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Document 62020CJ0100

    Acórdão do Tribunal de Justiça (Quinta Secção) de 9 de setembro de 2021.
    XY contra Hauptzollamt B.
    Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Bundesfinanzhof.
    Reenvio prejudicial — Fiscalidade — Tributação dos produtos energéticos e da eletricidade — Diretiva 2003/96/CE — Artigo 17.o, n.o 1, alínea a) — Reduções de impostos sobre o consumo de produtos energéticos e da eletricidade a favor de empresas com utilização intensiva de energia — Redução facultativa — Modalidades de restituição de impostos cobrados em violação de disposições do direito nacional adotadas com base numa faculdade concedida aos Estados‑Membros nesta diretiva — Pagamento de juros — Princípio da igualdade de tratamento.
    Processo C-100/20.

    Court reports – general

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:2021:716

     ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção)

    9 de setembro de 2021 ( *1 )

    [Texto retificado por Despacho de 29 de setembro de 2021]

    «Reenvio prejudicial — Fiscalidade — Tributação dos produtos energéticos e da eletricidade — Diretiva 2003/96/CE — Artigo 17.o, n.o 1, alínea a) — Reduções de impostos sobre o consumo de produtos energéticos e da eletricidade a favor de empresas com utilização intensiva de energia — Redução facultativa — Modalidades de restituição de impostos cobrados em violação de disposições do direito nacional adotadas com base numa faculdade concedida aos Estados‑Membros nesta diretiva — Pagamento de juros — Princípio da igualdade de tratamento»

    No processo C‑100/20,

    que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Bundesfinanzhof (Tribunal Tributário Federal, Alemanha), por Decisão de 19 de novembro de 2019, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 26 de fevereiro de 2020, no processo

    XY

    contra

    Hauptzollamt B,

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção),

    composto por: E. Regan, presidente de secção, M. Ilešič, E. Juhász (relator), C. Lycourgos e I. Jarukaitis, juízes,

    advogado‑geral: M. Szpunar,

    secretário: A. Calot Escobar,

    vistos os autos,

    vistas as observações apresentadas:

    [Conforme retificado por Despacho de 29 de setembro de 2021] em representação de XY, por L. Jesse, Rechtsanwalt,

    em representação do Hauptzollamt B, por G. Rittenauer, na qualidade de agente,

    em representação do Governo alemão, por J. Möller e S. Heimerl, na qualidade de agentes,

    em representação da Comissão Europeia, por A. Armenia e R. Pethke, na qualidade de agentes,

    ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 12 de maio de 2021,

    profere o presente

    Acórdão

    1

    O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 17.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva 2003/96/CE do Conselho, de 27 de outubro de 2003, que reestrutura o quadro comunitário de tributação dos produtos energéticos e da eletricidade (JO 2003, L 283, p. 51).

    2

    Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe XY ao Hauptzollamt B (Serviço Aduaneiro Central B, Alemanha), a respeito da liquidação fiscal do imposto sobre o consumo de eletricidade de XY, em particular, sobre a existência de um direito desta última ao pagamento de juros de mora sobre o montante do imposto sobre a eletricidade que tinha indevidamente pago e que lhe foi assim reembolsado.

    Quadro jurídico

    Direito da União

    3

    Os considerandos 3 a 5 da Diretiva 2003/96 enunciam:

    «(3)

    O bom funcionamento do mercado interno e a realização dos objetivos das outras políticas comunitárias exigem a fixação de níveis mínimos de tributação a nível comunitário para a maioria dos produtos energéticos, incluindo a eletricidade, o gás natural e o carvão.

    (4)

    A existência de importantes diferenças entre os níveis nacionais de tributação da energia aplicados pelos Estados‑Membros poderá ser prejudicial ao bom funcionamento do mercado interno.

    (5)

    A fixação a níveis adequados das taxas mínimas comunitárias pode permitir reduzir as atuais diferenças entre os níveis nacionais de tributação.»

    4

    O artigo 1.o desta diretiva tem a seguinte redação:

    «Os Estados‑Membros devem tributar os produtos energéticos e a eletricidade de acordo com o disposto na presente diretiva.»

    5

    O artigo 5.o da referida diretiva prevê:

    «Desde que respeitem os níveis mínimos de tributação previstos na presente diretiva e sejam compatíveis com o direito [da União], podem ser aplicadas pelos Estados‑Membros, sob controlo fiscal, taxas de imposto diferenciadas, nos seguintes casos:

    se as taxas diferenciadas estiverem diretamente ligadas à qualidade do produto;

    se as taxas diferenciadas dependerem de níveis quantitativos de consumo de eletricidade e produtos energéticos utilizados para fins de aquecimento;

    para as seguintes utilizações: transportes públicos locais de passageiros (incluindo os táxis), recolha de lixo, forças armadas e administração pública, pessoas deficientes, ambulâncias;

    para distinguir entre utilização profissional e utilização não profissional, no caso dos produtos energéticos e da eletricidade referidos nos artigos 9.o e 10.o»

    6

    O artigo 17.o da mesma diretiva dispõe:

    «1.   Desde que sejam respeitados em média os níveis de tributação mínimos para cada empresa previstos na presente diretiva, os Estados‑Membros poderão aplicar reduções de impostos sobre o consumo de produtos energéticos utilizados para aquecimento ou para os fins previstos nas alíneas b) e c) do n.o 2 do artigo 8.o e sobre a eletricidade nos seguintes casos:

    a)

    A favor de empresas com utilização intensiva de energia.

    Entende‑se por “empresa com utilização intensiva de energia”, uma entidade empresarial, tal como referida no artigo 11.o, cujos custos de aquisição de produtos energéticos e eletricidade ascendam, no mínimo, a 3,0 % do valor da produção ou para a qual o imposto nacional a pagar sobre a energia ascenda, pelo menos, a 0,5 % do valor acrescentado. No âmbito desta definição, os Estados‑Membros poderão aplicar critérios mais restritivos, incluindo o valor das vendas, o processo de fabrico e o setor industrial.

    Entende‑se por “custos de aquisição de produtos energéticos e eletricidade”, o custo real da energia adquirida ou gerada na empresa. Só se incluem a eletricidade, o calor e os produtos energéticos utilizados para fins de aquecimento ou para os fins previstos nas alíneas b) e c) do n.o 2 do artigo 8.o Incluem‑se todos os impostos, com exceção do [imposto sobre o valor acrescentado (IVA)] dedutível.

    Entende‑se por “valor de produção”, o volume de negócios, incluindo os subsídios diretamente ligados ao preço do produto, corrigido da variação das existências de produtos acabados, dos trabalhos em curso e dos bens e serviços adquiridos para revenda, diminuído das aquisições de bens e serviços para revenda.

    Entende‑se por “valor acrescentado”, o total do volume de negócios sujeito a IVA, incluindo as exportações, diminuído do total das aquisições sujeitas a IVA, incluindo as importações.

    Os Estados‑Membros que atualmente aplicam sistemas nacionais de tributação da energia nos quais as empresas com utilização intensiva de energia são definidas de acordo com outros critérios que não o dos custos da energia em comparação com o valor da produção e o do imposto nacional a pagar sobre a energia em comparação com o valor acrescentado disporão de um período transitório até 1 de janeiro de 2007, o mais tardar, para se adaptarem à definição do primeiro parágrafo da presente alínea.

    b)

    Sempre que sejam celebrados acordos com empresas ou associações de empresas ou aplicados regimes de autorização negociáveis ou convénios equivalentes, desde que conducentes à realização de objetivos de proteção ambiental ou de aumento da eficiência energética.

    2.   Sem prejuízo do n.o 1 do artigo 4.o, os Estados‑Membros podem aplicar um nível de tributação que pode descer até zero aos produtos energéticos ou à eletricidade na aceção do artigo 2.o, quando utilizados por empresas com utilização intensiva de energia na aceção do n.o 1 do presente artigo;

    3.   Sem prejuízo do n.o 1 do artigo 4.o, os Estados‑Membros podem aplicar um nível de tributação que pode descer até 50 % dos níveis mínimos fixados na presente diretiva aos produtos energéticos e à eletricidade na aceção do artigo 2.o, quando utilizados por entidades empresariais definidas no artigo 11.o que não sejam empresas com utilização intensiva de energia na aceção do n.o 1 do presente artigo.

    4.   As empresas que beneficiem das possibilidades referidas nos n.os 2 e 3 devem ser partes nos acordos, regimes de autorização negociáveis ou convénios equivalentes referidos na alínea b) do n.o 1. Os acordos, regimes de autorização negociáveis ou convénios equivalentes devem permitir a realização dos objetivos ambientais ou uma melhor eficiência energética, grosso modo equivalentes ao que seria alcançado caso se tivessem respeitado as taxas mínimas comunitárias.»

    7

    Ao abrigo dos artigos 7.o, 15.o, 16.o e 19.o da Diretiva 2003/96, os Estados‑Membros podem igualmente aplicar isenções ou reduções do nível de tributação nos casos aí previstos.

    8

    O artigo 21.o, n.o 5, primeira frase, desta diretiva prevê:

    «Para efeitos dos artigos 5.o e 6.o da Diretiva 92/12/CEE [do Conselho, de 25 de fevereiro de 1992, relativa ao regime geral, à detenção, à circulação e aos controlos dos produtos sujeitos a impostos especiais de consumo (JO 1992, L 76, p. 1), conforme alterada pela Diretiva 2000/47/CE do Conselho, de 20 de julho de 2000 (JO 2000, L 193, p. 73)], a eletricidade e o gás natural estão sujeitos a tributação que será exigível no momento do fornecimento pelo distribuidor ou redistribuidor.»

    Direito alemão

    9

    A Stromsteuergesetz (Lei relativa ao Imposto sobre a Eletricidade), de 24 de março de 1999 (BGBl. 1999 I, p. 378, e BGB1. 2000 I, p. 147), conforme alterada pela Lei de 19 de dezembro de 2008 (BGBl. 2008 I, p. 2794) (a seguir «StromStG»), dispõe, no seu § 3, com a epígrafe «Taxa de imposto»:

    «O imposto é de 20,50 euros por megawatt/hora.»

    10

    O § 9 da StromStG, com a epígrafe «Isenções e reduções do imposto», prevê, no seu n.o 3:

    «A eletricidade, com exceção dos casos referidos no n.o 2, ponto 2, está sujeita a uma tarifa reduzida de 12,30 euros por megawatt/hora, se for consumida por empresas da indústria transformadora ou por empresas agrícolas e silvícolas, para fins comerciais, e se não estiver isenta por força do n.o 1.»

    Litígio no processo principal e questão prejudicial

    11

    XY é uma empresa da indústria transformadora que, em 2010, no âmbito das suas atividades, adquiriu eletricidade proveniente da rede de fornecimento a fim de proceder ao carregamento de baterias.

    12

    Na sua declaração relativa ao imposto sobre a eletricidade para o ano de 2010, XY declarou o volume de eletricidade adquirida a título do seu consumo próprio e optou pela aplicação do imposto à taxa reduzida previsto no § 9, n.o 3, da StromStG. No aviso de liquidação correspondente, o Serviço Aduaneiro Central B aplicou, no entanto, o imposto sobre a eletricidade à taxa normal, o que XY contestou.

    13

    Após se ter concluído, no âmbito de um processo judicial relativo ao ano de 2006, que o imposto à taxa reduzida previsto no § 9, n.o 3, da StromStG era aplicável, o Serviço Aduaneiro Central B reviu a sua decisão relativamente ao ano de 2010, considerando definitivamente que XY tinha o direito de pedir a aplicação deste imposto, e procedeu, em 27 de agosto de 2013, à retificação do aviso de liquidação de XY e ao reembolso do montante indevidamente pago por esta última a título do ano de 2010.

    14

    Em dezembro de 2014, XY pediu que o montante reembolsado a título do ano de 2010 fosse acrescido de juros de mora, o que o Serviço Aduaneiro Central B recusou.

    15

    O Finanzgericht (Tribunal Tributário, Alemanha) negou provimento ao recurso interposto por XY com vista a obter o pagamento desses juros de mora, com o fundamento de que XY não tinha direito aos mesmos nem ao abrigo do direito da União nem do direito alemão. Mais especificamente, segundo esse órgão jurisdicional, o direito da União não impõe que o montante reembolsado seja acrescido de juros de mora. Com efeito, por um lado, a aquisição de eletricidade para carregamento de baterias não está abrangida pelo âmbito de aplicação da Diretiva 2003/96. Por outro lado, e em todo o caso, a aplicação da redução do imposto em causa no processo principal é de natureza facultativa, pelo que o direito da União não exige o pagamento de juros de mora em caso de reembolso.

    16

    XY interpôs recurso de «Revision» desta decisão no Bundesfinanzhof (Tribunal Tributário Federal, Alemanha), o órgão jurisdicional de reenvio. Segundo XY, em conformidade com a jurisprudência do Tribunal de Justiça, há que pagar juros de mora em caso de reembolso de impostos cobrados em violação do direito da União, incluindo em caso de aplicação de reduções facultativas do imposto. Além disso, o carregamento de uma bateria constitui uma operação reversível abrangida pelo âmbito de aplicação da Diretiva 2003/96.

    17

    Contrariamente ao Finanzgericht (Tribunal Tributário), o Bundesfinanzhof (Tribunal Tributário Federal) considera que a atividade de XY está abrangida pelo âmbito de aplicação da Diretiva 2003/96 e interroga‑se unicamente sobre a questão de saber se o montante do imposto sobre a eletricidade indevidamente pago e reembolsado a esta deve ser acrescido de juros de mora.

    18

    Nestas condições, o Bundesfinanzhof (Tribunal Tributário Federal) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

    «O direito da União exige o pagamento de juros relativos ao direito ao reembolso do imposto sobre a eletricidade erradamente fixado, quando a fixação de um valor mais baixo do imposto sobre a eletricidade se baseou na redução facultativa do imposto prevista no artigo 17.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva 2003/96 e a fixação de um valor mais elevado se deveu exclusivamente a um erro na aplicação ao caso em apreço da disposição nacional que transpôs o artigo 17.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva 2003/96?»

    Quanto à questão prejudicial

    19

    A título preliminar, importa salientar que, por um lado, no âmbito das suas observações, o Governo alemão, sem invocar uma exceção de inadmissibilidade, considera, em substância, que, por força do artigo 21.o, n.o 5, da Diretiva 2003/96, a eletricidade fornecida para ser armazenada em baterias deve ser tributada ou ser igualmente tributada no momento da sua posterior distribuição a terceiros. Esta opinião diverge da premissa do órgão jurisdicional de reenvio, que considera que o fornecimento de eletricidade para ser armazenado em baterias é o único facto gerador do imposto em causa.

    20

    Estas observações não afetam a admissibilidade da questão submetida.

    21

    Com efeito, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, as questões relativas à interpretação do direito da União submetidas pelo juiz nacional no quadro regulamentar e factual que define sob a sua responsabilidade, e cuja exatidão não cabe ao Tribunal de Justiça verificar, gozam de uma presunção de pertinência. O Tribunal de Justiça só pode recusar pronunciar‑se sobre um pedido apresentado por um órgão jurisdicional nacional se for manifesto que a interpretação do direito da União solicitada não tem nenhuma relação com a realidade ou com o objeto do litígio no processo principal, quando o problema for hipotético ou ainda quando o Tribunal não dispuser dos elementos de facto e de direito necessários para dar uma resposta útil às questões que lhe são submetidas e para compreender as razões pelas quais o tribunal nacional considera ter necessidade das respostas a essas questões para decidir o litígio de que é chamado a conhecer (Acórdãos de 10 de dezembro de 2018, Wightman e o., C‑621/18, EU:C:2018:999, n.o 27, e de 12 de dezembro de 2019, Slovenské elektrárne, C‑376/18, EU:C:2019:1068, n.o 24 e jurisprudência referida).

    22

    Resulta da questão submetida que a mesma tem uma relação com a realidade e o objeto do litígio no processo principal, uma vez que este não tem por objeto a interpretação das disposições da Diretiva 2003/96, mas as condições de reembolso de um imposto cobrado com base na aplicação errada de uma regulamentação nacional que executa uma faculdade prevista por esta diretiva.

    23

    Por outro lado, o Governo alemão afirma que a questão submetida não deveria fazer referência ao artigo 17.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva 2003/96, mas ao seu artigo 5.o, quarto travessão.

    24

    A este respeito, como observou o advogado‑geral no n.o 56 das suas conclusões, há que salientar que tanto os benefícios fiscais para as empresas com utilização intensiva de energia, previstos no artigo 17.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva 2003/96, como a aplicação de taxas de imposto diferenciadas em função da utilização profissional ou não profissional da eletricidade, referida no artigo 5.o, quarto travessão, desta diretiva, são de caráter facultativo para os Estados‑Membros. Por conseguinte, a resolução da problemática jurídica invocada na questão submetida pode ser importante para o resultado do litígio no processo principal, independentemente da base jurídica com que o legislador alemão introduziu a aplicação diferenciada das taxas do imposto diferenciadas em causa.

    25

    Nestas condições, há que considerar que o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o direito da União exige que, em caso de reembolso do montante do imposto sobre a eletricidade indevidamente cobrado, devido à aplicação errada de uma disposição nacional, adotada com base numa faculdade concedida aos Estados‑Membros pela Diretiva 2003/96, esse montante seja acrescido de juros.

    26

    Importa recordar que resulta de jurisprudência constante que o direito de obter o reembolso dos impostos cobrados num Estado‑Membro em violação das normas do direito da União é a consequência e o complemento dos direitos conferidos aos particulares pelas disposições do direito da União tal como interpretadas pelo Tribunal de Justiça. Os Estados‑Membros são assim, em princípio, obrigados a reembolsar os impostos cobrados em violação do direito da União (Acórdãos de 19 de julho de 2012, Littlewoods Retail e o., C‑591/10, EU:C:2012:478, n.o 24 e jurisprudência referida, e de 23 de abril de 2020, Sole‑Mizo e Dalmandi Mezőgazdasági, C‑13/18 e C‑126/18, EU:C:2020:292, n.o 34 e jurisprudência referida).

    27

    Além disso, o Tribunal de Justiça declarou que, quando um Estado‑Membro tiver cobrado impostos em violação das normas do direito da União, os particulares têm direito ao reembolso não só do imposto indevidamente cobrado mas também dos montantes pagos a esse Estado ou por este retidos, diretamente relacionado com esse imposto. Isto inclui igualmente as perdas resultantes da indisponibilidade de quantias em numerário decorrentes da exigibilidade prematura do imposto. Resulta desta jurisprudência que o princípio da obrigação de os Estados‑Membros restituírem com juros os montantes dos impostos cobrados em violação do direito da União decorre deste último direito (Acórdãos de 19 de julho de 2012, Littlewoods Retail e o., C‑591/10, EU:C:2012:478, n.os 25, 26 e jurisprudência referida, e de 23 de abril de 2020, Sole‑Mizo e Dalmandi Mezőgazdasági, C‑13/18 e C‑126/18, EU:C:2020:292, n.os 35, 36 e jurisprudência referida).

    28

    Como salientou o advogado‑geral no n.o 74 das suas conclusões, importa precisar que a obrigação de o montante dos impostos cobrados em violação do direito da União ser acrescido de juros também se aplica quando essa violação resulte de uma infração aos princípios gerais deste direito.

    29

    Há que recordar que a Diretiva 2003/96 tem por objeto, como resulta dos seus considerandos 3 a 5 e do seu artigo 1.o, a fixação de um regime de tributação harmonizado dos produtos energéticos e da eletricidade (v., neste sentido, Acórdão de 3 de dezembro de 2020, Repsol Petróleo, C‑44/19, EU:C:2020:982, n.o 21).

    30

    No âmbito deste regime, o legislador da União conferiu aos Estados‑Membros, nomeadamente ao abrigo dos artigos 5.o, 7.o, 15.o a 17.o e 19.o desta diretiva, um conjunto de faculdades para introduzir taxas de imposto diferenciadas, isenções de tributação ou reduções dos impostos especiais sobre o consumo, as quais são parte integrante do regime de tributação harmonizado estabelecido pela referida diretiva.

    31

    A este título, segundo jurisprudência do Tribunal de Justiça, os Estados‑Membros têm a obrigação de exercer o poder discricionário de que dispõem por força desses artigos no respeito pelo direito da União e dos seus princípios gerais e, nomeadamente, no respeito pelo princípio da igualdade de tratamento (v., neste sentido, Acórdão de 30 de janeiro de 2020, Autoservizi Giordano, C‑513/18, EU:C:2020:59, n.o 35 e jurisprudência referida). Por outro lado, esta exigência visa tanto as medidas através das quais exerce esse poder discricionário como a aplicação das mesmas.

    32

    O princípio da igualdade de tratamento exige que situações comparáveis não sejam tratadas de maneira diferente e que situações diferentes não sejam tratadas de maneira igual, a menos que esse tratamento seja objetivamente justificado (Acórdão de 30 de janeiro de 2020, Autoservizi Giordano, C‑513/18, EU:C:2020:59, n.o 37 e jurisprudência referida).

    33

    A este respeito, há que observar que, do ponto de vista do montante do imposto indevidamente cobrado e da obrigação de reembolso correspondente, um operador económico sujeito a uma taxa reduzida do imposto sobre a eletricidade em aplicação de uma disposição do direito nacional que executa a faculdade prevista pela Diretiva 2003/96, cujo montante foi indevidamente cobrado, se encontra numa situação comparável à de um operador económico sujeito à taxa normal desse imposto em aplicação de uma disposição desta diretiva, cujo montante foi indevidamente cobrado.

    34

    Estas duas situações não devem ser tratadas de maneira diferente, o que implica, em caso de reembolso, a obrigação de o montante do imposto indevidamente cobrado ser acrescido de juros.

    35

    Com efeito, a comparação entre os operadores económicos deve ser feita consoante tenham ou não tido de suportar perdas resultantes da indisponibilidade de quantias em numerário decorrentes da exigibilidade errada do imposto, na aceção da jurisprudência referida no n.o 27 do presente acórdão, quer sejam abrangidos pela aplicação da taxa normal ou da taxa reduzida deste, na medida em que ambas as taxas se enquadram no mesmo regime harmonizado estabelecido pela Diretiva 2003/96.

    36

    Atendendo ao conjunto das considerações precedentes, há que responder à questão submetida que o direito da União exige que, em caso de reembolso do montante do imposto sobre a eletricidade indevidamente cobrado, devido à aplicação errada de uma disposição nacional adotada com base numa faculdade concedida aos Estados‑Membros pela Diretiva 2003/96, esse montante seja acrescido de juros.

    Quanto às despesas

    37

    Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

     

    Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Quinta Secção) declara:

     

    O direito da União deve ser interpretado no sentido de que exige que, em caso de reembolso do montante do imposto sobre a eletricidade indevidamente cobrado, devido à aplicação errada de uma disposição nacional adotada com base numa faculdade concedida aos Estados‑Membros pela Diretiva 2003/96/CE do Conselho, de 27 de outubro de 2003, que reestrutura o quadro comunitário de tributação dos produtos energéticos e da eletricidade, esse montante seja acrescido de juros.

     

    Assinaturas


    ( *1 ) Língua do processo: alemão.

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