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Documento 62019CJ0181

Acórdão do Tribunal de Justiça (Grande Secção) de 6 de outubro de 2020.
Jobcenter Krefeld – Widerspruchsstelle contra JD.
Reenvio prejudicial — Livre circulação de pessoas — Trabalhadores — Regulamento (UE) n.o 492/2011 — Artigo 7.o, n.o 2 — Igualdade de tratamento — Vantagens sociais — Artigo 10.o — Filhos escolarizados — Diretiva 2004/38/CE — Artigo 24.o — Prestações de assistência social — Regulamento (CE) n.o 883/2004 — Artigo 4.o — Artigo 70.o — Prestações pecuniárias especiais de caráter não contributivo — Trabalhador migrante que tem a seu cargo filhos escolarizados no Estado‑Membro de acolhimento.
Processo C-181/19.

Coletânea da Jurisprudência — Coletânea Geral

Identificador Europeu da Jurisprudência (ECLI): ECLI:EU:C:2020:794

Processo C‑181/19

Jobcenter Krefeld ‑ Widerspruchsstelle contra JD

(pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Landessozialgericht Nordrhein‑Westfalen)

Acórdão do Tribunal de Justiça (Grande Secção) de 6 de outubro de 2020

«Reenvio prejudicial – Livre circulação de pessoas – Trabalhadores – Regulamento (UE) n.o 492/2011 – Artigo 7.o, n.o 2 – Igualdade de tratamento – Vantagens sociais – Artigo 10.o – Filhos escolarizados – Diretiva 2004/38/CE – Artigo 24.o – Prestações de assistência social – Regulamento (CE) n.o 883/2004 – Artigo 4.o – Artigo 70.o – Prestações pecuniárias especiais de caráter não contributivo – Trabalhador migrante que tem a seu cargo filhos escolarizados no Estado‑Membro de acolhimento»

  1. Livre circulação de pessoas – Trabalhadores – Direito de residência dos membros da família – Filho de um trabalhador migrante ou de um antigo trabalhador migrante que prossegue estudos no Estado‑Membro de acolhimento – Progenitor que assegura efetivamente a guarda deste filho – Direito de residência que tem origem unicamente no artigo 10.o do Regulamento n.o 492/2011 – Obrigação de satisfazer as condições definidas na Diretiva 2004/38 – Inexistência – Referido progenitor que perde a qualidade de trabalhador – Falta de incidência

    (Regulamento n.o 492/2011 do Parlamento Europeu e do Conselho, artigo 10.o; Diretiva 2004/38 do Parlamento Europeu e do Conselho)

    (cf. n.os 35, 37‑39, 49)

  2. Livre circulação de pessoas – Trabalhadores – Igualdade de tratamento – Vantagens sociais – Conceito – Prestação social que visa garantir meios de existência aos seus beneficiários – Inclusão

    (Regulamento n.o 492/2011 do Parlamento Europeu e do Conselho, artigo 7.o, n.o 2)

    (cf. n.os 41, 42)

  3. Livre circulação de pessoas – Trabalhadores – Igualdade de tratamento – Vantagens sociais – Beneficiários – Filho de um trabalhador migrante ou de um antigo trabalhador migrante que prossegue estudos no Estado‑Membro de acolhimento – Progenitor que assegura efetivamente a guarda desse filho – Referido progenitor que perde a qualidade de trabalhador – Falta de incidência

    (Artigo 45.o TFUE; Diretiva 492/2011 do Parlamento Europeu e do Conselho, artigos 7.°, n.o 2, e 10.°)

    (cf. n.os 43‑48, 50‑55)

  4. Livre circulação de pessoas – Trabalhadores – Igualdade de tratamento – Vantagens sociais – Regulamentação nacional que exclui do direito de beneficiar de prestações que visam assegurar a sua subsistência um antigo trabalhador migrante e os seus filhos que podem invocar um direito de residência autónomo a título da escolarização dos filhos no Estado‑Membro de acolhimento – Inadmissibilidade – Justificação – Derrogação ao princípio da igualdade de tratamento dos cidadãos da União em matéria de assistência social – Inaplicabilidade – Cidadão da União em causa que também beneficia de um direito de residência como requerente de emprego – Falta de incidência

    (Regulamento n.o 492/2004 do Parlamento Europeu e do Conselho, artigos 7.°, n.o 2, e 10.°; Diretiva 2004/38 do Parlamento Europeu e do Conselho, artigo 24.o, n.o 2)

    (cf. n.os 55, 58, 167, ‑73, 7779, 213)

  5. Segurança social – Trabalhadores migrantes – Igualdade de tratamento na aceção do artigo 4.o do Regulamento n.o 883/2004 – Âmbito de aplicação – Prestações pecuniárias especiais de caráter não contributivo – Inclusão

    (Regulamento n.o 883/2004 do Parlamento Europeu e do Conselho, artigos 3.°, n.o 3, 4.° e 70.°, n.o 2)

    (cf. n.o 83)

  6. Segurança social – Trabalhadores migrantes – Igualdade de tratamento – Regulamentação nacional que exclui do direito de beneficiar de prestações pecuniárias especiais de caráter não contributivo um antigo trabalhador migrante e os seus filhos que podem invocar um direito de residência autónomo a título da escolarização dos filhos no Estado‑Membro de acolhimento – Inadmissibilidade – Justificação – Derrogação do princípio da igualdade de tratamento dos cidadãos da União em matéria de assistência social – Inaplicabilidade

    (Regulamentos do Parlamento Europeu e do Conselho n.o 883/2004, artigos 3.°, n.os 1 e 3, 4.° e 70.°, n.o 2, e n.o 492/2011, artigo 10.o; Diretiva 2004/38 do Parlamento Europeu e do Conselho, artigo 24.o, n.o 2)

    (cf. n.os 84‑89, disp. 2)

Resumo

Um antigo trabalhador migrante e os seus filhos que beneficiam de um direito de residência a título da escolarização dos filhos não podem ser excluídos de forma automática de prestações sociais de base previstas no direito nacional pelo facto de esse trabalhador ter ficado desempregado

JD é um nacional polaco que reside, desde 2013, com as suas duas filhas menores na Alemanha, país em que estas estão escolarizadas. Em 2015 e em 2016, JD exerceu várias atividades assalariadas neste Estado‑Membro antes de ter ficado desempregado. Entre setembro de 2016 e junho de 2017, a família recebeu, nomeadamente, prestações de proteção social de base previstas na regulamentação alemão, a saber «prestações subsidiárias de desemprego» para JD (Arbeitslosengeld II) e «prestações sociais» para as suas filhas (Sozialgeld). Desde 2 de janeiro de 2018 que JD voltou a exercer um novo emprego a tempo completo na Alemanha.

JD requereu à autoridade alemã competente, o Jobcenter Krefeld, que fosse mantido o pagamento das referidas prestações no período entre junho e dezembro de 2017. No entanto, o Jobcenter Krefeld indeferiu o seu pedido pelo facto de, durante o período controvertido, JD não ter conservado a sua qualidade de trabalhador assalariado e de ter residido na Alemanha como estando à procura de emprego. JD interpôs recurso desta decisão, que foi julgado procedente. O Jobcenter Krefeld interpôs então recurso no Landessozialgericht Nordrhein‑Westfalen (Tribunal Superior do Contencioso Social da Renânia do Norte – Vestefália, Alemanha).

Tendo este último órgão jurisdicional submetido um pedido de decisão prejudicial, o Tribunal de Justiça, num acórdão proferido em formação de Grande Secção em 6 de outubro de 2020, precisou os direitos de que beneficia um antigo trabalhador migrante que tenha a seu cargo filhos que estão escolarizados no Estado‑Membro de acolhimento, à luz dos Regulamentos n.o 492/2011 ( 1 ) e n.o 883/2004 ( 2 ), bem como da Diretiva 2004/38 ( 3 ).

A este respeito, depois de ter salientado que as prestações de proteção social em causa podem ser qualificadas de «vantagem social» na aceção do Regulamento n.o 492/2011, o Tribunal declarou, em primeiro lugar, que este regulamento se opõe a uma regulamentação nacional que exclui, em todas as circunstâncias e de forma automática, que um antigo trabalhador migrante e os seus filhos recebam tais prestações quando beneficiam, ao abrigo do referido regulamento ( 4 ), de um direito de residência autónomo a título da escolarização dos filhos.

Para chegar a esta conclusão, o Tribunal começou por recordar que o direito de residência reconhecido aos filhos de um (antigo) trabalhador migrante para garantir o seu direito de acesso ao ensino e, de forma derivada, ao progenitor que assegura a sua guarda, resulta, inicialmente, da qualidade de trabalhador desse progenitor. No entanto, depois de adquirido, este direito passa a ser autónomo e vai poder prolongar‑se para além da perda da referida qualidade. O Tribunal considerou, em seguida, que as pessoas que dispõem de tal direito de residência também beneficiam do direito à igualdade de tratamento com os cidadãos nacionais em matéria de concessão de vantagens sociais, previsto no Regulamento n.o 492/2011 ( 5 ), inclusivamente quando já não possam beneficiar da qualidade de trabalhador que tem origem no direito de residência inicial. Tal interpretação evita assim que uma pessoa que tem intenção de sair do seu Estado‑Membro de origem com a sua família para ir trabalhar para outro Estado‑Membro fique exposta, em caso de perda de emprego, ao risco de ter de interromper a escolaridade dos seus filhos e de regressar ao seu país de origem, por não poder beneficiar das prestações sociais previstas no direito nacional que lhe permitiriam dispor de meios de subsistência suficientes.

Por último, o Tribunal declarou que o Estado‑Membro de acolhimento não pode invocar, num caso como o sub iudice, a derrogação ao princípio da igualdade de tratamento em matéria de assistência social prevista na Diretiva 2004/38 ( 6 ). Esta derrogação permite recusar a concessão de prestações de assistência a certas categorias de pessoas, como as que beneficiam, ao abrigo desta diretiva, de um direito de residência a título da procura de emprego no Estado‑Membro de acolhimento, para evitar que essas pessoas se tornem uma sobrecarga não razoável para o regime de segurança social deste Estado‑Membro. Ora, esta derrogação deve ser interpretada de forma estrita e só se pode aplicar a pessoas cujo direito de residência só tenha origem na referida diretiva. No presente processo, é certo que os interessados beneficiam de um direito de residência que tem origem nesta diretiva ( 7 ), a título da procura de emprego pelo progenitor em causa. Contudo, na medida em que também podem invocar um direito de residência autónomo, a título do Regulamento n.o 492/2011, a referida derrogação não lhes pode ser oposta. Assim, uma regulamentação nacional que os exclui de qualquer direito às prestações de proteção social instaura uma diferença de tratamento em matéria de vantagens sociais face aos cidadãos nacionais, o que contraria este regulamento ( 8 ).

Em segundo lugar, o Tribunal declarou que um (antigo) trabalhador migrante e os seus filhos, que gozem de um direito ao abrigo do Regulamento n.o 492/2011 e que estejam inscritos no sistema de segurança social no Estado‑Membro de acolhimento, também dispõem do direito à igualdade de tratamento que decorre do Regulamento n.o 883/2004 ( 9 ). O facto de lhes ser recusado um direito às prestações de proteção social em causa constitui assim uma diferença de tratamento face aos cidadãos nacionais. Esta diferença de tratamento contraria este último regulamento ( 10 ), não podendo a derrogação prevista na Diretiva 2004/38 ( 11 ), pelas mesmas razões que foram expostas pelo Tribunal no contexto do Regulamento n.o 492/2011, aplicar‑se à situação de tal trabalhador e dos seus filhos escolarizados.


( 1 ) Regulamento (UE) n.o 492/2011 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de abril de 2011, relativo à livre circulação dos trabalhadores na União (JO 2011, L 141, p. 1).

( 2 ) Regulamento (CE) n.o 883/2004 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de abril de 2004, relativo à coordenação dos sistemas de segurança social (JO 2004, L 166, p. 1, e retificação JO 2004, L 200, p. 1).

( 3 ) Diretiva 2004/38/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de abril de 2004, relativa ao direito de livre circulação e residência dos cidadãos da União e dos membros das suas famílias no território dos Estados‑Membros, que altera o Regulamento (CEE) n.o 1612/68 e que revoga as Diretivas 64/221/CEE, 68/360/CEE, 72/194/CEE, 73/148/CEE, 75/34/CEE, 75/35/CEE, 90/364/CEE, 90/365/CEE e 93/96/CEE (JO 2004, L 158, p. 77, e retificações JO 2004, L 229, p. 35, e JO 2004, L 200, p. 34).

( 4 ) Artigo 10.o do Regulamento n.o 492/2011

( 5 ) Artigo 7.o, n.o 2, do Regulamento n.o 492/2011.

( 6 ) Artigo 24.o, n.o 2, da Diretiva 2004/38.

( 7 ) Artigo 14.o, n.o 4, alínea b), da Diretiva 2004/38.

( 8 ) Artigo 7.o, n.o 2, do Regulamento n.o 492/2011, lido em conjugação com o artigo 10.o deste.

( 9 ) Artigo 4.o do Regulamento n.o 883/2004

( 10 ) Artigo 4.o do Regulamento n.o 883/2004

( 11 ) Artigo 24.o, n.o 2, da Diretiva 2004/38.

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