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Document 61993TJ0021

Sentenza del Tribunale di primo grado (Terza Sezione) del 26 ottobre 1994.
N contro Commissione delle Comunità europee.
Dipendenti - Obblighi - Falsa dichiarazione - Sanzione disciplinare - Consiglio di disciplina - Retrocessione di grado - Motivazione - Proporzionalità.
Causa T-21/93.

Raccolta della Giurisprudenza – Pubblico impiego 1994 I-A-00223; II-00709

ECLI identifier: ECLI:EU:T:1994:256

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Terceira Secção)

26 de Outubro de 1994 ( *1 )

«Funcionários — Deveres — Falsas declarações — Sanção disciplinar — Conselho de disciplina — Retrogradação — Fundamentação — Proporcionalidade»

No processo T-21/93,

N, funcionário da Comissão das Comunidades Europeias, representado por Américo Thomati, advogado no foro de Lisboa, com domicílio escolhido no Luxemburgo na residência de José Mira Mendes, rue Marguerite de Brabant,

recorrente,

contra

Comissão das Comunidades Europeias, representada por Ana Maria Alves Vieira, membro do Serviço Jurídico, na qualidade de agente, com domicílio escolhido no Luxemburgo no gabinete de Georgios Kremlis, membro do Serviço Jurídico, Centre Wagner, Kirchberg,

recorrida,

que tem por objecto a anulação da decisão do director-geral do Pessoal e da Administração da Comissão de 27 de Novembro de 1992, que aplicou ao recorrente a sanção disciplinar da retrogradação,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTANCIA DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Terceira Secção),

composto por: R. García-Valdecasas, presidente, B. Vesterdorf e J. Biancarelli, juízes,

secretário: H. Jung

vistos os autos e após a audiência de 7 de Junho de 1994,

profere o presente

Acórdão

Matéria de facto na origem do litigio

1

O recorrente entrou ao serviço da Comissão e foi nomeado funcionário estagiário da Direcção-Geral XXI - União Aduaneira e Impostos Indirectos em 16 de Setembro de 1987. Em 1 de Novembro de 1988 foi nomeado funcionário titular, classificado no grau B 3, escalão 5.

2

Após ter solicitado e obtido, no final do mês de Outubro de 1987, alguns dias de licença, o recorrente deslocou-se a Portugal para aí tratar de um problema pessoal e urgente, relacionado com a sua alegada participação num delito de tráfico de estupefacientes.

3

Logo após a sua chegada a Lisboa, o recorrente foi consultar um médico. Este passou-lhe um atestado, com data de 1 de Novembro de 1987, confirmando que se encontrava doente e, por esse motivo, não podia apresentar-se ao serviço durante um período de tempo indeterminado. O atestado foi reconhecido por um notário português em 9 de Novembro de 1987 e, em seguida, remetido à Comissão pela esposa do recorrente.

4

Na tarde do dia 2 de Novembro de 1987, o recorrente apresentou-se à Polícia Judiciária, tendo sido detido em cumprimento de um mandado de captura emitido na mesma data pelo juiz do Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa. Em 3 de Novembro de 1987, o juiz ordenou a prisão preventiva do recorrente, que foi colocado cm situação de incomunicabilidade. A decisão continha a seguinte anotação:

«... proceda a secção de investigação às diligências mais urgentes de modo a apurar-se a intervenção dolosa do arguido nos factos destes autos ou outros a eles conducentes, devendo ser prestada no prazo acima referido informação sobre a situação prisional de incomunicabilidade do arguido, atendendo a que o mesmo se encontra colocado em organismo da CEE e a prorrogação da situação actual do mesmo sem absoluta necessidade pode vir a causar prejuízos irreparáveis».

5

No Tribunal de Instrução Criminal, o recorrente não foi representado por advogado, mas sim por um funcionário daquele órgão jurisdicional, nomeado seu defensor oficioso.

6

Resulta das peças do processo que a situação de incomunicabilidade terminou em 20 de Novembro de 1987. Prolongando-se a ausência do recorrente, a Comissão enviou para a sua residência em Sacavém (Portugal), em 18 de Dezembro, um telegrama solicitando a apresentação daquele a uma visita médica de controlo em Lisboa, em 21 de Dezembro. O recorrente, que se encontrava ainda em situação de prisão preventiva, não compareceu a essa visita.

7

Em 12 de Janeiro de 1988, o advogado do recorrente requereu ao Tribunal de Instrução Criminal que informasse a Comissão de que o seu constituinte se encontrava em situação de prisão preventiva. Esta informação foi transmitida ao Gabinete de Imprensa e Informação da Comissão em Lisboa a 22 de Janeiro de 1988.

8

Por decisão de 24 de Fevereiro de 1988 da entidade competente para proceder a nomeações (a seguir «AIPN»), o recorrente foi suspenso das suas funções, nos termos do disposto no artigo 88.o do Estatuto dos Funcionarios das Comunidades Europeias (a seguir «Estatuto»). Em 26 de Março de 1988, o recorrente foi restituído à liberdade, com a obrigação de se apresentar na representação diplomática de Portugal existente no seu local de trabalho no primeiro dia útil de cada mês, durante seis meses. Por decisão de 8 de Abril de 1988, a AIPN pôs fim à suspensão do recorrente, com efeitos a partir de 5 de Abril do mesmo ano.

9

Em 14 de Maio de 1990, o recorrente foi condenado pelo Tribunal Criminal de Lisboa na pena de quatro meses de prisão e na multa de 100000 ESC por ter participado com «negligência inconsciente» num crime de tráfico de estupefacientes. Por já ter cumprido a pena de prisão que lhe foi aplicada, foi mandado em liberdade. Não interpôs recurso da sentença.

10

Em 30 de Março de 1992, a AIPN decidiu instaurar um processo disciplinar contra o recorrente, acusando-o de haver prestado falsas declarações ao justificar, através de um atestado médico, a sua ausência do serviço por razões de saúde, quando, na realidade, se encontrava detido por decisão do juiz do Tribunal de Instrução Criminal.

11

Em 2 de Outubro de 1992, o conselho de disciplina emitiu o seu parecer fundamentado, propondo que ao recorrente fosse aplicada a sanção disciplinar de repreensão, prevista no artigo 86.o, n.o 2, alínea b), do Estatuto. Considerou que não estava provado que o atestado médico tivesse sido enviado à Comissão após a prisão do recorrente, não sendo assim possível imputar-lhe falsas declarações. No entender do conselho de disciplina, contudo, teria violado as obrigações estatutárias, em particular as que lhe são impostas pelo artigo 59.o, n.o 1, segundo parágrafo, do Estatuto, ao não ter informado a instituição dos motivos da sua ausência entre 18 de Dezembro de 1987 e 22 de Janeiro de 1988.

12

Por decisão de 27 de Novembro de 1992 (a seguir «decisão impugnada»), a AIPN considerou que o comportamento do recorrente constituía incumprimento grave dos deveres estatutários e aplicou-lhe a sanção disciplinar de retrogradação do grau B 3, escalão 5, ao grau B 4, escalão 5, com efeitos a partir de 1 de Dezembro de 1992. Na sua decisão, a AIPN considerou que, no momento em que foi preparada a comunicação à Comissão do atestado médico, o recorrente devia estar consciente de que a sua ausência eventual do serviço, após a licença que lhe fora concedida, não seria devida a questões de saúde e que aquele se absteve deliberadamente de comunicar à instituição as verdadeiras razões da sua ausência. Mais considerou a AIPN que, no final do período de incomunicabilidade a que esteve submetido, o recorrente deveria ter informado a Comissão de que o atestado médico não correspondia à verdade ou, pelo menos, certificar-se que a polícia havia efectivamente comunicado à Comissão a sua detenção. Ora, como salienta a AIPN, não obstante o recorrente ter tomado conhecimento, em 18 de Dezembro de 1987, de que a Comissão não havia sido informada pelas autoridades portuguesas da sua detenção, só veio a reagir em 12 de Janeiro seguinte, deixando assim, conscientemente, a Comissão na convicção de que a sua ausência seria devida a motivos de saúde. A AIPN observou ainda que o recorrente assinou e nunca contestou a decisão de suspensão de 24 de Fevereiro de 1988, que o acusava já de ter querido esconder que a sua ausência não era devida a razões de saúde. Segundo a AIPN, tal facto - que não foi tomado em consideração pelo conselho de disciplina no seu parecer fundamentado - tem como consequência que a violação pelo recorrente do dever de informar a instituição não pode ser limitada ao período que vai de 18 de Dezembro de 1987 a 12 de Janeiro de 1988.

13

O recorrente apresentou uma reclamação contra a decisão impugnada, nos termos do artigo 91.o, n.o 2, do Estatuto. Esta reclamação deu entrada no Secretariado-Geral da Comissão em 24 de Fevereiro de 1993. Dado que a AIPN não adoptou uma decisão expressa em resposta a tal reclamação, considera-se ter sido tacitamente indeferida em 24 de Junho de 1993.

Tramitação processual e pedidos das partes

14

Foi nestas circunstâncias que o recorrente, por petição entrada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 1 de Março de 1993, interpôs um recurso que tem por objecto a anulação da decisão impugnada.

15

Por requerimento separado, que deu entrada no mesmo dia, o recorrente apresentou também, nos termos do artigo 91.o, n.o 4, do Estatuto, um pedido de medidas provisórias em que solicitava a suspensão da execução da referida decisão.

16

Por despacho de 5 de Abril de 1993, o presidente do Tribunal de Primeira Instância ordenou a suspensão da decisão impugnada, até que seja proferida a decisão final do Tribunal, reservando para esse momento a decisão quanto às despesas.

17

Com base no relatório preliminar do juiz-relator, o Tribunal de Primeira Instância (Terceira Secção) decidiu iniciar a fase oral do processo sem instrução. Porém, convidou a recorrida a apresentar o original do atestado médico de 1 de Novembro de 1987 e a responder a determinadas questões escritas. Foram ouvidas as alegações das partes e as suas respostas às questões colocadas pelo Tribunal na audiência de 7 de Julho de 1994.

18

O recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

anular a decisão da recorrida de 27 de Novembro de 1992, que lhe aplicou a sanção disciplinar de retrogradação.

19

A recorrida conclui pedindo que o Tribunal se digne:

julgar o recurso improcedente;

decidir quanto às despesas de acordo com o artigo 88.o do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância.

Quanto ao merito

20

No essencial, o recorrente invoca quatro fundamentos assentes, respectivamente, na violação do dever de fundamentação, em erro de facto, em erro de direito e, por último, na violação do princípio da proporcionalidade.

21

O Tribunal de Primeira Instância considera útil analisar conjuntamente, desde logo, os fundamentos assentes em erro de facto e erro de direito.

Quanto aos fundamentos assentes em erro defacto e erro de direito

Resumo da argumentação das partes

22

Afirma o recorrente que, ao contrário do que concluiu a Comissão, não foi provada a existência de falsas declarações. A recorrida não demonstrou qualquer premeditação por sua parte, nem apresentou qualquer prova de que o recorrente ocultou deliberadamente à Comissão as razões efectivas da sua ausência.

23

Afirma o recorrente que, durante o processo disciplinar, ficou provado que esteve efectivamente impossibilitado de informar a Comissão de que a doença atestada pelo médico não era o único motivo da sua ausência. O recorrente alega, por um lado, que nem no dia da sua detenção, em 2 de Novembro de 1987, nem no dia da sua comparência perante o juiz do Tribunal de Instrução Criminal, em 3 de Novembro de 1987, onde o seu «defensor» foi um funcionário do referido órgão jurisdicional nomeado seu defensor oficioso, não foi assistido por advogado que pudesse providenciar para que as razões da sua ausência fossem comunicadas à Comissão e, por outro, que as autoridades portuguesas, contra o que indicara o juiz de instrução, não informaram a Comissão sobre a situação de prisão preventiva em que se encontrava. O recorrente esclarece ter presumido que a Comissão tinha tido conhecimento da sua situação, e que só em 18 de Dezembro de 1987 tomou conhecimento de que a Comissão não fora informada das razões da sua ausência. Afirma que, logo que tomou conhecimento desta falta de informação, tentou, através do seu advogado, que as autoridades portuguesas informassem a Comissão. Acrescenta que, se actuou com alguma lentidão e não cumpriu o seu dever de informação entre 18 de Dezembro de 1987 e 12 de Janeiro de 1988, tal comportamento é desculpável da parte de uma pessoa detida e explica-se por razões normais de ordem psicológica.

24

A esse respeito, o recorrente afirma que a Comissão cometeu um erro de direito ao considerar, na decisão impugnada, que, mesmo que tivesse sido ordenado às autoridades portuguesas que informassem a Comissão acerca da sua situação, nem por isso esse facto o desculpa, uma vez que não verificou pessoalmente se essa informação foi efectivamente comunicada à Comissão.

25

Além disso, o recorrente salienta que no processo disciplinar não ficou provado que, no momento em que partiu para Lisboa, soubesse que iria ser alvo de um processo judicial por tráfico de estupefacientes ou por qualquer outro motivo. Além disso, não foi contestado que o recorrente se sentia efectivamente doente quando se dirigiu ao médico à sua chegada, e não foi posta em causa a veracidade do atestado médico que lhe foi passado.

26

Por último, o recorrente alega que a Comissão, na sua decisão, considerou erradamente como circunstância relevante o facto de o recorrente não ter apresentado reclamação contra a decisão de 24 de Fevereiro de 1988, já referida, que o suspendeu e que, por isso, deu o seu assentimento às razões em que se baseava a decisão de suspensão. Carecendo este argumento de apoio factual, na medida em que o prazo para apresentação da reclamação não tinha ainda terminado no momento em que a Comissão decidiu levantar a suspensão, a decisão enferma parcialmente de falta de fundamentação.

27

A recorrida considera que a qualificação jurídica que o conselho de disciplina fez da matéria de facto que deu como provada — inexistência de falsas declarações — não corresponde à realidade dos factos.

28

A este respeito, a Comissão alega que uma das razões que levaram o conselho de disciplina a considerar não ter havido falsas declarações foi a impossibilidade de apurar se o atestado médico com data de 1 de Novembro de 1987 tinha sido enviado à Comissão após a detenção do recorrente. Ora, a assinatura do médico que passou o atestado foi reconhecida pelo notário em 9 de Novembro de 1987, ou seja, antes do seu envio à Comissão, mas após a prisão preventiva do recorrente.

29

No que toca aos obstáculos que impediram o recorrente de comunicar com o exterior, a Comissão distingue três fases do período de detenção que, em seu critério, vão aumentando a gravidade do incumprimento do dever de informação. A primeira fase vai de 3 a 20 de Novembro de 1987. Durante este período de incomunicabilidade, a Comissão entende que o recorrente teve possibilidade de lhe comunicar as verdadeiras razões da sua ausência através do seu defensor, mesmo sendo este um funcionário do tribunal. Efectivamente, nos termos do artigo 32.o, n.o 3, da Constituição Portuguesa, a incomunicabilidade não é oponível ao defensor do arguido. A segunda fase vai de 20 de Novembro a 18 de Dezembro de 1987. No critério da Comissão, quase três semanas após a passagem do atestado médico, não podia o recorrente ignorar que o atestado não correspondia à sua situação real. A sua pretensa convicção de que a Polícia Judiciária informara a Comissão, nos termos do despacho de 3 de Novembro de 1987, não desculpa o seu incumprimento dos deveres estatutários. Daqui resulta que, durante tal período, a omissão do dever de informar adquiriu carácter mais sério e grave. Durante a terceira fase, que vai de 18 de Dezembro de 1987 a 12 de Janeiro de 1988, a omissão do dever de informação, no entender da Comissão, revestiu particular gravidade. Efectivamente, a partir de 18 de Dezembro o recorrente soube que a Comissão não fora informada de que ele se encontrava preso, uma vez que esta o convocou para uma visita médica em Lisboa, em 21 de Dezembro de 1987. A falta de reacção imediata do recorrente, no sentido de prestar à sua entidade patronal todos os esclarecimentos necessários para que ficasse informada da sua prisão, evidenciou um propósito deliberado de esconder as verdadeiras razões da sua ausência, até que o seu advogado apresentou, em 12 de Janeiro de 1988, um requerimento para que a Polícia Judiciária informasse a Comissão da sua situação. Durante esse lapso de tempo, o recorrente dispôs de todos os meios úteis - carta, solicitação a um familiar ou outro meio - para informar ele próprio a Comissão, não sendo necessário o recurso a advogado.

30

A Comissão, afirma, além disso, que o argumento de que o recorrente confiou em que a Polícia Judiciária tivesse informado a Comissão das razões da sua ausência, carece de fundamento. Em seu entender, o recorrente estava sujeito a obrigações estatutárias, mais precisamente às obrigações de informação e de lealdade, que apenas impendem sobre ele. No critério da Comissão, o recorrente deveria dar cumprimento a essas obrigações mesmo que a Polícia Judiciária tivesse, de facto, informado a Comissão.

31

Por último, a Comissão concorda que, na decisão impugnada, não devia ter feito referência à falta de reclamação contra a decisão que suspendeu o recorrente, uma vez que não tinha ainda terminado o prazo para o efeito. Contudo, mesmo sem se ser com base nesta circunstância, ficou demonstrado que o recorrente faltou gravemente ao cumprimento dos seus deveres estatutários.

32

Baseada nesses argumentos, a Comissão conclui que o recorrente induziu conscientemente a sua entidade patronal em erro quanto à verdadeira razão da sua incapacidade para o trabalho. A sua omissão ao dever de fornecer informações correctas quanto à sua ausência justifica que se equipare essa falta disciplinar a falsas declarações por omisssão.

Apreciação do Tribunal de Primeira Instância

33

O Tribunal de Primeira Instância verifica, por um lado, que o conselho de disciplina baseou o seu parecer, entre outras, nas seguintes considerações: N foi detido e colocado em situação de incomunicabilidade em 2 de Novembro de 1987, pelo que não pôde comunicar com o exterior; admitiu ter recebido uma convocatória para uma visita médica de controlo em 18 de Dezembro de 1987, apercebendo-se assim de que a Comissão não tinha sido informada da sua situação; devia ter informado a Comissão da sua situação desde o início; não deu explicação satisfatória para o facto de não ter informado a Comissão entre 18 de Dezembro de 1987 e 12 de Janeiro de 1988. O Tribunal de Primeira Instância verifica, por outro lado, que desta última consideração resulta que o conselho de disciplina aceitou a explicação fornecida por N quanto à sua impossibilidade ou omissão de informação da Comissão durante o período que vai de 2 de Novembro de 1987 a 18 de Dezembro de 1987. A este respeito, deve ainda salientar-se que, perante o conselho de disciplina, o recorrente referiu que «pensava que a polícia informaria a sua entidade patronal da sua situação, em conformidade com a obrigação imposta pela legislação portuguesa».

34

A AIPN, na decisão impugnada considerou, designadamente, que «o facto, por ele (o recorrente) alegado, de pensar que a polícia portuguesa tinha informado a Comissão da sua situação não é, em si mesmo, susceptível de desculpar a falta de reacção da sua parte a partir do momento em que teve oportunidade de avisar a instituição...».

35

Além disso, resulta da decisão impugnada que a AIPN entendia que o recorrente podia comunicar à instituição as razões da sua ausência, através do seu defensor, desde o início da detenção.

36

Nestas circunstâncias, compete ao Tribunal de Primeira Instância, num primeiro momento, analisar se está correcta a apreciação da matéria de facto efectuada pela Comissão e, num segundo momento, analisar se assiste fundamento jurídico à Comissão para afirmar que, mesmo nas circunstâncias do presente caso, o recorrente estava obrigado pelo Estatuto a informar, ele próprio e pessoalmente, a Comissão quanto às razões da sua ausência.

37

No que respeita à matéria de facto, resulta desde logo, tanto dos articulados como das explicações fornecidas pelo recorrente ao conselho de disciplina, que o mesmo alega ter pensado que a polícia portuguesa informara a Comissão da sua situação após a sua detenção em 2 de Novembro de 1987, até ao momento em que, em 18 de Dezembro de 1987, recebeu a convocatória da Comissão para se apresentar a uma visita médica de controlo.

38

O Tribunal de Primeira Instância considera que esta explicação do recorrente é plausível. Efectivamente, é confirmada pela decisão de 3 de Novembro de 1987 do juiz do Tribunal de Instrução Criminal, que determina «...devendo ser prestada no prazo acima referido (oito dias) informação sobre a situação prisional de incomunicabilidade do arguido, atendendo a que o mesmo se encontra colocado em organismo da CEE...». Nestas circunstâncias, o Tribunal de Primeira Instância entende que o recorrente podia legitimamente e de boa fé confiar que a sua entidade patronal iria ser informada pelas autoridades portuguesas da sua situação.

39

Estas constatações em nada são prejudicadas pelo facto de a esposa do recorrente ter enviado à Comissão o atestado médico, após ter sido reconhecido por notário em 9 de Novembro de 1987, na medida em que, como a Comissão expressamente o reconheceu na audiência, não alegou que o recorrente não estivesse doente, nem que o atestado médico fosse, por isso, inexacto.

40

Por último, o Tribunal de Primeira Instância verifica, tal como a própria Comissão o admitiu na fase escrita do processo e na audiência, que a instituição não podia validamente referir-se na decisão impugnada à falta de reclamação contra a decisão que suspendeu o recorrente, para daí extrair um elemento de acusação contra este.

41

Face ao que atrás foi dito, o Tribunal de Primeira Instância considera que a Comissão não demonstrou que o recorrente agiu voluntária e premeditadamente, como a AIPN alega na decisão impugnada.

42

Sendo assim, a decisão impugnada está viciada por erro de facto.

43

No que respeita, seguidamente, à afirmação da Comissão de que, em qualquer caso, o recorrente era obrigado pelo Estatuto a informar, ele próprio ou por intermédio do seu defensor, a instituição quanto à sua situação, o Tribunal de Primeira Instância considera que, embora o Estatuto, no artigo 59.o, n.o 1, segundo parágrafo, disponha que «o interessado deve informar, no mais curto prazo possível, a sua instituição da sua impossibilidade de comparencia ao serviço, indicando o lugar em que se encontre...», daí não decorre que, em todas as situações, o interessado seja obrigado a informar ele próprio a instituição, ou por intermédio de mandatário por ele constituído para esse fim. Efectivamente, a própria redacção do artigo 59.o do Estatuto, tal como a sua ratio legis, não permitem que seja interpretado no sentido de que, mesmo que o interessado tenha boas razões para pensar que a sua instituição será informada por outro meio seguro e fidedigno, como no caso vertente pelas autoridades portuguesas, tenha de comunicar ele próprio a informação à sua instituição. É esse o caso no presente processo, tanto mais que o recorrente se encontrava sob prisão, durante uma parte da qual em situação de incomunicabilidade, ou seja, numa situação em que se não provou que o recorrente tivesse possibilidade de comunicar com o exterior. Uma vez que o recorrente podia legitimamente confiar que a polícia portuguesa informaria a Comissão, não faltou ao cumprimento de um dever estatutário durante o período em causa, que terminou em 18 de Dezembro de 1987, contrariamente ao que refere a decisão recorrida.

44

Daqui decorre que a decisão impugnada está também viciada por um erro de direito.

45

Dado que a decisão impugnada está viciada por um erro de facto e por um erro de direito, respeitando ambos a um aspecto essencial da decisão impugnada, ou seja aquele em que a decisão da AIPN se afasta em especial do parecer emitido pelo conselho de disciplina, deve a decisão ser anulada, sem que seja necessário decidir quanto aos outros fundamentos apresentados pelo recorrente.

Quanto às despesas

46

Nos termos do artigo 87.o, n.o 2, do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. No presente processo, a recorrida foi vencida. Porém, o recorrente nada requereu quanto às despesas. Nestas condições, decide-se que cada uma das partes suporte as suas próprias despesas, incluindo as relativas ao processo de medidas provisórias.

 

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTANCIA (Terceira Secção)

decide:

 

1)

E anulada a decisão da Comissão de 27 de Novembro de 1992.

 

2)

Cada uma das partes suportará as suas próprias despesas, incluindo as relativas ao processo de medidas provisórias.

 

García-Valdecasas

Vesterdorf

Biancarelli

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 26 de Outubro de 1994.

O secretário

H. Jung

O presidente

R. García-Valdecasas


( *1 ) Língua do processo: português.

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