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Document 62023CJ0241

Acórdão do Tribunal de Justiça (Sétima Secção) de 8 de maio de 2024.
P. sp. z o.o. contra Dyrektor Izby Administracji Skarbowej w Warszawie.
Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Naczelny Sąd Administracyjny.
Reenvio prejudicial — Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado (IVA) — Diretiva 2006/112/CE — Artigo 73.° — Entregas de bens e prestações de serviços — Transferência de bens imóveis a título de entrada em espécie — Base de tributação — Contraprestação — Capital acionista — Valor nominal — Valor de emissão.
Processo C-241/23.

Court reports – general

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2024:392

Edição provisória

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Sétima Secção)

8 de maio de 2024 (*)

«Reenvio prejudicial — Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado (IVA) — Diretiva 2006/112/CE — Artigo 73.° — Entregas de bens e prestações de serviços — Transferência de bens imóveis a título de entrada em espécie — Base de tributação — Contraprestação — Capital acionista — Valor nominal — Valor de emissão»

No processo C‑241/23,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.° TFUE, pelo Naczelny Sąd Administracyjny (Supremo Tribunal Administrativo, Polónia), por Decisão de 24 de fevereiro de 2023, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 18 de abril de 2023, no processo

P. sp. z o.o.

contra

Dyrektor lzby Administracji Skarbowej w Warszawie

sendo interveniente:

Rzecznik Małych i Średnich Przedsiębiorców,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Sétima Secção),

composto por: F. Biltgen, presidente de secção, A. Prechal (relatora), presidente da Segunda Secção, exercendo funções de juíza da Sétima Secção, e M. L. Arastey Sahún, juíza,

advogado‑geral: J. Kokott,

secretário: A. Calot Escobar,

vistos os autos,

vistas as observações apresentadas:

–        em representação da P. sp. z o.o., por J. Martini, doradca podatkowy,

–        em representação do Dyrektor Izby Administracji Skarbowej w Warszawie, por J. Kazimierczak, radca prawny,

–        em representação do Rzecznik Małych i Średnich Przedsiębiorców, por P. Chrupek, radca prawny,

–        em representação do Governo Polaco, por B. Majczyna, na qualidade de agente,

–        em representação da Comissão Europeia, por M. Herold e U. Małecka, na qualidade de agentes,

vista a decisão tomada, ouvida a advogada‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1        O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 73.° da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado (JO 2006, L 347, p. 1), conforme alterada pelo Ato Relativo às Condições de Adesão da República da Croácia e às adaptações do Tratado da União Europeia, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia e do Tratado que institui a Comunidade Europeia da Energia Atómica (JO 2012, L 112, p. 21) (a seguir «Diretiva IVA»).

2        Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a P. sp. z o.o. ao Dyrektor Izby Administracji Skarbowej w Warszawie (Diretor da Administração Fiscal de Varsóvia, Polónia) (a seguir «autoridade de recurso») a respeito da recusa, por parte desta autoridade, em ter em conta a dedução efetuada por aquela sociedade dos montantes do imposto sobre o valor acrescentado (IVA) que figuravam nas faturas emitidas pela W. e pela B., a título de entradas de imóveis efetuadas por essas sociedades no capital da P.

 Quadro jurídico

 Direito da União

3        O artigo 73.° da Diretiva IVA dispõe:

«Nas entregas de bens e prestações de serviços, que não sejam as referidas nos artigos 74.° a 77.°, o valor tributável compreende tudo o que constitui a contraprestação que o fornecedor ou o prestador tenha recebido ou deva receber em relação a essas operações, do adquirente, do destinatário ou de um terceiro, incluindo as subvenções diretamente relacionadas com o preço de tais operações.»

4        O artigo 74.° desta diretiva prevê:

«Nas operações de desafetação ou de afetação, por um sujeito passivo, de bens da sua empresa, ou de detenção de bens por um sujeito passivo ou pelos seus sucessores em casos de cessação da sua atividade económica tributável, referidas nos artigos 16.° e 18.o, o valor tributável é constituído pelo preço de compra dos bens ou de bens similares ou, na falta de preço de compra, pelo preço de custo, determinados no momento em que tais operações se realizam.»

5        O artigo 80.° da referida diretiva tem a seguinte redação:

«1.      A fim de evitar a fraude ou evasão fiscais, os Estados‑Membros podem tomar medidas para que, relativamente às entregas de bens e prestações de serviços que envolvam laços familiares ou outros laços pessoais próximos, laços organizacionais, patrimoniais, associativos, financeiros ou jurídicos, definidos pelo Estado‑Membro, o valor tributável seja o valor normal, nos seguintes casos:

a)      Quando a contraprestação seja inferior ao valor normal e o destinatário da operação não tenha direito a deduzir totalmente o IVA ao abrigo dos artigos 167.° a 171.° e 173.° a 177.o;

b)      Quando a contraprestação seja inferior ao valor normal e o fornecedor dos bens ou prestador dos serviços não tenha direito a deduzir totalmente o IVA ao abrigo dos artigos 167.° a 171.° e dos artigos 173.° a 177.° e a operação esteja isenta ao abrigo dos artigos 132.o, 135.o, 136.o, 371.o, 375.o, 376.o, 377.o, 378.o, n.° 2, 379.o, n.° 2, ou dos artigos 380.° a 390.o‑C;

c)      Quando a contraprestação seja superior ao valor normal e o fornecedor dos bens ou prestador dos serviços não tenha direito a deduzir totalmente o IVA ao abrigo dos artigos 167.° a 171.° e 173.° a 177.o

Para efeitos do primeiro parágrafo, os laços jurídicos podem abranger as relações estabelecidas entre um empregador e um empregado ou a família deste ou quaisquer outras pessoas com ele estreitamente relacionadas.

2)      Quando exerçam a faculdade prevista no n.o 1, os Estados‑Membros podem especificar as categorias de fornecedores, prestadores, adquirentes ou destinatários às quais são aplicáveis as medidas.

[...]»

 Direito polaco

6        O artigo 29a.° da ustawa o podatku od towarów i usług (Lei relativa ao Imposto sobre Bens e Serviços), de 11 de março de 2004 (Dz. U. de 2011, n.° 177, posição 1054), conforme alterada (a seguir «Lei do IVA»), dispõe no seu n.° 1:

«Sem prejuízo do disposto nos n.os 2 a 5, e nos artigos 30a.° a 30c.°, 32.°, 119.° e 120.°, n.os 4 e 5, o valor tributável compreende tudo o que constitui a contraprestação que o fornecedor ou o prestador recebeu ou deva receber, pela venda de bens ou pela prestação de serviços, do adquirente dos bens, do beneficiário dos serviços ou de terceiros, incluindo subvenções, subsídios e outros auxílios da mesma natureza que influenciem diretamente o preço dos bens fornecidos ou dos serviços prestados pelo sujeito passivo.»

7        O artigo 86.o, n.° 1, desta lei dispõe:

«Na medida em que os bens e serviços são utilizados para operações tributáveis, os sujeitos passivos referidos no artigo 15.° têm direito à dedução, sem prejuízo do disposto nos artigos 114.°, 119.°, n.° 4, 120.°, n.os 17 e 19, e 124.º»

8        O artigo 88.° da referida lei tem a seguinte redação:

«3a.      As faturas e documentos aduaneiros não constituem uma base para a redução do imposto a jusante nem para o reembolso da diferença do imposto ou para o reembolso do imposto a montante quando:

[…]

4)      as faturas emitidas, as faturas retificativas ou os documentos aduaneiros:

b)      indicam montantes que não correspondem à realidade, na parte relativa às posições em que foram indicados montantes não conformes com a realidade.

[…]»

 Litígio no processo principal e questão prejudicial

9        A P. é uma sociedade sujeita ao IVA cujo capital social está dividido em ações.

10      Entre o final de 2014 e o início de 2015, a P. procedeu a um aumento de capital através de entradas em espécie provenientes da W. e da B. Mais concretamente, essas duas sociedades celebraram com a P. vários contratos que tinham por objeto a transferência de bens imóveis que lhes pertenciam e uma contribuição em numerário, em troca de ações da P. Assim, em 3 de outubro, 28 de novembro e 29 de dezembro de 2014, a P. celebrou contratos com a W. nos termos dos quais esta última lhe transferiria 23 imóveis e um determinado montante em dinheiro, em troca de, respetivamente, 4 767, 1 164 e 7 745 ações emitidas pela P. Além disso, em 3 de outubro e 28 de novembro de 2014, a P. celebrou contratos com a B., nos termos dos quais esta última lhe transferiria dois imóveis e um determinado montante em dinheiro, em troca de, respetivamente, 2 100 e 133 ações emitidas pela P. Estes contratos estipulam que a contraprestação das entradas em espécie no capital da P. é constituída por ações desta última, avaliadas pelo seu preço de emissão. Este preço é de 35 287,19 zlótis polacos (PLN) por ação, ou seja, cerca de 8 123 euros. Para determinar este preço, as partes basearam‑se no valor dos imóveis cedidos, tal como avaliado por um terceiro em função dos preços de mercado.

11      Nas suas declarações de IVA para o quarto trimestre de 2014 e para o primeiro trimestre de 2015, a P. incluiu os montantes do IVA e os montantes líquidos indicados nas faturas emitidas pela W. e pela B., relativas às entradas de imóveis no capital da P. Estes montantes foram calculados com base no valor de emissão das ações da P. recebidas em contrapartida dessas entradas.

12      Por Decisão de 28 de março de 2017, o Naczelnik Pierwszego Urzędu Skarbowego Warszawa‑Śródmieście w Warszawie (chefe da Primeira Repartição de Finanças de Varsóvia — Centro, Varsóvia, Polónia), que é a autoridade de primeira instância, considerou que o valor tributável do IVA das entradas de capital efetuadas pela W. e pela B. no âmbito do aumento de capital da P. devia ser calculado tendo em conta o valor nominal das ações desta, que corresponde a 50 PLN por ação, ou seja, cerca de 11,50 euros, e não o seu valor de emissão, que corresponde a 35 287,19 PLN por ação, ou seja, cerca de 8 123 euros. Por conseguinte, esta autoridade pôs em causa o direito da P. a deduzir o IVA relativo às referidas entradas e correspondente ao montante que excedia o calculado sobre o valor nominal das ações.

13      Por Decisão de 30 de junho de 2017, a autoridade de recurso confirmou a decisão da referida autoridade de primeira instância, depois de ter considerado que os montantes constantes das faturas emitidas pela W. e pela B., relativas às entradas de imóveis no capital da P. em troca de ações desta, não correspondiam inteiramente à realidade e, por conseguinte, que, em aplicação do artigo 86.°, n.° 1, da Lei do IVA, não conferiam à P. o direito à dedução do IVA. Segundo a autoridade de recurso, a contraprestação recebida pela W. e pela B. em troca das entradas em espécie efetuadas no capital da P. deve ser apreciada com base no valor nominal das ações.

14      Por Sentença de 29 de maio de 2018, o Wojewódzki Sąd Administracyjny w Warszawie (Tribunal Administrativo do Voivodato de Varsóvia, Polónia) negou provimento ao recurso interposto pela P. contra a decisão da autoridade de recurso. Referindo‑se em particular ao artigo 29a.°, n.° 1, e ao artigo 88.°, n.° 3a, ponto 4, alínea b), da Lei do IVA, esse órgão jurisdicional considerou que a contraprestação devida à entidade que realiza uma entrada em espécie numa sociedade com uma forma diferente da de uma empresa ou parte organizada de uma empresa é constituída pelo valor nominal das ações que essa sociedade tiver transferido para aquela entidade como forma de a remunerar pela referida entrada em espécie.

15      A P. interpôs recurso de cassação desse acórdão para o Naczelny Sąd Administracyjny (Supremo Tribunal Administrativo, Polónia), que é o órgão jurisdicional de reenvio. A P. considera, nomeadamente, que o artigo 29a.°, n.° 1, da Lei do IVA foi erradamente interpretado no sentido de que exige que o valor tributável de uma operação correspondente a uma entrada em espécie seja determinado com base no valor nominal das ações recebidas em contrapartida. Segundo P., uma interpretação correta desta disposição exige que o preço de emissão das ações seja tido em conta para calcular o valor tributável da entrada em causa. A esta base deve ser deduzido, se for caso disso, o valor da contribuição em numerário de que P. beneficiou no âmbito da operação de entrada.

16      O órgão jurisdicional de reenvio considera que, no caso de uma entrada em espécie em troca de ações, primeiro, o valor de mercado do objeto dessa entrada não pode servir para determinar o valor tributável do IVA dessa entrada e, segundo, a contraprestação é constituída pelas ações dessa sociedade.

17      Em contrapartida, esse órgão jurisdicional considera que a questão de saber se, para determinar esse valor tributável, importa ter em conta o valor nominal das ações ou, pelo contrário, o seu valor de emissão, em conformidade com o que as partes acordaram, ainda não foi abordada pelo Tribunal de Justiça.

18      Por conseguinte, o órgão jurisdicional de reenvio tem dúvidas quanto à forma como deve ser determinado o valor tributável do IVA no caso em apreço. A este respeito, precisa que o valor nominal das ações considerado como valor tributável pelas autoridades fiscais em causa não corresponde manifestamente ao valor dos imóveis entregues à P. e que, devido a esse desequilíbrio, as partes em causa acordaram nos contratos de entradas em espécie que a contrapartida dessas entradas seria constituída por ações da P., valorizadas ao seu preço de emissão. Esta última abordagem permite conferir caráter recíproco às transações em causa.

19      Foi nestas condições que o Naczelny Sąd Administracyjny (Supremo Tribunal Administrativo) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«Deve entender‑se por contraprestação que o fornecedor tenha recebido ou deva receber em relação às entregas de bens, a que se refere o artigo 73.° da Diretiva [IVA], de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, o valor nominal das ações subscritas ou o valor de emissão, se as partes tiverem estipulado que o valor de emissão das ações constitui a contraprestação?»

 Quanto à questão prejudicial

20      Com a sua questão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se o artigo 73.° da Diretiva IVA deve ser interpretado no sentido de que o valor tributável de uma entrada de imóveis, efetuada por uma primeira sociedade no capital de uma segunda sociedade em troca de ações desta última, deve ser determinado em função do valor nominal dessas ações quando as referidas sociedades tiverem acordado que a contraprestação dessa entrada de capital será constituída pelo valor de emissão das referidas ações.

21      A este respeito, resulta da redação do artigo 73.° da Diretiva IVA que o valor tributável compreende tudo o que constitui a contraprestação que o fornecedor ou o prestador tenha recebido ou deva receber em relação a essas operações, do adquirente, do destinatário ou de um terceiro.

22      Esta contraprestação não tem necessariamente de ser em dinheiro. Com efeito, os contratos de permuta, em que a contraprestação é por definição em espécie, e as operações cuja contraprestação é pecuniária são, do ponto de vista económico e comercial, duas situações idênticas ao abrigo da Diretiva IVA. Assim, a contraprestação de uma prestação de serviços ou de uma entrega de bens pode consistir numa prestação de serviços e corresponder ao seu valor tributável na aceção do artigo 73.° dessa Diretiva (v., neste sentido, Acórdão de 10 de janeiro de 2019, A, C‑410/17, EU:C:2019:12, n.os 35 e 36 e jurisprudência referida).

23      Todavia, é importante que a entrega de bens ou a prestação de serviços seja efetuada a título oneroso, isto é, que exista um nexo direto entre os bens ou as prestações trocados e que o valor do bem ou da prestação dado em troca possa ser expresso em dinheiro. Este nexo direto está demonstrado quando existir uma relação jurídica entre o prestador e o beneficiário no quadro da qual sejam realizadas prestações recíprocas, sendo a retribuição recebida pelo prestador o contravalor efetivo do serviço fornecido ao beneficiário (v., neste sentido, Acórdão de 10 de janeiro de 2019, A, C‑410/17, EU:C:2019:12, n.os 31 e 35 e jurisprudência referida).

24      No caso em apreço, a P. procedeu a vários aumentos do seu capital ao adquirir a propriedade de imóveis pertencentes à W. e à B. A contraprestação recebida por estas sociedades pelas entradas dos seus imóveis no capital da P. corresponde às ações da P. que esta emitiu para esse efeito.

25      Por conseguinte, existe um nexo direto entre a transmissão desses imóveis pela W. e B. e a atribuição de ações da P. a essas sociedades. Além disso, o valor das ações transmitidas às referidas sociedades pode ser expresso em dinheiro.

26      Quanto à valorização em dinheiro dessas ações, resulta dos autos de que dispõe o Tribunal de Justiça que, no direito polaco, o valor nominal das ações de uma sociedade comercial se define, em substância, como sendo o valor, por ação, dos ativos financeiros e não financeiros transferidos pelos sócios fundadores, conforme definido nos estatutos da sociedade. Este valor é, portanto, o valor de cada ação detida pelos acionistas da sociedade no momento da sua constituição, determinado em função das entradas desses sócios para a sociedade nesse momento. O valor de emissão de uma ação corresponde, por sua vez, ao seu valor no momento em que é emitida. Assim, aquando da criação de uma sociedade, o valor de emissão de uma ação é, em princípio, igual ao seu valor nominal. No entanto, o valor de uma sociedade pode aumentar ou diminuir durante a sua existência, em função, nomeadamente, da sua atividade, pelo que o valor de cada uma das ações dessa sociedade pode ser superior ou inferior ao seu valor nominal. Quando uma sociedade, cujas ações aumentaram de valor desde a sua criação, emite novas ações, o preço de emissão das mesmas é geralmente mais elevado do que o valor nominal das ações existentes, a fim de evitar a diluição do valor destas últimas ações.

27      Resulta de jurisprudência constante que o valor tributável de uma entrega de bens, efetuada a título oneroso, é constituído pela contraprestação realmente recebida para esse efeito. Essa contraprestação representa, portanto, o valor subjetivo, isto é, o realmente recebido, e não um valor calculado segundo critérios objetivos (v., neste sentido, Acórdão de 19 de dezembro 2012, Orfey, C‑549/11, EU:C:2012:832, n.° 44 e jurisprudência referida).

28      Se não consistir num montante em dinheiro acordado entre as partes, esse valor, para ser subjetivo, deve ser o que o beneficiário da entrega de bens, que constitui a contrapartida de outra entrega de bens, atribuir aos bens que pretende obter, devendo corresponder ao montante que o referido beneficiário está disposto a gastar para esse fim (v., neste sentido, Acórdão de 19 de dezembro 2012, Orfey, C‑549/11, EU:C:2012:832, n.° 45 e jurisprudência referida).

29      No caso em apreço, o valor subjetivo da contraprestação das entradas de imóveis corresponde ao valor em dinheiro que a W. e a B. conferiram às ações da P. quando as aceitaram em troca das referidas entradas no capital desta última.

30      Sem prejuízo de uma verificação pelo órgão jurisdicional de reenvio, resulta dos contratos celebrados entre, por um lado, a W. e a B. e, por outro, a P., que a contraprestação da incorporação dos imóveis até então pertencentes a W. e a B. no capital da P. corresponde à atribuição de um número de ações cujo valor unitário é fixado em função do valor de emissão dessa ação. Daqui resulta que o valor subjetivo de cada uma dessas ações que a W. e a B. subscreveram nesse aumento de capital corresponde ao preço de emissão das referidas ações.

31      Este preço de emissão, que ascende a 35 287,19 PLN, ou seja, cerca de 8 123 euros, corresponde assim ao valor em dinheiro acordado e realmente recebido pela W. e pela B. por cada uma das ações da P.

32      Por conseguinte, uma vez que, por um lado, em aplicação do artigo 73.° da Diretiva IVA, o valor tributável dos imóveis transmitidos a P. deve ser estabelecido tendo em conta a contraprestação acordada e realmente recebida para esse efeito pela W. e pela B. e, por outro, uma vez que a P. e estas sociedades acordaram que essa contrapartida consistiria na atribuição de ações da P. a um preço de emissão de 35 287,19 PLN por ação, ou seja, cerca de 8 123 euros, é esse mesmo preço de emissão, e não o valor nominal dessas ações, a saber, 50 PLN, ou seja, cerca de 11,50 euros, que deve ser tido em conta para determinar o valor tributável da cessão desses imóveis.

33      Esta apreciação não é posta em causa pelo facto de, no caso em apreço, o valor de emissão das ações ter sido determinado pelas partes após uma avaliação, por um terceiro, do valor de mercado dos imóveis que foram objeto da entrada. Com efeito, como indica o Rzecznik Małych i Średnich Przedsiębiorców (Provedor de Justiça para as Pequenas e Médias Empresas, Polónia) nas suas observações, esta avaliação apenas demonstra que essas partes acordaram termos e condições semelhantes aos que poderiam ter acordado outras partes para a venda desses imóveis no mercado. A referida avaliação não afeta a conclusão de que as partes em causa no processo principal acordaram que o valor das ações em questão corresponde ao seu valor de emissão.

34      Assim, o facto de o preço acordado corresponder ao preço de mercado não demonstra que o valor tributável em sede de IVA deva ser determinado à luz de um valor objetivo, em vez do valor subjetivo realmente convencionado pelas referidas partes. Por conseguinte, a contraprestação realmente acordada para os imóveis em causa que, em aplicação do artigo 73.° da Diretiva IVA, formam o valor tributável em sede de IVA, é determinada tendo em conta o número de ações da P., valorizadas segundo o seu preço de emissão, que a W. e a B. puderam subscrever.

35      A apreciação que figura no n.° 32 do presente acórdão também não é posta em causa pelo argumento do Governo Polaco, apresentado nas suas observações, e da autoridade de recurso, conforme resulta da decisão de reenvio, segundo o qual o valor nominal das ações determina o alcance dos direitos e obrigações patrimoniais e não patrimoniais dos acionistas de uma sociedade. Com efeito, mesmo que assim seja, não se pode deduzir daí que o valor nominal corresponda à contraprestação acordada entre as partes, uma vez que os contratos que estas celebraram, à margem do aumento de capital em causa, estipulam que as novas ações emitidas em troca da entrada em espécie dos imóveis serão subscritas pelo seu valor de emissão.

36      No entanto, esta determinação da base tributável em sede de IVA não obsta, como salientou a Comissão Europeia, a que o órgão jurisdicional de reenvio possa verificar, tendo em conta todas as circunstâncias relevantes, que o valor acordado pelas partes reflete efetivamente a realidade económica e comercial e não é o resultado de uma prática abusiva (v., neste sentido, Acórdão de 10 de janeiro de 2019, A, C‑410/17, EU:C:2019:12, n.° 47 e jurisprudência referida).

37      Além disso, o artigo 80.° da Diretiva IVA permite expressamente que, em alguns casos, a fim de evitar a fraude ou a evasão fiscais, os Estados‑Membros considerem o valor normal da operação como valor tributável para as entregas de bens e prestações de serviços que envolvam laços familiares ou outros laços pessoais próximos, laços organizacionais, patrimoniais, associativos, financeiros ou jurídicos, definidos pelo Estado‑Membro.

38      Todavia, uma vez que derroga a regra segundo a qual o valor tributável é constituído pela contraprestação realmente recebida para esse efeito pelo sujeito passivo, esta disposição deve ser objeto de interpretação restrita. Assim, foi declarado que as condições de aplicação estabelecidas na referida disposição são taxativas e, portanto, a legislação nacional não pode prever, com fundamento nessa mesma disposição, que o valor tributável seja o valor normal da operação em casos diferentes dos aí enumerados (Acórdão de 19 de dezembro de 2012, Orfey, C‑549/11, EU:C:2012:832, n.° 47 e jurisprudência referida).

39      No caso em apreço, nenhum elemento dos autos de que dispõe o Tribunal de Justiça leva, no entanto, a crer que o valor de emissão das ações em causa resulta de uma prática abusiva ou que a República da Polónia tenha tomado medidas ao abrigo do artigo 80.° da Diretiva IVA e que as mesmas sejam aplicáveis.

40      Tendo em conta todas as considerações precedentes, há que responder ao órgão jurisdicional de reenvio que o artigo 73.° da Diretiva IVA deve ser interpretado no sentido de que o valor tributável de uma entrada de imóveis, efetuada por uma primeira sociedade no capital de uma segunda sociedade em troca de ações desta última, deve ser determinado em função do valor de emissão dessas ações quando as referidas sociedades tiverem acordado que a contraprestação dessa entrada de capital será constituída por este valor de emissão.

 Quanto às despesas

41      Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Sétima Secção) declara:

O artigo 73.° da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, conforme alterada pelo Ato Relativo às Condições de Adesão da República da Croácia e às adaptações do Tratado da União Europeia, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia e do Tratado que institui a Comunidade Europeia da Energia Atómica,

deve ser interpretado no sentido de que:

o valor tributável de uma entrada de imóveis, efetuada por uma primeira sociedade no capital de uma segunda sociedade em troca de ações desta última, deve ser determinado em função do valor de emissão dessas ações quando as referidas sociedades tiverem acordado que a contraprestação dessa entrada de capital será constituída por este valor de emissão.

Assinaturas


*      Língua do processo: polaco.

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