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Document 62018CJ0542

Acórdão do Tribunal de Justiça (Grande Secção) de 26 de março de 2020.
Erik Simpson contra Conselho da União Europeia e HG contra Comissão Europeia.
Reapreciação dos Acórdãos do Tribunal Geral da União Europeia Simpson/Conselho (T‑646/16 P) e HG/Comissão (T‑693/16 P) — Função pública — Composição da formação de julgamento que proferiu os acórdãos em primeira instância — Processo de nomeação de um juiz do Tribunal da Função Pública da União Europeia — Artigo 47.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia — Tribunal estabelecido por lei — Fiscalização incidental da legalidade — Lesão da unidade ou da coerência do direito da União.
Processos apensos C-542/18 RX-II e C-543/18 RX-II.

Court reports – general – 'Information on unpublished decisions' section

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2020:232

 ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção)

26 de março de 2020 ( *1 )

«Reapreciação dos Acórdãos do Tribunal Geral da União Europeia Simpson/Conselho (T‑646/16 P) e HG/Comissão (T‑693/16 P) — Função pública — Composição da formação de julgamento que proferiu os acórdãos em primeira instância — Processo de nomeação de um juiz do Tribunal da Função Pública da União Europeia — Artigo 47.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia — Tribunal estabelecido por lei — Fiscalização incidental da legalidade — Lesão da unidade ou da coerência do direito da União»

Nos processos apensos C‑542/18 RX‑II e C‑543/18 RX‑II,

que têm por objeto a reapreciação, nos termos do artigo 256.o, n.o 2, segundo parágrafo, TFUE, dos Acórdãos do Tribunal Geral da União Europeia (Secção dos recursos de decisões do Tribunal da Função Pública) de 19 de julho de 2018, Simpson/Conselho (T‑646/16 P, não publicado, EU:T:2018:493) e HG/Comissão (T‑693/16 P, não publicado, EU:T:2018:492), proferidos nos processos

Erik Simpson, funcionário do Conselho da União Europeia, residente em Bruxelas (Bélgica),

contra

Conselho da União Europeia (C‑542/18 RX‑II),

e

HG, funcionário da Comissão Europeia,

contra

Comissão Europeia (C‑543/18 RX‑II),

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção),

composto por: K. Lenaerts, presidente, R. Silva de Lapuerta, vice‑presidente, A. Prechal, M. Vilaras, E. Regan, M. Safjan, S. Rodin e I. Jarukaitis, presidentes de secção, M. Ilešič (relator), C. Toader, D. Šváby, F. Biltgen e N. Piçarra, juízes,

advogado‑geral: E. Sharpston,

secretário: V. Giacobbo‑Peyronnel, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 21 de maio de 2019,

vistas as observações apresentadas:

em representação de E. Simpson, por M. Velardo, avocate,

em representação do Conselho da União Europeia, por M. Bauer e R. Meyer, na qualidade de agentes,

em representação de HG, por L. Levi, avocate,

em representação da Comissão Europeia, por G. Berscheid, T. S. Bohr e F. Erlbacher, na qualidade de agentes,

em representação do Governo búlgaro, por E. Petranova, L. Zaharieva e T. Mitova, na qualidade de agentes,

vistos os artigos 62.o‑A e 62.o‑B, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia,

ouvidas as conclusões da advogada‑geral na audiência de 12 de setembro de 2019,

profere o presente

Acórdão

1

Os presentes processos têm por objeto a reapreciação dos acórdãos do Tribunal Geral da União Europeia (Secção dos recursos de decisões do Tribunal da Função Pública) de 19 de julho de 2018, Simpson/Conselho (T‑646/16 P, não publicado; a seguir «primeiro acórdão em reapreciação, EU:T:2018:493) e HG/Comissão (T‑693/16 P, não publicado; a seguir «segundo acórdão em reapreciação, EU:T:2018:492) (a seguir, em conjunto, «acórdãos em reapreciação»).

2

Com o primeiro acórdão em reapreciação, o Tribunal Geral anulou o Despacho do Tribunal da Função Pública da União Europeia de 24 de junho de 2016, Simpson/Conselho (F‑142/11 RENV, EU:F:2016:136), que tinha negado provimento ao recurso de anulação interposto por Erik Simpson, por um lado, da Decisão do Conselho da União Europeia, de 9 de dezembro de 2010, que indeferiu o seu pedido de progressão ao grau AD 9 na sequência da sua aprovação no concurso geral EPSO/AD/113/07 organizado para o recrutamento de chefes de unidade de grau AD 9, nomeadamente de língua estónia, no domínio da tradução, e da Decisão do Conselho, de 7 de outubro de 2011, que indeferiu a reclamação dessa primeira Decisão de 9 de dezembro de 2010 (a seguir «Decisão de 7 de outubro de 2011»), e, por outro lado, da condenação do Conselho na reparação dos danos sofridos. Esse despacho foi proferido na sequência do Acórdão do Tribunal Geral de 22 de outubro de 2015, Conselho/Simpson (T‑130/14 P, EU:T:2015:796), que anulou o Acórdão do Tribunal da Função Pública de 12 de dezembro de 2013, Simpson/Conselho (F‑142/11, EU:F:2013:201) e que lhe remeteu o processo.

3

Com o segundo acórdão em reapreciação, o Tribunal Geral anulou o Acórdão do Tribunal da Função Pública de 19 de julho de 2016, HG/Comissão (F‑149/15, EU:F:2016:155), que negou provimento ao recurso de anulação, interposto por HG, a título principal, por um lado, da Decisão da Comissão Europeia de 10 de fevereiro de 2015 que lhe aplicou a sanção disciplinar de suspensão de subida de escalão por um período de 18 meses e que o condenou a reparar os danos sofridos pela Comissão no montante de 108596,35 euros (a seguir «Decisão de 10 de fevereiro de 2015») e, sendo caso disso, da decisão de indeferimento da reclamação, e, por outro lado, a condenação da Comissão na reparação dos danos alegadamente sofridos.

4

A reapreciação tem por objeto a questão de saber se, tendo em conta, nomeadamente, o princípio geral da segurança jurídica, os acórdãos em reapreciação lesam a unidade ou a coerência do direito da União na medida em que o Tribunal Geral, enquanto tribunal de recurso, declarou que a formação de julgamento do Tribunal da Função Pública que proferiu o Despacho de 24 de junho de 2016, Simpson/Conselho (F‑142/11 RENV, EU:F:2016:136), e o Acórdão de 19 de julho de 2016, HG/Comissão (F‑149/15, EU:F:2016:155) (a seguir, em conjunto, «decisões impugnadas»), estava composta de forma irregular, devido a uma irregularidade que afetava o processo de nomeação de um dos membros dessa formação, que levaria a uma violação do princípio do juiz previamente estabelecido por lei, consagrado no artigo 47.o, segundo parágrafo, primeiro período, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta»).

5

A reapreciação tem igualmente por objeto a questão de saber se, à semelhança dos atos referidos no artigo 277.o TFUE, a nomeação de um juiz pode ser objeto de fiscalização incidental da legalidade ou se essa fiscalização incidental da legalidade — por princípio ou após o decurso de um certo período de tempo — está excluída ou é limitada a certos tipos de irregularidades, a fim de assegurar a estabilidade jurídica e o caso julgado.

Quadro jurídico

Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia

6

O artigo 47.o da Carta, com a epígrafe «Direito à ação e a um tribunal imparcial», estabelece o seguinte nos seus dois primeiros parágrafos:

«Toda a pessoa cujos direitos e liberdades garantidos pelo direito da União tenham sido violados tem direito a uma ação perante um tribunal nos termos previstos no presente artigo.

Toda a pessoa tem direito a que a sua causa seja julgada de forma equitativa, publicamente e num prazo razoável, por um tribunal independente e imparcial, previamente estabelecido por lei. Toda a pessoa tem a possibilidade de se fazer aconselhar, defender e representar em juízo.»

Decisão 2004/752/CE, Euratom e anexo I do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia

7

O considerando 6 da Decisão 2004/752/CE, Euratom do Conselho, de 2 de novembro de 2004, que institui o Tribunal da Função Pública da União Europeia (JO 2004, L 333, p. 7), referia:

«O número de juízes da câmara jurisdicional deverá ser adaptado ao seu volume de contencioso. A fim de facilitar a decisão do Conselho relativa à nomeação dos juízes, é necessário prever que este crie um comité consultivo independente encarregado de verificar se as candidaturas preenchem as condições requeridas para o efeito.»

8

Por força do artigo 2.o da Decisão 2004/752, tinha sido anexado ao Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia um anexo I, intitulado «Tribunal da Função Pública da União Europeia». Este anexo, na versão aplicável à data das decisões impugnadas (a seguir «Anexo I do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia»), previa, no seu artigo 2.o:

«O Tribunal da Função Pública é composto por sete juízes. […]

Os juízes são nomeados por um período de seis anos. Os juízes cessantes podem ser nomeados de novo.

Em caso de vaga, proceder‑se‑á à nomeação de um novo juiz por um período de seis anos.»

9

O artigo 3.o do anexo I do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia dispõe:

«1.   Os juízes são nomeados pelo Conselho, deliberando nos termos do quarto parágrafo do artigo 257.o [TFUE], após consulta do Comité previsto no presente artigo. Ao nomear os juízes, o Conselho deve garantir que a composição do Tribunal seja equilibrada e assente na mais ampla base geográfica possível de cidadãos dos Estados‑Membros e dos regimes jurídicos representados.

2.   Pode apresentar a sua candidatura qualquer cidadão da União que preencha as condições previstas no quarto parágrafo do artigo 257.o [TFUE]. O Conselho, deliberando por maioria qualificada sob recomendação do Tribunal [de Justiça da União Europeia], fixa as regras a que deverão obedecer a apresentação e instrução das candidaturas.

3.   É instituído um comité composto por sete personalidades escolhidas de entre antigos membros do Tribunal de Justiça e do Tribunal Geral e de juristas de reconhecida competência. A designação dos membros do comité e as suas regras de funcionamento são decididas pelo Conselho, deliberando por maioria qualificada, sob recomendação do presidente do Tribunal de Justiça.

4.   O comité dá parecer sobre a adequação dos candidatos ao exercício das funções de juiz do Tribunal da Função Pública. O comité anexa a esse parecer uma lista de candidatos que possuam a experiência de alto nível mais apropriada. Essa lista deve incluir um número de candidatos correspondente a pelo menos o dobro do número de juízes a nomear pelo Conselho.»

Convite público à apresentação de candidaturas de 3 de dezembro de 2013

10

Em 3 de dezembro de 2013, o Conselho publicou no Jornal Oficial da União Europeia um Convite público à apresentação de candidaturas para nomeação de juízes do Tribunal da Função Pública da União Europeia (JO 2013, C 353, p. 11; a seguir «convite público à apresentação de candidaturas de 3 de dezembro de 2013»), cujo n.o 4 tinha a seguinte redação:

«Dado que o mandato de dois juízes termina em 30 de setembro de 2014, é lançado um convite à apresentação de candidaturas com vista à nomeação de dois novos juízes por um período de seis anos compreendido entre 1 de outubro de 2014 e 30 de setembro de 2020.»

Decisão (UE, Euratom) 2016/454

11

Os considerandos 1 a 6 da Decisão (UE, Euratom) 2016/454 do Conselho, de 22 de março de 2016, que nomeia três juízes para o Tribunal da Função Pública da União Europeia (JO 2016, L 79, p. 30), referem:

«1)

Os mandatos de dois juízes do Tribunal da Função Pública […] terminaram com efeitos desde 30 de setembro de 2014, e o mandato de um outro juiz terminou com efeitos desde 31 de agosto de 2015. Por conseguinte, nos termos do artigo 2.o e do artigo 3.o, n.o 1, do anexo I [do] Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia […], é necessário nomear três juízes para preencher essas vagas.

2)

Na sequência de um convite público à apresentação de candidaturas [de 3 de dezembro de] 2013, […] o Comité criado pelo artigo 3.o, n.o 3, do anexo I do [Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia] emitiu um parecer sobre a adequação dos candidatos ao exercício das funções de juiz do Tribunal da Função Pública. O Comité de Seleção fez acompanhar esse parecer de uma lista de seis candidatos que possuem a experiência de alto nível mais apropriada.

3)

Na sequência do acordo político sobre a reforma da arquitetura judiciária da União Europeia que conduziu à adoção do Regulamento (UE, Euratom) 2015/2422 do Parlamento Europeu e do Conselho [de 16 de dezembro de 2015, que altera o Protocolo n.o 3 relativo ao Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia], o Tribunal de Justiça apresentou, em 17 de novembro de 2015, uma proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo à transferência para o Tribunal Geral […] da competência para decidir, em primeira instância, dos litígios entre a União e os seus agentes, com efeitos a partir de 1 de setembro de 2016.

4)

Nestas circunstâncias, por razões de calendário, é adequado não publicar um novo convite público à apresentação de candidaturas, mas antes recorrer à lista de seis candidatos que possuem a experiência de alto nível mais apropriada estabelecida pelo Comité de Seleção na sequência do convite público à apresentação de candidaturas [de 3 de dezembro] de 2013.

5)

Por conseguinte, é conveniente nomear três das pessoas cujos nomes constam da lista acima referida como juízes do Tribunal da Função Pública, velando por que a composição do Tribunal da Função Pública seja equilibrada e assente na mais ampla base geográfica possível de cidadãos dos Estados‑Membros e dos sistemas jurídicos representados. As três pessoas cujos nomes constam da referida lista que possuem a experiência de alto nível mais apropriada são Sean VAN RAEPENBUSCH, João SANT'ANNA e Alexander KORNEZOV. João SANT'ANNA e Alexander KORNEZOV deverão ser nomeados com efeitos a partir da data de entrada em vigor da presente decisão. Uma vez que Sean VAN RAEPENBUSCH já foi juiz no Tribunal da Função Pública até 30 de setembro de 2014, tendo continuado a exercer funções enquanto se aguardava a decisão do Conselho nos termos do artigo 5.o do [Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia], é adequado nomeá‑lo para um novo mandato com efeitos desde o dia seguinte ao do termo do seu mandato anterior.

6)

Decorre do artigo 2.o do anexo I [do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia] que, em caso de vaga, se procederá à nomeação de um novo juiz por um período de seis anos. Contudo, aquando da aplicação do regulamento proposto sobre a transferência para o Tribunal Geral da União Europeia da competência para decidir, em primeira instância, dos litígios entre a União e os seus agentes, o Tribunal da Função Pública deixará de existir, e o mandato dos três juízes nomeados pela presente decisão terminará, ipso facto, no dia anterior ao da aplicação do referido regulamento.»

12

O artigo 1.o da Decisão 2016/454 dispõe:

«São nomeados juízes do Tribunal da Função Pública da União Europeia:

Sean Van Raepenbusch, com efeitos a partir de 1 de outubro de 2014,

João Sant’Anna, com efeitos a partir de 1 de abril de 2016,

Alexander Kornezov, com efeitos a partir de 1 de abril de 2016.»

Antecedentes do processo objeto de reapreciação

Processo de nomeação em causa

13

Com a Decisão 2009/474/CE, Euratom do Conselho, de 9 de junho de 2009, que nomeia um juiz do Tribunal da Função Pública da União Europeia (JO 2009, L 156, p. 56), I. Rofes i Pujol foi nomeada juíza do Tribunal da Função Pública por um período de seis anos, entre 1 de setembro de 2009 e 31 de agosto de 2015.

14

Na sequência do convite público à apresentação de candidaturas de 3 de dezembro de 2013, lançado na perspetiva do termo, em 30 de setembro de 2014, dos mandatos de dois outros juízes do Tribunal da Função Pública, a saber, R. Van Raepenbusch e H. Kreppel, o comité mencionado no artigo 3.o, n.o 3, do anexo I do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia (a seguir «Comité de Seleção») elaborou uma lista de seis candidatos.

15

Não tendo o Conselho procedido, antes de expirarem esses dois mandatos, à nomeação de juízes para os lugares ocupados por R. Van Raepenbusch e H. Kreppel, estes permaneceram no cargo além de 30 de setembro de 2014, de acordo com o artigo 5.o, terceiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, segundo o qual o juiz permanece no cargo até que o seu sucessor assuma funções. Esta disposição era aplicável aos juízes do Tribunal da Função Pública por força do artigo 5.o, primeiro parágrafo, do anexo I do referido Estatuto.

16

Nenhum convite público à apresentação de candidaturas foi publicado na perspetiva do termo do mandato de I. Rofes i Pujol. Neste contexto, e de acordo com as disposições mencionadas no número anterior, esta continuou em funções além de 31 de agosto de 2015.

17

Com a Decisão 2016/454, o Conselho nomeou, em 22 de março de 2016, três juízes para o Tribunal da Função Pública, a saber, R. Van Raepenbusch, com efeitos a partir de 1 de outubro de 2014, e J. Sant’Anna e A. Kornezov, com efeitos a partir de 1 de abril de 2016. Para proceder às nomeações para estes três lugares de juízes (a seguir «processo de nomeação em causa»), o Conselho utilizou a lista dos candidatos elaborada na sequência do convite público à apresentação de candidaturas de 3 de dezembro de 2013, incluindo para o lugar vago anteriormente ocupado por I. Rofes i Pujol (a seguir «terceiro lugar»), quando esse convite público à apresentação de candidaturas não visava esse lugar.

18

J. Sant’Anna e A. Kornezov prestaram juramento em 13 de abril de 2016.

19

Por Decisão de 14 de abril de 2016 (JO 2016, C 146, p. 11), o Tribunal da Função Pública afetou os juízes K. Bradley, J. Sant’Anna e A. Kornezov à Segunda Secção para o período compreendido entre 14 de abril e 31 de agosto de 2016.

Processo C‑542/18 RX‑II

Factos na origem do litígio

20

E. Simpson, que era agente auxiliar na unidade de tradução de língua estónia no Conselho desde 1 de junho de 2004, foi recrutado em 1 de janeiro de 2005 como funcionário estagiário no grau AD 5, após ter sido aprovado no concurso geral EPSO/LA/3/03 destinado à constituição de uma lista de reserva para o recrutamento de tradutores adjuntos de grau (LA) 8. Foi promovido ao grau AD 6 em 1 de janeiro de 2008.

21

Em 2009, E. Simpson obteve aprovação no concurso EPSO/AD/113/07. Em 28 de abril de 2009, foi publicada a lista de reserva do concurso. Em 25 de junho de 2010, E. Simpson pediu, com base no artigo 90.o, n.o 1, do Estatuto dos Funcionários da União Europeia (a seguir «Estatuto»), que beneficiasse de uma progressão ao grau AD 9, invocando o facto de ter sido aprovado no concurso EPSO/AD/113/07 correspondente a esse grau e o facto de três funcionários que, segundo afirma, se encontravam numa situação comparável à sua terem beneficiado de uma progressão de grau, na sequência da aprovação num concurso de grau superior ao seu.

22

Por nota de 9 de dezembro de 2010, o Conselho, indeferindo esse pedido, indicou que, na falta de uma disposição estatutária que confira aos funcionários o direito de beneficiarem automaticamente de uma progressão de grau com base numa aprovação num concurso de um grau superior ao seu, essa decisão só podia ser concedida à luz do interesse do serviço e que, no caso, esse interesse não existia, tendo em conta a situação da unidade de tradução de língua estónia em 2010.

23

Em 8 de março de 2011, E. Simpson apresentou no Conselho uma reclamação dessa decisão, nos termos do artigo 90.o, n.o 2, do Estatuto. A reclamação foi indeferida por Decisão de 7 de outubro de 2011.

Processos no Tribunal da Função Pública e no Tribunal Geral que antecederam a adoção do primeiro acórdão em reapreciação

24

Em 27 de dezembro de 2011, E. Simpson interpôs no Tribunal da Função Pública recurso da Decisão de 7 de outubro de 2011.

25

Por Acórdão de 12 de dezembro de 2013, Simpson/Conselho (F‑142/11, EU:F:2013:201), o Tribunal da Função Pública anulou a Decisão de 7 de outubro de 2011 por violação do dever de fundamentação.

26

Por petição entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 24 de fevereiro de 2014, o Conselho interpôs recurso desse acórdão.

27

Por Acórdão de 22 de outubro de 2015, Conselho/Simpson (T‑130/14 P, EU:T:2015:796), o Tribunal Geral deu provimento a esse recurso, com o fundamento de que uma inexatidão material tinha viciado o raciocínio do Tribunal da Função Pública, ao qual remeteu o processo.

28

Por Despacho de 24 de junho de 2016, Simpson/Conselho (F‑142/11 RENV, EU:F:2016:136), a Segunda Secção do Tribunal da Função Pública negou integralmente provimento ao recurso de E. Simpson.

29

Por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 6 de setembro de 2016, E. Simpson interpôs recurso desse despacho. O recurso foi registado na Secretaria do Tribunal Geral sob o número T‑646/16 P.

30

Em 21 de março de 2018, o presidente da Secção dos recursos de decisões do Tribunal Geral reabriu a fase escrita nesse processo, por um lado, na sequência do Acórdão de 23 de janeiro de 2018, FV/Conselho (T‑639/16 P, EU:T:2018:22), no qual o Tribunal Geral (Secção dos recursos de decisões do Tribunal da Função Pública) anulou o Acórdão de 28 de junho de 2016, FV/Conselho (F‑40/15, EU:F:2016:137), com o fundamento de que a formação de julgamento que o tinha proferido não tinha sido constituída de forma regular, e, por outro, na sequência da Decisão de 19 de março de 2018, Reapreciação FV/Conselho (C‑141/18 RX, EU:C:2018:218), na qual o Tribunal de Justiça (Secção de reapreciação) decidiu não ter de reapreciar esse acórdão.

31

Em 22 de março de 2018, o Tribunal Geral convidou as partes a apresentar as suas observações sobre as consequências a retirar, no processo T‑646/16 P, do Acórdão de 23 de janeiro de 2018, FV/Conselho (T‑639/16 P, EU:T:2018:22). Em resposta a esse convite, as partes alegaram, por um lado, que um fundamento relativo a uma irregularidade na composição da formação de julgamento, como a que foi declarada pelo Tribunal Geral nesse acórdão, constituía um fundamento de ordem pública, de conhecimento oficioso pelo juiz de recurso, e, por outro, que o Despacho do Tribunal da Função Pública de 24 de junho de 2016, Simpson/Conselho (F‑142/11 RENV, EU:F:2016:136), tinha sido assinado pela mesma formação de julgamento cuja composição foi considerada irregular. Assim, segundo as partes, esse despacho do Tribunal da Função Pública devia ser anulado por razões idênticas às que foram acolhidas pelo Tribunal Geral no mesmo acórdão.

Primeiro acórdão em reapreciação

32

Com o primeiro acórdão em reapreciação, o Tribunal Geral anulou o Despacho do Tribunal da Função Pública de 24 de junho de 2016, Simpson/Conselho (F‑142/11 RENV, EU:F:2016:136), e remeteu o processo a uma secção do Tribunal Geral diferente da que tinha decidido do recurso para que esta se pronunciasse em primeira instância.

33

Os n.os 38 a 46 do primeiro acórdão em reapreciação têm a seguinte redação:

«38

Em primeiro lugar, há que lembrar que, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, um fundamento baseado em irregularidade da composição da formação de julgamento constitui um fundamento de ordem pública, de conhecimento oficioso pelo juiz de segunda instância, mesmo no caso de essa irregularidade não ter sido invocada em primeira instância (v., neste sentido, Acórdão de 1 de julho de 2008, Chronopost e La Poste/UFEX e o., C‑341/06 P e C‑342/06 P, EU:C:2008:375, n.os 44 a 50 e jurisprudência aí referida).

39

Em segundo lugar, há que lembrar ainda que, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, o juiz da União não pode, em princípio, basear a sua decisão num fundamento jurídico de que conhece oficiosamente, mesmo que seja de ordem pública, sem ter previamente convidado as partes a apresentar as suas observações sobre esse fundamento (v. Acórdão de 17 de dezembro de 2009, Reapreciação M/EMEA, C‑197/09 RX-II, EU:C:2009:804, n.o 57 e jurisprudência aí referida).

40

Em terceiro lugar, refira‑se que, no Acórdão de 23 de janeiro de 2018, FV/Conselho (T‑639/16 P, EU:T:2018:22), na apreciação do fundamento relativo à irregularidade da composição da formação de julgamento e invocado pelo recorrente pelo facto de o processo de nomeação de um dos juízes que integraram essa formação estar ferido de irregularidade, o Tribunal Geral declarou o seguinte.

41

Em primeiro lugar, o Tribunal Geral observou que o Tribunal da Função Pública (Segunda Secção), quando proferiu o Acórdão de 28 de junho de 2016, FV/Conselho (F‑40/15, EU:F:2016:137), era composto pelos juízes K. Bradley, J. Sant’Anna e A. Kornezov. O Tribunal Geral observou igualmente que, segundo o dispositivo e o considerando 5 da Decisão [2016/454], o Conselho tinha nomeado juízes do Tribunal da Função Pública, em primeiro lugar, S. Van Raepenbusch, em segundo lugar, J. Sant’Anna e, em terceiro lugar, A. Kornezov. Assim, o Tribunal Geral referiu que o juiz K. Bradley não tinha sido nomeado juiz do Tribunal da Função Pública pela Decisão 2016/454 e não podia, portanto, ser o juiz visado pelo fundamento mencionado no n.o 40, supra, mas que, em contrapartida, os juízes J. Sant’Anna e A. Kornezov tinham sido nomeados juízes do Tribunal da Função Pública por essa decisão.

42

Em segundo lugar, o Tribunal Geral examinou o fundamento relativo a uma irregularidade do processo de nomeação, pelo facto de o Conselho ter nomeado um juiz para o [terceiro lugar], recorrendo à lista de candidatos elaborada na sequência do convite público à apresentação de candidaturas [de 3 de dezembro de 2013] para preencher os lugares vagos ocupados pelos juízes S. Van Raepenbusch e H. Kreppel no Tribunal da Função Pública, quando essa lista não tinha sido elaborada com vista à nomeação de um juiz para o [terceiro lugar]. A este respeito, no n.o 51 do Acórdão de 23 de janeiro de 2018, FV/Conselho (T‑639/16 P, EU:T:2018:22), o Tribunal Geral declarou que, ao utilizar a lista elaborada na sequência do convite público à apresentação de candidaturas de 3 de dezembro de 2013, para prover o terceiro lugar […], o Conselho violou o quadro legal imposto pelo convite público à apresentação de candidaturas de 3 de dezembro de 2013. Assim, após ter recordado que, segundo o dispositivo e o considerando 5 da Decisão 2016/454, o Conselho tinha nomeado juízes do Tribunal da Função Pública, em primeiro lugar, R. Van Raepenbusch, em segundo lugar, J. Sant’Anna e, em terceiro lugar, A. Kornezov, o Tribunal Geral declarou que essa instituição tinha o direito de utilizar essa lista no respeitante às duas primeiras nomeações, mas não no respeitante à terceira.

43

Em terceiro lugar, no n.o 78 do Acórdão de 23 de janeiro de 2018, FV/Conselho (T‑639/16 P, EU:T:2018:22), o Tribunal Geral declarou que, tendo em conta a importância do respeito das regras da nomeação de um juiz para a confiança dos sujeitos de direito e do público na independência e na imparcialidade dos tribunais, o juiz em causa não pode ser considerado um juiz previamente estabelecido por lei na aceção do artigo 47.o, segundo parágrafo, primeira frase, da [Carta], tendo, portanto, anulado integralmente o Acórdão de 28 de junho de 2016, FV/Conselho (F‑40/15, EU:F:2016:137).

44

No caso, basta observar que o Despacho [de 24 de junho de 2016, Simpson/Conselho (F‑142/11 RENV, EU:F:2016:136)] foi proferido pelo Tribunal da Função Pública (Segunda Secção), composto pelos juízes K. Bradley, J. Sant’Anna e A. Kornezov, a saber, pela mesma formação de julgamento que proferiu o Acórdão de 28 de junho de 2016, FV/Conselho (F‑40/15, EU:F:2016:137), e cuja composição foi considerada irregular no Acórdão de 23 de janeiro de 2018, FV/Conselho (T‑639/16, EU:T:2018:22).

45

Assim, há que conhecer oficiosamente do fundamento relativo a uma irregularidade na composição da formação de julgamento, que, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, lembrada no n.o 38, supra, constitui um fundamento de ordem pública que deve ser apreciado oficiosamente pelo juiz de segunda instância, mesmo no caso de essa irregularidade não ter sido invocada em primeira instância (v., neste sentido, Acórdão de 1 de julho de 2008, Chronopost e La Poste/UFEX e o., C‑341/06 P e C‑342/06 P, EU:C:2008:375, n.os 44 a 50 e jurisprudência aí referida), e, ouvidas as partes, aplicar ao caso os princípios lembrados pelo Tribunal Geral no Acórdão de 23 de janeiro de 2018, FV/Conselho (T‑639/16 P, EU:T:2018:22).

46

Assim, há que anular integralmente o despacho recorrido por violação do princípio do juiz previamente estabelecido por lei consagrado no artigo 47.o, segundo parágrafo, primeiro período, da [Carta], sem que seja necessário analisar os fundamentos suscitados pelo recorrente.»

Processo C‑543/18 RX‑II

Factos na origem do litígio

34

De 16 de maio de 2007 a 31 de agosto de 2013, HG, funcionário da Comissão, foi afeto à delegação da Comissão junto das Nações Unidas em Nova Iorque (Estados Unidos).

35

Em 15 de setembro de 2008, a Comissão e HG assinaram um acordo de disponibilização de um alojamento de função correspondente às necessidades da sua família (a seguir «alojamento de função») nos termos do artigo 5.o do anexo X do Estatuto.

36

Em outubro de 2008, HG informou a chefe de administração da delegação da Comissão junto das Nações Unidas em Nova Iorque, «A», por um lado, de que não tinha podido mudar‑se para o alojamento de funções devido a problemas de saúde da sua filha, nascida em junho do mesmo ano, e, por outro, que ocuparia o alojamento de função, mas residiria também regularmente no apartamento da sua mulher, para beneficiar da companhia da sua família. HG alega igualmente ter informado «A», em data por precisar, que um dos seus amigos, «B», ocuparia o alojamento de função por «algumas horas» ou «dois dias em cada duas semanas» como seu «guardião». A esse respeito, HG indica, por um lado, ter pedido a «B», em setembro de 2008, que procedesse às formalidades junto do fornecedor de eletricidade para o alojamento de função e, por outro, ter‑lhe dado a chave do alojamento de função em dezembro de 2008.

37

Por Decisão de 10 de fevereiro de 2015, a Autoridade Investida do Poder de Nomeação tripartida (a seguir «AIPN tripartida») considerou que, primeiro, ao não residir com a sua família no alojamento de função, HG tinha violado o artigo 5.o do anexo X do Estatuto; segundo, ao não assinar o contrato de fornecimento de eletricidade, tinha violado as suas obrigações decorrentes do n.o 22.10.11.4 do vade‑mécum da Direção‑Geral (DG) «Relações Externas» ao cuidado do pessoal das delegações; e terceiro, o comportamento ilícito de HG estava na origem dos danos resultantes de a instituição ter assumido o custo da locação injustificada do alojamento de função. Consequentemente, a AIPN tripartida aplicou a HG a sanção disciplinar de suspensão de subida de escalão durante um período de 18 meses e condenou‑o a reparar os referidos danos no montante de 108596,35 euros.

38

Em 9 de maio de 2015, HG apresentou uma reclamação, nos termos do artigo 90.o, n.o 2, do Estatuto, contra a Decisão de 10 de fevereiro de 2015. Essa reclamação foi indeferida por Decisão da AIPN tripartida de 10 de setembro de 2015.

Processos no Tribunal da Função Pública e no Tribunal Geral que antecederam a adoção do segundo acórdão em reapreciação

39

Por petição que deu entrada na Secretaria do Tribunal da Função Pública em 21 de dezembro de 2015, HG interpôs um recurso, a título principal, por um lado, de anulação da Decisão de 10 de fevereiro de 2015 e, na medida do necessário, da decisão de indeferimento da sua reclamação, pedindo, por outro, a condenação da Comissão na reparação dos danos alegadamente sofridos.

40

Por Acórdão de 19 de julho de 2016, HG/Comissão (F‑149/15, EU:F:2016:155), a Segunda Secção do Tribunal da Função Pública negou provimento a esse recurso e condenou HG nas suas próprias despesas e nas despesas da Comissão.

41

Por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 28 de setembro de 2016, HG interpôs recurso desse acórdão. O recurso foi registado na Secretaria do Tribunal Geral sob o número T‑693/16.

42

Na sequência da prolação do Acórdão de 23 de janeiro de 2018, FV/Conselho (T‑639/16 P, EU:T:2018:22), cujo teor está resumido no n.o 30 do presente acórdão, HG perguntou ao Tribunal Geral, por requerimento apresentado em 31 de janeiro de 2018, se tencionava recolher as observações das partes sobre as consequências desse acórdão, no respeitante ao processo referente ao seu recurso.

43

Por Despacho de 23 de março de 2018, o presidente da Secção dos recursos de decisões do Tribunal Geral ordenou a reabertura da fase oral do processo. Em 26 de março de 2018, o Tribunal Geral convidou as partes a apresentar observações quanto às consequências a retirar desse acórdão para o caso.

44

Em resposta a esse convite, as partes indicaram que o Acórdão do Tribunal da Função Pública de 19 de julho de 2016, HG/Comissão (F‑149/15, EU:F:2016:155), tinha sido proferido pela mesma formação de julgamento cuja composição fora considerada irregular no Acórdão de 23 de janeiro de 2018, FV/Conselho (T‑639/16 P, EU:T:2018:22). HG alegou igualmente que um fundamento relativo a uma irregularidade da composição da formação de julgamento, como a que foi declarada pelo Tribunal Geral neste último acórdão, constituía um fundamento de ordem pública e concluiu daí que o Acórdão do Tribunal da Função Pública de 19 de julho de 2016, HG/Comissão (F‑149/15, EU:F:2016:155), devia ser anulado pelas mesmas razões que tinham sido consideradas pelo Tribunal Geral no Acórdão de 23 de janeiro de 2018, FV/Conselho (T‑639/16 P, EU:T:2018:22). Quanto à Comissão, reconheceu que os fundamentos com base nos quais o Tribunal Geral proferiu este último acórdão poderiam justificar a anulação do Acórdão do Tribunal da Função Pública de 19 de julho de 2016, HG/Comissão (F‑149/15, EU:F:2016:155), e a remessa do processo a uma secção do Tribunal Geral diferente da que decidira do recurso interposto por HG.

Segundo acórdão em reapreciação

45

Com o segundo acórdão em reapreciação, o Tribunal Geral anulou o Acórdão do Tribunal da Função Pública de 19 de julho de 2016, HG/Comissão (F‑149/15, EU:F:2016:155), e remeteu o processo a uma secção do Tribunal Geral diferente da que tinha decidido o recurso de segunda instância para se pronunciar em primeira instância.

46

Esta decisão baseia‑se, nos n.os 39 a 47 do segundo acórdão em reapreciação, numa fundamentação que é, essencialmente, idêntica à reproduzida no n.o 33 do presente acórdão.

Tramitação do processo no Tribunal de Justiça

47

Na sequência da proposta do primeiro advogado‑geral, a Secção de Reapreciação considerou — nas suas Decisões de 17 de setembro de 2018, Reapreciação Simpson/Conselho (C‑542/18 RX), e de 17 de setembro de 2018, Reapreciação HG/Comissão (C‑543/18 RX), proferidas ao abrigo do artigo 62.o, segundo parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia e do artigo 193.o, n.o 4, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça — que se devia proceder à reapreciação dos acórdãos em causa para determinar se lesavam a unidade ou a coerência do direito da União. Por outro lado, de acordo com o artigo 195.o, n.o 5, do Regulamento de Processo, a Secção de reapreciação decidiu, em 14 de fevereiro de 2019, pedir ao Tribunal de Justiça que remetesse os dois processos em reapreciação à Grande Secção.

48

Dada a conexão entre os processos C‑542/18 RX‑II e C‑543/18 RX‑II, há que os apensar para efeitos de acórdão, tendo as partes tido na audiência a possibilidade de se pronunciar sobre a oportunidade dessa apensação.

Quanto à reapreciação

49

A título preliminar, refira‑se que a resposta à questão objeto de reapreciação, reproduzida nos n.os 4 e 5 do presente acórdão, não pode ser inferida só do facto de, por Decisão de 19 de março de 2018, Reapreciação FV/Conselho (C‑141/18 RX, EU:C:2018:218), o Tribunal de Justiça ter decidido que não havia que proceder à reapreciação do Acórdão de 23 de janeiro de 2018, FV/Conselho (T‑639/16 P, EU:T:2018:22), no qual o Tribunal Geral baseou os acórdãos em reapreciação. Com efeito, como resulta dos seus n.os 4 e 5, essa decisão do Tribunal de Justiça foi motivada pelo facto de, na sua proposta de reapreciação do Acórdão de 23 de janeiro de 2018, FV/Conselho (T‑639/16 P, EU:T:2018:22), o primeiro advogado‑geral, embora expondo as razões específicas que o levaram a recorrer à secção de reapreciação, indicar que considerava que esse acórdão «não apresenta, no raciocínio jurídico que contém, um risco sério de lesão da unidade ou da coerência do direito da União». Resultava, assim, dessa proposta de reapreciação não estarem preenchidos os pressupostos previstos no artigo 62.o, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia para efeitos da reapreciação de uma decisão do Tribunal Geral.

50

No que respeita à resposta à questão objeto da presente reapreciação, há que examinar, num primeiro momento, se, tendo em conta nomeadamente o princípio geral da segurança jurídica, o Tribunal Geral cometeu erros de direito ao anular as decisões impugnadas com o fundamento de a formação de julgamento do Tribunal da Função Pública que proferiu essas decisões ser composta de forma irregular devido a uma irregularidade que afetava o processo de nomeação de um dos membros dessa formação e que levava a uma violação do princípio do juiz previamente estabelecido por lei, consagrado no artigo 47.o, segundo parágrafo, primeiro período, da Carta.

51

No âmbito desta análise, importa determinar, por um lado, em que condições pode a nomeação de um juiz, à semelhança dos atos previstos no artigo 277.o TFUE, ser objeto de fiscalização incidental da legalidade. Por outro lado, há que verificar se, na medida em que seja demonstrada a irregularidade relativa ao processo de nomeação, dada por provada pelo Tribunal Geral, esta implicou efetivamente uma violação do artigo 47.o, segundo parágrafo, primeiro período, da Carta, que justifique a anulação dessas decisões.

52

No caso de o referido exame revelar que os acórdãos em reapreciação estão efetivamente feridos de erros de direito, haverá que avaliar, num segundo momento, se esses acórdãos lesam a unidade ou a coerência do direito da União.

Quanto às condições de uma fiscalização incidental da legalidade do processo de nomeação em causa

53

Nos acórdãos em reapreciação, o Tribunal Geral decidiu que se devia conhecer oficiosamente do fundamento relativo à irregularidade da composição da formação de julgamento que proferiu as decisões impugnadas. Com efeito, baseando‑se no Acórdão do Tribunal de Justiça de 1 de julho de 2008, Chronopost e La Poste/UFEX e o. (C‑341/06 P e C‑342/06 P, EU:C:2008:375), bem como no Acórdão do Tribunal Geral de 23 de janeiro de 2018, FV/Conselho (T‑639/16 P, EU:T:2018:22), considerou que se tratava de um fundamento de ordem pública de conhecimento oficioso do juiz de segunda instância, mesmo no caso de essa irregularidade não ter sido invocada em primeira instância.

54

A título preliminar, há que observar que a Decisão 2016/454, pela qual o sucessor no terceiro lugar foi nomeado juiz do Tribunal da Função Pública, não constitui, como salientou a advogada‑geral, nomeadamente nos n.os 118 a 124 das suas conclusões, um ato de alcance geral na aceção do artigo 277.o TFUE.

55

No entanto, decorre do direito fundamental a uma ação perante um tribunal independente, imparcial e previamente estabelecido por lei, garantido pelo artigo 47.o da Carta, que todos os sujeitos de direito devem, em princípio, ter a possibilidade de invocar uma violação desse direito. Daí resulta que o juiz da União deve poder verificar se uma irregularidade que viciasse o processo de nomeação em causa pode ter dado origem a uma violação desse direito fundamental.

56

Há que analisar ainda se o facto de nenhuma das partes nos presentes processos ter suscitado uma impugnação quanto à regularidade da formação de julgamento que adotou as decisões impugnadas obstava a que o Tribunal Geral conhecesse oficiosamente dessa regularidade.

57

A este respeito, há que sublinhar que as garantias de acesso a um tribunal independente, imparcial e previamente estabelecido por lei, nomeadamente as que determinam o seu conceito e a sua composição, representam a pedra angular do direito ao processo equitativo. Este implica que qualquer órgão jurisdicional tem a obrigação de verificar se, pela sua composição, constitui um tribunal desse tipo quando surja uma dúvida séria quanto a esse ponto. Essa verificação é necessária à confiança que os tribunais de uma sociedade democrática devem inspirar nos particulares. Neste sentido, essa fiscalização constitui uma formalidade essencial cujo respeito é de ordem pública e é de conhecimento oficioso (v., neste sentido, Acórdão de 1 de julho de 2008, Chronopost e La Poste/UFEX e o., C‑341/06 P e C‑342/06 P, EU:C:2008:375, n.os 46 e 48).

58

Por conseguinte, o Tribunal Geral não cometeu nenhum erro ao decidir, nos acórdãos em reapreciação, conhecer oficiosamente da regularidade da composição da formação de julgamento que proferiu as decisões impugnadas, uma vez que a irregularidade dessa mesma formação de julgamento tinha sido declarada no Acórdão de 23 de janeiro de 2018, FV/Conselho (T‑639/16 P, EU:T:2018:22).

Quanto à irregularidade no processo de nomeação em causa e aos seus efeitos no direito das partes a um tribunal previamente estabelecido pela lei

Irregularidade no processo de nomeação em causa

59

Nos acórdãos em reapreciação, o Tribunal Geral, com base no Acórdão de 23 de janeiro de 2018, FV/Conselho (T‑639/16 P, EU:T:2018:22), concluiu que o Conselho tinha violado o quadro legal imposto pelo convite público à apresentação de candidaturas de 3 de dezembro de 2013 ao utilizar a lista dos candidatos elaborada na sequência deste para preencher o terceiro lugar.

60

Esta conclusão não contém nenhum erro de direito.

61

Com efeito, na medida em que, nos termos do seu n.o 4, o convite público à apresentação de candidaturas de 3 de dezembro de 2013 tinha sido expressa e exclusivamente lançado para prover os lugares dos dois juízes cujo mandato expirava em 30 de setembro de 2014, a saber, os lugares ocupados pelos juízes S. Van Raepenbusch e H. Kreppel, e não com vista a prover também o terceiro lugar, anteriormente ocupado pela juíza I. Rofes i Pujol, cujo mandato expirava em 31 de agosto de 2015, o Conselho, ao recorrer à lista de candidatos estabelecida na sequência desse convite público à apresentação de candidaturas para prover igualmente esse último lugar, violou o quadro legal que tinha imposto a si próprio ao publicar esse convite público à apresentação de candidaturas e que tinha de respeitar. As «razões de calendário», a que se refere o considerando 4 da Decisão 2016/454 no contexto da reforma da arquitetura jurisdicional da União Europeia, não justificam o desrespeito do mesmo convite público à apresentação de candidaturas.

62

Em contrapartida, contrariamente ao que o Tribunal Geral considerou nos n.os 52 a 58 do Acórdão de 23 de janeiro de 2018, FV/Conselho (T‑639/16 P, EU:T:2018:22), considerações que, de resto, não foram expressamente reproduzidas nos acórdãos em reapreciação, a utilização dessa lista para a nomeação para o terceiro lugar revela‑se, quanto ao restante, conforme com as regras que regem o processo de nomeação dos juízes do Tribunal da Função Pública.

63

Com efeito, por força do artigo 3.o, n.o 4, terceiro período, do anexo I do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, a lista dos candidatos devia incluir um número de candidatos correspondente, pelo menos, ao dobro do número de juízes a nomear pelo Conselho. Ora, a lista elaborada na sequência do convite público à apresentação de candidaturas de 3 de dezembro de 2013 incluía seis candidatos, o que corresponde efetivamente ao dobro do número de juízes nomeados com base nessa lista. Esta disposição foi, assim, plenamente respeitada no caso em apreço.

64

Além disso, nenhum elemento permite pôr em causa o respeito do artigo 257.o, quarto parágrafo, primeiro período, TFUE, que exige que os membros dos tribunais especializados sejam escolhidos de entre pessoas que ofereçam todas as garantias de independência e que possuam a capacidade exigida para o exercício de funções jurisdicionais, do artigo 3.o, n.o 2, primeiro período, do anexo I do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, por força do qual qualquer pessoa que preenchesse esses requisitos e possuísse a cidadania da União podia apresentar a sua candidatura aos lugares de juiz do Tribunal da Função Pública, ou do artigo 3.o, n.o 4, segundo período, desse anexo, segundo o qual a lista estabelecida pelo Comité de Seleção devia indicar os candidatos com a experiência de alto nível mais apropriada.

65

Assim, de modo nenhum se pôs em dúvida que o convite público à apresentação de candidaturas de 3 de dezembro de 2013 estava aberto a qualquer cidadão da União que preenchesse os requisitos previstos no artigo 257.o, quarto parágrafo, primeiro período, TFUE, que todos os seis candidatos constantes da lista elaborada na sequência desse convite público possuíam a cidadania da União e tinham sido considerados pelo Comité de Seleção aptos ao exercício das funções de juiz no Tribunal da Função Pública e que essa lista indicava efetivamente os candidatos que possuíam a experiência de alto nível mais apropriada.

66

No que respeita ao artigo 3.o, n.o 1, segundo período, do anexo I do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia — disposição segundo a qual o Conselho assegura, aquando da nomeação de juízes para o Tribunal da Função Pública, uma composição equilibrada desse órgão jurisdicional numa base geográfica tão ampla quanto possível entre os nacionais dos Estados‑Membros — e no que diz respeito aos sistemas jurídicos nacionais representados, é certo que o Tribunal Geral considerou, no n.o 56 do Acórdão de 23 de janeiro de 2018, FV/Conselho (T‑639/16 P, EU:T:2018:22), que não se podia excluir a possibilidade de a utilização da lista de candidatos estabelecida na sequência do convite público à apresentação de candidaturas de 3 de dezembro de 2013 para a nomeação de um juiz para o terceiro lugar ter a consequência de excluir uma parte dos potenciais candidatos ao lugar, nomeadamente os de nacionalidade espanhola, que, tendo em conta o requisito previsto nessa disposição, podem eventualmente ter sido dissuadidos de participar nesse convite público por já ter o Tribunal da Função Pública um membro espanhol no momento do convite à apresentação de candidaturas e o convite não visar o lugar desse membro.

67

Todavia, de nenhuma forma isso permite considerar que a nomeação do juiz para o terceiro lugar conduziu a uma composição não equilibrada em termos de repartição geográfica ou de representação dos sistemas jurídicos nacionais no Tribunal da Função Pública e que, por conseguinte, o Conselho procedeu a essa nomeação em violação do artigo 3.o, n.o 1, segundo período, do anexo I do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia. De resto, o facto de certos potenciais candidatos terem sido dissuadidos de participar no convite público à apresentação de candidaturas de 3 de dezembro de 2013, identificado pelo Tribunal Geral no n.o 56 do Acórdão de 23 de janeiro de 2018, FV/Conselho (T‑639/16 P, EU:T:2018:22), resultou direta e exclusivamente de esse convite público não se destinar a prover o terceiro lugar, pelo que esse facto não pode ser considerado uma irregularidade distinta da identificada no n.o 61 do presente acórdão.

68

Resulta destas considerações que a irregularidade no processo de nomeação em causa resulta exclusivamente da violação, pelo Conselho, do convite público à apresentação de candidaturas de 3 de dezembro de 2013 e não de uma violação das exigências decorrentes do artigo 257.o, quarto parágrafo, TFUE ou do artigo 3.o do anexo I do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia.

Incidência da irregularidade no processo de nomeação em causa sobre o direito das partes a um tribunal previamente estabelecido pela lei

69

Nos acórdãos em reapreciação, o Tribunal Geral, baseando‑se novamente no Acórdão de 23 de janeiro de 2018, FV/Conselho (T‑639/16 P, EU:T:2018:22), declarou que, tendo em conta a importância do respeito das regras da nomeação de um juiz para a confiança dos sujeitos de direito e do público na independência e na imparcialidade dos tribunais, o juiz nomeado para o terceiro lugar não pode ser considerado um juiz previamente estabelecido por lei, na aceção do artigo 47.o, segundo parágrafo, primeiro período, da Carta.

70

Nos termos dessa disposição, toda a pessoa tem direito a que a sua causa seja julgada de forma equitativa, publicamente e num prazo razoável, por um tribunal independente e imparcial, previamente estabelecido por lei.

71

A esse respeito, o Tribunal de Justiça decidiu no sentido de que a exigência de independência e de imparcialidade faz parte do conteúdo essencial do direito a uma tutela jurisdicional efetiva e do direito fundamental a um processo equitativo, que reveste importância essencial enquanto garante da proteção do conjunto dos direitos que o direito da União confere aos sujeitos de direito e da preservação dos valores comuns aos Estados‑Membros, enunciados no artigo 2.o TUE, nomeadamente o valor do Estado de direito. Essas garantias postulam a existência de regras, nomeadamente no que respeita à composição da instância, à nomeação, à duração das funções, bem como às causas de escusa, de recusa e de destituição dos seus membros, que permitem afastar qualquer dúvida legítima, no espírito dos sujeitos de direito, quanto à impermeabilidade da referida instância a elementos externos e quanto à sua neutralidade relativamente aos interesses em confronto. Mais especificamente, no que respeita às decisões de nomeação, é necessário, nomeadamente, que as condições substantivas e as modalidades processuais que presidem à adoção dessas decisões sejam de tal ordem que não possam fazer surgir tais dúvidas legítimas no que diz respeito aos juízes nomeados [v., neste sentido, Acórdão de 19 de novembro de 2019, A. K. e o. (Indépendance de la chambre disciplinaire de la Cour suprême), C‑585/18, C‑624/18 e C‑625/18, EU:C:2019:982, n.os 120, 123 e 134 e jurisprudência aí referida].

72

Uma vez que o artigo 47.o, segundo parágrafo, primeiro período, da Carta corresponde ao artigo 6.o, n.o 1, primeiro período, da Convenção Europeia para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, assinada em Roma, em 4 de novembro de 1950 (a seguir «CEDH»), o seu sentido e o seu alcance são, por força do artigo 52.o, n.o 3, da Carta, os mesmos conferidos por essa Convenção. Por conseguinte, o Tribunal de Justiça deve assegurar que a sua interpretação do artigo 47.o, segundo parágrafo, da Carta garante um nível de proteção que não vá contra o garantido pelo artigo 6.o CEDH, conforme interpretado pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem [Acórdão de 19 de novembro de 2019, A. K. e o. (Indépendance de la chambre disciplinaire de la Cour suprême), C‑585/18, C‑624/18 e C‑625/18, EU:C:2019:982, n.o 118 e jurisprudência aí referida].

73

Segundo jurisprudência constante do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, a introdução da expressão «estabelecido por lei» no artigo 6.o, n.o 1, primeiro período, CEDH tem por objetivo evitar que a organização do sistema judicial seja deixada à discricionariedade do executivo e assegurar que essa matéria seja regulada por uma lei adotada pelo poder legislativo em conformidade com as regras que enquadram o exercício da sua competência. Essa expressão reflete nomeadamente o princípio do Estado de Direito e diz respeito não só à base legal da própria existência do tribunal mas também à composição da formação em cada processo e ainda a qualquer outra disposição de direito interno cujo desrespeito leve à irregularidade da participação de um ou mais juízes no exame do processo, o que inclui, particularmente, disposições relativas à independência e à imparcialidade dos membros do tribunal em causa (v., neste sentido, Tribunal EDH, 8 de julho de 2014, Biagioli c. San Marino, CE:ECHR:2014:0708DEC000816213, §§ 72 a 74, e Tribunal EDH, 2 de maio de 2019, Pasquini c. San Marino, CE:ECHR:2019:0502JUD005095616, §§ 100 e 101 e jurisprudência aí referida).

74

Do mesmo modo, o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem já teve a oportunidade de salientar que o direito de ser julgado por um tribunal «estabelecido por lei», na aceção do artigo 6.o, n.o 1, CEDH, engloba, pela sua própria natureza, o processo de nomeação dos juízes (Tribunal EDH, 12 de março de 2019, Ástráðsson c. Islândia, CE:ECHR:2019:0312JUD002637418, não definitivo, § 98).

75

Decorre da jurisprudência referida nos n.os 71 e 73 do presente acórdão que uma irregularidade cometida na nomeação dos juízes no interior do sistema judicial em causa implica uma violação do artigo 47.o, segundo parágrafo, primeiro período, da Carta, nomeadamente quando essa irregularidade seja de uma natureza e de uma gravidade tais que cria um risco real de que outros ramos do poder, particularmente o executivo, possam exercer um poder discricionário indevido que ponha em perigo a integridade do resultado a que conduz o processo de nomeação e semeie, assim, uma dúvida legítima no espírito dos sujeitos de direito quanto à independência e à imparcialidade do ou dos juízes em causa, o que é o caso quando estão em questão regras fundamentais que fazem parte integrante do estabelecimento e do funcionamento desse sistema judicial.

76

É à luz destes princípios que se deve examinar se a irregularidade cometida no processo de nomeação em causa implicou, no caso, uma violação do direito das partes a que a sua causa fosse julgada por um tribunal previamente estabelecido por lei, garantido pelo artigo 47.o, segundo parágrafo, primeiro período, da Carta.

77

A este respeito, há que recordar que, como foi salientado no n.o 68 do presente acórdão, essa irregularidade resulta exclusivamente da inobservância pelo Conselho do convite público à apresentação de candidaturas de 3 de dezembro de 2013.

78

Assim, há que observar que a nomeação de um juiz para o terceiro lugar foi efetuada no respeito das regras fundamentais para a nomeação dos juízes para o Tribunal da Função Pública que constituem o artigo 257.o, quarto parágrafo, TFUE e o artigo 3.o do anexo I do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia.

79

Neste contexto, o simples facto de o Conselho ter recorrido à lista elaborada na sequência do convite público à apresentação de candidaturas de 3 de dezembro de 2013 para preencher o terceiro lugar não basta para provar a existência de uma violação de uma regra fundamental do processo de nomeação dos juízes do Tribunal da Função Pública de uma natureza e de uma gravidade tais que tivesse criado um risco real de que o Conselho fizesse um uso injustificado dos seus poderes, pondo em perigo a integridade do resultado a que conduziu o processo de nomeação e semeando, assim, no espírito dos sujeitos de direito, uma dúvida legítima quanto à independência e à imparcialidade do juiz nomeado para o terceiro lugar ou mesmo da secção a que foi afeto.

80

A este respeito, a irregularidade no processo de nomeação em causa distingue‑se da que estava em causa na Decisão do Tribunal EFTA de 14 de fevereiro de 2017, Pascal Nobile/DAS Rechtsschutz‑Versicherungs (E‑21/16), mencionada no n.o 75 do Acórdão de 23 de janeiro de 2018, FV/Conselho (T‑639/16 P, EU:T:2018:22). Com efeito, essa irregularidade consistia na nomeação de um juiz do Tribunal EFTA para um mandato cuja duração tinha sido excecionalmente fixada em três anos em vez de seis e dizia assim respeito, ao contrário da irregularidade examinada nos presentes processos, à violação de uma regra fundamental relativa à duração dos mandatos de juiz nesse órgão jurisdicional, destinada a proteger a sua independência.

81

Resulta do exposto que a inobservância, pelo Conselho, do convite público à apresentação de candidaturas de 3 de dezembro de 2013 não constitui uma violação das regras fundamentais do direito da União aplicáveis à nomeação dos juízes do Tribunal da Função Pública que implicasse uma violação do direito dos recorrentes a um tribunal estabelecido por lei, garantido pelo artigo 47.o, segundo parágrafo, primeiro período, da Carta.

82

Por conseguinte, uma vez que os acórdãos em reapreciação não contêm outros elementos suscetíveis de pôr em causa o respeito do artigo 47.o, segundo parágrafo, primeiro período, da Carta, há que declarar que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito ao declarar, nesses acórdãos, que essa disposição tinha sido violada. A irregularidade referida no número anterior não podia, assim, por si só, justificar a anulação de uma decisão judicial adotada pela formação de julgamento à qual foi afeto o juiz nomeado para o terceiro lugar.

83

Resulta do exposto que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito ao anular as decisões impugnadas apenas com fundamento na irregularidade cometida no processo de nomeação em causa.

Quanto à existência de uma lesão da unidade ou da coerência do direito da União

84

O erro de direito que vicia os acórdãos em análise é suscetível de lesar a unidade e a coerência do direito da União.

85

Com efeito, os acórdãos em reapreciação são suscetíveis de constituir precedentes para processos futuros, podendo a interpretação e a aplicação erradas pelo Tribunal Geral do artigo 47.o, segundo parágrafo, primeiro período, da Carta repercutir‑se noutros processos que ponham em causa a nomeação de um membro de uma formação de julgamento e, mais genericamente, o direito a um tribunal independente, imparcial e previamente estabelecido por lei.

86

Além disso, esse direito tem um caráter fundamental e transversal no ordenamento jurídico da União, cuja interpretação e coerência devem ser asseguradas pelo Tribunal de Justiça, especialmente quando surgem questões a esse respeito num contexto específico que ainda não deu origem a jurisprudência constante.

87

Nestas condições, há que concluir que os acórdãos em reapreciação lesam a unidade e a coerência do direito da União, na medida em que o Tribunal Geral, enquanto tribunal de segunda instância, declarou que a formação de julgamento do Tribunal da Função Pública que tinha proferido as decisões impugnadas estava composta de forma irregular devido a uma irregularidade que afetava o processo de nomeação de um dos membros dessa formação e que isso implicava uma violação do princípio do juiz previamente estabelecido por lei, consagrado no artigo 47.o, segundo parágrafo, primeiro período, da Carta, e anulou as referidas decisões.

Quanto aos efeitos da reapreciação

88

O artigo 62.o‑B, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia dispõe que, se o Tribunal de Justiça constatar que a decisão do Tribunal Geral afeta a unidade ou a coerência do direito da União, remete o processo ao Tribunal Geral, que fica vinculado pelas soluções de direito dadas pelo Tribunal de Justiça. Além disso, ao remeter o processo, o Tribunal de Justiça pode indicar os efeitos da decisão do Tribunal Geral que devem ser considerados definitivos relativamente às partes no litígio. A título excecional, o próprio Tribunal de Justiça pode decidir definitivamente, se, tendo em conta o resultado da reapreciação, a decisão da causa decorrer das conclusões de facto em que se baseia a decisão do Tribunal Geral.

89

Daí resulta que o Tribunal de Justiça não se pode limitar a declarar a lesão para a unidade ou para a coerência do direito da União sem extrair consequências dessa declaração nos dois litígios em causa (v., igualmente, Acórdão de 10 de setembro de 2015, Reapreciação Missir Mamachi di Lusignano/Comissão,C‑417/14 RX-II, EU:C:2015:588, n.o 60 e jurisprudência aí referida).

90

Tendo o Tribunal Geral anulado, nos acórdãos em reapreciação, as decisões impugnadas com base numa violação do artigo 47.o, segundo parágrafo, primeiro período, da Carta sem examinar os fundamentos que os recorrentes tinham invocado em apoio dos respetivos recursos de segunda instância, há que anular os acórdãos em reapreciação e remeter os processos ao Tribunal Geral para que este possa decidir sobre esses fundamentos.

Quanto às despesas

91

Nos termos do artigo 195.o, n.o 6, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, quando a decisão do Tribunal Geral objeto de reapreciação tiver sido proferida ao abrigo do artigo 256.o, n.o 2, TFUE, o Tribunal de Justiça decide sobre as despesas.

92

Na falta de regras especiais quanto à repartição das despesas em sede de reapreciação, há que decidir que cada parte suportará as suas próprias despesas.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Grande Secção) decide:

 

1)

Os processos C‑542/18 RX‑II e C‑543/18 RX‑II são apensados para efeitos do acórdão.

 

2)

Os Acórdãos do Tribunal Geral da União Europeia (Secção dos recursos de decisões do Tribunal da Função Pública) de 19 de julho de 2018, Simpson/Conselho (T‑646/16 P, não publicado, EU:T:2018:493) e HG/Comissão (T‑693/16 P, não publicado, EU:T:2018:492), lesam a unidade e a coerência do direito da União na medida em que o Tribunal Geral da União Europeia, como tribunal de segunda instância, considerou que a formação de julgamento do Tribunal da Função Pública da União Europeia que tinha proferido respetivamente o Despacho de 24 de junho de 2016, Simpson/Conselho (F‑142/11 RENV, EU:F:2016:136), e o Acórdão de 19 de julho de 2016, HG/Comissão (F‑149/15, EU:F:2016:155), estava composta de forma irregular devido a uma irregularidade que afetava o processo de nomeação de um dos membros dessa formação, levando a uma violação do princípio do juiz previamente estabelecido por lei, consagrado no artigo 47.o, segundo parágrafo, primeiro período, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, e anulou essas decisões.

 

3)

Os referidos acórdãos são anulados.

 

4)

Os processos são remetidos ao Tribunal Geral da União Europeia.

 

5)

Erik Simpson, o Conselho da União Europeia, HG, a Comissão Europeia e o Governo búlgaro suportarão as suas próprias despesas com os processos de reapreciação.

 

Assinaturas


( *1 ) Línguas do processo: inglês e francês.

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