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Document 62023CJ0184

    Acórdão do Tribunal de Justiça (Quarta Secção) de 11 de julho de 2024.
    Finanzamt T contra S.
    Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Bundesfinanzhof.
    Reenvio prejudicial — Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado (IVA) — Sexta Diretiva 77/388/CEE — Artigo 2.o, ponto 1 — Artigo 4.o, n.o 4, segundo parágrafo — Sujeitos passivos — Faculdade de os Estados‑Membros considerarem como um único sujeito passivo, denominado “agrupamento IVA”, pessoas juridicamente independentes, mas estreitamente vinculadas entre si nos planos financeiro, económico e de organização — Prestações internas no agrupamento IVA — Tributação dessas prestações — Beneficiário das prestações não autorizado a deduzir o IVA — Risco de perdas fiscais.
    Processo C-184/23.

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:2024:599

     ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quarta Secção)

    11 de julho de 2024 ( *1 )

    «Reenvio prejudicial — Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado (IVA) — Sexta Diretiva 77/388/CEE — Artigo 2.o, ponto 1 — Artigo 4.o, n.o 4, segundo parágrafo — Sujeitos passivos — Faculdade de os Estados‑Membros considerarem como um único sujeito passivo, denominado “agrupamento IVA”, pessoas juridicamente independentes, mas estreitamente vinculadas entre si nos planos financeiro, económico e de organização — Prestações internas no agrupamento IVA — Tributação dessas prestações — Beneficiário das prestações não autorizado a deduzir o IVA — Risco de perdas fiscais»

    No processo C‑184/23,

    que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Bundesfinanzhof (Tribunal Federal Tributário, Alemanha), por Decisão de 26 de janeiro de 2023, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 22 de março de 2023, no processo

    Finanzamt T

    contra

    S,

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quarta Secção),

    composto por: C. Lycourgos, presidente de secção, O. Spineanu‑Matei, J.‑C. Bonichot (relator), S. Rodin e L. S. Rossi, juízes,

    advogado‑geral: A. Rantos,

    secretário: A. Calot Escobar,

    vistos os autos,

    vistas as observações apresentadas:

    em representação de S, por R. J. Schwerin e D. Sommerfeld, Rechtsanwälte,

    em representação do Governo Alemão, por M. J. Möller e A. Hoesch, na qualidade de agentes,

    em representação da Comissão Europeia, por B. Eggers e M. Herold, na qualidade de agentes,

    ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 16 de maio de 2024,

    profere o presente

    Acórdão

    1

    O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 2.o, ponto 1, e do artigo 4.o, n.o 4, segundo parágrafo, da Sexta Diretiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados‑Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios — Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado matéria coletável uniforme (JO 1977, L 145, p. 1; EE 09 F1, p. 54 a seguir «Sexta Diretiva»).

    2

    Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe o Finanzamt T (Administração Fiscal, Alemanha) a S, uma fundação alemã de direito público, a respeito da tributação desta fundação para efeitos do imposto sobre o valor acrescentado (IVA), relativamente ao exercício fiscal de 2005.

    Quadro jurídico

    Direito da União

    3

    A Sexta Diretiva foi revogada e substituída, a partir de 1 de janeiro de 2007, pela Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado (JO 2006, L 347, p. 1). No entanto, tendo em conta a data dos factos em causa no litígio no processo principal, este continua a ser regulado pela Sexta Diretiva.

    4

    O artigo 2.o da Sexta Diretiva dispunha:

    «Estão sujeitas ao [IVA]:

    1)

    As entregas de bens e as prestações de serviços, efetuadas a título oneroso, no território do país, por um sujeito passivo agindo nessa qualidade;

    […]»

    5

    O artigo 4.o dessa diretiva previa:

    «1)   Por “sujeito passivo” entende‑se qualquer pessoa que exerça, de modo independente, em qualquer lugar, uma das atividades económicas referidas no n.o 2, independentemente do fim ou do resultado dessa atividade.

    […]

    4)   A expressão “de modo independente”, utilizada no n.o 1, exclui da tributação os assalariados e outras pessoas, na medida em que se encontrem vinculados à entidade patronal por um contrato de trabalho ou por qualquer outra relação jurídica que estabeleça vínculos de subordinação no que diz respeito às condições de trabalho e de remuneração e à responsabilidade da entidade patronal.

    Sem prejuízo da consulta prevista no artigo 29.o, os Estados‑Membros podem considerar como um único sujeito passivo as pessoas estabelecidas no território do país que, embora juridicamente independentes, se encontrem estreitamente vinculadas entre si nos planos financeiro, económico e de organização.

    5)   Os Estados, as coletividades territoriais e outros organismos de direito público não serão considerados sujeitos passivos relativamente às atividades ou operações que exerçam na qualidade de autoridades públicas, mesmo quando em conexão com essas mesmas atividades ou operações cobrem direitos, taxas, quotizações ou remunerações.

    […]»

    6

    Nos termos do artigo 6.o, n.o 2, da referida diretiva:

    «São equiparadas a prestações de serviços efetuadas a título oneroso:

    […]

    b)

    As prestações de serviços a título gratuito efetuadas pelo sujeito passivo, para seu uso privado ou do seu pessoal ou, em geral, para fins estranhos à própria empresa.

    Os Estados‑Membros podem derrogar o disposto no presente número, desde que tal derrogação não conduza a distorções de concorrência.»

    7

    O artigo 13.o, parte A, n.o 1, alínea b), da mesma diretiva dispunha:

    «1) Sem prejuízo de outras disposições comunitárias, os Estados‑Membros isentarão, nas condições por eles fixadas com o fim de assegurar a aplicação correta e simples das isenções a seguir enunciadas e de evitar qualquer possível fraude, evasão e abuso:

    […]

    b)

    A hospitalização e a assistência médica, e bem assim as operações com elas estreitamente conexas, asseguradas por organismos de direito público ou, em condições sociais análogas às que vigoram para estes últimos, por estabelecimentos hospitalares, centros de assistência médica e de diagnóstico e outros estabelecimentos da mesma natureza devidamente reconhecidos».

    8

    O artigo 17.o, n.o 2, da Sexta Diretiva previa:

    «Desde que os bens e os serviços sejam utilizados para os fins das próprias operações tributáveis, o sujeito passivo está autorizado a deduzir do imposto de que é devedor:

    a)

    O [IVA] devido ou pago em relação a bens que lhe tenham sido fornecidos ou que lhe devam ser fornecidos e a serviços que lhe tenham sido prestados ou que lhe devam ser prestados por outro sujeito passivo;

    […]»

    9

    O artigo 11.o da Diretiva 2006/112 dispõe:

    «Após consulta do Comité Consultivo do [IVA] (a seguir designado “Comité do IVA”), cada Estado‑Membro pode considerar como um único sujeito passivo as pessoas estabelecidas no território desse mesmo Estado‑Membro que, embora juridicamente independentes, se encontrem estreitamente vinculadas entre si nos planos financeiro, económico e de organização.

    Um Estado‑Membro que exerça a faculdade prevista no primeiro parágrafo pode adotar todas as medidas necessárias para evitar a possibilidade de fraude ou evasão fiscais em razão da aplicação dessa disposição.»

    Direito alemão

    10

    O artigo 2.o, n.o 2, da Umsatzsteuergesetz (Lei do Imposto sobre o Volume de Negócios), na versão aplicável ao litígio no processo principal (a seguir «UStG»), tem a seguinte redação:

    «A atividade industrial, comercial ou profissional não é exercida de modo independente:

    […]

    2) Quando a arquitetura global dos vínculos efetivos demonstre que uma pessoa coletiva está integrada na empresa da sociedade dominante (unidade fiscal) nos planos financeiro, económico e de organização. Os efeitos da unidade fiscal limitam‑se às prestações internas entre as filiais da empresa situadas no país. Essas filiais devem ser tratadas como uma única empresa. […]»

    11

    O artigo 3.o, 9a, ponto 2, da UStG dispõe:

    «São equiparadas a outra prestação a título oneroso:

    […]

    2) o fornecimento a título gratuito pelo empresário de outra prestação para fins estranhos à empresa ou para uso privado do seu pessoal, exceto as meras liberalidades [feitas a este].»

    Matéria de facto no processo principal e questões prejudiciais

    12

    Resulta da decisão de reenvio que S é uma fundação alemã de direito público, sendo o órgão de cúpula de uma universidade, que gere também um departamento de medicina universitária, e da sociedade U‑GmbH.

    13

    Ao longo de 2005, a sociedade U‑GmbH prestou à S serviços de limpeza, higiene, lavandaria e transporte de pacientes. Os serviços de limpeza foram prestados para todo o complexo imobiliário constituído pelo departamento de medicina universitária, do qual fazem parte os quartos dos pacientes, os corredores, as salas de operações, as salas de aulas e os laboratórios.

    14

    A S exerce atividades económicas no complexo imobiliário pelas quais está sujeita a IVA, mas utiliza salas de curso e outras partes desse complexo para atividades de formação de estudantes, que exerce na qualidade de autoridade pública e pelas quais não é considerada sujeito passivo de IVA. A proporção da área desse complexo afetada a estas últimas atividades ascende a 7,6 % da superfície total desse complexo.

    15

    Em 3 de novembro de 2005, na sequência de uma inspeção, a Administração Fiscal retificou o aviso de liquidação de IVA da S relativo ao ano de 2005.

    16

    Em primeiro lugar, considerando que os estabelecimentos da S formavam uma empresa única, cujo órgão de cúpula era S, a Administração Fiscal considerou que devia ser feita uma única declaração de IVA e que, por conseguinte, devia ser emitido um único aviso de liquidação.

    17

    Em segundo lugar, a Administração Fiscal considerou que, de acordo com o artigo 2.o, n.o 2, ponto 2, da UStG, os serviços de limpeza prestados pela U‑GmbH à S constituíam prestações efetuadas na unidade fiscal (Organschaft) formada pela S e pela U‑GmbH e que, por conseguinte, essas prestações não estavam sujeitas a IVA.

    18

    No entanto, a Administração Fiscal considerou também que, uma vez que essas prestações tinham sido efetuadas nas atividades da S pelas quais não era considerada sujeita a IVA, tinham sido fornecidas para fins «alheios à empresa» e tinham dado origem, a favor da S, a uma «prestação de serviços a título gratuito, equiparada a uma prestação de serviços a título oneroso», em conformidade com o artigo 3.o, n.o 9a, ponto 2, da UStG, que transpunha o artigo 6.o, n.o 2, alínea b), da Sexta Diretiva.

    19

    Com este fundamento, a Administração Fiscal aumentou o montante de IVA devido pela S.

    20

    A S apresentou uma reclamação administrativa dessa decisão, que foi indeferida.

    21

    O Finanzgericht (Tribunal Tributário, Alemanha) deu provimento ao recurso interposto pela S contra o agravamento do IVA. A esse respeito, considerou que a unidade fiscal (Organschaft) que reunia, numa única empresa, o órgão de cúpula S e a U‑GmbH se estendia às atividades da S pertencentes ao exercício do poder público e que não estavam preenchidos os pressupostos previstos no artigo 3.o, n.o 9a, ponto 2, da UStG.

    22

    A Administração Fiscal interpôs recurso de Revision dessa sentença para o Bundesfinanzhof (Tribunal Tributário Federal, Alemanha), que é o órgão jurisdicional de reenvio. Este submeteu ao Tribunal de Justiça, a título prejudicial, um pedido de decisão prejudicial, para determinar se a regulamentação alemã relativa à unidade fiscal era conforme com o direito da União e se o artigo 6.o, n.o 2, alínea b), da Sexta Diretiva era aplicável.

    23

    Esse pedido de decisão prejudicial deu origem ao Acórdão de 1 de dezembro de 2022, Finanzamt T (Prestações internas de um agrupamento IVA) (C‑269/20, EU:C:2022:944). Nesse acórdão, o Tribunal de Justiça considerou que o artigo 4.o, n.o 4, segundo parágrafo, da Sexta Diretiva não se opunha a que um Estado‑Membro designasse, como sujeito passivo único de um agrupamento IVA, o respetivo órgão de cúpula, quando esse órgão possa impor a sua vontade às outras entidades que fazem parte desse grupo e desde que essa designação não implique um risco de perdas fiscais. O Tribunal de Justiça declarou também que o direito da União deve ser interpretado no sentido de que, no caso em que um órgão como esse exerça atividades económicas pelas quais está sujeito a IVA e atividades no âmbito do exercício das prerrogativas de poder público, relativamente às quais não é considerado sujeito passivo de IVA nos termos do artigo 4.o, n.o 5, dessa diretiva, a prestação, por uma entidade que faz parte desse agrupamento, de um serviço relacionado com o referido exercício não deve ser tributada nos termos do artigo 6.o, n.o 2, alínea b), dessa diretiva.

    24

    O órgão jurisdicional de reenvio considera necessário submeter novamente ao Tribunal de Justiça, no âmbito do mesmo litígio, a questão de saber se as prestações fornecidas a título oneroso entre pessoas que fazem parte de um mesmo agrupamento IVA fazem parte do âmbito de aplicação do IVA, de acordo com o artigo 2.o, n.o 1, e com o artigo 4.o, n.o 4, segundo parágrafo, da Sexta Diretiva. Considera que existe uma incerteza a esse respeito, tendo em conta o que o Tribunal de Justiça indicou nos n.os 77 a 80 do Acórdão de 1 de dezembro de 2022, Norddeutsche Gesellschaft für Diakonie (C‑141/20, EU:C:2022:943).

    25

    Este órgão jurisdicional interroga‑se também sobre se, de qualquer forma, não será de sujeitar essas prestações a IVA, no caso de o beneficiário dessas prestações não estar ou estar apenas parcialmente autorizado a deduzir o imposto devido ou pago a montante, para evitar um «risco de prejuízos fiscais», tendo em conta os princípios decorrentes dos Acórdãos de 1 de dezembro de 2022, Norddeutsche Gesellschaft für Diakonie (C‑141/20, EU:C:2022:943) e de 1 de dezembro de 2022, Finanzamt T (Prestações internas de um agrupamento IVA) (C‑269/20, EU:C:2022:944).

    26

    Nestas circunstâncias, o Bundesfinanzhof (Supremo Tribunal Tributário Federal) suspendeu a instância e submeteu ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

    «1)

    O agrupamento de várias pessoas num único sujeito passivo, na aceção do artigo 4.o, n.o 4, segundo parágrafo, da [Sexta Diretiva] significa que as prestações efetuadas a título oneroso entre estas pessoas não estão abrangidas pelo âmbito de aplicação do imposto sobre o valor acrescentado (IVA) na aceção do artigo 2.o, n.o 1, desta diretiva?

    2)

    As prestações a título oneroso entre estas pessoas estão, de qualquer modo, sujeitas ao âmbito de aplicação do IVA se o destinatário não tiver (ou só tiver parcialmente) o direito de deduzir o imposto pago a montante, uma vez que, caso contrário, existe um risco de perdas fiscais?»

    Quanto às questões prejudiciais

    27

    Com as suas duas questões, a examinar em conjunto, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 2.o, ponto 1, e o artigo 4.o, n.o 4, segundo parágrafo, da Sexta Diretiva devem ser interpretados no sentido de que as prestações efetuadas a título oneroso entre pessoas que fazem parte de um mesmo agrupamento IVA devem estar sujeitas a IVA e se a circunstância de o beneficiário dessas prestações não poder deduzir o IVA devido ou pago a montante deve ser tido em conta por essa situação poder implicar um risco de perdas fiscais.

    28

    A título preliminar, há que lembrar que, nos termos do artigo 2.o, n.o 1, da Sexta Diretiva, estão sujeitas a IVA «as entregas de bens e as prestações de serviços, efetuadas a título oneroso, no território do país, por um sujeito passivo agindo nessa qualidade».

    29

    Segundo o artigo 4.o, n.o 1, desta diretiva, entende‑se por «sujeito passivo» qualquer pessoa que exerça, de modo independente, uma atividade económica na aceção do n.o 2 desse artigo, independentemente do fim ou do resultado dessa atividade.

    30

    Além disso, resulta de jurisprudência constante do Tribunal de Justiça que «uma prestação de serviços só é tributável se existir entre o prestador e o beneficiário uma relação jurídica durante a qual são trocadas prestações recíprocas», constituindo a retribuição recebida pelo prestador o contravalor efetivo do serviço prestado ao beneficiário (v., neste sentido, Acórdão de 24 de janeiro de 2019, Morgan Stanley & Co International, C‑165/17, EU:C:2019:58, n.o 37 e jurisprudência referida).

    31

    Para determinar se essa relação jurídica existe, há que verificar se o prestador exerce uma atividade económica independente, nomeadamente por suportar o risco económico decorrente da sua atividade [v., neste sentido, Acórdãos de 17 de setembro de 2014, Skandia America (USA), filial Sverige, C‑7/13, EU:C:2014:2225, n.o 25, e de 24 de janeiro de 2019, Morgan Stanley & Co International, C‑165/17, EU:C:2019:58, n.o 35].

    32

    Quanto à questão de saber se as prestações fornecidas entre membros de um mesmo agrupamento IVA devem ser tributadas em IVA, refira‑se, tendo em conta as interrogações formuladas pelo órgão jurisdicional de reenvio, que o Tribunal de Justiça não se pronunciou sobre esta questão no Acórdão de 1 de dezembro de 2022, Norddeutsche Gesellschaft für Diakonie (C‑141/20, EU:C:2022:943).

    33

    Com efeito, nos n.os 77 a 80 desse acórdão, referidos mais especificamente pelo órgão jurisdicional de reenvio, a questão examinada era a de saber se um Estado‑Membro pode qualificar, «por categorização», entidades dadas como não independentes, na aceção do artigo 4.o, n.o 1, e do artigo 4.o, n.o 4, primeiro parágrafo, da Sexta Diretiva, quando estas últimas estiverem integradas nos planos financeiro, económico e de organização no órgão de cúpula de um agrupamento IVA.

    34

    Resulta dos n.os 23 e 28 a 30 do referido acórdão que esta questão era submetida pelo mesmo órgão jurisdicional de reenvio que apresentou o presente pedido de decisão prejudicial, para apreciar se o sistema alemão da unidade fiscal (Organschaft) podia ser «justificado», em todo o caso, através de uma leitura conjugada do artigo 4.o, n.o 1, e do artigo 4.o, n.o 4, primeiro parágrafo, da Sexta Diretiva.

    35

    Por conseguinte, a jurisprudência resultante do Acórdão de 1 de dezembro de 2022, Norddeutsche Gesellschaft für Diakonie (C‑141/20, EU:C:2022:943), não prejudica a resposta a dar à questão de saber se as prestações realizadas entre os membros de um mesmo agrupamento IVA estão abrangidas pelo âmbito de aplicação do IVA.

    36

    Para responder a esta questão, em contrapartida, há que ter em conta a pertença desses membros a um mesmo agrupamento IVA e as regras específicas previstas no artigo 4.o, n.o 4, segundo parágrafo, da Sexta Diretiva (v., neste sentido, Acórdão de 11 de março de 2021, Danske Bank, C‑812/19, EU:C:2021:196, n.o 22).

    37

    Segundo a redação dessa disposição, os Estados‑Membros podem considerar como «um único sujeito passivo» as pessoas estabelecidas no território do país que, embora juridicamente independentes, estão estreitamente vinculadas entre si nos planos financeiro, económico e de organização.

    38

    Resulta ainda de jurisprudência assente que a aplicação do regime previsto no artigo 4.o, n.o 4, segundo parágrafo, da Sexta Diretiva implica que a regulamentação nacional adotada com base no mesmo autoriza as entidades que apresentam esses vínculos a deixarem de ser consideradas sujeitos passivos distintos de IVA para serem consideradas um sujeito passivo único e que, quando um Estado‑Membro aplica essa disposição, a ou as entidades subordinadas na aceção da referida disposição não podem ser consideradas um ou mais sujeitos passivos na aceção do artigo 4.o, n.o 1, da Sexta Diretiva [v., neste sentido, Acórdãos de 22 de maio de 2008, Ampliscientifica e Amplifin, C‑162/07, EU:C:2008:301, n.o 19; de 1 de dezembro de 2022, Norddeutsche Gesellschaft für Diakonie, C‑141/20, EU:C:2022:943, n.o 45, e de 1 de dezembro de 2022, Finanzamt T (Prestações internas de um agrupamento IVA),C‑269/20, EU:C:2022:944, n.o 39].

    39

    Consequentemente, a equiparação de um agrupamento IVA a um único sujeito passivo, ao abrigo do artigo 4.o, n.o 4, segundo parágrafo, da Sexta Diretiva, impede que os membros do agrupamento IVA continuem a apresentar declarações de IVA separadamente e continuem a ser identificados, dentro e fora do agrupamento, como sujeitos passivos, uma vez que só o sujeito passivo único está autorizado a apresentar as referidas declarações. Esta disposição, quando é aplicada por um Estado‑Membro, pressupõe portanto necessariamente que a legislação nacional que a transpõe assegure que o sujeito passivo seja único e que seja atribuído um único número de IVA ao grupo [v., neste sentido, Acórdãos de 22 de maio de 2008, Ampliscientifica e Amplifin, C‑162/07, EU:C:2008:301, n.os 19 e 20, e de 1 de dezembro de 2022, Finanzamt T (Prestações internas de um agrupamento IVA),C‑269/20, EU:C:2022:944, n.o 40].

    40

    Como o advogado‑geral referiu, nos n.os 44 e 45 das suas conclusões, resulta daí que, quando o Estado‑Membro tiver instituído esse regime, um prestador pertencente a um agrupamento IVA não pode ser considerado a título individual um sujeito passivo distinto do sujeito passivo que é constituído pelo agrupamento IVA, pelo que não há que determinar se esse prestador preenche o pressuposto de independência previsto no artigo 4.o, n.o 1, da Sexta Diretiva quando fornece uma prestação a título oneroso a outra entidade desse agrupamento. Assim, essa prestação não pode estar abrangida pelo âmbito de aplicação do IVA nos termos do artigo 2.o, n.o 1, dessa diretiva.

    41

    Por último, refira-se que o Comité do IVA, instituído no artigo 398.o da Diretiva 2006/112, fez uma análise idêntica a respeito do agrupamento IVA referido no artigo 11.o dessa diretiva, nas orientações resultantes da centésima décima nona reunião desse comité, de 22 de novembro de 2021, que indicam que o tratamento de um agrupamento IVA como um sujeito passivo único exclui que os membros desse agrupamento continuem a operar, dentro e fora do seu agrupamento, como sujeitos passivos distintos para efeitos de IVA. Esse documento, embora sem valor vinculativo, não deixa de constituir um auxílio à interpretação da Sexta Diretiva (v., por analogia, Despacho de 8 de outubro de 2020, Weindel Logistik Service, C‑621/19, EU:C:2020:814, n.o 48).

    42

    Do mesmo modo, o ponto 3.4.3 da Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu no que respeita à faculdade de criação de agrupamentos para efeitos de IVA prevista no artigo 11.o da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, relativa ao sistema comum de imposto sobre o valor acrescentado [COM (2009) 325 final], relativo às «Entregas e prestações intragrupo», precisa que as operações entre os membros de um mesmo agrupamento IVA efetuadas a título oneroso não existem para efeitos de IVA.

    43

    Quanto à questão de saber se há que distinguir o caso particular em que o prestador de tal prestação não pode invocar o direito à dedução do IVA devido ou pago a montante, por existir, nesse caso, um «risco de perdas fiscais», importa, a título preliminar, recordar que, no âmbito de um agrupamento IVA, o direito à dedução do IVA devido ou pago a montante é conferido ao próprio agrupamento, e não aos seus membros.

    44

    Por outro lado, nos Acórdãos de 1 de dezembro de 2022, Norddeutsche Gesellschaft für Diakonie (C‑141/20, EU:C:2022:943), e de 1 de dezembro de 2022, Finanzamt T (Prestações internas de um agrupamento IVA) (C‑269/20, EU:C:2022:944), que o órgão jurisdicional de reenvio citou na sua decisão de reenvio, a condição da necessidade de evitar um risco de prejuízos fiscais a que o Tribunal de Justiça fez referência dizia respeito a uma questão diferente da examinada no âmbito do presente processo.

    45

    Com efeito, conforme resulta do n.o 60 do Acórdão de 1 de dezembro de 2022, Norddeutsche Gesellschaft für Diakonie (C‑141/20, EU:C:2022:943), e do n.o 53 do Acórdão de 1 de dezembro de 2022, Finanzamt T (Prestações internas de um agrupamento IVA) (C‑269/20, EU:C:2022:944), essa questão era a da possibilidade de um Estado‑Membro não designar o próprio agrupamento IVA, mas sim o órgão de cúpula desse agrupamento para exercer o papel de único sujeito passivo. Como recordado no n.o 23 do presente acórdão, o Tribunal de Justiça considerou que podia ser esse o caso se, no respeitante às receitas fiscais, essa designação conduzisse ao mesmo resultado do caso de o próprio agrupamento IVA estar sujeito a esse imposto [v., neste sentido, Acórdãos de 1 de dezembro de 2022, Norddeutsche Gesellschaft für Diakonie, C‑141/20, EU:C:2022:943, n.os 57 a 59, e de 1 de dezembro de 2022, Finanzamt T (Prestações internas de um agrupamento IVA),C‑269/20, EU:C:2022:944, n.os 50 a 52].

    46

    Em contrapartida, o «risco de perdas fiscais» a que o órgão jurisdicional nacional se refere no âmbito da sua segunda questão não resulta, a priori, da aplicação de condições específicas do regime do agrupamento IVA próprias do direito de um Estado‑Membro, mas sim da aplicação do sistema comum do IVA previsto na Sexta Diretiva e das regras relativas à dedução do IVA devido ou pago a montante que prevê.

    47

    Em face do exposto, há que responder às questões submetidas que o artigo 2.o, ponto 1, e o artigo 4.o, n.o 4, segundo parágrafo, da Sexta Diretiva devem ser interpretados no sentido de que as prestações efetuadas a título oneroso entre pessoas que façam parte de um mesmo agrupamento IVA não estão sujeitas a IVA, mesmo no caso de o IVA devido ou pago pelo beneficiário dessas prestações não poder ser objeto de dedução a montante.

    Quanto à limitação dos efeitos no tempo

    48

    O Governo Alemão pediu ao Tribunal de Justiça que limitasse no tempo os efeitos do presente acórdão no caso de o Tribunal de Justiça responder pela afirmativa à primeira ou à segunda questão.

    49

    Tendo em conta a resposta dada às duas questões submetidas pelo órgão jurisdicional de reenvio, não há que responder a este pedido.

    Quanto às despesas

    50

    Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional nacional, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

     

    Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Quarta Secção) declara:

     

    O artigo 2.o, ponto 1, e o artigo 4.o, n.o 4, segundo parágrafo, da Sexta Diretiva do Conselho 77/388/CEE, de 17 de maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados‑Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios — Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria coletável uniforme,

     

    devem ser interpretados no sentido de que:

     

    as prestações efetuadas a título oneroso entre pessoas que façam parte de um mesmo agrupamento constituído por pessoas independentes do ponto de vista jurídico, mas estreitamente vinculadas entre si nos planos financeiro, económico e de organização, designado por um Estado‑Membro como sendo um sujeito passivo único, não estão sujeitas a imposto sobre o valor acrescentado (IVA), mesmo no caso de o IVA devido ou pago pelo beneficiário dessas prestações não poder ser objeto de dedução a montante.

     

    Assinaturas


    ( *1 ) Língua do processo: alemão.

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