COMISSÃO EUROPEIA
Bruxelas, 2.5.2018
COM(2018) 324 final
2018/0136(COD)
Proposta de
REGULAMENTO DO PARLAMENTO EUROPEU E DO CONSELHO
sobre a proteção do orçamento da União em caso de deficiências generalizadas no que diz respeito ao Estado de direito nos Estados-Membros
EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS
1.CONTEXTO DA PROPOSTA
•Justificação e objetivos
Conforme explicado na Comunicação da Comissão de fevereiro de 2018 intitulada «Um quadro financeiro plurianual novo e moderno para a concretização eficaz das prioridades pós2020 da União Europeia», a União Europeia é uma comunidade de direito e os seus valores constituem a própria razão da sua existência. Estes valores transparecem em toda a sua estrutura jurídica e institucional e em todos os seus programas e políticas. Importa, por conseguinte, garantir o respeito destes valores em todos os domínios de intervenção da União. Este princípio inclui o orçamento da UE, uma vez que o respeito pelos valores fundamentais é um pré-requisito essencial para uma gestão financeira sólida e eficaz dos fundos da UE. O respeito pelo Estado de direito é importante para os cidadãos europeus, bem como para as iniciativas empresariais, a inovação e o investimento. A prosperidade da economia europeia manifesta-se mais fortemente quando o quadro jurídico e institucional adere plenamente aos valores comuns da União.
O potencial do orçamento da UE só poderá ser plenamente aproveitado se o contexto económico, regulamentar e administrativo dos Estados-Membros for favorável. No âmbito do atual quadro financeiro plurianual, todos os Estados-Membros e beneficiários são já obrigados a demonstrar que o quadro regulamentar para a gestão financeira é sólido, que a regulamentação relevante da UE está a ser corretamente aplicada e que dispõem da capacidade administrativa e institucional necessária ao êxito dos financiamentos da UE. Importa referir que a condicionalidade da política orçamental pode contribuir para a cooperação entre Estados-Membros em domínios nos quais as economias de escala ou externalidades são significativas. O quadro financeiro plurianual de 2014-2020 introduziu igualmente novas disposições para evitar situações em que a eficiência do financiamento da UE é prejudicada por políticas económicas e orçamentais desadequadas.
O efetivo respeito pelo primado do direito é um requisito prévio para a confiança em que as despesas da UE nos Estados-Membros são suficientemente protegidas. Como exposto na Comunicação da Comissão de 2014 intitulada «Um novo quadro da UE para reforçar o Estado de direito», o primado do direito é a pedra angular de qualquer democracia constitucional moderna. Constitui um dos princípios de base que decorrem das tradições constitucionais comuns de todos os Estados-Membros da União Europeia. Como tal, é um dos principais valores em que se funda a União, como reiterado no artigo 2.º do Tratado da União Europeia, bem como nos preâmbulos do Tratado e da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia. Assegura que as ações empreendidas pelo Estado decorrem ao abrigo de um quadro jurídico eficaz e fiável, que podem ser objeto de escrutínio e contestação e, se necessário, de vias de recurso.
As diferentes constituições e sistemas jurídicos dos Estados-Membros da UE estão, em princípio, bem concebidos para garantir o Estado de Direito, estando dotados de salvaguardas para proteger os cidadãos contra qualquer ameaça ao primado do direito. Contudo, diversos acontecimentos recentes evidenciaram debilidades generalizadas a nível dos controlos e equilíbrios nacionais e demonstraram de que forma o desrespeito do primado do direito pode tornar-se um grave motivo comum de preocupação no seio da União Europeia. Em consequência, surgiu um pedido claro, emanante de instituições como o Parlamento Europeu, bem como do público em geral, no sentido de a UE a tomar medidas com vista à proteção do Estado de direito.
As referidas medidas foram tomadas com os instrumentos disponíveis, tendo sido alcançados resultados. Contudo, tendo em conta a ligação entre o respeito pelo Estado de direito e a confiança mútua e a solidariedade financeira entre os Estados-Membros da União Europeia, e que os mecanismos de controlo só podem ser eficazes se apoiados por uma aplicação efetiva do controlo administrativo e jurídico e das vias de recurso em caso de irregularidades, as obrigações atualmente existentes destinadas a assegurar a eficácia dos sistemas de controlo devem ser complementadas por medidas destinadas a garantir o respeito do Estado de direito.
A fim de proteger os interesses financeiros da União contra o risco de perdas financeiras causadas por deficiências generalizadas no que diz respeito ao Estado de direito num Estado-Membro, a União Europeia deve ter a possibilidade de adotar medidas adequadas em tais casos, com base numa decisão do Conselho sob proposta da Comissão. Essa decisão é considerada como tendo sido adotada pelo Conselho, salvo se este decidir, por maioria qualificada, rejeitar a proposta da Comissão no prazo de um mês a contar da data da sua adoção pela Comissão. Além disso, o Parlamento Europeu deve ser plenamente envolvido em todas as fases do processo.
As medidas devem ser adotadas com pleno respeito pelos princípios da transparência e da proporcionalidade. É igualmente importante assegurar que as consequências das medidas estão devidamente ligadas ao objetivo do financiamento, o que aponta também para a necessidade de assegurar que as consequências recaem sobre os responsáveis pela deficiências identificadas. Deverá, por conseguinte, ter-se em conta o facto de que os beneficiários individuais do financiamento da UE, como os estudantes Erasmus, os investigadores ou as organizações da sociedade civil, não podem ser considerados responsável por tais infrações.
A presente proposta estabelece as regras necessárias com vista à proteção do orçamento da União caso se verifiquem deficiências generalizadas no que diz respeito ao Estado de direito nos Estados-Membros. Poderá ser integrada no regulamento financeiro, que tem a mesma base jurídica, aquando da sua próxima revisão.
•Coerência com as disposições em vigor
A proposta contribuirá para garantir o respeito pelo Estado de direito em todos os Estados-Membros, em conformidade com o artigo 2.º do TUE, e para a proteção do orçamento da União.
•Coerência com as outras políticas da União
Ao contribuir para assegurar o respeito pelo Estado de direito e a boa execução do orçamento da União, a proposta irá apoiar todas as outras políticas da União, nomeadamente no que respeita à utilização dos fundos da União.
2.BASE JURÍDICA, SUBSIDIARIEDADE E PROPORCIONALIDADE
•Base jurídica
A proposta tem por base o artigo 322.º, n.º 1, alínea a), do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia e o artigo 106.º-A do Tratado que institui a Comunidade Europeia da Energia Atómica.
•Subsidiariedade (em caso de competência não exclusiva)
As regras financeiras que regem o orçamento da União nos termos do artigo 322.º do Tratado sobre o Funcionamento da UE não podem ser adotadas a nível dos Estados-Membros.
•Proporcionalidade
A proposta prevê medidas proporcionais às deficiências generalizadas no que diz respeito ao Estado de direito, nomeadamente a suspensão e a redução do financiamento ao abrigo dos compromissos existentes, ou a proibição de assumir novos compromissos com categorias específicas de beneficiários. A proporcionalidade será assegurada, nomeadamente, ao ter-se em conta a gravidade da situação, o tempo decorrido desde que teve início a conduta em causa, a sua duração e recorrência, a intenção e o grau de cooperação do Estado-Membro envolvido para por termo à infração à regra do primado do direito, bem como os efeitos dessa deficiência nos respetivos fundos da União.
•Escolha do instrumento
Considerando que o objetivo é contribuir para a correta execução do orçamento geral da União, a proposta assume a forma de um regulamento autónomo baseado no artigo 322.º do TFUE, a mesma base jurídica que o Regulamento Financeiro.
3.RESULTADOS DAS AVALIAÇÕES RETROSPETIVAS, DA CONSULTA DAS PARTES INTERESSADAS E DAS AVALIAÇÕES DE IMPACTO
•Avaliações retrospetivas/balanços de qualidade da legislação vigente
Não existe atualmente qualquer programa semelhante. Há, no entanto, experiência adquirida com a abordagem, a nível da União Europeia, de questões relacionadas com o Estado de direito nos Estados-Membros. Esta experiência demonstrou que, apesar de já existirem alguns instrumentos, estes não foram especificamente concebidos para fazer face às situações em que a execução dos fundos da União pode ser posta em risco por deficiências no que diz respeito ao Estado de direito.
•Consultas das partes interessadas
Não foi realizada qualquer consulta específica das partes interessadas, mas o assunto foi objeto de um amplo debate, nomeadamente no Parlamento Europeu e no Conselho.
•Peritos externos
Fontes externas, nomeadamente o Conselho da Europa, foram tidas em consideração na conceção das regras atuais. O recurso a peritos externos do Conselho da Europa está igualmente previsto, quando adequado, na aplicação das medidas propostas.
•Avaliação de impacto
Não foi efetuada qualquer avaliação de impacto, uma vez que a medida tem como único objetivo evitar que o orçamento da União seja prejudicado por situações em que uma deficiência generalizada no que diz respeito ao Estado de direito num Estado-Membro afeta ou é suscetível de afetar a boa gestão financeira e a proteção dos interesses financeiros da União. As opções eram, por conseguinte, manter o status quo, sem qualquer procedimento financeiro específico em caso de problemas relacionados com o Estado de direito suscetíveis de afetar a boa gestão dos fundos da União; ou a instituição de tal procedimento.
•Direitos fundamentais
Ao aumentar o atual nível de proteção contra deficiências no que diz respeito ao Estado de direito, a proposta terá um impacto positivo nos direitos fundamentais.
4.INCIDÊNCIA ORÇAMENTAL
Ao aumentar a proteção contra possíveis práticas, omissões ou medidas de autoridades públicas que afetam o Estado de direito num Estado-Membro, e que afetam, ou são suscetíveis de afetar, a sua capacidade para cumprir as suas obrigações orçamentais, a proposta terá um impacto positivo na boa gestão financeira do orçamento geral da União.
5.OUTROS ELEMENTOS
•Planos de execução e acompanhamento, avaliação e prestação de informações
A Comissão irá avaliar a situação no Estado-Membro em causa, a fim de decidir se pode propor um levantamento das medidas.
•Explicação pormenorizada das disposições específicas da proposta
A proposta tem por base a Comunicação da Comissão de 2014 intitulada «Um novo quadro da União Europeia para reforçar o Estado de direito», e a Comunicação da Comissão, de fevereiro de 2018, intitulada «Um quadro financeiro plurianual novo e moderno para a concretização eficaz das prioridades pós-2020 da União Europeia», bem como as normas e os princípios desenvolvidos pelo Conselho da Europa.
O artigo 1.º especifica o objeto do regulamento e a necessidade de proteger o orçamento da UE contra deficiências generalizadas no que diz respeito ao Estado de direito num Estado-Membro, suscetíveis de afetar a boa gestão financeira e a proteção dos interesses financeiros da União.
O artigo 2.º estabelece as definições.
O artigo 3.º especifica as medidas a adotar para fazer face a uma situação de deficiências generalizadas no que diz respeito ao Estado de direito. Explica quais as funções específicas do Estado que são suscetíveis de ser afetadas e ter um impacto negativo sobre a boa gestão financeira dos fundos da União.
O artigo 4.º enumera os tipos de medidas que podem ser adotadas e clarifica que estas devem ser dirigidas aos Estados-Membros enquanto destinatários dos fundos da União.
O artigo 5.º estabelece o procedimento que deverá ser seguido pela Comissão ao propor medidas ao Conselho, que deve decidir através de uma votação por maioria qualificada invertida.
O artigo 6.º define o procedimento com vista ao levantamento das medidas caso a situação tenha sido corrigida num determinado Estado-Membro, e as consequências desse levantamento em termos orçamentais.
O artigo 7.º diz respeito à informação a prestar ao Parlamento Europeu.
O artigo 8.º contém as disposições finais.
2017/ (COD)
2018/0136 (COD)
Proposta de
REGULAMENTO DO PARLAMENTO EUROPEU E DO CONSELHO
sobre a proteção do orçamento da União em caso de deficiências generalizadas no que diz respeito ao Estado de direito nos Estados-Membros
O PARLAMENTO EUROPEU E O CONSELHO DA UNIÃO EUROPEIA,
Tendo em conta o Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, nomeadamente o artigo 322.º, n.º 1, alínea a),
Tendo em conta o Tratado que institui a Comunidade Europeia da Energia Atómica, nomeadamente o artigo 106.º-A,
Tendo em conta a proposta da Comissão Europeia,
Após transmissão do projeto de ato legislativo aos parlamentos nacionais,
Tendo em conta o parecer do Tribunal de Contas,
Deliberando de acordo com o processo legislativo ordinário,
Considerando o seguinte:
(1)O Estado de direito constitui um dos valores essenciais em que se funda a União. Como reiterado no artigo 2.º do Tratado da União Europeia, estes valores são comuns a todos os Estados-Membros.
(2)O primado do direito supõe que todos os poderes públicos atuam dentro dos limites fixados pela lei, em conformidade com os valores da democracia e os direitos fundamentais, e sob o controlo de tribunais independentes e imparciais. Exige, nomeadamente, que os princípios da legalidade, da segurança jurídica, da proibição da arbitrariedade dos poderes executivos, da separação de poderes e da proteção judicial efetiva por tribunais independentes sejam respeitados.
(3)O Estado de direito constituí uma condição prévia para a proteção dos outros valores essenciais em que a União assenta, como a liberdade, a democracia, a igualdade e o respeito pelos direitos humanos. O respeito do primado do direito está intrinsecamente ligado ao respeito da democracia e dos direitos fundamentais: não pode haver democracia e respeito dos direitos fundamentais sem respeito do Estado de direito, e vice-versa.
(4)Sempre que os Estados-Membros executam o orçamento da União, e independentemente da modalidade de execução utilizada, o respeito do Estado de direito é uma condição prévia indispensável à conformidade com os princípios da boa gestão financeira consagrado no artigo 317.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia.
(5)Os Estados-Membros só podem assegurar uma boa gestão financeira se as autoridades públicas agirem em conformidade com a lei e se as eventuais infrações à lei forem efetivamente passíveis de procedimentos penais pelos órgãos de investigação e pelos serviços do Ministério Público, e se as decisões das autoridades públicas puderem ser sujeitas a um controlo jurisdicional efetivo por tribunais independentes e pelo Tribunal de Justiça da União Europeia.
(6)Os órgãos judiciais devem agir com independência e imparcialidade e os serviços de investigação e ação penal devem estar aptos a exercer adequadamente as suas funções. Devem dispor de recursos e procedimentos suficientes para agir eficazmente e no pleno respeito do direito a um julgamento justo. Estas condições são necessárias como garantia mínima contra decisões ilegais ou arbitrárias das autoridades públicas suscetíveis de prejudicar os interesses financeiros da União.
(7)A independência do sistema judiciário pressupõe, em particular, que o órgão em causa esteja em condições de exercer as suas funções judiciais com total autonomia, sem estar sujeito a qualquer vínculo hierárquico ou de subordinação a outro órgão, e sem receber ordens ou instruções de quem quer que seja, sendo assim protegido contra intervenções ou pressões externas suscetíveis de comprometer a independência de julgamento dos seus membros e influenciar as suas decisões. As garantias de independência e de imparcialidade postulam a existência de regras, designadamente no que respeita à composição do órgão e à nomeação, duração do mandato e motivos de impugnação da nomeação ou de destituição dos seus membros, a fim de afastar qualquer dúvida razoável, no espírito dos cidadãos, quanto à impermeabilidade do referido órgão em relação a fatores externos e à sua neutralidade relativamente aos interesses com que se depara.
(8)O respeito pelo Estado de direito é importante não apenas para os cidadãos da União, mas também para as iniciativas empresariais, a inovação, o investimento e o bom funcionamento do mercado interno, que será mais florescente no âmbito de um sólido quadro jurídico e institucional.
(9)O artigo 19.º do TUE, que exprime em termos concretos o valor do Estado de direito consagrado no artigo 2.º, exige aos Estados-Membros que prevejam uma tutela jurisdicional efetiva nos domínios abrangidos pelo direito da União, incluindo os que se prendem com a execução do orçamento da União. A própria existência de um controlo jurisdicional efetivo destinado a assegurar a conformidade com o direito da União constitui a essência do primado do direito e requer a independência dos tribunais. É essencial manter a independência dos tribunais, como o confirma o artigo 47.º, segundo parágrafo, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia. Isto aplica-se, em especial, ao controlo jurisdicional da validade das medidas, contratos ou outros instrumentos que dão origem a despesas ou dívidas públicas, nomeadamente no âmbito de processos de contratação pública que podem também ser objeto de ações perante os tribunais.
(10)Por conseguinte, existe uma relação clara entre o respeito do primado do direito e uma execução eficiente do orçamento da União, de acordo com os princípios da boa gestão financeira.
(11)A existência de deficiências nos Estados-Membros no que diz respeito ao Estado de direito, afetando em particular o bom funcionamento das autoridades públicas e o efetivo controlo jurisdicional, pode lesar seriamente os interesses financeiros da União.
(12)A identificação de uma deficiência generalizada requer uma avaliação qualitativa pela Comissão. Essa avaliação pode basear-se nas informações provenientes de todas as fontes disponíveis e instituições reconhecidas, incluindo acórdãos do Tribunal de Justiça da União Europeia, relatórios do Tribunal de Contas e conclusões e recomendações das organizações e redes internacionais relevantes, como os órgãos do Conselho da Europa e as redes europeias de supremos tribunais e conselhos superiores da magistratura.
(13)Há que estabelecer as eventuais medidas a adotar em caso de deficiências generalizadas, bem como o procedimento a seguir com vista à sua adoção. Essas medidas devem incluir a suspensão dos pagamentos e dos compromissos, uma redução do financiamento ao abrigo dos atuais compromissos e uma proibição de assumir novos compromissos com os beneficiários.
(14)Deve aplicar-se o princípio da proporcionalidade ao estabelecer as medidas a adotar, em especial tendo em conta a gravidade da situação, o tempo decorrido desde que teve início a conduta em causa, a sua duração e recorrência, a intenção e o grau de cooperação do Estado-Membro envolvido para por termo à deficiência generalizada no que diz respeito ao Estado de direito, bem como os efeitos dessa deficiência nos respetivos fundos da União.
(15)A fim de assegurar a aplicação uniforme do presente regulamento, e tendo em conta a importância dos efeitos financeiros das medidas impostas nos termos do presente regulamento, deverão ser atribuídas competências de execução ao Conselho, que deverá agir com base numa proposta da Comissão. A fim de facilitar a adoção de decisões que sejam necessárias para proteger os interesses financeiros da União, deve recorrer-se a uma votação por maioria qualificada invertida.
(16)Antes de propor a adoção de qualquer medida nos termos do presente regulamento, a Comissão deve informar o Estado-Membro em causa das razões pelas quais considera que pode existir uma deficiência generalizada no domínio do Estado de direito nesse Estado-Membro. O Estado-Membro em causa deve ter a possibilidade de apresentar as suas observações. A Comissão e o Conselho devem ter em conta essas observações.
(17)O Conselho deve retirar as medidas com efeito suspensivo, sob proposta da Comissão, sempre que a situação que conduziu à imposição dessas medidas já tiver sido suficientemente remediada.
(18)A Comissão deve manter o Parlamento Europeu informado de quaisquer medidas propostas e adotadas nos termos do presente regulamento,
ADOTARAM O PRESENTE REGULAMENTO:
Artigo 1.º
Objeto
O presente regulamento estabelece as regras necessárias com vista à proteção do orçamento da União caso se verifiquem deficiências generalizadas no que diz respeito ao Estado de direito nos Estados-Membros.
Artigo 2.º
Definições
Para efeitos do presente regulamento, aplicam-se as seguintes definições:
(a)«Estado de direito»: um dos valores da União, consagrado no artigo 2.º do Tratado da União Europeia, que inclui os princípios da legalidade, que supõe um processo transparente, responsável, democrático e pluralista para a adoção de legislação; da segurança jurídica; da proibição da arbitrariedade nos poderes executivos; da proteção judicial efetiva por tribunais independentes, nomeadamente dos direitos fundamentais; da separação de poderes e da igualdade perante a lei;
(b)«Deficiência generalizada no que diz respeito ao Estado de direito»: uma prática ou omissão generalizada ou recorrente, ou uma medida por parte das autoridades públicas, que afeta o Estado de direito;
(c)«Entidade pública»: todas as autoridades públicas, a todos os níveis de governo, incluindo autoridades nacionais, regionais e locais, bem como as organizações dos Estados na aceção do [artigo 2.º, ponto 42], do Regulamento (UE, Euratom) n.º [...] (a seguir designado «Regulamento Financeiro»).
Artigo 3.º
Medidas
1.Devem ser adotadas medidas adequadas sempre que, num Estado-Membro, uma deficiência generalizada no que diz respeito ao Estado de direito afete ou seja suscetível de afetar os princípios da boa gestão financeira ou da proteção dos interesses financeiros da União, nomeadamente:
(a)O correto funcionamento das autoridades desse Estado-Membro ao executar o orçamento da União, em especial no contexto de procedimentos de contratação pública ou de concessão de subvenções, bem como ao efetuar fiscalizações e controlos;
(b)O correto funcionamento dos órgãos de investigação e dos serviços do Ministério Público no que diz respeito à repressão da fraude, corrupção ou outras infrações ao direito da União relativamente à execução do orçamento da União;
(c)O controlo jurisdicional efetivo, realizado por tribunais independentes, das ações ou omissões das autoridades referidas nas alíneas a) e b);
(d)A prevenção e punição da fraude, corrupção ou outras infrações ao direito da União relativamente à execução do orçamento da União, e a imposição, aos beneficiários, de sanções efetivas e dissuasivas pelos tribunais ou autoridades administrativas nacionais;
(e)A recuperação dos fundos indevidamente pagos;
(f)A cooperação eficaz e em tempo útil com o Organismo Europeu de Luta Antifraude e com a Procuradoria Europeia nas suas investigações ou ações penais em conformidade com os respetivos atos jurídicos e com o princípio da cooperação leal.
2.Podem nomeadamente ser consideradas deficiências generalizadas no que diz respeito ao Estado de direito as seguintes situações:
(a)O facto de se pôr em risco a independência do poder judicial;
(b)O facto de não se prevenir, corrigir e sancionar as decisões arbitrárias ou ilegais por parte de autoridades públicas, incluindo as autoridades com funções coercivas; de suspender recursos humanos e financeiros de forma a afetar o seu correto funcionamento; ou de não se conseguir evitar conflitos de interesses;
(c)O facto de se limitar a disponibilidade e a eficácia dos mecanismos de recurso, nomeadamente através de regras processuais restritivas; de não se executar sentenças; ou de se limitar a efetiva investigação, repressão ou sanção das infrações à lei.
Artigo 4.º
Conteúdo das medidas
1.Podem ser adotadas uma ou diversas das seguintes medidas:
(a)Quando a Comissão executa o orçamento da União em regime de gestão direta ou indireta nos termos das alíneas a) e c) do artigo 62.º do Regulamento Financeiro, e quando o beneficiário é uma entidade pública:
(1)uma suspensão dos pagamentos ou da execução do compromisso jurídico ou uma cessação do compromisso jurídico nos termos do artigo [131.º, n.º 3], do Regulamento Financeiro;
(2)uma proibição de assumir novos compromissos jurídicos;
(b)Quando a Comissão executa o orçamento da União em regime de gestão partilhada nos termos do [artigo 62.º, alínea b)], do Regulamento Financeiro:
(1)uma suspensão da aprovação de um ou mais programas ou uma alteração dos mesmos;
(2)uma suspensão dos compromissos;
(3)uma redução dos compromissos, nomeadamente através de correções financeiras ou transferências para outros programas de despesas;
(4)uma redução do pré-financiamento;
(5)uma interrupção dos prazos de pagamento;
(6)uma suspensão dos pagamentos.
2.Salvo disposição em contrário da decisão que adota as medidas, a imposição de medidas adequadas não afeta a obrigação de as entidades públicas a que se refere o n.º 1, alínea a), ou os Estados-Membros a que se refere o n.º 1, alínea b), executarem o programa ou fundo afetado pela medida, e, em particular, a obrigação de efetuar pagamentos aos destinatários finais ou beneficiários.
3.As medidas adotadas devem ser proporcionais à natureza, gravidade e alcance das deficiências generalizadas no que diz respeito ao Estado de direito. Devem, na medida do possível, visar as ações da União efetiva ou potencialmente afetadas por tal deficiência.
Artigo 5.º
Procedimento
1.Se a Comissão entender que tem motivos razoáveis para considerar que as condições previstas no artigo 3.º estão preenchidas, deve enviar uma notificação escrita ao Estado-Membro em causa, indicando as razões em que se baseou essa sua constatação.
2.A Comissão pode tomar em consideração todas as informações pertinentes, incluindo decisões do Tribunal de Justiça da União Europeia, relatórios do Tribunal de Contas e conclusões e recomendações de organizações internacionais competentes.
3.A Comissão pode solicitar quaisquer informações adicionais que sejam necessárias à sua avaliação, tanto antes como depois de ter chegado a uma constatação nos termos do n.º 1.
4.O Estado-Membro em causa deve fornecer todas as informações necessárias e pode apresentar as suas observações num prazo fixado pela Comissão, que não pode ser inferior a 1 mês a contar da data de notificação da constatação. Nas suas observações, o Estado-Membro pode propor a adoção de medidas corretivas.
5.A Comissão deve ter em consideração as informações recebidas e as observações apresentadas pelo Estado-Membro em causa, bem como a adequação das eventuais medidas corretivas propostas, ao decidir se deve ou não apresentar uma proposta de decisão sobre as medidas adequadas.
6.Se a Comissão considerar que existe uma deficiência generalizada no que diz respeito ao Estado de direito, deve apresentar ao Conselho uma proposta com vista a um ato de execução sobre as medidas adequadas.
7.Essa decisão é considerada como tendo sido adotada pelo Conselho, salvo se este decidir, por maioria qualificada, rejeitar a proposta da Comissão no prazo de um mês a contar da data da sua adoção pela Comissão.
8.O Conselho, deliberando por maioria qualificada, pode alterar a proposta da Comissão e adotar o texto assim alterado enquanto decisão do Conselho.
Artigo 6.º
Levantamento das medidas
1.O Estado-Membro em causa pode, a qualquer momento, apresentar à Comissão elementos de prova que demonstrem que a insuficiência generalizada no que diz respeito ao Estado de direito foi corrigida ou deixou de existir.
2.A Comissão deve avaliar a situação no Estado-Membro em causa. Uma vez que as deficiências generalizadas no que diz respeito ao Estado de direito que foram o motivo da adoção de medidas adequadas deixem de existir, no todo ou em parte, a Comissão deve apresentar ao Conselho uma proposta de decisão para levantar essas medidas no todo ou em parte. Aplica-se o procedimento estabelecido no artigo 5.º, n.os 2, 4, 5, 6 e 7.
3.Se as medidas relativas à suspensão da aprovação de um ou mais programas ou à sua alteração, a que se refere o artigo 4.º, n.º 2, alínea b), subalínea i), ou à suspensão dos compromissos a que se refere o artigo 4.º, n.º 2, alínea b), subalínea ii), forem levantadas, os montantes correspondentes aos compromissos suspensos devem ser inscritos no orçamento, sem prejuízo do artigo 7.º do Regulamento (UE, Euratom) n.º XXXX do Conselho (Regulamento QFP). Os compromissos suspensos do ano n não podem ser inscritos no orçamento para além do ano n +2.
Artigo 7.º
Informação do Parlamento Europeu
A Comissão deve informar imediatamente o Parlamento Europeu de quaisquer medidas propostas ou adotadas nos termos dos artigos 4.º e 5.º
Artigo 8.º
Entrada em vigor
O presente regulamento entra em vigor no vigésimo dia seguinte ao da sua publicação no Jornal Oficial da União Europeia. O presente regulamento aplica-se a partir de 1 de janeiro de 2021.
O presente regulamento é obrigatório em todos os seus elementos e diretamente aplicável em todos os Estados-Membros.
Feito em Bruxelas, em
Pelo Parlamento Europeu
Pelo Conselho
O Presidente
O Presidente