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Document 32022D2358

    Decisão de Execução (UE) 2022/2358 da Comissão de 1 de dezembro de 2022 relativa à medida adotada pela França que estabelece uma limitação do exercício dos direitos de tráfego devido a problemas ambientais graves, nos termos do disposto no artigo 20.o do Regulamento (CE) n.o 1008/2008 do Parlamento Europeu e do Conselho [notificada com o número C(2022) 8694] (Apenas faz fé o texto na língua francesa) (Texto relevante para efeitos do EEE)

    C/2022/8694

    JO L 311 de 2.12.2022, p. 168–175 (BG, ES, CS, DA, DE, ET, EL, EN, FR, GA, HR, IT, LV, LT, HU, MT, NL, PL, PT, RO, SK, SL, FI, SV)

    Legal status of the document In force

    ELI: http://data.europa.eu/eli/dec_impl/2022/2358/oj

    2.12.2022   

    PT

    Jornal Oficial da União Europeia

    L 311/168


    DECISÃO DE EXECUÇÃO (UE) 2022/2358 DA COMISSÃO

    de 1 de dezembro de 2022

    relativa à medida adotada pela França que estabelece uma limitação do exercício dos direitos de tráfego devido a problemas ambientais graves, nos termos do disposto no artigo 20.o do Regulamento (CE) n.o 1008/2008 do Parlamento Europeu e do Conselho

    [notificada com o número C(2022) 8694]

    (Apenas faz fé o texto na língua francesa)

    (Texto relevante para efeitos do EEE)

    A COMISSÃO EUROPEIA,

    Tendo em conta o Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia,

    Tendo em conta o Regulamento (CE) n.o 1008/2008 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 24 de setembro de 2008, relativo a regras comuns de exploração dos serviços aéreos na Comunidade (1), nomeadamente o artigo 20.o,

    Após consulta do comité referido no artigo 25, n.o 1, do Regulamento (CE) n.o 1008/2008,

    Considerando o seguinte:

    I.   PROCEDIMENTO

    (1)

    Por carta de 17 de novembro de 2021 (2), a França informou a Comissão, nos termos do artigo 20.o, n.o 2, do Regulamento (CE) n.o 1008/2008 («regulamento»), da sua intenção de introduzir uma limitação temporária, sujeita a condições, do exercício dos direitos de tráfego devido a problemas ambientais graves («medida inicial»).

    (2)

    As informações inicialmente apresentadas pela França incluíam: 1) o artigo 145.o da Lei n.o 2021-1104, de 22 de agosto de 2021, relativa à luta contra as alterações climáticas e ao reforço da resiliência aos seus efeitos («Loi Climat et Résilience» ou «Lei») (3); 2) a versão consolidada do artigo L.6412-3 do Código dos Transportes, na sequência da Lei n.o 2021-1104; 3) um projeto de decreto que estabelece as condições de aplicação da proibição («projeto de decreto»); bem como 4) os elementos adicionais que definem o contexto, o conteúdo e a justificação da medida inicial nos termos do artigo 20.o, n.o 2, do regulamento.

    (3)

    A Comissão recebeu duas denúncias (uma por parte de aeroportos e outra de companhias aéreas) (4), alegando que o artigo 145.o da Lei não satisfaz as condições do artigo 20.o, n.o 1, do regulamento e que, por conseguinte, é incompatível com o direito da UE.

    (4)

    Os autores das denúncias alegam, concretamente, que o artigo 145.o da Lei seria ineficaz e desproporcionado em relação ao objetivo pretendido, que discriminaria as transportadoras aéreas e que a sua duração não seria limitada no tempo. Os autores das denúncias alegam igualmente que a avaliação de impacto realizada pelas autoridades francesas não é suficientemente pormenorizada, remetendo, neste contexto, para o parecer do Conselho de Estado francês (5), e que, além disso, o setor dos transportes aéreos já está sujeito a outras medidas que prosseguem o mesmo objetivo, como o sistema de comércio de licenças de emissão da União Europeia (CELE), e irá ser em breve sujeito a novas medidas legislativas, como as propostas do pacote Objetivo 55 (6). A medida inicial vem acrescentar-se igualmente à obrigação, nos termos do artigo 147.o da mesma lei, de todas as companhias aéreas que operam em França compensarem as suas emissões nas rotas domésticas.

    (5)

    Tendo em conta a sua apreciação preliminar, a Comissão decidiu, em 15 de dezembro de 2021, proceder a uma análise mais aprofundada da medida inicial nos termos do artigo 20.o, n.o 2, do regulamento («Decisão da Comissão de 15 de dezembro de 2021»). Decidiu igualmente que a medida inicial só poderia ser executada depois de a Comissão ter concluído a sua análise (7).

    (6)

    Por carta de 7 de janeiro de 2022, os serviços da Comissão solicitaram às autoridades francesas informações complementares a fim de apreciarem a compatibilidade da medida inicial com as condições estabelecidas no artigo 20.o, n.o 1, do regulamento.

    (7)

    Por carta de 9 de maio de 2022, a França forneceu elementos adicionais sobre o conteúdo e a justificação da medida inicial nos termos do artigo 20.o do regulamento. Por carta de 21 de junho de 2022, a França prestou informações atualizadas sobre a sua notificação, incluindo um projeto de decreto alterado sem derrogações (o «projeto final de decreto»), bem como elementos adicionais destinados a ter em conta as preocupações manifestadas pela Comissão e pelos seus serviços quanto à sua compatibilidade com as condições estabelecidas no artigo 20.o, n.o 1, do regulamento (conjuntamente, a «medida»).

    II.   OS FACTOS

    II.1.   Descrição da Medida

    (8)

    Em 22 de agosto de 2021, a França adotou a Lei n.o 2021-1104 relativa à luta contra as alterações climáticas e ao reforço da resiliência aos seus efeitos.

    (9)

    O artigo 145.I da Lei proíbe, com base no artigo 20.o do regulamento, os serviços regulares de transporte aéreo público de passageiros em todas as rotas aéreas no território francês para as quais existam várias ligações ferroviárias diretas por dia de menos de duas horas e meia.

    (10)

    Nos termos do artigo 145.II e IV da Lei, a aplicação da proibição deverá ser avaliada três anos após a data da sua entrada em vigor.

    (11)

    O artigo 145.I, n.o 2, da lei exige a adoção de um decreto posterior, sob reserva de um parecer do Conselho de Estado francês (Conseil d’État) que especifique as condições de aplicação do n.o 1, «em especial, as características das ligações ferroviárias em causa, que devem assegurar um serviço suficiente, e as modalidades de derrogação a esta proibição no caso de os serviços aéreos assegurarem principalmente o transporte de passageiros em trânsito ou poderem ser considerados como prestando serviços de transporte aéreo sem emissões de carbono. Fixa igualmente o nível de emissões de CO2 por passageiro que os serviços considerados isentos de carbono têm de respeitar».

    (12)

    O projeto de decreto final estabelece as condições para a aplicação da proibição.

    (13)

    Nos termos do artigo 1.o do projeto de decreto final, a proibição aplica-se aos serviços de transporte aéreo público regular de passageiros para os quais uma ligação ferroviária forneça, em cada direção, uma viagem de menos de duas horas e meia:

    «1.°

    entre estações ferroviárias que sirvam as mesmas cidades que os aeroportos em causa; se a mais importante em termos de tráfego nos dois aeroportos em causa for diretamente servida por um serviço ferroviário de alta velocidade, a estação ferroviária utilizada deverá ser a que serve esse aeroporto;

    2.°

    sem mudança de comboio entre essas duas estações ferroviárias;

    3.°

    várias vezes por dia, com frequências suficientes e horários satisfatórios;

    4.°

    assegurando uma presença no local de mais de oito horas durante o dia.»

    (14)

    O projeto de decreto final não inclui as derrogações relativas às ligações e aos serviços que podem ser considerados descarbonizados a que se refere o considerando 11 da Decisão da Comissão de 15 de dezembro de 2021.

    (15)

    Nos termos do artigo 2.o do projeto de decreto final, este entrará em vigor no dia seguinte ao da sua publicação por um período de três anos.

    (16)

    As autoridades francesas indicaram o seguinte (8) relativamente à medida:

    «1.

    Foi introduzida uma diferenciação no cálculo dos tempos de transporte ferroviário alternativo, tendo plenamente em conta o papel de certos aeroportos na intermodalidade:

    se o aeroporto mais importante, em termos de tráfego, for diretamente servido por um serviço ferroviário de alta velocidade, a estação utilizada para calcular o serviço ferroviário alternativo é a que serve esse aeroporto;

    em todos os outros casos, a estação utilizada para determinar o serviço ferroviário alternativo é a estação que serve a mesma cidade que o aeroporto em causa.

    Especificamente, das oito rotas identificadas, apenas dois aeroportos são diretamente servidos por um serviço ferroviário de alta velocidade: Paris-Charles de Gaulle e Lyon-Saint-Exupéry.

    O aeroporto de Paris-Charles de Gaulle é o quinto aeroporto com a taxa de ligação mais elevada da Europa (30 %, fonte IATA 2019) e existe infraestrutura para aceder ao aeroporto num comboio de alta velocidade. Por conseguinte, as autoridades francesas consideram que, ao contrário do que acontece com o aeroporto de Paris-Orly, que é um aeroporto que opera de ponto a ponto (7 % de ligações, ibidem), o objetivo intermodal do aeroporto de Paris-Charles de Gaulle, apoiado pela existência na plataforma de uma estação de ligação à rede ferroviária de alta velocidade, deverá ser tido em conta, e aquele considerado como um destino de pleno direito na análise dos trajetos ferroviários alternativos a partir de Bordéus, Lyon, Nantes ou Rennes.

    Na mesma ordem de ideias, o aeroporto de Lyon-Saint-Exupéry está equipado com uma estação de alta velocidade que deve ser considerada como um destino autónomo na análise das diferentes ligações, nomeadamente a rota de Marselha-Lyon.

    2.

    As autoridades francesas decidiram igualmente precisar as condições para que se possa considerar que um serviço ferroviário é aceitável (9): deverá dispor de frequências suficientes e de horários satisfatórios em conformidade com o artigo 16.o do Regulamento (CE) n.o 1008/2008 relativo às obrigações de serviço público. Esta definição deve permitir assegurar o respeito do artigo 20.o do referido regulamento, circunscrevendo a definição da medida mediante uma definição precisa do conceito de “serviço suficiente”.»

    (17)

    As autoridades francesas especificaram ainda que (10) «Na prática […], a situação das oito rotas referidas na notificação inicial seria a seguinte:

    «—

    as três rotas entre Paris-Orly e Bordéus, Nantes e Lyon serão objeto de proibição para as transportadoras aéreas;

    as rotas entre Paris-Charles de Gaulle, por um lado, e Bordéus e Nantes, por outro, estão excluídas do âmbito de aplicação da medida devido a um tempo de viagem por caminho de ferro superior a duas horas e meia até à estação do aeroporto de Paris-Charles de Gaulle (sendo idealmente os tempos de trajeto aproximadamente de três horas e meia e de três horas, respetivamente);

    as ligações entre Paris Charles-de-Gaulle, por um lado, e Rennes e Lyon, por outro, e a ligação de Lyon-Marselha estão excluídas da medida no estado atual da oferta ferroviária. Com efeito, embora as viagens de comboio possam oferecer tempos de viagem inferiores a duas horas e meia, não permitem o acesso ao aeroporto de Paris Charles de Gaulle (ou ao aeroporto de Lyon Saint Exupéry, no caso da ligação de Lyon-Marselha) de manhã cedo, ou a partida suficientemente tarde, à noite.

    a futura melhoria dos serviços ferroviários, com frequências suficientes e horários satisfatórios, nomeadamente para satisfazer as necessidades de ligação, permitiria a proibição dessas ligações aéreas.»

    Além disso, as autoridades francesas incluíram na sua resposta um anexo com informações pormenorizadas sobre a forma como os critérios do projeto de decreto final são aplicados às oito ligações aéreas acima referidas.

    (18)

    As autoridades francesas especificam igualmente que «a situação das rotas proibidas e das rotas potencialmente afetadas pela proibição (principalmente as rotas domésticas que ligam os aeroportos de Paris-Charles de Gaulle, Paris-Orly e Lyon-Saint Exupéry aos destinos servidos por linhas ferroviárias de alta velocidade) será examinada antes de cada período de programação» (ou seja, aquando da apresentação da programação das faixas horárias). «Além disso, durante o período de aplicação da medida, a DGAC manterá o público informado da lista atualizada das rotas efetivamente proibidas, explicando a correlação entre estas proibições e os critérios do decreto».

    (19)

    As autoridades francesas reiteraram ainda e especificaram o seu compromisso, assumido a pedido da Comissão, de «realizar e transmitir aos serviços da Comissão Europeia uma avaliação da medida 24 meses após a sua entrada em vigor. Essa apreciação deve ter em conta, em especial, os efeitos da medida no ambiente, incluindo nas alterações climáticas, e no mercado interno dos serviços aéreos».

    II.2.   Decisão da Comissão de 15 de dezembro de 2021

    (20)

    Na sua Decisão de 15 de dezembro de 2021, a Comissão considerou, com base na sua apreciação preliminar, que a medida inicial notificada pela França em 17 de novembro de 2021 suscitava preocupações quanto à sua compatibilidade com as condições estipuladas no n.o 1 do artigo 20.o do regulamento em termos de não discriminação, distorção da concorrência, justificação e proporcionalidade.

    (21)

    A Comissão considerou que as duas primeiras derrogações que beneficiavam os serviços aéreos que transportavam a maioria dos passageiros em trânsito apresentavam um risco de possível discriminação e de distorção da concorrência entre transportadoras aéreas e que a terceira derrogação que beneficiaria os serviços aéreos que atingiriam um limiar máximo de emissões exigia uma análise mais aprofundada dos seus efeitos potenciais sobre a concorrência e a eventual discriminação entre transportadoras aéreas.

    (22)

    O âmbito das derrogações levantou igualmente questões quanto à eficácia da medida inicial em relação ao objetivo prosseguido, uma vez que a prossecução do objetivo ambiental seria limitada pela aplicação das duas primeiras derrogações.

    III.   APRECIAÇÃO DA MEDIDA

    (23)

    A título preliminar, a Comissão observa que, a título de derrogação ao artigo 15.o do regulamento e ao direito das transportadoras aéreas da UE de operarem livremente serviços aéreos intra-UE, o artigo 20.o do regulamento deve ser interpretado de forma a limitar o seu âmbito ao estritamente necessário para salvaguardar os interesses que assegura aos Estados-Membros.

    Relativamente à existência de problemas ambientais graves

    (24)

    A Comissão apoia as medidas destinadas a promover uma maior utilização de modos de transporte hipocarbónicos, assegurando concomitantemente o bom funcionamento do mercado interno. Um dos objetivos da Estratégia de Mobilidade Sustentável e Inteligente da Comissão («Estratégia de Mobilidade») é criar condições para que os operadores de transportes ofereçam aos seus clientes, até 2030, opções neutras em termos de carbono em viagens coletivas regulares inferiores a 500 km na UE.

    (25)

    Na sua Decisão de 15 de dezembro de 2021, a Comissão reconheceu que o objetivo almejado pela medida, tal como notificada pela França, é contribuir para fazer face às alterações climáticas graças à utilização de modos de transporte com menor intensidade de CO2 sempre que existam alternativas adequadas.

    (26)

    Na sua resposta de 9 de maio de 2022, as autoridades francesas indicaram que a «a medida notificada pelas autoridades francesas é fruto dos trabalhos no âmbito da Convenção dos Cidadãos sobre o Clima, que resultou em 149 medidas destinadas a acelerar a luta contra as alterações climáticas». Especificaram ainda que «o principal desafio da redução dos voos consiste em agir, em consonância com várias outras ações, contra as alterações climáticas», salientando ao mesmo tempo que «irão também ser aduzidos impactos positivos secundários em termos de ruído e de poluição local na sequência da redução do tráfego aéreo suscitada pela medida».

    (27)

    Na sua proposta de regulamento que estabelece o quadro para alcançar a neutralidade climática e que altera o Regulamento (UE) 2018/1999 («Lei Europeia do Clima») (11), a Comissão reconhece que «lutar contra as alterações climáticas é um desafio urgente» e remete para o relatório especial do Painel Intergovernamental sobre as Alterações Climáticas (PIAC) sobre os impactos de um aquecimento global de 1,5 °C acima dos níveis pré-industriais e as trajetórias globais conexas das emissões de gases com efeito de estufa, o que corrobora, nomeadamente, a necessidade premente de reduzir as emissões de gases com efeito de estufa (12).

    (28)

    O Pacto Ecológico Europeu insta a uma redução de 90 % das emissões de gases com efeito de estufa (GEE) provenientes dos transportes até 2050 e apela para tornar o sistema de transportes no seu conjunto sustentável. Tal como sublinhado na Estratégia de Mobilidade, «para alcançar esta mudança sistémica, 1) precisamos de tornar todos os modos de transporte mais sustentáveis, 2) tornar amplamente disponíveis alternativas sustentáveis num sistema de transportes multimodal e 3) criar os incentivos adequados para impulsionar a transição, […] o que implica que todas as alavancas políticas devem ser acionadas».

    (29)

    Com vista à consecução desse objetivo, há que promover alternativas de transporte sustentáveis, como o transporte ferroviário de alta velocidade. Como salientado na Estratégia de Mobilidade, tal implica que existam alternativas adequadas, em termos de serviços (ferroviários), a preços, frequências e níveis de conforto competitivos.

    (30)

    Neste contexto, a Comissão considera que a França tem o direito de considerar que existe um problema ambiental grave na situação vertente, subjacente à necessidade urgente de reduzir as emissões de gases com efeito de estufa, e que uma medida como a prevista pelas autoridades francesas é justificável ao abrigo do n.o 1 do artigo 20.o do regulamento desde que não seja discriminatória, que não falseie a concorrência entre transportadoras aéreas, que não seja mais restritiva do que o necessário para sanar o problema e que tenha um prazo de validade limitado não superior a três anos, após o qual deverá ser revista, tal como previsto no n.o 1 do artigo 20.o do regulamento.

    Não discriminação e não distorção da concorrência

    (31)

    No que diz respeito à não discriminação e ao impacto na concorrência, a medida inicial continha duas derrogações que beneficiavam os serviços aéreos que transportam a maioria dos passageiros em trânsito, o que, na avaliação inicial da Comissão (13), teria acarretado um risco de possível discriminação e de distorção da concorrência entre transportadoras aéreas.

    (32)

    Com base nas informações adicionais fornecidas pelas autoridades francesas, a Comissão considera que tais derrogações, independentemente da proporção de passageiros em trânsito considerada, teriam constituído uma discriminação de facto e teriam conduzido a uma distorção da concorrência em detrimento das transportadoras aéreas que operam de ponto a ponto, existentes ou potenciais, cujo modelo de negócio não se centra nos passageiros em trânsito.

    (33)

    Com a retirada das duas derrogações pela França, as preocupações sobre as duas derrogações relativas ao risco eventual de discriminação e de distorção da concorrência entre transportadoras aéreas foram resolvidas.

    (34)

    Os critérios utilizados para a proibição no projeto de decreto final baseiam-se na extensão das ligações ferroviárias e na frequência e adequação dos horários, sendo, por conseguinte, de natureza objetiva. A proibição aplica-se a todos os serviços públicos regulares de transporte aéreo de passageiros para os quais uma ligação ferroviária forneça, em cada direção, uma viagem de menos de duas horas e meia e preencha as condições do artigo 1.o do projeto de decreto final, tal como referido no considerando 13. Uma vez que nenhum serviço aéreo será isento da proibição, a medida não conduz a qualquer discriminação em razão da nacionalidade, da identidade ou do modelo de negócio de uma transportadora aérea, nem dá origem a distorções da concorrência entre transportadoras aéreas.

    A medida não deve ser mais restritiva do que o necessário para resolver os problemas.

    (35)

    O artigo 20.o, n.o 1, do regulamento exige que essas medidas não sejam mais restritivas do que o necessário para sanar os problemas.

    (36)

    Tal como referido no considerando 30, o problema identificado pelas autoridades francesas neste caso inclui a necessidade urgente de reduzir as emissões de gases com efeito de estufa. Na sua apreciação sobre se a medida não é mais restritiva do que o necessário para sanar o problema em causa, a Comissão irá ponderar se a medida permite alcançar o objetivo pretendido — contribuir para a redução das emissões de gases com efeito de estufa — e não excede o necessário para o atingir, tendo em conta se outros modos de transporte fornecem níveis de serviço adequados para assegurar a conectividade necessária.

    (37)

    Neste contexto, os impactos negativos para os cidadãos europeus e a conectividade de qualquer restrição dos direitos de tráfego devem ser compensados pela disponibilidade de modos de transporte alternativos acessíveis, convenientes e mais sustentáveis.

    (38)

    A título de observação preliminar, a Comissão observa que está a ser desenvolvida uma panóplia de instrumentos legislativos e não legislativos para ajudar e incentivar o setor dos transportes aéreos a reduzir significativamente as suas emissões de CO2 e a tornar-se mais sustentável. No âmbito do seu pacote «Objetivo 55», a Comissão apresentou uma proposta de revisão do Sistema de Comércio de Licenças de Emissão da UE (CELE) (14) para reforçar o sinal do preço do carbono, uma proposta de revisão da Diretiva Tributação da Energia (15) que elimina a isenção obrigatória para os combustíveis para a aviação a jato, bem como uma nova proposta legislativa, a «ReFuelEU Aviação» (16). Esta iniciativa visa descarbonizar o setor da aviação, impondo a adoção de combustíveis de aviação sustentáveis e assegurando concomitantemente o bom funcionamento do mercado da aviação. As propostas da Comissão para atualizar a legislação relativa ao Céu Único Europeu e as regras de gestão do tráfego aéreo (17) têm também um potencial importante de modernização e sustentabilidade, ajudando a reduzir o consumo excessivo de combustível e as emissões de CO2 causadas pelas ineficiências dos voos e pela fragmentação do espaço aéreo. Estas propostas legislativas estão atualmente a ser debatidas pelos colegisladores e ainda não são aplicáveis. Uma vez em vigor, deverão contribuir eficazmente para a descarbonização do setor do transporte aéreo, deixando então a medida em apreço de ser necessária.

    (39)

    Não obstante, a fim de contribuir, entretanto, para a redução das emissões de gases com efeito de estufa no setor dos transportes aéreos, a Comissão observa que a França optou por limitar temporariamente o exercício dos direitos de tráfego para os serviços nacionais de transporte aéreo regular de passageiros para os quais existem várias ligações ferroviárias diárias diretas com trajetos inferiores a duas horas e meia, com frequências suficientes e horários adequados.

    (40)

    No que diz respeito à questão de saber se outros modos de transporte oferecem níveis de serviço adequados, a Comissão observa que o artigo 1.o do projeto de decreto final prevê um conjunto mais pormenorizado de requisitos pertinentes e objetivos que têm em conta a qualidade da ligação, tanto para os passageiros «ponto a ponto» como para os passageiros em trânsito. Além disso, as autoridades francesas competentes comprometeram-se a avaliar ex ante, antes de cada período de programação, se a ligação ferroviária oferece ou não um nível adequado de serviço num determinado itinerário (tal como definido no artigo 1.o do projeto de decreto final) e, posteriormente, a informar devidamente as transportadoras potencialmente interessadas sobre as rotas que podem continuar a ser servidas. Isto significa também que um itinerário proibido poderia eventualmente ser novamente servido se a qualidade do serviço ferroviário se deteriorasse e deixasse de preencher as condições de níveis de serviço adequados, incentivando assim a prestação de serviços ferroviários de qualidade que ofereçam níveis de serviço adequados. A Comissão considera que uma abordagem de tal maneira dinâmica que tenha em conta o futuro desenvolvimento dos serviços ferroviários promoveria a multimodalidade em consonância com os objetivos da Estratégia de Mobilidade e beneficiaria a conectividade.

    (41)

    No que diz respeito ao impacto ambiental positivo da medida, as autoridades francesas afirmam que «o encerramento, já efetivo, das três rotas de Orly-Bordeaux, Orly-Lyon e Orly-Nantes (18) resulta numa redução total das emissões de CO2 provenientes do transporte aéreo de 55 000 toneladas» (19).

    (42)

    Explicam igualmente que a oferta global de lugares pela Air France nas rotas de Paris- Charles de Gaulle (CDG)-Bordeaux, CDG-Lyon e CDG-Nantes se manteve estável desde 2019 (entre -1 % e +3 % consoante a rota em causa), não tendo levado a uma transferência de capacidade a partir de Orly.

    (43)

    As autoridades francesas preveem que as pessoas passem a recorrer principalmente aos comboios de alta velocidade e não ao autocarro ou ao automóvel. Os dados disponíveis referidos (20) parecem apontar para uma preferência histórica pelas ligações ferroviárias por parte dos passageiros que utilizam as ligações aéreas. Para obter estimativas sobre o impacto potencial da transferência modal na redução das emissões, as autoridades francesas calcularam dois cenários extremos para a rota de Orly-Bordéus: segundo as autoridades francesas, a medida resultaria, na hipótese mais desfavorável (21), numa redução das emissões de CO2 de quase 50 % (-48,2 %) e, na melhor das hipóteses (transferência modal total para o transporte ferroviário), numa redução de 98,3 % das emissões.

    (44)

    As rotas aéreas de CDG-Lyon, CDG-Rennes e Lyon-Marselha não são atualmente abrangidas pelo âmbito de aplicação da medida, uma vez que uma ou várias das condições estabelecidas no artigo 1.o do projeto de decreto final (ainda) não se encontram preenchidas. No entanto, as autoridades francesas indicam que estas três rotas aéreas podem ser abrangidas pela proibição logo que um operador ferroviário melhore as condições dos seus serviços (principalmente em termos de horários propostos). As autoridades francesas estimam que a proibição destas três rotas adicionais poderia conduzir a uma potencial redução das emissões de 54 900 toneladas de CO2. Em contrapartida, as rotas de CDG-Bordeaux e CDG-Nantes não são, nem serão, de acordo com as explicações fornecidas pelas autoridades francesas (ver considerando 17), abrangidas pelo âmbito de aplicação da medida sem melhorias estruturais nos serviços ferroviários.

    (45)

    As autoridades francesas chamam igualmente a atenção para um potencial impacto positivo da medida, uma vez que esta «impediria a criação de serviços aéreos para o tráfego “ponto a ponto” a partir da região de Paris para 60 % das 40 cidades mais povoadas da França metropolitana», na medida em que «24 destas cidades estão acessíveis a partir de Paris a menos de duas horas e meia de comboio». Para secundar este ponto de vista, invocam a liberdade de as transportadoras aéreas operarem no mercado interno e a dinâmica de crescimento do tráfego «ponto a ponto» antes da pandemia.

    (46)

    Enquanto se aguarda a adoção e a aplicação das medidas mais eficazes para reduzir as emissões de CO2 no transporte aéreo, mencionadas no considerando 38, a Comissão considera que a medida, embora não seja, por si só, capaz de eliminar os graves problemas em causa, é, no entanto, suscetível de contribuir a curto prazo para a redução das emissões no setor dos transportes aéreos e para a luta contra as alterações climáticas.

    (47)

    Por outro lado, a Comissão observa que a medida prevê uma restrição limitada à liberdade de prestação de serviços aéreos. Visa apenas as rotas em que existe um modo de transporte mais sustentável que oferece um nível de serviço adequado, tal como definido no artigo 1.o do projeto de decreto final.

    (48)

    Além disso, a Comissão toma nota dos compromissos franceses, referidos no considerando 18, de rever «a situação das rotas proibidas e das rotas potencialmente afetadas pela proibição […], a montante, para cada período de programação» e, no considerando 19, de «efetuar e transmitir aos serviços da Comissão Europeia uma avaliação da medida 24 meses após a sua entrada em vigor. Essa apreciação deve ter em conta, em especial, os efeitos da medida no ambiente, incluindo nas alterações climáticas, e no mercado interno dos serviços aéreos». Tal deverá permitir às autoridades francesas aplicar corretamente a medida, de modo a que esta não vá para além do estritamente necessário para resolver os problemas graves em causa ou, se for caso disso, revogar a medida se esta já não for considerada necessária e proporcionada ao objetivo prosseguido.

    (49)

    A Comissão chama igualmente a atenção para o facto de que «durante o período de aplicação da medida, a DGAC manterá o público informado da lista atualizada das rotas efetivamente proibidas, explicando a correlação entre estas proibições e os critérios do decreto». Tal assegurará a transparência necessária para com os cidadãos europeus e as partes interessadas pertinentes e permitir-lhes-á, se for caso disso, contestar a medida a nível nacional.

    (50)

    Tendo em conta o que precede, a Comissão considera que a medida, na pendência da adoção e aplicação das medidas mais eficazes para reduzir as emissões de CO2 no transporte aéreo, mencionadas no considerando 38, não é mais restritiva que o necessário para sanar os problemas.

    Prazo de validade limitado

    (51)

    O artigo 20.o, n.o 1, do regulamento exige que a medida tenha um prazo de validade limitado, não superior a três anos, após o qual deverá ser revista.

    (52)

    Tal como recordado no considerando 10, a aplicação da proibição será avaliada três anos após a data da sua entrada em vigor, que é o máximo permitido nos termos do n.o 1 do artigo 20.o do regulamento.

    (53)

    Na sequência das preocupações manifestadas pela Comissão, e em conformidade com o n.o 1 do artigo 20.o do regulamento, o prazo de validade do projeto de decreto final foi limitado a três anos (considerando 15). Além disso, a França comprometeu-se a «realizar e transmitir à Comissão Europeia uma avaliação da medida 24 meses após a sua entrada em vigor. Essa avaliação deverá ter em conta, em especial, os efeitos da medida no ambiente, incluindo nas alterações climáticas, e no mercado interno dos serviços aéreos». Se, na sequência dessa análise, for prevista uma nova medida, nos termos do n.o 2 do artigo 20.o do regulamento, a França deve informar a Comissão.

    (54)

    Por conseguinte, a Comissão considera que a medida tem um prazo de validade limitado a três anos.

    IV.   CONCLUSÃO

    (55)

    Com base no exame da notificação e tendo em conta o que precede, a Comissão considera que a medida prevista cumpre as condições estabelecidas no n.o 1 do artigo 20.o do Regulamento,

    ADOTOU A PRESENTE DECISÃO:

    Artigo 1.o

    A medida notificada pela França em 17 de novembro de 2021 e alterada por ofício de 21 de junho de 2022 está em conformidade com o n.o 1 do artigo 20.o do regulamento.

    A França deverá rever a medida 24 meses após a sua entrada em vigor e, nos termos do n.o 2 do artigo 20.o do regulamento, deverá informar a Comissão de novas medidas eventualmente previstas na sequência dessa avaliação.

    Artigo 2.o

    A destinatária da presente decisão é a República Francesa.

    Feito em Bruxelas, em 1 de dezembro de 2022.

    Pela Comissão

    Adina-Ioana VĂLEAN

    Membro da Comissão


    (1)   JO L 293 de 31.10.2008, p. 3.

    (2)  Ref.a ARES (2021)7093428.

    (3)  Jornal Oficial eletrónico autenticado n.o 0196 da República Francesa, de 24 de agosto de 2021 https://www.legifrance.gouv.fr/download/pdf?id=x7Gc7Ys-Z3hzgxO5KgI0zSu1fmt64dDetDQxhvJZNMc=

    (4)  CHAP (2021) 03705, de 6 de outubro de 2021, e CHAP (2021) 03855, de 20 de outubro de 2021.

    (5)  https://www.conseil-etat.fr/avis-consultatifs/derniers-avis-rendus/au-gouvernement/avis-sur-un-projet-de-loi-portant-lutte-contre-le-dereglement-climatique-et-ses-effets

    (6)  Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões intitulada « “Objetivo 55”: alcançar a meta climática da UE para 2030 rumo à neutralidade climática», COM(2021) 550 final.

    (7)  Decisão de Execução da Comissão de 15 de dezembro de 2021, C (2021) 9550.

    (8)  Nas informações adicionais prestadas em 9 de maio de 2022.

    (9)  Nas informações adicionais fornecidas em 9 de maio de 2022, as autoridades francesas declararam erradamente que « as autoridades francesas decidiram, além disso, especificar mais pormenorizadamente as condições necessárias para que um serviço ferroviário possa ser considerado como substituível». O texto foi retificado após verificação junto das autoridades francesas.

    (10)  Nas informações adicionais prestadas em 21 de junho de 2022.

    (11)  Proposta de Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que estabelece o quadro para alcançar a neutralidade climática e que altera o Regulamento (UE) 2018/1999 (Lei Europeia do Clima), COM(2020) 80 final, 2020/0036 (COD).

    (12)  Ver considerando 2. Também incluído no considerando 3 da Lei Europeia do Clima (JO L 243 de 9.7.2021, p. 1).

    (13)  Ver considerando 21 acima.

    (14)  COM(2021)552 final de 14.7.2021.

    (15)  COM(2021) 563 final de 14.7.2021.

    (16)  COM(2021)561 final de 14.7.2021.

    (17)  COM(2020) 577 final e COM(2020) 579 final, de 22.9.2020.

    (18)  A Comissão está ciente de que a Air France já tinha decidido cessar a sua atividade nestas três rotas em 2020, nomeadamente no contexto do empréstimo e da garantia estatal sobre os empréstimos concedidos pela França. A proibição dessas rotas não iria, portanto, conduzir a uma redução efetiva das emissões. Todavia, podem obter-se benefícios ambientais não quantificáveis, uma vez que as transportadoras aéreas potencialmente interessadas em explorar essas rotas seriam impedidas de o fazer.

    (19)  Estimativas da DGAC baseadas no tráfego de 2019.

    (20)  Ver «High-speed rail: lessons for policy makers from experiences abroad», D Albalate, G Bel – Public Administration Review (2012) (citado na carta francesa de 17 de novembro de 2021).

    (21)  Hipótese «segundo a qual os passageiros aéreos recorrem ao transporte ferroviário e rodoviário nas mesmas proporções que os passageiros que recorriam já a estes modos alternativos quando existia uma oferta aérea (negligenciando o motivo “outros”). As percentagens referidas foram extraídas do inquérito sobre a mobilidade de pessoas de 2019». Acrescentam, no entanto, que «é necessária uma hipótese maximalista da utilização alternativa do transporte rodoviário para dividir por dois os benefícios do encerramento do transporte aéreo».


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