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Document 62006CJ0231

    Acórdão do Tribunal de Justiça (Primeira Secção) de 21 de Junho de 2007.
    Office national des pensions contra Emilienne Jonkman (C-231/06) e Hélène Vercheval (C-232/06) e Noëlle Permesaen contra Office national des pensions (C-233/06).
    Pedido de decisão prejudicial: Cour du travail de Bruxelles - Bélgica.
    Igualdade de tratamento entre homens e mulheres - Regime legal de pensões de reforma - Directiva 79/7/CEE - Hospedeiras de bordo - Concessão de uma pensão igual à dos comissários de bordo - Pagamento de contribuições de regularização de uma única vez - Pagamento de juros - Princípio da efectividade - Obrigações de um Estado-Membro decorrentes de um acórdão prejudicial.
    Processos apensos C-231/06 a C-233/06.

    Colectânea de Jurisprudência 2007 I-05149

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:2007:373

    Partes
    Fundamentação jurídica do acórdão
    Parte decisória

    Partes

    Nos processos apensos C‑231/06 a C‑233/06,

    que têm por objecto pedidos de decisão prejudicial nos termos do artigo 234.° CE, apresentados pela cour du travail de Bruxelles (Bélgica), por decisões de 10 de Maio de 2006, entrados no Tribunal de Justiça em 22 de Maio de 2006, nos processos

    Office national des pensions

    contra

    Emilienne Jonkman (C‑231/06),

    Hélène Vercheval (C‑232/06),

    e

    Noëlle Permesaen (C‑233/06)

    contra

    Office national des pensions,

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção),

    composto por: P. Jann, presidente de secção, R. Schintgen, A. Borg Barthet, M. Ilešič (relator) e E. Levits, juízes,

    advogada‑geral: J. Kokott,

    secretário: C. Strömholm, administradora,

    vistos os autos e após a audiência de 1 de Março de 2007,

    vistas as observações apresentadas:

    – em representação de E. Jonkman, H. Vercheval e N. Permesaen, por J. Heynderickx, avocat,

    – em representação do Office national des pensions, por R. Dupont e M. Willemet, avocats,

    – em representação do Governo italiano, por I. M. Braguglia, na qualidade de agente, assistido por W. Ferrante, avvocato dello Stato,

    – em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por G. Rozet e M. van Beek, na qualidade de agentes,

    ouvidas as conclusões da advogada‑geral na audiência de 29 de Março de 2007,

    profere o presente

    Acórdão

    Fundamentação jurídica do acórdão

    1. Os pedidos de decisão prejudicial têm por objecto a interpretação da Directiva 79/7/CEE do Conselho, de 19 de Dezembro de 1978, relativa à realização progressiva do princípio da igualdade de tratamento entre homens e mulheres em matéria de segurança social (JO 1979, L 6, p. 24; EE 05 F2 p. 174).

    2. Estes pedidos foram apresentados no âmbito de litígios entre E. Jonkman, H. Vercheval e N. Permesaen e o Office national des pensions (a seguir «ONP»).

    Litígios nos processos principais e questões prejudiciais

    3. Após terem trabalhado como hospedeiras de bordo na Sabena SA, sociedade anónima belga de navegação aérea, E. Jonkman, H. Vercheval e N. Permesaen apresentaram um pedido de pensão de reforma como pessoal de voo da aviação civil. Apresentaram os seus pedidos, respectivamente, no decurso de 1992, 1995 e 1996, invocando os seus direitos à pensão a partir, respectivamente, de 1 de Março de 1993, 1 de Julho de 1996 e 1 de Fevereiro de 1997.

    4. O ONP concedeu‑lhes uma pensão. Contudo, E. Jonkman, H. Vercheval e N. Permesaen contestaram as decisões do ONP perante o tribunal du travail de Bruxelles no que se refere ao primeiro caso e no de Nivelles quanto aos outros dois casos, alegando que o cálculo das suas pensões teve por base disposições discriminatórias e que deveriam receber uma pensão calculada de acordo com as mesmas regras aplicadas aos seus colegas do sexo masculino.

    5. Mais exactamente, resultava de uma comparação das notas de cálculo das pensões das interessadas que os montantes de remuneração tidos em conta pelo ONP eram, para o período de 1 de Janeiro de 1964 a 31 de Dezembro de 1980, claramente mais baixos no caso das hospedeiras do que no caso dos comissários de bordo, não obstante as suas remunerações‑base serem iguais.

    6. Essa situação explicava‑se pela diferença de tratamento entre, por um lado, as hospedeiras de bordo e, por outro, os outros membros do pessoal de cabine durante o período acima referido. Com efeito, por Decreto real de 10 de Janeiro de 1964 que determinava as contribuições destinadas ao financiamento do regime de pensões de reforma e de sobrevivência do pessoal de voo da aviação civil, bem como as modalidades do respectivo pagamento ( Moniteur belge de 17 de Janeiro de 1964, p. 464), que entrou em vigor em 1 de Janeiro de 1964, tinha sido criado um regime especial de pensões de reforma para o pessoal de voo da aviação civil, do qual estavam, contudo, excluídas as hospedeiras. Estas ficavam sujeitas ao regime geral de pensões de reforma dos trabalhadores por contra de outrem, que se caracterizava pela tomada em consideração, para a cobrança das contribuições e o cálculo da pensão, de uma quota de remuneração menos importante do que a que servia de base para o cálculo no regime especial do pessoal de voo da aviação civil.

    7. A razão da exclusão das hospedeiras de bordo deste regime especial de pensões de reforma residia na impossibilidade de as mesmas, à época, poderem progredir na carreira enquanto membros do pessoal de voo para além dos 40 anos de idade. Não podiam, portanto, realizar uma carreira completa. Por essas razões, o Reino da Bélgica decidiu não as integrar no regime especial instituído.

    8. A problemática da carreira na Sabena SA e do regime de pensões das hospedeiras de bordo foi objecto de vários processos nos órgãos jurisdicionais belgas, alguns dos quais foram decididos com base num acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça na sequência de um pedido de decisão prejudicial (acórdãos de 25 de Maio de 1971, Defrenne, 80/70, Colect., p. 161; de 8 de Abril de 1976, Defrenne, 43/75, Colect., p. 193; e de 15 de Junho de 1978, Defrenne, 149/77, Colect., p. 463). Por Decreto real de 27 de Junho de 1980, que alterou o Decreto real de 3 de Novembro de 1969, que fixou para o pessoal de voo da aviação civil as regras especiais para a concessão do direito à pensão e as modalidade especiais de aplicação do Decreto real n.° 50, de 24 de Outubro de 1967, relativo às pensões de reforma e de sobrevivência dos trabalhadores por conta de outrem ( Moniteur belge de 23 de Agosto de 1980, p. 9700), que entrou em vigor em 1 de Janeiro de 1981, as hospedeiras de bordo foram finalmente integradas no regime especial do pessoal de voo da aviação civil. Posteriormente, o legislador belga, por Decreto real de 28 de Março de 1984, com o mesmo título que o anterior ( Moniteur belge de 3 de Abril de 1984, p. 4100), instituiu uma regularização a favor das hospedeiras de bordo para o período de 1 de Janeiro de 1964 a 31 de Dezembro de 1980. Tendo este decreto real sido anulado por acórdão do Conseil d’État de 7 de Setembro de 1987, foi adoptado um novo Decreto real, em 25 de Junho de 1997, também com o mesmo título ( Moniteur belge de 31 de Julho de 1997, p. 19635, a seguir «Decreto real de 25 de Junho de 1997»), com o objectivo de obviar à diferença de tratamento entre as hospedeiras de bordo e os comissários de bordo no período compreendido entre 1 de Janeiro de 1964 e 31 de Dezembro de 1980.

    9. Nos termos do Decreto real de 25 de Junho de 1997, as hospedeiras de bordo que tenham trabalhado no período de 1 de Janeiro de 1964 a 31 de Dezembro de 1980 passam a ter direito a uma pensão de reforma calculada de acordo com as mesmas modalidades aplicáveis ao comissários de bordo, mediante o pagamento, de uma só vez, das contribuições de regularização acrescidas de juros à taxa de 10% ao ano. As ditas contribuições de regularização são constituídas essencialmente pela diferença entre as contribuições pagas pelas hospedeiras de bordo no período de 1 de Janeiro de 1964 a 31 de Dezembro 1980 e as contribuições mais elevadas pagas pelos comissários de bordo durante o mesmo período.

    10. E. Jonkman, H. Vercheval e N. Permesaen consideram que a regularização prevista pelo Decreto real de 25 de Junho de 1997 não permite eliminar na totalidade a discriminação entre as hospedeiras e os comissários de bordo.

    11. Por decisões de 17 de Novembro de 1997 e 9 de Janeiro de 1998, proferidas, respectivamente, pelo tribunal du travail de Bruxelles e pelo de Nivelles, foi dado provimento aos recursos de E. Jonkman e H. Vercheval, com o fundamento de que o modo de cálculo das respectivas pensões é discriminatório.

    12. No caso de N. Permesaen, o tribunal du travail de Nivelles, por decisão de 26 de Dezembro de 2003, deu provimento parcial aos argumentos do ONP. Declarou que não constitui discriminação a atribuição de uma pensão idêntica à dos trabalhadores masculinos sujeita à condição do pagamento das contribuições que deveriam ter sido pagas se a trabalhadora estivesse inscrita nesse regime durante a sua carreira profissional. Em contrapartida, classificou como discriminatórios os juros à taxa anual de 10%.

    13. O ONP recorreu dos acórdãos de 17 de Novembro de 1997 e 9 de Janeiro de 1998 para a cour du travail de Bruxelles. N. Permesaen recorreu para esta mesma jurisdição da decisão de 26 de Dezembro de 2003.

    14. A cour du travail de Bruxelles entende que as modalidades práticas do sistema de regularização instituído pelo Decreto real de 25 de Junho 1997 são susceptíveis de ser discriminatórias. Observa, a este respeito, que o pagamento de uma só vez de um capital bastante elevado representa para um pensionista um obstáculo não negligenciável. A cour du travail evoca também o aspecto fiscal deste sistema de regularização, uma vez que as contribuições eram à época fiscalmente dedutíveis para os comissários de bordo, o que não é o caso para as hospedeiras de bordo. Observa, por último, que a taxa de juro aplicada é superior à taxa legal dos juros de mora e compensatórios, bem como à taxa bancária.

    15. A cour du travail de Bruxelles entende que a solução dos litígios nos processos principais depende da interpretação da Directiva 79/7. Por conseguinte, decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

    «1) A Directiva 79/7 deve ser interpretada no sentido de que autoriza um Estado‑Membro a adoptar uma legislação que visa permitir a uma categoria de pessoas de determinado sexo, inicialmente discriminada, beneficiar do regime de pensões aplicável à categoria de pessoas do outro sexo, mediante o pagamento retroactivo de contribuições (pagamento de uma só vez de um montante consideravelmente elevado) que, por força da legislação aplicável nesse Estado, já prescreveram para esta última categoria de pessoas?

    Em caso de resposta afirmativa à questão anterior, a Directiva 79/7 deve ser interpretada no sentido de que exige que um Estado‑Membro adapte a legislação contrária a esta disposição quando um acórdão do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias declare a existência desse conflito de normas e, o mais tardar, dentro do prazo de prescrição aplicável ao crédito de contribuições criado com a adopção desta legislação?

    2) A Directiva 79/7 deve ser interpretada no sentido de que autoriza um Estado‑Membro a adoptar uma legislação que visa permitir a uma categoria de pessoas de determinado sexo, inicialmente discriminada, beneficiar do regime de pensões aplicável à categoria de pessoas do outro sexo, mediante o pagamento de importantes juros de mora, que, por força da legislação aplicável nesse Estado, já prescreveram para esta última categoria de pessoas?

    Em caso de resposta afirmativa à questão anterior, a Directiva 79/7 deve ser interpretada no sentido de que exige que um Estado‑Membro adapte a legislação contrária a esta disposição quando um acórdão do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias declare a existência desse conflito de normas e, o mais tardar, dentro do prazo de prescrição aplicável aos juros de mora que emergem da adopção desta legislação?»

    Quanto às questões prejudiciais

    Considerações liminares

    16. Importa constatar, desde já, que é pacífico para as partes nos processos principais que foi discriminatória a exclusão inicial das hospedeiras de bordo do regime especial de pensões do pessoal de voo da aviação civil.

    17. Também a título liminar, importa observar que o artigo 141.°, n. os  1 e 2, CE, relativo ao princípio da igualdade de remuneração entre trabalhadores masculinos e trabalhadores femininos não é aplicável no caso vertente, uma vez que o referido artigo se aplica unicamente aos regimes profissionais de pensões e não aos regimes legais de pensões (acórdãos de 25 de Maio de 1971, Defrenne, já referido, n. os  10 a 13; de 6 de Outubro de 1993, Tem Oever, C‑109/91, Colect., p. I‑4879, n.° 9; e de 21 de Julho de 2005, Vergani, C‑207/04, Colect., p. I‑7453, n. os  22 e 23).

    18. O órgão jurisdicional de reenvio colocou, portanto, correctamente as suas questões à luz da Directiva 79/7, que se aplica aos regimes legais em matéria de segurança social, incluindo os regimes legais de pensões (acórdão de 1 de Julho de 1993, van Cant, C‑154/92, Colect., p. I‑3811, n. os  10 e 11).

    19. O artigo 4.°, n.° 1, desta directiva proíbe «qualquer discriminação em razão do sexo […], especialmente no que respeita […] ao âmbito dos regimes e às condições de acesso […], à obrigação de pagar as cotizações e ao cálculo destas, [bem como] ao cálculo das prestações». Esta disposição pode ser invocada por um particular perante um órgão jurisdicional nacional a fim de conduzir este a afastar qualquer disposição nacional não conforme com o mesmo (acórdãos de 13 de Dezembro de 1989, Ruzius‑Wilbrink, C‑102/88, Colect., p. I‑4311, n.° 19, e de 27 de Outubro de 1993, van Gemert‑Derks, C‑337/91, Colect., p. I‑5435, n.° 31).

    Quanto à exigência do pagamento de contribuições de regularização

    20. Na primeira parte das suas questões, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, se a Directiva 79/7 se opõe a que um Estado‑Membro, quando adopta uma legislação no sentido de permitir às pessoas de determinado sexo, inicialmente discriminadas, beneficiar do regime de pensões aplicável às pessoas do outro sexo, faça depender essa inscrição do pagamento, de uma única vez e acrescido de juros à taxa anual de 10%, de contribuições de regularização constituídas pela diferença entre as contribuições pagas pelas pessoas inicialmente discriminadas no decurso do período durante o qual a discriminação se verificou e as contribuições mais elevadas pagas pela outra categoria de pessoas durante esse mesmo período.

    21. Resulta das observações apresentadas ao Tribunal de Justiça que as partes nos processos principais, a Comissão das Comunidades Europeias e o Governo italiano estão todos de acordo em que não é em si mesma discriminatória a condição principal a que estão sujeitas as hospedeiras de bordo pelo Decreto real de 25 de Junho 1997 para que a sua actividade profissional durante o período de 1 de Janeiro de 1964 a 31 de Dezembro de 1980 seja tida em consideração do mesmo modo que a dos comissários de bordo, a saber, o pagamento de um montante que representa a diferença entre as contribuições pagas pelas mesmas ao longo do referido período e as contribuições mais elevadas pagas pelos comissários de bordo durante o mesmo período.

    22. Este ponto de vista é correcto. Como o Tribunal de Justiça já decidiu no âmbito de litígios relativos a regimes profissionais de pensões, o facto de um trabalhador se poder inscrever retroactivamente num tal regime não lhe permite eximir‑se ao pagamento das quotizações referentes ao período de inscrição em causa (acórdãos de 28 de Setembro de 1994, Fisscher, C‑128/93, Colect., p. I‑4583, n.° 37; de 24 de Outubro de 1996, Dietz, C‑435/93, Colect., p. I‑5223, n.° 34; e de 16 de Maio de 2000, Preston e o., C‑78/98, Colect., p. I‑3201, n.° 39).

    23. Com efeito, no caso de ter sido sofrida uma discriminação, o restabelecimento da igualdade de tratamento deve colocar o trabalhador discriminado na mesma situação que a dos trabalhadores do outro sexo. Por conseguinte, esse trabalhador não pode exigir, nomeadamente no plano financeiro, um tratamento mais favorável que o que teria tido se tivesse estado regularmente inscrito (acórdãos, já referidos, Fisscher, n. os  35 e 36, e Preston e o., n.° 38).

    24. É de concluir que esta jurisprudência é aplicável por analogia aos casos de inscrição num regime legal de pensões. Por conseguinte, um Estado‑Me mbro, quando adopta uma legislação que visa permitir às pessoas de determinado sexo, inicialmente discriminadas, beneficiar do regime de pensões aplicável às pessoas do outro sexo, pode optar por restabelecer a igualdade de tratamento exigindo o pagamento de uma soma que representa a diferença entre as contribuições pagas pelas pessoas inicialmente discriminadas no período em que a discriminação ocorreu e as contribuições mais elevadas pagas pela outra categoria de pessoas durante o mesmo período. O facto de esta última categoria de pessoas beneficiar entretanto da prescrição da acção para cobrança das suas contribuições não pode impedir uma regularização como a acima descrita, desde que, como salientou a advogada‑geral no n.° 70 das suas conclusões, seja fixado um prazo de prescrição idêntico para os novos inscritos.

    25. Além disso, para evitar qualquer discriminação inversa, as contribuições de regularização podem ser acrescidas de juros visando compensar a depreciação monetária. Com efeito, como observou a advogada‑geral no n.° 38 das suas conclusões, e com a ressalva formulada no n.° 39 das mesmas, essa majoração garante que as contribuições pagas pelos novos inscritos não são na realidade menos elevadas do que as pagas pelos trabalhadores inscritos desde a criação do regime de pensões.

    26. Pelas razões enunciadas pela advogada‑geral nos n. os  64 e 65 das suas conclusões, as considerações precedentes limitam‑se à hipótese de a regularização dos direitos à pensão produzir todos os seus efeitos desde a data da passagem à reforma. De facto, uma regularização oferecida a pessoas já reformadas e que exige o pagamento de um montante que representa a diferença entre as contribuições pagas por estas no período em que foram discriminadas e as contribuições mais elevadas pagas pela outra categoria de pessoas durante esse mesmo período só põe termo ao tratamento desigual se conduzir ao mesmo cálculo dos direitos à pensão para a totalidade da duração da reforma de cada um dos interessados.

    27. Resulta do exposto que a Directiva 79/7 não se opõe a que um Estado‑Membro, quando adopta uma legislação que visa permitir às pessoas de determinado sexo, inicialmente discriminadas, beneficiar, em relação à totalidade da duração da sua reforma, do regime de pensões aplicável às pessoas do outro sexo, faça depender essa inscrição do pagamento de contribuições de regularização constituídas pela diferença entre as contribuições pagas pelas pessoas inicialmente discriminadas durante o período em que a discriminação ocorreu e as contribuições mais elevadas pagas pela outra categoria de pessoas durante esse mesmo período, acrescidas de juros que compensem a depreciação monetária.

    Quanto às modalidades de pagamento das contribuições de regularização

    28. Na medida em que o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se o Estado‑Membro pode exigir que o pagamento das contribuições de regularização seja efectuado de uma só vez e que seja acrescido de juros a uma taxa anual de 10%, importa observar que qualquer medida tomada por um Estado‑Membro para se conformar com as normas de direito comunitário, como o princípio da igualdade de tratamento entre homens e mulheres, deve ser efectiva (v., neste sentido, acórdãos Fisscher, já referido, n.° 31; Preston e o., já referido, n. os  40 a 42; de 20 de Março de 2003, Kutz‑Bauer, C‑187/00, Colect., p. I‑2741, n.° 57; e de 4 de Julho de 2006, Adeneler e o., C‑212/04, Colect., p. I‑6057, n.° 95). Por conseguinte, incumbia ao legislador belga, quando adoptou o Decreto real de 25 de Junho de 1997 para colocar as hospedeiras de bordo na mesma situação que os comissários de bordo, fixar as modalidades de regularização de forma que esta não se tornasse praticamente impossível ou excessivamente difícil.

    29. Ora, resulta das observações apresentadas ao Tribunal que, tendo em conta a longa duração do período de discriminação, que se estendeu de 1 de Janeiro de 1964 a 31 de Dezembro de 1980, e os numerosos anos que decorreram entre o fim deste período e a adopção do Decreto real de 25 de Junho de 1997 que possibilitou a regularização (1981 a 1997), as contribuições de regularização representam um montante particularmente elevado. Como realçou a advogada‑geral no n.° 49 das suas conclusões, a referida soma poderia mesmo ultrapassar a pensão anual das pessoas a quem a regularização era proposta. Assim, como salientaram E. Jonkman, H. Vercheval e N. Permesaen, sem serem contestadas neste ponto pelo ONP, o pagamento, de uma só vez, desse montante poderia tornar‑se impossível ou implicar um empréstimo junto de uma instituição financeira que exigiria, por seu turno, o pagamento de juros.

    30. Por outro lado, resulta do Decreto real de 25 de Junho de 1997 que este prevê em casos excepcionais, não aplicáveis ao caso vertente, o escalonamento do pagamento das contribuições de regularização sob a forma de um pagamento em anuidades.

    31. Em face do exposto, há que considerar que a obrigação imposta às interessadas de pagar as contribuições de regularização de uma só vez teve por efeito tornar a regularização dos direitos à pensão das hospedeiras de bordo excessivamente difícil.

    32. No que toca à taxa de juro de 10% ao ano, as partes nos processos principais, a Comissão e o Governo italiano declararam ou admitiram que esta taxa é significativamente elevada. Instado a este respeito na audiência, o ONP não conseguiu precisar a razão pela qual o Decreto real de 25 de Junho de 1997 fixou uma taxa de juro que ultrapassava a taxa de inflação.

    33. De todo o modo, é pacífico que a fixação de uma taxa de juro que excede o necessário para compensar a depreciação monetária tem como resultado que as contribuições pagas pelos novos inscritos são na realidade mais elevadas do que as pagas pelos trabalhadores inscritos desde a instituição do regime de pensões. Por conseguinte, longe de colocar as hospedeiras de bordo na mesma situação que os comissários de bordo, esta taxa de juro contribuiu para a continuação do tratamento desigual das hospedeiras de bordo.

    34. Compete, todavia, ao órgão jurisdicional de reenvio, único que tem um conhecimento completo do direito nacional, determinar em que medida a taxa de juro de 10% ao ano prevista no Decreto real de 25 de Junho de 1997 pode conter uma percentagem de juro que visa compensar a depreciação monetária.

    35. Resulta do conjunto destas considerações que a Directiva 79/7 se opõe a que um Estado‑Membro, quando adopta uma legislação que visa permitir às pessoas de determinado sexo, inicialmente discriminadas, beneficiar do regime de pensões aplicável às pessoas do outro sexo, exija que o pagamento das contribuições de regularização seja acrescido de outros juros além dos que visam compensar a depreciação monetária. Esta directiva opõe‑se também a que seja exigido que o referido pagamento se processe de uma só vez, quando essa condição torne praticamente impossível ou excessivamente difícil a regularização visada. Assim é, designadamente, quando o montante a pagar excede a pensão anual do interessado.

    Quanto às obrigações de um Estado‑Membro decorrentes de um acórdão proferido sobre um pedido de decisão prejudicial

    36. Na segunda parte das suas questões, vista no contexto dos litígios nos processos principais, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, se um Estado‑Membro tem a obrigação de adaptar a sua legislação na sequência de um acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça sobre um pedido de decisão prejudicial do qual decorre a incompatibilidade da referida legislação com o direito comunitário.

    37. A este respeito, importa recordar que, por força do princípio da cooperação leal consagrado no artigo 10.° CE, os Estados‑Membros são obrigados a suprimir as consequências ilícitas de uma violação do direito comunitário (acórdão de 7 de Janeiro de 2004, Wells, C‑201/02, Colect., p. I‑723, n.° 64 e jurisprudência aí referida).

    38. Assim, na sequência de um acórdão proferido sobre um pedido de decisão prejudicial do qual decorre a incompatibilidade da legislação nacional com o direito comunitário, incumbe às autoridades do Estado‑Membro em causa adoptar as medidas gerais ou especiais adequadas para assegurar no seu território o respeito do direito comunitário (v., neste sentido, acórdão Wells, já referido, n. os  64 e 65, e acórdão de 25 de Março de 2004, Azienda Agricola Giorgio, Giovanni e Luciano Visentin e o., C‑495/00, Colect., p. I‑2993, n.° 39). Embora lhes continue a caber a escolha das medidas a tomar, as referidas autoridades devem designadamente velar para que, o mais rapidamente possível, o direito nacional seja posto em conformidade com o direito comunitário e para que seja dada plena eficácia aos direitos que para os particulares decorrem do direito comunitário.

    39. Por outro lado, como o Tribunal reiteradamente decidiu em casos de discriminações contrárias ao direito comunitário, enquanto não forem adoptadas medidas que restabeleçam a igualdade de tratamento, o respeito do princípio da igualdade só pode ser assegurado pela concessão, às pessoas da categoria desfavorecida, das mesmas vantagens de que beneficiam as pessoas da categoria privilegiada. Em tal hipótese, o juiz nacional deve afastar toda e qualquer disposição nacional discriminatória, não tendo de pedir ou aguardar a sua eliminação prévia pelo legislador, e aplicar aos membros do grupo desfavorecido o mesmo regime de que beneficiam as pessoas da outra categoria (acórdãos de 28 de Setembro de 1994, Avdel Systems, C‑408/92, Colect., p. I‑4435, n. os  16 e 17; de 12 de Dezembro de 2002, Rodríguez Caballero, C‑442/00, Colect., p. I‑11915, n. os  42 e 43; e de 7 de Setembro de 2006, Cordero Alonso, C‑81/05, Colect., p. I‑7569, n. os  45 e 46).

    40. Acresce que um Estado‑Membro está obrigado a reparar os prejuízos causados aos particulares por violações do direito comunitário. Caso as condições desta obrigação estejam preenchidas, incumbe ao juiz nacional retirar as consequências desse princípio (v., designadamente, acórdãos de 22 de Abril de 1997, Sutton, C‑66/95, Colect., p. I‑2163, n.° 35, e de 30 de Setembro de 2003, Köbler, C‑224/01, Colect., p. I‑10239, n. os  51 e 52).

    41. Em face do exposto, cabe responder à segunda parte das questões prejudiciais que, na sequência de um acórdão proferido sobre um pedido de decisão prejudicial do qual decorre a incompatibilidade de uma legislação nacional com o direito comunitário, incumbe às autoridades do Estado‑Membro em causa adoptar as medidas gerais ou especiais adequadas para assegurar o respeito do direito comunitário, velando designadamente para que, o mais rapidamente possível, o direito nacional seja posto em conformidade com o direito comunitário e para que seja dada plena eficácia aos direitos que para os particulares decorrem do direito comunitário. Quando se verifica uma discriminação contrária ao direito comunitário, enquanto não forem adoptadas medidas que restabeleçam a igualdade de tratamento, o juiz nacional deve afastar toda e qualquer disposição nacional discriminatória, não tendo de pedir ou aguardar a sua eliminação prévia pelo legislador, e aplicar aos membros do grupo desfavorecido o mesmo regime de que beneficiam as pessoas da outra categoria.

    Quanto às despesas

    42. Revestindo o processo, quanto às partes nas causas principais, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional nacional, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efectuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

    Parte decisória

    Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Primeira Secção) declara:

    1) A Directiva 79/7/CEE do Conselho, de 19 de Dezembro de 1978, relativa à realização progressiva do princípio da igualdade de tratamento entre homens e mulheres em matéria de segurança social, quando um Estado‑Membro adopta uma legislação que visa permitir às pessoas de determinado sexo, inicialmente discriminadas, beneficiar, em relação à totalidade da duração da sua reforma, do regime de pensões aplicável às pessoas do outro sexo,

    – não se opõe a que o referido Estado‑Membro faça depender essa inscrição do pagamento de contribuições de regularização constituídas pela diferença entre as contribuições pagas pelas pessoas inicialmente discriminadas durante o período em que a discriminação ocorreu e as contribuições mais elevadas pagas pela outra categoria de pessoas durante esse mesmo período, acrescidas de juros que compensem a depreciação monetária,

    – em contrapartida, opõe‑se a que o referido Estado‑Membro exija que o pagamento das contribuições de regularização seja acrescido de outros juros além dos que visam compensar a depreciação monetária,

    – opõe‑se também a que seja exigido que o referido pagamento se processe de uma só vez, quando essa condição torne praticamente impossível ou excessivamente difícil a regularização visada. Assim é, designadamente, quando o montante a pagar exceda a pensão anual do interessado.

    2) Na sequência de um acórdão proferido sobre um pedido de decisão prejudicial do qual decorre a incompatibilidade de uma legislação nacional com o direito comunitário, incumbe às autoridades do Estado‑Membro em causa adoptar as medidas gerais ou especiais adequadas para assegurar o respeito do direito comunitário, velando designadamente para que, o mais rapidamente possível, o direito nacional seja posto em conformidade com o direito comunitário e para que seja dada plena eficácia aos direitos que para os particulares decorrem do direito comunitário.

    Quando se verifica uma discriminação contrária ao direito comunitário, enquanto não forem adoptadas medidas que restabeleçam a igualdade de tratamento, o juiz nacional deve afastar toda e qualquer disposição nacional discriminatória, não tendo de pedir ou aguardar a sua eliminação prévia pelo legislador, e aplicar aos membros do grupo desfavorecido o mesmo regime de que beneficiam as pessoas da outra categoria.

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