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Document 62016CJ0101

Acórdão do Tribunal de Justiça (Segunda Secção) de 19 de outubro de 2017.
SC Paper Consult SRL contra Direcţia Regională a Finanţelor Publice Cluj-Napoca e Administraţia Judeţeană a Finanţelor Publice Bistriţa Năsăud.
Pedido de decisão prejudicial apresentado pela Curtea de Apel Cluj.
Reenvio prejudicial — Fiscalidade — Imposto sobre o valor acrescentado (IVA) — Diretiva 2006/112/CE — Direito a dedução — Condições de exercício — Artigo 273.° — Medidas nacionais — Luta contra a fraude e a evasão fiscal — Fatura emitida por um contribuinte declarado “inativo” pela Administração Fiscal — Risco de fraude — Recusa do direito a dedução — Proporcionalidade — Recusa da tomada em consideração de provas de inexistência de fraude ou de perda fiscal — Limitação dos efeitos no tempo do acórdão a proferir — Inexistência.
Processo C-101/16.

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2017:775

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção)

19 de outubro de 2017 ( *1 )

«Reenvio prejudicial — Fiscalidade — Imposto sobre o valor acrescentado (IVA) — Diretiva 2006/112/CE — Direito a dedução — Condições de exercício — Artigo 273.o — Medidas nacionais — Luta contra a fraude e a evasão fiscal — Fatura emitida por um contribuinte declarado “inativo” pela Administração Fiscal — Risco de fraude — Recusa do direito a dedução — Proporcionalidade — Recusa da tomada em consideração de provas de inexistência de fraude ou de perda fiscal — Limitação dos efeitos no tempo do acórdão a proferir — Inexistência»

No processo C‑101/16,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pela Curtea de Apel Cluj (Tribunal de Recurso de Cluj, Roménia), por decisão de 21 de janeiro de 2016, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 19 de fevereiro de 2016, no processo

SC Paper Consult SRL

contra

Direcția Regională a Finanțelor Publice Cluj‑Napoca,

Administrația Județeană a Finanțelor Publice Bistrița‑Năsăud,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção),

composto por: M. Ilešič, presidente de secção, A. Rosas (relator), C. Toader, A. Prechal, e E. Jarašiūnas, juízes,

advogado‑geral: P. Mengozzi,

secretário: L. Carrasco Marco, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 26 de janeiro de 2017,

vistas as observações apresentadas:

em representação da SC Paper Consult SRL, por A. Bora, avocat,

em representação do Governo romeno, por R. H. Radu, M. Bejenar e E. Gane, na qualidade de agentes,

em representação da Comissão Europeia, por M. Owsiany‑Hornung e G.‑D. Balan, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 31 de maio de 2017,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado (JO 2006, L 347, p. 1), conforme alterada pela Diretiva 2010/45/UE do Conselho, de 13 de julho de 2010 (JO 2010, L 189, p. 1, a seguir «Diretiva 2006/112»).

2

Foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a SC Paper Consult SRL (a seguir «Paper Consult») à Direcția Regională a Finanțelor Publice Cluj‑Napoca (Direção Regional das Finanças Públicas de Cluj‑Napoca, Roménia) e à Administrația Județeană a Finanțelor Publice Bistrița‑Năsăud (Administração das Finanças Públicas de Bistrița‑Năsăud, Roménia), no qual a Paper Consult contesta uma decisão administrativa que lhe recusa o direito de deduzir o imposto sobre o valor acrescentado (IVA) pago sobre as prestações de serviços adquiridas à SC Rom Packaging SPRL (a seguir «Rom Packaging»), com o fundamento de que esta última tinha sido declarada contribuinte «inativo» na data da celebração do contrato.

Quadro jurídico

Direito da União

Diretiva 2006/112

3

O considerando 59 da Diretiva 2006/112 tem a seguinte redação:

«É conveniente que, dentro de certos limites e em determinadas condições, os Estados‑Membros possam adotar ou manter medidas especiais derrogatórias da presente diretiva, a fim de simplificar a cobrança do imposto ou evitar certas formas de fraude ou evasão fiscais.»

4

O artigo 1.o, n.o 2, segundo parágrafo, da Diretiva 2006/112, que figura no título I da mesma sob a epígrafe «Objeto e âmbito de aplicação», prevê:

«Em cada operação, o IVA, calculado sobre o preço do bem ou serviço à taxa aplicável ao referido bem ou serviço, é exigível, com prévia dedução do montante do imposto que tenha incidido diretamente sobre o custo dos diversos elementos constitutivos do preço.»

5

O artigo 168.o da referida diretiva, que figura no título X da mesma sob a epígrafe «Deduções», tem a seguinte redação:

«Quando os bens e os serviços sejam utilizados para os fins das suas operações tributadas, o sujeito passivo tem direito, no Estado‑Membro em que efetua essas operações, a deduzir do montante do imposto de que é devedor os montantes seguintes:

a)

O IVA devido ou pago nesse Estado‑Membro em relação aos bens que lhe tenham sido ou venham a ser entregues e em relação aos serviços que lhe tenham sido ou venham a ser prestados por outro sujeito passivo;

[…]»

6

Em conformidade com o artigo 178.o, alínea a), da Diretiva 2006/112:

«Para poder exercer o direito à dedução, o sujeito passivo deve satisfazer as seguintes condições:

a)

Relativamente à dedução referida na alínea a) do artigo 168.o, no que respeita às entregas de bens e às prestações de serviços, possuir uma fatura emitida em conformidade com as secções 3 a 6 do capítulo 3 do título XI»

7

O artigo 214.o, n.o 1, alínea a), desta Diretiva prevê:

«1.   Os Estados‑Membros tomam as medidas necessárias para que sejam identificadas através de um número individual as seguintes pessoas:

a)

Os sujeitos passivos, com exceção dos referidos no n.o 2 do artigo 9.o, que efetuem, no respetivo território, entregas de bens ou prestações de serviços que lhes confiram direito a dedução e que não sejam entregas de bens ou prestações de serviços em relação às quais o IVA seja devido unicamente pelo destinatário em conformidade com os artigos 194.° a 197.° e 199.°».

8

Nos termos do artigo 273.o, primeiro parágrafo, da Diretiva 2006/112:

«Os Estados‑Membros podem prever outras obrigações que considerem necessárias para garantir a cobrança exata do IVA e para evitar a fraude, sob reserva da observância da igualdade de tratamento das operações internas e das operações efetuadas entre Estados‑Membros por sujeitos passivos, e na condição de essas obrigações não darem origem, nas trocas comerciais entre Estados‑Membros, a formalidades relacionadas com a passagem de uma fronteira.»

Regulamento (UE) n.o 904/2010

9

O Regulamento (UE) n.o 904/2010 do Conselho, de 7 de outubro de 2010, relativo à cooperação administrativa e à luta contra a fraude no domínio do imposto sobre o valor acrescentado (JO 2010, L 268, p. 1), é uma reformulação do Regulamento (CE) n.o 1798/2003 do Conselho, de 7 de outubro de 2003, relativo à cooperação administrativa no domínio do imposto sobre o valor acrescentado e que revoga o Regulamento (CEE) n.o 218/92 (JO 2003, L 264, p. 1). Entre outros, amplia o conteúdo da base de dados eletrónica do Sistema de Intercâmbio de Informações sobre o IVA (VAT Information Exchange System, a seguir «VIES»).

10

O considerando 16 deste regulamento tem a seguinte redação:

«A confirmação em linha da validade dos números de identificação IVA é um instrumento cada vez mais utilizado pelos operadores. O sistema de confirmação da validade dos números de identificação IVA deverá permitir a confirmação automatizada das informações relevantes para os operadores.»

11

O artigo 17.o, n.o 1, alínea c), do Regulamento n.o 904/2010 prevê que os Estados‑Membros armazenem também, no VIES, os dados relativos aos números de identificação IVA atribuídos que deixaram de ser válidos.

12

Segundo o artigo 23.o deste regulamento, uma administração fiscal pode presumir que a pessoa cessou a sua atividade económica quando, apesar de obrigada a fazê‑lo, essa pessoa não tenha apresentado declarações de IVA nem mapas recapitulativos durante um ano após o termo do prazo para apresentação da primeira declaração ou do mapa em falta, ou ainda, nomeadamente, quando as pessoas tiverem declarado dados falsos ou não tiverem comunicado alterações dos seus dados.

13

Em conformidade com o artigo 62.o, quarto parágrafo, do Regulamento n.o 904/2010, o artigo 17.o ainda não tinha entrado em vigor na altura dos factos no processo principal.

Direito romeno

14

Na data dos factos em causa no processo principal, o artigo 78.o bis, n.o 1, da ordonanța Guvernului nr. 92/2003 privind Codul de procedură fiscală, republicată, cu modificările și completările ulterioare (Decreto do Governo n.o 92/2003, sobre o Código de Processo Fiscal, republicado, com modificações e alterações posteriores), dispunha:

«Registo dos contribuintes inativos/reativados

Os contribuintes pessoas coletivas ou todas as outras entidades sem personalidade jurídica são declarados inativos e sujeitos às disposições do artigo 11.o, n.os 1 bis e 1 ter, da Lei n.o 571/2003 relativa ao Código dos Impostos, e posteriores alterações e integrações [(a seguir “Código dos Impostos”)], se preencherem um dos seguintes requisitos:

a)

não tiverem apresentado, durante um semestre de calendário, nenhuma das declarações previstas na lei;

b)

se se tiverem subtraído ao controlo fiscal, ao declararem informações relativas à identificação de sede social que não permitam à autoridade fiscal identificá‑la;

c)

se as autoridades fiscais tiverem constatado que não exercem a sua atividade na sede social ou no domicílio fiscal declarado.»

15

O artigo 11.o, n.o 1 bis, do Código dos Impostos prevê:

«Os contribuintes sujeitos passivos estabelecidos na Roménia, declarados inativos em conformidade com o artigo 78.o do [Decreto n.o 92/2003], que exerçam uma atividade económica durante o período de inatividade, estão sujeitos às obrigações relativas ao pagamento dos impostos e taxas previstos na presente lei, mas não beneficiam, relativamente ao período em questão, do direito à dedução das despesas e do [IVA] relativos às aquisições efetuadas.»

16

O artigo 11.o, n.o 1 ter, do Código dos Impostos enuncia:

«Os beneficiários que tenham adquirido bens e/ou serviços a contribuintes sujeitos passivos estabelecidos na Roménia, depois da inscrição destes últimos como inativos no Registo dos contribuintes inativos/reativados em conformidade com o artigo 78.o do [Decreto n.o 92/2003], não beneficiam do direito à dedução das despesas e do [IVA] relativos às aquisições em questão, com exceção das aquisições de bens efetuadas no âmbito de um processo de execução e/ou de aquisições de bens/serviços de sujeitos passivos alvo de um processo de insolvência em conformidade com a Lei n.o 85/2006 relativa ao processo de insolvência, conforme alterada e completada posteriormente.»

17

O artigo 21.o, n.o 4, alínea r), do Código dos Impostos tem a seguinte redação:

«Não são dedutíveis as seguintes despesas: […]

(r)

as despesas contabilizadas resultantes de um documento emitido por um contribuinte inativo cujo certificado de registo fiscal foi suspenso por despacho do presidente da Agência Nacional de Administração Fiscal.»

18

O artigo 3.o da ordinul Președintelui Agenției Naționale de Administrare Fiscală («ANAF») nr. 819/2008 (Decisão n.o 819/2008 do presidente da Agência Nacional da Administração Fiscal, a seguir «ANAF»), dispõe:

«1.   Os contribuintes são declarados inativos a partir da data da entrada em vigor do despacho do presidente da [ANAF] que aprova a lista dos contribuintes declarados inativos.

2.   A lista dos contribuintes declarados inativos é afixada na sede da [ANAF] e publicada na página Internet da mesma, na secção “Informações públicas — Informações relativas aos agentes económicos”.

3.   O despacho do presidente da [ANAF] que aprova a lista dos contribuintes declarados inativos entra em vigor no prazo de quinze dias a contar da data da afixação, em conformidade com o artigo 44.o, n.o 3, do [Decreto n.o 92/2003].»

19

O anexo n.o 1 da Decisão n.o 3347/2011 do presidente da ANAF, que precisa as obrigações declarativas referidas no artigo 78.o bis, n.o 1, alínea a), do Decreto n.o 92/2003, enumera as seguintes obrigações declarativas:

«—

100 “Declaração sobre as obrigações de pagamento ao orçamento de Estado”;

112 “Declaração sobre as obrigações de pagamento das contribuições sociais, do imposto sobre o rendimento e o registo nominal das pessoas seguradas”;

101 “Declaração relativa ao imposto sobre as sociedades”;

300 “Declaração relativa ao [IVA]”;

301 “Declaração especial relativa ao [IVA]”;

390 “VIES Declaração recapitulativa sobre os fornecimentos/aquisições intracomunitários de bens”;

394 “Declaração informativa sobre os fornecimentos/prestações e as aquisições efetuados no território nacional”.»

Litígio no processo principal e questões prejudiciais

20

Por decisão de 11 de maio de 2012, as autoridades fiscais constataram que a Rom Packaging, estabelecida em Bucareste (Roménia), tinha prestado serviços à Paper Consult, estabelecida em Bistriţa‑Năsăud (Roménia), no montante de 190340 lei romenos (RON) (cerca de 44560 euros) sem IVA, com base num contrato de prestação de serviços celebrado em 3 de janeiro de 2011.

21

Dado que a Rom Packaging tinha sido declarada inativa a partir de 7 de outubro de 2010 e eliminada do registo dos contribuintes sujeitos a IVA a partir de 1 de novembro de 2010 por falta de apresentação das declarações fiscais impostas por lei, e tendo em conta o artigo 11.o, n.o 1 ter, do Código dos Impostos, as autoridades fiscais concluíram que a Paper Consult não tinha o direito de deduzir o montante de 45680 RON (cerca de 10694 euros), a saber, o montante pago a título de IVA pelas prestações de serviços fornecidas pela Rom Packaging.

22

A reclamação apresentada pela Paper Consult contra o ato da autoridade de controlo fiscal foi considerada improcedente por decisão de 17 de julho de 2014 da Direção Regional das Finanças Públicas de Cluj‑Napoca. O recurso interposto pela Paper Consult em sede de contencioso fiscal contra esta decisão foi, por sua vez, julgado improcedente por sentença cível de 8 de julho de 2015, proferida pelo Tribunalul Bistrița‑Năsăud (Tribunal de Primeira Instância de Bistriţa‑Năsăud).

23

A Paper Consult interpôs recurso dessa decisão para a Curtea de Apel Cluj (Tribunal de Recurso de Cluj, Roménia). Não contestou os elementos factuais apurados pelas autoridades fiscais e pelo Tribunalul Bistrița‑Năsăud (Tribunal de Primeira Instância de Bistriţa‑Năsăud). Em contrapartida, alega que a decisão do presidente da ANAF de 21 de setembro de 2010, na qual a Rom Packaging tinha sido declarada um contribuinte inativo, não lhe foi comunicada, mas apenas publicada na sede da ANAF e na página Internet desta. A Paper Consult alegou que, nestas circunstâncias, esta decisão não lhe era oponível e não podia ser considerada o fundamento da recusa do seu direito à dedução do IVA, considerando que tal medida era contrária ao direito da União.

24

A Paper Consult alega que, para poder beneficiar do direito à dedução do IVA, basta satisfazer as condições previstas no artigo 178.o da Diretiva 2006/112.

25

Contudo, o órgão jurisdicional de reenvio salienta que, segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, a luta contra a evasão fiscal, a fraude e os abusos é um objetivo reconhecido e encorajado pela Diretiva 2006/112, desde que as medidas adotadas para esse fim sejam proporcionadas. Segundo aquele órgão jurisdicional, os contribuintes não suportam um encargo excessivo quando lhes é pedido que procedam a uma verificação mínima, no sítio Internet da ANAF, sobre as pessoas com as quais têm a intenção de contratar, para verificar se as mesmas estão ou não declaradas como «contribuintes inativos». Contudo, o referido órgão jurisdicional constata que não existe jurisprudência do Tribunal de Justiça relativa a tal situação.

26

Nestas condições, a Curtea de Apel Cluj (Tribunal de Recurso de Cluj) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

Opõe‑se a Diretiva 2006/112 à legislação nacional que recusa a um sujeito passivo o direito à dedução do IVA pelo facto de a pessoa a montante, que emitiu a fatura em que figuram separadamente a despesa e o IVA, ter sido declarada inativa pela [A]dministração [F]iscal?

2)

No caso de a resposta à primeira questão ser negativa, opõe‑se a Diretiva 2006/112 à legislação nacional nos termos da qual para poder recusar o direito à dedução do IVA, nas circunstâncias descritas na primeira questão, basta afixar a lista dos contribuintes declarados inativos na sede da [ANAF] e publicar a referida lista no sítio Internet dessa agência na secção “Informações públicas — Informações relativas aos agentes económicos”?»

Quanto à admissibilidade

27

A admissibilidade das questões prejudiciais é contestada pelo Governo romeno, que alega que o órgão jurisdicional de reenvio não explicou as razões pelas quais considera que a resposta a estas questões é necessária para a resolução do litígio que lhe foi submetido, visto que a argumentação da Paper Consult tem exclusivamente por objeto a inoponibilidade da declaração de inatividade e não os próprios efeitos dessa inatividade tal como decorrem da regulamentação nacional.

28

Importa recordar que, segundo jurisprudência constante, no âmbito da cooperação entre o Tribunal de Justiça e os órgãos jurisdicionais nacionais instituída pelo artigo 267.o TFUE, o juiz nacional, a quem foi submetido o litígio e que deve assumir a responsabilidade pela decisão judicial a tomar, tem competência exclusiva para apreciar, tendo em conta as especificidades do processo, tanto a necessidade de uma decisão prejudicial para poder proferir a sua decisão como a pertinência das questões que submete ao Tribunal. Consequentemente, desde que as questões submetidas sejam relativas à interpretação do direito da União, o Tribunal de Justiça é, em princípio, obrigado a pronunciar‑se (acórdãos de 15 de janeiro de 2013, Križan e o., C‑416/10, EU:C:2013:8, n.o 53, e de 21 de dezembro de 2016, Vervloet e o., C‑76/15, EU:C:2016:975, n.o 56).

29

Daqui resulta que as questões relativas ao direito da União gozam de uma presunção de necessidade e de pertinência. O Tribunal de Justiça só pode recusar pronunciar‑se sobre uma questão prejudicial submetida por um órgão jurisdicional nacional quando for manifesto que a interpretação do direito da União solicitada não tem nenhuma relação com a realidade ou com o objeto do litígio no processo principal, quando o problema for hipotético ou ainda quando o Tribunal não dispuser dos elementos de facto e de direito necessários para dar uma resposta útil às questões que lhe são submetidas (acórdãos de 15 de janeiro de 2013, Križan e o., C‑416/10, EU:C:2013:8, n.o 54, e de 21 de dezembro de 2016, Vervloet e o., C‑76/15, EU:C:2016:975, n.o 57).

30

No caso em apreço, o órgão jurisdicional de reenvio indicou na sua decisão que, além do fundamento relativo à inoponibilidade da decisão do presidente da ANAF, a Paper Consult apresentou também um fundamento relativo à observância das condições para poder beneficiar do direito à dedução do IVA. Assim, o órgão jurisdicional de reenvio considerou que era necessário interrogar o Tribunal sobre a interpretação da Diretiva 2006/112.

31

Por conseguinte, não é manifesto que a interpretação do direito da União solicitada pelo órgão jurisdicional de reenvio não tenha nenhuma relação com o objeto do litígio no processo principal nem que seja hipotética.

32

Assim, há que declarar admissíveis as questões submetidas pelo órgão jurisdicional de reenvio.

Quanto ao mérito

33

Com as suas questões, que importa analisar em conjunto, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se a Diretiva 2006/112 deve ser interpretada no sentido de que se opõe a uma regulamentação nacional, como a que está em causa no processo principal, que recusa o direito à dedução do IVA a um sujeito passivo com o fundamento de o operador que lhe forneceu uma prestação de serviço contra uma fatura em que figuram distintamente a despesa e o IVA ter sido declarado inativo pela Administração Fiscal de um Estado‑Membro, declaração de inatividade que é pública e está acessível na Internet a qualquer sujeito passivo nesse Estado.

34

Estas questões dizem respeito, em substância, à ponderação entre, por um lado, o direito a dedução, elemento essencial do mecanismo do IVA, e, por outro, a luta contra a fraude fiscal, objetivo reconhecido e encorajado pela Diretiva 2006/112.

35

No que diz respeito ao direito a dedução, há que recordar que resulta de jurisprudência constante que o direito dos sujeitos passivos de deduzir do IVA de que são devedores o IVA devido ou pago em relação aos bens adquiridos e aos serviços que lhes foram prestados a montante constitui um princípio fundamental do sistema comum do IVA instituído pela legislação da União (v., nomeadamente, acórdãos de 25 de outubro de 2001, Comissão/Itália, C‑78/00, EU:C:2001:579, n.o 28, e de 21 de junho de 2012, Mahagében e Dávid, C‑80/11 e C‑142/11, EU:C:2012:373, n.o 37).

36

Como o Tribunal de Justiça sublinhou reiteradamente, o direito a dedução previsto nos artigos 167.° e seguintes da Diretiva 2006/112 faz parte integrante do mecanismo do IVA e não pode, em princípio, ser limitado. Em especial, esse direito é imediatamente exercido em relação à totalidade dos impostos que tenham onerado as operações efetuadas a montante (v., nomeadamente, acórdãos de 21 de março de 2000, Gabalfrisa e o., C‑110/98 a C‑147/98, C:2000:145, n.o 43, e de 21 de junho de 2012, Mahagében e Dávid, C‑80/11 e C‑142/11, EU:C:2012:373, n.o 38).

37

O regime das deduções visa desonerar inteiramente o empresário do encargo do IVA devido ou pago no quadro de todas as suas atividades económicas. O sistema comum do IVA garante, por conseguinte, a neutralidade quanto à carga fiscal de todas as atividades económicas, independentemente dos respetivos fins ou resultados, desde que essas atividades estejam, em princípio, elas próprias sujeitas a IVA (v., nomeadamente, acórdãos de 21 de março de 2000, Gabalfrisa e o., C‑110/98 a C‑147/98, EU:C:2000:145, n.o 44, e de 21 de junho de 2012, Mahagében e Dávid, C‑80/11 e C‑142/11, EU:C:2012:373, n.o 39).

38

Não obstante, o direito à dedução do IVA está subordinado à observância de exigências ou de requisitos tanto materiais como de natureza formal.

39

No que se refere às exigências ou aos requisitos materiais, resulta do artigo 168.o, alínea a), da Diretiva 2006/112 que, para poder beneficiar do direito a dedução, é necessário, por um lado, que o interessado seja um «sujeito passivo» na aceção desta diretiva e, por outro, que os bens ou serviços invocados para basear esse direito sejam utilizados a jusante pelo sujeito passivo para os fins das suas próprias operações tributadas e que, a montante, esses bens sejam entregues ou esses serviços prestados por outro sujeito passivo (v., neste sentido, nomeadamente, acórdãos de 6 de setembro de 2012, Tóth, C‑324/11, EU:C:2012:549, n.o 26, e de 22 de outubro de 2015, PPUH Stehcemp, C‑277/14, EU:C:2015:719, n.o 28 e jurisprudência referida).

40

Quanto às modalidades de exercício do direito a dedução, que se assemelham a exigências ou a requisitos de natureza formal, o artigo 178.o, alínea a), da Diretiva 2006/112 prevê que o sujeito passivo deve possuir uma fatura emitida em conformidade com os artigos 220.° a 236.° e com os artigos 238.° a 240.° da mesma.

41

Segundo jurisprudência constante, o princípio fundamental da neutralidade do IVA exige que a dedução deste imposto pago a montante seja concedida se as exigências materiais estiverem satisfeitas, mesmo que os sujeitos passivos tenham omitido certas exigências formais (acórdãos de 12 de julho de 2012, EMS‑Bulgaria Transport, C‑284/11, EU:C:2012:458, n.o 62 e jurisprudência referida, e de 28 de julho de 2016, Astone, C‑332/15, EU:C:2016:614, n.o 45).

42

No entanto, pode assim não suceder se a violação dessas exigências formais tiver por efeito impedir a prova irrefutável de que as exigências materiais foram observadas (acórdãos de 12 de julho de 2012, SEM‑Bulgaria Transport, C‑284/11, EU:C:2012:458, n.o 71, e de 28 de julho de 2016, Astone, C‑332/15, EU:C:2016:614, n.o 46). Ora, resulta dos autos, como salientou o advogado‑geral nos n.os 40 a 43 das suas conclusões, que tal não é o caso no processo principal.

43

Do mesmo modo, decorre de jurisprudência constante que o direito a dedução pode ser recusado quando se provar, com base em elementos objetivos, que esse direito é invocado de maneira fraudulenta ou abusiva. Com efeito, a luta contra a fraude, a evasão fiscal e os eventuais abusos é um objetivo reconhecido e encorajado pela Diretiva 2006/112, e os sujeitos passivos não podem, de maneira fraudulenta ou abusiva, invocar as normas do direito da União (acórdão de 21 de junho de 2012, Mahagében e Dávid, C‑80/11 e C‑142/11, EU:C:2012:373, n.os 42 e 43, e jurisprudência referida).

44

No que diz respeito à regulamentação nacional em causa no processo principal, resulta dos elementos submetidos ao Tribunal de Justiça que a mesma tem por objetivo lutar contra a fraude ao IVA, sancionando, através da recusa do direito a dedução, um comportamento que pode contribuir para atrasar a deteção de tal fraude ou, pelo menos, uma falta de pagamento do IVA pelos contribuintes que não preenchem as obrigações declarativas previstas pela lei, ou que se subtraiam ao controlo fiscal declarando informações de identificação da sede social que não permitem à autoridade fiscal identificá‑la, ou ainda em relação aos quais as autoridades fiscais constataram que não exercem a sua atividade na sede social ou no domicílio fiscal declarado.

45

A Comissão Europeia salientou nas suas observações, fazendo referência a dados que figuram num comunicado de imprensa que publicou em 4 de setembro de 2015, que a fraude ao IVA é particularmente importante na Roménia uma vez que, durante o ano de 2013, a diferença entre as receitas previstas em matéria de IVA e o IVA efetivamente cobrado foi de 41,1%.

46

No mesmo sentido, o Governo romeno sublinhou, na audiência, que foram as dificuldades encontradas pelas autoridades na luta contra a fraude ao IVA que levaram o legislador romeno a instituir um mecanismo de prevenção da evasão fiscal através da declaração de inatividade de tais contribuintes, cujo comportamento fiscal incorreto impede a deteção de irregularidades à cobrança do IVA e constitui o indício da prática de uma fraude fiscal. Além disso, a falta de pagamento do IVA repercute‑se no preço de venda dos produtos e dos serviços e proporciona ao vendedor uma vantagem competitiva que aumenta o volume das vendas, pelo que a imposição de sanções pecuniárias não é suficiente para lutar contra a fraude ao IVA.

47

Não há dúvida de que a prossecução de tal objetivo constitui a execução da obrigação dos Estados‑Membros, que decorre do artigo 4.o, n.o 3, TUE, do artigo 325.o TFUE, do artigo 2.o, do artigo 250, n.o 1, e do artigo 273.o da Diretiva 2006/112, de tomar todas as medidas legislativas e administrativas necessárias para garantir a cobrança da integralidade do IVA devido no seu território e de lutar contra a fraude (acórdão de 17 de dezembro de 2015, WebMindLicenses, C‑419/14, EU:C:2015:832, n.o 41, e jurisprudência referida). Além disso, existe uma relação direta entre a cobrança das receitas provenientes do IVA no respeito do direito da União aplicável e a colocação à disposição do orçamento da União dos recursos IVA correspondentes, uma vez que qualquer lacuna na cobrança das primeiras está potencialmente na origem de uma redução dos segundos (v. acórdão de 26 de fevereiro de 2013, Åkerberg Fransson, C‑617/10, EU:C:2013:105, n.o 26).

48

A este respeito, há que recordar que os Estados‑Membros são obrigados a verificar as declarações dos sujeitos passivos, a contabilidade destes e outros documentos pertinentes, bem como a calcular e a cobrar o imposto devido (v. acórdão de 9 de julho de 2015, Cabinet Medical Veterinar Dr. Tomoiagă Andrei, C‑144/14, EU:C:2015:452, n.o 26 e jurisprudência referida).

49

Em conformidade com o artigo 273.o, primeiro parágrafo, da Diretiva 2006/112, os Estados‑Membros podem prever outras obrigações além das impostas por esta diretiva, quando considerem essas obrigações necessárias para assegurar a cobrança exata do IVA e para evitar a fraude.

50

Contudo, as medidas adotadas pelos Estados‑Membros não devem ir além do que é necessário para alcançar esses objetivos. Não podem, por isso, ser utilizadas de forma a porem sistematicamente em causa o direito a dedução do IVA e, portanto, a neutralidade do IVA (acórdãos de 21 de março de 2000, Gabalfrisa e o., C‑110/98 a C‑147/98, EU:C:2000:145, n.o 52, e de 21 de junho de 2012, Mahagében e Dávid, C‑80/11 e C‑142/11, EU:C:2012:373, n.o 57).

51

O Tribunal de Justiça já declarou em várias ocasiões que a Administração não pode obrigar o sujeito passivo a realizar verificações complexas e aprofundadas relativamente ao seu fornecedor, transferindo, de facto, para o sujeito passivo os atos de controlo que incumbem a essa Administração (v., neste sentido, acórdãos de 21 de junho de 2012, Mahagében e Dávid, C‑80/11 e C‑142/11, EU:C:2012:373, n.o 65, e de 31 de janeiro de 2013, Stroy trans, C‑642/11, EU:C:2013:54, n.o 50).

52

Em contrapartida, não é contrário ao direito da União exigir que um operador tome todas as medidas que lhe possam ser razoavelmente exigidas para garantir que a operação que efetua não implica a sua participação numa fraude fiscal (v., neste sentido, acórdãos de 27 de setembro de 2007, Teleos e o., C‑409/04, EU:C:2007:548, n.os 65 e 68, e de 21 de junho de 2012, Mahagében e Dávid, C‑80/11 e C‑142/11, EU:C:2012:373, n.o 54).

53

A este respeito, há que constatar que a regulamentação nacional em causa no processo principal não transfere para o sujeito passivo os atos de controlo que incumbem à Administração, mas informa‑o do resultado de um inquérito administrativo do qual resulta que o contribuinte declarado inativo deixa de ser controlável pela administração competente, quer porque esse contribuinte deixou de cumprir as obrigações declarativas impostas por lei, quer porque apresentou informações de identificação da sede social que não permitem à autoridade fiscal em causa identificar essa sede, ou ainda porque não exerce a sua atividade na sede social ou no domicílio fiscal declarado.

54

A única obrigação imposta ao sujeito passivo consiste, com efeito, em consultar a lista dos contribuintes declarados inativos afixada na sede da ANAF e publicada na página sua Internet, sendo tal verificação, de resto, fácil de efetuar.

55

Assim, afigura‑se que, ao obrigar o sujeito passivo a efetuar esta verificação, a legislação nacional prossegue um objetivo que é legítimo e mesmo imposto pelo direito da União, a saber, assegurar a cobrança exata do IVA e evitar a fraude, e que essa verificação pode ser razoavelmente exigida a um operador económico. Não obstante, importa verificar se esta legislação não vai além do que é necessário para alcançar o objetivo prosseguido.

56

Embora a falta de apresentação das declarações fiscais previstas pela lei possa ser considerada um indício de fraude, não é uma prova irrefutável da existência de uma fraude ao IVA. Além disso, resulta dos elementos fornecidos ao Tribunal de Justiça que, sob reserva das verificações a efetuar pelo órgão jurisdicional de reenvio, mesmo que o contribuinte regularizasse a sua situação e obtivesse o cancelamento da sua inscrição na lista dos contribuintes inscritos como inativos, a sanção prevista no artigo 11.o, 1 ter, do Código dos Impostos persistiria, pelo que o adquirente do bem ou do serviço não poderia recuperar o direito à dedução do IVA. Em contrapartida, o artigo 11.o, n.o 1 bis, do Código dos Impostos prevê que o contribuinte «reativado» é autorizado, depois da sua «reativação», a recuperar o IVA cuja dedução lhe foi recusada durante o período de inatividade.

57

A este respeito, o Governo romeno indicou que a lei tinha sido alterada e que, desde 1 de janeiro de 2017, na hipótese de uma reativação de um contribuinte declarado inativo, os efeitos fiscais da inativação são anulados, tanto para o contribuinte visado como para os seus parceiros comerciais que recuperam o direito à dedução do IVA relativo às transações celebradas durante o período de inatividade.

58

Segundo a Paper Consult, a Rom Packaging pagou ao Tesouro Público o IVA cobrado em razão do contrato celebrado com a Paper Consult. Em resposta a uma questão colocada pelo Tribunal de Justiça, o Governo romeno confirmou que os montantes correspondentes ao IVA devido pela Rom Packaging tinham sido efetivamente pagos, mas que não era possível verificar se esses montantes eram relativos às transações celebradas entre as duas sociedades uma vez que a Rom Packaging não tinha apresentado as suas liquidações de IVA.

59

Sob reserva das verificações a efetuar pelo órgão jurisdicional de reenvio, o artigo 11.o, n.o 1 ter, do Código dos Impostos, na versão aplicável aos factos do processo principal, não prevê uma regularização em benefício do sujeito passivo a jusante apesar da prova de pagamento do IVA pelo sujeito passivo a montante, uma vez que o não reconhecimento do direito a dedução é definitivo.

60

Ora, a impossibilidade, para o sujeito passivo, de demonstrar que as transações celebradas com o operador declarado inativo satisfazem as condições previstas pela Diretiva 2006/112 e, nomeadamente, que o IVA foi pago ao Tesouro Público por este operador, ultrapassa aquilo que é necessário para alcançar o objetivo legítimo prosseguido por esta diretiva.

61

Por conseguinte, há que responder às questões submetidas que a Diretiva 2006/112 deve ser interpretada no sentido de que se opõe a uma regulamentação nacional, como a que está em causa no processo principal, por força da qual o direito à dedução do IVA é recusado a um sujeito passivo com o fundamento de o operador que lhe forneceu uma prestação de serviço contra uma fatura em que figuram distintamente a despesa e o IVA ter sido declarado inativo pela Administração Fiscal de um Estado‑Membro, declaração de inatividade que é pública e está acessível na Internet a qualquer sujeito passivo nesse Estado, quando essa recusa do direito a dedução é sistemática e definitiva, não permitindo que seja feita a prova da inexistência de fraude ou de perda de receita fiscal.

Quanto à limitação no tempo dos efeitos do acórdão do Tribunal de Justiça

62

O Governo romeno pediu ao Tribunal, no caso de considerar que o direito da União se opõe a uma lei como a que está em causa no processo principal, para limitar no tempo os efeitos do acórdão a proferir.

63

Em apoio do seu pedido, o Governo romeno invoca, em primeiro lugar, a sua boa‑fé, resultante de dúvidas objetivas no que diz respeito ao alcance da jurisprudência do Tribunal de Justiça assim como do seguimento que foi dado a um procedimento «EU Pilot» sobre a regulamentação nacional em causa no processo principal, no âmbito do qual, com base na resposta das autoridades romenas, a Comissão arquivou o processo, o que levou estas autoridades a pensar que esta regulamentação era compatível com o direito da União. Em segundo lugar, o Governo romeno destaca as graves consequências financeiras caso, na sequência do acórdão do Tribunal de Justiça, devesse ser concedida a dedução do IVA a todos os operadores que tenham celebrado transações com operadores declarados inativos desde 2007.

64

A este respeito, importa recordar que, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, a interpretação que este faz de uma regra de direito da União, no exercício da competência que lhe é conferida pelo artigo 267.o TFUE, clarifica e precisa o significado e o alcance dessa regra, tal como deve ser ou deveria ter sido entendida e aplicada desde a data da sua entrada em vigor. Donde se conclui que a regra assim interpretada pode e deve ser aplicada pelo juiz mesmo a relações jurídicas surgidas e constituídas antes de ser proferido o acórdão que decida do pedido de interpretação, se, além disso, estiverem reunidas as condições que permitem submeter aos órgãos jurisdicionais competentes um litígio relativo à aplicação da referida regra (v. acórdãos de 10 de maio de 2012, Santander Asset Management SGIIC e o., C‑338/11 a C‑347/11, EU:C:2012:286, n.o 58, e de 22 de setembro de 2016, Microsoft Mobile Sales International e o., C‑110/15, EU:C:2016:717, n.o 59).

65

Só a título verdadeiramente excecional pode o Tribunal, aplicando o princípio geral da segurança jurídica inerente à ordem jurídica da União, ser levado a limitar a possibilidade de qualquer interessado invocar uma disposição por si interpretada para pôr em causa relações jurídicas estabelecidas de boa‑fé. Para decidir esta limitação, é necessário que estejam preenchidos dois critérios essenciais, a saber, a boa‑fé dos meios interessados e o risco de perturbações graves (v. acórdãos de 10 de maio de 2012, Santander Asset Management SGIIC e o., C‑338/11 a C‑347/11, EU:C:2012:286, n.o 59, e de 22 de setembro de 2016, Microsoft Mobile Sales International e o., C‑110/15, EU:C:2016:717, n.o 60).

66

Mais especificamente, o Tribunal só recorreu a esta solução em circunstâncias bem precisas, nomeadamente quando existia um risco de repercussões económicas graves devidas em especial ao grande número de relações jurídicas constituídas de boa‑fé com fundamento na regulamentação considerada validamente em vigor e quando se verificava que os particulares e as autoridades nacionais tinham sido incitados a adotar um comportamento não conforme com o direito da União em razão de uma incerteza objetiva e importante quanto ao alcance das disposições do direito da União, incerteza para a qual tinham eventualmente contribuído os próprios comportamentos adotados por outros Estados‑Membros ou pela Comissão (v. acórdão de 10 de maio de 2012, Santander Asset Management SGIIC e o., C‑338/11 a C‑347/11, EU:C:2012:286, n.o 60, e de 22 de setembro de 2016, Microsoft Mobile Sales International e o., C‑110/15, EU:C:2016:717, n.o 61).

67

No que respeita às dúvidas apresentadas pelo Governo romeno relativas à interpretação do direito da União, cabe recordar que a recusa do direito à dedução do IVA oposta a sujeitos passivos constitui uma exceção ao princípio fundamental do sistema comum do IVA cuja legalidade, segundo jurisprudência constante, só é admitida em circunstâncias excecionais.

68

O encerramento de um procedimento «EU Pilot» pela Comissão não altera esta análise. Com efeito, o encerramento desse procedimento informal, que não é regulado pelas disposições dos Tratados mas implica uma cooperação voluntária entre a Comissão e os Estados‑Membros, visando geralmente tanto verificar a aplicação correta do direito da União como resolver as questões colocadas por esta aplicação numa fase precoce, em nada prejudica a faculdade da Comissão de dar início a um procedimento formal de incumprimento ao abrigo do artigo 258.o TFUE. Em todo o caso, a atitude da Comissão não pode servir de base à confiança legítima de um Estado‑Membro quanto à conformidade da sua regulamentação nacional com o direito da União quando, como no presente processo, decorre da jurisprudência que não existe uma incerteza objetiva e importante quanto ao alcance do direito da União, em particular das disposições da Diretiva 2006/112.

69

Uma vez que o critério relativo à boa‑fé dos meios interessados não está preenchido no que respeita às autoridades romenas, não é necessário verificar se o critério relativo à gravidade das repercussões económicas está preenchido.

70

Resulta destas considerações que não há que limitar no tempo os efeitos do presente acórdão.

Quanto às despesas

71

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Segunda Secção) declara:

 

A Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, deve ser interpretada no sentido de que se opõe a uma regulamentação nacional, como a que está em causa no processo principal, por força da qual o direito à dedução do imposto sobre o valor acrescentado é recusado a um sujeito passivo com o fundamento de o operador que lhe forneceu uma prestação de serviço contra uma fatura em que figuram distintamente a despesa e o imposto sobre o valor acrescentado ter sido declarado inativo pela Administração Fiscal de um Estado‑Membro, declaração de inatividade que é pública e está acessível na Internet a qualquer sujeito passivo nesse Estado, quando essa recusa do direito a dedução é sistemática e definitiva, não permitindo que seja feita a prova da inexistência de fraude ou de perda de receita fiscal.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: romeno.

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