção social, da Comissão, é um instrumento para os Estados-Membros e para a UE neste processo. Como o Comité afirmou no parecer sobre a estratégia de coordenação aberta (3), é necessário criar indicadores apropriados para este instrumento.

2.2

Os sistemas de segurança social de todos os Estados-Membros evoluíram de acordo com a história de cada Estado, tendo circunstâncias particulares dado origem a sistemas diferentes de Estado para Estado.

2.3

A protecção social engloba todas as intervenções de organismos públicos ou privados destinadas a minorar, para a comunidade local (famílias ou indivíduos), o encargo representado por um conjunto definido de riscos ou necessidades (4).

2.4

A protecção social desenvolveu-se bastante desde o início dos anos noventa, momento em que a confusão se instalou na sequência de duas recomendações do Conselho, a primeira (92/442) visava harmonizar objectivos e políticas de protecção social, a segunda determinar critérios comuns para garantir recursos suficientes nos sistemas de todos os Estados-Membros da UE (5).

2.5

Outras comunicações ulteriores sobre a protecção social deram à protecção social maior prioridade na agenda europeia e contribuíram positivamente para um entendimento comum da protecção social europeia (de la Porte 1999 a) (6).

2.6

Isto tornou necessária a avaliação comparativa eficaz, assente na cooperação (já a vigorar) e na coordenação, que consiste, principalmente, na troca de pontos de vista e de recomendações com base nas melhores práticas.

2.7

A questão mais sensível continua a ser o estabelecimento de indicadores acordados em comum. Os sistemas existentes de estatística comparativa necessitam de ser revistos. Teve de ser realizada uma análise dos aspectos, causas e desenvolvimento da exclusão social e a qualidade dos dados melhorada.

2.8

Os resultados da Estratégia de Lisboa podem ser avaliados através de indicadores e pela apreciação do desempenho económico assim como do programa de emprego e crescimento. É necessário ligar esses indicadores aos indicadores de protecção social. É a melhor maneira de avaliar os resultados de toda a Estratégia de Lisboa.

3.   Síntese do documento da Comissão

3.1

Os sistemas de protecção social estão muito desenvolvidos na UE. A organização e o financiamento destes sistemas são da responsabilidade dos Estados-Membros.

3.2

A UE tem um papel distinto a desempenhar no tocante a garantir a protecção para os cidadãos em cada Estado-Membro e para os cidadãos que atravessam as fronteiras, com base na legislação comunitária que coordena os sistemas nacionais de segurança social.

3.3

Por isso, é essencial estabelecer um conjunto acordado de indicadores comuns, o que requer o empenho dos Estados-Membros em desenvolver instrumentos-chaves como o ESSPROS. Um quadro jurídico para o ESSPROS, tal como especificado na proposta da Comissão, «melhorará a utilidade das recolhas de dados actuais em termos de oportunidade, cobertura e comparabilidade».

3.4

Foi acordado no Conselho Europeu de Outubro de 2003 (7) que um relatório conjunto anual sobre a inclusão social e a protecção social seria o instrumento fulcral de relato para a simplificação e a melhoria da eficácia do método aberto de coordenação (MAC) (8).

3.5

A Comunicação da Comissão sobre Trabalhar em conjunto, trabalhar melhorUm novo enquadramento para o método aberto de coordenação aplicado às políticas de protecção social e inclusão social na União Europeia refere expressamente a necessidade de definir um novo enquadramento para tornar o MAC um processo mais visível e mais forte (9).

3.6

A proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo ao ESSPROS, da Comissão, põe em evidência a importância da dimensão social como um dos pilares da Estratégia de Lisboa.

3.7

O objectivo do regulamento é estabelecer um enquadramento para o cotejo de dados sobre a protecção social pelos Estados-Membros, que é, actualmente, efectuado utilizando diferentes métodos e uma variedade de definições de Estado para Estado, o que torna impossível a comparação de dados. Esta incomparabilidade retira utilidade a esses dados quando se analisam os sistemas de protecção social na UE.

3.8

Os objectivos da proposta da Comissão serão melhor atingidos se as estatísticas e a análise destas forem realizadas ao nível da UE com base numa recolha harmonizada de dados nos diferentes Estados-Membros.

3.9

O CESE concorda com que um enquadramento jurídico para o ESSPROS contribuirá para atingir as metas de competitividade, emprego e inclusão social definidas na Estratégia de Lisboa e, por consequência, ajudará a melhorar os sistemas de protecção social nos diferentes Estados-Membros.

3.10

O método aberto de coordenação, que facilitará o trabalho sobre a protecção social, pressupõe igualmente estatísticas comparáveis e fidedignas na área da política social (10).

3.11

Os principais elementos do regulamento proposto pela Comissão são:

O sistema principal do ESSPROS que abrange os fluxos financeiros relativos a despesas e receitas de protecção social.

Ao sistema principal serão acrescentados módulos sobre beneficiários de pensões e prestações líquidas de protecção social.

4.   Metodologia do ESSPROS

4.1

Desenvolvida nos finais da década de setenta, a metodologia do ESSPROS foi uma resposta à necessidade de um instrumento específico para acompanhar estatisticamente a protecção social nos Estados-Membros (11).

4.2

O Manual do ESSPROS de 1996 criou um sistema extremamente pormenorizado de classificação dos benefícios sociais.

4.3

A metodologia revista do Manual do ESSPROS aumenta a flexibilidade, que até certo ponto falta na compilação de estatísticas do Eurostat.

4.4

Uma das vias de aumento da flexibilidade é a passagem para um sistema principal e módulos (12).

4.5

O sistema principal corresponde à informação normalizada sobre as receitas e despesas de protecção social publicada anualmente pelo Eurostat.

4.6

Os módulos contêm informação estatística suplementar sobre aspectos particulares da protecção social. Os temas cobertos pelos módulos são determinados pelos requisitos da Comissão e dos diferentes Estados-Membros (13).

4.7

Embora os objectivos do ESPROSS façam uma descrição completa da protecção social nos Estados-Membros da UE, a metodologia do ESSPROS não inclui estatísticas sobre aspectos importantes como os serviços de saúde, a habitação, a pobreza, a exclusão social e a imigração. O Eurostat procede a uma significativa colação destas estatísticas e há, entre os Estados-Membros, um intercâmbio exaustivo de informação relativamente à protecção social com base no MISSOC (14). Todavia, um enquadramento jurídico para o ESSPROS asseguraria uma descrição mais completa e realista da protecção social nos Estados-Membros.

5.   Tendências na área da protecção social

5.1   Habitação

5.1.1

A acessibilidade da habitação é um domínio que requer avaliação. A medição da verdadeira acessibilidade da habitação tem de ser bastante exaustiva.

5.1.2

Aspectos como este acentuam mais ainda a importância da colação das estatísticas económicas e sociais dos Estados-Membros para benefício do público; os indicadores de sustentabilidade devem ser mantidos como alerta.

5.2   Pensões

5.2.1

Em muitos países da UE é realizada a colação das estatísticas neste domínio.

5.2.2

Todavia as medições de projecções de alterações demográficas são mais difíceis em virtude do problema de estimar os dados da imigração. Pode ser importante incluir a projecção dos dados da imigração e o provável impacto na sustentabilidade dos fundos de pensões de financiamento público. Por consequência, quanto mais exactos forem os dados sobre os fluxos da imigração, melhor será a contribuição da estatística para a decisão correcta.

Bruxelas, 5 de Julho de 2006.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Parecer do CESE de 20-4-2006 sobre a Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões «Trabalhar em conjunto, trabalhar melhor: Um novo enquadramento para o método aberto de coordenação aplicado às políticas de protecção social e das políticas de inclusão na União Europeia». Relator: Olsson. DO C 185 de 8.8.2006.

(2)  Ver nota de pé-de-página 1.

(3)  Parecer do CESE de 20-4-2006 sobre a Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões «Trabalhar em conjunto, trabalhar melhor: Um novo enquadramento para o método aberto de coordenação aplicado às políticas de protecção social e das políticas de inclusão na União Europeia». Relator: OLSSON. DO C 185 de 8.8.2006

(4)  Social Benchmarking policy making, Caroline de la Porte.

(5)  Definição do MANUAL do ESSPROS (1996).

(6)  Social Benchmarking policy making, Caroline de la Porte.

(7)  Conselho Europeu de Bruxelas, 16 e 17 de Outubro de 2003, Conclusões da Presidência.

(8)  COM(2006) 11 final, 2006/2004 (COD).

(9)  COM(2005) 706 final.

(10)  COM(2003) 261 final.

(11)  COM(2003) 261 final.

(12)  Manual do ESSPROS de 1996.

(13)  Manual do ESSPROS de 1996.

(14)  Manual do MISSOC de 2004.


16.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 309/81


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre as «Relações entre a União Europeia e a Comunidade Andina de Nações»

(2006/C 309/18)

Em 14 de Julho de 2005, o Comité Económico e Social Europeu decidiu, nos termos do n.o 2 do artigo 29.o do Regimento, emitir um parecer sobre Relações entre a União Europeia e a Comunidade Andina de Nações.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Relações Externas, que emitiu parecer em 1 de Junho de 2006, sendo relator Juan MORENO PRECIADO.

Na 428.a reunião plenária de 5 e 6 de Julho de 2006 (sessão de 5 de Julho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 156 votos a favor, 2 votos contra e 10 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Introdução

1.1

A Declaração Final do Terceiro Encontro da Sociedade Civil Organizada da União Europeia e da América Latina e Caraíbas propunha «uma associação baseada, numa primeira fase, numa rede de acordos entre a UE e as diferentes associações regionais e países da ALC, com o objectivo de alcançar um acordo global de associação entre as duas regiões» e apelava à abertura de negociações com a Comunidade Andina (CAN) (1).

1.2

A declaração de Guadalajara, aprovada pela III Cimeira de Chefes de Estado e de Governo da América Latina e Caraíbas e da União Europeia (2) considerou ser seu «objectivo estratégico comum» celebrar um acordo de associação entre a UE e a CAN (como os já celebrados com o México e o Chile e o actualmente em negociação com o Mercosul), que incluísse uma zona de comércio livre.

1.3

A mesma cimeira decidiu igualmente proceder a uma avaliação conjunta do grau de integração económica da Comunidade Andina, que foi iniciada em Janeiro de 2005.

1.4

Até agora, os Estados-Membros da UE não têm tirado proveito do potencial económico e comercial da Comunidade Andina; apesar de a UE ser o segundo parceiro comercial a seguir aos EUA, o comércio não atingiu níveis significativos. Os esforços das instituições da Comunidade Andina por uma maior integração (não obstante as dificuldades e limitações referidas no presente documento) melhoram as perspectivas de um acordo de associação, que pode incrementar o comércio entre a UE e a CAN, como já ocorreu com outras regiões.

1.5

Além disso, no contexto das relações com a sociedade civil andina, o CESE mantém contactos regulares com os dois órgãos que representam os parceiros sociais de toda a região: o Conselho Consultivo Laboral Andino (CCLA) e o Conselho Consultivo Empresarial Andino (CCEA).

1.6

O CESE organizou, em 6 e 7 de Fevereiro de 2006, em Lima, com a colaboração do Secretariado-Geral da CAN, uma audição em que participaram o CCLA e o CCEA, bem como outras associações andinas da sociedade civil, cujas valiosas contribuições foram incorporadas no presente documento. Os participantes mostraram-se favoráveis à abertura de negociações com a UE, advertindo, porém, que a associação deveria ter em conta as assimetrias entre as duas regiões, evitar modelos de desenvolvimento dependente e contribuir para reduzir a dívida social da região andina e favorecer uma efectiva coesão social.

1.7

O presente parecer destina-se a informar as autoridades das duas regiões da posição da sociedade civil organizada sobre as relações com a Comunidade Andina, de acordo com as propostas da Declaração Final do Quarto Encontro da Sociedade Civil Organizada da UE e da América Latina e Caraíbas, celebrado em Viena, em Abril de 2006 (onde foi reiterada a necessidade de a União Europeia contribuir para o aprofundamento dos processo de integração na América Latina) e com as recomendações finais da Cimeira de Chefes de Estado e de Governo da UE e da América Latina e Caraíbas (Maio de 2006) sobre a possibilidade de um acordo de associação entre a UE e a CAN, incluídas na Declaração Final:

«Recordando o objectivo estratégico comum estabelecido na Declaração de Guadalajara, congratulamo-nos com a decisão adoptada pela União Europeia e a Comunidade Andina de encetar, durante o ano de 2006, um processo conducente à negociação de um acordo de associação que inclua um diálogo político, programas de cooperação e um acordo comercial».

2.   Situação nos cinco países andinos

2.1

É difícil resumir de forma concisa a situação nos cinco países que, apesar da sua localização comum (a cordilheira dos Andes), apresentam diferenças acentuadas de nível económico, demografia, trajectória política, etc. O presente documento limita-se, pois, a destacar alguns dos aspectos mais relevantes da situação actual em cada país.

2.2

A Bolívia é o mais pobre dos cinco países andinos e um dos menos desenvolvidos de toda a América Latina. Este facto deve-se, em parte, à falta de acesso directo ao mar, mas também a outros factores, como a reduzida população (que emigra cada vez mais), a falta de solos adequados a uma agricultura competitiva, a tradicional dependência de recursos naturais não diversificados, a exclusão dos povos indígenas (que constituem mais de metade da população) e as crescentes tensões entre o centro tradicional do poder político, sedeado no planalto, e as zonas emergentes de poder económico nas planícies orientais. O país tem conseguido encontrar soluções democráticas, mas a prolongada situação de incerteza tem dificultado o seu desenvolvimento económico. O novo Governo, que entrou em funções em Janeiro de 2006, deve empreender profundas reformas para encontrar o caminho certo para o desenvolvimento, sem, com isso, prejudicar a segurança jurídica dos investimentos e faltar aos compromissos internacionais assumidos e aos acordos bilaterais em vigor.

2.3

A situação no Equador tem muito em comum com a Bolívia, com uma elevada percentagem de população indígena e consideráveis diferenças políticas e culturais entre as planícies costeiras e o planalto. Embora nos últimos anos não tenha sido afectado pelo mesmo grau de conflitos sociais declarados, a instabilidade política tem sido ainda maior. 49 % (3) da população vive abaixo do limiar da pobreza. A crise económica da última década e a «dolarização» da economia contribuíram para os elevados níveis de pobreza do país, assim como a emigração de 10 % da sua população activa. As remessas dos emigrantes, que totalizaram 1,74 mil milhões de dólares em 2004, constituem a segunda maior fonte de divisas estrangeiras, a seguir ao petróleo.

2.4

O Peru seguiu um rumo diferente, porque sofreu primeiro o terrorismo (na década de 1980 e no princípio dos anos 1990) e depois teve um Governo autoritário e corrupto (durante a presidência de Alberto Fujimori). Embora a economia esteja a crescer a um ritmo bastante rápido, o actual Governo não conseguiu aplicar um programa credível de reformas políticas e sociais e conta com escasso apoio popular. No que diz respeito à Comunidade Andina, cujo Secretariado-Geral está sedeado em Lima, o Peru tem mostrado alguma relutância em relação a determinados aspectos da integração sub-regional.

2.5

O caso da Venezuela (4) concentra as atenções de toda a região e do mundo: nos últimos anos, o país foi palco de graves tensões sociais e políticas e de intensas rivalidades entre seguidores e detractores do Presidente Hugo Chávez. A economia da Venezuela está cada vez mais dependente das exportações de petróleo, cujo preço internacional é elevado, o que permite ao Governo desenvolver uma política internacional activa e dispor de um orçamento importante para realizar políticas internas.

2.6

Apesar da grande violência política e social, exacerbada pelo tráfico de droga, a Colômbia conseguiu manter intacta a sua estrutura institucional democrática, um caso raro na América Latina e, paralelamente a esses esforços políticos, registou também progressos económicos dignos de nota. Mas apesar da relativa diminuição da violência na Colômbia, continuam os assassínios e os sequestros de sindicalistas, jornalistas, empresários e membros de organizações de direitos humanos.

3.   Integração andina

3.1   Evolução institucional

3.1.1

A Comunidade Andina é o mais antigo processo de integração na América do Sul. Os seus países fundadores (Bolívia, Colômbia, Chile, Equador e Peru) assinaram o Acordo de Cartagena em 1969, criando o então Pacto Andino. Três anos volvidos, a Venezuela aderiu ao Pacto; em 1976, o Chile retirou-se. Os cinco actuais membros (Bolívia, Colômbia, Equador, Peru e Venezuela) têm uma população conjunta de 120 milhões de habitantes e um PIB total de 265 mil milhões de dólares, aproximadamente. O seu mercado interno vale cerca de 8,6 mil milhões de dólares.

3.1.2

Nos seus 35 anos de existência, o grupo andino passou de um modelo proteccionista (baseado na substituição das importações), que era comum nas décadas de 1960 e 1970, a um modelo orientado para o «regionalismo aberto». Entretanto, levou a cabo diversas reformas institucionais que visavam aprofundar a integração regional, culminando na criação da Comunidade Andina em 1997. Daqui resultou que a Comunidade Andina possui uma estrutura institucional muito desenvolvida e um corpo legislativo estruturado.

3.1.3

O objectivo do Sistema Andino de Integração (SAI) (5), criado pelo Protocolo de Trujillo em 1996, é assegurar a coordenação entre os seus órgãos, com vista a aprofundar e reforçar a integração andina. O sistema é constituído por órgãos intergovernamentais e comunitários, que têm poderes executivos, legislativos, jurisdicionais, deliberativos e tributários.

3.1.4

O sistema tem dois órgãos deliberativos principais: o Conselho Andino de Ministros dos Negócios Estrangeiros e a Comissão da Comunidade Andina, ambos de carácter intergovernamental. A função da Comissão é elaborar legislação em matéria económica, de comércio e de investimento. O Conselho Andino de Ministros dos Negócio Estrangeiros trata de todos os aspectos que estão fora da esfera de competência da Comissão, especificamente, questões políticas, sociais e ambientais, política de migração, livre circulação das pessoas e coordenação da actividade externa dos diversos órgãos comunitários.

3.1.5

A mais alta instância política do SAI é o Conselho Presidencial Andino, constituído pelos chefes de Estado dos países membros. O Conselho exprime a sua opinião através de declarações ou orientações, que traçam o rumo para os outros órgãos e instituições do sistema. A Presidência do Conselho Presidencial Andino muda a meio de cada ano, por ordem alfabética, e esta rotatividade aplica-se igualmente aos demais órgãos intergovernamentais.

3.1.6

O Secretariado-Geral da Comunidade Andina (SG-CAN) tem lugar de destaque entre os órgãos e instituições do SAI. Está sedeado em Lima, Peru (6), e funciona como órgão de apoio técnico das instituições intergovernamentais. Tem competências legislativas em determinados domínios (adopção de resoluções), direito de iniciativa e outras funções específicas.

3.1.7

Outros órgãos da Comunidade são o Tribunal de Justiça da Comunidade Andina e o Parlamento Andino, e as instituições complementares reconhecidas incluem o Conselho Consultivo Empresarial Andino e o Conselho Consultivo Laboral Andino, a Corporação Andina de Fomento (CAF), o Fundo Latino-Americano de Reservas (FLAR), a Convenção Simón Rodríguez, a Convenção Hipólito Unanue e a Universidade Andina Simón Bolívar.

3.2   Estado actual da integração andina

3.2.1

Uma avaliação da integração andina deve ter em consideração dois aspectos. Em primeiro lugar, embora a Comunidade Andina exista há mais de três décadas, ainda é constituída por cinco países em desenvolvimento (com um rendimento médio per capita de 2 364 euros, enquanto a média da UE-25 é de 20 420 euros), com o que isto implica em termos institucionais e económicos.

3.2.2

Em segundo lugar, e ainda no contexto anterior, embora os aspectos convencionais da integração (os inerentes à criação de um mercado comum) não pareçam muito avançados na Comunidade Andina, outras áreas estão razoavelmente bem desenvolvidas. Apesar das dificuldades que entravam a integração do comércio, outras dimensões da Comunidade Andina (cultural, social, financeira, etc.) têm sido reforçadas.

3.2.3

Para entender como funciona na prática a Comunidade Andina, é habitual começar por olhar para a integração económica. Neste aspecto, a história da Comunidade Andina tem tido altos e baixos. Só em 1993 foi possível criar uma zona de comércio livre, que o Peru decidiu imediatamente não integrar. O plano de criação de uma Pauta Externa Comum para todos os membros ainda não está concluído, mas tem havido progressos na harmonização do comércio. Neste contexto, para que ambas as partes obtenham o máximo benefício, é fundamental que, no futuro acordo de associação entre a União Europeia e a Comunidade Andina, os países desta última estabeleçam uma verdadeira união aduaneira.

3.2.4

Os limitados progressos na arquitectura regulamentar resultaram em níveis reduzidos de comércio intracomunitário, que apresentam grandes variações de ano para ano. Na década de 1990, o comércio aumentou consideravelmente entre os membros da Comunidade Andina, passando de 4,1 % do total em 1990 para 14,2 % em 1998 (7). No entanto, se comparados com os níveis de comércio entre o grupo andino registados na década de 1970, estes números são ainda baixos, ficando aquém da média da América Latina (20,2 %). Desde 1998, o comércio no interior da Comunidade Andina tem vindo a diminuir (10,4 % em 2004), embora se tenha registado uma inversão da tendência em 2005.

3.2.5

O comércio interno na Comunidade Andina tem sido inferior ao comércio com os EUA (46,6 % do comércio total em 2004) e quase equivalente ao comércio com a União Europeia (11 % em 2004). Três dos actuais cinco membros da Comunidade Andina enviam menos de 12 % das suas exportações para o mercado sub-regional.

3.2.6

Embora se tenham registado alguns progressos na integração, têm sido muitas as dificuldades, causadas, em parte, por falta de vontade política, a par de outros factores como a estrutura do mercado, as diferenças entre modelos económicos, os diferentes níveis de desenvolvimento económico, a situação geográfica (que dificulta o comércio intracomunitário) e problemas políticos internos. Apesar de tudo isto, a Comunidade Andina tem conseguido manter-se na via da integração há mais de três décadas. A falta de infra-estruturas modernas de comunicação e transporte entre os cinco países andinos é um dos principais obstáculos para a realização de um mercado intracomunitário e para o desenvolvimento em geral da Comunidade Andina.

3.2.7

Cabe assinalar o pouco interesse demonstrado pelos países membros da CAN na coordenação prática das suas relações externas. A Bolívia e a Venezuela aproximaram-se do Mercosul, enquanto o Peru e a Colômbia assinaram acordos de comércio livre com os EUA.

3.2.8

Estas disparidades agravaram-se quando a Venezuela anunciou, em 22 de Abril de 2006, o abandono da Comunidade Andina. Este facto e a assinatura dos acordos de comércio livre abriram uma profunda crise política, que será debatida numa cimeira extraordinária.

3.3   Reptos da coesão social

3.3.1

No entanto, e como já se salientou, a Comunidade Andina não se esgota na integração do comércio. Sempre existiu uma ambição mais vasta de incorporar as dimensões política e social no processo de integração andina. Esta ambição é um reflexo não só da recente luta pela democracia travada em muitos dos países da sub-região, como também da necessidade de dar força à voz andina na cena latino-americana e para além dela. É também produto da realidade socioeconómica dos Andes.

3.3.2

As estatísticas relativas à ausência de coesão social são esmagadoras: 50 % da população andina — cerca de 60 milhões de pessoas — vivem abaixo do limiar da pobreza. Os cinco países da Comunidade Andina estão entre os mais desiguais de todo o mundo (segundo o índice de Gini), não só em termos de rendimento, mas também em relação a outras formas de exclusão, em razão de etnia, raça, local de origem, etc.

3.3.3

A este respeito, é importante salientar os níveis elevados de trabalho informal, de migração interna e externa (que afectam severamente as mulheres) e outros fenómenos como a marginalização das populações indígenas, que constituem minorias consideráveis (Equador e Peru) ou maiorias (Bolívia) na região. É também nesta região que é produzida a maior parte da cocaína do mundo, o que contribui para economias ilegais e para elevados níveis de população deslocada, violência e corrupção a que, no caso da Colômbia, se junta uma longa história de conflitos armados.

3.3.4

Neste contexto, a liberalização do comércio não pode ser o único instrumento para a promoção da coesão entre os países andinos. O novo plano estratégico preconizado pelo Secretariado-Geral da Comunidade Andina (8) coloca menos ênfase no desarmamento pautal e mais noutros desafios como a melhoria da competitividade, a propriedade intelectual, a eliminação de barreiras não pautais, as infra-estruturas, a livre circulação das pessoas, a energia, o ambiente e a segurança.

3.3.5

Um dos eixos do novo plano estratégico, que propõe a integração para o desenvolvimento e a globalização, é o desenvolvimento social. Para este fim, uma das iniciativas mais importantes da Comunidade Andina nos últimos tempos foi o Plano Integrado de Desenvolvimento Social (PIDS) (9), adoptado em Setembro de 2004, que visa lutar contra a pobreza, a exclusão e a desigualdade social na região. A médio prazo, o PIDS poderia constituir a base de uma estratégia geral de coesão social (e económica). O método aberto de coordenação, utilizado pela UE no contexto social, é de grande interesse para a Comunidade Andina, e a ideia de um fundo social semelhante aos fundos estruturais da UE é também uma opção atractiva. Isto significa que a Comunidade Andina é a primeira sub-região que tenciona adoptar aspectos do modelo social europeu.

3.3.6

A dimensão social tem mostrado ser um tema cada vez mais comum nas declarações políticas e nas decisões da Comunidade Andina desde 1999 (10) e, nos últimos cinco anos, começaram a tomar forma algumas iniciativas concretas.

3.3.7

O Diálogo Presidencial Andino sobre Integração, Desenvolvimento e Coesão Social reconheceu que, no contexto dos seus esforços de internacionalização, as economias andinas devem procurar diversificar a produção e promover uma competitividade inclusiva num processo que incorpore as micro, pequenas e médias empresas, promova esforços cooperativos e comunitários e crie condições propícias ao desenvolvimento local e à regionalização, recorrendo a abordagens de desenvolvimento territorial.

3.3.8

O Secretariado-Geral da Comunidade Andina declara que os principais objectivos da Comunidade são a globalização com integração, o desenvolvimento com competitividade e inclusão social e a coesão social com o reforço da governabilidade democrática. A actual agenda social engloba todas estas questões e será viável desde que dê prioridade à região andina nas negociações com terceiros sobre a liberalização do comércio, em especial nas negociações que podem, por definição, provocar maiores desequilíbrios na região e no interior das sociedades andinas (que se caracterizam pela exclusão de determinados sectores, em razão da origem étnica ou do sexo).

4.   Participação da sociedade civil no quadro institucional andino

4.1   Conselho Consultivo Laboral Andino (CCLA) e Conselho Consultivo Empresarial Andino (CCEA)

4.1.1

Embora o processo de integração andino tenha várias décadas de existência, a participação da sociedade civil só foi formalizada na fase mais recente da história da Comunidade Andina, com a criação do CCLA e do CCEA. Anteriormente, empregadores e sindicatos, enquanto actores da integração andina, tinham poucas oportunidades de participar a nível regional, embora estivessem envolvidos na integração andina por intermédio dos Governos nacionais.

4.1.2

O CCLA foi criado pela Decisão 441 (11) e é constituído por quatro delegados de cada um dos países andinos. Estes delegados e os seus suplentes são eleitos de entre os dirigentes das organizações representativas do sector laboral designados por cada país. Participam no CCLA as federações e confederações sindicais mais representativas de cada país. Presentemente, estão representadas 16 federações dos cinco países (12).

4.1.3

O CCEA foi criado pela Decisão 442 e é constituído por quatro delegados de cada um dos países andinos. Estes delegados são eleitos de entre os dirigentes das organizações representativas do sector empresarial designados por cada país.

4.1.4

As funções dos conselhos consultivos foram redefinidas pela Decisão 464 (13), que determina que estes podem emitir pareceres para o Conselho Andino de Ministros dos Negócios Estrangeiros, a Comissão ou o Secretariado-Geral da Comunidade Andina, e assistir a reuniões do Conselho e da Comissão, bem como a reuniões de peritos ou grupos de trabalho governamentais relacionadas com o processo de integração andina, nas quais podem participar com direito a intervir.

4.1.5

O CCLA emitiu numerosos pareceres, alguns dos quais relacionados com a agenda social ou com as relações externas da Comunidade Andina. É especialmente digno de nota o parecer n.o 27 (14) sobre o seguimento da conclusão de um possível acordo de associação entre a UE e a Comunidade Andina, em relação ao qual o CCLA partilhava a expectativa de progressos rumo a uma aliança política, económica e social com a UE.

4.1.6

Entretanto, o CCEA salientou, numa das suas declarações (15), que a questão da associação com a UE é essencial; a publicidade dada a estas negociações com a UE tem de ser cuidadosa, para não pôr em risco as negociações.

4.1.7

Tanto o CCLA como o CCEA salientaram a necessidade de aumentar a cooperação com outros actores da sociedade civil na região andina, por um lado, e com o Comité Económico e Social Europeu (CESE), por outro, para coordenar posições comuns e promover iniciativas com vista a garantir normas laborais básicas em todos os acordos entre a UE e a Comunidade Andina.

4.2   Outros instrumentos de participação

4.2.1

Para além das mencionadas instâncias de representação institucional da sociedade civil, a Comunidade Andina conta com outros instrumentos de participação para as políticas sociais como a Convenção Simón Rodríguez (1973) que consiste num fórum tripartido para debate, participação e coordenação das políticas socioprofissionais a nível regional entre os ministros do Trabalho, os empregadores e os trabalhadores, integrado nas chamadas convenções sociais (16).

4.2.2

Esta convenção foi um dos primeiros instrumentos da integração sociolaboral andina, directamente ligado às questões do desenvolvimento social e laboral. A implementação da convenção não foi desprovida de sucesso, atraindo um interesse constante por parte de todos os sectores interessados no progresso no domínio sociolaboral. No entanto, em contrapartida, circunstâncias adversas — principalmente de natureza institucional — tiveram um forte impacto no processo de integração e, em 1983, a convenção ficou congelada.

4.2.3

A convenção tomou o formato actual com o Protocolo de Substituição da Convenção Simón Rodríguez, adoptado pelo Conselho Presidencial Andino em 24 de Junho de 2001. Este tem por finalidade:

a)

Apresentar e debater propostas respeitantes a matérias de âmbito sociolaboral, que representam uma contribuição efectiva para o desenvolvimento da agenda social da sub-região, contribuindo para a actividade dos outros órgãos do SAI.

b)

Definir e coordenar as políticas da Comunidade para a promoção do emprego, a formação profissional, a saúde e a segurança no local de trabalho, a segurança social e a migração laboral, assim como outros temas que os países membros considerem adequados.

c)

Propor e conceber actividades de cooperação e coordenação entre os países membros respeitantes a matérias de âmbito sociolaboral.

4.3   Papel das ONG e das organizações da sociedade civil

4.3.1

As dinâmicas sociais nacionais e globais não estão excluídas da dimensão andina: além das questões laborais, os interesses da sociedade estão representados também de outras formas, em torno de temas concretos como os direitos humanos, os direitos das populações indígenas, os direitos da mulher, a cultura, o ambiente, os consumidores, a agricultura familiar e o minifúndio, etc.

4.3.2

Estes interesses específicos estão representados em numerosas organizações de interesses diversos, que desempenham um papel muito activo na integração regional, papel esse que ganhará mais importância depois da futura associação entre a UE e a CAN.

4.3.3

Merece igualmente referência a importância de outros tipos de organização da sociedade civil, nomeadamente associações ou movimentos (de povos indígenas, por exemplo) e organizações não governamentais (ONG), plataformas e redes de ONG, coligações ou plataformas de acção, centros de investigação, universidades, etc.

4.3.4

A dinâmica social destes movimentos e da chamada sociedade civil «não organizada» é muito activa na região andina, embora a sua organização e actividades sejam frequentemente limitadas ao nível nacional e não encontrem canais de acesso ou participação no sistema formal de integração andina. Neste contexto, o Secretariado-Geral da Comunidade Andina anunciou a próxima criação de uma rede sub-regional andina de instituições académicas e ONG.

4.3.5

Para facilitar a integração destes actores na dinâmica formal do processo de integração andina, a Comunidade Andina criou vários grupos de trabalho. O Grupo de Trabalho sobre os Direitos dos Povos Indígenas (17) foi constituído como órgão consultivo do SAI, para promover a participação activa dos povos indígenas nas esferas económica, social, cultural e política da integração sub-regional. O grupo de trabalho trata de questões delicadas como a ocupação de terras comunais e indígenas, comunidades rurais e produção, desenvolvimento económico, equidade social e participação política, identidade cultural e institucionalização, etc.

4.3.6

O Grupo de Trabalho Andino sobre os Direitos dos Consumidores (18) foi igualmente criado como órgão consultivo do SAI. O seu objectivo é promover a participação activa das instituições públicas e privadas que trabalham no domínio dos direitos do consumidor nos países membros da Comunidade Andina, na concertação social e nos processos decisórios relativos à integração regional nas suas áreas de interesse.

4.3.7

Estes órgãos consultivos (19) não contam com o orçamento da Comunidade Andina para o seu funcionamento. Por isso, as únicas organizações que estão em condições de participar são as que podem mobilizar os recursos humanos e económicos para estarem presentes nas reuniões dos grupos de trabalho e órgãos da Comunidade Andina.

5.   Relações entre a União Europeia e a Comunidade Andina

5.1   Primeiros acordos entre a União Europeia e a Comunidade Andina

5.1.1

O primeiro Acordo de Cooperação entre a Comunidade Europeia e a América Latina foi assinado com o Pacto Andino, em 1983, catorze anos depois do estabelecimento deste.

5.1.2

Este acordo fazia parte da chamada «segunda geração de acordos de cooperação». Contrariamente à primeira geração de acordos, que se baseava, essencialmente, no comércio (não preferencial), a nova geração de acordos tinha um âmbito mais vasto, incluindo aspectos políticos e relativos à cooperação, que se tornaram essenciais nos acordos posteriores. Estes tratados constituíram também uma indicação clara da importância que a Comunidade Europeia dava à integração regional na América Latina.

5.1.3

O dinamismo das relações entre a UE e a América Latina na década de 1980 revelou rapidamente a necessidade de uma nova geração de acordos, o que aconteceu a partir de 1991. Em 1993, a UE assinou um acordo-quadro de terceira geração com o grupo andino. Uma das novas características deste acordo foi a inclusão de uma «cláusula democrática», que exprimia o compromisso conjunto com a democracia, e de uma cláusula «evolução futura», pela qual as partes contratantes poderiam alargar a sua cooperação.

5.1.4

Ao mesmo tempo, uma outra questão veio conferir crescente importância às relações com a Comunidade Andina na década de 1990: a luta contra o tráfico de droga. A UE pretendia propor uma abordagem diferente da dos EUA, centrada em instrumentos de repressão. Esta abordagem tinha duas componentes: em primeiro lugar, em resposta a um pedido dos próprios países andinos, foi acordado que o Sistema de Preferências Generalizadas (SPG) seria alargado de forma a incluir os países andinos, por meio de um regime especial, o SPG-Droga, que permitia que 90 % dos produtos andinos entrassem na UE sem direitos aduaneiros. Em segundo lugar, foi instituído um diálogo especializado de alto nível em matéria de droga.

5.1.5

O acordo de 1993 foi rapidamente suplantado por um novo quadro de relações que a UE começou a promover a meio da década de 1990, com as negociações de acordos de quarta geração com o Mercosul, o Chile e o México. Estes textos foram elaborados como um primeiro passo para acordos de associação, que viriam a incorporar um acordo de comércio livre. A Comunidade Andina esperava um acordo semelhante, mas a UE entendeu que seria preferível avançar gradualmente para esse objectivo, começando por um acordo intermédio, proposta que foi aprovada na Segunda Cimeira entre a UE e a América Latina e Caraíbas, realizada em Madrid, em Maio de 2002.

5.2   Acordo de 2003: uma etapa intermédia

5.2.1

Em 15 de Dezembro de 2003, foi assinado o Acordo de Diálogo Político e Cooperação entre a UE e a Comunidade Andina. Embora este constituísse um avanço em relação ao acordo anterior, não correspondeu às expectativas dos países andinos (20). Um dos problemas que os andinos viam neste modelo era o de não melhorar o acesso ao mercado da UE. No entanto, este acordo tem uma novidade importante: a institucionalização do diálogo político. Inclui igualmente novos domínios de cooperação bi-regional (migração, terrorismo, etc.) e promove a participação da sociedade civil nessa cooperação (21).

5.3   Comércio entre a União Europeia e a Comunidade Andina

5.3.1

Como ilustra o quadro seguinte, as relações comerciais entre a UE e a Comunidade Andina conheceram um certo grau de estagnação. Embora a UE seja actualmente o segundo maior parceiro comercial da Comunidade Andina, representa apenas 12 %-13 % do comércio externo da região, cabendo 40 % aos EUA. As exportações andinas para a UE caíram de 19 % do total das exportações em 1994 para 12 % em 2004. Como fornecedor, a UE foi a origem de 19 % das importações da Comunidade Andina em 1994, que caíram para 13 % em 2004.

COMÉRCIO DA UE COM A COMUNIDADE ANDINA

(milhões de euros)

 

Importações (Imp.)

Exportações (Exp.)

Saldo

(para a UE)

Imp+Exp

Volume

Variação anual

em %

Parte do total das imp. da UE

Volume

Variação anual

em %

Parte do total das exp. da UE

2000

8.153

 

0,82

7.020

 

0,82

-1.134

15 173

2001

8.863

8,7

0,90

7.908

12,6

0,89

-955

16 771

2002

8.853

-0,1

0,94

7.085

-10,4

0,79

-1.768

15 938

2003

7.911

-10,6

0,84

5.586

-21,2

0,64

-2.325

13 497

2004

8.904

12,6

0,87

5.988

7,2

0,62

-2.916

14 892

Crescimento médio anual (%)

 

2,2

 

 

-3,9

 

 

-0,5

Fonte: Eurostat

5.3.2

A UE é a maior fonte de investimento directo na Comunidade Andina, mas os fluxos têm vindo a decrescer continuamente desde 2000, ano em que atingiram mais de 3,3 mil milhões de dólares, tendo ficado em 2003 por apenas mil milhões de dólares.

5.3.3

As perspectivas para as relações comerciais afiguram-se incertas. O novo regime de SPG que entrou em vigor em 2006 não parece vir melhorar significativamente o acesso ao mercado da UE, embora abranja um maior número de produtos. No entanto, o prolongamento do regime por dez anos permite uma maior previsibilidade (o que pode favorecer o investimento). Neste contexto, um acordo de associação poderia contribuir para forjar laços económicos muito mais fortes entre a UE e a Comunidade Andina.

5.4   Rumo a um acordo de associação

5.4.1

Apesar de alguns progressos significativos, as relações entre a União Europeia e a Comunidade Andina podem ficar bloqueadas na situação actual, caracterizada por relações económicas pouco dinâmicas e cooperação relativamente importante, com diálogo político institucionalizado, mas sem agenda comum. Por isso, apesar das presentes dificuldades, o CESE entende que devem ser dados passos, o mais rapidamente possível, no sentido de um acordo de associação semelhante aos que foram assinados com o Chile e com o México e ao que está a ser negociado com os países do Mercosul.

5.4.2

Este instrumento incluiria um acordo de comércio livre, um diálogo político mais vasto e novas possibilidades de cooperação. Deveria incorporar igualmente uma dimensão social mais ambiciosa, com maiores oportunidades de participação dos parceiros sociais e da sociedade civil.

5.4.3

Deveria ainda incluir aspectos não menos importantes como o fomento da competitividade, a segurança jurídica do investimento e o desenvolvimento de um verdadeiro mercado interno andino onde as empresas possam operar com garantias.

5.4.4

A União Europeia concordou, por fim, em considerar esta possibilidade na Terceira Cimeira Bilateral, em Guadalajara (México), em Maio de 2004, mas incluiu uma série de condições prévias (por exemplo, que qualquer acordo de comércio livre depende dos resultados do Programa de Desenvolvimento de Doha e de um nível suficiente de integração económica regional andina), a avaliar conjuntamente pela UE e pela Comunidade Andina.

5.5   Conteúdo social da associação entre a União Europeia e a Comunidade Andina

5.5.1

De acordo com o objectivo de uma associação plena, as partes na negociação devem centrar a sua atenção no respeito dos direitos fundamentais em matéria sociolaboral e na defesa da democracia e dos direitos humanos e criar mecanismos de promoção destes direitos, evidenciando expressamente a sua determinação em lutar contra o tráfico de droga e a corrupção e em conjugar o desenvolvimento económico com a justiça e a coesão social.

5.5.2

O futuro acordo deveria ser estruturado de forma a corresponder ao objectivo declarado de associação política, económica e social. Neste sentido, seria desejável que o texto incluísse, portanto, um capítulo social para complementar e contrabalançar as secções dedicadas às relações comerciais e ao diálogo político.

5.5.3

O capítulo social deveria incluir os direitos dos trabalhadores e dos empregadores, com base nos critérios acima referidos, fazendo menção expressa à liberdade de associação, ao diálogo social e à concertação social (22).

5.5.4

A evidente insegurança que afecta o exercício dos direitos humanos e, sobretudo, da liberdade de imprensa e da associação sindical em alguns países andinos torna ainda mais necessária uma forte contribuição da UE.

5.5.5

O acordo deveria comprometer as partes signatárias na promoção dos direitos sociais, por meio de cooperação técnica e outros programas de assistência.

5.6   Cooperação

5.6.1

A UE tem tido um papel de clara liderança no domínio da cooperação para o desenvolvimento com os países andinos. Mais de um terço da cooperação da UE com a América Latina tem sido destinada à Comunidade Andina e aos seus países membros. A Bolívia e o Peru estiveram entre os três maiores beneficiários da ajuda oficial da UE entre 1994 e 2002.

5.6.2

A Comissão Europeia elabora actualmente uma nova estratégia para a cooperação sub-regional com a Comunidade Andina e uma estratégia específica para cada um dos cinco países andinos, a fim de orientar os seus esforços no período de 2007 a 2013.

5.6.3

O documento de estratégia regional da Comissão Europeia para a Comunidade Andina (2007-2013) incide em três áreas: integração regional, coesão social e luta contra a droga.

6.   Participação da sociedade civil organizada nas relações entre a União Europeia e a Comunidade Andina

6.1

O presente parecer destina-se a fornecer às instituições da UE os critérios básicos para a dimensão social e a participação da sociedade civil, que o CESE considera deverem pautar as relações com a Comunidade Andina e ser estudados pelo futuro comité de negociação do acordo de associação.

6.2

Não existindo pareceres ou resoluções anteriores do CESE sobre as relações com a Comunidade Andina, os referidos critérios poderão basear-se no seguinte:

a)

Os pontos já estabelecidos a este respeito no Acordo de Diálogo Político e Cooperação, em especial nos artigos 42.o (cooperação social), 43.o (participação da sociedade civil organizada na cooperação) e 44.o ( cooperação em matéria de igualdade de sexos), que deverão ser adaptados aos objectivos do futuro acordo de associação.

b)

Alguns documentos e declarações referentes ao contexto mais geral das relações com a América Latina produzidos pelo CESE ou pela sociedade civil de cada uma das regiões.

6.3

Neste contexto, é importante ter presente o compromisso implicitamente assumido pelos participantes no Terceiro Encontro da Sociedade Civil Organizada da UE e da América Latina e Caraíbas, ao apelarem a que «os acordos a celebrar com a UE incluam também uma importante componente de dimensão social, bem como a promoção e o reforço das organizações sociais e dos órgãos de participação e consulta da sociedade civil organizada» e ao reafirmarem «a determinação em incentivar as relações recíprocas entre os órgãos consultivos regionais da ALC, bem como as relações entre o CESE e os referidos organismos» (23).

6.4

Além disso, os países da UE e da CAN subscreveram os princípios e valores expressos na Constituição da OIT e nos seus instrumentos sociais fundamentais, como a Declaração relativa aos Princípios e Direitos Fundamentais do Trabalho (1998), a Declaração Tripartida de Princípios no que respeita às Empresas Multinacionais e à Política Social (1977, alterada em 2000) e a resolução da Conferência Internacional do Trabalho sobre os direitos sindicais e a sua relação com as liberdades cívicas (1970). Aderiram igualmente à Declaração Universal dos Direitos do Homem (1948) e ao Pacto Internacional sobre os Direitos Económicos, Sociais e Culturais.

6.5

O CESE, o CCEA e o CCLA devem constituir os pilares da acção conjunta das sociedades civis andina e europeia e da sua participação nas negociações entre as duas partes e nas futuras estruturas de consulta e participação, que, no entender do CESE, deveriam ser criadas pelo futuro acordo de associação.

6.6

Ao assinarem o Plano de Cooperação Interinstitucional, estes três órgãos estão a dar um primeiro passo importante no sentido da institucionalização das suas relações. Este plano melhorará a qualidade da compreensão entre o CESE, o CCEA e o CCLA, de forma a reforçar e consolidar a cooperação mútua.

6.7   O Plano de Cooperação Interinstitucional tem em vista:

1)

apoiar a participação das organizações da sociedade civil da Comunidade Andina;

2)

contribuir para o diálogo da sociedade civil entre a Comunidade Andina e a União Europeia;

3)

promover a inclusão de uma dimensão social no futuro acordo de associação entre a UE e a Comunidade Andina;

4)

apoiar a iniciativa do CCEA e do CCLA de trabalhar na proposta de criação de um Conselho Económico e Social Andino (CESA);

5)

promover uma maior participação das organizações da sociedade civil andina equivalentes às que compõem o Grupo III do CESE;

6)

Aprofundar os vínculos económicos entre as duas regiões.

6.8

Pela sua parte, os dois conselhos consultivos andinos apresentaram uma proposta conjunta (24) às autoridades da Comunidade Andina no sentido de dar início a conversações que conduzam, o mais rapidamente possível, à criação de um Conselho Económico e Social Andino (CESA).

6.9

O CESE congratula-se com tal iniciativa e com o consenso que a rodeia e crê que basear o Conselho Económico e Social Andino (CESA) numa configuração plural, representativa dos trabalhadores, dos empregadores e dos interesses diversos da sociedade civil organizada, facilitaria a criação de um muito necessário comité consultivo misto e a participação das organizações da sociedade civil da UE e da Comunidade Andina no quadro institucional do futuro acordo de associação.

6.10

Em 3 de Março de 2005, a Comissão Europeia organizou uma primeira conferência sobre o futuro das relações entre a UE e a Comunidade Andina, em que participaram várias organizações sociais e representantes do CESE. Na perspectiva de um possível início das negociações, este evento deverá ser repetido e alargado de modo a incluir, no futuro, as organizações da sociedade civil andina existentes (CCLA, CCEA e Grupos de Trabalho Andinos sobre Consumidores e Povos Indígenas).

6.11

O CESE considera que, para desenvolver a associação entre as duas regiões, as organizações representativas dos diferentes sectores da sociedade civil na UE e na Comunidade Andina devem intensificar as suas relações bilaterais e acções conjuntas, dando continuidade aos progressos já efectuados rumo a este objectivo (25).

7.   Conclusões e propostas económicas e sociais

7.1

Tal como se afirma em anteriores pareceres do CESE, uma maior estabilidade democrática dependerá do reforço das instituições do Estado e das relações entre o Estado e a sociedade, da melhoria do bem-estar social, da redução das desigualdades, da promoção do desenvolvimento e do crescimento económico, da integração social de sectores tradicionalmente excluídos e da criação de plataformas para um diálogo político alargado a nível local, nacional e regional.

7.2

O CESE considera que seria benéfico para os interesses comuns da UE e da Comunidade Andina iniciar negociações (sem que estejam condicionadas aos resultados do ciclo de Doha) com vista a um acordo de associação entre as duas regiões e insta as partes a tomarem medidas neste sentido.

7.3

O CESE entende que o acordo deve lançar as bases de uma associação plena e equilibrada, que inclua uma zona de comércio livre e permita um diálogo sobre aspectos políticos e relacionados com a cooperação. A dimensão social desta associação deve ser expressamente incluída no texto do futuro acordo, com base no compromisso de respeitar as convenções da OIT relativas aos direitos fundamentais e outros instrumentos citados no presente documento.

7.4

No plano económico, o acordo deverá:

a)

revalorizar o papel da empresa na sociedade andina como factor decisivo para o desenvolvimento económico e social;

b)

fomentar a competitividade, graças à I&D e ao desenvolvimento das infra-estruturas;

c)

promover os investimentos e proteger a sua segurança jurídica;

d)

facilitar o acesso ao financiamento, sobretudo para as PME e outras medidas conducentes a elevar os níveis de crescimento económico;

e)

estimular o desenvolvimento do sector da economia social;

f)

impulsionar a criação de uma verdadeira união aduaneira andina.

7.5

No plano social, o acordo deverá especificamente apoiar e proteger:

a)

a educação e a formação profissional e a cooperação interuniversitária como instrumento de desenvolvimento da investigação científica e do ensino superior;

b)

a igualdade e a não discriminação em razão do sexo, raça ou origem étnica, religião ou crença, deficiência, etc.;

c)

a igualdade entre homens e mulheres no trabalho, mediante planos para a equiparação salarial e demais aspectos sociolaborais;

d)

a integração dos imigrantes e a protecção dos seus direitos, incluindo garantias quanto às remessas de fundos para os países de origem. A UE e a CAN deverão assentar uma política de emigração nestas bases;

e)

planos de erradicação do trabalho infantil;

f)

a promoção do diálogo social entre empregadores e trabalhadores e o reforço das respectivas organizações;

g)

a promoção e reforço de outros tipos de associações profissionais ou sociais (trabalhadores agrícolas, consumidores, etc.) e de todas as organizações da sociedade civil;

h)

o estabelecimento de condições dignas de trabalho em matéria de saúde laboral e ambiente, eliminando gradualmente o trabalho informal.

7.6

A União Europeia deveria aumentar a sua — já considerável — actividade de cooperação com os países andinos, como factor essencial para a melhoria das condições destes países com vista a um acordo de associação, de acordo com a prioridade que a recente comunicação da Comissão dá à coesão social (26). O CESE apoia a proposta de o Banco Europeu de Investimento aumentar o seu financiamento na América Latina, de modo a que uma proporção significativa desses fundos se destinem a pequenas e médias empresas. Para alcançar este e outros objectivos, a Corporação Andina de Fomento poderia ser um parceiro útil.

7.7

O CESE insta igualmente a Comissão a analisar atentamente a proposta do Parlamento Europeu de criar um fundo de solidariedade bi-regional, que seria especialmente benéfico para os países andinos (e centro-americanos). Considera igualmente que o programa IBERPYME constitui um exemplo adequado de fomento da actividade empresarial e que a experiência acumulada poderia ser aplicável a um projecto similar entre a UE e a CAN.

7.8

Considerando que a Comunidade Andina encontra dificuldades na execução dos vinte projectos que constituem o Plano Integrado de Desenvolvimento Social, esta deveria receber apoio técnico ou financeiro da Comissão Europeia, em especial depois de os ministros da UE terem felicitado a Comunidade Andina pelo plano, a que chamaram «um instrumento muito útil para a promoção da coesão social na Comunidade Andina» (27).

7.9

O CESE salienta a decisão tomada pelo CCEA e pelo CCLA de criarem um Conselho Económico e Social Andino (CESA) idêntico ao modelo europeu e dar-lhe-á o seu apoio através de medidas acordadas no Plano de Cooperação Interinstitucional.

7.10

O CESE considera que deve ser criado um comité conjunto entre o CESE e os conselhos consultivos andinos (e, mais tarde, entre o CESE e o CESA), o que poderia preceder a assinatura do acordo de associação, nos termos do Acordo de Diálogo Político e Cooperação, de 2003, uma vez ratificado.

7.11

A Comissão Europeia e o Secretariado-Geral da Comunidade Andina deveriam — com a cooperação do CESE e dos conselhos consultivos andinos — promover conjuntamente a realização periódica de um fórum de diálogo da sociedade civil andina e europeia, onde as associações e organizações sociais das duas regiões pudessem expor os seus pontos de vista sobre as relações entre a União Europeia e a Comunidade Andina.

Bruxelas, 5 de Julho de 2006.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Cidade do México, 13-15 de Abril de 2004. Também conhecida como Comunidade Andina de Nações, embora esta designação seja menos frequente.

(2)  Guadalajara (México), 28-29 de Maio de 2004.

(3)  Indicadores do milénio da Divisão de Estatística das Nações Unidae (15.10.2003).

(4)  O presente documento, bem como os indicadores que contém, foi elaborado considerando a Venezuela como membro da Comunidade Andina.

(5)  Em princípio, Comunidade Andina (CAN) refere-se a um conjunto de instituições e órgãos, incluindo os países membros, enquanto Sistema Andino de Integração (SAI) refere-se às relações entre esses órgãos. Na prática, porém, não há uma distinção clara entre o SAI e a CAN.

(6)  Artigo 30.o, alínea a), do Acordo.

(7)  Dados colhidos no relatório da Comissão Económica para a América Latina (CEPAL), Panorama de la Inserción Internacional de América Latina y el Caribe, 2004. Tendencias 2005. Santiago do Chile, 2005.

(8)  Ver, por exemplo, Globalização através da Integração, discurso do Secretário-Geral da Comunidade Andina, embaixador Allan Wagner Tizón, na cerimónia oficial de tomada de posse, em Lima, em 15 de Janeiro de 2004 (disponível em:

http://www.comunidadandina.org/index.asp).

(9)  Ver texto em:

http://www.comunidadandina.org/normativa/dec/DEC601.pdf

(10)  Artigo 1.o e Capítulo XVI do Acordo de Cartagena relativo à integração e cooperação económica e social. Carta Social Andina, aprovada pelo Parlamento Andino em 1994 mas ainda não ratificada pelos Governos. Declaração de Cartagena do XI Conselho Presidencial, que encarrega o Conselho de Ministros dos Negócios Estrangeiros de apresentar uma proposta para a participação da sociedade civil, para além da participação empresarial e laboral prevista nas Decisões 441 e 442; Diálogo Presidencial Andino sobre Integração, Desenvolvimento e Coesão Social, Cuzco, 2004

(11)  Cartagena de Indias, Colômbia, 26 de Julho de 1998.

(12)  Marcos-Sánchez, José, La experiencia de participación de la sociedad civil en el proceso de integración andino («A experiência de participação da sociedade civil no processo de integração andino») I Fórum da Sociedade Civil UE-CAN, Bruxelas, Bélgica, Março de 2005.

http://europa.eu.int/comm/external_relations/andean/conf_en/docs/jose_marcos-sanchez.pdf.

(13)  Cartagena de Indias, Colômbia, 25 de Maio de 1999.

(14)  CCLA, Lima, Peru, 7 de Abril de 2005.

(15)  VII reunião ordinária do CCEA (Lima, Abril de 2005).

(16)  Os outros são a Convenção Andrés Bello, relativa à política da educação na região andina, e a Convenção Hipólito Unanue, relativa à política da saúde, sendo esta última também conhecida como Organismo Andino de Saúde.

(17)  Decisão 524, de 7 de Julho de 2002.

(18)  Decisão 539: Grupo de Trabalho Andino sobre a Participação da Sociedade Civil na Defesa dos Direitos do Consumidor, Bogotá, Colômbia, 11 de Março de 2003.

(19)  Foi ainda criado um Grupo de Trabalho das Autarquias Locais, com carácter consultivo.

(20)  Alguns autores referem-se ao acordo como sendo de «terceira geração plus ou quarta geração minus», dada a sua posição intermédia entre os acordos de 1993 e os assinados com o Mercosul, o Chile e o México: Javier Fernández y Ana Gordon, «Un nuevo marco para el refuerzo de las relaciones entre la Unión Europea y la Comunidad Andina» («Um novo quadro para o reforço das relações entre a União Europeia e a Comunidade Andina»), Revista de Derecho Comunitario Europeo, 1989, n.o 17, Janeiro-Abril 2004.

(21)  O n.o 3 do artigo 52.o do Acordo prevê a criação de um Comité Consultivo para «apoiar o Comité Misto na promoção do diálogo com as organizações económicas e sociais da sociedade civil organizada».

(22)  Este aspecto é reconhecido no ponto 6.8.3 do parecer do CESE sobre a coesão social na América Latina e Caraíbas: «O fortalecimento de organizações económicas e sociais independentes e representativas, com capacidade para estabelecerem compromissos, é condição essencial para a consecução de um diálogo social e de um diálogo civil frutuoso e, por conseguinte, para o próprio desenvolvimento dos países latino–americanos.» (JO C 110 de 30.04.2004, p. 55).

(23)  Pontos 4 e 5 da declaração final do Encontro.

(24)  V reunião conjunta do Conselho Consultivo Empresarial Andino e do Conselho Consultivo Laboral Andino em Lima, Peru, 2-3 de Novembro de 2004.

(25)  Em 7 de Abril de 2003, a Confederação Europeia de Sindicatos (CES) e o CCLA assinaram uma declaração que estabelece relações regulares e anuncia um acordo de cooperação. Em 17 de Fevereiro de 2005, em Lima, a ALOP, rede latino-americana de ONG, e a Universidade Católica de Lima organizaram uma reunião de ONG da UE e da CAN.

(26)  Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu — Uma parceria reforçada entre a União Europeia e a América Latina, Bruxelas, COM(2005) 636 final.

(27)  Reunião ministerial UE — CAN (Luxemburgo, 26 de Maio de 2005).


16.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 309/91


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o «Futuro da dimensão setentrional»

(2006/C 309/19)

Em 17 de Novembro de 2005, no contexto das actividades da futura presidência do Conselho da União Europeia, Mari KIVINIEMI, ministra do Comércio Externo e Desenvolvimento da Finlândia, solicitou ao Comité Económico e Social Europeu um parecer sobre o Futuro da dimensão setentrional.

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Relações Externas emitiu parecer em 1 de Junho de 2005. Relator: Filip HAMRO-DROTZ.

Na 428.a reunião plenária realizada em 5 e 6 de Julho de 2006 (sessão de 5 de Julho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou por 162 votos a favor e 5 abstenções o seguinte parecer.

Síntese

Foram decididas, na reunião ministerial dos países da dimensão setentrional (UE, Islândia, Noruega, Rússia) de Novembro de 2005, as orientações para a elaboração da futura política da DS que se iniciará em 2007.

Assumindo a presidência do Conselho, a Finlândia solicitou ao CESE a elaboração de um parecer exploratório sobre a política DS, bem como sobre a participação da sociedade civil.

O CESE apoia as orientações acordadas e apela à Finlândia, que assume a presidência da UE, no sentido de agir vigorosamente em favor da realização da nova política.

O CESE recomenda as seguintes prioridades:

projectos de cooperação em curso nos domínios do ambiente e da saúde pública;

infra-estruturas, transportes e logística;

energia e a respectiva segurança;

reforço da sociedade civil e das sua redes de cooperação, bem como melhoria da informação pública;

no respeitante ao supra referido, chama-se a atenção para a necessidade de estabelecer relações construtivas e abertas, na Rússia, com a sociedade civil, bem como de um diálogo social efectivo; deve-se igualmente apoiar o desenvolvimento de redes transfronteira entre as sociedades civis e reforçar a informação pública;

o CESE salienta que o financiamento dos projectos DS deve ser suficiente e que o respectivo processo de requerimento deve ser claro, rápido e simples;

o CESE propõe que, para a gestão DS, se devem criar mecanismos sólidos comuns, e que se deve igualmente decidir a localização das actividades operacionais. O CESE, crê que os órgãos regionais existentes constituem um ponto de partida natural para a gestão DS;

o CESE propõe a participação da sociedade civil nos mecanismos de gestão DS, na forma de um grupo consultivo nos moldes do processo de Barcelona para o Mediterrâneo. O CESE apoia vigorosamente esta medida.

1.   Contexto

A reunião ministerial da UE e dos países parceiros da dimensão setentrional (Islândia, Noruega, Rússia), realizada em Novembro de 2005, aprovou as novas orientações para o prolongamento da dimensão setentrional a partir de 2007 («Guidelines for the development of a political declaration and policy framework document»)  (1).

As partes da DS constituíram um grupo misto para elaborar um documento conforme as orientações. As partes pretendem tomar uma decisão sobre o prolongamento da política de dimensão setentrional no Outono de 2006.

Em Novembro de 2005, a Finlândia, que assume a presidência do Conselho da UE, fazendo referência aos anteriores contributos do CESE para a política da dimensão setentrional, solicitou ao Comité a apresentação de um parecer exploratório sobre o futuro da política da dimensão setentrional. O pedido solicitava a apresentação, no parecer, de pontos de vista e recomendações, em particular sobre as modalidades de reforço da política no início de 2007, bem como sobre uma melhor participação da sociedade civil na elaboração e na execução da política.

Constam do anexo ao presente documento os antecedentes da dimensão setentrional e os anteriores contributos do CESE.

2.   Recomendações do CESE para o desenvolvimento da dimensão setentrional

O CESE adoptou, em Julho de 2005, um parecer sobre as relações UE-Rússia (2) e adoptou, em Setembro de 2005, um parecer sobre o futuro da dimensão setentrional (3). As conclusões e recomendações são de actualidade e pertinentes, embora não referidas neste parecer. O presente parecer complementa os pareceres supra referidos, a que se fará referência no capítulo das recomendações às partes da dimensão setentrional.

Durante a preparação do parecer, o CESE efectuou uma visita de estudo a S. Petersburgo a fim de recolher os pontos de vista dos actores sobre o prolongamento da dimensão setentrional. Os pontos de vista dos actores da Noruega e Islândia foram recolhidos no âmbito dos contactos do EEE.

2.1.   O CESE apoia a grande visibilidade da cooperação no âmbito da política da DS comum entre a UE, a Islândia, a Noruega e a Rússia

É cada vez mais crescente a importância do Norte da Europa tanto para os europeus como para o mundo em geral, tendo em conta, por exemplo, os recursos energéticos bem como as questões ambientais e climáticas. O Norte da Europa tem necessidade de uma cooperação regional multilateral sólida em que participem igualmente os Estados não membros da UE. Deste modo se complementam as relações bilaterais entre Estados bem como as relações da UE com os países terceiros. O desenvolvimento da cooperação regional contribui para promover a estabilidade, o crescimento económico, o bem estar, o emprego e o desenvolvimento sustentável na região e em toda a Europa.

É evidente que a política da dimensão setentrional tem necessidade de maior visibilidade tanto na União Europeia como nos países parceiros. Deve ser uma política bem estruturada e bem visível, tanto nas instituições comunitárias (e no EEE) e nas administrações estatais como na sociedade civil.

O CESE solicita que a Finlândia, durante a sua presidência da UE, dê um vigoroso ímpeto a este assunto e promova decisões determinadas, bem como um vínculo político a uma política dinâmica. A UE alargou-se a Estados-Membros que constituem recursos preciosos também para o desenvolvimento da DS. O CESE apoia igualmente as orientações propostas no sentido de perenisar a dimensão setentrional como domínio político.

O CESE apoia o reforço da dimensão setentrional como política comum entre a UE, a Islândia, a Noruega e a Rússia. Justifica-se associar a DS aos instrumentos centrais da cooperação entre a UE e a Rússia: a política da DS torna se numa política regional com base nos quatro espaços comuns e a Islândia e a Noruega participam neste novo círculo virtuoso, ao abrigo do acordo EEE.

Na cimeira entre a UE e a Rússia, em Maio de 2006, foi decidido iniciar negociações para a revisão do acordo entre a UE e a Rússia. Tal daria possibilidades ao desenvolvimento de uma cooperação transfronteira dinâmica com base na DS. No âmbito da política DS comum, cria se igualmente a possibilidade de conceber uma estratégia mais aprofundada para o Mar Báltico, que o Parlamento Europeu está a preparar.

O CESE congratula-se com a resolução e o relatório adoptados em Junho de 2006 pelo comité consultivo do EEE «The future of the Northern Dimension Policy», elaborados em estreita colaboração durante a preparação do parecer do CESE.

Importa colocar em destaque desde o início o princípio muito central do «carácter comum» da dimensão setentrional. Os países terceiros da DS devem ter um papel de pleno direito e devem ter uma participação equitativa na elaboração, execução e acompanhamento da política.

Para tal há necessidade de mecanismos rigorosos: um comité permanente de gestão coadjuvado por um número suficiente de subcomités e um órgão efectivo para a gestão operacional. As partes deveriam reunir se anualmente para acompanharem e orientarem a execução da cooperação no âmbito da DS.

Dado que, muitas vezes, as acções da dimensão setentrional são de carácter local, será importante uma boa cooperação entre as administrações locais, subregionais e as centrais na preparação e na execução da política DS.

2.2.   Prioridades recomendadas pelo CESE

O CESE entende que as experiências adquiridas até à data da cooperação nas diversas áreas prioritárias deveriam constituir o ponto de partida para o prolongamento da política da DS. Deve-se tirar partido das experiências positivas dos projectos concretos de parceria público-privado.

2.2.1.   Reforço dos projectos de cooperação em curso nos domínios do ambiente e da saúde pública

A cooperação ambiental em curso no âmbito da DS deverá dar prioridade às medidas de despoluição das águas do Mar Báltico e do golfo da Finlândia, bem como aos esforços de redução imediata do perigo de poluição radioactiva pelos resíduos radioactivos na península de Kola, bem como apoiar os projectos de cooperação ambiental transfronteira na região de Pskov.

No respeitante à cooperação no domínio da saúde pública, deve-se prestar particular atenção à redução das doenças contagiosas, em particular a HIV/SIDA.

O CESE urge as partes da DS a envidarem maiores esforços nas áreas prioritárias no âmbito dos projectos de parceria em curso (NDEP e o projecto do canal Vodokanal em S. Petersburgo e NDPHS). Estes projectos devem ser decisivamente reforçados e alargados, como se deve garantir maior atenção por parte da UE.

2.2.2.   O desenvolvimento das infra-estruturas, dos transportes e da logística na região é pré-condição para a promoção do espírito empresarial, dos investimentos e do crescimento económico

O espírito empresarial, os investimentos e o crescimento económico exigem um sistema efectivo de transportes e logística na área da dimensão setentrional. Para tal, há necessidade de um diálogo no contexto da DS sobre as modalidades de desenvolvimento dos transportes e da logística, a fim de realizar ligações eficazes necessárias ao transporte de mercadorias e de pessoas no norte da Europa. Devem-se desenvolver e interligar os transportes de superfície, aéreos e marítimos com interligações transfronteira. Deve-se dar particular atenção à segurança dos transportes (por exemplo, nas vias marítimas), à cooperação entre as autoridades aduaneiras (formalidades aduaneiras, normas, requisitos sanitários, política de vistos, etc.) a fim de flexibilizar os fluxos transfronteira. No âmbito da DS, devem-se procurar meios eficazes para combater as actividades clandestinas transfronteira (por exemplo, tráfico de pessoas, contrabando, imigração clandestina).

Em matéria de infra-estruturas, transportes e logística, há necessidade de projectos de cooperação público-privado para a implementação da política de dimensão setentrional, e o CESE espera que todas as partes interessadas envidem todos os esforços para realizar tal projecto comum.

2.2.3.   Desenvolvimento da cooperação e segurança no domínio da energia

O alargamento da UE e as tendências internacionais em matéria de energia colocam em destaque a importância de maior cooperação no norte da Europa no domínio da energia. O CESE apela para uma coordenação da cooperação regional e para o diálogo UE-Rússia em matéria de energia, a fim de melhorar a segurança e o aprovisionamento de energia. O Comité recomenda a criação de uma parceria DS no domínio da energia, no âmbito da nova política DS, com foco no desenvolvimento sustentável da utilização de recursos naturais, na eficácia energética e nas fontes de energia renováveis, bem como na segurança do transporte de energia, numa óptica ambiental.

Sendo uma região com vastos recursos energéticos, a área da dimensão setentrional não é importante apenas para os países da região, mas exerce um impacto considerável na globalidade da UE. Em virtude do seu papel crucial na segurança do aprovisionamento de petróleo e gás para a UE, a região merece a atenção de todos os Estados-Membros da UE. O aumento do foco no Norte da Europa na nova política energética da UE deveria contribuir para uma maior visibilidade da nova política da dimensão setentrional. A Comissão, no seu Livro Verde sobre energia (4), refere especificamente a Rússia e a Noruega como importantes parceiros no âmbito de uma possível nova política energética externa e coerente da UE.

A dimensão setentrional é um importante elemento para o desenvolvimento equilibrado da infra-estrutura energética da Europa. Serão necessários consideráveis investimentos na região da dimensão setentrional a fim de garantir um nível suficiente de aprovisionamento energético no futuro, tanto no respeitante às infra-estruturas de transporte de energia como ao aproveitamento das reservas de gás da região. Um investimento crescente significa crescimento económico, inclusive aumento de emprego e mais elevados níveis de actividade igualmente em indústrias não directamente ligadas à exploração dos recursos no mar. Será todavia importante que, em particular, a exploração dos vastos recursos de gás e de petróleo, assente numa óptica de desenvolvimento sustentável, nos mais elevados níveis de normas ambientais e no respeito das expectativas das populações locais.

Será necessário um sistema de acompanhamento dos ecossistemas marinhos no norte, que deveria ser parte da cooperação transfronteira da DS. Será importante que a exploração dos recursos de gás e petrolíferos vão a par com uma indústria pesqueira viável e um ambiente marinho saudável. Deve-se garantir o mais elevado nível possível de segurança do transporte marítimo de petróleo e de gás, aumentando esta necessidade com um transporte mais extensivo de gás natural líquido no futuro.

Neste contexto, reveste-se de importância a proposta do governo da Noruega de 31 de Março de 2006 relativa a um novo sistema mais coordenado de acompanhamento dos ecossistemas marinhos no norte. O CESE constata igualmente com satisfação a resolução adoptada pelo comité parlamentar misto do EEE em Maio de 2006 «Europe's High North: Energy and Environmental Issues», cujas conclusões estão em sintonia com o presente parecer.

O CESE salienta que na cooperação em matéria de energia da DS se deve prestar séria atenção ao vigoroso crescimento do transporte de energia no golfo da Finlândia e no mar Báltico, em particular no que respeita à organização e segurança dos transportes, bem como à minimização do risco de danos ambientais.

2.2.4.   Colocar em destaque a sociedade civil, as redes de cooperação e a informação pública

2.2.4.1.   Reforçar a sociedade civil, os valores democráticos comuns, os direitos humanos e o diálogo social e civil transparente

Para ser bem sucedida, a cooperação entre os parceiros da dimensão setentrional requer a aplicação de valores comuns em cada um dos países da DS. São complementares o pluralismo democrático, uma vigorosa sociedade civil, diálogo social e civil transparente e uma efectiva economia de mercado. Estas questões devem ser destacadas de modo decisivo, em particular na Rússia, onde há necessidade de uma sociedade civil activa e de instituições democráticas.

No seu parecer de Julho de 2005 sobre as relações UE-Rússia, o CESE prestou séria atenção às condições prevalecentes na Rússia nesta importante matéria. O Comité constata que a nova lei relativa aos actores da sociedade civil vem agravar ainda mais a situação actual. Situação essa que deverá ser reformada com a aplicação da lei, no futuro. Quando as autoridades russas desenvolverem de modo credível as suas políticas e práticas no sentido de estabelecer relações construtivas e transparentes com os actores da sociedade civil, a estreita cooperação com a Rússia merecerá vasto apoio. Será importante que a «Civic Chamber» criada na Rússia se torne num instrumento credível para o reforço de um diálogo civil efectivo. Deve-se reforçar a capacidade dos actores da sociedade civil russa para um diálogo construtivo.

Estas questões devem ser tratadas como parte da cooperação regional da DS, de que a Rússia é uma das partes.

2.2.4.2.   Promoção das redes transfronteira de cooperação da sociedade civil

Deve-se reforçar o diálogo efectivo e transparente transfronteira para promover as questões supra referidas. Os actores da sociedade civil têm uma responsabilidade central e um papel a desempenhar nesta matéria e será imprescindível que os diferentes círculos da sociedade civil tomem iniciativas para reforçar a cooperação nas suas áreas de actividade. Deve-se salientar que a chamada «co-propriedade» da DS não é uma matéria exclusivamente entre governos, mas que abrange igualmente as sociedades civis e os respectivos actores dos países participantes. Só se conseguirão bons resultados na aplicação da política DS se os actores da sociedade civil forem integrados no processo de modo activo.

No âmbito da política DS, deve-se apoiar de modo decisivo a possibilidade de criar redes de diálogo cooperação entre os actores da sociedade civil nos diferentes países parceiros da DS e em sub-regiões, por exemplo, no noroeste da Rússia. Uma das prioridades da política deverá ser a cooperação transfronteira «entre pessoas». Deve-se promover a mobilidade, o desenvolvimento dos recursos humanos, a troca de experiências, de competências e de conhecimentos, bem como o reconhecimento mútuo das qualificações. A cooperação transfronteira deve abranger todos os diferentes actores da sociedade civil, por exemplo, empresários, PME e outras empresas, trabalhadores, jovens e estudantes, mulheres, cientistas e círculos culturais, membros de minorias, círculos de protecção do ambiente, sectores agrícolas e florestais, consumidores. Nas actividades transfronteira, deve-se favorecer a criação de parcerias e iniciativas concretas para projectos comuns entre aqueles actores. Os actores relevantes devem ter a possibilidade de tomar iniciativas, de modo simples, no âmbito dos projectos de cooperação da dimensão setentrional.

O desenvolvimento de relações tripartidas efectivas e de mercados de trabalho em todas as regiões da área abrangida pela DS teria por objectivo um equilíbrio entre a concorrência leal entre as empresas e condições de trabalho decentes para os trabalhadores. As relações e os mercados de trabalho já estão bem desenvolvidos em muitos países, e as respectivas competências devem ser partilhadas com organizações de países em que estão menos desenvolvidas. A política da dimensão setentrional deveria constituir um instrumento de enquadramento adequado para projectos transfronteira nesta área. O papel dos parceiros sociais em cada país da DS deverá consistir em garantir que as iniciativas e a legislação relativas às mutações económicas e sociais, e à melhoria da situação de emprego, tenham em devida conta os seus interesses de modo equilibrado. Para tal, deverão ser implicados em todos os debates sobre questões do mercado de trabalho.

2.2.4.3.   Reforço da informação pública

A visibilidade pública da dimensão setentrional é muito fraca. É pouco conhecida em todos os países, tanto na UE como nos países terceiros da DS. Assim, a DS deverá focar a informação e um considerável reforço dos canais de informação. É necessária uma informação pública suficiente sobre a dimensão setentrional, uma vez que é através dela que se poderá despertar o interesse da sociedade civil para a DS e incentivar os seus actores a integrarem o processo e darem os seus contributos. Os actores da sociedade civil devem ser igualmente divulgadores da informação na sociedade e, para tal, deve-se prestar maior atenção às acções de sensibilização e de formação.

É evidente a necessidade, nas regiões da dimensão setentrional, de um centro de tratamento da informação supra referida, bem como de coordenação prática das redes, dos contactos e do financiamento. As partes interessadas da DS deverão tomar uma decisão sobre a criação de tal centro. O CESE recomenda, para tal, a reabertura da agência da Comissão em S. Petersburgo, recentemente encerrada, e que seja incumbida das medidas operacionais da DS conjuntamente acordadas. Deve-se igualmente ponderar as possibilidades de atribuir as actividades operacionais da DS ao secretariado de um órgão regional existente referido no ponto 2.4.

2.2.5.   As relações com a sociedade civil da Bielorússia necessitam atenção

Nas discussões sobre o desenvolvimento da política da dimensão setentrional, sugeriu-se abranger igualmente a Bielorússia, de certo modo. Tal se justifica numa óptica geográfica mas, por outro lado, as actuais condições políticas naquele país não favorecem uma cooperação oficial. O CESE salienta todavia que as questões levantadas no ponto 2.2.4 abrangem igualmente a Bielorússia.

O CESE é de opinião que estas questões podem ser resolvidas através de contactos dos actores da sociedade civil com os seus homólogos da Bielorússia. O Comité continuará a fortalecer os seus contactos e propõe que esta actividade seja apoiada no âmbito da dimensão setentrional.

O CESE está a preparar um parecer sobre as relações entre a UE e a Bielorússia.

2.3.   Necessidade de consulta da sociedade civil como parte do mecanismo de cooperação da DS O CESE apoia vigorosamente esta medida

A DS deve ser dotada de um mecanismo de consulta efectivo, por forma que os actores da sociedade civil possam, através dos seus pontos de vista, recomendações e participação, contribuir para a execução e acompanhamento da DS.

O CESE crê que uma reunião anual dos actores da sociedade civil, nos moldes da cooperação euromediterrânica, activa há vários anos, seria um modelo eficaz. A cooperação euromediterrânica engendrou boas experiências, bem como o comité consultivo de cooperação do EEE. A par disso, justifica-se a criação de um subcomité consultivo da sociedade civil subjacente ao comité de gestão DS, como sugerido no ponto 2.1, que poderia participar na política de acompanhamento de modo regular e preparar a reunião anual.

Esta modalidade ofereceria aos responsáveis da política DS a possibilidade de tirarem partido dos contributos dos diferentes actores da sociedade civil em questões económicas e sociais da execução da DS.

O CESE já organizou anteriormente duas conferências com a participação de actores da sociedade civil de diferentes países da DS. Ao longo dos anos, o Comité consolidou os seus contactos com os actores centrais da sociedade civil de diferentes países terceiros parceiros da DS. Assim, o Comité possui uma experiência prática de cooperação com a sociedade civil na região, a qual pode ser directamente aproveitada.

O CESE prontifica-se a participar de modo activo no acolhimento dos actores da sociedade civil na execução da futura política DS. O Comité pretende criar um grupo distinto de acompanhamento e poderia desempenhar um papel preponderante na organização das reuniões anuais dos actores da sociedade civil. Assim, ter-se-ia igualmente em conta a cooperação em curso no âmbito da DS. O objectivo das reuniões consistiria em apresentar orientações para a execução da DS, em particular nas questões relacionadas com o funcionamento da sociedade civil, nas questões levantadas no ponto 2.2.4. O Comité recomenda que o sistema supra referido seja integrado no mecanismo oficial de cooperação DS.

2.4.   Os órgãos regionais constituem um ponto de partida natural para a gestão da cooperação DS

O CESE apoia a ideia segundo a qual os órgãos de cooperação já existentes, em particular o Conselho dos Estados do Mar Báltico (CBSS), o Conselho Euro-Árctico de Barents (BEAC), o Conselho de Ministros dos Países Nórdicos (NMC) e o Conselho Árctico deveriam ter um papel central na implementação da dimensão setentrional. Deve-se promover de modo decisivo a coordenação e a cooperação entre estas instâncias e o comité de gestão DS proposto no ponto 2.1, uma vez que constituem um excdlente ponto de partida para a gestão global da DS.

Neste contexto, a sociedade civil teria uma verdadeira possibilidade de contribuir para a cooperação DS por via das suas próprias redes regionais de cooperação (por exemplo, a BASTUN dos trabalhadores, a BAC das empresas e a BCCA das câmaras de comércio e os círculos ONG) e, através destas, para os órgãos acima referidos.

2.5.   O financiamento das medidas DS deve ser claro

As áreas prioritárias deveriam constituir projectos de parceria público-privado (PPP), com parceiros, programas de acção, calendários e orçamentos convincentes.

Igualmente nos casos em que os países parceiros ainda não conseguiram um projecto de parceria nas determinadas áreas prioritárias, devem todavia tentar acordar medidas precisas, bem como a sua execução e financiamento.

No respeitante às acções de execução propostas pelos actores da sociedade civil (ponto 2.2.4), será importante criar um mecanismo tão simplificado quanto possível para financiar acções de pequenas dimensões. Há necessidade de assistência técnica para prestar orientações no processo de requerimento. Ao mesmo tempo, será extremamente importante que o exame e o processo de aprovação das propostas de projectos sejam breves e simples. O CESE é de opinião que os representantes da sociedade civil poderiam ter uma participação de responsabilidade na manutenção deste processo.

O Instrumento Europeu de Vizinhança e Parceria (IEVP) deverá ser, por parte da UE, a fonte central de financiamento das acções DS. Uma parte suficiente das dotações do IEVP deve destinar-se aos projectos e acções DS, e a gestão DS deve reservar dotações suficientes.

O financiamento por parte da Rússia e os mecanismos de financiamento do EEE são necessários para a realização da cooperação regional transfronteira. Outras fontes de financiamento internacionais e nacionais, que têm participado nos projectos DS (BERD, BEI, BNI), continuarão a ser necessárias no futuro para garantir o sucesso da política DS.

A sociedade civil deve ter acesso eficaz à informação sobre os financiamentos disponíveis e respectivas fontes, bem como sobre o processo de requerimento de financiamento para os seus projectos.

Bruxelas, 5 de Julho de 2006.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  http://europa.eu.int/comm/external_relations/north_dim/doc/guidelines05.pdf

(2)  Parecer do CESE sobre o «Contributo da sociedade civil para as relações UE-Rússia»JO C 294, 25/11/2005, p. 33.

(3)  Parecer do CESE sobre «A dimensão setentrional e o plano de acção», JO C 24, 31/01/2006, p. 34.

(4)  Livro Verde da Comissão sobre «Uma estratégia europeia para uma energia sustentável, competitiva e segura», 8 de Março de 2006.


16.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 309/96


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Política Europeia de Vizinhança».

(2006/C 309/20)

Em 22 de Abril de 2005, a Comissão, por ofício da comissária FERRERO-WALDNER de 22 de Abril de 2005, decidiu, nos termos do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a Política Europeia de Vizinhança.

A Secção Especializada de Relações Externas, encarregada de preparar os correspondentes trabalhos, emitiu parecer em 4 de Maio de 2006, com base no projecto da relatora G. CASSINA.

Na 428.a reunião plenária de 5 e 6 de Julho de 2006 (sessão de 5 de Julho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 160 votos a favor, 2 votos contra e 9 abstenções, o seguinte parecer:

Contexto

O CESE já elaborou duas avaliações parciais da política europeia de vizinhança (PEV), dizendo respeito uma delas aos países da Europa Central e Oriental e a outra aos países da Bacia do Mediterrâneo (1). No presente parecer serão, portanto, retomados apenas alguns temas destes dois documentos que serão transmitidos, para informação, juntamente com o presente parecer, às autoridades da UE e dos países interessados.

0.   Síntese e conclusões

0.1.

O CESE considera a política europeia de vizinhança (PEV) de grande importância estratégica, sendo necessário valorizar o seu potencial para a paz, a estabilidade, a partilha dos valores e das políticas e a promoção dos intercâmbios a todos os níveis com os países vizinhos através de uma actuação coerente e responsável (pontos 1.5 e 1.6).

0.2.

O CESE sublinha, em particular, a necessidade de assegurar a coerência entre:

as políticas externas dos Estados-Membros e a PEV,

as demais acções no âmbito das relações externas da UE e da PEV,

as políticas externas e internas dos países parceiros e a PEV,

as acções das várias Direcções-Gerais da Comissão envolvidas na aplicação da PEV,

as opções orçamentais da UE e a importância estratégica da PEV,

a aplicação do princípio de diferenciação (que poderá gerar dinâmicas positivas de competitividade entre países e zonas) e a oportunidade de criar sinergias dentro de cada zona e entre várias zonas (propícia à cooperação e à maior compreensão),

as medidas concretas consideradas prioritárias e os grandes objectivos perseguidos.

0.3.

O CESE solicita a todos os actores institucionais envolvidos que reconheçam na prática que o princípio da titularidade (ou propriedade) implica um forte apelo aos valores democráticos que devem ser respeitados e promovidos e não só partilhados formalmente. A titularidade deve ser, com efeito, o princípio orientador não só das relações entre a UE e os países parceiros (PP), mas também dentro da própria UE e, nos PP, entre as administrações nacionais e os representantes da sociedade civil. Assim sendo, uma realização eficaz e satisfatória da PEV apenas será possível com a participação sistemática das organizações da sociedade civil, em particular dos actores sociais e socioprofissionais, cujo papel consultivo e cuja capacidade negocial importa reconhecer e promover explicitamente. Importa, por conseguinte, assegurar:

informações claras, transparentes, documentadas e céleres sobre as decisões com respeito à aplicação da PEV,

locais, instrumentos e mecanismos de consulta e participação na formação dessas decisões para um diálogo civil eficaz,

informações e instrumentos para avaliar as realizações, também com o compromisso de realizar periodicamente acções nesse sentido,

oportunidades de formação que permitam a essas organizações contribuírem para a concretização da PEV e darem um contributo mais eficaz graças ao acesso aos recursos e aos programas comunitários,

oportunidade de construir redes de diálogo, de cooperação e de controlo da aplicação da PEV, entre as organizações dos vários países e das várias zonas.

0.4.

O CESE fará tudo que estiver ao seu alcance para construir, manter e desenvolver as relações com os órgãos consultivos e/ou com as organizações socioprofissionais dos PP, estar sempre atento às suas expectativas e cooperar com o Parlamento Europeu e o Comité das Regiões com o fito de contribuir para uma PEV participativa, eficaz e coerente com os objectivos de paz, estabilidade, segurança e desenvolvimento partilhado e sustentável.

1.   Introdução

1.1

No decurso do processo de integração, as autoridades comunitárias sempre tiveram em conta a realidade nos países vizinhos devido a, pelo menos, dois bons motivos:

o primeiro concerne à razão política fundamental que compeliu os países europeus a integrar-se numa comunidade, ou seja, a necessidade de paz, de liberdade e de estabilidade, tanto dentro como fora da zona de integração,

o segundo, correspondente ao processo de integração económica e dos mercados, sugeria o imperativo dúplice de garantir uma zona de trocas comerciais mais ampla do que a constituída apenas pelos Estados-Membros e de competir com países que tinham alcançado ou estavam em vias de alcançar um nível de crescimento económico e de desenvolvimento humano comparável ao da Comunidade, e poderem assim beneficiar mutuamente das trocas comerciais sem o perigo de distorções, de dumping e/ou medidas proteccionistas de uma ou da outra parte.

1.2

Durante o longo período de divisão do mundo em dois blocos, a heterogeneidade das economias da Europa Oriental e Ocidental, mas sobretudo a diversidade dos sistemas políticos, reduziram infelizmente ao mínimo os intercâmbios (não apenas económicos, mas também humanos, culturais e sociais). Além disso, o conhecimento entre os povos cingia-se a meros contactos diplomáticos ou a relações superficiais entre organizações e autarquias. Esta situação teve dois efeitos negativos: por um lado, cristalizou os estereótipos herdados da guerra fria e, por outro, conferiu uma aura de legitimidade democrática internacional que os governos do regime soviético não tinham nem podiam ter.

1.3

Neste mesmo período, todavia, a Comunidade Europeia desenvolveu as suas relações com os países europeus democráticos vizinhos (ou que tinham transitado de uma ditadura para uma democracia, como a Grécia, a Espanha e Portugal) e levou a bom termo uns quatro processos de alargamento (2). Foram, por outro lado, estabelecidas relações estáveis com os países que não teriam a perspectiva ou não tencionavam entrar na Comunidade, através de acordos específicos. Recorde-se aqui a Associação Europeia de Comércio Livre (EFTA) constituída em 1960, o Espaço Económico Europeu (EEE) de 1994 e ainda uma série muito vasta de acordos bilaterais (especialmente com os países da Bacia do Mediterrâneo).

1.4

Entre finais dos anos oitenta e o início dos anos noventa, a região adjacente composta pelos países do Sul e do Leste da Bacia do Mediterrâneo foi adquirindo progressivamente grande importância aos olhos da Comunidade Europeia, um processo que culminou com a definição na Conferência Interministerial de Barcelona de 1995 de uma parceria estratégica estruturada em acordos de associação e projectos regionais. O seu objectivo era construir até 2010 uma zona de comércio livre, de segurança e de prosperidade para todos.

1.5

Mas o acontecimento que mudou radicalmente o contexto geopolítico da Comunidade — que lograra entretanto concretizar a integração dos mercados e se preparava para introduzir a moeda única — foi a libertação dos países do Centro e do Lesta da Europa do jugo soviético e a sua transição para a democracia e a economia de mercado.

1.6

A reunificação do continente europeu, a par do alargamento de 1 de Maio de 2004, representa a principal conquista política da Europa na história do pós-guerra que transformou a União Europeia numa zona rica de capital humano, cultural, histórico, económico e social, sem precedentes no passado. Esta grande mutação quantitativa e qualitativa da UE exige que se entenda a fundo, se valorize, promova e defenda a nova realidade, o que exige a adaptação de todas as políticas comunitárias e, por conseguinte, das relações com os nossos vizinhos. A política europeia de vizinhança nasceu desta convicção, inteiramente partilhada pelo CESE que contribuiu para estes sucessos com o seu grande empenho na cooperação e no diálogo com as organizações da sociedade civil dos países candidatos.

2.   A fase inicial da política europeia de vizinhança (PEV)

2.1

Já no Conselho de Assuntos Gerais e Relações Externas de finais de Novembro de 2002, se manifestou a necessidade de elaborar uma política de vizinhança. Em Dezembro do mesmo ano, o Conselho Europeu de Copenhaga convidou a UE a intensificar as relações com os países limítrofes com base em valores comuns, a fim de evitar novas divisões na Europa e promover a estabilidade e a prosperidade tanto dentro como fora das suas fronteiras. Inicialmente, a maior atenção foi para as relações com a Rússia, a Ucrânia, a Bielorússia e a Moldávia, mas também para os países parceiros mediterrânicos (PPM).

2.2

Em 2003 e 2004, a Comissão publicou duas comunicações e, ainda em 2004, uma proposta de regulamento para a criação de um instrumento europeu de vizinhança e parceria (3).

2.3

Para além dos países supramencionados, durante 2004 e em resposta a um pedido explícito de três países do Cáucaso Meridional, a PEP foi alargada à Arménia, ao Azarbeijão e à Geórgia. Anteriormente, a Rússia já tinha comunicado que não participaria na PEV, mas prosseguiria as suas relações com a UE no quadro específico de «parceria estratégica». A PEV tão pouco se aplica aos países balcânicos enquadrados no Pacto de Estabilidade dos Balcãs e/ou candidatos à adesão, como a Croácia, nem à Turquia (antes inserida na política de parceria euromediterrânica e hoje um país candidato cujas negociações de adesão tiveram início em 3 de Outubro de 2005).

2.4

A PEV propõe-se partilhar com os países vizinhos uma série relevante de políticas, o que implica o empenho prioritário da UE e dos países parceiros (PP) na defesa dos valores comuns (princípio de titularidade ou de apropriação comum): Estado de direito, boa governação, respeito dos direitos humanos e das minorias, afirmação do princípio de igualdade entre homens e mulheres, economia de mercado e desenvolvimento sustentável. Também se espera dos PP que se empenhem sobretudo na luta contra o terrorismo, contra a proliferação das armas de destruição em massa, no respeito da legalidade internacional e na resolução de conflitos por via pacífica.

2.5

Em concertação com os PP, foram definidos planos de acção nacionais (PAN), consoante a especificidade e as exigências dos vários interlocutores (princípio de diferenciação), mas com um conjunto de prioridades comuns associadas à promoção dos valores a que se refere o ponto anterior. Os PAN são seguidamente aprovados pelos respectivos conselhos de associação e aplicados em cooperação entre o PP interessado e a UE. A execução dos PAN será acompanhada pela UE através de relatórios periódicos da Comissão, o que permitirá adaptar o desenvolvimento da estratégia também aos resultados obtidos por cada país parceiro.

2.6

Até ao fim do actual período de programação financeira (finais de 2006), serão afectados recursos ao abrigo dos programas TACIS e MEDA. Nas Perspectivas Financeiras 2007-2013 deveria haver, por seu turno, um único instrumento de financiamento da PEV (Instrumento europeu de vizinhança e parceria) com uma dotação financeira a definir mas que, na proposta da Comissão, deveria corresponder aproximadamente ao dobro dos recursos actualmente à disposição dos dois programas supra.

2.7.

Infelizmente, o CESE constata que, até à data, a Comissão não propôs nem nos seus documentos nem nas negociações para a definição dos PAN quaisquer elementos intrínsecos ao desenvolvimento comunitário e apoiaram e tornaram mais democrático e participativo o processo de integração. Concretamente, são omitidos os conceitos de «diálogo social» e de «função consultiva». O CESE já assinalou estas lacunas à Comissão em várias ocasiões e espera, por isso, que todas as autoridades comunitárias zelem para que esses conceitos sejam uma prática na aplicação da PAN.

3.   O conceito de «vizinhança» e os problemas gerais

3.1

Se o conceito de «vizinhança» parece intuitivamente bastante claro, já é menos evidente como é que uma política baseada nesta intuição, mas muito ambiciosa, pode ter o rigor estratégico requerido. Com efeito, a UE enquanto tal desenvolveu uma política externa que ainda é limitada pelo facto de muitas competências neste plano serem zelosamente conservadas e exercidas pelos Estados-Membros. O problema é compreender que a UE não pretende com a sua política de relações externas expropriar os Estados-Membros das suas estratégias internacionais, mas sim completá-las e conferir-lhes valor acrescentado, se estes estiverem dispostos a actuar em conjunto e a dotar-se de instrumentos para coordenar as suas acções de política externa, por forma a garantir a coerência e a eficácia das acções de todos os actores operando numa certa área de intervenção. No caso da PEV, é possível alcançar este objectivo, mas só na condição de os Estados-Membros e a UE zelarem com determinação pela coerência com o quadro europeu e se apresentarem aos seus interlocutores como um bloco com os mesmos objectivos e propostas convergentes.

3.2

Na opinião do CESE, o conceito de «política de vizinhança» exclui uma interpretação meramente geográfica. A definição dada à PEV nos vários documentos citados na nota de rodapé n.o 3 procura antes dar ao termo uma forte conotação de comunidade (ou da busca de comunidade) de valores, de culturas e de intenções (4). Portanto, embora o princípio de vizinhança apresente também características geográficas, alicerça-se em políticas e valores. Não se pode, por conseguinte, excluir a possibilidade de integrar futuramente outros países na PEV.

3.3

Uma dificuldade que poderia surgir em relação ao princípio de apropriação comum (ou titularidade comum) das acções a empreender é que não se fale de adesão no caso dos países parceiros da PEV. É certo que a perspectiva de uma eventual adesão seria muito mais motivadora, mas é legítimo relevar que os conteúdos, a metodologia e, proporcionalmente, também os recursos destinados à realização dos planos de acção nacionais são idênticos — senão iguais — aos utilizados no processo de adesão dos novos Estados-Membros do último alargamento. Também o mecanismo de aplicação de políticas de desenvolvimento nos países parceiros deveria ter por modelo a experiência das políticas estruturais e assentar numa parceria muito estreita ente UE e os PP. Uma das características do método adoptado pela PEV é avançar paulatinamente, o que permite controlar os procedimentos e os instrumentos utilizados, mas sobretudo avaliar as evoluções mais significativas susceptíveis de alterar, eventualmente, o quadro dos objectivos estabelecidos actualmente. A «nova fase» da PEV prevê já a intensificação das relações com os PP que melhor aplicam os PAN. Trata-se de uma espécie de «prémio» que deveria estreitar ainda mais as relações económicas, políticas e, espera-se, também entre as sociedades, para corresponder às expectativas, por vezes bastante exaltadas até, das populações dos PP. O CESE considera, portanto, que seria um erro propor agora um quadro rígido excluindo qualquer possibilidade de adesão ou alimentar falsas esperanças.

3.4

A Comissão publicou, em Março de 2005, uma comunicação com recomendações aos países com os quais ainda não foram aprovados planos de acção nacionais (5), ou seja, três países do Cáucaso Meridional, e ainda o Egipto e o Líbano. O Conselho Europeu de 25 de Abril de 2005 deu o seu aval ao documento e fez votos para que a definição dos PAN fosse concluída em breve, a fim de permitir aos órgãos competentes (conselhos de associação) aprová-los rapidamente e a entrada dos mesmos em fase de aplicação. O Conselho também chamou a atenção para a necessidade de aplicar o princípio de diferenciação mas, ao mesmo tempo, deu realce à declaração dos três países do Cáucaso Meridional que tencionam utilizar da melhor forma os instrumentos da PEV para reforçar a cooperação regional (ver ponto 4).

4.   Os problemas das várias zonas

4.1

A PEV caracteriza-se por uma forte bilateralidade UE/PP, mas as principais áreas de intervenção desta política (que podemos definir grosso modo como as dos países da Europa Central e Oriental, do Mediterrâneo e do Cáucaso Meridional) revelam especificidades internas a que deveriam ficar especialmente atentos os responsáveis pela aplicação da PEV para ser possível desenvolver sinergias entre as várias zonas e as relações internas dentro de cada uma delas. Para alcançar este objectivo, serão necessárias acções e incentivos bem orientados que facilitem e encorajem o desenvolvimento das relações e da cooperação dentro de cada uma delas mas também entre as várias zonas. Não só os países das três zonas — que muitas vezes o solicitam expressamente — tirariam partido desta abordagem, mas esta favoreceria igualmente a estabilidade, a segurança e a paz em toda a UE e, por arrastamento, dos países que se situam para além da zona geográfica de aplicação da PEV. É, contudo, importante manter a flexibilidade e o pragmatismo para garantir um equilíbrio adequado entre bilateralismo e promoção da cooperação dentro de cada zona e entre as várias zonas.

4.2

O mecanismo de aplicação da PEV implica um certo grau de concorrência entre os vários PP. Com efeito, à medida que um país vai progredindo para os objectivos fixados conjuntamente com a UE, a sua condição de parceiro da UE poderá melhorar (mais facilidades, maior apoio a acções-chave, mais abertura dos mercados, facilidades para a circulação de pessoas, etc.). Esta competitividade poderá manifestar-se igualmente ao nível das zonas, convindo aqui ficar alerta para evitar frustrações e atitudes de desistência por parte das zonas — ou dos países dentro de cada zona — que lutam com maiores dificuldades. É crucial favorecer os contactos entre países e zonas diversas porque se todos os intervenientes na PEV estiverem convencidos de que estão a trabalhar não só para si próprios mas também para uma grande empresa comum, será mais fácil desenvolver o entendimento recíproco e detectar possíveis percursos de cooperação porventura ainda por explorar. O contributo da sociedade civil pode ser um motor para acelerar este dinâmica.

4.3

Ao mesmo tempo, convém assinalar a existência nas três grandes zonas cobertas pela PEV de conflitos abertos, latentes ou potenciais. São patentes outras tensões, também no interior de alguns PP, sobretudo onde a democracia ainda não está bem consolidada. É legítima a preocupação com as suas possíveis repercussões no interior da UE, mas deve haver uma preocupação ainda maior em relação à segurança e à estabilidade dos PP e da sua população. Haverá, por conseguinte, que prestar uma atenção especial e constante às intervenções que, no âmbito da aplicação dos PAN, se orientem explicitamente para neutralizar as fontes de tensão e de confronto, com o fito de criar as condições para superar as dificuldades e promover a cooperação entre os países, as economias e os povos. Inútil é dizer que estas medidas deverão envolver plenamente as organizações da sociedade civil enquanto protagonistas da cooperação económica, social e cultural imprescindível para a convivência pacífica.

4.3.1.

É igualmente essencial assegurar, no desenvolvimento das várias iniciativas comunitárias que se prendem com as relações externas, a coerência com as diversas componentes da PEV. Particularmente delicadas, neste contexto, são as relações com a Rússia no quadro da parceria estratégica, como bem demonstrou a recente crise do gás. É, além disso, oportuno (e não só no caso da Ucrânia) verificar atentamente todas as eventuais consequências, também de ordem social e económica, do reconhecimento do estatuto de economia de mercado, tanto para o país interessado como para a UE.

4.3.2.

Neste contexto, seria hipócrita ocultar o facto de um dos objectivos da PEV ser assegurar as boas relações com países que são nossos fornecedores de matérias-primas energéticas. Não há aqui nada de escandaloso desde que se cumpram duas condições essenciais: que a legítima preocupação de aprovisionamento não prevaleça sobre os objectivos de desenvolvimento económico e social compatível dos PP e que os Estados-Membros sejam mais coerentes e revelem uma vontade genuína de cooperar entre si para resolverem juntos os problemas tão delicados quanto estratégicos associados ao sector energético.

4.4

Na mesma ordem de ideias e de objectivos, é primordial a cooperação transfronteiriça entre os Estados-Membros e os países parceiros. Os novos Estados-Membros confinam, na sua grande parte, com países ao abrigo da PEV e conhecem, por conseguinte, as dificuldades eventualmente associadas à vizinhança mas também as oportunidades que lhes são proporcionadas pela contiguidade. A aplicação da PEV deverá, portanto, visar a redução ao mínimo dos riscos de instabilidade (tanto política como económica e social), mas sobretudo favorecer a transformação das oportunidades potenciais em políticas concretas e em realizações de utilidade recíproca. Isto terá um impacto positivo em todo o território comunitário — hoje muito aberto e homogéneo — em termos de desenvolvimento e de melhoria das trocas comerciais, de maior segurança e de um melhor conhecimento das populações.

4.5

Este parecer não pretende analisar a situação específica dos vários países nem das diversas zonas, uma vez que, como se disse no início, o CESE já forneceu alguns contributos específicos sobre o Mediterrâneo e os seus novos vizinhos do Leste. Em Fevereiro de 2006, a iniciativa do CESE em Kiev, com as organizações da sociedade civil ucraniana — as quais se mostram entusiasmadas em relação à UE e alimentam grandes expectativas em relação à PEV — fez emergir a sua grande vitalidade e demonstrou que os trabalhos relacionados com a elaboração do parecer sobre os vizinhos do Leste começaram já a dar frutos. O CESE está determinado a fixar objectivos de diálogo e de cooperação mais estruturados e a mais longo prazo com as organizações da sociedade civil da Ucrânia.

4.5.1

Quanto à Bielorússia, o CESE exprime grande preocupação pelos recentes acontecimentos e condena a repressão e as práticas antidemocráticas e persecutórias que lesam os direitos civis e sociais. O CESE, que continuará a desenvolver relações cada vez mais estreitas com as organizações de sociedade civil bielorussa, está a preparar um parecer a este propósito (6).

4.5.2

O CESE deplora a ausência de uma análise directa e mesmo de contactos estáveis com as organizações da sociedade civil dos países do Cáucaso Meridional. Esta lacuna poderia ser colmatada dentro em breve com a realização de um trabalho de aprofundamento num relatório de informação e num eventual parecer específico.

5.   Os instrumentos metodológicos e financeiros

5.1

Os métodos de aplicação dos PAN requerem um processo contínuo de diálogo e de negociação entre as autoridades da UE e as dos países interessados. Além disso, todas as medidas deverão ser aplicadas por ambas as partes segundo os procedimentos correntes no quadro comunitário. O CESE já manifestou antes a sua viva preocupação perante as dificuldades colocadas aos beneficiários no acesso aos fundos previstos pelo programa MEDA, sentidas sobretudo pelas organizações da sociedade civil (7). Embora seja indispensável que os processos de concessão e de controlo dos fundos sejam extremamente rigorosos para evitar a sua utilização fraudulenta, importa garantir a sua clareza, transparência (p.ex. tradução dos formulários na língua dos destinatários!), simplicidade e um nexo directo com os objectivos políticos da PEV. Não é aumentando desmesuradamente os procedimentos de acesso aos fundos e complicando-os numa lógica exclusivamente burocrática que se obtém uma maior adequação às prioridades nem a eficácia requerida. Deste modo, apenas se favorece os «profissionais da cooperação» representados pelas empresas de consultores que levam ao aniquilamento da riqueza da especificidade e da capacidade de iniciativa dos parceiros. As autoridades da UE insistem que a PEV deve ser entendida como uma política «feita por medida», o que é sem dúvida essencial, mas só na condição de traduzir-se igualmente nos métodos de aplicação adaptando-os sistemática e constantemente à situação económica e social dos vários países e tornando-os, deste modo, compreensíveis para os diversos actores sociais.

5.1.1

Muitas vezes, as dificuldades de acesso aos programas e aos recursos por parte das organizações da sociedade civil devem-se, pelo menos em parte, ao conhecimento escasso ou aproximativo dos regulamentos e dos procedimentos. O acesso a um programa comunitário ou às acções desenvolvidas no âmbito de uma política comunitária não poderá ser medido em função de um processo de adjudicação em que os concorrentes, para poderem participar, têm de dotar-se de instrumentos de informação e de organização. As instituições comunitárias deverão assumir uma responsabilidade muito bem definida e ajudar as organizações sociais e socioprofissionais a desenvolverem as capacidades e as competências necessárias. Até a uns anos atrás, a Comissão realizou acções deste género proporcionando aos proponentes de projectos cursos especializados a um preço acessível. Estes custos triplicaram nos últimos tempos e tornaram-se inacessíveis para a maioria dos actores sociais que necessitariam de tais cursos. Na opinião do CESE, a disseminação deste tipo de conhecimento especializado pelas organizações da sociedade civil é tão indispensável como o reforço das capacidades administrativas dos países parceiros/países PEV. Se se pretende que a sociedade civil contribua para a aplicação da PEV, é forçoso que estas prestações sejam consideradas como um serviço indispensável a fornecer gratuitamente.

5.2

Uma vez que os PAN abrangem, de facto, todas as políticas a cargo de diversos comissários, é fundamental que a PEV seja apoiada e partilhada por todas as Direcções-Gerais, as quais deverão colaborar em rede e de uma forma responsável e concorrerem assim para o seu êxito.

5.3

Para ser eficaz, o mecanismo de avaliação periódica deverá circunscrever-se ao essencial, evitar repetições e concentrar-se nas prioridades. Esta abordagem poderá tornar mais eficaz e frutuosa a participação na aplicação e na avaliação da PEV da sociedade civil organizada que continua a ser um factor insubstituível para o êxito tanto desta política como de todas as outras (ver ponto 6). Haverá que dar a devida prioridade aos critérios destinados a verificar os progressos democráticos do PP interessado e o respeito dos valores e dos direitos fundamentais. É metodologicamente prioritária neste contexto a constituição de uma rede para a colecta de dados e de estatísticas que permita avaliar de um modo correcto e eventualmente aferível as realizações de cada um dos países envolvidos. Conviria igualmente conseguir uma certa simultaneidade na apresentação dos relatórios de avaliação, a fim de facilitar a apreciação das melhores realizações e a definição das prioridades que carecem de um apoio mais substancial ou diferente.

5.4

Ainda que a UE seja o principal parceiro comercial dos países parceiros/países da PEV, os recursos orçamentais comunitários previstos para a cooperação são, por vezes e em certos países, inferiores às de outros actores internacionais. Apesar disso, os nossos parceiros mostraram por diversas ocasiões estar conscientes da grande importância da intervenção da Europa integrada para a qualidade do seu desenvolvimento, por ser capaz de estabilizar certas conquistas, reforçar as suas capacidades e criar uma parceria que considera cada actor como um protagonista responsável, usufruindo dos mesmos direitos, e jamais como o beneficiário de uma ajuda, mais ou menos obrigado a subscrever objectivos que não sente como seus.

5.5

É preciso evitar por todos os meios defraudar as expectativas dos nossos parceiros. Esta diligência implica que todos os actores comunitários, e antes de tudo os Estados-Membros, que detêm a competência principal em termos orçamentais, não se escusem a assumir as suas responsabilidades. É essencial que as Perspectivas Financeiras 2007/2013 valorizem esta política, tão crucial tanto para o desenvolvimento e para a segurança interna da UE como para o reforço do seu papel de interlocutor na cena mundial. Satisfeita esta exigência, será mais fácil mobilizar o concurso de fundos privados, porquanto os investidores poderão mover-se num quadro coerente e fundado em certezas.

6.   A participação da sociedade civil na PEV

6.1

O CESE não tem dúvidas de que o sucesso da PEV está intimamente ligado com a capacidade de todos os actores institucionais de envolverem e fazerem participar as organizações da sociedade civil na execução dos PAN, tendo ilustrado essa sua convicção em pareceres anteriores como, por analogia, em todos os pareceres sobre o processo de alargamento (8). Seria conveniente que partisse da Comissão um sinal mais explícito nesta direcção, mediante a proposta de critérios, procedimentos e instrumentos para a integração das organizações da sociedade civil na aplicação dos PAN. Sob reserva do que ficou dito no ponto 3.3, a experiência do alargamento constitui um importante ponto de referência, quer para a implicação dos actores sociais e socioprofissionais dos países candidatos no processo de negociações quer para o diálogo indispensável entre as organizações da sociedade civil dos Estados-Membros e as dos países candidatos. Se a primeira destas condições já está preenchida, especialmente em alguns países candidatos, entretanto já membros, a segunda foi deixada à iniciativa voluntária de organizações, fundações e órgãos consultivos, em particular o CESE, quando se sabe que na realização da PEV é indispensável estruturar e garantir esta participação.

6.2

Com base na experiência e nos trabalhos realizados pelo CESE, bem como nas propostas contidas nos pareceres referidos na nota de rodapé n.o 1, enunciaremos apenas as acções que consideramos indispensáveis para alcançar o objectivo de uma realização da PEV eficaz e com a participação da sociedade.

6.3

O CESE convida a Comissão a:

assegurar uma forte coerência interna entre as diversas Direcções-Gerais que se ocupam dos vários aspectos da PEV, promovendo as sinergias, o trabalho em rede e o estímulo das boas práticas,

defender com firmeza, em cooperação com os governos dos países parceiros/países da PEV, a indispensável participação das organizações da sociedade civil na realização dos PAN, introduzindo para esse efeito um critério relativo ao envolvimento das organizações da sociedade civil na avaliação dos resultados obtidos por esses países,

fornecer aos actores sociais e socioprofissionais o conhecimento especializado necessário para utilizar da forma mais adequada e mais correcta os recursos destinados à PEV, permitindo também às partes envolvidas controlar a aplicação dos PAN nos seus países e apresentar propostas sobre o seu seguimento,

fornecer critérios claros e eficazes para avaliar a partilha dos valores enquanto prioridade distintiva na aplicação da PEV,

fornecer informações e documentação sobre as reuniões previstas no quadro dos acordos de associação em que se tratará da realização dos PAN (em particular, a publicação do calendário e das ordens do dia dessas reuniões) e promover sessões de informação e de consulta antes e depois das mesmas,

propor um instrumento que facilite a concessão de vistos aos cidadãos dos países parceiros/países da PEV que desejarem entrar na UE para estudar ou participar em acções de formação e de investigação, para estabelecer contactos com organizações homólogas, para negócios, etc.,

secundar os esforços envidados pelo CESE para assegurar a coordenação dos órgãos consultivos e das organizações da sociedade civil empenhadas em participar na realização dos PAN, financiando em especial a realização de uma cimeira socioprofissional anual (análoga à que o CESE organiza já há dez anos no quadro euromediterrânico) para avaliar a realização global da PEV e permitir às organizações intervenientes contactos mais gerais e não apenas bilaterais e regionais.

6.4

O CESE solicita aos governos dos Estados-Membros e à UE que:

adoptem um método de aferição sistemática para assegurar a coerência e a eficácia entre as várias políticas externas nacionais e a PEV, no intuito de criar uma massa crítica não só de recursos, mas sobretudo de iniciativas que contribuam para obter resultados vantajosos para todas as partes envolvidas,

orientem as suas políticas externas para uma aplicação da PEV que valorize o contributo da sociedade civil organizada tanto nos países parceiros/países da PEV como ao nível nacional, designadamente através do concurso das políticas de cooperação para o desenvolvimento e da constituição de parcerias e de redes com as organizações da sociedade civil empenhadas neste domínio,

assegurem a coerência entre os compromissos assumidos no âmbito da PEV e a iniciativa dentro dos organismos internacionais multilaterais,

forneçam toda a informação sobre as suas posições nacionais sobre os pontos das ordens do dia das reuniões realizadas no quadro dos acordos de associação,

se esforcem por promover e facilitar o acesso às universidades nacionais dos estudantes oriundos dos países parceiros/países da PEV,

organizem, ao nível nacional, jornadas de informação em determinadas datas (umas duas por ano) sobre os resultados da aplicação da PEV e sobre as avaliações feitas pelo próprio governo da aplicação desta importante política.

6.5

O CESE solicita aos governos dos países parceiros/dos Estados-Membros que:

procurem manter a máxima coerência entre as suas políticas externas bilaterais e multilaterais e os compromissos assumidos no quadro da PEV;

garantam uma informação clara e constante sobre o andamento da aplicação dos PAN às organizações dos parceiros sociais e das organizações socioprofissionais dos seus países, bem como a possibilidade de acesso à documentação sobre a evolução da aplicação destes planos;

consultem sistematicamente os órgãos consultivos — se os houver — sobre as decisões em preparação, tanto no que se refere à aplicação dos PAN como às avaliações e às eventuais etapas ulteriores para fazer progredir as relações entre o país em questão e a UE;

criem nos países parceiros/países da PEV, que ainda não possuam órgãos consultivos, um instrumento que favoreça e coordene a participação das organizações da sociedade civil na formação das decisões inerentes à realização dos PAN e ao controlo das acções empreendidas;

zelem pela articulação da consulta e pela participação da sociedade civil, também a nível territorial, para que a PEV possa constituir um instrumento de desenvolvimento e de reequilíbrio do sistema económico e social em todo o território nacional.

6.6.

O CESE convida as organizações da sociedade civil dos países parceiros/países da PEV a:

informarem-se sobre a aplicação da PEV nos seus países para poderem avaliá-la e intervir se necessário, seja insistindo para obterem dos seus governos informação e possibilidades de participação, seja associando-se ao CESE para assinalar as prioridades identificadas e transmiti-las às autoridades comunitárias;

mostrarem-se disponíveis para um diálogo estruturado tanto com o CESE como com os órgãos consultivos dos Estados-Membros da UE e dos outros países parceiros/países da PEV, por forma a criar uma ampla rede de controlo da aplicação da PEV e a favorecer o conhecimento recíproco entre as organizações e a disseminação das boas práticas de participação.

6.7.

O CESE compromete-se, por seu lado, a seguir de perto a aplicação da PEV nas diversas áreas e a desenvolver as formas de cooperação mais eficazes com o Parlamento Europeu e o Comité das Regiões e assim contribuir para o envolvimento das organizações da sociedade civil nesta política tão importante.

Bruxelas, 5 de Julho de 2006.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  O primeiro sobre a Europa alargada e os países vizinhos: «Um novo enquadramento para as relações com os nossos vizinhos orientais e meridionais», Karin ALLEWELDT — JO C 80 de 30.3.2004, p.148-155. 148-155 O segundo sobre «O papel dos órgãos consultivos e das organizações socioprofissionais na aplicação dos acordos de associação e no âmbito da política europeia de vizinhança» (contributo temático para a cimeira económica e social euromediterrânica realizada na Jordânia em 16 e 17 de Novembro de 2005, relatora: Giacomina CASSINA, elaborado com o contributo dos conselhos consultivos da Grécia, de Israel e da Tunísia e de uma representação socioprofissional de Marrocos).

(2)  Dinamarca, Reino Unido e Irlanda em 1973, Grécia em 1981, Espanha e Portugal em 1986, Áustria, Suécia e Finlândia em 1995.

(3)  COM(2003) 104 final — Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu «Europa alargada e os países vizinhos: um novo enquadramento para as relações com os nossos vizinhos orientais e meridionais» — Bruxelas, 11/3/2003.

COM(2004) 373 final — Comunicação da Comissão — Política de vizinhança — Documento de estratégia — Bruxelas, 15/5/2004.

COM(2004) 628 final. — Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que estabelece disposições gerais relativas à criação do Instrumento Europeu de Vizinhança — Bruxelas, 29/9/2004.

(4)  O facto de a Arménia, o Azerbeijão e a Geórgia (não contíguos territorialmente à UE) terem pedido a sua integração na PEV é a demonstração concreta desta afirmação.

(5)  COM(2005) 72 final — Comunicação da Comissão ao Conselho — Política Europeia de Vizinhança — Recomendações para a Arménia, o Azerbaijão e a Geórgia e para o Egipto e o Líbano — Bruxelas, 2.3.2005.

(6)  Cfr. o relatório STULÍK (REX/220).

(7)  Ver relatório Dimitriadis, na perspectiva da Cimeira Euromediterrânica de Malta (REX/113), especialmente os pontos 35 e 36.1.

(8)  Ver, entre os pareceres mais recentes, o parecer da secção REX (REX/208, relator PEZZINI).


16.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 309/103


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de decisão do Conselho relativa ao sistema de recursos próprios das Comunidades Europeias (//CE, Euratom)»

COM(2006) 99 final — 2006/0003 (CNS)

(2006/C 309/21)

Em 26 de Abril de 2006, o Conselho da União Europeia decidiu consultar o Comité Económico e Social Europeu, nos termos do artigo 93.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, sobre a proposta supramencionada.

A Mesa do CESE incumbiu a Secção Especializada da União Económica e Monetária e Coesão Económica e Social da preparação dos correspondentes trabalhos.

Dada a urgência dos trabalhos, o Comité Económico e Social Europeu, na 428.a reunião plenária de 5 e 6 de Julho de 2006 (sessão de 5 de Julho) designou relatora-geral Ágnes CSER e adoptou, por 84 votos a favor, 2 votos contra e 2 abstenções, o seguinte parecer.

1.   Síntese do parecer do Comité

1.1

De acordo com o artigo 9.o da decisão do Conselho sobre o sistema de recursos próprios das Comunidades Europeias (1), a Comissão teve que proceder, antes de 1 de Janeiro de 2006, a uma reapreciação geral do sistema de recursos próprios — previsto para o período 2007-2013 — que acompanhou de propostas adequadas. O Parlamento Europeu apresentou um pedido de revisão dos critérios de contribuição. A Comissão, em concertação com o Conselho, elaborou a sua proposta e submeteu-a a exame.

1.2

As instituições da UE estudaram a proposta e o CESE avaliou-a (ECO/148) à luz dos seus pareceres anteriores, chamando a atenção para a relação intrínseca entre as políticas comunitárias e a política orçamental da União.

1.3

O Comité abordou a questão da futura aplicação dos três recursos próprios, bem como a avaliação da proposta respeitante à criação de um recurso próprio directo da União que figura no documento da Comissão.

1.4

O CESE apresentou uma resenha histórica da formação dos recursos próprios e das adaptações ocorridas, fez a análise do «quarto recurso» e avaliou o mecanismo de correcção britânico e a correcção generalizada.

1.5

Em Dezembro de 2005, durante a presidência britânica, o Conselho da UE chegou a um acordo político no decurso da avaliação das perspectivas financeiras para o período de 2007-2013. Reviu a sua decisão anterior e traçou novas orientações. Além disso, solicitou à Comissão que elaborasse uma nova decisão e modificasse o documento de trabalho sobre o sistema de correcção do Reino Unido que a acompanha, bem como a sua anterior proposta respeitante à correcção generalizada.

1.6

Não obstante a Comissão ter modificado a proposta, o CESE mantém as observações finais dos seus pareceres anteriores, já que a proposta em apreço não apresenta mudanças fundamentais mas tão-só alterações resultantes de negociações políticas. Todavia, o facto de o modo de cálculo do «cheque» britânico, que se mantém há vinte anos, ter sido alterado, representa um progresso histórico pois pode ser o primeiro passo para a sua supressão.

2.   A perspectiva do CESE enquanto representante da sociedade civil organizada

2.1

O Comité, enquanto actor dinâmico e activo contribui consideravelmente para diminuir o fosso que separa os cidadãos das instituições europeias, tanto ao nível da União como dos Estados-Membros. O Comité actua como intermediário, dá o seu parecer sobre os objectivos formulados nos documentos da Comissão respeitantes ao período de reflexão e favorece a participação activa dos cidadãos com vista à aplicação das políticas da União (Plano de Acção, Plano D, Livro Branco sobre uma política de comunicação europeia).

2.2

De acordo com estes documentos, os cidadãos da União têm o direito de saber o que faz a UE e porquê. No seu parecer sobre o período de reflexão (2), o CESE deu conta das expectativas dos cidadãos sobre o conteúdo a dar às políticas relativas ao futuro da UE. Neste contexto, congratula-se com o acordo interinstitucional de 4 de Abril de 2006, que prevê um aumento das dotações para 2007-2013 relativamente ao acordo inicial do Conselho Europeu. Todavia, referindo-se a parecer anterior, o CESE constata que esse aumento continua a ser limitado e que as perspectivas financeiras não permitem mobilizar meios orçamentais à altura das ambições da Europa. Remete, a este propósito, para o seu parecer anterior.

3.   Introdução

3.1

O alargamento de 2004 é um acontecimento histórico. Com efeito, permitiu reunir novamente mais de 450 milhões de europeus após 50 anos de separação. Por outro lado, envolveu um trabalho formidável no plano institucional numa Europa que abrangia quinze membros. A adopção das políticas comunitárias no quadro da UE alargada a 25 e, em breve a 27, a definição e a criação dos recursos necessários representam puseram à prova a colaboração entre os «antigos» e os «novos» Estados-Membros. No âmbito deste processo, a comunicação da Comissão de 2004 «Construir o nosso futuro comum — Desafios políticos e recursos orçamentais da União alargada, 2007-2013», bem como a proposta da Comissão nela inspirada, respeitante às perspectivas financeiras para o período de 2007-2013, teriam contribuído para a realização dos objectivos desse futuro comum.

3.2

A adopção da comunicação da Comissão foi o ponto de partida da decisão sobre as perspectivas financeiras. A posição do Parlamento Europeu pautou-se pelas prioridades da União. A decisão do Conselho europeu impunha uma hierarquização mais rigorosa no que toca as despesas e as despesas necessárias.

3.3

O orçamento da UE é limitado em comparação com os orçamentos nacionais, que absorvem em média 45 % do rendimento nacional, ao passo que o orçamento comunitário mal excede 1 %. A Comissão recomendou que o tecto dos recursos no quadro das perspectivas financeiras para 2007-2013 fosse fixado em 1,24 % do rendimento nacional bruto (RNB).

3.4

Simplesmente, não é realista esperar mais da Europa por menos dinheiro. As novas políticas comunitárias exigem cobertura financeira adequada. As despesas correspondentes às políticas que defendem o valor acrescentado da UE propostas no âmbito das novas perspectivas financeiras foram definidas à luz do triplo requisito de desempenho, eficácia e sinergia.

3.5

Para realizar estes objectivos, é necessário apoiar-se em orientações que prevejam maior transparência financeira, selectividade das despesas, maior eficácia e uma avaliação mais rigorosa do valor acrescentado da Europa.

3.6

A insuficiente transparência da estrutura dos recursos próprios, sua limitada autonomia financeira, sua complexidade e opacidade tornaram cada vez mais premente a necessidade de a modificar. O mecanismo de ajustamento aplicado à Grã Bretanha desde meados dos anos oitenta suscitou um pedido de correcção generalizado ou de modificação do sistema.

4.   As perspectivas financeiras da UE entre 2007 e 2013 na sequência da decisão do Conselho Europeu de Dezembro de 2005.

4.1

Como também reconheceu o Conselho Europeu nas suas conclusões de Dezembro de 2004, as perspectivas financeiras estão intimamente ligadas ao problema dos recursos próprios, ao mecanismo de correcção e à necessidade de adaptar o sistema actual.

4.2

O Conselho Europeu de Março de 2005 reafirmou os objectivos da Estratégia de Lisboa e, no centro desta, pôs o crescimento da economia e do emprego.

4.3

Na cimeira informal de Outubro de 2005, em Hampton Court, não se discutiu o modelo social europeu mas sim os desafios da mundialização. As novas perspectivas financeiras da União para 2007-2013 deverão reflectir novas prioridades: a investigação e desenvolvimento, a inovação, a energia, a política, a educação (incluindo o investimento no ensino superior), a promoção da imigração regional para fins económicos e a gestão das mutações demográficas.

4.4

O Conselho Europeu de Dezembro de 2005 aprovou o quadro orçamental da União para o referido período. Tendo em conta este acordo político e baseando-se na proposta modificada da Comissão, o acordo interinstitucional assinado pelo Parlamento Europeu, pelo Conselho e pela Comissão, fixa o quadro financeiro para o sete anos. A conclusão do acordo dependia fundamentalmente da desfecho do diálogo com o Parlamento Europeu. A estrutura do quadro financeiro só em parte reflectia a dupla exigência, isto é, por um lado financiar os novos desafios com que a UE está confrontada e, por outro, cobrir as necessidades orçamentais decorrentes do alargamento.

4.5.

O Conselho de Dezembro de 2005 decidiu que a revisão do sistema de recursos próprios deveria ficar concluído antes do exame das perspectivas financeiras plurianuais das receitas e despesas da União, que caducam em 2008-2009. Esta disposição figura no acordo interinstitucional desde Maio de 2006.

4.6

A Comissão propôs a elaboração de um livro branco para fazer o ponto da situação do quadro financeiro, das receitas e das despesas. O que se pretende é que o sistema actual dos recursos próprios da União Europeia seja substituído por receitas mais transparentes e independentes. A Comissão toma nota da intenção do Parlamento Europeu de organizar uma conferência em que participariam os parlamentos nacionais. O CESE exprime a sua vontade de ser associado a este processo.

5.   Sistema de recursos próprios

Nos dois anos de negociação das perspectivas financeiras a questão do sistema de recursos próprios não mereceu muita atenção.

5.1

Não é possível fazer uma avaliação completa deste sistema sem ter uma ideia da evolução do orçamento da integração europeia. Entre 1957 e 2006 é possível apontar quatro períodos:

 

1957-1969: cada Comunidade dispunha do seu próprio orçamento;

 

1970-1987: orçamentos anuais únicos;

 

1988-1999: período dos dois primeiros quadros financeiros determinados pelas políticas comunitárias;

 

2000-2006: políticas comunitárias determinadas pelo orçamento.

Desde o início, o que determinou os orçamentos ao longo da história da integração europeia foi a realização dos objectivos comuns e a prossecução dos interesses dos Estados-Membros.

Em geral, pode observar-se que durante dos dois primeiros quadros financeiros o crescimento das dotações para autorizações acompanhou o ritmo das políticas comunitárias, o que foi determinante para os quadros orçamentais da Comunidade.

5.2

No debate sobre a Agenda 2000, cuja divisa era a «estabilização das despesas», os contribuintes líquidos para o orçamento da União conseguiram reduzir a margem de manobra do orçamento, tendo invocado a necessidade de acatar a disciplina orçamental prevista no pacto de estabilidade e de crescimento para justificar esta estabilização das despesas.

5.3

Depois do fracasso da cimeira de Junho de 2005, o reexame das despesas e dos recursos próprios do orçamento comunitário passou a ser uma questão fundamental. No entanto, os recursos próprios ainda não foram debatidos a fundo. Por iniciativa da presidência britânica, foi adoptada uma cláusula de reexame com base na proposta que a Comissão Europeia apresentou em Junho de 2005, e que já constava das propostas finais da presidência luxemburguesa. Os Estados-Membros dividiram-se acerca desta cláusula e do calendário das reformas. No debate sobre o futuro do orçamento comunitário surgiram mais uma vez posições opostas baseadas nas posições dos Estados-Membros enquanto contribuintes líquidos. Ficou claro que as reformas de fundo não se fariam antes de 2013.

5.4

Se examinarmos a situação dos Estados-Membros em relação ao orçamento da União, numa perspectiva puramente contabilística, tendo unicamente em conta o saldo líquido entre verbas concedidas e contribuições, verificamos que há diferenças consideráveis e extremamente enganadoras. Ser beneficiário ou contribuinte líquido não diz nada quanto aos ganhos gerados a nível europeu, isto é, o contributo das políticas comunitárias para o aumento adicional do rendimento macroeconómico no mercado interno único.

5.5

Como já teve o ensejo de salientar em anteriores pareceres, o CESE não pode aceitar que as posições dos Estados-Membros enquanto contribuintes líquidos prevaleçam sobre as políticas comunitárias que têm em vista realizar objectivos comuns.

5.6

O Comité entende que o papel das políticas comunitárias na definição do orçamento é compatível com a disciplina orçamental ao nível europeu. Foi no âmbito do pacote Delors que pela primeira vez se falou de disciplina orçamental, o que não quer dizer que as políticas comunitárias não desempenham um papel decisivo para o equilíbrio entre políticas e orçamento.

5.7

Os recursos baseados no RNB (rendimento nacional bruto) cujo papel será reforçado após 2007, são um bom exemplo de equidade. Porém, há o risco de o crescimento das contribuições baseadas no RNB acentuar a tendência para focalizar a situação de contribuinte líquido. Os recursos RNB provêm de um efeito de transferência directa do orçamento dos Estados-Membros e não visam garantir recursos genuinamente próprios da UE.

6.   O documento de trabalho sobre o mecanismo de correcção britânico

6.1

Como a decisão sobre os recursos próprios sofreu alterações, será elaborado novo documento, que deverá entrar em vigor em 1 de Janeiro de 2007 ou, o mais tardar, no início de 2009, eventualmente com efeitos retroactivos. O documento mantém a taxa de mobilização uniforme sobre o IVA em 0,30 %, mas prevê duas excepções: relativamente ao período 2007-2013, a taxa de mobilização do IVA para a Áustria será fixada em 0,225 %, para a Alemanha em 0,15 % e para os Países Baixos e Suécia em 0,10 %. Relativamente ao mesmo período, os Países Baixos poderão beneficiar de uma redução anual bruta da sua contribuição RNB de 605 milhões de euros e a Suécia de uma redução anual bruta da sua contribuição RNB de 150 milhões de euros, calculada em função do RNB.

6.2

No máximo a partir de 2013, o Reino Unido participará plenamente no financiamento dos custos do alargamento nos Estados-Membros que aderiram à União Europeia depois de 30 de Abril de 2004, excepto no atinente às despesas de mercado da PAC. Em relação à decisão que está em vigor, a contribuição adicional do Reino Unido não poderá exceder o tecto de 10,5 mil milhões de euros para o período de 2007-2013. Esta contribuição será reajustada caso haja outras adesões para além da Roménia e da Bulgária. Nas suas decisões para rever o sistema dos recursos próprios, o Conselho sublinha, mais uma vez, que é necessário rever em profundidade o quadro financeiro, pede que se reexamine os recursos da União que englobam igualmente a PAC e o «cheque» britânico e se apresente um relatório sobre esta matéria em 2008 ou 2009.

6.3

De acordo com a proposta da Comissão, a diminuição do IVA será tida em conta antes de calcular a correcção britânica, mas o abaixamento das contribuições baseadas no RNB será feito depois de efectuar este cálculo. Dezassete Estados-Membros consideram que estas medidas devem ser aplicadas depois de calcular a correcção britânica, ao passo que Londres defende que há que as tomar em consideração antes. A proposta do Reino Unido equivale a aumentar o montante da correcção e, por conseguinte, a aumentar os encargos dos outros Estados-Membros.

6.4

O CESE concorda com o Tribunal de Contas que entende que a existência qualquer tipo de mecanismo de correcção põe em perigo a simplicidade e a transparência do sistema de recursos próprios. O TC fez numerosas observações sobre o sistema actual dos recursos próprios e suas lacunas. Apontou, em particular, a gestão deficiente, a falta de coerência e de transparência. Ao mesmo tempo, faz notar que o desequilíbrio do orçamento não pode ser corrigido através de regras de cálculo.

6.5

De entre as pequenas modificações do sistema dos recursos próprios, reveste particular importância a adaptação do método de cálculo da correcção britânica. Segundo o acordo de Dezembro de 2005, as verbas concedidas aos novos Estados-Membros serão gradualmente suprimidas, a partir de 2009, e totalmente depois de 2011, com excepção das despesas de mercado da PAC e dos pagamentos directos aos produtores. Isto permite evitar que a correcção britânica aumente proporcionalmente aos custos do alargamento.

7.   Observações na generalidade

7.1

O Comité concorda com o Parlamento quando este declara que os recursos próprios provenientes do IVA e do RIB (cujo objectivo inicial era completar os recursos próprios da UE) se tornaram progressivamente a principal fonte de financiamento do orçamento comunitário e que os regimes derrogatórios que se vieram juntar ao sistema actual mais não fizeram do que torná-lo mais complexo, menos transparente aos olhos dos cidadãos e mais iníquo, criando assim um sistema de financiamento que gera disparidades inaceitáveis entre os Estados-Membros.

7.2

O CESE comunga da opinião do PE de que é importante dotar a UE, que se está a alargar, de recursos financeiros consentâneos com as suas ambições políticas crescentes. As perspectivas financeiras são um quadro financeiro para garantir a realização das prioridades da UE tendo em conta a disciplina orçamental. Não se trata de um orçamento para sete anos.

7.3

O CESE sublinha que o tecto dos recursos próprios decidido em 1993 para os 15 se manteve inalterado, isto é fixado em 1,31 % do montante total do RNB da União, para as dotações para autorizações, e em 1,24 % do mesmo montante, para as dotações de pagamento.

8.   Síntese

8.1

Atento o atrás exposto, o Comité considera, de uma forma geral, que o acordo político obtido no Conselho Europeu de 2005 implica prolongar até 2013 o quarto período da história orçamental da União Europeia iniciado em 2000, isto é o período das políticas comunitárias determinadas pelo orçamento.

8.2

A chave do próximo orçamento consistirá em acabar com o papel determinante das posições de contribuinte. Precisamos de um orçamento comum totalmente ou em grande parte independente dos orçamentos nacionais. Só com recursos verdadeiramente próprios será possível garantir esta autonomia.

8.3

Para o CESE esta autonomia passa necessariamente por um sistema de recursos próprios baseado quer em políticas comuns, quer em verdadeiros recursos comunitários, como por exemplo um imposto comunitário ou uma combinação dos dois. Do ponto de vista do futuro da União, a solução mais adequada ao método comunitário poderia ser o recurso às políticas comuns enquanto geradoras de recursos.

8.4

Além disso, não obstante a forte oposição ao imposto comunitário em razão do princípio da soberania orçamental, consideramos que a realização dos objectivos comuns exige que haja recursos próprios para substituir as contribuições assentes no RNB.

8.5

Ao adaptar o sistema de recursos próprios, convém assegurar a aplicação dos princípios de transparência, eficácia, flexibilidade e de financiamento proporcional.

Recursos-eficácia: os recursos devem ter um impacto significativo na dimensão do orçamento;

Transparência e simplicidade: os cidadãos devem poder compreender facilmente a contribuição dos Estados-Membros para o orçamento da União;

Eficácia das despesas: as despesas administrativas decorrentes da cobrança não devem ser demasiado elevadas em relação ao volume dos recursos;

Igualdade das contribuições líquidas: importa repartir os encargos equitativamente pelos Estados-Membros, tendo em conta a situação real dos cidadãos.

Bruxelas, 5 de Julho de 2006.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  JO C 253, de 7.10.2000.

(2)  JO C 74, de 23.3.2005.


16.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 309/107


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de directiva do Conselho relativa à isenção do imposto sobre o valor acrescentado e dos impostos especiais de consumo cobrados sobre as mercadorias importadas por viajantes provenientes de países terceiros»

COM(2006) 76 final — 2006/0021 (CNS)

(2006/C 309/22)

Em 22 de Fevereiro de 2006, a Comissão decidiu, nos termos do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada da União Económica e Monetária e Coesão Económica e Social, que emitiu parecer em 7 de Junho de 2006, sendo relator Umberto BURANI.

Na 428.a reunião plenária de 5 e 6 de Julho de 2006 (sessão de 5 de Julho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por unanimidade, o seguinte parecer:

1.   Introdução

1.1

A proposta da Comissão prevê a harmonização das disposições respeitantes às isenções do imposto sobre o valor acrescentado (IVA) e dos impostos especiais de consumo cobrados na importação de mercadorias contidas na bagagem pessoal de viajantes provenientes de países terceiros. Dentro de certos limites, tais mercadorias foram sempre importadas com isenção de impostos, de acordo com a Directiva 69/169/CEE de 28 de Maio de 1969, entretanto alterada em dezassete ocasiões, devendo ser substituída pela proposta em apreço.

1.2

A manutenção desse regime continua a ser necessária «a fim de prevenir a dupla tributação, assim como nos casos em que, dadas as condições de importação das mercadorias, não seja necessário proteger a economia» (1). A Comissão crê que, sem pôr em causa o princípio orientador da directiva, o número de alterações ocorridas desde a data de adopção, o alargamento e a nova configuração das fronteiras externas são motivo suficiente para proceder à revisão completa e à substituição da directiva original.

1.3

O problema, simples em si, é complicado pela necessidade de regulamentar a importação de produtos «sensíveis» como o tabaco e as bebidas alcoólicas. Não sendo o problema de agora, o alargamento da União abre novas perspectivas, conservando, porém, as questões de fundo: O resultado final dependerá da possibilidade de encontrar um ponto de consenso sobre a proposta de harmonização da Comissão.

2.   Observações na generalidade

2.1

Inicialmente, a directiva aplicava-se aos viajantes no interior da Comunidade. Concretamente, desde 1993, em aplicação dos princípios do mercado comum, os viajantes deixaram de estar sujeitos a restrições no interior da UE. Com o alargamento, as fronteiras externas da Comunidade sofreram alterações, introduzindo novos elementos de avaliação; como diz a Comissão, as fronteiras estendem-se «agora, designadamente, até à Rússia, à Ucrânia e à Bielorrússia.»

2.1.1

O CESE regista esta situação, fazendo notar que, para além das citadas, a Leste existem outras fronteiras terrestres comuns com países terceiros, onde o nível de preços é significativamente inferior, que criam dificuldades aos novos Estados-Membros, sem esquecer as novas fronteiras marítimas resultantes da adesão de Chipre e de Malta.

2.1.2

No entanto, todas elas caducaram, com excepção de uma derrogação para a Finlândia, que está autorizada a limitar as importações de cerveja por parte de viajantes provenientes de países terceiros a uma quantidade não inferior a dezasseis litros até ao final de 2007. O CESE, que se opôs sempre ao regime das derrogações, regozija-se por tal facto. No entanto, neste caso, a aplicação aos vinte e cinco Estados-Membros de um regime uniforme poderia suscitar certos problemas, como se verá adiante.

2.2

A proposta de directiva prevê um aumento do limite da franquia actual: de 175 para 500 euros para os passageiros dos transportes aéreos e para 220 euros para os outros viajantes. Na exposição de motivos, a Comissão justifica tais medidas dizendo que «O custo e os esforços que as deslocações por via aérea implicam, levam a supor que, provavelmente, este modo de transporte seja utilizado menos frequentemente do que um transporte terrestre ou por “ferry”. Além disso, a própria natureza do transporte aéreo constitui uma limitação para as mercadorias que os passageiros podem adquirir e transportar, já que não lhes permite transportar mercadorias volumosas». O verdadeiro motivo parece, porém, ser diferente: o quarto considerando indica com efeito que «Os limiares pecuniários devem ter em conta as dificuldades sentidas pelos Estados Membros que possuem fronteiras com países terceiros em que os preços são consideravelmente inferiores …».

2.2.1

Na opinião do CESE, a razão da discrepância entre a argumentação da exposição de motivos e o quarto «considerando» radica ante de mais numa preocupação de carácter fiscal. Com efeito, não faria sentido falar de «mercadorias volumosas» (ver ponto anterior): há mercadorias pouco volumosas e de grande valor (aparelhos fotográficos, computadores portáteis, relógios, jóias, etc.), cuja importação seria autorizada aos passageiros dos transportes aéreos mas não aos que viajam de automóvel ou de comboio nem aos passageiros de navios de cruzeiro. A outra afirmação, segundo a qual o transporte aéreo seria utilizado menos frequentemente do que um transporte terrestre ou por «ferry» e implicaria «custo e esforços», parece referir-se a situações particulares e não a casos gerais: as viagens aéreas (e em particular as low cost) fazem parte do quotidiano de milhões de operadores económicos e de turistas que se deslocam anualmente a países terceiros.

2.2.2

O CESE não aceita que situações particulares conduzam a normas de harmonização que discriminam os cidadãos em função do meio de transporte utilizado. Se bem que o CESE se tenha pronunciado em várias ocasiões contra o regime das derrogações, como indicado no ponto 2.1.2, e continue, por princípio, a opor-se-lhe, entende que, no caso vertente, este regime constitui a única via possível, devendo, porém, ser utilizado tão-só quando um ou mais Estados-Membros possam provar — no respeito do princípio da proporcionalidade — que um limite geral de 500 euros constitui uma perda insuportável de receitas fiscais.

2.3

A proposta de directiva mantém os limites quantitativos para o tabaco e o álcool. No caso do tabaco, é feita referência à convenção da OMS ratificada pela União Europeia em 30 de Junho de 2005, que recomenda que as partes contratantes proíbam ou restrinjam, consoante o caso, as vendas aos viajantes internacionais. Em conformidade com esta recomendação, a proposta prevê um sistema uniforme de limites quantitativos reduzidos para os produtos do tabaco, «a fim de assegurar um tratamento equitativo de todos os cidadãos que entram na União Europeia» .

2.3.1

O CESE manifesta a sua concordância, embora exprima algumas reservas quanto aos argumentos utilizados a propósito do tabaco, que como os outros, parecem mais de carácter fiscal do que sanitário; basta pensar que por força do n.o 2 do art. 9, é concedido aos Estados-Membros o direito de aplicarem níveis mínimos de importação de tabaco muito inferiores aos níveis normais. Sem pôr em causa a nocividade do tabaco, seria absurdo que o nível dessa nocividade pudesse ser medido de forma diferente consoante os Estados-Membros.

2.4

Além disso, propõe-se a supressão dos limites quantitativos para o perfume, o café e o chá, tendo em conta que, nos termos da legislação comunitária, o perfume deixou de estar sujeito a imposto de consumo, o café só o é em cinco Estados-Membros e o chá num único. A exposição de motivos da proposta formula a esse respeito um princípio fundamental (2): a supressão dos limites quantitativos impõe-se «dado que deixaram de reflectir o verdadeiro regime da tributação das mercadorias sujeitas aos impostos especiais de consumo na UE-25». Por outras palavras, estes limites são suprimidos porque, entre os vinte e cinco Estados-Membros, só um número limitado de Estados-Membros sujeita estes produtos ao imposto especial de consumo.

2.4.1

O CESE está plenamente de acordo com a supressão de tais medidas e faz notar que neste caso foi adoptada a regra segundo a qual, tendo presente o princípio da proporcionalidade, o interesse geral prevalece sobre o individual.

2.5

É precisamente sob o prisma da proporcionalidade que a proposta de directiva dá por vezes o flanco à crítica. Em geral, e relativamente à disposição evocada no ponto 2.4, o CESE chama a atenção para a necessidade de toda a iniciativa se pautar pela coerência na aplicação de um princípio a todos os aspectos da regulamentação e não apenas a alguns. Esta afirmação será mais claramente justificada nas observações na especialidade.

3.   Observações na especialidade

3.1

Artigos 2, 4, 5 e 7: aplicação da directiva. Estes artigos estabelecem que a isenção do IVA e dos impostos especiais de consumo é concedida às mercadorias contidas na bagagem pessoal dos viajantes («bagagem acompanhada») que atravessou um país terceiro. É aplicável se o viajante não puder provar que as mercadorias transportadas na bagagem foram adquiridas de acordo com os termos gerais de tributação no mercado interno de um Estado-Membro e não beneficiam de qualquer reembolso do IVA ou dos impostos especiais de consumo. Para efeitos das isenções, o valor dos objectos pessoais importados temporariamente ou reimportados após a sua exportação temporária não é tomado em consideração.

3.1.1

Esta norma, já vigente, continua a impor pesadas obrigações ao viajante, que deveria ter consigo as facturas que comprovam a compra num Estado-Membro da UE dos artigos já na sua posse, em particular os mais onerosos, ou, na sua falta, obter à partida uma declaração de exportação temporária.

3.1.2

O CESE está ciente de que não existem soluções mais simples. Mas faz notar que a Comissão poderia utilmente recomendar aos Estados-Membros que dêem a conhecer esta norma pelas vias mais adequadas, mediante avisos apostos nas fronteiras e sua inserção nas instruções gerais emitidas pelos operadores turísticos e nos bilhetes de transporte aéreo e marítimo.

3.2

Artigo 8. o : limites pecuniários O valor total das mercadorias importadas com isenção é de 500 euros para os passageiros dos transportes aéreos e de 220 euros para todos os outros viajantes. Os Estados-Membros podem reduzir o limiar pecuniário, que não pode, em caso algum ser inferior a 110 euros, relativamente aos viajantes com menos de 15 anos. Estes limites pecuniários aplicam-se a todas as mercadorias, com excepção do tabaco e do álcool, para os quais foram fixados limites quantitativos.

3.2.1

O CESE já exprimiu reservas (cf. ponto 2.2.2) quanto à discriminação operada entre os cidadãos em função do meio de transporte utilizado. É evidente que tal distinção se explica pela situação particular de certos Estados-Membros limítrofes de países terceiros que praticam níveis de preços inferiores, devido, nomeadamente a diferenças fiscais importantes. A aplicação do princípio da proporcionalidade (cf. pontos 2.4.1 e 2.5) acompanhado de derrogações concedidas em casos específicos e de comprovada necessidade, resolveria o problema.

3.2.2

O CESE, na esteira do que afirmou no ponto 2.2.2., confirma a sua proposta de estender de um modo geral o limite de 500 euros a todos os viajantes, sem distinção em função do meio de transporte utilizado. Um limite elevado teria a vantagem de libertar as alfândegas de pesadas operações de controlo sobre a generalidade dos viajantes, especialmente nos períodos de intenso tráfico turístico, permitindo-lhes dar mais atenção aos verdadeiros casos de contrabando. Cabe notar a propósito que a experiência e o profissionalismo dos funcionários aduaneiros permitem-lhes fazer facilmente a distinção — fundamental — entre o «turista» (que teria, quando muito, cometido uma irregularidade administrativa) e o «contrabandista», cuja actuação é passível de acção penal. Resta o problema do viajante habitual (que não é turista, não se desloca para trabalhar, e que não é fronteiriço), cujas importações participam do fenómeno do pequeno tráfico para fins lucrativos).

3.3

Artigo 9. o : limites quantitativos para o tabaco A isenção do IVA e do imposto especial de consumo para o tabaco está sujeita a limites quantitativos. Os limites quantitativos normais são 200 cigarros, ou 100 cigarrilhas, ou 50 charutos ou 250 gramas de tabaco para fumar. Os Estados-Membros podem fixar limites quantitativos reduzidos: 40 cigarros ou 20 cigarrilhas ou 10 charutos ou 50 gramas de tabaco para fumar; os Estados-Membros podem aplicar estes limites a todos os viajantes ou apenas aos viajantes que não utilizam os transportes aéreos .

3.3.1

Discordando com a fixação de limites quantitativos diferentes, como já afirmou a propósito dos limites pecuniários, o CESE faz ainda notar que os limites reduzidos causariam muitos incómodos aos turistas da UE que atravessam de automóvel diversos países (comunitários ou não) e não têm por destino final o país que aplica estes limites. Atenta a importância do turismo e a necessidade de o promover e não de o entravar por medidas que pressupõem a aplicação de controlos estritos nas fronteiras, o CESE sugere a adopção de uma disposição de isenção específica para tais casos.

3.4

Artigo 10. o : limites quantitativos para o álcool Por analogia com o disposto para o tabaco, os limites quantitativos em vigor são mantidos para o álcool, mediante certas alterações e uma subdivisão em duas categorias: no primeiro caso, 1 litro de bebidas destiladas e bebidas espirituosas de teor alcoólico superior a 22 % vol. ou álcool etílico não desnaturado de teor alcoólico igual ou superior a 80 % vol. e, no segundo caso, 2 litros de produtos «intermédios» e vinhos espumosos. Estas duas categorias representam limites não cumuláveis. É autorizada a importação com isenção de 4 litros de vinho tranquilo e de 16 litros de cerveja para além das quantidades acima indicadas. Estas isenções não são aplicáveis aos viajantes com menos de 17 anos.

3.4.1

O CESE concorda, em linhas gerais, com as medidas propostas, mas chama a atenção para certos pormenores não despiciendos. Em primeiro lugar, o álcool de teor igual ou superior a 80 %, previsto na primeira categoria, encontra-se normalmente no comércio apenas a 98 ou 99 % vol., e 1 litro deste produto permite preparar 3 litros de bebidas alcoólicas a 33 % vol. A assimilação a 1 litro de bebidas destiladas ou de bebidas espirituosas afigura-se, pois, arbitrária. No que diz respeito à categoria dos vinhos espumosos, que abarca tanto os vinhos de maior qualidade (champanhe) como vinhos de qualidade muito variável, o CESE considera que seria conveniente suprimir a distinção entre os «vinhos tranquilos», na medida em que se trata sempre de vinhos sem referência ao seu valor.

3.4.2

O CESE exprime uma reserva explícita às quantidades de vinho e de cerveja: existe uma manifesta desproporção entre 4 litros de vinho e 16 litros de cerveja, que penaliza os viajantes provenientes de países em que a cerveja não faz parte dos hábitos de consumo. Em vez de fixar limites comuns, seria necessário estabelecer limites quantitativos separados e alternativos para estes dois tipos de bebidas.

3.5

Quanto aos combustíveis, a isenção aplica-se ao combustível contido no reservatório do veículo e a uma quantidade de combustível que não ultrapasse 10 litros contida num reservatório portátil, mas são previstas derrogações quando existam disposições nacionais restritivas.

3.5.1

O CESE convida a Comissão a rever radicalmente esta disposição. Em primeiro lugar, a situação dos distribuidores de combustíveis não justifica que a isenção se estenda aos reservatórios portáteis, para além do combustível contido no reservatório do veículo. Esta opção deveria ser suprimida, quanto mais não seja em consideração dos riscos inerentes ao transporte de combustível fora dos reservatórios. Cabe recordar que o Código da Estrada de muitos países proíbe tal prática. Esta proibição deveria estender-se a eventuais reservatórios suplementares incorporados no veículo. Para os autocarros, que são frequentemente equipados com dois reservatórios, a proibição deveria aplicar-se aos reservatórios não homologados no momento da entrada em circulação.

3.5.2

Em segundo lugar, as disposições nacionais restritivas, ainda que justificadas por disparidades de preço entre Estados vizinhos, não podem estender-se aos turistas de países diferentes do que aplica as restrições, pelos motivos já invocados no ponto 3.3.1. As restrições, desde que sejam consideradas necessárias, poderiam enquadrar-se nas aplicadas às pessoas residentes nas zonas fronteiriças e aos trabalhadores fronteiriços, em conformidade com o previsto no artigo 14 da proposta de directiva.

3.6

Artigo 14. o : população fronteiriça Disposições particulares, que confirmam as vigentes, são previstas para a população fronteiriça (pessoas residentes nas zonas fronteiriças) e para os trabalhadores fronteiriços (trabalhadores residentes num Estado-Membro da UE que trabalham na zona fronteiriça de um país terceiro limítrofe ou pessoas residentes num país terceiro que trabalham na zona fronteiriça de um Estado-Membro limítrofe). Para estas categorias, os Estados-Membros podem reduzir os limites pecuniários e/ou os limites quantitativos. Para a directiva, a «zona fronteiriça» é um território que não pode exceder quinze quilómetros. O CESE considera que esta delimitação é arbitrária e que não tem em conta características geográficas, económicas e sociais de cada zona fronteiriça: cada Estado-Membro deveria poder delimitar as suas zonas em função das circunstâncias; uma maior flexibilidade permitiria, designadamente a certos Estados-Membros, lutar contra o fenómeno preocupante do contrabando atípico que grassa nas fronteiras terrestres dos países do Leste da Europa.

3.7

Por fim, a data de entrada em vigor da directiva é fixada em 31 de Dezembro de 2006, prazo que pode ser considerado razoável na hipótese de o processo legislativo vir a ser rápido e harmónico.

Bruxelas, 5 de Julho de 2006.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Ver COM(2006) 76 final — 2006/0021 (CNS), primeiro «considerando».

(2)  Ver 1) Contexto da proposta — Exposição de motivos e objectivos da proposta: 4.o travessão.


16.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 309/110


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões Aplicar o programa comunitário de Lisboa: Promover o espírito empreendedor através do ensino e da aprendizagem»

COM(2006) 33 final

(2006/C 309/23)

Em 5 de Abril de 2006, a Comissão Europeia decidiu, nos termos do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

A Secção Especializada de Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania, incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, emitiu parecer em 2 de Junho de 2006. Foi relatora Ingrid JERNECK.

Na 428.a reunião plenária de 5 e 6 de Julho de 2006 (sessão de 6 de Julho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 122 votos a favor, 16 votos contra e 10 abstenções, o seguinte parecer:

Pontos principais do parecer do CESE

O espírito empreendedor significa a capacidade de uma pessoa transformar as ideias em acção. A formação em empreendedorismo promove a inovação, a criatividade e a auto-confiança através do ensino e da aprendizagem:

Começar desde muito cedo a desenvolver este espírito;

Cursos complementares de formação em espírito empresarial, incluídos nos currículos nacionais, desde o ensino primário até ao superior;

Cooperação positiva e efectiva entre escolas/universidades e empresas;

O envolvimento dos docentes contribui para o seu desenvolvimento pessoal;

A concepção de programas educacionais para o desenvolvimento do espírito empresarial deve envolver tanto empregadores como trabalhadores;

Reforço do empenhamento e da presença da sociedade civil no processo de aprendizagem;

Ter em conta, na escola, a importância das mulheres empresárias para promover a igualdade entre homens e mulheres;

Promover o espírito empreendedor também entre as pessoas com deficiência;

Intercâmbio dos melhores métodos e seguimento dos progressos realizados através de conferências de avaliação, organizadas pela Comissão;

É muito importante a imagem da actividade empresarial veiculada pelos meios de comunicação social;

A «Escada Empresarial» pode ser utilizada nos Estados-Membros como um dos muitos modelos possíveis;

A importância da abertura de balcões únicos para facilitar a constituição de empresas;

Lançamento do Ano Europeu do Espírito Empresarial por proposta da Comissão;

A formação e a educação para o desenvolvimento do espírito empresarial podem ter um papel de relevo na tarefa de comunicar a Europa e aproximar a UE dos seus cidadãos.

1.   Síntese da comunicação da Comissão

1.1

Em Fevereiro de 2005, a Comissão propôs um novo começo para a Estratégia de Lisboa, centrando os esforços da União Europeia em duas tarefas principais: a garantia de um crescimento mais sólido e duradouro e a criação de mais e melhores. Na nova Parceria para o Crescimento e o Emprego é realçada a importância de promover uma cultura mais orientada para o empreendedorismo e de criar um ambiente económico mais favorável às PME.

1.2

É necessário criar na sociedade um ambiente mais propício ao empreendedorismo, com base numa política integrada que tenha como objectivo não só mudar as mentalidades, mas também melhorar as competências dos europeus e eliminar os obstáculos que dificultam a criação, a transmissão e o crescimento das empresas.

1.3

O espírito empresarial é uma competência essencial para o crescimento, o emprego e a realização pessoal. Embora reconhecendo que esta competência deve ser adquirida no contexto da aprendizagem ao longo da vida, a presente comunicação foca sobretudo a educação facultada desde o primeiro ciclo do ensino básico até à universidade, incluindo o ensino profissional de nível secundário (formação profissional básica) e os institutos técnicos de nível superior.

1.4

Tradicionalmente, o ensino formal na Europa não tem propiciado o espírito empresarial e o trabalho por conta própria. Embora estejam em curso numerosas iniciativas relacionadas com a educação para o empreendedorismo, estas nem sempre têm sido coerentes. As propostas da Comissão, baseadas em situações e boas práticas observadas, têm como objectivo contribuir para a definição de abordagens mais sistemáticas da educação para o empreendedorismo e potenciar o papel do ensino na criação de uma cultura mais empreendedora na Europa. As acções devem, na sua maior parte, ser realizadas a nível nacional e local.

1.5

A comunicação servirá de referência para a análise dos progressos conseguidos na definição de políticas, sobretudo através dos relatórios de Lisboa que os Estados-Membros apresentarão no quadro das Orientações Integradas para o Crescimento e o Emprego.

2.   Observações do CESE

2.1

O Comité congratula-se com a proposta da Comissão. É importante criar mais empresas se quisermos promover o crescimento económico necessário para manter o modelo social europeu e assegurar o êxito da Estratégia de Lisboa. A Europa precisa de mais empresários dotados das competências adequadas para competir com êxito nos mercados. Tal como é constatado pela Comissão, os benefícios da educação para o espírito empresarial não se limitam à maior implantação de empresas, ao aumento de projectos inovadores e à criação de novos empregos. Uma mentalidade empreendedora deveria ser vista como uma competência básica e uma oportunidade de carreira, bem como uma parte importante do desenvolvimento pessoal. Promove a criatividade e a inovação, assim como a auto-confiança, uma vez que desenvolve o espírito de iniciativa e ajuda a lidar com os insucessos. Trata-se de incutir uma atitude empreendedora e não apenas aprender a ser homem ou mulher de negócios. A formação do espírito empresarial também é útil aos trabalhadores porque os torna conscientes do contexto do seu trabalho e aptos a aproveitar oportunidades ao seu alcance. O espírito empresarial é a capacidade dos indivíduos de pôr as suas ideias em acção (1).

2.2

O CESE aprova a ideia de que uma alteração nas mentalidades e atitudes, desde a mais tenra idade, é crucial para promover um maior espírito empresarial. Um espírito empresarial deve também ser concebido como um processo de aprendizagem ao longo da vida, começando na escola primária. É aí que são lançadas as bases para certas competências empresariais particulares, para além dos conhecimentos e da cultura geral adquiridos no âmbito da educação formal e é aí que se pode despertar a criatividade e uma atitude pró-activa capaz de estimular a iniciativa e o desejo de descobrir e de aprender. Contribui também para uma maior flexibilidade em diferentes fases da vida e, por conseguinte, facilita o equilíbrio entre a vida pessoal e o trabalho tanto para as mulheres como para os homens. Importa considerar igualmente, neste contexto, o papel da família e a importância da sua atitude perante o espírito empreendedor.

2.3

O Comité congratula-se com as conclusões da Cimeira da Primavera (2). O Conselho Europeu sublinha a necessidade de criar um ambiente global favorável às empresas e convida os Estados-Membros a reforçarem as medidas adoptadas neste domínio, também através da formação do espírito empresarial. Os Planos Nacionais de Reforma, bem como os relatórios, deveriam referir explicitamente medidas para melhorar o ambiente em que operam as PME de todos os tipos e dimensões e incentivar mais pessoas, em particular mulheres e jovens, a tornarem-se empresários.

2.4

O Comité aprecia a sugestão de abertura de balcões únicos para a criação de empresas de uma forma rápida e simples. Trata-se de uma questão importante para o crescimento em geral e para a criação de emprego. No entanto, como já referido pelo Comité, as barreiras colocadas às empresas, antes e após a sua constituição, são maiores do que se supunha. De facto, ao acelerar demasiado o registo das empresas pode-se inadvertidamente estar a encorajar uma abordagem que encurta as importantes fases de investigação, planeamento, aquisição de capacidades e deliberação por parte do empresário, que precedem o lançamento de um novo projecto de empresa (3). Neste contexto, o Comité reitera que nesse processo está envolvida não só a constituição mas também a transmissão de empresas.

2.5

Questões regulamentares, fiscais e financeiras, todas elas com influência no espírito empresarial, foram já abordados em pareceres anteriores do Comité (4).

2.6

Não obstante o Comité apoiar e concordar com as propostas e recomendações da Comunicação, gostaria de fazer as seguintes observações:

3.   Observações na especialidade

3.1   Espírito empresarial na educação

3.1.1

Para desenvolver o espírito empresarial é necessário um processo de aprendizagem ao longo da vida que deve ser iniciado numa idade precoce e deveria servir de fio condutor ao longo de todo o sistema educativo. O ensino primário, secundário e superior deveriam proporcionar uma melhor base para a aquisição de competências e de capacidades para ser possível desenvolver mais tarde a autonomia e o espírito empresarial. Uma educação formal aprofundada e de boa qualidade abrirá desde logo o caminho a uma formação especializada que tornará esse espírito mais eficaz. Uma sondagem recente (5) revela que os programas de formação em espírito empresarial desempenham um papel crucial para incentivar os jovens a ponderarem a hipótese de trabalharem por conta própria como futura opção de carreira. Estes programas também visam melhorar a sua capacidade de resolver problemas, desenvolver a sua autoconfiança e compenetrá-los da importância da cooperação e do trabalho de equipa. A formação do espírito empresarial implica uma participação activa na educação e não apenas uma assimilação passiva de conhecimentos. Um estudo da Universidade de Lund (6) revela que o espírito empresarial se aprende sobretudo com a experiência de trabalho e a prática e não apenas através da educação formal.

3.1.2

O desenvolvimento do espírito empresarial é importante do ponto de vista teórico, assim como o ensino secundário e superior, podendo também ter um efeito adicional positivo no despertar do interesse por vários tipos de educação. Neste contexto, o Comité nota que há diversos tipos de culturas empresariais a considerar no momento de conceber os programas de ensino.

3.1.3

Uma das soluções consiste em desenvolver atempadamente contactos concretos entre as escolas, empresas, governo, autoridades relevantes e comunidade local. Administrações escolares e empresários devem colaborar com vista a desenvolver a melhor educação possível. Tanto os empregadores como os trabalhadores devem ter visibilidade e desempenhar um papel activo na educação. O Comité concorda com a Comissão que a importância do espírito empresarial deve ser claramente afirmada e fazer parte dos programas de ensino nacionais, devendo para isso ser tomadas medidas adequadas. O carácter horizontal do espírito empresarial convida a uma maior cooperação entre todos os ministérios envolvidos (educação/ indústria/ economia), com vista a assegurar uma abordagem coordenada.

3.1.4

Há que apoiar várias iniciativas nacionais e locais, bem como o intercâmbio de boas práticas. As organizações da sociedade civil (incluindo os parceiros sociais, as organizações de família, etc.) devem ser consultadas.

3.1.5

Neste processo, é importante dar todo o apoio aos professores, que têm de ser sensibilizados para os benefícios da educação empresarial e ser informados sobre a maneira de aplicar esses programas, logo desde a escola primária. Neste contexto, é essencial que a escola tenha não apenas os recursos humanos e financeiros mas igualmente a margem de autonomia que lhes permita realizar com êxito esta como outras missões que lhe são cometidas. É preciso que os professores compreendam que a formação integral dos seus alunos deve conter elementos de autonomia, curiosidade e espírito crítico que os estimulem e desenvolvam neles uma capacidade empreendedora. É, por isso, essencial dar-lhes todo o apoio e compenetrá-los de que essa formação pode ser também um enriquecimento pessoal.

3.1.6

O Comité lamenta que a perspectiva feminina não tenha sido mais considerada na comunicação, apesar de ser mencionada na introdução. A percentagem das raparigas que participam em actividades de mini-empresas na escola secundária é igual à dos rapazes, em alguns países é mesmo superior. Apesar disso e a crer em pesquisas feitas, é maior a probabilidade de os homens começarem uma empresa própria e de mostrarem mais confiança nas suas competências empresariais (7). Este fenómeno merece mais consideração e atenção por parte do sistema educativo em geral.

3.1.7

As pessoas com deficiência deveriam ter as mesmas possibilidades de se tornarem empresários como todos as outras, devendo a educação e a formação empresarial considerar este aspecto e prestar apoio adequado a essas pessoas. As organizações relevantes em torno das pessoas com deficiência europeias, nacionais e locais terão de ser envolvidas neste processo.

3.2   Disseminação das melhores práticas e seguimento

3.2.1

A comunicação da Comissão identifica e reúne todo o trabalho realizado com base nas melhores práticas. A atenção deveria centrar-se agora no modo de intensificar a aplicação e a disseminação destas conclusões, propostas e recomendações.

3.3   Disseminação das melhores práticas

3.3.1

O Comité está ciente de que é grande o repositório de boas práticas existente nos Estados-Membros ao nível de programas de ensino enriquecidos por temas e actividades com o fito de desenvolver as competências exigidas para o exercício de uma futura actividade empresarial e gostaria de mencionar algumas para além das já referidas na comunicação. As autoridades públicas, bem como os actores privados, estão envolvidos na formação do espírito empresarial. Conviria, contudo, verificar a eficácia deste tipo de projectos e se podem ser aplicados de uma forma mais generalizada, a exemplo do modelo designado por «Escada Empresarial» (8). Este modelo, que compreende várias fases que vão desde a educação primária até aos níveis superiores de investigação, revelou-se um modo eficaz de ministrar aos alunos conhecimentos sobre educação empresarial desde tenra idade e prosseguir este trabalho ao longo de todos os níveis de ensino.

projectos do tipo «Flashes of genius» («Ideias geniais») donde resultam inovações

jovens de 15 anos: informação e participação activa nas escolas das empresas, organizações e autoridades

jovens de 18 anos: jovens empresários e mini-empresas

ensino superior: aquisição de capacidades especiais e programas para o espírito empresarial.

3.3.2

A criação de um fórum de boas práticas é importante. As iniciativas para identificar e trocar boas práticas devem continuar a ser desenvolvidas nos Estados-Membros, sob a coordenação da Comissão. Nesse sentido, as conferências anuais no âmbito da Carta Europeia para Pequenas Empresas são importantes. O Comité também está expectante quanto à Conferência que a Comissão organizará no Outono de 2006, na sequência da comunicação, sobre a promoção do espírito empreendedor. O Comité solicita que todos os actores relevantes, quer privados quer públicos, sejam associados a esta conferência e sugere a possibilidade de introduzir modelos diferentes que poderão ser usados, por exemplo, a «Escada Empresarial», como estudos de casos. Nessa ocasião, seria importante debater modelos bem sucedidos e que sirvam para facilitar, logo desde a escola primária, a criação de condições (mentalidades, personalidades) capazes de gerar futuras capacidades empresariais e que poderiam ser adaptados aos critérios nacionais e aos programas curriculares de outros Estados-Membros. O Comité propõe igualmente que este tipo de conferência de revisão se torne num evento anual, com o objectivo de avaliar a aplicação das recomendações da Comissão.

3.3.3

Na sua comunicação, a Comissão estabelece comparações com os Estados Unidos, onde as actividades empreendedoras são mais encorajadas do que na Europa. Num anterior parecer, o Comité já havia mencionado que, em comparação com os EUA, há proporcionalmente menos europeus envolvidos na criação de novas empresas e que uma percentagem significativamente mais elevada das pessoas prefere o emprego por conta de outrem ao trabalho por conta própria. Muitos observadores crêem que o modelo social europeu é uma das razões principais por que na Europa as pessoas preferem trabalhar por conta de outrem. Há que considerar a) se estes dados são adequados para a aferição comparativa das actividades da UE ao nível dos Estados-Membros e em relação ao resto do mundo,b) qual o efeito desta preferência no emprego e no auto emprego, c) se ela está directamente relacionada com a falta de dinamismo empreendedor na Europa e d) se as soluções são aceitáveis para a sociedade europeia (9).

3.3.4

O espírito empresarial é importante para toda a sociedade. Com vista a promover e sensibilizar para a cultura da mentalidade empreendedora, e permitir uma melhor compreensão da importância do espírito empresarial para o desenvolvimento global de um país, o Comité propõe que 2009 seja declarado Ano Europeu do Espírito Empresarial. Neste contexto, o Comité nota que a revisão intercalar dos diversos programas comunitários relevantes terá lugar em 2010. Há necessidade de criar atitudes públicas positivas sobre o espírito empresarial. O Ano seria também uma oportunidade para consolidar e reforçar o intercâmbio de boas práticas. Um Ano Europeu do Espírito Empresarial poderia igualmente ter um papel de relevo na tarefa de comunicar a Europa e aproximar a UE dos seus cidadãos.

3.3.5

Como salientado pelo Comité, os meios de comunicação social desempenham um papel crucial para veicular o espírito empreendedor e facilitar a compreensão sobre as actividades empresariais. No entanto, a tónica é sobretudo colocada nas grandes empresas e nas multinacionais. As estratégias que visam evidenciar o papel do empresário deveriam ser definidas de molde a promoverem a imagem das pequenas empresas, das microempresas, do comércio especializado de serviços e das actividades tradicionais e artesanais (10).

3.4.   Seguimento

3.4.1

Uma vez que a educação e a formação fazem parte das competência dos Estados-Membros, a questão do seguimento e execução é crucial. O Comité constata que os anteriores relatórios de avaliação, no âmbito da Carta das Pequenas Empresas, estão a ser substituídos pelos relatórios gerais no quadro da Estratégia de Lisboa (Orientações Integradas para o Crescimento e o Emprego, orientação n.o 15). No entanto, o Comité considera que poderiam ainda ser formados painéis nacionais. A Comissão deverá definir objectivos qualitativos e quantitativos para avaliar, de modo eficiente e a longo prazo, a evolução da situação, no respeito pelo princípio da subsidiariedade e em função da situação específica de cada país. As propostas apresentadas no relatório final do grupo de peritos «Educação para o desenvolvimento do espírito empresarial» são válidas (11).

3.4.2

O Comité constata que vários programas comunitários de formação podem apoiar financeiramente as acções de sensibilização para o espírito empresarial, em particular os programas Erasmus e Leonardo, os Fundos Estruturais, especialmente o Fundo Social Europeu, e o futuro Programa de Inovação e Competitividade (CIP). No entanto, estas possibilidades de apoio parecem não estar coordenadas. A promoção do espírito empresarial deverá ser objecto de uma estratégia coerente ao nível comunitário, em que os métodos e o financiamento sejam claramente identificados e os actores em todos os níveis sejam informados das possibilidades de financiamento comunitário.

3.4.3

O Comité tenciona dar sequência à acção prioritária da presidência finlandesa no sentido de libertar o potencial empreendedor, conforme reclama o Conselho Europeu (12).

Bruxelas, 6 de Julho de 2006.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  COM(2005) 548 — Proposta de Recomendação do Parlamento Europeu e do Conselho sobre as competências-chave para a aprendizagem ao longo da vida.

(2)  Conselho Europeu de Bruxelas, 23-24 de Março de 2006, Conclusões da Presidência.

(3)  Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o «Livro Verde — Espírito Empresarial na Europa» (relator: Ben Butters) in JO C 10, 14.1.2004, p. 58.

(4)  Parecer do CESE sobre a «Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Plano de acção: A agenda europeia para o espírito empresarial» (relator Ben BUTTERS) in JO C 74 de 23.03.2005, p.1 e parecer do CESE sobre o «Livro Verde — Espírito Empresarial na Europa» (relator: Ben BUTTERS) in JO C 10 de 14.1.2004, p. 58.

(5)  «Interprise 2010 the next generation» (Empresa 2010, a próxima geração) estudo da Junior Achievement Young Enterprise, Setembro de 2005.

(6)  «Espírito empresarial, experiência de trabalho e aprendizagem — Desenvolver a nossa compreensão do espírito empresarial enquanto processo de aprendizagem empírica», dissertação de Diamanto Politis 2005, School of Economics and Management, Universidade de Lund.

(7)  Global Entrepreneurship Monitor, Relatório sucinto de 2005.

(8)  Conceito introduzido pela Confederação de Empresas da Suécia.

(9)  Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o «Livro Verde — Espírito Empresarial na Europa» (relator: Ben Butters) in JO C 10, 14.1.2004, p. 58.

(10)  Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o «Livro Verde — Espírito Empresarial na Europa» (relator: Ben Butters) in JO C 10, 14.1.2004, p. 58.

(11)  Relatório final do grupo de peritos «Educação para o desenvolvimento do espírito empresarial» — Fomentar a promoção das atitudes e competências empresariais no ensino básico e secundário (Fevereiro de 2004).

(12)  Conselho Europeu de Bruxelas, 23-24 de Março de 2006, Conclusões da Presidência.


ANEXO 1

As seguintes propostas de alteração obtiveram mais de três quartos dos sufrágios expressos mas foram rejeitadas durante o debate:

Pontos principais da posição do CESE — 14.o travessão

Alterar como segue:

 

Lançamento do Ano Europeu do Espírito Empresarial por proposta da Comissão;

Resultados da votação

Votos a favor 48

Votos contra 62

Abstenções 15

Ponto 3.3.4

Alterar como segue:

«O espírito empresarial é importante para toda a sociedade. Com vista a promover e sensibilizar para a cultura da mentalidade empreendedora, e permitir uma melhor compreensão da importância do empreendedorismo para o desenvolvimento global de um país, o Comité propõe que 2009 seja declarado Ano Europeu do Espírito Empresarial insta a Comissão a tomar medidas adequadas. O Comité nota que a revisão intercalar dos diversos programas comunitários relevantes terá lugar em 2010. Há necessidade no sentido de criar atitudes públicas positivas sobre empreendedorismo. O Ano seria também uma oportunidade para , consolidar e reforçar o intercâmbio de boas práticas. Um Ano Europeu do Espírito Empresarial poderia igualmente ter um papel de relevo na tarefa de comunicar a Europa e aproximar a UE dos seus cidadãos.».

Resultados da votação

Votos a favor 60

Votos contra 73

Abstenções 13


16.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 309/115


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o «Livro Branco sobre a Política de Comunicação Europeia»

COM(2006) 35 final

(2006/C 309/24)

Em 1 de Fevereiro, a Comissão Europeia decidiu, nos termos do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre o Livro Branco sobre a Política de Comunicação Europeia.

O Comité Económico e Social Europeu decidiu, na 424.a reunião plenária de 15 e 16 de Fevereiro de 2006 e em conformidade com o disposto no n.o 1 do artigo 19.o do Regimento, criar um subcomité para preparar os trabalhos correspondentes.

Incumbido da preparação dos correspondentes trabalhos, o Subcomité «Política europeia de comunicação» emitiu parecer em 22 de Junho de 2006, tendo sido relatora Jillian van TURNHOUT.

Na 428.a reunião plenária, realizada em 5 e 6 de Julho de 2006 (sessão de 6 de Julho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 108 votos a favor e 4 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Conclusões e recomendações

Os pontos de vista pormenorizados do Comité sobre as cinco questões levantadas no Livro Branco da Comissão Europeia são apresentados em seguida. Em resumo, o Comité não aprova uma carta suplementar ou um código de conduta que estabeleça princípios gerais, exortando novamente a Comissão a resolver o problema da ausência de base jurídica para a política de comunicação. O Comité chama a atenção para um duplo problema de recursos: a falta de fundos e os procedimentos burocráticos complicados e desmotivadores para a sua atribuição. O Comité congratula-se com as propostas práticas sobre questões como a educação cívica, assinala que a responsabilidade principal por muitas delas cabe aos Estados-Membros e insta os ministros da Educação a, por exemplo, debaterem uma abordagem comum à história da União Europeia. Para se chegar aos cidadãos é necessário, por um lado, um conjunto claro e atraente de mensagens e uma visão clara que os cidadãos aceitem como sua e, por outro lado, uma concepção adequada e instrumentos de comunicação. O CESE está disposto a trabalhar em conjunto com outras instituições e efectivamente reconhece haver uma evolução interinstitucional positiva ao nível central. Todavia, o Comité, que defende com veemência uma abordagem descentralizada, insta a Comissão a reflectir mais profundamente na forma de criar sinergias verdadeiras e cooperação insterinstitucional ao nível descentralizado. O Comité propõe que o prometido aditamento pós-Livro Branco ao protocolo de cooperação entre a Comissão Europeia e o Comité Económico e Social Europeu se concentre nesta questão em particular.

2.   Exposição de motivos

2.1

Em 1 de Fevereiro de 2006, a Comissão Europeia adoptou o Livro Branco sobre uma Política de Comunicação Europeia (COM(2006) 35 final). Foi o terceiro documento relacionado com o tema da comunicação adoptado pela Comissão Europeia no espaço de sete meses. Os outros dois foram: um plano de acção interno (SEC(2005) 985 final), adoptado em 20 de Julho de 2005; e a Comunicação «Contributo da Comissão para o período de reflexão e para a fase posterior: Plano D para a Democracia, o Diálogo e o Debate» (COM(2005) 494 final), adoptado em 13 de Outubro de 2005. No Livro Branco, as instituições e os organismos da União Europeia são convidados a responder «através das vias institucionais normais». Nele é fixado um período de consulta de seis meses. No final deste período, proceder-se-á a uma análise da situação «tendo em vista apresentar propostas relativamente a cada domínio de acção».

2.2

Por sua vez, o Comité Económico e Social Europeu emitiu recentemente dois pareceres sobre o tema da comunicação: o primeiro sobre o «Período de reflexão: estrutura, temas e quadro para uma avaliação do debate sobre a União Europeia» (CESE 1249/2005 (1)), adoptado em 26 de Outubro e destinado ao Parlamento Europeu; o segundo sobre a Comunicação da Comissão «Plano D» (CESE 1499/2005 (2)), adoptado em 14 de Dezembro de 2005. Ambos os pareceres propunham uma série de recomendações operacionais. Na sua reunião de 6 de Abril de 2006, o Grupo de Comunicação do CESE iniciou um processo de análise sistemática da aplicação destas recomendações.

2.3

O presente parecer sobre o Livro Branco não deve, portanto, repisar o que o Comité já escreveu e está a escrever sobre o assunto. Pelo contrário, deve procurar responder às perguntas relacionadas com as cinco áreas básicas identificadas no Livro Branco, designadamente:

Definição de princípios comuns: que via a seguir?

Como chegar ao cidadão?

Como envolver de forma mais eficaz os meios de comunicação social na comunicação sobre a Europa?

Que mais há a fazer para conhecer a opinião europeia?

Trabalhar em conjunto.

2.4

Para além dos dois pareceres do Comité supramencionados e do Livro Branco da Comissão, o subcomité e a relatora basearam-se ainda nos seguintes documentos:

Resumo dos debates travados nas reuniões plenárias do CESE desde Junho de 2005, incluindo o debate de 20 de Abril de 2006 em torno das questões suscitadas pelo Livro Branco e supramencionadas.

As recomendações apresentadas pelos grupos de trabalho no fórum sobre o tema «Colmatar o hiato: Como aproximar a Europa e os seus cidadãos?», realizado em 7 e 8 de Novembro de 2005, em Bruxelas.

Resumos de vários debates desenrolados no Grupo de Comunicação.

O parecer de iniciativa do Comité enviado ao Conselho Europeu de Junho de 2006, tal como adoptado em 17 de Maio de 2006.

As recomendações apresentadas pelos grupos de trabalho no fórum descentralizado do CESE sobre o tema «Colmatar o hiato: Como aproximar a Europa e os seus cidadãos?», realizado em 9 e 10 de Maio de 2006, em Budapeste.

2.5

O presente parecer sobre o Livro Branco está dividido em cinco partes, correspondentes a cada uma das cinco perguntas identificadas no documento da Comissão, e cada parte centra-se apenas numa ou nalgumas áreas básicas.

3.   Observações na generalidade

3.1   Definição de princípios comuns: que via a seguir?

3.1.1

No domínio específico de comunicar a Europa, o papel dos Estados-Membros é essencial. Em muitas outras áreas, são as empresas, os parceiros sociais, alguns sectores da sociedade civil. Por outras palavras, é a própria sociedade dinâmica que desempenha com êxito um papel decisivo, o que não acontece com a comunicação sobre a Europa em geral.

3.1.2

A questão principal que aqui se coloca é saber se o Comité deve ou não concordar com a afirmação da Comissão de que «os princípios e as normas comuns que devem nortear as actividades de informação e comunicação sobre as questões europeias devem ser consagrados num documento-quadro, por exemplo, uma carta europeia ou um código de conduta europeu sobre a comunicação. O objectivo consiste em que todos os intervenientes (instituições da UE, governos nacionais, regionais e locais e organizações não-governamentais) assumam um compromisso comum de respeitar estes princípios e de garantir que a política de comunicação da UE esteja ao serviço dos cidadãos.»

3.1.3

O Comité entende que a preocupação subjacente da Comissão Europeia é a ausência de uma verdadeira base jurídica para as actividades de informação e comunicação comunitárias. O Comité já se pronunciou inequivocamente sobre esse assunto. Nomeadamente, no ponto 3.7 do seu parecer de 26 de Outubro de 2005 ao Parlamento Europeu sobre o período de reflexão (3), o Comité instou a Comissão Europeia a «apresentar uma proposta legislativa para uma política da comunicação e a responder à questão “oculta” da ausência de base jurídica que originou demasiados mecanismos informais e um método desequilibrado. No entender do Comité, o facto de apresentar uma tal proposta seria já um incentivo para o debate.»

3.1.4

O Livro Branco afirma que, no final do período de consulta, a Comissão «apresentará os respectivos resultados e analisará a hipótese de propor uma carta, um código de conduta ou outro instrumento». O Comité manifesta-se preocupado com esta formulação e vê riscos no que parece ser a abordagem potencial a propor pela Comissão.

3.1.5

A Comissão refere-se a «princípios e normas comuns», baseando-se na prática de alguns Estados-Membros, mas esses princípios e normas ultrapassam a comunicação e a informação. Uma simples declaração de princípios a aprovar por todos — porque na realidade aprovam — não acrescentará qualquer valor. Por outro lado, um código ou uma carta poderão parecer demasiado restritivos. Além disso, esses princípios já estão consagrados em diversos textos de base. Se, por outro lado, a intenção for elaborar um código de conduta para os meios de comunicação social e outros actores desse sector, tal poderá ser encarado como uma tentativa de manipular o debate ou prejudicar abordagens eurocépticas. Além disso, o objectivo de envolver todos os actores parece irrealista, dado que uma das lições a tirar por todas as instituições das experiências de referendo em França e nos Países Baixos é que um crescente número de actores não apoia automaticamente o processo de integração europeia. Por último, se todos os actores referidos no Livro Branco aderissem a um código desse tipo, tal significaria que todos teriam igual responsabilidade pelo desafio de comunicação enfrentado pela União Europeia. No parecer do Comité, seria enganoso dar essa impressão dado que a principal responsabilidade cabe — e deve caber — aos governos dos Estados-Membros.

3.1.6

O Comité assinala com inquietação que a Comissão irá lançar na Internet um fórum especial destinado a obter opiniões sobre a oportunidade de tal documento-quadro. Nem todos os cidadãos europeus têm acesso a uma abordagem baseada na Internet, sendo portanto essencial reforçar o exercício de consulta mediante outros meios de comunicação social mais tradicionais.

3.2   Como chegar ao cidadão?

3.2.1

O Comité chama a atenção para o facto de os recursos financeiros serem extremamente limitados. Além disso, os procedimentos para a distribuição dos fundos, após a aprovação do novo regulamento financeiro, estão indubitavelmente a impedir e a desencorajar muitas acções bem intencionadas da sociedade civil.

3.2.2

Comunicar com êxito com os cidadãos exige acções que resolvam os motivos para o seu cepticismo: primeiro, alguns sectores da sociedade criticam cada vez mais os resultados e os impactos das decisões políticas nas suas condições de vida e de trabalho. Segundo, há efectivamente uma falta de discurso político e, dessa forma, uma necessidade de comunicação, mas a forma dessa comunicação deve ser alterada para ter êxito.

3.2.3

Uma comunicação eficaz exige, sobretudo, um conjunto de mensagens claras e atraentes, uma visão clara que os cidadãos aceitem. Os cidadãos querem que a Europa seja um projecto político, que inclua um projecto socioeconómico, um modelo europeu, que mantenha a coesão social e reforce a competitividade. Alguns países já demonstraram que tal é possível.

3.2.4

A comunicação está centralizada e orientada para a Europa. Desenrola-se principalmente a nível europeu entre actores e instituições europeus e indivíduos que já se encontram próximo do projecto europeu. Utiliza igualmente instrumentos — tais como as consultas pela Internet — que atingem apenas grupos selectos de cidadãos. Para ir mais longe, é preciso desenvolver actividades de comunicação que envolvam outros actores que não as instituições da União Europeia e aqueles já próximos da UE e descentralizar verdadeiramente os debates, ou seja, há que efectuá-los aos níveis nacional, regional e local, com a participação dos decisores e meios de comunicação social desses níveis (que em alguns casos têm de se convencer a si próprios primeiro).

3.2.5

Neste contexto, o Livro Branco apresenta algumas propostas práticas, desde a educação cívica a debates conjuntos abertos. O Comité apoia em particular os argumentos a favor de uma educação cívica. Todavia, tal como o Livro Branco reconhece, o artigo 149.o do TCE afirma claramente que os conteúdos educativos e a organização dos sistemas de ensino são da exclusiva competência dos Estados-Membros. Mais uma vez, portanto, há um risco duplo envolvido na argumentação das instituições europeias a favor do reforço da educação cívica. Por um lado, arriscam-se a serem acusados de interferirem nos assuntos soberanos dos governos dos Estados-Membros e, por outro lado, implicitamente estariam a aceitar a responsabilidade por algo que, na verdade, não é da sua responsabilidade.

3.2.6

No entanto, a União Europeia precisa da aceitação pelos seus cidadãos de um destino comum. Para tal, seria desejável que, como parte dos programas educativos dos Estados-Membros, a União Europeia fosse apresentada e explicada em termos históricos e actuais como um projecto político comum de todos os Estados-Membros e respectivas populações. Esta questão devia ser debatida abertamente no Conselho de Ministros da Educação.

3.2.7

Isso não significa que as instituições comunitárias devam ficar inactivas. Pelo contrário, devem todas concentrar-se mais em informar os cidadãos europeus sobre a mais-valia da União Europeia. É preciso identificar o público-alvo e promover as histórias de sucesso inquestionável da UE.

3.2.8

De forma mais geral, os cidadãos deviam sentir que fazem parte de processos reguladores e de decisão plenamente transparentes.

3.3   Como envolver de forma mais eficaz os meios de comunicação social na comunicação sobre a Europa?

3.3.1

Nesta secção, a Comissão assinala que as instituições da UE deviam ter melhores instrumentos e capacidades de comunicação e explorar formas de eliminar o «fosso digital». O Comité lamenta que a intenção da Comissão de propor uma agência de imprensa europeia tenha sido abandonada na versão final do Livro Branco por, como demonstrado pelas reacções iniciais, poder provocar um debate amplo sobre a natureza das relações entre os meios de comunicação social situados em Bruxelas e as instituições comunitárias.

3.3.2

O Comité defende as medidas definidas nesta secção. Todavia, insta a Comissão a fazer uma distinção entre os meios de comunicação especializados e os meios de comunicação social gerais. Geralmente, os meios de comunicação especializados estão bem informados e fornecem cobertura informativa. O Comité gostaria igualmente de salientar que a televisão continua a ser o vector principal de informação para a maioria dos cidadãos europeus. Incentiva a Comissão a ter isso e a rápida evolução da televisão digital em conta na elaboração de qualquer estratégia geral. Neste contexto, o Comité frisa a importância essencial de comunicar com os cidadãos na sua própria língua.

3.3.3

Pela sua parte, o Comité continua a actualizar e aplicar o seu plano estratégico de comunicação, que inclui a revisão permanente dos seus instrumentos de comunicação e respectiva utilização e a exploração de métodos inovadores (a utilização da «Tecnologia de Espaço Aberto» nos fóruns sobre «Colmatar o hiato» de 7-8 de Novembro de 2005 (Bruxelas) e de 9-10 de Maio de 2006 (Budapeste) é um dos exemplos notáveis de tal).

3.4   Que mais há a fazer para conhecer a opinião europeia?

3.4.1

A Comissão propõe redes de peritos nacionais e um observatório da opinião pública europeia. O Comité concorda com as linhas gerais básicas do Livro Branco neste domínio. Concorda em particular que a União Europeia possui uma ferramenta viável sob a forma do Eurobarómetro, embora estime que a Comissão devia desenvolver relações e sinergias com organizações nacionais de sondagens de opinião.

3.4.2

O Comité considera igualmente que a Comissão não está a explorar suficientemente os mecanismos existentes para sondar a opinião pública, tal como o Comité Económico e Social Europeu. Nesse contexto, o Comité congratulou-se com as declarações de intenção estabelecidas no novo Protocolo de Cooperação entre a Comissão Europeia e o CESE (assinado em 7 de Novembro de 2005). A utilização mais estruturada do Comité enquanto transmissor de opiniões devia ser desenvolvida no contexto do aditamento pós-Livro Branco ao protocolo de cooperação de 7 de Novembro de 2005.

3.5   Trabalhar em conjunto

3.5.1

Nesta secção, a Comissão apresenta algumas formas novas, estruturadas de cooperação. Chama a atenção para o papel que o Comité Económico e Social Europeu já desempenha e faz referência ao novo protocolo de cooperação entre as duas instituições, de 7 de Novembro de 2005. A cooperação entre as duas instituições é boa ao nível central, no entanto, o Comité considera que muito mais poderia ser feito para fomentar sinergias entre os recursos da Comissão e do Comité a nível descentralizado. Este é mais um domínio que devia ser desenvolvido no aditamento pós-Livro Branco ao protocolo de 7 de Novembro de 2005.

4.   Anteriores recomendações do Comité

4.1

O Comité recorda as suas recomendações anteriores à Comissão no domínio da comunicação, em particular as constantes do anexo ao seu parecer sobre o «Período de reflexão: estrutura, temas e quadro para uma avaliação do debate sobre a União Europeia» (CESE 1249/2005 (4)) e do seu parecer de Maio destinado ao Conselho Europeu de 15-16 de Junho de 2006.

Bruxelas, 6 de Julho de 2006.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  JO C 28 de 3.2.2006, págs. 42-46.

(2)  JO C 65 de 17.3.2006, págs. 92-93.

(3)  «Período de reflexão: estrutura, temas e quadro para uma avaliação do debate sobre a União Europeia»JO C 28 de 3.2.2006, págs. 42-46.

(4)  JO C 28 de 3.2.2006, págs. 42-46.


16.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 309/119


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «Coesão social: dar conteúdo a um modelo social europeu»

(2006/C 309/25)

Em 19 de Janeiro de 2006, o Comité Económico e Social Europeu decidiu, em conformidade com o n.o 2 do artigo 29.o do seu Regimento, elaborar um parecer sobre Coesão social: dar conteúdo a um modelo social europeu.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania, que emitiu parecer em 2 de Junho de 2006, sendo relator E. EHNMARK.

Na 428.a reunião plenária, realizada em 5 e 6 de Julho de 2006 (sessão de 6 de Julho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 91 votos a favor, 1 voto contra e 5 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Conclusões e recomendações

1.1

O Modelo Social Europeu é uma realidade, baseada na unidade dos objectivos gerais e na diversidade das aplicações. O modelo tem dado provas de fundamento inspirando os países europeus na construção de sociedades coesas, solidárias e competitivas. O modelo enfrentará, nos próximos anos, desafios de grande envergadura. A tarefa actual consiste em dar conteúdo ao modelo social e preparar para o futuro.

1.2

A pujança do Modelo Social Europeu tem sido determinada pela forma como têm interagido entre si a competitividade, a solidariedade e a confiança recíproca. Nesta medida, o modelo assume-se simultaneamente como uma realidade e uma visão para o futuro, mas não pode, em momento algum ou de alguma forma, ser encarado como «definitivo». Deve ser dinâmico e capaz de responder a novos desafios.

1.3

O modelo social europeu, na presente análise, não se confina à acepção tradicional do termo «social». A par da evolução das ligações entre vários sectores, há que relacionar o termo social com os aspectos económico e ambiental. Só aceitando esta definição alargada poderá o modelo social ser uma inspiração necessária para enfrentar futuros desafios. Com esta interpretação alargada, o modelo poderia muito bem definir-se como um modelo europeu de sociedade, de que o aspecto social é um dos elementos. A presente análise utiliza contudo o termo social.

1.4

Todos os sistemas nacionais da UE são caracterizados pela consistência entre eficiência económica e progresso social. As políticas de carácter social e laboral devidamente concebidas têm-se revelado uma força positiva, tanto para a justiça social como para a eficiência e a produtividade da economia. A política social é um factor de produção.

1.5

O CESE identifica um conjunto de componentes centrais do modelo social europeu, começando pela assunção pelo Estado da responsabilidade de promover a coesão e a justiça sociais estabelecendo como meta níveis elevados de emprego e a prestação de serviços públicos de qualidade. Outras componentes fundamentais são as relacionadas, entre outras, com medidas em prol da produtividade e competitividade, da investigação e ensino e de resposta aos desafios ambientais.

1.6

As conquistas do Modelo Social Europeu, que evoluiu durante um longo período são consideráveis em termos económicos, sociais e ambientais. A emergência de uma área europeia de bem-estar é o resultado mais concreto. Todavia, isso não pode ocultar deficiências do modelo, tais como a constante segregação social, a persistência de áreas de pobreza e a elevada taxa de desemprego, em particular entre os jovens.

1.7

Para a Europa, e para o Modelo Social Europeu, são consideráveis os futuros desafios. Entre os quais, competitividade e emprego, inclusão social e luta contra a pobreza, e efeitos da globalização. Outros desafios relacionam-se com as questões de igualdade de tratamento entre homens e mulheres, a migração e a evolução demográfica.

1.8

Para que o Modelo Social Europeu seja uma mais-valia na configuração da sociedade europeia de amanhã, terá de ser dinâmico e aberto a desafios, mudanças e reformas.

1.9

O Modelo Social Europeu será relevante apenas enquanto for apreciado e apoiado pelos cidadãos da Europa. A análise e os aspectos fulcrais do Modelo Social Europeu devem servir de base para o debate e o diálogo nos Estados-Membros, proporcionando, aos cidadãos uma nova forma de apresentarem os seus pontos de vista sobre a Europa e o modelo social que desejam.

1.10

Para resumir numa frase, a hipótese formulada no presente parecer é que o Modelo Social Europeu deve ser, para todos os cidadãos da Europa, um conceito de espaço de bem-estar social simultaneamente democrático, capaz de assegurar a protecção do ambiente, competitivo, assente na solidariedade e socialmente inclusivo.

2.   Análise e observações

2.1   Contexto e definições

2.1.1   Introdução

2.1.1.1

O Modelo Social Europeu e as suas características tornaram-se tema de um animado debate, o que não é surpreendente, dado que vários acontecimentos recentes vieram alimentar a discussão. O projecto de Tratado Constitucional não recolheu o apoio da opinião pública e as visões que traçava não se materializaram. Outros desenvolvimentos e acontecimentos inspiraram igualmente um debate sobre o modelo social europeu: a estagnação do desempenho económico da Europa e o seu fracasso em aumentar as taxas de emprego, a evolução demográfica, o avanço da globalização e o vigoroso debate sobre o projecto de directiva relativa aos serviços. A integração de novos Estados-Membros contribui para inspirar debates sobre o futuro da UE.

2.1.1.2

Com o presente parecer, o CESE dá o seu contributo para o debate em curso. O parecer servirá de base à prossecução do diálogo com os parceiros sociais e a sociedade civil organizada.

2.1.1.3

O ponto de partida do parecer é o reconhecimento de que existe, de facto, um conjunto de valores e visões que, conjuntamente com a realidade social, constituem aquilo que se pode designar por Modelo Social Europeu. A sua finalidade é analisar o conteúdo desse modelo e traçar ideias e desafios para o seu aprofundamento.

2.1.1.4

Como visão para a Europa, o modelo social deve aprofundar-se em simbiose com outras visões para a Europa e, sobretudo, com a do desenvolvimento sustentável e a de uma Europa que venha a ser a sociedade baseada no conhecimento mais competitiva do planeta, capaz de proporcionar mais e melhor emprego e coesão social.

2.1.2   Definição e âmbito do Modelo Social Europeu

2.1.2.1

A análise do modelo social europeu tem de começar pelos sistemas de valores como desenvolvidos nos países europeus. Os sistemas de valores fornecem a base para qualquer debate sobre características comuns de um modelo social. A União Europeia funda-se em alguns valores comuns: liberdade, democracia, respeito dos direitos e da dignidade do ser humano, igualdade, solidariedade, diálogo e justiça social. O facto de que o modelo é, em parte, um modelo com base em direitos — como ilustrado pela Carta Social — demonstra que o modelo se baseia em valores.

2.1.2.2

Na presente análise, o Modelo Social Europeu é visto numa perspectiva ampla. O modelo social não se confina à acepção tradicional do termo «social». A inter-relação existente entre questões económicas, sociais e ambientais impõe uma interpretação ampla do modelo social.

2.1.2.3

Nesta análise do Modelo Social Europeu adoptou-se uma abordagem dupla que foca valores e visões em conjugação com as políticas de base para tornar as visões realidade. O modelo social não se limita à formulação de visões: é também, em grande medida, um exercício de transferência de uma visão para a realidade política. O papel do modelo é inspirar e facultar um quadro para a abordagem de novas questões.

2.1.2.4

Uma hipótese formulada pela presente análise é que o Modelo Social Europeu dos nossos dias é basicamente composto por três blocos principais, que são os objectivos económicos, sociais e ambientais. É no quadro da interacção entre estes sectores — perante o pano de fundo de tendências como a globalização — que tem lugar o desenvolvimento concreto do modelo social. A pujança do Modelo Social Europeu tem sido determinada pela forma como têm interagido entre si a competitividade, a solidariedade e a confiança recíproca. Nesta perspectiva, o Modelo Social Europeu não pode, em momento algum e de forma alguma, ser encarado como «definitivo». Tem de ser dinâmico e responder aos desafios endógenos e exógenos.

2.1.2.5

A seguinte frase poderia sintetizar esta visão: o Modelo Social Europeu deve ser, para todos os cidadãos da Europa, um conceito de espaço de bem-estar social simultaneamente democrático, capaz de assegurar a protecção do ambiente, competitivo, assente na solidariedade e socialmente inclusivo.

2.1.2.6

Neste contexto, afigura-se relevante salientar a ligação entre eficiência económica e justiça e coesão sociais. O Modelo Social Europeu baseia-se em ambas. Apesar da diversidade entre sistemas nacionais, existe um Modelo Social Europeu com traços distintivos, na medida em que todos os sistemas nacionais dos Estados-Membros da UE se caracterizam pela coerência entre a eficiência económica e o progresso social. A dimensão social funciona igualmente como um factor de produção. Por exemplo, boa saúde e boa legislação laboral conduzem a bons resultados económicos. Políticas de carácter social e políticas do mercado de trabalho devidamente concebidas podem revelar-se uma força positiva, tanto para a justiça e a coesão sociais como para a eficiência e a produtividade da economia. As prestações de desemprego, associadas a políticas activas para o mercado de trabalho, estabilizam as economias e promovem uma adaptação activa à mudança através do desenvolvimento de competências e de uma procura de emprego e formação profissional eficientes. O investimento público, devidamente direccionado, em infra-estruturas físicas e em capital humano pode servir objectivos económicos e sociais. Os dois aspectos podem e devem reforçar-se mutuamente. A participação activa de parceiros sociais e da sociedade civil pode melhorar a coesão enquanto aumenta a eficiência económica.

2.1.2.7

Outra forma de abordar esta questão é a da perspectiva dos custos económicos e políticos que resultariam da inexistência de uma Europa social. Um estudo encomendado pela Comissão Europeia sobre os custos de uma política não-social permitiu identificar vantagens económicas substanciais da política social em termos de eficiência na distribuição de recursos, de produtividade laboral e de estabilização económica. O estudo concluiu que as políticas sociais baseadas em investimentos no capital humano e social conduzem a uma maior eficiência económica, uma vez que aumentam a produtividade e a qualidade da mão-de-obra. A política social é, por conseguinte, um factor favorável à produção, ainda que os seus custos sejam geralmente visíveis a curto prazo e os seus benefícios apenas se tornem patentes a longo prazo (1).

2.1.2.8

Os países europeus e, em alguns casos, as regiões, têm uma experiência histórica específica, que inclui os conflitos e as formas encontradas para a sua resolução. O consenso social sobre o «equilíbrio» correcto entre valores é também um pouco divergente, embora não em aspectos fundamentais. Estes aspectos deram origem a uma multiplicidade de formatos institucionais que permitem aos países aplicarem a sua respectiva «Constituição social» — ou seja, valores que foram transformados em direitos garantidos pela lei — nas quais se enraíza a economia de mercado, o ordenamento jurídico e constitucional e a administração pública. Os Tratados europeus realçam os valores comuns subjacentes ao modelo social, insistindo ao mesmo tempo na importância de respeitar a diversidade nacional.

2.1.2.9

A isto somam-se as questões ambientais. O rápido aumento dos preços da energia, a persistente contaminação da atmosfera e os efeitos daí decorrentes para a habitação, os transportes e a vida profissional irão prejudicar o equilíbrio entre eficiência económica e produtividade, por um lado, e justiça e coesão sociais, por outro. Contudo, também neste domínio temos exemplos de políticas que, promovendo a sustentabilidade, conseguem acompanhar a prossecução de objectivos económicos e sociais — o que é igualmente válido para os domínios da saúde pública e da segurança. A degradação do ambiente está a provocar novos problemas de saúde, tanto nos jovens como nos adultos, facto que ilustra a necessidade de uma melhor integração das questões ambientais no Modelo Social Europeu.

2.1.2.10

Houve quem concluísse, perante esta variedade institucional, que não existe, na realidade, um Modelo Social Europeu, mas (pelo menos) tantos modelos quantos os países ou, na melhor das hipóteses, modelos que podem ser agrupados em «famílias».

2.1.2.11

Embora não pretenda, de forma alguma, subestimar a importância desta diversidade, o CESE apresenta as seguintes razões pelas quais pode fazer sentido falar de um único Modelo Social Europeu:

1)

contrastando com anteriores abordagens que tentaram explicitamente identificar famílias no seio do capitalismo europeu, constatam-se diferenças substanciais, quando se parte de uma visão global, entre os resultados obtidos pelos países europeus considerados como um grupo, e os obtidos por países capitalistas e avançados extra-europeus (sobretudo os Estados Unidos).

2)

a diversidade institucional é muito mais significativa do que a diversidade de resultados sociais em toda a Europa, uma vez que muitas instituições são funcionalmente equivalentes.

3)

as economias europeias estão cada vez mais estreitamente integradas, muito mais do que em outras regiões do mundo, o que conduz à necessidade de abordagens conjuntas em muitas áreas de política;

4)

os Estados-Membros da União Europeia conferem ainda uma dimensão supranacional única aos seus modelos sociais, ou seja, a dimensão europeia, o que significa que a UE tem um «acervo social» efectivo (2).

2.1.2.12

O CESE propõe que as características seguidamente descritas — que constituem uma realidade social, embora com diferentes tipos de institucionalização, e não apenas um conjunto de valores — sejam estabelecidas como componentes básicas de um Modelo Social Europeu, quer se encontrem já concretizadas em alguns Estados-Membros da UE, quer tenham ainda de o ser, por via política.

1)

o Estado assume a responsabilidade de promover a coesão e a justiça sociais, estabelecendo como meta elevados níveis de emprego e prestando ou garantindo serviços públicos de qualidade (serviços de interesse geral), bem como instituindo políticas orçamentais redistributivas;

2)

Os governos e/ou parceiros sociais, ou outras agências, asseguram sistemas de protecção social que proporcionam uma cobertura apropriada contra riscos graves (desemprego, doença, velhice) a níveis susceptíveis de evitar a pobreza e a exclusão social.

3)

direitos fundamentais de natureza legal (ou quase legail) — reflectidos nos acordos internacionais –,como o direito de associação e o direito à greve;

4)

envolvimento de trabalhadores a todos os níveis com sistemas de relações laborais ou diálogo social autónomo;

5)

uma vontade forte e clara em matéria de igualdade de oportunidades em todos os sectores da sociedade e, em particular, na educação e na vida laboral;

6)

políticas necessárias para tratar questões de migração, em particular no contexto da evolução demográfica nos países da UE;

7)

um corpus legislativo em matéria social e laboral que garanta oportunidades iguais e proteja os grupos vulneráveis, incluindo políticas positivas para responder às necessidades específicas de grupos desfavorecidos (jovens, idosos e pessoas com deficiência);

8)

um conjunto de políticas macro-económicas e estruturais que promovam a sustentabilidade, o crescimento económico não-inflacionista e o comércio em condições equitativas (mercado único) e que prevejam medidas de apoio à indústria e aos prestadores de serviços, sobretudo aos empresários e PME;

9)

necessários programas políticos para incentivar investimentos em domínios cruciais para o futuro da Europa, em particular a aprendizagem ao longo da vida, investigação e desenvolvimento, tecnologias ambientais, etc.;

10)

constante prioridade à promoção da mobilidade social e da igualdade de oportunidades para todos;

11)

responsabilidade pelo lançamento de políticas necessárias para fazer face às questões ambientais, em particular as relacionadas com a saúde e o aprovisionamento energético;

12)

um amplo consenso sobre a necessidade de os investimentos públicos e privados na Europa apresentarem um nível muito elevado de sustentabilidade, de forma a promover a competitividade e o progresso social e ambiental;

13)

empenhamento no desenvolvimento sustentável, para que as conquistas económicas e sociais da actual geração não sejam alcançadas a troco de restrições para as gerações vindouras (solidariedade entre gerações);

14)

empenhamento claro na solidariedade com os países em desenvolvimento e na assistência aos seus programas de reforma económica, social e ambiental.

2.2   Conquistas do Modelo Social Europeu

2.2.1

A criação da União Europeia e o seu alargamento eficaz é um acontecimento de proporções históricas. Um continente dilacerado por guerras e conflitos conseguiu virar uma nova página e afastar-se do nacionalismo beligerante. O Modelo Social Europeu deve ser visto neste contexto.

2.2.2

A Europa pode sentir-se justificadamente orgulhosa dos resultados sociais que alcançou graças às suas instituições e políticas, na multiplicidade de formas que estas assumem, a nível nacional e, em certa medida, também a nível europeu. Em indicadores fundamentais de bem-estar social, incluindo a pobreza e a desigualdade, a esperança de vida e a saúde, os países europeus ocupam os lugares cimeiros da classificação mundial.

2.2.3

Muitos países europeus lideram as classificações internacionais de produtividade e competitividade, embora se registem variações consideráveis entre os Estados-Membros da UE. É uma conquista significativa o facto de alguns Estados-Membros da UE se colocarem na vanguarda absoluta, a nível global, da competitividade e do investimento em investigação. A visão de uma sociedade de conhecimento intensivo, tendo a investigação e a aprendizagem ao longo da vida como componentes fundamentais, é um aspecto do modelo europeu que goza de apoio vigoroso.

2.2.4

Foi a Europa que conseguiu ir mais longe na aplicação do Protocolo de Quioto, ainda que os resultados globais continuem a ser decepcionantes. A Europa tornou-se também uma das regiões que lideram, a nível global, o investimento em tecnologias respeitadoras do ambiente e apostam no desenvolvimento de novas soluções energéticas para o aquecimento e os transportes.

2.2.5

Uma comparação dos indicadores de coesão e segurança sociais com as taxas de emprego/desemprego nos países da OCDE revela que os países que oferecem elevados níveis de segurança aos seus cidadãos e trabalhadores denotam uma tendência para apresentar taxas mais elevadas de emprego e menos desemprego, sendo os países nórdicos notáveis exemplos positivos neste contexto.

2.2.6

É cada vez mais evidente que o apoio político ao aumento da integração europeia está dependente da consciência de que esta ultrapassa a mera integração no mercado. À medida que são eliminadas as fronteiras económicas, os governos dos Estados-Membros e as Instituições europeias, com os parceiros sociais a nível nacional e europeu, estão a desenvolver mecanismos adequados para assegurar a coesão e a justiça sociais nas novas circunstâncias e, em particular, para evitar que a concorrência entre regimes conduza a uma corrida para o fundo no seio da Europa, que reduziria seriamente os padrões sociais.

2.2.7

O alargamento da UE contribuiu de modo muito positivo para a emergência de um Modelo Social Europeu. O alargamento veio enriquecer a UE com um grande grupo de países que possuem uma longa história de conquistas culturais, sociais, económicas e industriais. Estabeleceu solidamente a dimensão cultural do modelo social. A dimensão cultural será um dos mecanismos fulcrais para promover a coesão na UE.

2.2.8

O diálogo social, a todos os níveis, tornou-se uma expressão vital do Modelo Social Europeu. O diálogo social conduziu a um consenso muito ambicioso para a estratégia de Lisboa, e o modelo social será extremamente difícil de implementar sem a participação dos parceiros sociais. A modalidade europeia de participação dos trabalhadores garante que as constantes mutações estruturais das empresas são satisfatórias para todas as partes envolvidas.

2.2.9

Os parceiros sociais têm desempenhado um papel decisivo na execução das políticas da UE. Um papel que é único a nível mundial. Foi mesmo sugerido que os parceiros sociais, ao nível da UE, deviam assumir a responsabilidade por todo o trabalho de regulação nas questões relacionadas com a vida profissional.

2.2.9.1

No tocante à estrutura de base do modelo social europeu, não é possível avaliar adequadamente o papel fundamental dos parceiros sociais na política económica e social. Assim, o papel regulador das organizações sindicais e patronais é especialmente importante no quadro dos acordos colectivos e dos acordos salariais. O direito de participação dos representantes dos trabalhadores nas empresas, um direito sedimentdo, é um dos instrumentos fundamentais do modelo social europeu.

2.2.10

A participação dos cidadãos e das suas organizações é parte fundamental para dar forma ao Modelo Social Europeu. As organizações da sociedade civil dão voz às aspirações dos seus membros e são igualmente importantes fornecedores de serviços sociais. O futuro do Modelo Social Europeu e o seu dinamismo dependem de um maior envolvimento da sociedade civil organizada mediante um alargamento do diálogo civil e, assim, da democracia de participação.

2.2.11

Nas décadas recentes, a sociedade civil organizada atingiu um crescente papel proeminente em diálogos sobre questões de comunidade e sociais. A sociedade civil organizada oferece um canal vital democrático para comunicação, tanto à escala europeia como nacional. Assim, a sociedade civil organizada é igualmente parte fundamental do Modelo Social Europeu.

2.2.12

Serviços públicos de elevada qualidade são outra questão relevante para a identificação do modelo social. O panorama geral da situação na UE é que o sector público, como garante e/ou fornecedor de serviços fundamentais fornecidos equitativamente, goza de maior apoio na UE do que noutras regiões. Em áreas como o ensino e a formação, os cuidados de saúde e a assistência aos idosos, o sector público desempenha um papel decisivo em todos os Estados-Membros. A par disso, verifica-se um vigoroso debate sobre os papéis alternativos do sector público, como garante de serviços específicos, ou como garante e fornecedor.

2.2.13

Em estreita relação com o sector público está o desenvolvimento, em vários Estados-Membros da UE, de entidades da economia social. A economia social tem um duplo papel: permite gerir tarefas essenciais, em particular no sector da prestação de cuidados e, ao mesmo tempo, proporciona emprego a cidadãos que não conseguem integrar-se facilmente no mercado de trabalho normal, como acontece com as pessoas com deficiência. A economia social está em expansão praticamente em todos os Estados-Membros da UE, em parte por causa da evolução demográfica e da necessidade de prestação de cuidados aos idosos. A economia social desempenha um papel vital no combate à pobreza. A economia social apresenta muitas «faces» e tem uma rica variedade de modalidades organizacionais, não tendo necessariamente vocação para se tornar parte do sistema de concorrência.

2.3   Deficiências e desafios

2.3.1

Embora seja correcto salientar as conquistas do Modelo Social Europeu, seria errado não reconhecer as suas deficiências e os desafios que enfrenta num clima de mudança. O orgulho no modelo social não deve ser confundido com complacência.

2.3.2

Diz-se frequentemente que um modelo não pode ser considerado «social» se condenar uma décima ou décima-segunda parte da sua força de trabalho ao desemprego. Por um lado, a afirmação é correcta, pois o desemprego atingiu de facto um nível inaceitavelmente alto em grande parte da União Europeia, gerando dificuldades sociais e económicas, ameaçando a coesão social e desperdiçando recursos produtivos. Porém, a asserção tem implícita a ideia de que se optarmos por um modelo social, teremos de aceitar uma elevada taxa de desemprego, ou seja, de que este é o preço a pagar pela coesão social. O CESE rejeita esta abordagem. A Europa não tem de escolher entre coesão social e desemprego elevado.

2.3.3

O desemprego continua a ser a ameaça fundamental para o Modelo Social Europeu, aumentando os custos, reduzindo as oportunidades de financiamento e criando desigualdades e tensões sociais. Reduzir o desemprego continua a ser a principal prioridade. Isto aplica-se particularmente ao desemprego entre os jovens, que em muitos países é substancialmente mais elevado do que a taxa média de desemprego e que, dado o elevado risco de exclusão a longo prazo do mercado de trabalho e da sociedade em geral, é especialmente nocivo a nível social e económico. Para resolver este problema, é necessário um amplo pacote de medidas do lado da oferta, bem como uma política para a vertente da procura orientada para a optimização de resultados.

2.3.4

A desigualdade geográfica e a pobreza (que se calcula afectar 70 milhões de cidadãos) continuam a ser fenómenos acentuados em toda a União Europeia e o seu peso aumentou desde o alargamento. Até nos países europeus ricos há um número demasiado elevado de pessoas afectadas pela pobreza (relativa). A pobreza infantil é especialmente escandalosa, destruindo as oportunidades de vida e entrincheirando as desigualdades ao longo de gerações. Mesmo com as actuais grandes ambições, as políticas de coesão social nos Estados-Membros da UE não lograram travar a pobreza e o desemprego — uma tarefa de vulto, a que teremos de nos dedicar desde já.

2.3.5

É frequente considerar-se que os novos desafios exacerbam estas e outras deficiências da economia e da sociedade europeia, no nosso modelo social, através da globalização económica, da ascensão de novas tecnologias e do envelhecimento demográfico. O aumento da esperança de vida e a queda das taxas de natalidade suscitam graves problemas no financiamento dos sistemas de segurança social, sendo os regimes de pensões o exemplo mais claro desta situação. O CESE alerta para que não se tirem conclusões políticas simplistas de um conjunto de ideias correntes:

Embora a globalização implique, de facto, a negociação internacional de um número crescente de produtos e serviços, é importante estar ciente de que, se considerarmos a UE-25 como uma única entidade económica, apenas um pouco mais de 10 % da produção europeia é exportada (ou importada). A economia da União Europeia não é, pois, uma economia mais aberta do que a dos Estados Unidos (habitualmente considerada muito mais independente das forças da globalização). Os Estados-Membros devem fazer opções sociais e políticas relativamente aos seus sistemas de bem-estar social e às reformas necessárias. Um regime de benefícios concebido em moldes errados deve ser reformado, pela maior produtividade ou nível de emprego que isso permitirá obter ao proporcionar mais segurança aos beneficiários, e não por causa da «globalização».

De igual modo, a evolução tecnológica é um factor positivo, por aumentar a produtividade laboral e ajudar a criar a riqueza necessária ao financiamento de níveis de vida e de protecção social elevados. A resposta correcta a dar à evolução tecnológica é investir nos trabalhadores e apoiar os processos de adaptação através de políticas sociais bem concebidas, de forma a fazer progredir as empresas e os trabalhadores europeus na escala das competências.

A demografia influencia certamente o Modelo Social Europeu, mas o oposto também é verdadeiro. As políticas sensatas de cuidados infantis permitem que mulheres e homens trabalhem sem ter que optar entre carreira e família; e uma política de envelhecimento activo permite manter os trabalhadores mais idosos no mercado de trabalho, possibilitando-lhes, a eles e à sociedade em geral, tirar partido do aumento da esperança de vida. A aprendizagem ao longo da vida promove a adaptabilidade e aumenta a produtividade e o emprego. Além disso, todas as sociedades se vêem confrontadas com problemas demográficos.

Por último, é um facto geralmente reconhecido que a Europa necessita mais de desenvolver e coordenar do que de limitar políticas económicas europeias como instrumentos de contrapeso às distorções do mercado, como uma concorrência fiscal nociva. Tais distorções exercem pressão sobre os regimes sociais e as respectivas bases financeiras. Por outro lado, a integração europeia é também uma poderosa força dinamizadora do comércio e da eficiência económica, e sobretudo introduz a possibilidade de regular alguns aspectos da vida profissional e social à escala europeia, que é mais relevante. Atingir esta meta face à diversidade institucional é um grande desafio tanto para os responsáveis políticos como para os parceiros sociais.

2.4   Um modelo dinâmico

2.4.1

Para que o Modelo Social Europeu sobreviva e seja capaz de influenciar as políticas futuras, é necessário que ele seja dinâmico e esteja aberto ao debate e à introdução de reformas. A História dá-nos inúmeros exemplos de desafios a este modelo que não puderam ser previstos: a ameaça de catástrofes ambientais, transformações drásticas da demografia e da estrutura familiar, crises de aprovisionamento energético, a revolução do conhecimento, as novas e poderosas tecnologias de informação e comunicação e a evolução dos modelos de produção e de vida profissional.

2.4.2

Na perspectiva do futuro, o desafio fundamental que se coloca ao Modelo Social Europeu é o de identificar aspectos deste modelo que promovam soluções vantajosas dos dois pontos de vista, ou mesmo dos três pontos de vista. Por outras palavras, importa dar ênfase à identificação das políticas já existentes ou novas que promovam a coesão social e o desempenho económico, assim como o desenvolvimento sustentável.

2.4.3

Simultaneamente, são necessárias reformas firmes e ponderadas das instituições que estejam comprovadamente a ter efeitos negativos em termos económicos, sociais ou ambientais. As avaliações do impacto das políticas podem ser úteis, tendo como objectivo melhorar a regulamentação, em vez de introduzir apenas uma desregulamentação simplista.

2.4.4

Onde se situam os novos desafios do Modelo Social Europeu? Principalmente em três sectores: competitividade e emprego, inclusão social e luta contra a pobreza, e efeitos da globalização. Numa perspectiva de mais longo prazo, os desafios ambientais poderão resultar em grandes deslocalizações da produção e dos locais de trabalho. Devem-se acrescentar as questões de migração (interna ou externa) e as da igualdade de oportunidades entre homens e mulheres; ambas terão grande influência no futuro panorama do Modelo Social Europeu.

2.4.5

Será essencial desenvolver mais a sociedade baseada no conhecimento intensivo, tanto no sector da investigação como no da aprendizagem ao longo da vida. O conhecimento tornar-se-á, ainda mais do que hoje em dia, um factor crucial para alcançar a competitividade e criar, assim, recursos para as políticas sociais. Neste contexto, afigura-se importante continuar a apoiar a iniciativa empresarial e o crescimento das pequenas empresas. Os efeitos sociais da revolução do conhecimento são uma questão potencial que seria útil abordar no quadro do Diálogo Social. O desenvolvimento de novos sistemas eficazes de aprendizagem ao longo da vida será um desafio específico para os governos e para os parceiros sociais.

2.4.6

É bastante necessário investigar o estabelecimento de um novo equilíbrio entre a flexibidade e a segurança que promova o emprego e a inovação, como salientaram os parcerios sociais no seu recente programa de trabalho conjunto (3). Afigura-se especialmente importante que os parceiros sociais possam chegar a acordo sobre medidas para reduzir o desemprego entre os jovens. O desemprego é uma tragédia, e o desemprego das gerações mais jovens constitui uma ameaça ao próprio tecido da sociedade europeia democrática.

2.4.7

Na perspectiva dos desafios ambientais, serão necessários mais investimentos em transportes e habitação, bem como no planeamento e na reforma comunitários. A subida dos preços da energia terá efeitos importantes sobre a coesão social e as políticas estruturais. Trata-se de uma área fundamental, que promete soluções vantajosas dos três pontos de vista.

2.4.8

O sistema de governação macro-económica deve dar um melhor apoio aos Objectivos de Lisboa. Numa perspectiva de mais longo prazo, e após Lisboa, será de vital importância estabelecer um equilíbrio orientado para o crescimento entre as vertentes da oferta e da procura da política económica.

2.4.9

A globalização constitui um desafio, e não apenas em termos de comércio e de preços. A globalização é também uma oportunidade, por exemplo, para abrir novos mercados para as tecnologias respeitadoras do ambiente. A Europa deve investir muito mais em tecnologias modernas, sobretudo na esfera ambiental, uma vez que outros países como, por exemplo, os Estados Unidos, estão a reconhecer rapidamente estas oportunidades. A globalização não se resume apenas à resolução de problemas, antes exige uma actuação pró-activa e a identificação das oportunidades.

2.4.10

O mais grave dos eventuais desafios no futuro seria que a Europa voltasse à política de Estados-nações, acompanhada de proteccionismo e do fecho dos mercados. Isto teria efectivamente efeitos nocivos, tanto económicos como sociais.

2.4.11

Nenhum modelo social atingiu a sua fase definitiva, nem isso alguma vez acontecerá. O conceito de base subjacente a um modelo social é que este gera ideias e percepções à medida que avança. Um modelo social deve ser dinâmico, ou ficará petrificado — e perecerá. O modelo social deve ser testado e debatido num processo democrático contínuo. Devem ser feitas avaliações e desenvolvidos e refinados os instrumentos de governação adequados.

2.5   O Modelo Social Europeu é um modelo de referência global?

2.5.1

É possível ver o Modelo Social Europeu como uma tentativa para elaborar um projecto de construção de uma União Europeia de bem-estar social em moldes sustentáveis para o futuro, caracterizada por uma indústria altamente competitiva, ambições sociais muito elevadas e um alto nível de responsabilidade no domínio dos desafios ambientais. Descrito deste modo, e pondo-se a ênfase nas suas funções democráticas, o Modelo Social Europeu pode ser uma fonte de ideias e experiências para outros países ou grupos de países.

2.5.2

Pode o Modelo Social Europeu tornar-se uma referência global? Cada país e cada grupo de países deve desenvolver o seu próprio modelo social e as suas próprias aplicações. O que se revelou valioso na Europa não será necessariamente valioso para outro país e perante outro conjunto de desafios. Apesar disto, o Modelo Social Europeu pode, contudo, exercer um papel inspirador, inclusivamente porque tenta integrar as questões económicas, sociais e ambientais numa concepção de um espaço de bem-estar democrático, competitivo, baseado na solidariedade e capaz de assegurar a protecção do ambiente e a inclusão social, para todos os cidadãos da Europa. Serão os outros países a julgá-lo, pelo seu sucesso em alcançar estes objectivos.

2.5.3

Os parceiros da UE têm cada vez mais interesse na abordagem que combina, de modo reforçado, objectivos económicos, de emprego, sociais e ambientais. O modelo económico e social europeu na integração regional pode ser fonte de inspiração para as regiões e países parceiros. A abordagem dos três pilares mostrou o seu valor na UE.

2.5.4

No seu estudo sobre a dimensão social da globalização, a OIT referiu explicitamente o Modelo Social Europeu como possível fonte de inspiração para os países recentemente industrializados (4). A China, que atingiu agora um crescimento económico rápido e sustentado, mas está a tornar-se cada vez mais ciente das tensões sociais e da problemática ambiental, podia ser uma exemplo.

2.6   Apresentar as questões aos cidadãos da Europa

2.6.1

O Modelo Social Europeu irá persistir e sobreviver apenas enquanto for apoiado pelos cidadãos da União Europeia. Para que o modelo permaneça válido, deve ser objecto de debate e diálogo com os cidadãos. Estes constituiriam, para os cidadãos, uma oportunidade fundamental de participação no debate geral sobre o futuro da sociedade europeia.

2.6.2

No presente parecer, o CESE apresentou uma análise de base do Modelo Social Europeu. Esta análise deverá agora ser aprofundada. Há uma necessidade concreta de relações claras entre as ideias e a realidade. Assim, o modelo poderá ser a base de mais debates sobre o tipo de sociedade europeia que os cidadãos desejam. Seria possível, no quadro da nova estratégia de informação e comunicação da UE, usar o modelo social como base de diálogo.

2.6.3

Em última análise, é com base no debate, no diálogo e na consciencialização crescente que os cidadãos da Europa se irão empenhar na defesa do Modelo Social Europeu e no apoio ao seu posterior desenvolvimento.

2.7   O papel do CESE

2.7.1

Os membros do CESE são um canal importante para os círculos que representam. O CESE organiza regularmente fóruns com as partes interessadas num contexto alargado, para troca de pontos de vista.

2.7.2

O CESE irá ponderar a possibilidade de usar o Modelo Social Europeu como base para um mais amplo esforço de comunicação no seio da União Europeia. Deste modo, o CESE pode dar um contributo concreto para o debate sobre o que esperam da Europa e do modelo social europeu os povos europeus. Serão convidados para o debate os parceiros sociais, a sociedade civil organizada e os conselhos económicos e sociais nacionais.

Bruxelas, 6 de Julho de 2006.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Dr. Didier Fouarge (3 de Janeiro de 2003). Cost of non-social policy (Custos da política não-social: para um enquadramento económico das políticas sociais de qualidade — e os custos de não as ter)

(URL: http://www.lex.unict.it/eurolabor/documentazione/altridoc/costs030103.pdf).

(2)  O acervo social europeu compreende directivas relativas a questões como informação sobre condições individuais de trabalho (91/533/CEE), mulheres grávidas (92/85/CEE), licença parental (96/34/CE), tempo de trabalho (2003/88/CE), jovens no trabalho (94/33/CE) e trabalho a tempo parcial (97/81/CE).

(3)  «Programa de trabalho dos Parceiros Sociais Europeus 2006-2008». Ver igualmente o parecer do CESE de 17 de Maio de 2006 sobre «Flexissegurança — o caso da Dinamarca» (relatora: VIUM) (ainda não publicado no J. O.).

(4)  URL: http://www.ilo.org/public/english/wcsdg/globali/synthesis.pdf.


16.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 309/126


Parecer do Comité Económico e Social sobre o «Papel das organizações da sociedade civil na aplicação da política comunitária de coesão e desenvolvimento regional»

(2006/C 309/26)

Em 13 e 14 de Julho de 2005, o Comité Económico e Social Europeu decidiu, nos termos do n.o 2 do artigo 29.o do Regimento, elaborar um parecer sobre o «Papel das organizações da sociedade civil na aplicação da política comunitária de coesão e desenvolvimento regional».

A Secção Especializada da União Económica e Monetária e Coesão Económica e Social, incumbida da preparação dos trabalhos correspondentes, emitiu parecer em 7 de Junho de 2006, tendo sido relatora Marzena MENDZA-DROZD.

Na 428.a reunião plenária de 5 e 6 de Julho de 2006 (sessão de 6 de Julho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 47 votos a favor, 36 contra e 6 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Introdução

1.1

Desde há muito que a política de coesão suscita vivo interesse no Comité Económico e Social Europeu, o qual se pronunciou por diversas vezes sobre este tema abordando as regras dos fundos estruturais (1) e do Fundo de Coesão, bem como um dos princípios fundamentais da sua execução — o princípio da parceria.

1.2

O interesse do Comité pelo princípio da parceria resultou sempre da convicção, aliás partilhada pela Comissão Europeia, de que «a eficácia da política de coesão depende, em grande medida, de uma implicação forte dos agentes económicos e sociais e das outras organizações da sociedade civil. (...)» (2).

1.3

O CESE é, no entanto, de opinião que em matéria de integração real das organizações da sociedade civil na aplicação da política de coesão ainda resta muito por fazer. O Comité gostaria de contribuir, através do presente parecer, para uma melhor realização do princípio da parceria no período que se avizinha e espera que a Comissão e o Conselho possam ainda vir a apresentar as modificações necessárias e a tomar medidas concretas para assegurar a participação das organizações da sociedade civil no processo de execução da política de coesão. O Comité espera igualmente que, tendo em conta os trabalhos sobre os documentos de programação dos Estados-Membros, o presente parecer possa ser um instrumento útil para as organizações da sociedade civil nas suas relações com o poder nacional e regional.

2.   Organizações da sociedade civil

2.1

O Comité preconizaria uma acepção mais ampla do conceito de sociedade civil englobando o «conjunto de todas as estruturas organizativas cujos membros perseguem o interesse geral» (3) e que respondem a critérios de representatividade sobre os quais já se pronunciou em pareceres anteriores (4). Este ponto de vista implica integrar neste conceito, antes do mais, as seguintes organizações da sociedade civil:

os parceiros sociais — sindicatos e federações de empregadores,

as organizações não governamentais, cujos estatutos oficiais e legais definem o objecto da sua acção e da sua missão: associações, organizações socioprofissionais, federações, fóruns, redes, fundações (em muitos Estados-Membros estas diferem das associações unicamente devido à base jurídica com que foram criadas); estes diferentes tipos de organizações são igualmente definidos como «organizações sem fins lucrativos» ou «terceiro sector», e as suas actividades abrangem domínios como a protecção do ambiente, a defesa dos direitos dos consumidores, o desenvolvimento local, os direitos humanos, a assistência social, a luta contra a exclusão social, a promoção do espírito empresarial, a economia social e muitos outros.

2.2

O Comité está ciente de que a adopção de uma noção tão lata de sociedade civil pode gerar dificuldades no que toca ao seu carácter operacional no nível prático, nomeadamente quando se aborda a problemática da coesão. Considera que, com uma definição clara da representatividade, as organizações da sociedade civil disporiam actualmente de uma maior legitimidade para participar nas diferentes etapas do processo de aplicação da política de coesão. No seu parecer sobre a representatividade das organizações europeias da sociedade civil, o Comité apresentou alguns critérios fundamentais, convidando os restantes actores a explorar os resultados dos seus trabalhos (5), em particular no que toca à programação e ao acompanhamento no nível comunitário. Contudo, considera que, com base nas suas propostas, designadamente no que tem a ver com a participação na programação e no acompanhamento, é também possível elaborar uma lista pertinente de critérios para o nível do Estado-Membro ou regional, que incluiria critérios como:

ter acesso ao conhecimento especializado dos seus membros,

desenvolver uma acção de utilidade pública e de interesse geral,

possuir um número de associados suficiente para garantir eficácia e perícia à sua acção, bem como a prática da democracia (eleição dos responsáveis, debates e informação interna, transparência na tomada de decisões, transparência financeira, etc.),

gozar de independência financeira bastante para viabilizar uma autonomia de acção,

possuir e dar provas de independência em relação a interesses e pressão externos,

garantir a sua transparência, nomeadamente no que toca a finanças e processos de decisão internos.

2.3

Esta questão da representatividade é fundamental. Deveria, porém, também ter em consideração os critérios qualitativos definidos no parecer do CESE supramencionado. Deveria ainda estabelecer uma distinção nítida entre participação e consulta no atinente à elaboração das políticas e à elegibilidade dos projectos financiados pelo fundo de coesão. Todas as organizações que podem contribuir para os objectivos de determinada política deveriam ser elegíveis para financiamento.

2.4

Com vista a uma aplicação eficaz da política de coesão, o Comité considera que há que envidar todos os esforços possíveis para se poder utilizar melhor o potencial das organizações da sociedade civil interessadas que podem dispor a maior parte das vezes, consoante o seu objecto, de qualidades únicas importantes para o processo de realização da política de coesão, nomeadamente:

experiência e competência no âmbito das esferas económica e social,

bom conhecimento das necessidades regionais e locais,

contacto directo com os cidadãos e os seus membros e, por conseguinte, possibilidade de se expressarem em nome destes,

contacto directo com os grupos-alvo e conhecimento das suas necessidades,

capacidade de mobilizar as sociedades locais e voluntários,

maior eficácia e disponibilidade para aplicar métodos de funcionamento inovadores,

possibilidade de exercer um controlo sobre as actividades da administração pública,

bons contactos com os meios de comunicação.

2.5

Ademais, na opinião do Comité, em geral, a participação das organizações da sociedade civil, que têm a confiança da sociedade, representa o ponto de contacto mais próximo dos cidadãos com a UE e poderá, igualmente, contribuir para aumentar a transparência do processo de utilização dos fundos disponíveis. O seu envolvimento poderá levar a que as decisões ganhem em transparência e que sejam tomadas apenas com base em critérios substantivos. A participação destas organizações pode também contribuir para que as actividades realizadas respondam objectivamente às necessidades sociais. Por último, as organizações da sociedade civil poderão ser parceiros importantes no debate sobre o tema do futuro dos domínios de acção das políticas europeias, incluindo a política de coesão, graças à transferência deste debate para o nível local, mais próximo dos cidadãos.

2.6

O Comité chama, igualmente, a atenção para o potencial das organizações da sociedade civil, em função da sua especificidade e do seu objecto estatutário, em domínios concretos como:

o mercado de trabalho, o emprego e a actividade empresarial — em que podem contribuir para uma melhor definição das prioridades e das medidas com impacto no desenvolvimento da economia,

as mutações económicas — cujas competências podem ajudar a combater os efeitos negativos, involuntários ou insuficientemente previstos,

a protecção do ambiente — em que podem dar garantias para a definição de objectivos estratégicos, de prioridades e de critérios de selecção dos projectos que respeitem o princípio do desenvolvimento sustentável,

a exclusão social e a igualdade entre homens e mulheres — em que o seu conhecimento prático pode assegurar uma execução da política de coesão que respeite o princípio da igualdade de oportunidades e requisitos legais neste domínio e que tenha em conta a esfera social das soluções propostas,

o desenvolvimento local — em que o seu conhecimento dos problemas e das necessidades constitui o primeiro passo para a sua resolução,

a cooperação transfronteiriça — em que podem ser excelentes parceiros para a realização de projectos,

o acompanhamento da utilização dos fundos públicos, incluindo a identificação e a exposição de casos de corrupção.

3.   Papel das organizações da sociedade civil no processo de aplicação da política de coesão

3.1

O Comité concorda com a proposta da Comissão Europeia e do Conselho de que a aplicação do princípio da parceria tem de ocorrer em todas as fases de aplicação da política de coesão, começando na programação, passando pela execução e terminando na avaliação do seu impacto. O Comité realça também que a participação das organizações da sociedade civil pode assegurar uma melhor qualidade de execução, assim como a obtenção dos resultados esperados. Segundo o Comité, o envolvimento das organizações da sociedade civil tem de ser assegurado quando se trata de:

programação no nível comunitário,

programação no nível nacional (elaboração dos quadros de referência estratégicos nacionais e dos programas operacionais),

divulgação dos fundos estruturais e informação sobre as possibilidades de se beneficiar dos seus recursos,

aplicação dos fundos estruturais,

acompanhamento e avaliação da utilização dos recursos.

3.2

Por fim, o Comité chama a atenção para o facto de que durante o processo de aplicação da política de coesão, as organizações da sociedade civil podem desempenhar uma tripla função: em primeiro lugar de aconselhamento no âmbito da definição de objectivos e prioridades, em seguida, de controlo das actividades realizadas pela administração pública, e, por último, executiva enquanto executor e parceiro de projectos co-financiados pelos fundos estruturais.

3.3

O Comité gostaria de recordar o seu parecer sobre as disposições gerais dos fundos estruturais (6) em que via de forma crítica a forma como foi tratado o princípio da parceria, apesar de ter apreciado o facto de na proposta da Comissão (7) se referir pela primeira vez a sociedade civil e as organizações não governamentais. No entanto, o Comité viu com preocupação o facto de durante os trabalhos legislativos no Conselho ter sido abandonada e se ter restringido a formulação a apenas «Qualquer outro organismo adequado». Fica, no entanto, mais satisfeito por constatar que a última versão dos documentos em questão, de Abril de 2006, introduziu novamente a letra que inclui, no princípio da parceria, entre os referidos parceiros os actores representantes da sociedade civil, as partes interessadas envolvidas na protecção do meio ambiente, as organizações não governamentais e os intervenientes incumbidos da defesa do princípio de igualdade entre homens e mulheres. O Comité gostaria de acreditar que os comentários que teceu até à data contribuíram para estas alterações.

4.   Programação no nível comunitário

4.1

Estando ciente de que a programação no nível comunitário é o primeiro passo da execução dos fundos estruturais, o Comité realça a importância de todas as consultas realizadas precisamente neste nível. As consultas realizadas recentemente pela Comissão sobre as orientações estratégicas para 2007-2013 confirmam o interesse das organizações da sociedade civil por estas questões (8). O Comité, que envidou esforços no sentido de incluir outras organizações da sociedade civil nos seus trabalhos, considera que há que aproveitar o mais possível este interesse activo no âmbito do processo de elaboração de documentos estratégicos.

4.2

O Comité entende, igualmente, que a participação activa das organizações da sociedade civil poderia ser de grande valor para todos os órgãos consultivos que operam a nível europeu. O Comité está consciente de que é precisamente a este nível que surge de forma clara a questão da representatividade e da necessidade de definir critérios adequados. Em particular, os critérios recentemente definidos pelo Comité a propósito das organizações não governamentais europeias encontram aqui matéria de aplicação perfeita (9).

5.   Programação dos fundos estruturais no nível nacional

5.1

Embora as simplificações previstas pela Comissão Europeia possam levar a uma maior transparência da política de coesão, o CESE chama novamente a atenção para os riscos subjacentes a estas propostas. O seu grande receio é que as organizações da sociedade civil sejam negligenciadas pelas autoridades nacionais e regionais, as quais nem sempre estão abertas à inclusão daquelas no processo de utilização dos fundos estruturais e do Fundo de Coesão (como se confirma pelo relatório preparado por grupos ambientais (10) e pela Confederação Europeia dos Sindicatos (11)), o que terá por consequência uma limitação dos controlos sociais quanto ao modo como são gastos os fundos.

5.2

A experiência com a elaboração de documentos de programação fundamentais para o período de 2004-2006, descrita no relatório preparado por Brian Harvey (12) para o European Citizen Action Service, apesar de contemplar apenas as organizações não governamentais nos novos Estados-Membros, não dá azo, infelizmente, a grande optimismo. Alterações frequentes das datas de consulta, alterações extensas aos documentos de programação findas as consultas (ex. previsões de impacto ambiental), atrasos no início do processo de consulta e, em consequência, prazos curtos para apresentação de observações, são apenas alguns dos defeitos apontados pelos representantes da sociedade civil ao processo. Nos casos em que a elaboração dos documentos foi atribuída a agências de consultoria, que não tinham quaisquer contactos com as organizações da sociedade civil, a situação era ainda pior.

5.3

Esta maneira de proceder leva não só a uma redução do interesse no processo de consulta, mas também, o que é mais pernicioso, ao desperdício de oportunidades para introduzir alterações importantes nos documentos de programação. Neste contexto, o Comité gostaria de realçar claramente que um processo de consulta bem executado deve assegurar não só o acesso de todas as organizações aos documentos em apreço, mas também um prazo adequado para apresentação de observações (não perturbando o calendário dos trabalhos, mas suficiente para a familiarização com os documentos).

5.4

As experiências positivas — como por exemplo o modo como se desenrolaram as consultas na Polónia sobre o Plano Nacional de Desenvolvimento em 2005, em que as autoridades nacionais adoptaram regras pormenorizadas para a realização das consultas, documentaram o seu desenrolar, mantiveram um registo das observações apresentadas, justificando a sua aceitação ou rejeição — constituem um exemplo de boas práticas e uma prova de que todo o processo pode decorrer de forma diligente e eficaz.

5.5

Segundo informação de vários países, as organizações da sociedade civil não participam normalmente nos trabalhos dos grupos de trabalho responsáveis pela preparação dos documentos de programação, o que limita grandemente as suas possibilidades de formular observações logo desde o início do processo.

5.6

Assim, o Comité é de opinião que a definição pela Comissão de requisitos mínimos (ou, pelo menos, de orientações) a cumprir pelos Estados-Membros para a realização das consultas e a obrigação de apresentar informação sobre o desenrolar do processo, pode ter um efeito positivo para alterar esta situação. Ao actuar desta forma, a Comissão pode também contribuir para reduzir um pouco o risco de virem a ocorrer situações como num dos Estados-Membros em que um bom plano para a inclusão das organizações da sociedade civil na preparação do Plano Nacional de Desenvolvimento nunca passou de um mero pedaço de papel.

6.   Divulgação dos fundos estruturais

6.1

O Comité considera que apesar de nos últimos anos ter havido algumas melhorias no acesso à informação sobre os fundos estruturais, por exemplo no que concerne a sua publicação nos sítios web oficiais, há que realçar que apenas alguns países utilizam outras meios de divulgação e informação, como a imprensa, a televisão, seminários e conferências, dirigidos a grupos-alvo específicos. Esta situação parece poder ser consideravelmente melhorada caso se recorra às oportunidades oferecidas pelas organizações da sociedade civil neste contexto.

6.2

Para o Comité, a divulgação dos fundos estruturais no nível regional não é, lamentavelmente, melhor. Os planos de divulgação e informação são elaborados sem a realização de consultas ou com a única preocupação da autopromoção, não obstante o facto de a integração neste processo das organizações da sociedade civil e de o recurso aos seus conhecimentos sobre os diferentes meios e problemas poderem contribuir para a elaboração de estratégias promocionais e informativas mais realistas.

6.3

Tendo em conta que os fundos estruturais são atribuídos a objectivos sociais e económicos específicos e que os recursos financeiros para a divulgação e informação são apenas um meio que contribui para a realização daqueles, há que abordar com particular precaução a questão da eficácia das actividades de divulgação e informação.

6.4

É naturalmente difícil indicar de forma absoluta qual o mecanismo em matéria de utilização dos meios de divulgação e informação mais eficaz para chegar aos destinatários. É possível encontrar bons exemplos de actividades de divulgação e informação tanto realizadas independentemente por instituições de aplicação, como solicitadas a agências de publicidade ou empresas de relações públicas. Contudo, podem-se também citar exemplos em que nenhuma destas opções é eficaz para chegar aos beneficiários interessados, ou em que o produto proposto não se adequa às necessidades dos destinatários.

6.5

Consequentemente, isto leva, com frequência, a situações absurdas em que a falta de acesso aos fundos atribuídos para divulgação leva as organizações da sociedade civil a realizar as suas próprias iniciativas de informação, recorrendo, para tal, aos seus próprios meios para conseguir os recursos financeiros necessários.

6.6

Afigura-se, assim, que o facto de se assegurar o acesso das organizações da sociedade civil, capazes de realizar actividades de informação bem adaptadas às necessidades dos destinatários e dispostas a realizar determinadas actividades frequentemente com um orçamento inferior, aos recursos para divulgação e informação é uma das condições para a sua eficaz utilização.

6.7

O Comité está consciente de que a divulgação dos fundos estruturais e do Fundo de Coesão não é uma questão que se possa resumir apenas a saber quem é por ela responsável e quem a aplica. São, igualmente, essenciais os objectivos que estão por trás da utilização dos fundos estruturais e os problemas para cuja resolução devem contribuir. O Comité considera que esta questão exige, sem dúvida, uma abordagem ampla e um debate público prévios ao processo de utilização dos fundos estruturais e do Fundo de Coesão.

7.   Execução dos fundos estruturais

7.1

Em pareceres precedentes, o CESE já chamou a atenção para a importância de subvenções globais. Neste contexto, realça que vê com preocupação o facto de o sistema de subvenções globais ter sido adoptado apenas num dos dez novos Estados-Membros, a República Checa, e mesmo neste país a importância deste mecanismo foi limitada devido à introdução pela administração pública de uma série de obstáculos formais. Receando uma repetição desta situação no próximo período de programação, o Comité recorda que as experiências dos países que beneficiaram deste mecanismo são muito positivas, em particular quando se tratou de chegar aos grupos especialmente desfavorecidos, por exemplo, os desempregados de longa duração.

7.2

Outra questão, já anteriormente referida pelo Comité, diz respeito ao acesso à assistência técnica para as organizações da sociedade civil. O Reino Unido é o exemplo de um país em que o orçamento atribuído à assistência técnica (incluindo o Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional) foi aproveitado, em larga escala, para envolver aquele tipo de organizações no processo de execução dos fundos estruturais. Esta assistência técnica foi utilizada para financiar, por exemplo, acções de organizações de cúpula que asseguram serviços de aconselhamento e de formação às organizações não governamentais, as quais podem desta forma realizar programas e projectos com recursos dos fundos estruturais. Esta não é, porém, uma situação usual. O Comité considera que se esta prática não existe, conviria reconhecer claramente que as organizações da sociedade civil estão habilitadas a candidatarem-se aos recursos de assistência técnica (13).

7.3

O Comité chama igualmente a atenção para o facto de que a exigência de co-financiamento dos projectos com fundos públicos pode colocar as organizações da sociedade civil numa situação de desvantagem. De facto, isto leva a uma restrição no acesso aos recursos dos fundos estruturais, o que limita, em consequência, as possibilidades de realização de projectos. O Comité gostaria de afirmar com toda a clareza que, na sua opinião, os fundos próprios — privados — das organizações da sociedade civil devem poder ser parte do co-financiamento (a nível nacional) dos projectos dos fundos estruturais. O Comité apela à extensão desta disposição com vista a abranger igualmente as organizações não governamentais que, muitas vezes, assumem o papel de executantes de projectos financiados pelos fundos estruturais.

7.4

O Comité salienta também que é necessário garantir a referência explícita às organizações da sociedade civil nos programas operacionais, enquanto beneficiários finais, o que infelizmente não é normalmente o caso. No entanto, a experiência de alguns países, como a Espanha, em que estas organizações conseguem beneficiar dos recursos disponíveis são testemunho da sua enorme eficácia, nomeadamente, nos domínios do combate à exclusão social, do desenvolvimento do turismo e do desenvolvimento local. O Comité entende que, no contexto da realização dos objectivos da Estratégia de Lisboa e das Orientações Estratégicas para 2007-2013, é igualmente de extrema importância garantir às organizações da sociedade civil possibilidades de realização de projectos financiados com fundos estruturais.

7.5

O Comité está ciente do facto de que, no final, o elemento-chave para a aplicação da política de coesão está no tipo de projectos reconhecidos como elegíveis. São, na verdade, estes que acabam por contribuir, ou não, para assegurar uma maior coesão económica e social. A posição do Comité é que as instâncias responsáveis pelo processo de selecção dos projectos podem tirar partido das competências das organizações da sociedade civil e do seu perfeito conhecimento das necessidades locais e regionais, prestando particular atenção ao conflito de interesses que pode surgir nesta situação.

8.   Acompanhamento e avaliação da utilização dos recursos

8.1

O CESE está profundamente convicto de que o acompanhamento e a avaliação são elementos extremamente importantes do processo de execução dos fundos estruturais, que garantem não só uma gestão eficaz dos recursos, como também a concretização dos objectivos e resultados esperados da política de coesão. Neste contexto, há que envidar todos os esforços possíveis para que, nos países onde esta prática ainda não é generalizada, a avaliação das organizações da sociedade civil em matéria do processo de execução e de alcance dos efeitos pretendidos possa ser feita e tida em conta durante a tomada de decisões. Para tal, é necessária a presença de representantes das organizações da sociedade civil nos comités de acompanhamento da execução dos Quadros de Referência Estratégicos Nacionais e dos diferentes programas operacionais.

8.2

No seu parecer de 2003 sobre o princípio da parceria (14), o CESE já chamara a atenção para o facto de que a informação sobre a composição dos comités de acompanhamento variava significativamente de país para país. Apesar de não ser intenção do Comité uniformizar as abordagens utilizadas, gostaria, no entanto, de ter a certeza que todos os Estados-Membros aplicam determinados critérios mínimos.

8.3

Nos novos Estados-Membros, a Polónia e a República Checa, por exemplo, conseguiram assegurar a participação das organizações da sociedade civil em praticamente todos os comités de acompanhamento. Quanto às organizações não governamentais, foram as próprias que propuseram o processo de recrutamento, que envolveu um convite à apresentação de candidaturas com qualificações adequadas, uma votação pela Internet e a selecção dos candidatos que haviam recolhido o maior número de votos. O CESE sabe que o mesmo não se passa em todos os Estados-Membros. Ademais, mesmo estas experiências positivas (não raras vezes resultado de acções de protesto) não garantem resultados idênticos nos próximos períodos de programação. O âmbito e a qualidade do envolvimento dos representantes da sociedade civil depende, portanto, actualmente, em grande medida, da boa vontade dos diferentes governos e não da necessidade de respeitar regras claramente definidas. O Comité considera que, futuramente, o facto de o poder nacional e regional ter em conta o papel das organizações da sociedade civil dependerá, por um lado, da obrigação de respeitar disposições concretas (ou orientações) e, por outro, da capacidade das próprias organizações da sociedade civil (sobretudo não governamentais) se organizarem e designarem os seus representantes. O CESE realça que o lugar dos actores da sociedade civil e o respeito que o seu papel deverá merecer das autoridades estatais só poderão ser granjeados com uma representatividade incontestável, que lhes confira legitimidade e, consequentemente, os torne elegíveis a título dos programas dos fundos estruturais correspondentes à sua actividade.

8.4

O CESE considera, igualmente, que haveria que envidar todos os esforços possíveis para aumentar a eficácia dos comités de acompanhamento, para que não sejam meros órgãos formais nem — como acontece em muitos casos — locais onde se vai apresentar de decisões já tomadas pela administração pública. Seria útil assegurar que estes comités sejam verdadeiros fóruns de debate onde se tenta encontrar as soluções mais eficazes. Segundo o Comité, um dos métodos para o conseguir seria envolvendo as organizações da sociedade civil que teriam a oportunidade de introduzir um novo ponto de vista nesses debates.

8.5

O Comité salienta que entre os problemas mais frequentemente referidos relacionados com a participação no acompanhamento dos fundos estruturais estão: o limitado acesso aos documentos, a falta de recursos financeiros indispensáveis ao cumprimento dessas funções e um sistema pouco transparente de selecção dos representantes das organizações da sociedade civil. Para o Comité, este tipo de observações são um sinal muito importante de que se devem envidar esforços para alterar a situação no próximo período de programação. Considera que os conselhos económicos e sociais nacionais e/ou regionais poderiam exercer uma função de aconselhamento às organizações da sociedade civil que o solicitassem

8.6

O CESE considera, igualmente, que os representantes das organizações da sociedade civil nos comités de acompanhamento devem beneficiar de formação e reembolsos pelas despesas incorridas (ex. com viagens), por forma a assegurar que cumprem de forma eficaz a sua função.

9.   Reivindicações do Comité

9.1

O Comité já por diversas vezes emitiu pareceres sobre as políticas de coesão e dos fundos estruturais, tendo chamado a atenção para o papel crucial das organizações da sociedade civil. Muitas outras instituições também se pronunciaram sobre esta matéria. Tendo presente a afirmação constante do Terceiro relatório sobre a coesão social «Para promover uma melhor governança, os parceiros sociais e os representantes da sociedade civil deverão ficar cada vez mais envolvidos, através dos mecanismos adequados, na concepção, implementação e acompanhamento das intervenções», o Comité espera que as regras que serão finalmente adoptadas, assim como o próximo período de programação, traduzam esta posição. O CESE espera, igualmente, que a Comissão Europeia elabore determinadas orientações para os Estados Membros com base nas observações do presente parecer.

9.2

O Comité considera que seria extremamente útil fazer uma compilação das soluções encontradas actualmente pelos Estados-Membros que melhor asseguram a execução do princípio da parceria. O CESE está, igualmente, a ponderar a possibilidade de criar um Observatório da Parceria no âmbito das suas estruturas.

9.3

O Comité está, contudo, consciente de que a observância das suas recomendações e reivindicações depende largamente dos Estados-Membros. Por esta razão, reitera o seu apelo às autoridades públicas nacionais e regionais para que assegurem uma maior participação das organizações da sociedade civil no processo de aplicação da política de coesão, independentemente da forma que as regras finalmente adoptadas assumam.

10.   Considerando o que precede, o Comité formula as seguintes recomendações à Comissão e ao Conselho e apela aos Estados-Membros (autoridades nacionais e regionais), bem como às organizações da sociedade civil:

10.1   Programação no nível comunitário

O Comité, que tem há muito tempo a seu cargo uma missão consultiva junto da Comissão Europeia, do Parlamento Europeu e do Conselho, gostaria de sublinhar que se esforça por associar outras organizações ao seu trabalho, para que os seus pareceres considerem da forma mais lata possível as observações e posições dos representantes da sociedade civil.

No parecer sobre a representatividade das organizações europeias da sociedade civil, o Comité apresentou alguns critérios fundamentais e lançou um convite para que se tire partido dos resultados dos trabalhos (15). Uma representatividade claramente definida pode dar às organizações da sociedade civil mais legitimidade para participarem nas diferentes etapas do processo de execução da política de coesão.

O Comité propõe completar as orientações estratégicas para o período de 2007-2013 com a definição de um quadro para a integração das organizações da sociedade civil.

O Comité espera que na disposição prevista pelos regulamentos gerais (na versão de Abril de 2006) sobre as consultas no nível comunitário, o direito de participação de outras organizações europeias representativas seja garantido.

O Comité solicita à Comissão e ao Conselho que mencionem explicitamente nas regras referentes à cooperação transfronteiriça que as organizações da sociedade civil também podem ser parceiros das operações realizadas.

O Comité insta com a Comissão para que promova e respeite critérios mínimos de consulta sobre a política de coesão e que recorra com maior frequência aos meios electrónicos.

10.2   Programação no nível nacional

O Comité recomenda à Comissão que estabeleça orientações para o processo de consulta sobre os documentos estratégicos e de programação elaborados pelos Estados-Membros. Na opinião do Comité, importa, neste contexto, não só apresentar planos de consulta social, mas sobretudo dar um feedback sobre a sua aplicação.

O Comité insta com os Estados-Membros e com as suas autoridades nacionais e regionais responsáveis pela preparação dos documentos de programação a que assumam a obrigação de realizar de forma adequada o processo de consulta, tendo em conta factores como um prazo adequado para apresentação de observações pelas organizações da sociedade civil interessadas, acessibilidade dos documentos de programação, documentação do processo de consulta e registo das observações apresentadas.

O Comité convida as organizações da sociedade civil a participarem de forma activa, nomeadamente nos processos de consulta.

O Comité incita os Estados-Membros e os respectivos órgãos de poder local e regional incumbidos da preparação dos documentos de programação a prestarem atenção aos avisos e comentários das organizações da sociedade civil, considerando-os nos documentos elaborados.

10.3   Divulgação dos fundos estruturais

O Comité entende que os Estados-Membros e as autoridades regionais devem aproveitar em maior grau o potencial das organizações da sociedade civil, envolvendo-as na elaboração dos planos de divulgação, bem como apoiar as iniciativas provenientes dos níveis mais próximos dos cidadãos, recorrendo para tal a recursos financeiros adequados disponíveis para divulgação e informação sobre os fundos estruturais.

O Comité apela às organizações da sociedade civil que operam no nível nacional ou regional a envolverem-se de forma activa na informação aos seus círculos sobre os objectivos da política de coesão e as oportunidades decorrentes dos fundos estruturais.

10.4   Execução dos fundos estruturais

O Comité considera que se devem envidar esforços para incentivar os Estados-Membros a utilizarem o mecanismo das subvenções globais, sendo a Comissão Europeia um dos órgãos mais adequados para realizar esses esforços, mas também as organizações da sociedade civil que operam nos diferentes países.

O Comité apela aos Estados-Membros, e em particular àqueles que, à data, ainda não optaram pela introdução do mecanismo das subvenções globais, que beneficiem das experiências positivas dos outros países e apliquem o mecanismo no período 2007-2013.

O Comité considera que convém envidar todos os esforços possíveis para que as organizações da sociedade civil, elegíveis nos termos do ponto 2.2 do presente parecer, tenham acesso ao meios financeiros a título de assistência técnica.

Tendo em conta o papel positivo que as organizações da sociedade civil, elegíveis nos termos do ponto 2.2 do presente parecer, podem desempenhar, o Comité apela às autoridades nacionais e regionais dos Estados-Membros que simplifiquem os procedimentos do processo de aplicação dos fundos para assistência técnica.

O Comité apela, igualmente, aos Estados-Membros para que tenham em conta durante a elaboração dos orçamentos os fundos próprios das organizações da sociedade civil, elegíveis nos termos do ponto 2.2 do presente parecer, enquanto elemento do co-financiamento dos projectos, quer se trate de parceiros sociais ou de organizações não governamentais.

O Comité apela, igualmente, aos Estados-Membros para que definam explicitamente nos programas operacionais as organizações da sociedade civil, elegíveis nos termos do ponto 2.2 do presente parecer, como beneficiários finais. Paralelamente, o Comité insta com a Comissão para que vele por que os documentos apresentados pelos Estados-Membros garantam às organizações da sociedade civil o acesso aos fundos estruturais.

O Comité apela aos Estados-Membros para que tirem partido dos conhecimentos e da experiência das organizações da sociedade civil, elegíveis nos termos do ponto 2.2 do presente parecer, durante a selecção dos projectos, sublinhando a necessidade de um esforço no sentido de evitar o conflito de interesses que possa surgir.

O Comité chama a atenção para a necessidade de se eliminar ou reduzir alguns obstáculos formais e técnicos que dificultam a utilização dos fundos estruturais pelas organizações da sociedade civil, elegíveis nos termos do ponto 2.2 do presente parecer.

10.5   Acompanhamento e avaliação da utilização dos recursos

O Comité entende que a Comissão deve apresentar orientações para o envolvimento das organizações da sociedade civil no processo de acompanhamento e avaliação, incluindo-as, em particular, de pleno direito na composição dos comités de acompanhamento, zelando pela indispensável preservação da objectividade e imparcialidade dos indivíduos e organizações participantes.

O Comité espera que os relatórios apresentados pelos Estados-Membros contenham informação sobre o modo como é aplicado o princípio da parceria no âmbito dos comités de acompanhamento.

O Comité insta com os Estados-Membros para que assegurem aos representantes das organizações da sociedade civil o acesso a formação, por forma a cumprirem de forma eficaz o seu papel de membros dos comités de acompanhamento.

O Comité insta com as organizações da sociedade civil para que estabeleçam contactos permanentes com os seus representantes nos comités de acompanhamento e que assegurem um intercâmbio de informações mútuo.

Bruxelas, 6 de Julho de 2006.

A Presidente

do Comité Económico e Social

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Pareceres preparados recentemente: pareceres sobre as propostas de regulamentos do Parlamento Europeu e do Conselho relativos: à criação de um Agrupamento Europeu de Cooperação Transfronteiriça (AECT) ( JO C 255 de 14.10.2005, p. 76), às disposições gerais dos Fundos ( JO C 255 de 14.10.2005, p. 79), ao Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional ( JO C 255 de 14.10.2005, p. 91), ao Fundo Social Europeu (JO C 234 de 22.09.2005 p. 27) e à parceria para a execução dos Fundos Estruturais (JO C 10 de 14.01.2004 p. 21); parecer sobre o Terceiro Relatório sobre a Coesão (JO C 302 de 07.12.2004, p. 60) e ainda o parecer sobre as orientações estratégicas comunitárias para a política de coesão (2007-2013).

(2)  Parecer sobre a «Proposta de regulamento do Conselho que estabelece disposições gerais sobre o Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional, o Fundo Social Europeu e o Fundo de Coesão»JO C 255 de 14.10.2005, p. 79.

(3)  Parecer sobre a «Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões: Diálogo entre as sociedades civis da União Europeia e dos países candidatos», JO C 28 de 03.02.2006, p. 97.

(4)  Parecer sobre «A representatividade das organizações europeias da sociedade civil no quadro do diálogo civil», JO C 88 de 11.04.2006, p. 41

(5)  Para ser considerada representativa, uma organização europeia deverá cumprir nove critérios:

ter uma estrutura sustentável a nível europeu;

ter acesso directo ao conhecimento especializado dos seus membros;

representar interesses gerais, de acordo com os interesses da sociedade europeia;

ser composta de organizações que, a nível dos seus respectivos Estados-Membros, são consideradas representativas dos interesses concretos que defendem;

reunir organizações oriundas de uma grande maioria dos Estados-Membros;

introduzir a obrigação de responsabilização («accountability») dos membros da organização;

dispor de um mandato de representação e acção a nível europeu;

ser independente e não estar sujeita a directivas de interesses externos;

ser transparente, em particular no que toca às suas finanças e processos de decisão internos.

(6)  Parecer sobre a «Proposta de regulamento do Conselho que estabelece as disposições gerais sobre o Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional, o Fundo Social Europeu e o Fundo de Coesão»JO C 255 de 14.10.2005, p. 79.

(7)  COM(2004) 492 final.

(8)  Working document of Directorate General Regional Policy summarising the results of the public consultation on the Community Strategic Guidelines for Cohesion 2007-2013 (documento de trabalho da Direcção-Geral da Política Regional que resume os resultados de uma consulta pública sobre as Orientações Estratégicas Comunitárias para a Coesão), 7 de Outubro de 2005.

(9)  Parecer sobre «A representatividade das organizações europeias da sociedade civil no quadro do diálogo civil». JO C 88 de 11.04.2006, p. 41

(10)  «Melhores práticas disponíveis — Participação social na programação e acompanhamento dos fundos comunitários», Instituto de Economia Ambiental, CEE Bankwatch Network, Friends of the Earth Europe, Relatório de Setembro de 2004.

(11)  «Parceria para o período de programação 2000-2006 — Análise da aplicação do princípio de parceria» — Documento de debate da Direcção-Geral da Política Regional, Novembro de 2005.

(12)  Brian Harvey, Illusion of inclusion (A ilusão da inclusão) ECAS.

(13)  Parecer sobre a «Proposta de regulamento do Conselho que estabelece as disposições gerais sobre o Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional, o Fundo Social Europeu e o Fundo de Coesão»JO C 255 de 14.10.2005, p. 79.

(14)  Parecer do CESE sobre a «Parceria para a execução dos Fundos Estruturais», JO C 10 de 14.1.2004, p. 21.

(15)  Para ser considerada representativa, uma organização europeia deverá cumprir nove critérios:

ter uma estrutura sustentável a nível europeu;

ter acesso directo ao conhecimento especializado dos seus membros;

representar interesses gerais, de acordo com os interesses da sociedade europeia;

ser composta de organizações que, a nível dos seus respectivos Estados-Membros, são consideradas representativas dos interesses concretos que defendem;

reunir organizações oriundas de uma grande maioria dos Estados-Membros;

introduzir a obrigação de responsabilização («accountability») dos membros da organização;

dispor de um mandato de representação e acção a nível europeu;

ser independente e não estar sujeita a directivas de interesses externos;

ser transparente, em particular no que toca às suas finanças e processos de decisão internos.


16.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 309/133


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de regulamento do Conselho relativo à constituição de uma empresa comum para a realização do sistema europeu de gestão do tráfego aéreo de nova geração (SESAR)»

COM(2005) 602 final — 2005/0235 (CNS)

(2006/C 309/27)

Em 4 de Janeiro de 2006, o Conselho decidiu, nos termos do artigo 171.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada de Transportes, Energia, Infra-Estruturas e Sociedade da Informação emitiu parecer em 30 de Maio de 2006, tendo sido relator T. McDonogh.

Na 428.a reunião plenária, de 5 e 6 de Julho de 2006 (sessão de 6 de Julho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 37 votos a favor, 1 voto contra e 3 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Introdução

1.1

SESAR é a vertente tecnológica da iniciativa «Céu Único Europeu», lançada em 2004 com o objectivo de reformar a organização do controlo do tráfego aéreo. Com esta iniciativa são introduzidas novas tecnologias de comunicação, controlo e cálculo entre o pessoal em terra e a aeronave, que permitirão melhorar o trabalho dos controladores de tráfego aéreo e dos pilotos. Embora as cabinas de pilotagem estejam cada vez mais automatizadas, os controladores de tráfego aéreo e os pilotos continuam a comunicar por rádio.

1.2

SESAR é um sistema de gestão do tráfego aéreo de nova geração, essencial para gerir o aumento do tráfego aéreo. O projecto SESAR permitirá aumentar a segurança e a eficácia ambiental do transporte aéreo e garantirá que a Europa mantenha a sua posição de liderança no mercado mundial da aviação. A Comissão levará por diante este projecto industrial de grande dimensão juntamente com o Eurocontrol e os parceiros do sector.

1.3

A Europa disporá da infra-estrutura de controlo do tráfego aéreo mais eficiente do mundo. Calcula-se que o projecto SESAR, ao proporcionar uma maior eficiência do transporte aéreo, venha a totalizar um valor líquido de 20 000 milhões de euros. Os efeitos directos e indirectos do projecto são estimados em 50 000 milhões de euros. O projecto criará aproximadamente 200 000 postos de trabalho altamente qualificados.

1.4

Segundo as previsões, o tráfego aéreo na Europa aumentará significativamente até 2025. Este crescimento implica uma revisão profunda da infra-estrutura de controlo do tráfego aéreo, tendo em vista optimizar as rotas e eliminar o congestionamento. O projecto SESAR contribuirá igualmente para aumentar a segurança do transporte aéreo, actualmente caracterizada pelo envelhecimento das tecnologias e pela fragmentação dos sistemas de controlo de tráfego aéreo.

1.5

A Comissão Europeia e o Eurocontrol co-financiaram o contrato que, no valor de 43 milhões de euros (50,5 milhões de dólares americanos), foi adjudicado a um consórcio de 30 companhias aéreas, organizações de navegação aérea e fabricantes de aeronaves. O contrato abrange a fase de definição do sistema europeu de gestão do tráfego aéreo no âmbito do Céu Único Europeu, anteriormente conhecido por SESAME, e agora denominado SESAR. Na fase de definição, com a duração de dois anos, terá lugar a concepção do futuro sistema de gestão do tráfego aéreo, sendo igualmente fixado um prazo para a sua introdução até 2020.

1.6

Os custos totais da fase de definição, incluindo o contrato no valor de 43 milhões de euros, elevar-se-ão a 60 milhões de euros. A Comissão Europeia e o Eurocontrol suportam, em partes iguais, os custos, consistindo o contributo deste último em dinheiro, conhecimentos técnicos e investigação. A Comissão Europeia declarou que os custos da fase de desenvolvimento rondarão anualmente os 300 milhões de euros e serão financiados pela Comissão, pela indústria e pelo Eurocontrol. Até aqui têm sido investidos anualmente 200 milhões de euros na investigação e no desenvolvimento de um sistema de gestão do tráfego aéreo, quantia essa que irá agora ser canalizada para o projecto SESAR.

1.7

A fase de definição é financiada na totalidade pela Comissão e pelo Eurocontrol. No tocante à fase de desenvolvimento, prevê-se que a indústria, em geral, financie um terço do programa, no valor anual de cerca de 100 milhões de euros durante sete anos. A UE e o Eurocontrol contribuirão anualmente com 100 milhões de euros, respectivamente.

1.8

Ainda não está claro quem no sector da indústria, e com que montante, contribuirá para os 100 milhões de euros anuais. Deve definir-se o contributo da indústria, mas em primeiro lugar há que resolver problemas difíceis relacionados com os direitos de propriedade intelectual, as cláusulas de concorrência, etc.

1.9

No entanto, o nível actual das despesas de I&D na gestão do tráfego aéreo é um indicador das quantias com que a indústria contribuirá para o projecto SESAR. Do total de 200 milhões de euros por ano, cerca de 75 milhões de euros provêm dos prestadores de serviços de navegação aérea. Uma boa parte, ou mesmo a totalidade, deste dinheiro será canalizado para o projecto SESAR em vez de ser utilizado de forma fragmentada.

1.10

Os associados ao projecto são os centros de I&D na gestão do tráfego aéreo (ATM R&D), a EURAMID, a Autoridade de Aviação Civil do Reino Unido (UK CAA), indústrias não europeias (Boeing, Honeywell, Rockwell-Collins) e organizações profissionais (Federação Internacional das Associações de Controladores do Tráfego Aéreo (IFATCA), Associação Europeia dos Tripulantes de Cabina (ECA) e Federação Europeia de Trabalhadores dos Transportes (ETF)).

1.11

As empresas que participam na fase de definição são as seguintes:

 

UTILIZADORES: Air France, Iberia, KLM, Lufthansa, Associação Europeia de Companhias Aéreas (AEA), Associação Europeia das Linhas Aéreas Regionais (ERAA), Associação Internacional de Transportadoras Aéreas (IATA), Conselho Internacional das Associações de Proprietários de Aeronaves e de Pilotos (IAOPA).

 

Prestadores de serviços de navegação aérea: Aeroportos Espanhóis e Navegação Aérea (AENA), Austrocontrol, DFS, Direcção dos Serviços de Navegação Aérea (França) (DSNA), empresa italiana de serviços de navegação aéreos (ENAV), Luftfartsveket (operador aeroportuário sueco) (LFV), Luchtverkeersleidins Nederland (prestador de serviços de controlo do tráfego aéreo nos Países Baixos) (LVNL), Serviços Nacionais de Tráfego Aéreo (Reino Unido) (NATS), NAV.

 

AEROPORTOS: aeroportos de Paris, BAA, Fraport, Amsterdão, Munique, AENA, LFV.

 

INDÚSTRIA: Airbus, BAE Systems, Consórcio Europeu de Aeronáutica e Defesa (EADS), Indra, Selex, Thales ATM, Thales Avionics e Air Traffic Alliance.

2.   Recomendações e comentários

2.1

Há que apoiar e responder construtivamente a qualquer iniciativa no sentido de modernizar o controlo do tráfego aéreo na Europa.

2.2

O resultado pretendido é a utilização de rotas mais eficientes, a redução do consumo de combustível e voos mais rápidos para os viajantes.

2.3

O estabelecimento de blocos funcionais de espaço permitirá uma melhor utilização do espaço aéreo, respeitando simultaneamente os acordos regionais e as condições de vida e os interesses das comunidades locais (cidades e municípios) situadas nos blocos de espaço aéreo.

2.4

Evitando a duplicação de actividades de investigação e desenvolvimento, o Projecto SESAR não deverá conduzir ao aumento do montante global da contribuição dos utilizadores do espaço aéreo para o esforço de investigação e desenvolvimento.

2.5

Na sequência da adesão da Comunidade Europeia ao Eurocontrol, a Comissão e o Eurocontrol assinaram um acordo-quadro de cooperação para realização do Céu Único Europeu e de actividades de investigação e desenvolvimento no sector do controlo do tráfego aéreo. Pretendia-se deste modo aumentar a segurança e a eficácia operacional dos prestadores de serviços de navegação aérea.

2.6

A empresa comum deverá seguir uma abordagem integrada, conjugando os esforços da parceria público/privado em todas as vertentes (técnica, operacional, reguladora e institucional), a fim de assegurar uma transição fluída da fase de definição para a fase de implementação e das fases de investigação e de desenvolvimento para a de implantação.

2.7

O financiamento da empresa comum deverá ser objecto de revisão após concluída a fase de definição. Todas as partes deverão considerar que quaisquer custos adicionais financiados pelo sector privado através do mecanismo de aplicação de taxas aos utilizadores poder-se-ão reflectir nos bolsos dos viajantes.

2.8

As contribuições dos poderes públicos para a fase de implementação do projecto SESAR deverão ser completadas com contribuições do sector privado.

2.9

Face ao número de intervenientes no processo e aos meios financeiros e conhecimentos técnicos necessários, é urgente criar uma entidade jurídica que possa assegurar uma gestão coordenada dos fundos afectos ao projecto SESAR na sua fase de implementação.

2.10

O número de empresas envolvidas na fase de definição é limitado e não é representativo do conjunto da indústria europeia de aviação. A Comissão Europeia deverá alargar a participação na fase de definição aos pequenos proprietários e, em particular, aos novos Estados-Membros.

2.11

O SESAR exigirá uma implementação gradual, mas na fase final o projecto deverá ser concluído o mais rapidamente possível. A Comissão deveria estabelecer marcos precisos para acelerar a realização do projecto e encurtar a fase de aplicação.

2.12

Através do aumento da eficiência, o projecto SESAR conseguirá economias de custos no tráfego aéreo europeu.

Bruxelas, 6 de Julho de 2006.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


16.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 309/135


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «O futuro dos serviços de interesse geral»

(2006/C 309/28)

Em 14 de Julho de 2005, o Comité Económico e Social Europeu decidiu, nos termos do n.o 2 do artigo 29.o do seu Regimento, elaborar um parecer sobre o tema: «O futuro dos serviços de interesse geral».

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Transportes, Energia, Infra-estruturas, Sociedade da Informação, que emitiu parecer em 30 de Maio de 2006 (relator: R. HENCKS).

Na 428.a reunião plenária de 5 e 6 de Julho de 2006 (sessão de 6 de Julho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 46 votos a favor, 9 votos contra e 7 abstenções, o seguinte parecer.

1.   Conclusões

1.1

Os serviços de interesse geral, definidos como tal pelas autoridades públicas com base numa acção social e cívica e por referência a esta, satisfazem necessidades fundamentais e desempenham um papel fundamental na promoção da coesão social e territorial da União e no êxito da Estratégia de Lisboa.

1.2

Uma vez que o Conselho Europeu decretou uma fase de reflexão sobre os grandes temas europeus, será necessário que a sociedade civil intervenha de modo determinado e dinâmico para garantir serviços de interesse geral eficazes e fazer deles uma componente essencial da união.

1.3

O CESE reitera o pedido de definir a nível comunitário os princípios básicos comuns aplicáveis a todos os SIG, que deverão ser consagrados numa directiva-quadro e, em caso de necessidade, especificados por sector em directivas sectoriais.

1.4

De acordo com o princípio de subsidiariedade, cada Estado-Membro deve poder definir, mediante um acto oficial a notificar, os tipos de serviços «de regalia» ou de interesse nacional, regional ou local que não estão englobados nos serviços de interesse económico geral (SIEG), nem abrangidos pelo âmbito de aplicação das regras da concorrência e dos auxílios estatais.

1.5

Em relação aos outros serviços de interesse geral, a directiva-quadro e as leis sectoriais devem prever claramente a liberdade dos Estados-Membros ou das autarquias locais de definirem os modos de gestão e de financiamento, os princípios e limites da acção da Comunidade, a avaliação dos seus desempenhos, os direitos dos consumidores e dos utilizadores, um conjunto mínimo de missões e de obrigações de serviço público.

1.6

Para que todos aqueles a quem os serviços de interesse geral económicos e não económicos se destinam se identifiquem com as iniciativas, será necessário que todos os intervenientes, órgãos de poder estatal, regional e municipal, parceiros sociais, organizações de consumidores e ambientais, unidades do sector da economia social e de luta contra a exclusão, etc., ocupem o seu lugar a nível nacional, regional e local, ao lado das autoridades reguladoras e dos operadores no funcionamento dos serviços de interesse geral e sejam envolvidos em todas as fases, ou seja, na organização e na fixação, na vigilância e na aplicação de normas de qualidade.

1.7

A nível europeu, sempre que directivas sectoriais que regulamentam serviços de interesse geral tenham consequências sociais para a qualificação e as condições de trabalho e de emprego dos trabalhadores, as organizações de trabalhadores e patronais deverão ser consultadas no âmbito de novos comités sectoriais do diálogo estruturado europeu.

1.8

O carácter evolutivo dos serviços de interesse geral e a importância que têm na realização da Estratégia de Lisboa, fazem com que seja indispensável efectuar uma avaliação regular não só dos serviços de interesse económico geral para os quais existem regras comunitárias, mas também dos serviços de interesse geral em relação aos objectivos da União. O CESE propõe a criação de um observatório para avaliar os serviços de interesse geral económicos e não económicos, composto por representantes políticos do Parlamento Europeu e do Comité das Regiões, e por representantes da sociedade civil organizada do Comité Económico e Social Europeu.

1.9

O CESE insiste que os princípios atrás mencionados também devem determinar as posições da União nas negociações comerciais, em especial no âmbito da OMC e do GATS. Seria inadmissível que a UE tomasse, nas negociações comerciais, compromissos de liberalização de sectores ou de actividades que não tivessem sido decididos no quadro das regras do mercado interno específicas dos serviços de interesse geral. A necessidade de manter a capacidade dos Estados-Membros para regulamentarem os serviços de interesse geral, económicos e não económicos, a fim de atingir os objectivos sociais e de desenvolvimento que a União fixou para si própria, impõe que se excluam os serviços de interesse económico geral das negociações supracitadas.

2.   Objecto do parecer de iniciativa

2.1

Os serviços de interesse geral são fulcrais para o modelo europeu de sociedade e desempenham um papel fundamental na promoção da coesão social e territorial da União. Eles completam e vão além do mercado único e constituem uma condição prévia necessária para o bem-estar económico e social dos cidadãos e das empresas.

2.2

Os serviços de interesse geral, económicos ou não económicos, satisfazem necessidades fundamentais, são elementos constitutivos dum laço de pertença dos cidadãos à colectividade e representam um elemento de identidade cultural para todos os países europeus, até nas atitudes da vida quotidiana.

2.3

No centro de todas estas considerações figura, assim, o interesse do cidadão, cujo exercício exige a garantia de acesso a serviços considerados essenciais e à consecução de objectivos prioritários.

2.4

Esta comunidade de valores suscita uma variedade de modos de organização dos serviços de interesse geral de um país para outro, de uma região para outra e consoante os diferentes sectores. A definição dos serviços de interesse geral é a que as autoridades nacionais estabelecem com base numa acção social e cívica e por referência a esta.

2.5

Uma tal variedade de situações representa um desafio para a integração europeia. No entanto, longe de constituir um obstáculo insuperável, oferece uma oportunidade para criar, mediante a adaptação de um conjunto de princípios aplicáveis a todos os serviços de interesse geral, um quadro capaz de satisfazer o interesse geral num contexto económico e social em permanente mudança.

2.6

A realização de uma interacção benéfica entre o grande mercado europeu, com os seus imperativos de livre circulação, livre concorrência, eficácia, competitividade e dinamismo económico, por um lado, e a ponderação dos objectivos de interesse geral, por outro lado, revelou ser um processo longo e complexo. Este processo tem sido bem sucedido, na generalidade, embora se manifestem problemas que têm de ser corrigidos.

3.   Historial

3.1

O Tratado de Roma apenas menciona os serviços públicos no artigo 77.o (artigo 73.o do Tratado actual) que estabelece o serviço público para o sector dos transportes, e no n.o 2 do artigo 90.o (n.o 2 do artigo 86.o do Tratado actual) que aceita derrogações às regras da concorrência em determinadas condições, no caso dos serviços de interesse económico geral.

3.2

O n.o 2 do artigo 86.o do Tratado CE dá aos Estados-Membros a possibilidade de instaurarem um regime jurídico que derrogue o direito comum e, nomeadamente, as regras da concorrência, a favor das empresas que gerem um interesse económico geral: «As empresas encarregadas da gestão de serviços de interesse económico geral ou que tenham a natureza de monopólio fiscal ficam submetidas ao disposto no presente Tratado, designadamente às regras de concorrência, na medida em que a aplicação destas regras não constitua obstáculo ao cumprimento, de direito ou de facto, da missão particular que lhes foi confiada. O desenvolvimento das trocas comerciais não deve ser afectado de maneira que contrarie os interesses da Comunidade  (1) ».

3.3

Com base neste último artigo, o Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias reconhece (desde 1993) que para cumprir a missão especial que lhe foi confiada, o operador incumbido de missões de serviço público possa usufruir de restrições às regras de concorrência previstas no Tratado, que podem ir até à exclusão de qualquer concorrência, na medida em que estas restrições sejam necessárias para permitir que a empresa assegure o serviço de interesse económico geral em condições economicamente aceitáveis (2).

3.4

O Tribunal constatou, assim, que a atribuição de vantagens concorrenciais em actividades rentáveis, para compensar as perdas que a empresa sofre em actividades não rentáveis, mas de interesse geral, era compatível com o Tratado (3).

3.5

Na mesma lógica, o Tribunal decidiu que, na medida em que um apoio financeiro do Estado deva ser considerado uma compensação que representa a contrapartida das prestações efectuadas pela empresa beneficiária para cumprir obrigações de serviço público, essa intervenção não cai, em determinadas condições, sob a alçada das disposições do Tratado relativas aos auxílios de Estado (4). Ao mesmo tempo, o Tribunal precisa que os serviços de interesse geral — económicos ou não — devem observar os princípios gerais do Tratado: transparência, proporcionalidade, não discriminação, igualdade de tratamento.

3.6

É a partir do Acto Único de 1986, com a criação de um mercado único, que a construção europeia começou a intervir no terreno dos serviços de interesse económico geral, nomeadamente colocando em causa direitos especiais concedidos aos operadores de serviços (públicos ou privados) nos Estados-Membros e o lançamento de uma muito ampla liberalização das grandes redes de serviços públicos.

3.7

O Tratado de Amesterdão, de 1997, salienta no seu artigo 16.o o lugar que os serviços de interesse económico geral ocupam no conjunto dos valores comuns da União e o papel que desempenham na promoção da coesão social e territorial, exigindo às instituições nacionais e europeias que zelem por que esses serviços funcionem «com base em princípios e em condições que lhes permitam cumprir as suas missões», embora mantendo-se em grande medida sujeitos aos princípios da concorrência.

3.8

O dito artigo 16.o não tem efeito operativo sobre a política da Comissão em relação aos operadores de serviços públicos. No entanto, o Conselho Europeu decidiu, em Março de 2000, em Lisboa, «realizar um mercado interno plenamente operacional nessas áreas» preconizando uma maior liberalização dos serviços públicos de rede e o alargamento da concorrência nos mercados nacionais, quer se trate dos transportes ferroviários, dos serviços postais, da energia ou das telecomunicações.

3.9

A Carta dos Direitos Fundamentais proclamada em Nice em 2000 estabelece, pela primeira vez, uma ligação entre serviços de interesse geral e direitos fundamentais. Deste modo, o acesso aos SIEG e os direitos relativos a componentes específicos dos serviços de interesse geral (segurança social e assistência social, protecção da saúde, protecção do ambiente, etc.) são reconhecidos nos artigos II-34.o a II-36.o da Carta dos Direitos Fundamentais.

3.10

O Conselho Europeu de Barcelona, de 15 e 16 de Março de 2002, previu explicitamente que se especifique «numa proposta de directiva-quadro, os princípios relativos aos serviços de interesse económico geral, subjacentes ao artigo 16.o do Tratado, respeitando as especificidades dos diferentes sectores implicados e tendo em conta o disposto no artigo 86.o do Tratado».

4.   Contexto actual

4.1

Apesar de se terem registado progressos, muitos representantes da sociedade civil consideraram-nos insuficientes, face à importância dos serviços de interesse geral na vida dos cidadãos europeus, e multiplicaram as iniciativas no âmbito da elaboração da futura constituição europeia para integrar os princípios dos serviços de interesse geral nos objectivos comuns da União, a fim de promover e garantir a segurança e a justiça social por meio de serviços de qualidade baseados nos princípios da universalidade, da igualdade de acesso, da neutralidade de propriedade e da razoabilidade dos preços.

4.2

O artigo III-122.o do Projecto de Tratado Constitucional deveria estabelecer as bases do direito positivo derivado relativo aos serviços de interesse económico geral, dispondo, sem prejuízo da competência dos Estados-Membros, que «[e]sses princípios e condições são definidos por lei europeia» e que«zelam por que esses serviços funcionem com base em princípios e em condições, designadamente económicas e financeiras, que lhes permitam [aos SIEG] cumprir as suas missões».

4.3

Além disso, o dito artigo III-122.o deveria reconhecer o princípio de livre administração das autarquias locais e transformar a possibilidade de elas próprias prestarem serviços de interesse económico geral num princípio constitucional, concretizando, deste modo, o princípio de subsidiariedade a nível das competências da União e dos Estados-Membros no que aos SIEG diz respeito.

4.4

Tendo em conta o adiamento do processo de ratificação do Tratado Constitucional, o CESE considera necessário iniciar desde já, e com base nos tratados actuais, o processo de elaboração da directiva-quadro relativa aos serviços de interesse geral (económicos e não económicos) que há anos vem exigindo nos seus pareceres (5).

4.5

Actualmente, a única base jurídica possível é a da conclusão do mercado interno, entendendo-se que esta base deve ser completada pela ponderação de outras disposições do Tratado, que conferem um conteúdo preciso ao tipo de mercado interno que deverá existir em matéria de serviços de interesse económico geral:

O artigo 16.o, que atribui à União a missão de zelar por que os SIEG possam cumprir as suas missões;

O artigo 36.o da Carta dos Direitos Fundamentais, que exige que a União respeite o acesso de todos aos SIEG;

O artigo 86.o no qual se especifica que, em caso de conflito entre as regras de concorrência e as missões de interesse geral, estas últimas prevalecem;

O artigo 5.o relativo ao respeito pelo princípio de subsidiariedade;

O artigo 295.o, que estipula a neutralidade da União em relação à propriedade das empresas;

O Título VIII relativo ao emprego, tendo em conta o número de postos de trabalho visados pelos SIEG, directos ou indirectos;

O Título XIV sobre a defesa dos consumidores, o qual implica disposições específicas para os SIEG;

O Título XV sobre as redes transeuropeias, que atribui responsabilidades à União;

O Título XVI relativo à competitividade da indústria, que pressupõe a existência de SIEG modernos, eficazes e de qualidade;

O Título XVII sobre a coesão económica e social, que implica a compensação dos desequilíbrios existentes;

O Título XIX relativo à protecção do ambiente, particularmente importante para os SIEG, tendo em conta as suas externalidades.

4.6

A combinação destes artigos permite fundamentar um direito específico dos SIEG como parte integrante de uma directiva-quadro sobre todos os serviços de interesse geral, que tenha simultaneamente em conta a conclusão do mercado interno e as especificidades dos SIEG, respeitando os objectivos do Tratado.

5.   Distinção entre serviços de interesse geral e serviços de interesse económico geral

5.1

Ao contrário dos SIEG, os SIG, no seu conjunto, não são como tal mencionados nos Tratados.

5.2

Os serviços de interesse geral de carácter não económico, não são regidos por regras comunitárias específicas, nem estão sujeitos às regras relativas ao mercado interno, à concorrência e aos auxílios estatais. Dependem, todavia, de uma série de objectivos da União Europeia (respeito pelos direitos fundamentais, promoção do bem-estar dos cidadãos, justiça social, coesão social, etc.), que são indispensáveis à sociedade. Em consequência, a União, que tem responsabilidades na promoção do nível e da qualidade de vida em todo o território europeu, também tem algumas responsabilidades relativamente aos SIG, enquanto instrumentos de aplicação dos direitos fundamentais e da coesão social, devendo, por isso, zelar, pelo menos, por que existam e estejam acessíveis a todos, a preços razoáveis e com boa qualidade.

5.3

A distinção entre carácter económico e não económico continua a ser vaga e incerta. Quase todos os serviços de interesse geral, mesmo os prestados a título não lucrativo ou benévolo, têm um determinado valor económico, embora não devam ser por isso abrangidos pelo direito da concorrência. Além disso, um mesmo serviço pode ser simultaneamente comercial e não comercial, ou ter um carácter comercial mas o mercado não estar em condições de o assegurar de acordo com a lógica e os princípios que regem os serviços de interesse geral.

5.4

Deste facto resultam ambiguidades e contradições entre a concorrência e os SIG, cujo carácter económico ou não económico continua a estar sujeito às interpretações e mudanças jurídicas do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias, o que:

Fragiliza a situação de muitos operadores de serviço público, nomeadamente dos que intervêm no domínio social ou nos sectores não comerciais, ou que exercem as suas actividades a nível local;

Expõe os operadores ao risco de sanções por parte da Comissão ou do Tribunal de Justiça Europeu,

Preocupa os cidadãos/consumidores, que receiam o desaparecimento dos serviços públicos.

5.5

Também existem ambiguidades terminológicas entre as diferentes instituições europeias. Para a Comissão, o conceito de serviço de interesse geral abrange todos os serviços de interesse geral, comerciais ou não, ao passo que, para o Parlamento Europeu, o conceito de serviços de interesse geral visa apenas os que não são económicos. O CESE solicita, portanto, que as várias instituições adoptem uma iniciativa com vista a que se encontre uma linguagem comum.

6.   Orientações futuras

6.1

Uma vez que, após os referendos sobre o Tratado Constitucional, o Conselho Europeu decretou uma fase de reflexão sobre os grandes temas europeus, será necessário que a sociedade civil intervenha de modo determinado e dinâmico para garantir serviços de interesse geral eficazes e fazer deles uma componente essencial

6.2

Nesta ordem de ideias, há que perguntar que iniciativas se devem tomar na Europa para obter uma combinação harmoniosa dos mecanismos de mercado e das missões de serviço público nos domínios em que essa complementaridade é compatível com os objectivos dos serviços de interesse geral e pode gerar um valor acrescentado que melhore a qualidade de vida dos cidadãos europeus, numa lógica do modelo social europeu baseado no crescimento económico, na criação de postos de trabalho e no bem-estar sustentável.

6.3

Uma das grandes particularidades do modelo social é o diálogo social. A informação, a consulta e a participação dos parceiros sociais e dos actores da sociedade civil são as condições indispensáveis para a manutenção e a modernização bem sucedida do modelo social europeu; trata-se de concretizar uma Europa social, baseada numa interacção benéfica entre a regulamentação e o diálogo social.

6.4

Todos os intervenientes, órgãos do poder estatal, regional e municipal, parceiros sociais, organizações de consumidores e ambientais, organismos de economia social e de luta contra a exclusão, etc., têm o seu lugar ao lado das autoridades reguladoras e dos operadores no funcionamento dos serviços de interesse geral.

6.5

Deve garantir-se, portanto, que quando se regulamentam os serviços de interesse geral, os actores supramencionados, a nível nacional, regional e local, são envolvidos em todas as fases, ou seja, na organização e na fixação, na vigilância, na análise custo/eficácia e na aplicação de normas de qualidade.

6.6

A nível europeu, sempre que as directivas sectoriais tenham consequências sociais para a qualificação e as condições de trabalho e de emprego dos trabalhadores, as iniciativas legislativas da Comissão Europeia devem ser precedidas de um diálogo social europeu estruturado.

6.7

Por outras palavras, a lógica do artigo 139.o do Tratado CE que encarrega a Comissão de zelar por que as organizações dos trabalhadores e patronais sejam consultadas a respeito da dimensão social das políticas que propõe, deve ser igualmente aplicada a nível sectorial, quando se trata de regulamentar os serviços de interesse económico geral.

6.8

Deste modo, os comités de diálogo social sectorial estruturado tornar-se-ão os garantes da promoção do diálogo social sectorial ou intersectorial, que deve conduzir à celebração de convenções colectivas europeias aplicáveis para proteger os direitos dos trabalhadores e o seu emprego, face ao dumping social e ao emprego de pessoal não qualificado.

6.9

Isto não deverá dispensar a Comissão de proceder obrigatoriamente a uma análise do impacto sobre o funcionamento dos serviços de interesse económico geral para cada uma das suas propostas de alteração de instrumentos de direito comunitário de vocação sectorial ou de instituição de novos instrumentos no domínio dos serviços de interesse económico geral.

7.   Construir um conceito europeu de serviço de interesse geral

7.1

A Europa a que os cidadãos aspiram é a de um espaço de vivência comum atento às questões de qualidade de vida, solidariedade, emprego e criação de uma riqueza que não seja apenas material. Os SIG constituem um instrumento indispensável para o concretizar.

7.2

Há, assim, que definir a nível comunitário os princípios básicos comuns aplicáveis a todos os SIG, que deverão ser incluídos numa directiva-quadro e, em caso de necessidade, discriminados por sector através de directivas sectoriais.

7.3

A adopção de uma directiva-quadro de vocação horizontal é indispensável para proporcionar aos operadores encarregados da gestão dos serviços de interesse geral económicos e não económicos, e às autoridades públicas, toda a segurança jurídica requerida, e aos utilizadores e consumidores as garantias necessárias.

8.   Objectivos dos serviços de interesse geral

8.1

Em conformidade com o seu papel de pilar do modelo social europeu e de uma economia social de mercado, os SIG deverão, através das interacções e da integração do progresso económico e social:

garantir o direito de todos os habitantes a acederem a bens ou serviços fundamentais (direito à educação, à saúde, à segurança, ao emprego, à energia e à água, aos transportes, às comunicações, etc.);

assegurar a coesão económica, social e cultural;

zelar pela justiça e a inclusão sociais, construir solidariedades, promover o interesse geral da colectividade;

criar condições de desenvolvimento sustentável.

9.   Definição do interesse geral

9.1

É preciso, em primeiro lugar, criar um quadro institucional que constitua uma base sólida para criar estabilidade jurídica no que se refere à distinção, na acepção do Tratado, entre serviços de interesse económico geral e serviços de interesse geral não económicos, sendo certo que para estes últimos o Tratado não exige a aplicação das regras de concorrência e dos auxílios estatais.

9.2

Tendo em conta, por um lado, as dificuldades de definir exaustivamente este conceito e, por outro lado, o risco que comporta uma abordagem restritiva, essa definição deverá concentrar-se na missão específica dos serviços em questão e nas exigências (obrigações de serviço público) que lhes são impostas para o cumprimento das suas funções, e que deverão ser claramente estabelecidas.

9.3

Isto implica que, ao abrigo do n.o 2 do artigo 86.o do Tratado CE, o cumprimento efectivo de uma missão de interesse geral prevalece, em caso de tensão, sobre a aplicação das regras de concorrência, em conformidade com a jurisprudência comunitária.

10.   O papel das autoridades públicas nacionais

10.1

Por força do princípio de subsidiariedade, cada Estado-Membro deve continuar a ter a liberdade de estabelecer a distinção entre os serviços de interesse geral de natureza económica e os de natureza não económica. Porém, em caso de erro de apreciação manifesto, deve competir à Comissão poder intervir.

10.2

Os Estados-Membros deverão poder definir, assim, mediante um acto oficial a notificar às instituições europeias, os tipos de serviços «de regalia», resultantes de razões imperiosas de interesse geral ou de interesse nacional, regional ou local que não estão englobados nos serviços de interesse económico geral (SIEG), nem abrangidos pelo âmbito de aplicação das regras da concorrência e dos auxílios estatais.

10.3

Sem pôr em causa a liberdade de escolha das autoridades nacionais, o CESE considera que entre estes serviços de interesse nacional, regional ou municipal, deverão figurar os serviços relacionados com os sistemas de ensino obrigatório, de saúde e de segurança social, as actividades culturais, de solidariedade, de carácter social, caritativo ou baseado em donativos, bem como os serviços audiovisuais, os serviços de distribuição de água e de saneamento básico.

10.4

Quanto aos outros serviços, a directiva-quadro relativa aos serviços de interesse geral e as leis sectoriais devem definir claramente os princípios e modalidades de regulamentação, que vêm completar o direito comum da concorrência; essa definição legislativa deverá permitir proceder à adaptação das exigências em função da evolução das necessidades e das preocupações dos utilizadores e consumidores, bem como das mudanças do ambiente económico e tecnológico.

10.5

Considera o CESE que o estatuto particular da água, a continuidade e a perenidade dos serviços ligados à sua distribuição e a política de investimento e tarifária fazem que este sector seja do interesse geral e que não se preste a uma liberalização europeia sistemática.

10.6

Este quadro regulamentar deverá, pois, garantir a existência dos serviços de interesse geral, a liberdade de definição e de organização dos Estados-Membros, ou das autarquias locais, a liberdade de escolha dos modos de gestão (6) e de financiamento, os princípios e limites da acção da Comunidade, a avaliação dos seus desempenhos, os direitos dos consumidores e utilizadores, um conjunto mínimo de missões e obrigações de serviço público.

10.7

Estas obrigações de serviço público, patentes nas obrigações que os Estados-Membros impõem a si próprios ou aos prestadores de serviços, consistem principalmente na igualdade e a na generalidade de acesso, na ausência de discriminação, na continuidade do serviço, na sua qualidade, transparência, segurança e capacidade de adaptação às evoluções necessárias.

10.8

Em consonância com o artigo 295.o do Tratado, que em nada prejudica o carácter público ou privado do modo de gestão dos serviços de interesse económico geral nem incita os Estados-Membros à liberalização dos serviços, o CESE incentiva as mais diversas formas de gestão e de parceria entre as autoridades públicas, os operadores encarregados destes serviços, os parceiros sociais, e também os utilizadores e consumidores.

11.   Regulação

11.1

A regulação é um processo dinâmico, que evolui com o desenvolvimento do mercado e das mutações tecnológicas.

11.2

A forma como deverá funcionar a concorrência num mercado liberalizado depende das características do sector; pode fazer-se através de concursos, de parcerias entre o sector público e o sector privado, do controlo dos preços, da prevenção de um tratamento discriminatório no acesso à rede, ou da criação de uma concorrência entre redes.

11.3

Da comparação entre os diferentes sistemas de regulação dos Estados-Membros, conclui-se que nenhum modelo poderá considerar-se exemplar, pois depende sempre da história, das instituições e das tradições de cada país, da situação sectorial ou geográfica e do desenvolvimento tecnológico de um sector específico.

11.4

Trata-se, portanto, de conjugar o respeito pela diversidade dos modos de regulação associados à história, às tradições e às instituições, bem como ao tipo de serviços, com objectivos comunitários precisos e regras comuns limitadas para obter respostas diferenciadas e promover a maior eficácia possível a nível transeuropeu, transfronteiriço, nacional, regional, municipal ou local.

11.5

Embora se privilegiem as trocas e as coordenações a nível comunitário, não se deverá impor uma solução unificada à escala europeia, cabendo aos Estados-Membros definir o modo pertinente de regulação dos serviços de interesse económico geral, no respeito pelo princípio de subsidiariedade e pelo princípio de neutralidade quanto ao carácter público ou privado do modo de gestão do serviço em causa.

12.   Avaliação

12.1

O carácter evolutivo dos serviços de interesse geral, os objectivos que lhes são atribuídos e a importância que têm na realização da Estratégia de Lisboa, tornam indispensável uma avaliação regular não só dos serviços de interesse económico geral para os quais existem regras comunitárias, mas também dos serviços de interesse geral em relação aos objectivos da União (respeito pelos direitos fundamentais, promoção do bem-estar dos cidadãos, justiça social, coesão social, etc.).

12.2

O CESE não partilha, portanto, do parecer da Comissão (7) segundo o qual os serviços de interesse geral não económicos deverão continuar a ser excluídos da avaliação horizontal dos desempenhos dos SIG.

12.3

Uma tal avaliação deverá servir para aumentar a eficácia dos serviços de interesse geral e a sua adaptação à evolução das necessidades dos cidadãos e empresas e fornecer às autoridades públicas os elementos que lhes permitam fazer as escolhas mais pertinentes.

12.4

O Parlamento Europeu solicitou à Comissão (8) que organizasse o debate entre as diversas instâncias existentes (Comité Económico e Social, Comité das Regiões, organizações de diálogo social, associações de iniciativas respeitantes aos SIG e de consumidores). Os resultados deste debate deverão ser tidos em conta e servir para definir as orientações para a avaliação horizontal anual, devendo a própria avaliação ser objecto de debate.

12.5

Isto implica que o compromisso assumido pela Comissão, na sua Comunicação COM(2002) 331, de associar a sociedade civil à avaliação horizontal dos desempenhos dos SIG, nomeadamente mediante a criação «um mecanismo permanente para auscultar as opiniões dos cidadãos» deixe de ser letra morta e que — sempre segundo a Comissão, «as partes interessadas, incluindo os parceiros sociais, serão também consultadas numa base ad hoc sobre questões específicas».

12.6

Incumbirá, assim, à União estimular a dinâmica da avaliação, no respeito pelo princípio de subsidiariedade e pela elaboração, em diálogo com os representantes das partes interessadas, de um método de avaliação harmonizado à escala europeia com base em indicadores comuns.

12.7

Este método de avaliação deverá ter em conta não só os resultados puramente económicos, mas também o impacto social e ambiental, bem como a preservação do interesse geral a longo prazo.

12.8

Isto implica que os utilizadores a quem os serviços de interesse geral económicos e não económicos se destinam dispõem de meios para exprimir as suas necessidades e aspirações, nomeadamente participando, através dos seus representantes, na elaboração dos modos de avaliação e na apreciação dos resultados.

12.9

Nesta ordem de ideias, o CESE propõe a criação de um observatório para a avaliação dos serviços de interesse geral económicos e não económicos, composto por representantes políticos do Parlamento Europeu, do Comité das Regiões e de representantes da sociedade civil organizada do Comité Económico e Social Europeu.

12.10

O observatório deveria ter um comité de direcção que definisse os objectivos e cadernos de encargos das avaliações e que designasse as entidades incumbidas dos estudos, que examinassem e emitissem parecer sobre os relatórios. Ser-lhe-ia associado um concelho científico para examinar a metodologia adoptada e fazer recomendações. Aquele comité velaria por que os relatórios de avaliação fossem apresentados e debatidos publicamente nos Estados-Membros, em conjunto com as partes interessadas, o que implica que os relatórios estejam disponíveis nas línguas de trabalho da União.

13.   Financiamento

13.1

A segurança do financiamento a longo prazo dos investimentos e das obrigações de serviço público continua a ser uma questão essencial para garantir o acesso de todos, e em todo o território da União, a serviços de interesse geral de qualidade e a preços moderados.

13.2

O interesse geral e as obrigações de serviço público impostas pela autoridade pública a um ou vários fornecedores de um serviço de interesse económico geral, segundo determinadas condições e especificações, requerem métodos de financiamento adequados.

13.3

Incumbe, assim, aos Estados-Membros garantir o financiamento a longo prazo de uma parte dos investimentos necessários para a continuidade e a sustentabilidade dos serviços, para além da compensação adequada das obrigações de serviço público ou de serviço universal; as regras comunitárias devem favorecer, e não limitar, estas seguranças de financiamento.

13.4

A inexistência deliberada de uma directiva europeia relativa à definição, à organização e ao financiamento das obrigações de serviço público, deixa aos Estados-Membros toda a latitude para escolherem os seus métodos de financiamento, em conformidade com o princípio de subsidiariedade e de proporcionalidade.

13.5

Os Estados-Membros devem poder recorrer a muitos e diversos modos de financiamento das missões e obrigações de serviço público: compensação directa paga pelo orçamento nacional ou das autarquias locais, financiamento baseado na solidariedade social ou territorial entre utentes, contribuições dos operadores e utilizadores, créditos fiscais, direitos exclusivos, etc., instrumentos combinados de financiamento públicos e privados (parceria público-privada) sobretudo em matéria de infra-estruturas públicas que geram receitas provenientes da exploração.

13.6

Dado que os modos de financiamento dependem muito dos Estados ou sectores envolvidos, que estão em permanente mutação devido à evolução tecnológica, o CESE estima que não se deve restringir, a nível comunitário, as fontes de financiamento possíveis ou privilegiar uma em relação à outra, mas sim dar aos Estados-Membros a flexibilidade necessária para decidirem, a nível nacional, regional ou local, com base nas suas prioridades políticas e na sua estimativa de rendibilidade económica, de que modo desejam financiar os serviços cuja responsabilidade assumem.

13.7

Tendo, todavia, em conta as capacidades de financiamento limitadas de parte dos novos Estados-Membros, a União deveria pôr ao seu dispor os meios necessários para promover o desenvolvimento de serviços de interesse geral, económicos e não económicos, eficazes.

Bruxelas, 6 de Julho de 2006.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  O artigo n.o 2 do III-166.o, do Tratado que estabelece uma Constituição para a Europa reproduz quase integralmente o n.o 2 do artigo 86.o do Tratado CE.

(2)  Ver Acórdãos «Poste Italiane», «Corbeau», «Commune d'Almelo», «Glöckner» e «Altmark».

(3)  Ver Acórdão «Glöckner» de 25.10.2001.

(4)  Acórdão «Altmark» de 24.07.2003.

(5)  Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «Os serviços de interesse geral»JO C 241 de 7.10.2002, p. 119-127; parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o «Livro Verde sobre os serviços de interesse geral» (COM(2003) 270 final), JO C 80 de 30.3.2004, p. 66-76; parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o «Livro Branco sobre os serviços de interesse geral» (COM(2004) 374 final), JO C 221 de 8.9.2005 p. 17-21.

(6)  O artigo 295.o do Tratado CE consagra o princípio de neutralidade no que se refere à propriedade pública ou privada das empresas. COM(2004) 374 final de 12.05.2004.

(7)  COM(2002) 331, ponto 3.2.

(8)  Relatório do PE A5/0361/2001; relatório Werner Langen; 17.10.2001.


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