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Document 62023CJ0087

    Acórdão do Tribunal de Justiça (Sétima Secção) de 4 de julho de 2024.
    Biedrība «Latvijas Informācijas un komunikācijas tehnoloģijas asociācija» contra Valsts ieņēmumu dienests.
    Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Administratīvā apgabaltiesa.
    Reenvio prejudicial — Fiscalidade — Imposto sobre o valor acrescentado (IVA) — Diretiva 2006/112/CE — Artigo 2.o, n.o 1, alínea c) — Prestação de serviços efetuada a título oneroso — Artigo 9.o, n.o 1 — Conceitos de “sujeito passivo” e de “atividade económica” — Associação sem fins lucrativos que realiza projetos financiados pelo Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER) — Prestação de serviços de formação através de subcontratantes — Inclusão do montante da subvenção no valor tributável — Artigo 73.o.
    Processo C-87/23.

    Court reports – general

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:2024:570

     ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Sétima Secção)

    4 de julho de 2024 ( *1 )

    «Reenvio prejudicial — Fiscalidade — Imposto sobre o valor acrescentado (IVA) — Diretiva 2006/112/CE — Artigo 2.o, n.o 1, alínea c) — Prestação de serviços efetuada a título oneroso — Artigo 9.o, n.o 1 — Conceitos de “sujeito passivo” e de “atividade económica” — Associação sem fins lucrativos que realiza projetos financiados pelo Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER) — Prestação de serviços de formação através de subcontratantes — Inclusão do montante da subvenção no valor tributável — Artigo 73.o»

    No processo C‑87/23,

    que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Administratīvā apgabaltiesa (Tribunal Administrativo Regional, Letónia), por Decisão de 14 de fevereiro de 2023, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 15 de fevereiro de 2023, no processo

    Biedrība «Latvijas Informācijas un komunikācijas tehnoloģijas asociācija»

    contra

    Valsts ieņēmumu dienests,

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Sétima Secção),

    composto por: F. Biltgen, presidente de secção, N. Wahl (relator) e J. Passer, juízes,

    advogado‑geral: J. Kokott,

    secretário: A. Calot Escobar,

    vistos os autos,

    vistas as observações apresentadas:

    em representação da Biedrība «Latvijas Informācijas un komunikācijas tehnoloģijas asociācija», por A. Leškoviča, advokāte,

    em representação do Governo Letão, por J. Davidoviča, K. Pommere e E. Bārdiņš, na qualidade de agentes,

    em representação da Comissão Europeia, por P. Carlin, M. Herold e L. Ozola, na qualidade de agentes,

    ouvidas as conclusões da advogada‑geral na audiência de 7 de março de 2024,

    profere o presente

    Acórdão

    1

    O pedido de decisão prejudicial tem por objeto, em substância, a interpretação do artigo 2.o, n.o 1, alínea c), do artigo 9.o, n.o 1, e dos artigos 28.o e 73.o da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado (JO 2006, L 347, p. 1).

    2

    Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a Biedrība «Latvijas Informācijas un komunikācijas tehnoloģijas asociācija», uma associação letã de tecnologias da informação e de comunicação (a seguir «Associação»), à Valsts ieņēmumu dienests (Administração Tributária, Letónia), a respeito da recusa desta última em permitir à Associação deduzir o imposto sobre o valor acrescentado (IVA) pago a montante sobre as faturas que lhe foram enviadas pelas empresas prestadoras dos serviços de formação que esta última subcontratou.

    Quadro jurídico

    Direito da União

    3

    Nos termos do artigo 2.o, n.o 1, da Diretiva 2006/112:

    «Estão sujeitas ao IVA as seguintes operações:

    […]

    c)

    As prestações de serviços efetuadas a título oneroso no território de um Estado‑Membro por um sujeito passivo agindo nessa qualidade;

    […]»

    4

    O artigo 9.o, n.o 1, desta diretiva dispõe:

    «Entende‑se por “sujeito passivo” qualquer pessoa que exerça, de modo independente e em qualquer lugar, uma atividade económica, seja qual for o fim ou o resultado dessa atividade.

    Entende‑se por “atividade económica” qualquer atividade de produção, de comercialização ou de prestação de serviços, incluindo as atividades extrativas, agrícolas e as das profissões liberais ou equiparadas. É em especial considerada atividade económica a exploração de um bem corpóreo ou incorpóreo com o fim de auferir receitas com caráter de permanência.»

    5

    O artigo 28.o da referida diretiva enuncia:

    «Quando um sujeito passivo participe numa prestação de serviços agindo em seu nome mas por conta de outrem, considera‑se que recebeu e forneceu pessoalmente os serviços em questão.»

    6

    O artigo 73.o da mesma diretiva tem a seguinte redação:

    «Nas entregas de bens e às prestações de serviços, que não sejam as referidas nos artigos 74.o a 77.o, o valor tributável compreende tudo o que constitui a contraprestação que o fornecedor ou o prestador tenha recebido ou deva receber em relação a essas operações, do adquirente, do destinatário ou de um terceiro, incluindo as subvenções diretamente relacionadas com o preço de tais operações.»

    7

    Nos termos do artigo 132.o, n.o 1, da Diretiva 2006/112:

    «Os Estados‑Membros isentam as seguintes operações:

    […]

    i)

    […] a formação ou reciclagem profissional, e bem assim as prestações de serviços e as entregas de bens com elas estreitamente relacionadas, efetuadas por organismos de direito público que prossigam o mesmo fim e por outros organismos que o Estado‑Membro em causa considere prosseguirem fins análogos;

    […]»

    Direito letão

    Lei do Imposto sobre o Valor Acrescentado

    8

    A Pievienotās vērtības nodokļa likums (Lei do Imposto sobre o Valor Acrescentado), de 29 de novembro de 2012 (Latvijas Vēstnesis, 2012, n.o 197), visa transpor a Diretiva 2006/112 para o direito letão.

    Lei relativa às Associações e às Fundações

    9

    O artigo 2.o, n.o 1, da Biedrību un nodibinājumu likums (Lei relativa às Associações e às Fundações), de 30 de outubro de 2003 (Latvijas Vēstnesis, 2003, n.o 161), dispõe que uma associação é uma comunidade de pessoas voluntárias constituída para atingir um fim não lucrativo definido nos seus estatutos.

    10

    Nos termos do artigo 7.o, n.o 1, desta lei, as associações e as fundações têm o direito de exercer, a título acessório, atividades económicas ligadas à manutenção ou à exploração dos seus patrimónios e outras atividades económicas com vista à realização dos seus objetivos.

    Litígio no processo principal e questões prejudiciais

    11

    Em 2016, a Associação, com sede na Letónia, celebrou dois contratos com a Centrālā finanšu un līgumu aģentūra (Agência Central de Financiamento e Contratos, Letónia) (a seguir «CFLA»), relativos à realização de dois projetos de formação financiados pelo Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER). Tratava‑se, por um lado, de um projeto de formação dos profissionais da tecnologia da informação e da comunicação (a seguir «projeto TIC») e, por outro, de um projeto de formação das pequenas e microempresas (a seguir «projeto PME»). O proponente, no âmbito do primeiro projeto, podia ser uma associação e, no âmbito do segundo projeto, uma associação ou uma administração pública.

    12

    No âmbito do projeto TIC, a Associação celebrou contratos para prestar serviços de formação a beneficiários. No âmbito desses contratos, estes beneficiários tiveram de pagar à Associação os custos da formação e o IVA correspondente, bem como, em alguns casos, uma taxa de administração igual a 5 % ou a 10 % do montante do auxílio concedido à Associação pela CFLA e a transferir para os referidos beneficiários no final do projeto TIC, acrescido de IVA. Além disso, a Associação celebrou contratos com prestadores de serviços de formação para realizar, por sua conta, as ações de formação em causa. No final das formações, esses prestadores faturaram à Associação o valor total desses serviços e cobraram o IVA. A Associação pagou as faturas dos referidos prestadores e declarou o IVA como imposto pago a montante. No final do projeto, a Associação pagou os fundos recebidos da CFLA aos beneficiários das formações (estes pagamentos variavam entre 30 % a 70 % do valor dos serviços prestados) e faturou‑lhes a taxa de administração do projeto, no valor de 5 % ou 10 % do montante do auxílio concedido pela CFLA.

    13

    No âmbito do projeto PME, a Associação pagou integralmente aos prestadores de serviços de formação, incluindo o IVA. O contrato ao abrigo do qual o referido pagamento foi efetuado tinha sido celebrado entre a Associação, o prestador de serviços de formação e o beneficiário desses serviços. Nos termos desse contrato, esse beneficiário comprometia‑se a cofinanciar a formação e o prestador de serviços era obrigado a pagar o montante correspondente a esse cofinanciamento (30 % do pagamento total, incluindo o IVA) à Associação. O financiamento concedido pelo FEDER constituiu 70 % do pagamento total que a CFLA pagou à Associação no final do projeto, excluindo o IVA.

    14

    Na sequência de uma inspeção, a Administração Tributária pôs em causa a possibilidade de a Associação deduzir o IVA pago a montante. Por conseguinte, em 2019 e em 2021, adotou oito decisões que impunham à Associação o pagamento do montante de 87299,37 EUR a título de IVA para o período entre janeiro e outubro de 2018, de uma coima no montante de 611,96 EUR e de juros de mora no montante de 7707,52 EUR. Indeferiu também o pedido da Associação de reembolso do excedente de IVA constatado relativamente aos meses de julho e de setembro a dezembro de 2018, bem como aos meses de fevereiro, de março, de maio e de dezembro de 2019, no montante total de 101363,24 EUR.

    15

    De acordo com a Administração Tributária, os projetos TIC e PME só podiam ser realizados por uma associação ou por uma administração pública, mas não por um operador económico. Tendo em conta o fim não lucrativo da Associação e o facto de a execução destes projetos não ter por objetivo a obtenção de lucros, a realização destes projetos não pode ser considerada uma atividade económica da Associação. Esta última teria gerido os projetos e efetuado os pagamentos a partir dos fundos europeus, o que teria concedido uma vantagem aos beneficiários dos serviços de formação, mas não teria prestado ela própria esses serviços, pelo que não teria direito à dedução do IVA pago a montante.

    16

    A Associação contestou as decisões da Administração Tributária, considerando que o seu estatuto associativo não afetava o seu direito à dedução do IVA pago a montante. Alegou que estava registada na Letónia como sujeito passivo de IVA e que, no âmbito dos projetos TIC e PME, tinha prestado serviços de formação como intermediária.

    17

    O Administratīvā rajona tiesa (Tribunal Administrativo de Primeira Instância, Letónia) deu provimento aos recursos de anulação dessas decisões. A Administração Tributária interpôs recurso das sentenças em causa no Administratīvā apgabaltiesa (Tribunal Administrativo Regional, Letónia), o órgão jurisdicional de reenvio, que procedeu à apensação de todos os processos que lhe foram submetidos relativos a essas sentenças.

    18

    Foi nestas condições que o Administratīvā apgabaltiesa (Tribunal Administrativo Regional) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

    «1)

    Deve o artigo 9.o, n.o 1, da Diretiva [2006/112], ser interpretado no sentido de que uma organização sem fins lucrativos cuja atividade tem por objeto a execução de programas de auxílio estatal financiados pelo [FEDER] deve ser considerada um sujeito passivo que exerce uma atividade económica?

    2)

    Deve o artigo 28.o da Diretiva [2006/112], ser interpretado no sentido de que uma associação que, na prática, não presta serviços de formação deve, não obstante, ser equiparada a um prestador de serviços quando os serviços foram adquiridos a outro operador económico para permitir a execução de um projeto de auxílio estatal financiado pelo [FEDER]?

    3)

    Quando o prestador do serviço recebe do destinatário do serviço apenas uma contraprestação parcial pelo serviço prestado (30 %) e o valor remanescente do serviço é liquidado sob a forma de pagamento do auxílio proveniente do [FEDER], a contraprestação tributável, em conformidade com o artigo 73.o da Diretiva [2006/112], é o montante total que o prestador do serviço recebe tanto do destinatário do serviço como de um terceiro sob a forma de pagamento do auxílio?»

    Quanto às questões prejudiciais

    19

    Importa observar que a primeira questão submetida pelo órgão jurisdicional de reenvio tem por objeto a interpretação do conceito de «atividade económica» que figura no artigo 9.o, n.o 1, da Diretiva 2006/112, ao passo que a segunda questão submetida por esse órgão jurisdicional diz respeito, em substância, ao conceito de «prestações de serviços efetuadas a título oneroso», na aceção do artigo 2.o, n.o 1, alínea c), desta diretiva, em conjugação com o artigo 28.o da referida diretiva.

    20

    Ora, uma atividade só pode ser qualificada de atividade económica na aceção do artigo 9.o, n.o 1, da Diretiva 2006/112 se corresponder a uma das operações a que se refere o artigo 2.o desta diretiva (Acórdão de 12 de maio de 2016, Gemeente Borsele et Staatssecretaris van Financiën, C‑520/14, EU:C:2016:334, n.o 21).

    21

    Por conseguinte, importa responder primeiro à segunda questão. A resposta a esta questão permitirá, em seguida, se for caso disso, responder à terceira questão, determinando se subvenções como as concedidas pela CFLA no caso em apreço, depois de o próprio FEDER ter pagado estas subvenções a esta última, entram no valor tributável de serviços como os prestados pela Associação no âmbito dos projetos TIC e PME. Por último, há que examinar, se for caso disso, a primeira questão.

    Quanto à segunda questão

    22

    No seu pedido de decisão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio qualifica as prestações de serviços faturadas pela Associação com base em duas características relativas ao seu contexto, a saber, o recurso por esta à subcontratação para a realização dessas prestações e a subvenção das referidas prestações pelo FEDER, através da CFLA.

    23

    Daqui resulta que, com esta questão, este órgão jurisdicional pergunta, em substância, se o artigo 2.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva 2006/112, em conjugação com o seu artigo 28.o, deve ser interpretado no sentido de que constituem prestações de serviços efetuadas a título oneroso as prestações de serviços de formação faturadas por uma associação sem fins lucrativos, subcontratadas maioritariamente a terceiros e que beneficiaram de subvenções provenientes de fundos europeus até 70 % do montante total dessas prestações.

    24

    Importa recordar que cabe ao órgão jurisdicional de reenvio, o único competente para apreciar os factos, determinar a natureza das operações em causa no processo principal (Acórdão de 30 de março de 2023, Gmina L., C‑616/21, EU:C:2023:280, n.o 22 e jurisprudência referida).

    25

    Incumbe, porém, ao Tribunal de Justiça fornecer a esse órgão jurisdicional todos os elementos de interpretação do direito da União que possam ser úteis para a decisão do processo que lhe foi submetido (Acórdão de 30 de março de 2023, Gmina L., C‑616/21, EU:C:2023:280, n.o 23 e jurisprudência referida).

    26

    A este respeito, resulta da jurisprudência que uma prestação de serviços só é efetuada «a título oneroso», na aceção do artigo 2.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva 2006/112 e, consequentemente, só é tributável se existir um nexo direto entre a prestação de serviços, por um lado, e a contrapartida realmente recebida pelo sujeito passivo, por outro. Tal nexo direto está demonstrado quando existe entre o autor da prestação de serviços, por um lado, e o seu beneficiário, por outro, uma relação jurídica no quadro da qual são realizadas prestações recíprocas, sendo a retribuição recebida pelo autor dessas operações o contravalor efetivo do serviço fornecido ao referido beneficiário (v., neste sentido, Acórdão de 30 de março de 2023, Gmina O., C‑612/21, EU:C:2023:279, n.o 25 e jurisprudência referida).

    27

    Para se poder considerar que esta operação foi efetuada «a título oneroso», na aceção da Diretiva 2006/112, não é necessário, como decorre também do artigo 73.o da referida diretiva, que a contrapartida da prestação de serviços seja obtida diretamente do destinatário desta, podendo também ser obtida de um terceiro (v., neste sentido, Acórdão de 30 de março de 2023, Gmina O., C‑612/21, EU:C:2023:279, n.o 26 e jurisprudência referida).

    28

    O facto de a operação em causa ser efetuada por um preço superior ou inferior ao preço de custo, e, por conseguinte, por um preço superior ou inferior ao preço normal do mercado, não é pertinente para a qualificação como operação «a título oneroso», não sendo essa circunstância suscetível de afetar o nexo direto entre a operação efetuada ou a efetuar e a contraprestação recebida ou a receber, cujo montante é determinado antecipadamente e segundo critérios bem definidos (v., neste sentido, Acórdão de 30 de março de 2023, Gmina O., C‑612/21, EU:C:2023:279, n.o 27 e jurisprudência referida).

    29

    No caso em apreço, resulta das indicações fornecidas pelo órgão jurisdicional de reenvio que a Associação organiza, prepara o material e supervisiona as formações destinadas aos profissionais da tecnologia da informação e da comunicação (projeto TIC) e às microempresas (projeto PME), mas que delega a execução dessas formações em subcontratantes.

    30

    No âmbito do projeto TIC, sob reserva de verificação pelo órgão jurisdicional de reenvio, parecem coexistir duas prestações de serviços. A primeira vincula o beneficiário da formação à Associação, junto da qual este beneficiário paga a totalidade do preço cobrado. Após a receção da subvenção pela CFLA, a Associação transfere o montante devido a cada beneficiário do serviço de formação, o que tem por efeito reduzir o preço inicialmente pago por esta à Associação. A segunda resulta do contrato celebrado entre a Associação e a empresa de formação, que é remunerada pelo serviço prestado.

    31

    Por conseguinte, é evidente que a Associação deve ser considerada o prestador dos serviços de formação ao beneficiário da formação. A este respeito, é indiferente que a Associação tenha optado por recorrer aos serviços de um subcontratante em vez de recrutar o seu próprio pessoal.

    32

    O artigo 28.o da Diretiva 2006/112, cuja redação exige que um sujeito passivo aja em seu nome mas por conta de outrem, não é, por isso, pertinente no âmbito de um projeto como o projeto TIC, pois, por um lado, a Associação agiu em seu nome e por sua conta ao faturar aos beneficiários da formação o custo desta última e, por outro, a empresa de formação agiu em nome e por conta de outrem, isto é, da Associação, ao prestar os serviços de formação em questão, que foram depois pagos por esta.

    33

    No âmbito do projeto PME, novamente sob reserva de verificação pelo órgão jurisdicional de reenvio, a situação parece ser ligeiramente diferente, uma vez que, como resulta do n.o 13 do presente acórdão, existe, tal como no caso do projeto TIC, um contrato entre a Associação e um subcontratante com vista à prestação do serviço de formação aos seus beneficiários, mas a relação com estes últimos é ela própria definida noutro contrato, tripartido, entre a Associação, a empresa de formação e cada beneficiário de formação. Este outro contrato estipula que este último suporta 30 % do custo do serviço, sendo o montante correspondente a esta percentagem faturado pela própria Associação. A subvenção da CFLA de 70 % do custo da prestação de serviços de formação, permite, por isso, que a Associação obtenha a totalidade desse custo.

    34

    Por conseguinte, sob reserva da verificação pelo órgão jurisdicional de reenvio da inexistência de um contrato de mandato entre a Associação e a empresa de formação, afigura‑se que, não obstante a diferença em relação ao projeto TIC relativa, nomeadamente, à existência de um contrato tripartido, foi também em seu nome e por sua conta que a Associação prestou, através de um subcontratante, os serviços de formação em questão, não sendo esses serviços prestados pelo subcontratante em seu nome e por conta própria. O artigo 28.o da Diretiva 2006/112 não é, por isso, aplicável à luz do pedido de decisão prejudicial.

    35

    No que respeita aos dois projetos, há que acrescentar, primeiro, que a circunstância de o financiamento das prestações de serviços de formação provir, ainda que em grande parte, de um organismo como a CFLA, que recebeu ela própria os montantes em causa do FEDER, não se opõe à qualificação dessas prestações como tendo sido efetuadas a título oneroso, como resulta expressamente da jurisprudência recordada no n.o 27 do presente acórdão, nos termos da qual a contrapartida da prestação de serviços pode ser obtida de um terceiro.

    36

    Segundo, a circunstância de as receitas constituídas, por um lado, pelo pagamento do auxílio do FEDER, através da CFLA, e, por outro, da remuneração paga pelos beneficiários dos serviços de formação cobrirem integralmente os custos da Associação, mas não lhe permitir obter lucro, em conformidade com o seu estatuto de associação sem fins lucrativos, também não é suscetível de impedir a qualificação das prestações de serviços em causa no processo principal como prestações efetuadas a título oneroso, como resulta expressamente da jurisprudência mencionada no n.o 28 do presente acórdão, segundo a qual uma operação, mesmo realizada a um preço inferior ao preço de custo, pode ser qualificada de operação efetuada a título oneroso.

    37

    Por conseguinte, há que responder à segunda questão que o artigo 2.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva 2006/112 deve ser interpretado no sentido de que constituem prestações de serviços efetuadas a título oneroso as prestações de serviços de formação faturadas por uma associação sem fins lucrativos, subcontratadas maioritariamente a terceiros e que beneficiaram de subvenções provenientes de fundos europeus até 70 % do montante total dessas prestações, sem que seja aplicável o artigo 28.o desta diretiva, quando não exista um contrato expresso de mandato que permita demonstrar a existência de uma prestação de serviços efetuada por um sujeito passivo em seu nome e por conta de outrem.

    Quanto à terceira questão

    38

    Com a sua terceira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se o artigo 73.o da Diretiva 2006/112 deve ser interpretado no sentido de que, quando o prestador de um serviço recebe do beneficiário desse serviço apenas uma contraprestação parcial por esse serviço, assumindo a contraprestação do valor remanescente do mesmo serviço a forma de um pagamento de um auxílio proveniente do FEDER, o valor tributável corresponde, contudo, ao montante total recebido pelo prestador do serviço.

    39

    Resulta tanto da jurisprudência referida no n.o 27 do presente acórdão como das considerações expostas no n.o 35 do mesmo que há que responder afirmativamente a esta questão. Por conseguinte, o artigo 73.o desta diretiva deve ser interpretado no sentido de que as subvenções pagas a um prestador de serviços por um fundo europeu para uma determinada prestação de serviços estão, em conformidade com esta disposição, incluídas no valor tributável, como pagamentos obtidos de um terceiro.

    Quanto à primeira questão

    40

    Com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se o artigo 9.o, n.o 1, da Diretiva 2006/112 deve ser interpretado no sentido de que uma associação sem fins lucrativos cuja atividade tem por objeto a execução de programas de auxílio estatal financiados pelo FEDER deve ser considerada um sujeito passivo que exerce uma atividade económica.

    41

    A este respeito, em primeiro lugar, importa recordar que, sob reserva da apreciação que deve ser feita pelo órgão jurisdicional de reenvio sobre os factos do processo principal, resulta da resposta à segunda questão que as prestações de serviços de formação em causa preenchem os critérios que permitem qualificá‑las de prestações de serviços efetuadas a título oneroso na aceção do artigo 2.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva 2006/112, pelo que está preenchida esta condição necessária, mas não suficiente, para demonstrar o exercício de uma atividade económica.

    42

    Em segundo lugar, a análise da redação do artigo 9.o, n.o 1, desta diretiva, ao mesmo tempo que põe em evidência o alcance do âmbito de aplicação do conceito de «atividade económica», especifica também o caráter objetivo desta, no sentido de que a atividade é considerada em si mesma, independentemente dos seus objetivos e dos seus resultados (Acórdãos de 30 de março de 2023, Gmina O., C‑612/21, EU:C:2023:279, n.o 33 e jurisprudência referida, e de 30 de março de 2023, Gmina L., C‑616/21, EU:C:2023:280, n.o 41 e jurisprudência referida).

    43

    Por conseguinte, o facto de, devido à sua forma societária, uma pessoa coletiva apenas a título complementar poder exercer uma atividade económica de tipo empresarial é irrelevante para a conclusão da existência de uma atividade económica destinada a obter receitas com caráter de permanência, o que constitui o critério da atividade económica, na aceção do artigo 9.o, n.o 1, da referida diretiva (v., neste sentido, Acórdão de 2 de junho de 2016, Lajvér, C‑263/15, EU:C:2016:392, n.o 35 e jurisprudência referida).

    44

    Assim, no processo principal, foi através de uma interpretação errada desta disposição que a Administração Tributária considerou que o simples facto de a recorrente no processo principal ser uma associação sem fins lucrativos a impedia de exercer uma atividade económica na aceção da referida disposição.

    45

    Em terceiro lugar, a circunstância de as formações em causa terem sido financiadas, numa parte substancial, por auxílios provenientes do FEDER não pode influenciar a natureza económica ou não da atividade desenvolvida pela Associação, uma vez que o conceito de «atividade económica», em virtude do seu caráter objetivo recordado no n.o 42 do presente acórdão, se aplica independentemente do modo de financiamento escolhido pelo operador em questão, mesmo quando se trate de subvenções públicas (Acórdão de 2 de junho de 2016, Lajvér, C‑263/15, EU:C:2016:392, n.o 38 e jurisprudência referida).

    46

    Em quarto lugar, tendo em conta a dificuldade em criar uma definição precisa de atividade económica, é necessário analisar todas as condições em que esta é realizada, procedendo‑se a uma apreciação casuística tendo por referência o que seria o comportamento tipo de um empresário ativo no domínio em causa (Acórdãos de 30 de março de 2023, Gmina O., C‑612/21, EU:C:2023:279, n.o 35 e jurisprudência referida, e de 30 de março de 2023, Gmina L., C‑616/21, EU:C:2023:280, n.o 43 e jurisprudência referida), isto é, no caso em apreço, uma empresa com atividade no domínio da organização e da prestação de serviços de formação.

    47

    A este respeito, é verdade que o facto de, ao fixar o preço das prestações de serviços de formação que fatura aos beneficiários desses serviços, a Associação procurar unicamente cobrir os seus custos de funcionamento para atingir o equilíbrio financeiro não parece corresponder ao comportamento típico de um empresário, seja ele quem for, que é o de procurar a rentabilidade da sua empresa.

    48

    No entanto, esta análise não corresponde ao texto do artigo 9.o, n.o 1, da Diretiva 2006/112 e também não é corroborada pelos elementos factuais que figuram na decisão de reenvio.

    49

    Antes de mais, resulta da redação desta disposição que se entende por sujeito passivo qualquer pessoa que exerça, de modo independente, uma atividade económica, seja qual for o fim ou o resultado dessa atividade. Daqui decorre que o objetivo da Associação de simplesmente equilibrar as suas contas, não basta para excluir a possibilidade de esta última exercer uma atividade económica. Pela mesma razão, uma empresa que procura obter lucros, mas cuja atividade se revela permanentemente deficitária, por exemplo, devido a um desempenho insuficiente, não deixa de ser um sujeito passivo se a análise de todas as condições em que essa atividade é exercida, recordada no n.o 46 do presente acórdão, levar a considerar a referida atividade como sendo de natureza económica.

    50

    Em seguida, a Associação atua como uma empresa que organiza e assegura formações quando executa os projetos de formação financiados pelo FEDER, através da CFLA. Em especial, procura projetos, clientes e formadores, cujos serviços adquire no âmbito de uma subcontratação. Os beneficiários dos serviços de formação pagam uma parte do preço, avaliam o seu nível de conhecimentos e recolhem os seus comentários sobre a formação, o que constitui um típico inquérito de qualidade.

    51

    Também não é contestado que a Associação dispõe de pessoal próprio para a organização dos seus projetos, além dos subcontratantes a que recorre. Quanto a este último aspeto, importa recordar que a subcontratação é bastante frequente na vida económica.

    52

    Daqui resulta que, externamente, a Associação parece ser um prestador de serviços de formação ou de organização desses serviços comparável a qualquer outro operador económico presente no mesmo mercado, com o qual está, por conseguinte, em concorrência.

    53

    Por último, ainda que o facto de uma grande parte do seu financiamento provenha de subvenções públicas, este parece introduzir uma incerteza quanto à viabilidade económica da Associação, importa sublinhar que estas subvenções e o seu montante previsível constituem elementos em que a Associação baseia o seu plano de trabalho e a sua procura de clientes.

    54

    Resulta de todas estas considerações que uma entidade sem fins lucrativos como a Associação deve ser considerada um sujeito passivo que exerce uma atividade económica na aceção do artigo 9.o, n.o 1, da Diretiva 2006/112, pelo que as prestações de serviços de formação que fatura são abrangidas pelo âmbito de aplicação desta disposição.

    55

    Não obstante, caberá ao órgão jurisdicional de reenvio verificar se tais prestações de serviços não são abrangidas pelo âmbito de aplicação da isenção prevista no artigo 132.o, n.o 1, alínea i), desta diretiva, relativa à «formação ou reciclagem profissional», uma vez que o Tribunal de Justiça não foi chamado a pronunciar‑se sobre esta questão e não dispõe de elementos nos autos que permitam decidi‑la.

    56

    Atendendo às considerações precedentes, há que responder à primeira questão que o artigo 9.o, n.o 1, da Diretiva 2006/112 deve ser interpretado no sentido de que o estatuto de associação sem fins lucrativos de uma associação não se opõe a que, no final de uma análise que tome em consideração todas as circunstâncias da atividade desta e, nomeadamente, o facto de esta atividade ser comparável ao comportamento típico de um operador económico do mesmo setor, se possa considerar que essa associação constitui um sujeito passivo que exerce uma atividade económica na aceção desta disposição.

    Quanto às despesas

    57

    Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

     

    Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Sétima Secção) declara:

     

    1)

    O artigo 2.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado,

    deve ser interpretado no sentido de que:

    constituem prestações de serviços efetuadas a título oneroso as prestações de serviços de formação faturadas por uma associação sem fins lucrativos, subcontratadas maioritariamente a terceiros e que beneficiaram de subvenções provenientes de fundos europeus até 70 % do montante total dessas prestações, sem que seja aplicável o artigo 28.o desta diretiva, quando não exista um contrato expresso de mandato que permita demonstrar a existência de uma prestação de serviços efetuada por um sujeito passivo em seu nome e por conta de outrem.

     

    2)

    O artigo 73.o da Diretiva 2006/112

    deve ser interpretado no sentido de que:

    as subvenções pagas a um prestador de serviços por um fundo europeu para uma determinada prestação de serviços estão, em conformidade com esta disposição, incluídas no valor tributável, como pagamentos obtidos de um terceiro.

     

    3)

    O artigo 9.o, n.o 1, da Diretiva 2006/112

    deve ser interpretado no sentido de que:

    o estatuto de associação sem fins lucrativos de uma associação não se opõe a que, no final de uma análise que tome em consideração todas as circunstâncias da atividade desta e, nomeadamente, o facto de esta atividade ser comparável ao comportamento típico de um operador económico do mesmo setor, se possa considerar que essa associação constitui um sujeito passivo que exerce uma atividade económica na aceção desta disposição.

     

    Assinaturas


    ( *1 ) Língua do processo: letão.

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