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Document 62000CJ0092

Acórdão do Tribunal (Sexta Secção) de 18 de Junho de 2002.
Hospital Ingenieure Krankenhaustechnik Planungs-Gesellschaft mbH (HI) contra Stadt Wien.
Pedido de decisão prejudicial: Vergabekontrollsenat des Landes Wien - Áustria.
Contratos públicos - Directiva 92/50/CEE - Processo de adjudicação de contratos públicos de serviços - Directiva 89/665/CEE - Âmbito de aplicação - Decisão de anulação do convite para apresentação de propostas - Fiscalização jurisdicional - Alcance.
Processo C-92/00.

Colectânea de Jurisprudência 2002 I-05553

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2002:379

62000J0092

Acórdão do Tribunal (Sexta Secção) de 18 de Junho de 2002. - Hospital Ingenieure Krankenhaustechnik Planungs-Gesellschaft mbH (HI) contra Stadt Wien. - Pedido de decisão prejudicial: Vergabekontrollsenat des Landes Wien - Áustria. - Contratos públicos - Directiva 92/50/CEE - Processo de adjudicação de contratos públicos de serviços - Directiva 89/665/CEE - Âmbito de aplicação - Decisão de anulação do convite para apresentação de propostas - Fiscalização jurisdicional - Alcance. - Processo C-92/00.

Colectânea da Jurisprudência 2002 página I-05553


Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória

Palavras-chave


1. Questões prejudiciais Recurso ao Tribunal de Justiça Órgão jurisdicional nacional na acepção do artigo 234.° CE Conceito Instância de recurso competente em matéria de adjudicação de contratos de direito público

(Artigo 234.° CE)

2. Aproximação das legislações Processos de recurso em matéria de adjudicação de contratos de direito público de fornecimentos e de obras Directivas 89/665 e 92/50 Anulação de um convite para apresentação de propostas Obrigação de os Estados-Membros preverem um processo de recurso Limitação do alcance da fiscalização da legalidade da decisão Inexistência Determinação do momento a tomar em consideração para apreciar a legalidade da decisão Competência do órgão jurisdicional nacional Limites

(Directivas do Conselho 89/665, artigo 1.° , n.° 1, e 92/50)

Sumário


1. Para apreciar se um organismo de reenvio possui o carácter de órgão jurisdicional na acepção do artigo 234.° CE, questão que deve ser apreciada unicamente face ao direito comunitário, o Tribunal de Justiça leva em conta um conjunto de elementos, tais como a origem legal do órgão, o seu carácter permanente, o carácter vinculativo da sua jurisdição, a natureza contraditória do processo, a aplicação, pelo órgão jurisdicional, de regras jurídicas, bem como a sua independência.

Satisfaz estes critérios o Vergabekontrollsenat des Landes Wien, que a Wiener Landesvergabegesetz prevê como organismo competente para decidir, aplicando regras jurídicas, segundo um processo de natureza contraditória e através de decisões com carácter vinculativo, dos recursos em matéria de processos de adjudicação de contratos de direito público. Por outro lado, as disposições que regulam a composição e o funcionamento deste órgão garantem o seu carácter permanente e a sua independência.

( cf. n.os 25-27 )

2. O artigo 1.° , n.° 1, da Directiva 89/665 que coordena as disposições legislativas, regulamentares e administrativas relativas à aplicação dos processos de recurso em matéria de adjudicação dos contratos de direito público de obras e de fornecimentos, com a redacção que lhe foi dada pela Directiva 92/50 relativa à coordenação dos processos de adjudicação de contratos públicos de serviços, exige que a decisão da entidade adjudicante de anular o convite para apresentação de propostas para um contrato público de serviços possa ser objecto de um processo de recurso e ser eventualmente anulada com base na violação do direito comunitário em matéria de adjudicação de contratos de direito público ou das normas nacionais que transpõem esse direito.

Com efeito, essa decisão está sujeita às regras fundamentais do direito comunitário e, nomeadamente, aos princípios consagrados pelo Tratado em matéria de direito de estabelecimento e de livre prestação de serviços. Está também abrangida pelas regras previstas pela Directiva 89/665 a fim de assegurar o respeito das exigências do direito comunitário em matéria de contratos públicos.

No quadro de tal processo de recurso, a Directiva 89/665, com a redacção que lhe foi dada pela Directiva 92/50, opõe-se a que uma regulamentação nacional limite a fiscalização da legalidade da anulação de um convite para apresentação de propostas unicamente ao exame do carácter arbitrário desta decisão.

Por outro lado, a determinação do momento a tomar em consideração para apreciar a legalidade da decisão da entidade adjudicante de anular um convite para apresentação de propostas incumbe ao direito nacional, estando subentendido que as normas nacionais aplicáveis não podem ser menos favoráveis do que as respeitantes a recursos análogos de natureza interna nem tornar praticamente impossível ou excessivamente difícil o exercício dos direitos conferidos pela ordem jurídica comunitária.

( cf. n.os 42, 48, 55, 64, 68, disp. 1-3 )

Partes


No processo C-92/00,

que tem por objecto um pedido dirigido ao Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 234._ CE, pelo Vergabekontrollsenat des Landes Wien (Áustria), destinado a obter, no litígio pendente neste órgão jurisdicional entre

Hospital Ingenieure Krankenhaustechnik Planungs-Gesellschaft mbH (HI)

e

Stadt Wien,

uma decisão a título prejudicial sobre a interpretação do artigo 2._, n._ 1, alínea b), da Directiva 89/665/CEE do Conselho, de 21 de Dezembro de 1989, que coordena as disposições legislativas, regulamentares e administrativas relativas à aplicação dos processos de recurso em matéria de adjudicação dos contratos de direito público de obras e de fornecimentos (JO L 395, p. 33), com a redacção que lhe foi dada pela Directiva 92/50/CEE do Conselho, de 18 de Junho de 1992, relativa à coordenação dos processos de adjudicação de contratos públicos de serviços (JO L 209, p. 1), bem como da Directiva 92/50/CEE, na sua versão decorrente da Directiva 97/52/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de Outubro de 1997, que altera as Directivas 92/50/CEE, 93/36/CEE e 93/37/CEE, relativas à coordenação dos processos de adjudicação, respectivamente, de serviços públicos, de fornecimentos públicos e de empreitadas de obras públicas (JO L 328, p. 1),

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA

(Sexta Secção),

composto por: F. Macken, presidente de secção, C. Gulmann, J.-P. Puissochet, V. Skouris (relator) e J. N. Cunha Rodrigues, juízes,

advogado-geral: A. Tizzano,

secretário: R. Grass,

vistas as observações escritas apresentadas:

- em representação do Hospital Ingenieure Krankenhaustechnik Planungs-Gesellschaft mbH (HI), por R. Kurbos, Rechtsanwalt,

- em representação do Governo austríaco, por H. Dossi, na qualidade de agente,

- em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por M. Nolin, na qualidade de agente, assistido por R. Roniger, Rechtsanwalt,

visto o relatório do juiz-relator,

ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 28 de Junho de 2001,

profere o presente

Acórdão

Fundamentação jurídica do acórdão


1 Por despacho de 17 de Fevereiro de 2000, que deu entrada no Tribunal de Justiça no dia 10 de Março seguinte, o Vergabekontrollsenat des Landes Wien (comissão de fiscalização das adjudicações do Land de Viena) submeteu, nos termos do artigo 234._ CE, três questões prejudiciais sobre a interpretação do artigo 2._, n._ 1, alínea b), da Directiva 89/665/CEE do Conselho, de 21 de Dezembro de 1989, que coordena as disposições legislativas, regulamentares e administrativas relativas à aplicação dos processos de recurso em matéria de adjudicação dos contratos de direito público de obras e de fornecimentos (JO L 395, p. 33), com a redacção que lhe foi dada pela Directiva 92/50/CEE do Conselho, de 18 de Junho de 1992, relativa à coordenação dos processos de adjudicação de contratos públicos de serviços (JO L 209, p. 1, a seguir «Directiva 89/665»), bem como da Directiva 92/50/CEE, na sua versão decorrente da Directiva 97/52/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de Outubro de 1997, que altera as Directivas 92/50/CEE, 93/36/CEE e 93/37/CEE, relativas à coordenação dos processos de adjudicação, respectivamente, de serviços públicos, de fornecimentos públicos e de empreitadas de obras públicas (JO L 328, p. 1, a seguir «Directiva 92/50»).

2 Estas questões foram suscitadas no âmbito de um litígio que opõe a sociedade de direito alemão Hospital Ingenieure Krankenhaustechnik Planungs-Gesellschaft mbH (a seguir «HI») à Stadt Wien (a seguir «cidade de Viena»), a respeito da anulação, por esta última, do seu convite para apresentação de propostas para um concurso público de serviços para o qual a HI tinha apresentado uma proposta.

Enquadramento jurídico

A regulamentação comunitária

3 O artigo 1._, n._ 1, da Directiva 89/665 dispõe:

«Os Estados-Membros tomarão as medidas necessárias para garantir que, no que se refere aos processos de adjudicação abrangidos pelo âmbito de aplicação das Directivas 71/305/CEE, 77/62/CEE e 92/50/CEE [...], as decisões tomadas pelas entidades adjudicantes possam ser objecto de recursos eficazes e, sobretudo, tão rápidos quanto possível, nas condições previstas nos artigos seguintes e, nomeadamente, no n._ 7 do artigo 2._, com o fundamento de que essas decisões tenham violado o direito comunitário em matéria de contratos públicos ou as regras nacionais que transpõem esse direito.»

4 Nos termos do artigo 2._, n.os 1 e 5, da Directiva 89/665:

«1. Os Estados-Membros velarão por que as medidas tomadas para os efeitos dos recursos referidos no artigo 1._ prevejam os poderes que permitam:

a) Tomar o mais rapidamente possível, através de um processo de urgência, medidas provisórias destinadas a corrigir a alegada violação ou a impedir que sejam causados outros danos aos interesses em causa, incluindo medidas destinadas a suspender ou a fazer suspender o processo de adjudicação do contrato de direito público em causa ou a execução de qualquer decisão tomada pelas entidades adjudicantes;

b) Anular ou fazer anular as decisões ilegais, incluindo suprimir as especificações técnicas, económicas ou financeiras discriminatórias que constem dos documentos do concurso, dos cadernos de encargos ou de qualquer outro documento relacionado com o processo de adjudicação do contrato em causa;

[...]

[...]

5. Os Estados-Membros podem prever que, sempre que forem reclamadas indemnizações com base em que uma decisão foi tomada ilegalmente, a decisão contestada deva primeiro ser anulada por uma instância que tenha a competência necessária para esse efeito.»

5 O artigo 12._, n._ 2, da Directiva 92/50 dispõe:

«As entidades adjudicantes informarão o mais rapidamente possível os candidatos ou proponentes das decisões que tiverem sido tomadas relativamente à adjudicação do contrato, incluindo os motivos pelos quais tenham decidido renunciar à adjudicação de um contrato para o qual fora aberto concurso, ou os motivos pelos quais tenham decidido recomeçar o processo, informação essa que será prestada por escrito, se tal lhes for solicitado. Informarão igualmente dessas decisões o Serviço das Publicações Oficiais das Comunidades Europeias.»

A regulamentação nacional

6 A Wiener Landesvergabegesetz (lei sobre adjudicações do Land de Viena, LGBl. n._ 36/1995, na sua versão publicada no LGBl. n._ 30/1999, a seguir «WLVergG»), dispõe nos n.os 2 a 4 do § 32, sob a epígrafe «Rectificação e anulação de um convite para apresentação de propostas»:

«2. O convite para apresentação de propostas pode ser anulado durante o prazo de apresentação das propostas quando ocorram circunstâncias que, a serem conhecidas antecipadamente, teriam excluído o convite para apresentação de propostas ou conduzido a um convite para apresentação de propostas de conteúdo substancialmente diferente.

3. Findo o prazo para apresentação de propostas, o convite para apresentação de propostas deve ser anulado quando existam razões imperativas. Em especial, existem razões imperativas:

1) quando as circunstâncias descritas no n._ 2 só forem conhecidas findo o prazo de apresentação das propostas,

ou

2) quando todas as propostas devam ser excluídas.

4. O convite para apresentação de propostas pode ser anulado quando, por exemplo

1) não tenha sido apresentada qualquer proposta aceitável do ponto de vista económico,

ou

2) [...] apenas subsista uma proposta após a exclusão de todas as outras propostas.»

7 Por força da WLVergG, o Vergabekontrollsenat des Landes Wien é competente para decidir os recursos em matéria de processos de adjudicação de contratos de direito público de fornecimentos, de empreitadas de obras públicas e de serviços.

8 Em especial, o n._ 2 do § 94 da WLVergG prevê que o Vergabekontrollsenat decide em primeira e última instância sobre os recursos e que as suas decisões não podem ser alteradas ou anuladas por via administrativa. Segundo o n._ 3 deste parágrafo, o processo de recurso é regulado pela Allgemeine Verwaltungsverfahrensgesetz (código do processo administrativo geral) e pela Verwaltungsvollstreckungsgesetz (lei sobre a execução em matéria administrativa), salvo as disposições específicas da WLVergG.

9 O § 95 da WLVergG tem a seguinte redacção:

«1. O Vergabekontrollsenat é composto por sete membros. Estes são designados pelo Governo do Land por um período de seis anos. As reconduções são admissíveis. Três dos membros, que também podem ser agentes especializados da administração municipal da cidade de Viena, são nomeados, ouvido o Conselho Municipal, um por proposta da Wirtschaftskammer [Câmara Económica] de Viena, outro por proposta da Kammer für Arbeiter und Angestellte [Câmara dos Trabalhadores] de Viena e o terceiro por proposta da Architekten-und Ingenieurkonsultenkammer [Câmara dos Arquitectos e Engenheiros Consultores] de Viena, da Baixa Áustria e do Burgenland. O presidente deve pertencer à magistratura e é designado após ser ouvido o presidente do Oberlandesgericht Wien [...].

2. Tanto os membros como os substitutos devem possuir um conhecimento especial em matéria de adjudicações e, especialmente quanto aos membros e substitutos designados por proposta do Conselho Municipal, em matéria económica e técnica.

[...]

3a. Qualquer membro que se encontre duradouramente na incapacidade de exercer normalmente as suas funções em razão de deficiência física ou mental ou que tenha cometido faltas graves às suas obrigações é demitido do seu mandato por decisão do Vergabekontrollsenat. Esta decisão deve ser tomada após audição do interessado. Este não pode participar nesta deliberação.

4. Os membros do Vergabekontrollsenat são independentes no exercício das suas funções e não estão vinculados a quaisquer instruções.

5. Nos termos do n._ 3 do § 20 da Bundesverfassungsgesetz, os membros do Vergabekontrollsenat estão obrigados a sigilo.

6. O Vergabekontrollsenat reúne-se por convocação do presidente. Em caso de parcialidade ou impedimento provisório de um membro, deve ser convocado o seu substituto. Os membros do Vergabekontrollsenat não podem decidir em processo que implique a atribuição de um contrato público no âmbito de aplicação da instituição (no caso dos agentes da administração municipal de Viena, do serviço, da empresa sub-contratante ou do estabelecimento) de que sejam parte. Caso razões sérias ponham em causa a imparcialidade de um membro, deve abster-se de exercer as suas funções e requerer a sua substituição. As partes podem suscitar a suspeição dos membros do Vergabekontrollsenat por razões de parcialidade. O Vergabekontrollsenat decidirá da eventual parcialidade do membro e dos pedidos de afastamento por suspeição sem que o membro interessado possa participar na deliberação. Os nomes dos membros do Vergabekontrollsenat e da instituição (no caso de agentes da administração municipal de Viena, do serviço, da empresa sub-contratante ou do estabelecimento) de que sejam parte devem ser publicados no Amtsblatt der Stadt Wien no início de cada ano civil por iniciativa do presidente.

7. Os recursos devem ser sujeitos a votação pela ordem determinada pelo presidente. Pelo menos cinco membros devem estar presentes para que o Vergabekontrollsenat decida, sendo as decisões tomadas por maioria absoluta dos votantes. Não é permitida a abstenção. O Vergabekontrollsenat não se reúne publicamente. O desenrolar das reuniões é redigido em acta. As decisões devem ser adoptadas por escrito e mencionar os nomes dos membros do Vergabekontrollsenat que tomaram parte na votação. A decisão deve ser assinada pelo presidente [...].

8. Os membros do Vergabekontrollsenat exercem esta actividade a título gratuito. Prestam juramento perante o Landeshauptmann.

[...]

10. O Vergabekontrollsenat estabelecerá um regulamento interno.

[...]»

10 O § 99 da WLVergG, de epígrafe «Competência do Vergabekontrollsenat», prevê:

«1. Num processo de recurso, a competência do Vergabekontrollsenat para apreciar o pedido é determinada pelas seguintes disposições:

1) até o momento da efectiva adjudicação, é competente para a reparação das violações do direito na acepção do § 101, para a adopção de medidas provisórias e ainda para a declaração de nulidade de decisões ilegais tomadas pelo serviço competente da entidade adjudicante;

2) após adjudicação efectiva, é competente para determinar se, em razão de uma violação desta Landsgesetz na acepção dos §§ 47 e 48, n._ 2, a adjudicação não foi feita ao proponente que apresentou a melhor proposta. Num tal processo, o Vergabekontrollsenat é ainda competente para, a pedido da entidade adjudicante, determinar se, no caso de não ter existido a violação jurídica apurada, a adjudicação teria sido feita ao candidato ou proponente preterido.

2. O Vergabekontrollsenat só tem de apreciar um recurso na medida em que a decisão cuja nulidade é alegada tenha tido uma influência preponderante no resultado do processo de adjudicação.»

11 O § 101 da WLVergG dispõe:

«No âmbito de um processo de recurso, o Vergabekontrollsenat deve anular as decisões de uma entidade adjudicante quando:

1) a notificação pública pela qual as empresas foram convidadas a concorrer a um concurso limitado ou a um procedimento por negociação, ou os documentos do concurso, contenham exigências discriminatórias relativas ao tipo de prestações técnicas ou à capacidade económica ou financeira, ou

2) um candidato tenha sido afastado em violação dos critérios que se contêm na notificação pública em que as empresas foram convidadas a participar num concurso limitado ou num procedimento por negociação e a entidade adjudicante pudesse ter chegado, se tivesse observado as disposições que foram negligenciadas, a um resultado mais favorável ao recorrente.»

O litígio na causa principal e as questões prejudiciais

12 Resulta do despacho de reenvio que a cidade de Viena, representada pelo Magistrat der Stadt Wien - Wiener Krankenanstaltenverbund, publicou, enquanto entidade adjudicante, um convite para apresentação de propostas para adjudicação de um concurso intitulado «Direcção do projecto de realização da concepção estratégica global do fornecimento de refeições nas instalações da Wiener Krankenanstaltenverbund» no Jornal Oficial das Comunidades Europeias de 24 de Dezembro de 1996 e nos anúncios legais do Wiener Zeitung de 30 de Dezembro de 1996.

13 Após a recepção das propostas, entre as quais a da HI, a cidade de Viena retirou, dentro do prazo previsto para a adjudicação do concurso, o convite para apresentação de propostas. Informou a HI, por ofício de 25 de Março de 1997, que tinha renunciado ao prosseguimento do processo «por razões imperativas, em conformidade com o primeiro parágrafo do n._ 3 do § 32 da WLVergG».

14 Na sequência de um pedido de informações que lhe tinha sido dirigido pela HI, a cidade de Viena explicou do seguinte modo, no seu ofício de 14 de Abril de 1997, a anulação do convite para apresentação de propostas:

«Tendo em conta os resultados da condução do processo pela sociedade Humanomed em 1996, o plano inicial foi alterado. No quadro da discussão destas circunstâncias, conduzida no termo do prazo fixado para a apresentação das propostas, bem como durante o prazo de adjudicação do concurso no seio do comité de coordenação, verificou-se que o projecto devia futuramente ser desenvolvido de forma descentralizada. Foi, portanto, decidido não prever qualquer instância de coordenação, já não sendo, portanto, necessária a adjudicação do concurso a um director de projecto externo.

Verifica-se assim que as razões em questão teriam excluído uma adjudicação caso tivessem sido previamente conhecidas. Caso se venha a verificar ser necessária outra direcção no âmbito do projecto do `fornecimento de refeições', haverá que proceder a um convite para apresentação de propostas de conteúdo diferente.»

15 A HI apresentou então ao Vergabekontrollsenat vários pedidos destinados a obter, designadamente, a abertura de um processo de recurso, a adopção de uma medida provisória, a anulação de determinados documentos do concurso, bem como a anulação da decisão de retirar o convite para apresentação de propostas. Num complemento a este último pedido, a sociedade recorrente invocou novos elementos que, em seu entender, provam a ilegalidade da decisão de retirar o convite para apresentação de propostas, tendo de novo requerido a sua anulação.

16 Em especial, a HI referia as suas suspeitas de que a cidade de Viena possuía uma participação directa ou indirecta no capital da sociedade Humanomed. A HI sustentava que esta sociedade tinha realizado um trabalho preparatório substancial relativamente ao convite para apresentação de propostas, assegurado a direcção do projecto e influenciado a elaboração do esquema director e que a cidade de Viena tinha anulado o convite para apresentação de propostas a fim de contornar, com a finalidade de prosseguir a sua colaboração com a sociedade Humanomed, a sua obrigação de excluir a proposta desta sociedade. Daí a HI concluía que a decisão de retirar o convite era discriminatória, na medida em que se destinava a favorecer uma sociedade austríaca em detrimento de um candidato de um Estado-Membro diverso da República da Áustria.

17 Por decisões de 30 de Abril e 10 de Junho de 1997, o Vergabekontrollsenat julgou inadmissíveis os pedidos de anulação da decisão de retirar o convite para apresentação de propostas, pela razão de, por força do § 101 da WLVergG, só certas decisões adoptadas no decurso de um processo de adjudicação de contratos públicos, enumeradas de forma limitativa, poderem ser anuladas.

18 O Verfassungsgerichtshof (Tribunal Constitucional) (Áustria), para o qual a HI interpôs recurso destas decisões de rejeição por inadmissibilidade, anulou-as por violação do direito a um processo perante o juiz legal. Considerou que o Vergabekontrollsenat estava obrigado a submeter ao Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias uma questão a título prejudicial para saber se a decisão de anulação de um convite para apresentação de propostas constitui uma decisão na acepção do artigo 2._, n._ 1, alínea b), da Directiva 89/665.

19 O órgão jurisdicional de reenvio salienta desde logo que, em caso de anulação abusiva de um convite para apresentação de propostas, o empresário em causa pode, por força do direito nacional, intentar uma acção cível de indemnização nos tribunais comuns.

20 Por outro lado, resulta do despacho de reenvio que o Vergabekontrollsenat considera que as modalidades de anulação de um convite para apresentação de propostas não estão abrangidas pelas disposições das directivas que fixam as normas substantivas referentes às adjudicações dos contratos de direito público, não sendo tal decisão de anulação uma decisão a que se refere a alínea b) do n._ 1 do artigo 2._ da Directiva 89/665 e, portanto, não se inserindo nas decisões que, por força desta directiva, devem poder ser objecto de um processo de recurso.

21 Entendendo que a cidade de Viena respeitou o processo previsto no n._ 2 do artigo 12._ da Directiva 92/50, o Vergabekontrollsenat interroga-se sobre a questão de saber se, supondo que o direito comunitário exije fiscalização de uma decisão de anulação de um convite para apresentação de propostas, esta fiscalização só poderá versar sobre o carácter arbitrário ou fictício da referida decisão.

22 Quanto à data a tomar em consideração para apreciar a legalidade de semelhante decisão, o órgão jurisdicional de reenvio sustenta que o facto de a decisão da entidade adjudicante estar sujeita a fiscalização e constituir assim o objecto do litígio conduzirá a que seja tomada em consideração a data dessa decisão, mas admite que o princípio do efeito útil, como decorre dos considerandos da Directiva 89/665, conduzirá a ter em consideração, ao invés, a data da decisão da instância de recurso.

23 Vistas estas considerações, o Vergabekontrollsenat des Landes Wien decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1) Exige o artigo 2._, n._ 1, alínea b), da Directiva 89/665/CEE [...] que a decisão da entidade adjudicante de retirar o convite para apresentação de propostas para um concurso público de serviços seja fiscalizada através de um processo de recurso e, sendo caso disso, anulada?

2) Em caso de resposta afirmativa à primeira questão, comportam a Directiva [89/665/CEE] e a Directiva 92/50/CEE uma disposição que se oponha a que o recurso se limite apenas ao exame do carácter arbitrário ou fictício da decisão de retirar o convite para apresentação de propostas?

3) Em caso de resposta afirmativa à primeira questão, qual é o momento adequado para apreciar a legalidade da decisão da entidade adjudicante de retirar o convite para apresentação de propostas?»

Quanto à admissibilidade das questões prejudiciais

24 A título liminar, há que verificar se o Vergabekontrollsenat des Landes Wien constitui um órgão jurisdicional na acepção do artigo 234._ CE e, por conseguinte, se as suas questões são admissíveis.

25 Resulta de jurisprudência constante que, para apreciar se o organismo de reenvio possui o carácter de órgão jurisdicional na acepção do artigo 234._ CE, questão que deve ser apreciada unicamente face ao direito comunitário, o Tribunal de Justiça leva em conta um conjunto de elementos, tais como a origem legal do órgão, o seu carácter permanente, o carácter vinculativo da sua jurisdição, a natureza contraditória do processo, a aplicação, pelo órgão jurisdicional, de regras jurídicas, bem como a sua independência (v., designadamente, acórdãos de 17 de Setembro de 1997, Dorsch Consult, C-54/96, Colect., p. I-4961, n._ 23, e de 4 de Fevereiro de 1999, Köllensperger e Atzwanger, C-103/97, Colect., p. I-551, n._ 17).

26 A este respeito, há que referir, por um lado, que as disposições do § 94 da WLVergG mostram de forma evidente que o Vergabekontrollsenat preenche os critérios referentes à origem legal, ao carácter vinculativo da sua jurisdição, à natureza contraditória do processo e à aplicação de regras jurídicas.

27 Por outro lado, há que considerar que as disposições do § 95 da WLVergG, que regulam a composição e o funcionamento deste órgão, garantem o seu carácter permanente e, em conjugação com o § 94, n._ 3, desta lei, a sua independência.

28 Resulta do que antecede que o Vergabekontrollsenat des Landes Wien deve ser considerado um órgão jurisdicional na acepção do artigo 234._ CE, pelo que as suas questões são admissíveis.

Quanto ao mérito

Quanto à primeira questão

29 A título liminar, há que considerar que, como decorre do despacho de reenvio, o Vergabekontrollsenat pretende ser esclarecido, pela resposta à sua primeira questão, sobre a questão de saber se a decisão de anulação de um convite para apresentação de propostas para um concurso público de serviços se insere nas «decisões tomadas pelas entidades adjudicantes» relativamente às quais os Estados-Membros estão obrigados, por força do artigo 1._, n._ 1, da Directiva 89/665, a instituir, no seu direito interno, processos de recurso eficazes e tão rápidos quanto possível.

30 Com efeito, o artigo 2._, n._ 1, alínea b), da Directiva 89/665 não define as decisões ilegais cuja anulação pode ser pedida, limitando-se a enumerar as medidas que os Estados-Membros estão obrigados a prever relativamente aos recursos a que se refere o artigo 1._ desta directiva (v., neste sentido, acórdão de 28 de Outubro de 1999, Alcatel Austria e o., C-81/98, Colect., p. I-7671, n.os 30 e 31), sendo o âmbito de aplicação da referida directiva delimitado por esta última disposição.

31 Portanto, há que entender a primeira questão como interrogando, essencialmente, se o artigo 1._, n._ 1, da Directiva 89/665 exige que a decisão da entidade adjudicante de anular o convite para apresentação de propostas para um concurso público de serviços pode ser objecto de um processo de recurso e eventualmente anulada com base na violação do direito comunitário em matéria de concursos públicos ou das regras nacionais de transposição deste direito.

32 Para responder à questão assim reformulada, há, pois, que interpretar o conceito de «decisões tomadas pelas entidades adjudicantes» empregue no artigo 1._, n._ 1, da Directiva 89/665.

33 O Governo austríaco e a Comissão alegam, essencialmente, que os Estados-Membros estariam obrigados a instituir processos que permitissem a interposição de um recurso contra a anulação de um convite para apresentação de propostas para um concurso público de serviços caso esta anulação estivesse regulamentada pela Directiva 92/50. Ora, entendem que semelhante anulação é exclusivamente regulada pelas normas do direito interno e não se insere, portanto, no âmbito de aplicação da Directiva 89/665.

34 Em especial, a Comissão refere que, na sua proposta de Directiva 87/C 230/05 do Conselho relativa à coordenação das disposições legislativas, regulamentares e administrativas relativas à aplicação das regras comunitárias no âmbito dos processos de adjudicação dos contratos de empreitada e de fornecimentos celebrados por entidades públicas (JO 1987, C 230, p. 6), tinha expressamente proposto que a obrigação dos Estados-Membros de instituírem processos de recurso se estendesse não apenas às decisões tomadas pelas entidades adjudicantes em violação da regulamentação comunitária, mas igualmente às que infringissem as normas de direito interno. Contudo, no decurso do processo legislativo, a obrigação de instituir uma fiscalização jurisdicional terá sido limitada ao seu alcance actual, de forma a aplicar-se exclusivamente às decisões que violem «o direito comunitário em matéria de contratos públicos ou as regras nacionais que transpõem esse direito».

35 O Governo austríaco alega que a conclusão de que a decisão de anulação de um convite para apresentação de propostas não constitui uma decisão na acepção da Directiva 89/665 é confirmada pelo seu artigo 2._, n._ 1, alínea b), que respeita exclusivamente às decisões que a entidade adjudicante tome no decurso do processo de adjudicação de um contrato público, ao passo que a decisão de anulação do convite para apresentação de propostas põe termo a esse processo. Assim, segundo este governo, em caso de anulação abusiva de um convite para apresentação de propostas, o legislador nacional está unicamente obrigado, por força da Directiva 89/665, a garantir que aos candidatos e aos proponentes seja reconhecido o direito a uma indemnização por perdas e danos.

36 Importa referir a título liminar que o artigo 1._, n._ 1, da Directiva 89/665 impõe aos Estados-Membros a obrigação de preverem processos que permitam um recurso contra as decisões tomadas no âmbito de um processo de adjudicação com base em que essas decisões violaram o direito comunitário em matéria de contratos de direito público ou as normas nacionais que transpõem esse direito.

37 Donde decorre que, quando uma decisão tomada por uma entidade adjudicante no quadro de um processo de adjudicação de um contrato público esteja sujeita às normas de direito comunitário em matéria de concursos públicos e, portanto, seja susceptível de as violar, o artigo 1._, n._ 1, da Directiva 89/665 exige que esta decisão possa ser objecto de um recurso de anulação.

38 Por conseguinte, para determinar se a decisão da entidade adjudicante de anular um convite para apresentação de propostas para um concurso público de serviços pode ser considerada como inserindo-se nas decisões relativamente às quais os Estados-Membros estão obrigados, por força da Directiva 89/665, a instituir processos de recurso de anulação, há que examinar se esta decisão está abrangida pelas normas do direito comunitário em matéria de concursos públicos.

39 A este respeito, há que considerar que a única disposição da Directiva 92/50 que versa especificamente sobre a decisão de anulação de um convite para apresentação de propostas é o seu artigo 12._, n._ 2, que prevê nomeadamente que as entidades adjudicantes devem, quando decidam não adjudicar, informar detalhadamente os candidatos e os proponentes das razões da sua decisão.

40 O Tribunal de Justiça teve já ocasião de precisar o alcance da obrigação de comunicação das razões da não adjudicação de um contrato, no contexto da Directiva 93/37/CEE do Conselho, de 14 de Junho de 1993, relativa à coordenação dos processos de adjudicação de empreitadas de obras públicas (JO L 199, p. 54), na versão decorrente da Directiva 97/52 (a seguir «Directiva 93/37»), que comporta, no seu artigo 8._, n._ 2, uma disposição análoga à do artigo 12._, n._ 2, da Directiva 92/50. Em particular, no seu acórdão de 16 de Setembro de 1999, Fracasso e Leitschutz (C-27/98, Colect., p. I-5697, n.os 23 e 25), o Tribunal de Justiça declarou que o artigo 8._, n._ 2, da Directiva 93/37 não prevê que a faculdade de a entidade adjudicante renunciar à adjudicação de uma empreitada de obras públicas que foi objecto de um concurso, implicitamente admitida pela Directiva 93/37, esteja limitada aos casos excepcionais ou deva necessariamente assentar em razões graves.

41 Donde decorre que o n._ 2 do artigo 12._ da Directiva 92/50 deve ser interpretado no sentido de que, impondo embora à entidade adjudicante, quando decida anular o convite para apresentação de propostas referente a um concurso público de serviços, a comunicação das razões da sua decisão aos candidatos e aos proponentes, não implica, para esta entidade adjudicante, a obrigação de conduzir a seu termo o processo de adjudicação.

42 Todavia e sendo embora certo que, para além da exigência da comunicação da motivação da anulação do convite para apresentação de propostas, a Directiva 92/50 não comporta qualquer disposição específica referente às condições materiais ou formais desta decisão, também é certo que esta continua sujeita às regras fundamentais do direito comunitário e, nomeadamente, aos princípios consagrados pelo Tratado CE em matéria de direito de estabelecimento e de livre prestação de serviços.

43 A este propósito, há que recordar que, segundo jurisprudência constante, a coordenação a nível comunitário dos processos de adjudicação das empreitadas de obras públicas visa suprimir os entraves à livre circulação dos serviços e das mercadorias e, assim, proteger os interesses dos operadores económicos estabelecidos num Estado-Membro que desejem propor bens ou serviços às entidades adjudicantes estabelecidas noutro Estado-Membro (v., nomeadamente, acórdãos de 3 de Outubro de 2000, University of Cambridge, C-380/98, Colect., p. I-8035, n._ 16, e de 18 de Outubro de 2001, SIAC Construction, C-19/00, Colect., p. I-7725, n._ 32).

44 Há que considerar que a Directiva 92/50 prossegue este objectivo. Com efeito, como decorre do seu vigésimo considerando, visa eliminar as práticas que restringem a concorrência, em geral, e, em particular, as que restringem a participação nos contratos de nacionais de outros Estados-Membros, melhorando o acesso dos prestadores de serviços aos processos de adjudicação dos contratos.

45 Decorre além disso da jurisprudência do Tribunal de Justiça que o princípio da igualdade de tratamento, que constitui a base das directivas referentes aos processos de adjudicação das empreitadas de obras públicas, implica uma obrigação de transparência a fim de permitir verificar a sua observância (v., neste sentido, acórdãos de 18 de Novembro de 1999, Unitron Scandinavia e 3-S, C-275/98, Colect., p. I-8291, n._ 31, e de 7 de Dezembro de 2000, Telaustria e Telefonadress, C-324/98, Colect., p. I-10745, n._ 61).

46 A este respeito, há que referir que a exigência da comunicação das razões subjacentes à decisão de anulação de um convite para apresentação de propostas, prevista no n._ 2 do artigo 12._ da Directiva 92/50, está precisamente ditada pela preocupação de assegurar um nível mínimo de transparência nos processos de adjudicação dos contratos a que se aplica essa directiva e, portanto, o respeito do princípio da igualdade de tratamento.

47 Donde resulta que, apesar do facto de a Directiva 92/50 não regular especificamente as modalidades de anulação de um convite para apresentação de propostas para um contrato público de serviços, as entidades adjudicantes estão, todavia, obrigadas, quando adoptem semelhante decisão, a respeitar as regras fundamentais do Tratado em geral e o princípio da não discriminação em razão da nacionalidade em particular (v., por analogia e em matéria da celebração de contratos de concessão de serviços públicos, acórdão Telaustria e Telefonadress, já referido, n._ 60).

48 Ora, uma vez que a decisão da entidade adjudicante de anular um convite para apresentação de propostas para um contrato público de serviços está sujeita às normas substantivas de direito comunitário relevantes, há que concluir que também está abrangida pelas regras previstas pela Directiva 89/665 a fim de assegurar o respeito das exigências do direito comunitário em matéria de contratos públicos.

49 Esta conclusão é corroborada, em primeiro lugar, pelo teor das disposições da Directiva 89/665. Com efeito, como o Tribunal de Justiça referiu no n._ 35 do acórdão Alcatel Austria e o., já referido, a disposição do artigo 1._, n._ 1, desta directiva não prevê qualquer restrição no que diz respeito à natureza e ao conteúdo das decisões a que se refere. Semelhante restrição também não poderia ser deduzida do teor do artigo 2._, n._ 1, alínea b), da referida directiva (v., neste sentido, acórdão Alcatel Austria e o., já referido, n._ 32). Ao que acresce que uma interpretação restritiva do conceito de decisões relativamente às quais os Estados-Membros devem assegurar vias de recurso seria incompatível com a disposição do artigo 2._, n._ 1, alínea a), da mesma directiva, que impõe que os Estados-Membros prevejam processos de medidas provisórias relativamente a qualquer decisão tomada pelas entidades adjudicantes.

50 Seguidamente, a economia geral da Directiva 89/665 impõe uma interpretação ampla do referido conceito, na medida em que o artigo 2._, n._ 5, desta directiva permite que os Estados-Membros prevejam que, sempre que forem reclamadas indemnizações com base em que uma decisão da entidade adjudicante foi tomada ilegalmente, a decisão contestada deva primeiro ser anulada.

51 Com efeito, admitir que os Estados-Membros não estivessem obrigados a prever processos de recurso de anulação relativamente a decisões de anulação de convites para apresentação de propostas traduzir-se-ia em autorizá-los a privar, fazendo uso da faculdade prevista na disposição referida no número anterior, os proponentes lesados por semelhantes decisões, tomadas em violação das regras do direito comunitário, da possibilidade de intentar acções de indemnização por perdas e danos.

52 Por último, há que considerar que qualquer outra interpretação poria em causa o efeito útil da Directiva 89/665. Como resulta dos seus primeiro e segundo considerandos, esta directiva tem por objectivo reforçar os mecanismos existentes, tanto no plano nacional como no plano comunitário, para assegurar a aplicação efectiva das directivas comunitárias em matéria de celebração de contratos de direito público, sobretudo numa fase em que as violações podem ainda ser corrigidas, e é precisamente para assegurar o respeito destas directivas que o artigo 1._, n._ 1, da Directiva 89/665 impõe que os Estados-Membros instituam recursos eficazes e tão rápidos quanto possível (v., neste sentido, acórdão Alcatel Austria e o., já referido, n.os 33 e 34).

53 Ora, a realização completa do objectivo prosseguido pela Directiva 89/665 ficaria comprometida caso fosse possível às entidades adjudicantes retirarem um convite para apresentação de propostas relativamente a um concurso público de serviços sem ficarem sujeitas aos processos de fiscalização jurisdicional destinados a assegurar cabalmente a efectividade do respeito das directivas que fixam as normas substantivas referentes aos contratos públicos e os seus princípios subjacentes.

54 Vistas as precedentes considerações, há que concluir que a decisão de anulação de um convite para apresentação de propostas para um concurso público de serviços se insere nas decisões relativamente às quais os Estados-Membros estão obrigados, por força da Directiva 89/665, a instituir processos de recurso de anulação a fim de garantir o respeito das normas do direito comunitário em matéria de celebração de contratos públicos, bem como das normas nacionais de transposição deste direito.

55 Portanto, há que responder à primeira questão que o artigo 1._, n._ 1, da Directiva 89/665 exige que a decisão da entidade adjudicante de anular o convite para apresentação de propostas para um contrato público de serviços possa ser objecto de um processo de recurso e ser eventualmente anulada com base na violação do direito comunitário em matéria de adjudicação de contratos de direito público ou das normas nacionais que transpõem esse direito.

Quanto à segunda questão

56 Com a segunda questão, o órgão jurisdicional de reenvio pretende, essencialmente, saber se uma regulamentação nacional que limita o alcance da fiscalização da legalidade da anulação de um convite para apresentação de propostas para um contrato público de serviços apenas ao exame do carácter arbitrário desta decisão é compatível com as disposições das Directivas 89/665 e 92/50.

57 Há, em primeiro lugar, que referir que a problemática do alcance da fiscalização jurisdicional de uma decisão tomada no quadro de um processo de adjudicação de contratos públicos não é regulada pela Directiva 92/50, mas está unicamente abrangida pela Directiva 89/665. Portanto, há que entender a segunda questão como perguntando se a Directiva 89/665 se opõe a que uma regulamentação nacional limite a fiscalização da legalidade da anulação de um convite para apresentação de propostas apenas ao exame do carácter arbitrário desta decisão.

58 Ora, limitando-se a Directiva 89/665 a coordenar os mecanismos existentes nos Estados-Membros a fim de assegurar a aplicação plena e efectiva das directivas que fixam as normas substantivas referentes aos contratos públicos, não define expressamente o alcance das vias de recurso que os Estados-Membros devem instituir para esse efeito.

59 Por conseguinte, a questão do alcance da fiscalização jurisdicional exercida no âmbito dos processos de recurso a que se refere a Directiva 89/665 deve ser examinada à luz da sua finalidade e zelando para que não seja posta em causa a sua eficácia.

60 A este respeito, há que recordar que, como resulta do sexto considerando e do artigo 1._, n._ 1, da Directiva 89/665, esta impõe aos Estados-Membros a obrigação de porem em vigor processos de recurso adequados para os casos de ilegalidade dos processos de adjudicação de contratos públicos.

61 Portanto e tendo em conta o objectivo do reforço das vias de recurso prosseguido pela Directiva 89/665 e na falta de indicações em contrário, o alcance da fiscalização jurisdicional a exercer no quadro dos processos de recurso a que esta se aplica não pode ser interpretado de forma restritiva.

62 Donde decorre que, mesmo para os casos em que, como o em apreço na causa principal, as entidades adjudicantes beneficiam, por força da regulamentação nacional aplicável, de um amplo poder de apreciação quanto à anulação de um convite para apresentação de propostas, os órgãos jurisdicionais nacionais devem poder, por força da Directiva 89/665, verificar a compatibilidade de uma decisão de anulação de um convite para apresentação de propostas com as normas do direito comunitário relevantes.

63 Nestas condições, há que considerar que nem o teor nem o espírito da Directiva 89/665 permitem concluir ser possível aos Estados-Membros limitar a fiscalização da legalidade da decisão de anulação de um convite para apresentação de propostas unicamente ao exame do seu carácter arbitrário.

64 Há, por conseguinte, que responder à segunda questão que a Directiva 89/665 se opõe a que uma regulamentação nacional limite a fiscalização da legalidade da anulação de um convite para apresentação de propostas unicamente ao exame do carácter arbitrário desta decisão.

Quanto à terceira questão

65 Com a terceira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pretende conhecer o momento a tomar em consideração para apreciar a legalidade da decisão da entidade adjudicante de anular um convite para apresentação de propostas.

66 A este respeito, basta considerar que, tendo a Directiva 89/665 unicamente por objectivo coordenar os mecanismos existentes nos Estados-Membros a fim de tornar efectivo o respeito do direito comunitário em matéria de adjudicação de contratos públicos, não comporta qualquer disposição referente ao momento decisivo para efeitos de apreciação da legalidade da decisão de anulação de um convite para apresentação de propostas.

67 Ora, na ausência de regulamentação comunitária específica na matéria, incumbe à ordem jurídica interna de cada Estado-Membro determinar o momento decisivo para efeitos da apreciação da legalidade da decisão de anulação, desde que as normas nacionais aplicáveis não sejam menos favoráveis do que as respeitantes aos recursos análogos de natureza interna (princípio da equivalência) e não tornem praticamente impossível ou excessivamente difícil o exercício dos direitos conferidos pela ordem jurídica comunitária (princípio da efectividade) (v., por analogia, acórdãos de 20 de Setembro de 2001, Banks, C-390/98, Colect., p. I-6117, n._ 121, e Courage e Crehan, C-453/99, Colect., p. I-6297, n._ 29).

68 Portanto, há que responder à terceira questão que a determinação do momento a tomar em consideração para apreciar a legalidade da decisão da entidade adjudicante de anular um convite para apresentação de propostas incumbe ao direito nacional, estando subentendido que as normas nacionais aplicáveis não podem ser menos favoráveis do que as respeitantes a recursos análogos de natureza interna nem tornar praticamente impossível ou excessivamente difícil o exercício dos direitos conferidos pela ordem jurídica comunitária.

Decisão sobre as despesas


Quanto às despesas

69 As despesas efectuadas pelo Governo austríaco e pela Comissão, que apresentaram observações ao Tribunal, não são reembolsáveis. Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional nacional, compete a este decidir quanto às despesas.

Parte decisória


Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA

(Sexta Secção),

pronunciando-se sobre as questões submetidas pelo Vergabekontrollsenat des Landes Wien, por despacho de 17 de Fevereiro de 2000, declara:

1) O artigo 1._, n._ 1, da Directiva 89/665/CEE do Conselho, de 21 de Dezembro de 1989, que coordena as disposições legislativas, regulamentares e administrativas relativas à aplicação dos processos de recurso em matéria de adjudicação dos contratos de direito público de obras e de fornecimentos, com a redacção que lhe foi dada pela Directiva 92/50/CEE do Conselho, de 18 de Junho de 1992, relativa à coordenação dos processos de adjudicação de contratos públicos de serviços, exige que a decisão da entidade adjudicante de anular o convite para apresentação de propostas para um contrato público de serviços possa ser objecto de um processo de recurso e ser eventualmente anulada com base na violação do direito comunitário em matéria de adjudicação de contratos de direito público ou das normas nacionais que transpõem esse direito.

2) A Directiva 89/665, com a redacção que lhe foi dada pela Directiva 92/50, opõe-se a que uma regulamentação nacional limite a fiscalização da legalidade da anulação de um convite para apresentação de propostas unicamente ao exame do carácter arbitrário desta decisão.

3) A determinação do momento a tomar em consideração para apreciar a legalidade da decisão da entidade adjudicante de anular um convite para apresentação de propostas incumbe ao direito nacional, estando subentendido que as normas nacionais aplicáveis não podem ser menos favoráveis do que as respeitantes a recursos análogos de natureza interna nem tornar praticamente impossível ou excessivamente difícil o exercício dos direitos conferidos pela ordem jurídica comunitária.

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