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Document 62024CC0387

Conclusões do advogado-geral Rantos apresentadas em 5 de setembro de 2024.


Court reports – general

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2024:703

 CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

ATHANASIOS RANTOS

apresentadas em 5 de setembro de 2024 ( 1 )

Processo C‑387/24 PPU [Bouskoura] ( i )

C

contra

Staatssecretaris van Justitie en Veiligheid

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Rechtbank Den Haag, zittingsplaats Roermond (Tribunal de Primeira Instância de Haia, lugar da audiência Roermond, Países Baixos)]

«Reenvio prejudicial — Tramitação prejudicial urgente — Espaço de liberdade, segurança e justiça — Diretiva 2008/115/CE — Normas e procedimentos comuns nos Estados‑Membros para o regresso de nacionais de países terceiros — Artigo 15.o, n.o 2, alínea b) — Detenção de um nacional de um país terceiro em situação irregular para efeitos de afastamento — Diretiva 2013/33/UE — Normas em matéria de acolhimento de requerentes de proteção internacional — Artigo 9.o — Garantias dos requerentes detidos — Regulamento (UE) n.o 604/2013 — Determinação do Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de proteção internacional apresentado num dos Estados‑Membros por um nacional de um país terceiro — Artigo 28.o, n.o 4 — Retenção para efeitos de transferência — Retenção ilegal — Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia — Artigo 6.o — Direito à liberdade e à segurança — Artigo 47.o — Direito à ação e a um tribunal imparcial»

I. Introdução

1.

O presente pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 15.o, n.o 2, da Diretiva 2008/115/CE ( 2 ), do artigo 9.o, n.o 3, segundo parágrafo, da Diretiva 2013/33/UE ( 3 ) e do artigo 28.o, n.o 4, do Regulamento n.o 604/2013 ( 4 ) (a seguir «disposições relevantes»), conjugados com os artigos 6.o e 47.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta»).

2.

Estas disposições relevantes do direito derivado da União — relacionadas com o título V da parte III do TFUE, relativo ao espaço de liberdade, segurança e justiça — concretizam, neste domínio do direito, o princípio segundo o qual o nacional de um país terceiro detido deve ser libertado imediatamente quando se verifique que os requisitos de uma detenção legal não estão ou deixaram de estar reunidos ( 5 ).

3.

O pedido de decisão prejudicial foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe C, um nacional de país terceiro sujeito a um procedimento de regresso, ao Staatssecretaris van Justitie en Veiligheid (Secretário de Estado da Justiça e da Segurança, Países Baixos, a seguir «Secretário de Estado») a respeito da legalidade de uma detenção ininterrupta com base em duas medidas de detenção consecutivas adotadas por esta autoridade.

4.

Mais concretamente, o Rechtbank Den Haag, zittingsplaats Roermond (Tribunal de Primeira Instância de Haia, lugar da audiência Roermond, Países Baixos), o órgão jurisdicional de reenvio, pergunta se, à luz das disposições relevantes, um vício que afeta a legalidade da primeira detenção, a saber, o facto de o prazo estabelecido no direito nacional para a adoção da segunda medida de detenção ter sido ultrapassado, deve conduzir à libertação imediata da pessoa em causa, apesar de, no momento em que é efetuada a fiscalização jurisdicional, ser facto assente que os requisitos que justificavam a segunda medida estavam preenchidos.

II. Quadro jurídico

A.   Direito da União

1. Diretiva Regresso

5.

Os considerandos 16 e 17 da Diretiva Regresso enunciam:

«(16)

O recurso à detenção para efeitos de afastamento deverá ser limitado e sujeito ao princípio da proporcionalidade no que respeita aos meios utilizados e aos objetivos perseguidos. A detenção só se justifica para preparar o regresso ou para o processo de afastamento e se não for suficiente a aplicação de medidas coercivas menos severas.

(17)

Os nacionais de países terceiros detidos deverão ser tratados de forma humana e digna, no respeito pelos seus direitos fundamentais e nos termos do direito internacional e do direito nacional. Sem prejuízo da detenção inicial […], a detenção deverá, por norma, ser executada em centros de detenção especializados.»

6.

Nos termos do artigo 15.o desta diretiva, sob a epígrafe «Detenção»:

«1.   A menos que no caso concreto possam ser aplicadas com eficácia outras medidas suficientes mas menos coercivas, os Estados‑Membros só podem manter detidos nacionais de países terceiros objeto de procedimento de regresso, a fim de preparar o regresso e/ou efetuar o processo de afastamento, nomeadamente quando:

a)

Houver risco de fuga; ou

b)

O nacional de país terceiro em causa evitar ou entravar a preparação do regresso ou o procedimento de afastamento.

A detenção tem a menor duração que for possível, sendo apenas mantida enquanto o procedimento de afastamento estiver pendente e for executado com a devida diligência.

2.   A detenção é ordenada por autoridades administrativas ou judiciais.

A detenção é ordenada por escrito com menção das razões de facto e de direito.

Quando a detenção tiver sido ordenada por autoridades administrativas, os Estados‑Membros:

a)

Preveem o controlo jurisdicional célere da legalidade da detenção, a decidir o mais rapidamente possível a contar do início da detenção; ou

b)

Concedem ao nacional de país terceiro em causa o direito de intentar uma ação através da qual a legalidade da sua detenção seja objeto de controlo jurisdicional célere, a decidir o mais rapidamente possível a contar da instauração da ação em causa. Neste caso, os Estados‑Membros informam imediatamente o nacional de país terceiro em causa sobre a possibilidade de intentar tal ação.

O nacional de país terceiro em causa é libertado imediatamente se a detenção for ilegal.

3.   Em [cada] caso, a detenção é objeto de reapreciação a intervalos razoáveis, quer a pedido do nacional de país terceiro em causa, quer oficiosamente. No caso de períodos de detenção prolongados, as reapreciações são objeto de fiscalização pelas autoridades judiciais.

4.   Quando, por razões de natureza jurídica ou outra ou por terem deixado de se verificar as condições enunciadas no n.o 1, se afigure já não existir uma perspetiva razoável de afastamento, a detenção deixa de se justificar e a pessoa em causa é libertada imediatamente.

5.   A detenção mantém‑se enquanto se verificarem as condições enunciadas no n.o 1 e na medida do necessário para garantir a execução da operação de afastamento. Cada Estado‑Membro fixa um prazo limitado de detenção, que não pode exceder os seis meses.

6.   Os Estados‑Membros não podem prorrogar o prazo a que se refere o n.o 5, exceto por um prazo limitado que não exceda os doze meses seguintes, de acordo com a lei nacional, nos casos em que, independentemente de todos os esforços razoáveis que tenham envidado, se preveja que a operação de afastamento dure mais tempo, por força de:

a)

Falta de cooperação do nacional de país terceiro em causa; ou

b)

Atrasos na obtenção da documentação necessária junto de países terceiros.»

2. Diretiva Acolhimento

7.

O artigo 2.o, alínea h), da Diretiva Acolhimento define «detenção» como «qualquer medida de reclusão de um requerente por um Estado‑Membro numa zona especial, no interior da qual o requerente é privado da liberdade de circulação».

8.

O artigo 9.o, n.os 1 e 3, desta diretiva enuncia:

«1.   A detenção de um requerente deve ter a duração mais breve possível e só pode ser mantida enquanto forem aplicáveis os fundamentos previstos no artigo 8.o, n.o 3. […]

3.   Se a detenção for ordenada por uma autoridade administrativa, os Estados‑Membros submetem a legalidade da detenção a um controlo judicial acelerado, que se efetua oficiosamente e/ou a pedido do requerente. No caso do controlo oficioso, a decisão deve ser tomada o mais rapidamente possível a contar do início da detenção. No caso do controlo a pedido do requerente, a decisão deve ser tomada o mais rapidamente possível a partir do início dos procedimentos correspondentes. Para o efeito, os Estados‑Membros definem, no direito nacional, um prazo para a realização do controlo judicial oficioso e/ou do controlo judicial a pedido do requerente.

Se, na sequência de um controlo jurisdicional, a detenção for considerada ilegal, o recorrente em causa deve ser libertado imediatamente.»

3. Regulamento Dublim III

9.

O artigo 28.o, n.os 2 e 4, do Regulamento Dublim III tem a seguinte redação:

«2.   Caso exista um risco importante de que uma pessoa fuja, os Estados‑Membros podem reter essa pessoa a fim de garantir os procedimentos de transferência de acordo com o presente regulamento se existir um risco significativo de fuga, com base numa apreciação individual e apenas na medida em que a retenção seja proporcional, se não for possível aplicar de forma eficaz outras medidas alternativas menos coercivas.

[…]

4.   No que se refere às condições de detenção e às garantias aplicáveis às pessoas em regime de retenção, a fim de garantir os procedimentos de transferência para o Estado‑Membro responsável, são aplicáveis os artigos 9.o, 10.o e 11.o da [Diretiva Acolhimento].»

B.   Direito neerlandês

10.

O artigo 59.o, n.o 1, initio e alínea a), da Wet tot algehele herziening van de Vreemdelingenwet (Vreemdelingenwet 2000) (Lei de 2000 relativa aos Estrangeiros) ( 6 ) prevê que um estrangeiro em situação irregular pode ser detido por decisão do Secretário de Estado com vista ao seu afastamento do território neerlandês, se o interesse público ou a segurança nacional o exigirem.

11.

O artigo 59.oa dessa lei prevê que os estrangeiros aos quais se aplica o Regulamento Dublim III podem, em conformidade com o artigo 28.o deste regulamento, ser detidos com vista à sua transferência para o Estado‑Membro responsável pela análise do seu pedido de proteção internacional apresentado no território neerlandês.

12.

O artigo 94.o, n.os 1 e 6, da Lei relativa aos Estrangeiros prevê:

«1.   Quando adota uma decisão que aplica uma medida privativa da liberdade ao abrigo dos artigos […] 59.o, 59.oa e 59.ob, [o Secretário de Estado] deve informar o [tribunal competente] desse facto o mais tardar no vigésimo oitavo dia seguinte à notificação dessa decisão, salvo se o estrangeiro já tiver interposto recurso. Assim que o tribunal for informado, presume‑se que o cidadão estrangeiro interpôs recurso da decisão que lhe aplicou uma medida privativa de liberdade. O recurso visa igualmente a obtenção de uma compensação.

[…]

6.   Se considerar que a aplicação ou a execução da medida em causa é contrária à presente lei ou se considerar, após ponderação de todos os interesses em causa, que a medida aplicada não é justificada, o tribunal dará provimento ao recurso. Nesse caso, decreta o levantamento da medida ou a alteração das suas modalidades de execução.»

13.

O artigo 96.o, n.os 1 e 3, desta lei dispõe:

«1.   Se for negado provimento ao recurso a que se refere o artigo 94.o e o cidadão estrangeiro recorrer da prorrogação da medida de privação de liberdade, o tribunal encerrará a investigação preliminar no prazo de uma semana a contar da receção do pedido. […] [O] tribunal pode igualmente decidir, sem o consentimento das partes, que a audiência não se realizará. […]

[…]

3.   Se o tribunal considerar que a aplicação ou a execução da medida em causa é contrária à presente lei ou se considerar, após ponderação de todos os interesses em causa, que a medida não é razoavelmente justificada, o tribunal dará provimento ao recurso. Nesse caso, decreta o levantamento da medida ou a alteração das suas modalidades de execução.»

III. Litígio no processo principal e questão prejudicial

14.

Em 1 de maio de 2024, C, de nacionalidade marroquina, foi detido pela polícia de estrangeiros neerlandesa para ser interrogado, uma vez que não apresentou bilhete de comboio durante um controlo de bilhetes a bordo de um comboio internacional saído da Bélgica com destino aos Países Baixos. No mesmo dia, apresentou um pedido de proteção internacional nos Países Baixos.

15.

Em 2 de maio de 2024, C foi detido no Centro de Detenção de Roterdão (Países Baixos) com base numa medida adotada pelo Secretário de Estado ao abrigo do artigo 59.oa, n.o 1, da Lei relativa aos Estrangeiros e em conformidade com o artigo 28.o do Regulamento Dublim III (a seguir «primeira medida de detenção»). Ao adotar esta medida, o Secretário de Estado considerou que C estava abrangido pelo âmbito de aplicação do Regulamento Dublim III, que o objetivo da referida medida era assegurar a transferência de C para Espanha, isto é, o Estado‑Membro responsável pela análise do seu pedido de proteção internacional, e que a detenção era necessária tendo em conta o risco significativo de fuga de C.

16.

Em 3 de maio de 2024, o Secretário de Estado solicitou às autoridades espanholas que tomassem C a cargo ao abrigo do artigo 18.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento Dublim III.

17.

C retirou o seu pedido de proteção internacional em 6 de maio de 2024 e o Reino de Espanha foi informado deste facto dois dias depois, em 8 de maio de 2024.

18.

Em 14 de maio de 2024, as autoridades espanholas indeferiram o pedido de tomada a cargo. O Secretário de Estado não pediu a estas autoridades que reapreciassem a sua decisão de indeferimento.

19.

Em 16 de maio de 2024, C foi informado do indeferimento do pedido de transferência para Espanha e foi convidado a cooperar no regresso ao seu país de origem, Marrocos, o que recusou fazer.

20.

Em 17 de maio de 2024, C foi ouvido a respeito da intenção do Secretário de Estado de lhe aplicar uma decisão de regresso ao seu país de origem, uma proibição de entrada e uma nova medida de detenção, nos termos do artigo 15.o da Diretiva Regresso.

21.

Na sequência dessa audição, às 14 h 51, foi adotada uma decisão de regresso a respeito de C, que designava Marrocos como país de destino (a seguir «decisão de regresso»), e uma proibição de entrada no território neerlandês por dois anos. No mesmo dia, às 14 h 52, o Secretário de Estado adotou uma nova medida de detenção, com base no artigo 59.o, n.o 1, initio e alínea a), da Lei relativa aos Estrangeiros (que transpõe para o direito neerlandês o artigo 15.o, n.o 1, da Diretiva Regresso), por considerar que existia um risco efetivo de que C pudesse «subtrair‑se à vigilância e evitar ou impedir a preparação do regresso ou do procedimento de recondução à fronteira». Esta medida, que tem como objetivo assegurar o afastamento de C para o seu país de origem, continua em vigor (a seguir «segunda medida de detenção»). Por último, às 14 h 55, esta autoridade levantou a primeira medida de detenção e, às 15 h 00, deteve C com base na segunda medida de detenção.

22.

Conforme resulta dos factos acima expostos, C está detido ininterruptamente desde 2 de maio de 2024 ( 7 ).

23.

C interpôs dois recursos contra a primeira e a segunda medidas de detenção no órgão jurisdicional de reenvio, que os apreciou numa audiência única. No entender de C, a detenção decretada ao abrigo da primeira medida de detenção deixou de se justificar a partir de 14 de maio de 2024, uma vez que, na sequência do indeferimento do pedido de tomada a cargo pelas autoridades espanholas, a sua detenção já não podia ter como objetivo assegurar a sua transferência para Espanha. Por conseguinte, essa detenção devia ter terminado o mais rapidamente possível. A este respeito, de acordo com a jurisprudência do Raad van State (Conselho de Estado, em formação jurisdicional, Países Baixos) ( 8 ), antes da libertação, o Secretário de Estado dispunha de um prazo máximo de 48 horas após caducar a primeira decisão de detenção para adotar uma nova decisão de detenção com base noutro fundamento. No entanto, é pacífico que, no caso em apreço, este prazo não foi respeitado, uma vez que essa autoridade adotou a segunda medida de detenção em 17 de maio de 2024, ou seja, um dia após o termo do prazo máximo de 48 horas. C considera que esta circunstância tornou ilegal tanto a primeira como a segunda medida de detenção, violando o seu direito fundamental à liberdade. Por conseguinte, para sanar esta violação, o órgão jurisdicional de reenvio teria de libertá‑lo imediatamente, apesar de a primeira medida ter sido entretanto levantada ou de estar atualmente detido com base na segunda medida de detenção. Por outras palavras, a ilegalidade da primeira medida de detenção, devida a uma falta de diligência, inquina a legalidade da segunda medida ( 9 ).

24.

Por sua vez, o Secretário de Estado sustenta que a execução irregular da primeira medida de detenção não pode afetar a legalidade da segunda medida, uma vez que a manutenção da detenção de C se baseia na decisão de o fazer regressar a Marrocos, fundamento que continua válido. Esta autoridade reconheceu, no entanto, que não executou a primeira medida de detenção diligentemente, uma vez que excedeu o prazo máximo de 48 horas num dia antes de adotar a segunda medida. Para sanar esta ilegalidade, o Secretário de Estado, seguindo a sua prática, ofereceu a C a quantia de 100 euros para compensar a violação do seu direito à liberdade. No entanto, esta autoridade verificou que a primeira medida de detenção já tinha sido levantada quando da instauração do processo no órgão jurisdicional de reenvio e que, por isso, esta medida já não podia ser anulada. Por conseguinte, uma vez que este órgão jurisdicional já não podia levantar a primeira medida de detenção e que a segunda medida tinha sido aplicada nos termos da lei, C não podia ser libertado.

25.

A este respeito, o órgão jurisdicional de reenvio refere que, segundo a prática nacional, confirmada pela jurisprudência do Raad van State (Conselho de Estado, em formação jurisdicional), a ilegalidade de uma medida de detenção não pode afetar a legalidade de uma medida de detenção adotada posteriormente ( 10 ), pelo que o órgão jurisdicional competente não pode decretar a libertação se existir uma medida de detenção posterior. Ora, por força do artigo 15.o, n.o 2, da Diretiva Regresso e do artigo 9.o, n.o 3, da Diretiva Acolhimento, a pessoa em causa deve ser libertada imediatamente se a sua detenção for considerada ilegal. Nestas circunstâncias, segundo aquele órgão jurisdicional, suscita‑se a questão da proteção jurisdicional efetiva numa situação, como a do processo principal, em que uma pessoa permaneceu detida por mais de 48 horas, apesar de a primeira detenção ser comprovadamente ilegal. Esta questão implica, em substância, que se determine se a ilegalidade (pelo menos parcial) da primeira medida de detenção pode ser «regularizada» através do seu levantamento e da concessão de uma compensação à pessoa em causa ( 11 ).

26.

Foi neste contexto que o Rechtbank Den Haag, zittingsplaats Roermond (Tribunal de Primeira Instância de Haia, lugar da audiência Roermond) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«Devem o artigo 15.o, n.o 2, [initio e] alínea b), da [Diretiva Regresso], o artigo 9.o, n.o 3, da [Diretiva Acolhimento], e o artigo 28.o, n.o 4, do [Regulamento Dublim III], em conjugação com os artigos 6.o e 47.o da [Carta], ser interpretados no sentido de que a autoridade judicial é sempre obrigada a libertar imediatamente a pessoa detida quando a detenção tiver sido ou se tiver tornado ilegal a um dado momento durante a aplicação ininterrupta de uma série de medidas sucessivas de detenção?»

IV. Tramitação urgente no Tribunal de Justiça

27.

O órgão jurisdicional de reenvio solicitou que o presente reenvio prejudicial seja submetido à tramitação urgente prevista no artigo 107.o do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça. Em apoio deste pedido, referiu que o processo diz respeito à interpretação de disposições do direito da União relacionadas com o título V, parte III, do TFUE.

28.

No que respeita ao critério da urgência, o órgão jurisdicional de reenvio referiu, por um lado, que C foi detido em 2 de maio de 2024 e que continuava detido à data de apresentação do pedido de decisão prejudicial e, por outro, que a resposta do Tribunal de Justiça à questão prejudicial é decisiva para determinar se esse órgão jurisdicional está obrigado, por força do direito da União, a proceder à libertação imediata de C.

29.

Nestas condições, a Primeira Secção do Tribunal de Justiça decidiu, em 14 de junho de 2024, deferir o pedido do referido órgão jurisdicional de submeter o presente processo a tramitação prejudicial urgente.

30.

C, o Governo Neerlandês e a Comissão Europeia apresentaram observações escritas. Estas partes apresentaram igualmente alegações orais na audiência de alegações realizada em 15 de julho de 2024.

V. Análise

A.   Observações preliminares

31.

A título preliminar, julgo ser útil, antes de iniciar a minha análise, apresentar um sumário do quadro normativo aplicável e da jurisprudência relevante (1) e clarificar o alcance da questão prejudicial conforme foi formulada (2).

1. Quanto ao quadro normativo aplicável e à jurisprudência relevante

a) Panorama dos regimes jurídicos relativos à detenção

32.

Desde logo, parece‑me importante distinguir os diferentes regimes jurídicos relativos à detenção no âmbito da política comum em matéria de asilo e de imigração e, mais especificamente, por um lado, a detenção de um requerente de proteção internacional, nomeadamente, ao abrigo da Diretiva Acolhimento, ou no contexto da transferência de um requerente dessa proteção para o Estado‑Membro responsável pela análise do seu pedido ao abrigo do Regulamento Dublim III, e, por outro, a detenção para efeitos de afastamento regulada pela Diretiva Regresso, que diz respeito aos nacionais de países terceiros em situação irregular. Embora estes regimes tenham elementos comuns no que respeita às garantias oferecidas e à respetiva aplicação, são, no entanto, distintos, visto que prosseguem objetivos próprios ( 12 ).

33.

Em primeiro lugar, no que se refere aos requerentes de proteção internacional, cumpre, por um lado, salientar que a detenção destes requerentes deve respeitar o princípio subjacente de que ninguém deve ser detido apenas por requerer semelhante proteção ( 13 ). Assim, o artigo 8.o, n.o 3, da Diretiva Acolhimento elenca taxativamente os seis fundamentos suscetíveis de justificar a detenção de um requerente de proteção internacional, correspondendo cada um deles a uma necessidade específica e autónoma ( 14 ). Com efeito, esta disposição enuncia que os requerentes só podem ser detidos com base em fundamentos devidamente especificados, previstos no direito nacional ( 15 ). No que respeita aos requerentes de proteção internacional abrangidos pelo procedimento previsto no Regulamento Dublim III, a referida disposição remete, na sua alínea f), para o artigo 28.o deste regulamento. Mais concretamente, o artigo 28.o, n.o 2, do referido regulamento prevê que os Estados‑Membros podem deter as pessoas em causa para garantir os procedimentos de transferência de acordo com este regulamento se existir um risco significativo de fuga dessas pessoas. Além disso, o artigo 8.o, n.o 2, daquela diretiva prevê que a detenção só pode ocorrer quando, na sequência de uma apreciação individual, se revele necessário e se não for possível aplicar de forma eficaz outras medidas menos coercivas. Por conseguinte, as autoridades nacionais só podem deter um requerente de proteção internacional depois de terem verificado, casuisticamente, se essa detenção é proporcionada em relação aos objetivos que prossegue ( 16 ).

34.

Por outro lado, quanto às garantias relativas à duração da detenção, nos termos do artigo 9.o, n.o 1, da Diretiva Acolhimento, a detenção de um requerente de proteção internacional deve ter a duração mais breve possível e apenas enquanto for aplicável o fundamento da sua detenção, os procedimentos administrativos relacionados com esse fundamento de detenção devem ser executados com a devida diligência e os atrasos nesses procedimentos que não forem imputáveis ao requerente não podem justificar uma prorrogação da detenção ( 17 ). O artigo 9.o, n.o 3, desta diretiva acrescenta que se, na sequência do controlo judicial, a detenção for declarada ilegal, o requerente em causa deve ser libertado imediatamente. Esta disposição não impõe um prazo no termo do qual a detenção de um requerente de proteção internacional é automaticamente considerada ilegal, desde que o Estado‑Membro em causa assegure que, por um lado, a detenção dura apenas enquanto o fundamento em que se baseia for aplicável e, por outro, que os procedimentos administrativos relacionados com esse fundamento são executados com diligência ( 18 ). Estas disposições aplicam‑se, nos termos do artigo 28.o, n.o 4, do Regulamento Dublim III, às medidas de detenção adotadas a fim de garantir a transferência para o Estado‑Membro responsável ao abrigo deste regulamento ( 19 ).

35.

Em segundo lugar, no que respeita aos nacionais de países terceiros em situação irregular, há que sublinhar que o recurso à detenção para efeitos de afastamento deve ser limitado e estar sujeito ao respeito do princípio da proporcionalidade dos meios utilizados e dos objetivos prosseguidos. Recorde‑se que, nos termos do seu considerando 2, a Diretiva Regresso visa estabelecer uma política eficaz de afastamento e repatriamento, baseada em normas comuns, para proceder aos repatriamentos em condições humanamente dignas e com pleno respeito pelos direitos fundamentais e pela dignidade das pessoas. Assim, a detenção só se justifica «a fim de preparar o regresso e/ou de efetuar o processo de afastamento» e se não for suficiente a aplicação de medidas coercivas menos severas ( 20 ). Com efeito, o artigo 15.o, n.o 1, dessa diretiva prevê que os Estados‑Membros «só podem manter detidos nacionais de países terceiros objeto de procedimento de regresso, a fim de preparar o regresso e/ou efetuar o processo de afastamento, nomeadamente quando: a) [h]ouver risco de fuga; ou b) [o] nacional de país terceiro em causa evitar ou entravar a preparação do regresso ou o procedimento de afastamento». O Tribunal de Justiça esclareceu que estes dois motivos de detenção não são exaustivos, podendo os Estados‑Membros prever outros motivos de detenção específicos, em complemento dos dois motivos expressamente previstos nesta disposição ( 21 ). Todavia, a adoção de motivos de detenção complementares deve ser estritamente enquadrada tanto pelas exigências resultantes da própria Diretiva Regresso como pelas que decorrem da proteção dos direitos fundamentais, em particular do direito fundamental à liberdade, consagrado no artigo 6.o da Carta e do princípio da proporcionalidade ( 22 ). Por exemplo, um nacional de um país terceiro não pode ser detido pelo simples facto de estar sujeito a uma decisão de regresso ou de não poder prover às suas necessidades ( 23 ). Não obstante, o Tribunal de Justiça também declarou que o artigo 15.o da referida diretiva não se opõe a que, quando represente uma ameaça real, atual e suficientemente grave para a ordem pública ou para a segurança interna, seja aplicada uma medida de detenção a esse nacional de um país terceiro, enquanto aguarda o seu afastamento ( 24 ).

36.

Por outro lado, no que toca às garantias respeitantes à duração da detenção, à semelhança da detenção de requerentes de proteção internacional, o artigo 15.o da Diretiva Regresso prevê que essa detenção deve ter «a menor duração que for possível» e «se[r] apenas mantida enquanto o procedimento de afastamento estiver pendente e for executado com a devida diligência». O requisito de que essa detenção seja breve é reiterado várias vezes noutras disposições da Diretiva Regresso. Com efeito, primeiro, nos termos do artigo 15.o, n.o 2, último parágrafo, desta diretiva, «[o] nacional de país terceiro em causa é libertado imediatamente se a detenção for ilegal». Segundo, nos termos do artigo 15.o, n.o 4, da referida diretiva «[q]uando, por razões de natureza jurídica ou outra ou por terem deixado de se verificar as condições enunciadas no n.o 1, se afigure já não existir uma perspetiva razoável de afastamento, a detenção deixa de se justificar e a pessoa em causa é libertada imediatamente». Terceiro, o artigo 15.o, n.o 5, da mesma diretiva prevê que «[a] detenção mantém‑se enquanto se verificarem as condições enunciadas no n.o 1 e na medida do necessário para garantir a execução da operação de afastamento. Cada Estado‑Membro fixa um prazo limitado de detenção, que não pode exceder os seis meses». Quarto, nos termos do artigo 15.o, n.o 6, da Diretiva Regresso, os Estados‑Membros não podem prorrogar este prazo de seis meses «exceto por um prazo limitado que não exceda os doze meses seguintes» e, nesse caso, apenas mediante o preenchimento de condições rigorosas, a saber, se a não execução da decisão de regresso durante esses seis meses se dever à falta de cooperação da pessoa em causa ou a atrasos na obtenção da documentação necessária junto do país terceiro ( 25 ).

b) Jurisprudência relevante

37.

Embora os regimes relativos à detenção possam diferir quanto aos objetivos que prosseguem, apresentam elementos comuns. Com efeito, no seu Acórdão de 8 de novembro de 2022, Staatssecretaris van Justitie en Veiligheid (Exame oficioso da detenção) (C‑704/20 e C‑39/21, a seguir «Acórdão Exame oficioso da detenção, EU:C:2022:858), a Grande Secção do Tribunal de Justiça forneceu orientações gerais sobre as circunstâncias em que um nacional de um país terceiro pode ser detido ao abrigo destes diferentes regimes, tanto à luz do respeito do direito à liberdade, consagrado no artigo 6.o da Carta, como do direito a uma proteção jurisdicional efetiva, ao abrigo do artigo 47.o da mesma.

38.

Em primeiro lugar, no que concerne ao respeito do direito à liberdade garantido pelo artigo 6.o da Carta, primeiro, o Tribunal de Justiça recordou que a detenção de um nacional de um país terceiro ao abrigo das disposições acima referidas constitui uma ingerência grave no direito à liberdade consagrado no artigo 6.o da Carta ( 26 ). Com efeito, conforme prevê o artigo 2.o, alínea h), da Diretiva Acolhimento, a detenção consiste na reclusão de uma pessoa numa zona especial. Resulta da redação, da génese e do contexto no qual se inscreve esta disposição, cujo alcance é, aliás, transponível para o conceito de «detenção» que figura na Diretiva Regresso e [para o conceito de «retenção» que figura] no Regulamento Dublim III ( 27 ), que a detenção impõe à pessoa em causa que permaneça permanentemente num perímetro restrito e fechado, isolando, assim, esta pessoa do resto da população e privando‑a da sua liberdade de circulação. Ora, decorre do artigo 52.o, n.o 1 da Carta que qualquer restrição ao exercício desse direito deve ser prevista por lei e respeitar o conteúdo essencial do mesmo, bem como o princípio da proporcionalidade ( 28 ).

39.

Segundo, o Tribunal de Justiça sublinhou igualmente que a finalidade das medidas de detenção[/retenção], na aceção da Diretiva Regresso, da Diretiva Acolhimento e do Regulamento Dublim III, não é a investigação ou a repressão de infrações penais, mas antes a realização dos objetivos prosseguidos por esses instrumentos ( 29 ). Consequentemente, essas medidas de detenção não prosseguem nenhuma finalidade punitiva ( 30 ). Assim, a Diretiva Regresso prevê que a detenção deve ter lugar, regra geral, em centros de detenção especializados, que se distinguem dos estabelecimentos prisionais ( 31 ) e que, se tal não for possível, em estabelecimentos prisionais, desde que a pessoa detida não seja colocada em detenção juntamente com reclusos comuns ( 32 ).

40.

Terceiro, atendendo à gravidade desta ingerência no direito à liberdade consagrado no artigo 6.o da Carta e tendo em conta a importância deste direito, o poder reconhecido às autoridades nacionais competentes de colocarem nacionais de países terceiros em detenção está estritamente delimitado ( 33 ). Com efeito, esta disposição, à semelhança do artigo 5.o, n.o 1, da CEDH, exige uma leitura restritiva das situações em que a privação da liberdade é autorizada, uma vez que essas situações constituem exceções ao direito fundamental à liberdade e à segurança ( 34 ). Por conseguinte, uma medida de detenção só pode, assim, ser decretada ou prorrogada se forem respeitadas as regras gerais e abstratas que fixam as condições e modalidades dessa detenção ( 35 ).

41.

Essas regras gerais e abstratas fixam, a título de normas comuns da União, os requisitos de detenção[/retenção] que figuram no artigo 15.o, n.o 1, n.o 2, segundo parágrafo, n.os 4, 5 e 6, da Diretiva Regresso, no artigo 8.o, n.os 2 e 3, no artigo 9.o, n.os 1, 2 e 4, da Diretiva Acolhimento e no artigo 28.o, n.os 2, 3 e 4, do Regulamento Dublim III ( 36 ). As referidas regras, por um lado, e as disposições de direito nacional que procedem à sua execução, por outro, constituem as normas, decorrentes do direito da União, que fixam os requisitos de legalidade da detenção, incluindo à luz do artigo 6.o da Carta ( 37 ).

42.

A este respeito, o Tribunal de Justiça declarou, em primeiro lugar, que um nacional de um país terceiro não pode, como especificam o artigo 15.o, n.o 1, primeiro parágrafo, da Diretiva Regresso, o artigo 8.o, n.o 2, da Diretiva Acolhimento e o artigo 28.o, n.o 2, do Regulamento Dublim III, ser colocado em detenção quando for possível aplicar de forma eficaz uma medida menos coerciva. Em seguida, quando se verifique que os requisitos de legalidade da detenção, conforme enunciados no n.o 41 das presentes conclusões, não estão ou deixaram de estar preenchidos, o nacional de país terceiro em causa deve ser libertado imediatamente, como aliás o legislador da União prevê expressamente no artigo 15.o, n.o 2, quarto parágrafo, e n.o 4, da Diretiva Regresso e no artigo 9.o, n.o 3, segundo parágrafo, da Diretiva Acolhimento. Por último, o mesmo se aplica, nomeadamente, quando se verifica que o procedimento de regresso, de análise do pedido de proteção internacional ou de transferência, consoante o caso, já não é efetuado com toda a diligência requerida ( 38 ).

43.

Em segundo lugar, no que respeita ao direito a uma proteção jurisdicional efetiva dos nacionais de países terceiros detidos, é jurisprudência constante que, por força do artigo 47.o da Carta, os Estados‑Membros devem assegurar essa proteção dos direitos individuais que decorrem da ordem jurídica da União ( 39 ).

44.

No que respeita à detenção, os requisitos de legalidade da detenção identificados no n.o 41 das presentes conclusões visam proteger os nacionais de países terceiros contra a detenção arbitrária ( 40 ) e constituem uma materialização, no domínio em causa, do direito a uma proteção jurisdicional efetiva, garantido pelo artigo 47.o da Carta ( 41 ). Além disso, as normas comuns da União nesta matéria figuram no artigo 15.o, n.o 2, terceiro parágrafo, da Diretiva Regresso e no artigo 9.o, n.o 3, da Diretiva Acolhimento. Esta última disposição aplica‑se igualmente, por força do artigo 28.o n.o 4., do Regulamento Dublim III, no âmbito de procedimentos de transferência regulados por este último. De acordo com estas disposições, cada Estado‑Membro deve prever, quando a detenção tenha sido decretada por uma autoridade administrativa, uma fiscalização jurisdicional «célere» da legalidade dessa detenção, ex officio ou a pedido da pessoa em causa ( 42 ).

45.

No que diz respeito à fiscalização jurisdicional da legalidade de uma medida de detenção, o Tribunal de Justiça declarou que uma vez que o legislador da União exige, sem exceção, que a fiscalização do cumprimento dos requisitos de legalidade da detenção ocorra «[em] intervalos razoáveis» ( 43 ), a autoridade competente é obrigada a efetuar essa fiscalização ex officio, mesmo que o interessado não a solicite. Assim, o legislador da União não se limitou a estabelecer normas comuns substantivas, tendo igualmente instituído normas comuns processuais, com a finalidade de assegurar que existe, em cada Estado‑Membro, um regime que permita à autoridade judicial competente libertar, se for caso disso após um exame ex officio, a pessoa em causa quando se verifique que a sua detenção não é, ou deixou de ser, legal ( 44 ).

46.

Para que o regime de proteção assegure de forma efetiva o cumprimento dos requisitos estritos a que a legalidade de uma medida de detenção deve obedecer, a autoridade judicial competente deve estar em condições de decidir sobre todos os elementos de facto e de direito pertinentes para verificar essa legalidade, mesmo que a ilegalidade dessa medida não tenha sido invocada pela pessoa em causa. Esta interpretação assegura que a proteção jurisdicional do direito fundamental à liberdade é garantida de maneira eficaz em todos os Estados‑Membros, quer estes prevejam um sistema no qual a decisão de detenção é adotada por uma autoridade administrativa, mediante fiscalização jurisdicional, ou um sistema no qual essa decisão é adotada diretamente por uma autoridade judicial ( 45 ).

47.

É à luz destes esclarecimentos que proponho iniciar a análise da questão prejudicial.

2. Quanto ao alcance da questão prejudicial

48.

Com a sua questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta ao Tribunal de Justiça, em substância, se, ao abrigo das disposições relevantes, uma autoridade judiciária «é sempre obrigada a libertar imediatamente a pessoa detida quando a detenção tiver sido ou se tiver tornado ilegal a um dado momento durante a aplicação ininterrupta de uma série de medidas sucessivas de detenção».

49.

A meu ver, esta questão deve ser reformulada pelos motivos a seguir expostos.

50.

Primeiro, a questão conforme está formulada não prevê o motivo pelo qual a detenção inicial «[era] ou [se tornou] ilegal», isto é, o facto de C não ter sido libertado no prazo previsto no direito nacional. Ora, cada um dos fundamentos subjacentes a uma detenção responde a uma necessidade específica, e o motivo da ilegalidade também pode, por sua vez, estar relacionado com essa necessidade, pelo que a presente análise não pode ser feita em abstrato ( 46 ).

51.

Segundo, a questão baseia‑se numa construção jurisprudencial ao abrigo da qual há uma «aplicação ininterrupta de uma série de medidas sucessivas de detenção». Embora, de um ponto de vista temporal, as medidas sucessivas de detenção possam ser consideradas uma única detenção, não é esse o caso do ponto de vista do exercício da fiscalização jurisdicional. Com efeito, conforme resulta dos n.os 32 a 35 das presentes conclusões, os regimes jurídicos relativos à detenção estão sujeitos a requisitos distintos, sendo que cada medida tem um caráter autónomo. A construção jurisprudencial em que se baseia o órgão jurisdicional de reenvio descura, assim, o facto de cada uma das «medidas sucessivas de detenção» poder assentar em bases jurídicas e/ou fundamentos diferentes, o que, aliás, justifica, de um ponto de vista processual, que essas medidas sejam, como no caso vertente, objeto de recursos distintos.

52.

Terceiro, a formulação escolhida pelo órgão jurisdicional de reenvio não tem em conta a dimensão temporal do estatuto jurídico de C, que, à data do recurso, já não é «requerente de proteção internacional». Com efeito, conforme resulta dos autos transmitidos ao Tribunal de Justiça, desde 14 de maio de 2024 — isto é, na data em que as autoridades espanholas adotaram a decisão de indeferimento do pedido de transferência, da qual C não interpôs recurso — que C já não é requerente de proteção internacional, na aceção do artigo 2.o, alínea b), da Diretiva Acolhimento, pelo que deixou de estar abrangido pelo âmbito de aplicação desta diretiva, e, a fortiori, pelo procedimento previsto no Regulamento Dublim III ( 47 ). Do mesmo modo, uma vez que não resulta dos autos transmitidos ao Tribunal de Justiça que C beneficie de um direito ou de uma autorização de residência, na aceção do artigo 6.o, n.o 4, da Diretiva Regresso, deve considerar‑se que C está em situação irregular no território neerlandês desde 14 de maio de 2024 ( 48 ), estando, por conseguinte, abrangido pelo âmbito de aplicação da Diretiva Regresso ( 49 ). Além disso, recordo que uma decisão de detenção adotada com fundamento numa decisão de regresso, na aceção do artigo 3.o, ponto 4, da Diretiva Regresso, ainda que tivesse sido adotada a título subsidiário, não podia ter sido aplicada concomitantemente, antes de as autoridades espanholas terem recusado tomar C a cargo ( 50 ).

53.

Quarto, a questão prejudicial submetida refere expressamente o «artigo 15.o, n.o 2, [initio e] alínea b)», da Diretiva Regresso, e não o n.o 4 desta disposição, que exige a libertação imediata quando, nomeadamente, «as condições enunciadas no n.o 1 [deixaram de se verificar]» e «a detenção deixa de se justificar», circunstância que melhor reflete os factos do litígio no processo principal.

54.

Por último, parece‑me igualmente importante fazer um esclarecimento terminológico. No seu pedido de decisão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio qualifica de ilegal a primeira medida de detenção. No entanto, esta qualificação não reflete com exatidão os factos do processo principal, uma vez que, não tendo C sido libertado no prazo de 48 horas, é a própria detenção que se tornou ilegal, e não a primeira medida que a decretou, medida essa que ficou desprovida de objeto (caducou) porque deixou de ter justificação.

55.

Tendo em conta as considerações que precedem, e a fim de dar uma resposta útil às dúvidas do órgão jurisdicional de reenvio, proponho que a questão seja reformulada do seguinte modo:

Deve o artigo 15.o, n.o 2, quarto parágrafo, e n.o 4, da Diretiva Regresso, conjugado com os artigos 6.o e 47.o da Carta, ser interpretado no sentido de que impõe a uma autoridade judicial, no exercício do controlo da legalidade de uma medida de detenção, a obrigação de libertar imediatamente um nacional de um país terceiro detido em conformidade com as regras previstas na Diretiva Regresso, pelo simples facto de uma outra medida de detenção, à qual esse nacional tinha estado sujeito prévia e ininterruptamente, ao abrigo do Regulamento Dublim III, já não preencher os requisitos de legalidade visto que esse nacional não foi libertado imediatamente após a verificação de que essa detenção prévia já não era justificada, em conformidade com o artigo 9.o, n.o 3, da Diretiva Acolhimento, conjugado com o artigo 28.o, n.o 4, desse regulamento?

B.   Quanto à questão prejudicial

56.

O Tribunal de Justiça é, em substância, chamado a pronunciar‑se sobre a questão de saber se a ilegalidade da primeira detenção devido à não libertação no prazo previsto é suscetível de afetar a legalidade da segunda medida de detenção, de modo que o órgão jurisdicional de reenvio deve proceder à libertação imediata da pessoa em causa.

57.

Esta questão convida o Tribunal de Justiça a debruçar‑se sobre três aspetos distintos da execução de medidas de detenção: as consequências do termo de uma detenção e as diferentes opções que estão à disposição da Administração (1); o âmbito de aplicação temporal da obrigação de libertação imediata (2), e os meios disponíveis para sanar uma eventual ilegalidade relacionada com um vício que inquina a execução de uma medida de detenção (3).

1. Quanto às consequências do termo de uma detenção

58.

Em primeiro lugar, parece‑me essencial esclarecer se uma detenção ao abrigo da Diretiva Regresso pode ser autorizada no termo de uma detenção adotada ao abrigo da Diretiva Acolhimento ou do Regulamento Dublim III.

59.

A resposta é, a este respeito, afirmativa.

60.

Antes de mais, ao recordar o caráter autónomo de cada medida de detenção, o Tribunal de Justiça já reconheceu expressamente que quando uma detenção já não é justificada, uma autoridade judicial pode, além da libertação imediata, decretar uma medida alternativa à detenção. Com efeito, quando a detenção é considerada ilegal, a pessoa em causa deve ser libertada imediatamente e, nesse caso, o órgão jurisdicional nacional deve ter condições de substituir a decisão da autoridade administrativa que determinou a detenção por uma decisão sua e de decretar «uma medida [alternativa à detenção] ou a libertação [da pessoa] em causa» ( 51 ). Todavia, a prolação de uma medida alternativa à detenção só é possível se o fundamento que justificou a detenção da pessoa em causa for e permanecer válido e se essa detenção não se revelar ou tiver deixado de se revelar necessária ou proporcionada à luz desse motivo ( 52 ). Esta abordagem é igualmente compatível com a jurisprudência do TEDH sobre a aplicação do artigo 5.o, n.o 1, CEDH, o qual reconheceu que a manutenção de uma detenção pode ser totalmente justificada desde que respeite o princípio da segurança jurídica ( 53 ).

61.

O Tribunal de Justiça considerou, no mesmo sentido, que, embora a Diretiva Regresso seja inaplicável durante o processo de apreciação do pedido de asilo, isto não significa de maneira nenhuma que, por essa razão, seja definitivamente posto termo ao processo de regresso, visto que este pode prosseguir no caso de o pedido de asilo ser indeferido. Com efeito, se não fosse possível aos Estados‑Membros evitar que o interessado pudesse, através da apresentação de um pedido de asilo, obter automaticamente a sua libertação, o objetivo desta diretiva, isto é, o regresso eficaz dos nacionais de países terceiros em situação irregular, poderia ser frustrado ( 54 ).

62.

Em seguida, o facto de, no termo de uma detenção, poder ser autorizada uma nova detenção com um fundamento diferente, é confirmado, ainda que indiretamente, pelo ponto 14.5 do Manual do Regresso, que refere que «[o]s prazos máximos de detenção prescritos pela Diretiva Regresso não devem ser postos em causa por uma nova detenção das pessoas objeto de uma medida de regresso imediatamente após serem libertadas» ( 55 ).

63.

Por último, e por analogia, saliento que, na prática, os Estados‑Membros são frequentemente confrontados com a situação em que um nacional de um país terceiro, detido ao abrigo da Diretiva Regresso, apresenta um pedido de asilo, o que exige a manutenção da detenção, desta vez ao abrigo da Diretiva Acolhimento, para determinar os elementos em que se baseia o pedido de proteção internacional quando exista um risco de fuga.

2. Quanto ao âmbito de aplicação temporal da obrigação de libertação imediata

64.

Em segundo lugar, há que salientar que, no seu pedido, o órgão jurisdicional de reenvio refere que a prática jurídica nacional, segundo a qual a autoridade administrativa dispõe de um prazo de 48 horas, enquanto a pessoa em causa se encontra detida, para aplicar uma nova medida de detenção, com base noutro fundamento, uma vez verificado que o objetivo prosseguido pela primeira medida já não pode ser concretizado, não parece ser compatível com a obrigação de libertação «imediata».

65.

No caso em apreço, o Secretário de Estado reconheceu expressamente que não executou esta medida de detenção com a devida diligência, uma vez que excedeu num dia prazo máximo de 48 horas antes de adotar a segunda medida de detenção, o que fez com que a primeira medida de detenção se tornasse ilegal devido a essa ultrapassagem do prazo. Foi também por este motivo que o Secretário de Estado propôs uma compensação no montante de 100 euros. Além disso, esta análise não é contestada por C, que considera igualmente que a ilegalidade durou um dia.

66.

No entanto, por uma questão de exaustividade, e uma vez que esta questão foi suscitada pelo órgão jurisdicional de reenvio, considero útil examinar o alcance concreto da execução da obrigação de libertação imediata prevista nas disposições relevantes.

67.

A este respeito, primeiro, saliento que, de acordo com o teor das disposições relevantes aplicáveis aos requerentes de proteção internacional, a obrigação de libertação imediata incumbe às autoridades judiciais. Com efeito, o artigo 9.o da Diretiva Acolhimento, para o qual remete o artigo 28.o, n.o 4, do Regulamento Dublim III, prevê a libertação imediata «[s]e, na sequência do controlo judicial, a detenção for declarada ilegal» ( 56 ). Do mesmo modo, no que respeita aos nacionais de países terceiros em situação irregular, embora a Diretiva Regresso disponha, no seu artigo 15.o, n.o 2, que as medidas de detenção podem ser ordenadas por autoridades judiciais ou administrativas, prevê igualmente que estas medidas são objeto um controlo jurisdicional célere da legalidade ( 57 ). Por conseguinte, a disposição, ao exigir que «o nacional de país terceiro em causa [seja] libertado imediatamente se a detenção for ilegal», implica o exercício de um controlo jurisdicional prévio, o que significa que a obrigação de libertação recai igualmente sobre as autoridades judiciais. Este raciocínio também se aplica à obrigação de libertação referida no n.o 4 desse artigo.

68.

Em seguida, há que observar que nem a Diretiva Regresso, nem a Diretiva Acolhimento, nem o Regulamento Dublim III preveem um prazo máximo antes da libertação «imediata». Com efeito, o significado habitual do termo «imediato» é «algo que ocorre no próprio momento ou que deve ocorrer sem demora» ( 58 ). Por conseguinte, seria contraditório prever um prazo, ainda que curto, para a libertação imediata.

69.

Esta interpretação é também coerente com a jurisprudência do TEDH, que, no que respeita ao atraso na execução de uma decisão de libertação, considerou que é inconcebível que, num Estado de Direito, uma pessoa fique privada da sua liberdade apesar de existir uma decisão judicial que decreta a sua libertação ( 59 ). Esse tribunal considerou que um certo atraso na execução de uma decisão de libertação de uma pessoa detida é «compreensível e frequentemente inevitável», tendo em conta as necessidades práticas do funcionamento dos tribunais e do cumprimento de formalidades específicas, devendo, contudo, as autoridades nacionais esforçar‑se por encurtar esse prazo tanto quanto possível ( 60 ). As formalidades administrativas associadas à libertação não podem servir de justificação a um atraso superior a algumas horas ( 61 ). A detenção ilegal de pessoas que já não têm fundamento para estar detidas, em consequência de lacunas administrativas na transmissão de documentos entre diferentes órgãos do Estado, viola o artigo 5.o, ainda que essa detenção seja de curta duração ( 62 ).

70.

Segundo, importa examinar se esta obrigação de libertação se pode aplicar às autoridades administrativas competentes para aplicar medidas de detenção (nomeadamente, nos termos da Diretiva Regresso). A este respeito, quando as autoridades administrativas consideram que é necessário adotar uma nova medida de detenção consecutiva, tanto o levantamento da primeira medida de detenção como a reapreciação e a fundamentação de uma nova medida de detenção implicam vários atos administrativos que levam tempo, porque envolvem não só um certo trabalho de reflexão e de concertação interna, mas também o exercício dos direitos de defesa da pessoa em causa (se, nomeadamente, a detenção for decretada com base noutro fundamento). Quanto a este aspeto, o direito da União, em termos pragmáticos, não prevê nenhuma disposição relativa a estes atos nem à sua duração. De facto, não seria oportuno impor um prazo concreto, uma vez que os fundamentos da nova detenção podem variar e justificar prazos mais ou menos extensos. Esta questão é, por conseguinte, deixada ao critério dos Estados‑Membros.

71.

No entanto, importa recordar, a este respeito, que o Tribunal de Justiça, baseando‑se nomeadamente no considerando 17 da Diretiva Regresso, que esclarece que a «detenção inicial» de nacionais de países terceiros suspeitos de residir ilegalmente num Estado‑Membro se continua a reger pelo direito nacional, declarou que esta diretiva não se opõe a uma detenção com o objetivo de determinar se um nacional de um país terceiro está ou não em situação regular. A este título, o Tribunal de Justiça reconheceu que o objetivo da Diretiva Regresso, isto é, o regresso efetivo dos nacionais de países terceiros em situação irregular, ficaria comprometido se os Estados‑Membros não pudessem evitar, através de uma medida de privação de liberdade, como a detenção, a fuga de uma pessoa suspeita de residência ilegal antes de a sua situação poder ser esclarecida. Ora, embora as autoridades competentes devam dispor de um prazo, breve mas razoável, para identificar a pessoa controlada e recolher os elementos que permitam determinar se essa pessoa é nacional de um país terceiro em situação irregular, devem igualmente agir com diligência e tomar posição o mais rapidamente possível sobre a questão de saber se a pessoa em causa está ou não em situação regular ( 63 ). Resulta do que precede, por analogia e implicitamente, que o Tribunal de Justiça já concedeu às autoridades administrativas dos Estados‑Membros um prazo razoável para decretar uma eventual (nova) detenção, se existirem fundamentos que justifiquem essa detenção, e na condição de agirem rapidamente ( 64 ).

72.

Terceiro, caberá ao órgão jurisdicional nacional apreciar, casuisticamente, se, tendo em conta a duração média dos atos administrativos invocados pela Administração, um prazo máximo, como um prazo de 48 horas, constitui um prazo razoável. À primeira vista ( 65 ), parece ser esse o caso. No entanto, continua a ser importante que a autoridade administrativa justifique as razões pelas quais necessita de 48 horas, tendo em conta todas as circunstâncias factuais e jurídicas relevantes. No caso em apreço, foi o risco de fuga que justificou, em substância, a detenção, com base no Regulamento Dublim III e, posteriormente, com base na Diretiva Regresso. Este motivo de detenção não é, pela sua natureza, afetado pelo facto de a pessoa em causa deixar de ser requerente de proteção internacional. Por último, é importante sublinhar que, além do caso em apreço, se não existirem fundamentos para adotar uma nova medida de detenção, o Secretário de Estado também não dispõe de um prazo de 48 horas para pôr termo à detenção, devendo fazê‑lo o mais rapidamente possível, geralmente no próprio dia.

3. Quanto ao direito a compensação

73.

Em terceiro e último lugar, há que salientar que, contrariamente ao que o órgão jurisdicional de reenvio refere, nos sistemas administrativos nacionais, assim como no direito da União, a declaração de ilegalidade de um ato não implica necessariamente uma restituição integral (restitutio in integrum), neste caso uma libertação imediata, que permita à pessoa em causa ver os seus direitos restabelecidos, quando essa restituição já não seja materialmente possível. Com efeito, pela própria natureza das coisas, o não cumprimento do prazo de libertação previsto não é suscetível de dar direito a dias suplementares fora do centro de detenção, sobretudo quando a detenção já terminou. Por outras palavras, a pessoa em causa nunca poderá recuperar os dias em que permaneceu detida ilegalmente. É por esta razão que geralmente se prevê uma compensação a favor das pessoas que, embora tendo estado detidas, acabam por não ser condenadas, para compensar os danos materiais e morais que sofreram enquanto estiveram privadas da sua liberdade. Por conseguinte, a solução proposta pelo órgão jurisdicional de reenvio é puramente pretoriana e voluntarista e não pode ser facilmente justificada do ponto de vista jurídico ( 66 ).

74.

No presente caso, o Governo Neerlandês confirmou que, no âmbito do processo em que o juiz se pronuncia sobre a legalidade da detenção, mas também depois de a medida de detenção já ter terminado, a pessoa em causa pode pedir uma compensação e o juiz pode condenar o Secretário de Estado no pagamento de um montante de compensação, se for o caso, superior ao da compensação fixa oferecida pela Administração. Um sistema deste tipo parece‑me suscetível não só de sanar eventuais ilegalidades decorrentes de uma falta de diligência na execução de uma medida de detenção, mas também de ter um efeito dissuasor para a Administração.

75.

Por último, o dever de assistência impõe à Administração que não recorra sistematicamente a libertações tardias a troco de uma compensação, uma vez que o artigo 6.o da Carta tem por objetivo proteger a pessoa em causa contra a arbitrariedade, o que significa, nomeadamente, que deve estar protegida contra quaisquer comportamentos de má‑fé ou enganosos por parte das autoridades e que deve existir um nexo de proporcionalidade entre o fundamento invocado e a privação de liberdade.

VI. Conclusão

76.

Tendo em conta o que precede, proponho ao Tribunal de Justiça que responda à questão prejudicial submetida pelo Rechtbank Den Haag, zittingsplaats Roermond (Tribunal de Primeira Instância de Haia, lugar da audiência Roermond, Países Baixos) do seguinte modo:

O artigo 15.o, n.o 2, quarto parágrafo, e n.o 4, da Diretiva 2008/115/CE, de 16 de dezembro de 2008, relativa a normas e procedimentos comuns nos Estados‑Membros para o regresso de nacionais de países terceiros em situação irregular, conjugado com os artigos 6.o e 47.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia,

deve ser interpretado no sentido de que:

uma autoridade judicial, no exercício do controlo da legalidade de uma medida de detenção, não está obrigada a libertar imediatamente um nacional de um país terceiro detido, em conformidade com as regras previstas naquela diretiva, pelo simples facto de uma outra medida de detenção, à qual esse nacional tinha estado sujeito prévia e ininterruptamente, ao abrigo do Regulamento (UE) n.o 604/2013, de 26 de junho de 2013, que estabelece os critérios e mecanismos de determinação do Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de proteção internacional apresentado num dos Estados‑Membros por um nacional de um país terceiro, já não preencher os requisitos de legalidade visto que esse nacional não foi libertado imediatamente após a verificação de que essa detenção prévia já não era justificada, em conformidade com o artigo 9.o, n.o 3, da Diretiva 2013/33/UE, de 26 de junho de 2013, que estabelece normas em matéria de acolhimento dos requerentes de proteção internacional, conjugado com o artigo 28.o, n.o 4, desse regulamento.


( 1 ) Língua original: francês.

( i ) O nome do presente processo é um nome fictício. Não corresponde ao nome verdadeiro de nenhuma das partes no processo.

( 2 ) Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de dezembro de 2008, relativa a normas e procedimentos comuns nos Estados‑Membros para o regresso de nacionais de países terceiros em situação irregular (JO 2008, L 348, p. 98, a seguir «Diretiva Regresso»).

( 3 ) Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, que estabelece normas em matéria de acolhimento dos requerentes de proteção internacional (JO 2013, L 180, p. 96, a seguir «Diretiva Acolhimento»).

( 4 ) Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, que estabelece os critérios e mecanismos de determinação do Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de proteção internacional apresentado num dos Estados‑Membros por um nacional de um país terceiro ou por um apátrida (JO 2013, L 180, p. 31, a seguir «Regulamento Dublim III»).

( 5 ) Este princípio tem origem no artigo 5.o da Convenção Europeia para a Proteção dos Direitos Humanos e das Liberdades Fundamentais, assinada em Roma em 4 de novembro de 1950 (a seguir «CEDH»). O artigo 6.o da Carta consagra igualmente este princípio ao prever que «[t]oda a pessoa tem direito à liberdade e segurança».

( 6 ) Stb. 2000, n.o 497, com a redação que lhe foi dada para efeitos da transposição da Diretiva Regresso para o direito neerlandês, em vigor desde 31 de dezembro de 2011.

( 7 ) Durante este período, C só saiu uma vez do centro de detenção para comparecer perante o órgão jurisdicional de reenvio e ser ouvido presencialmente a respeito da sua privação de liberdade, antes da adoção da segunda medida de detenção.

( 8 ) V. Acórdãos do Raad van State (Conselho de Estado, em formação jurisdicional) de 6 de maio de 2024 (ECLI:NL:RVS:2024:1869), de 23 de dezembro de 2021 (ECLI:NL:RVS:2021:2963) e de 7 de abril de 2021 (ECLI:NL:RVS:2021:705).

( 9 ) Na audiência, C confirmou que o único fundamento invocado para contestar a legalidade da segunda medida de detenção foi a falta de diligência relativamente à duração da primeira detenção.

( 10 ) V. Acórdão de 8 de novembro de 2017 (ECLI:NL:RVS:2017:3059, n.o 3.2). Segundo o órgão jurisdicional de reenvio, esta prática espelha o conteúdo da legislação nacional, constituída pelos artigos 59.o, 59.oa, 94.o e 96.o da Lei relativa aos Estrangeiros, que não prevê explicitamente a obrigação de a autoridade judicial competente libertar imediatamente a pessoa em causa se considerar que a detenção é ilegal. Com base nestas disposições, uma autoridade judicial só está obrigada a libertar imediatamente a pessoa detida se a medida específica em que se baseia a detenção for ilegal quando o tribunal exerce o controlo judicial.

( 11 ) Nestas circunstâncias, o referido órgão jurisdicional questiona‑se se devia proceder à libertação de C, visto que a segunda medida de detenção não é, em si, ilegal. A este título, realça, primeiro, que esta questão exige que se determine se o objeto do controlo da autoridade judicial competente é a legalidade da «detenção», isto é, o período ininterrupto de privação de liberdade, em si, ou, em alternativa, se essa autoridade deve cingir o seu controlo às medidas de detenção que estão em vigor. Segundo, o direito da União não prevê a possibilidade de manter a detenção por razões administrativas ou para preparar a adoção de uma nova decisão, exigindo antes a libertação imediata, independentemente do momento em que a legalidade da detenção é apreciada. Terceiro, a gravidade e a duração da ilegalidade da medida de detenção são irrelevantes para efeitos de apreciação dessa decisão, posto que qualquer violação do direito à liberdade deve ser considerada grave. Quarto, relativamente a este ponto, a importância fundamental do direito à liberdade, conforme garantido pelo artigo 6.o da Carta, e do princípio da proteção jurisdicional efetiva, consagrado no artigo 47.o da mesma, milita a favor da libertação imediata de C visto que a detenção foi ilegal, mesmo que o tenha sido apenas no passado. Por conseguinte, o órgão jurisdicional de reenvio conclui que a libertação é a única medida que pode sanar a ilegalidade da detenção, considerando que o pagamento de uma compensação é, a este respeito, insuficiente.

( 12 ) V., neste sentido, Acórdão de 30 de novembro de 2009, Kadzoev (C‑357/09 PPU, EU:C:2009:741, n.os 45 e 47), nos termos do qual uma detenção anterior ou posterior ao abrigo da Diretiva Acolhimento não é tida em conta no cálculo da duração da detenção ao abrigo da Diretiva Regresso. V., no mesmo sentido, o ponto 14.4.2. da Recomendação (UE) 2017/2338 da Comissão, de 16 de novembro de 2017, que estabelece um Manual do Regresso comum a utilizar pelas autoridades competentes dos Estados‑Membros no exercício das funções relacionadas com o regresso (JO 2017, L 339, p. 83, a seguir «Manual do Regresso»).

( 13 ) V. Artigo 8.o, n.o 1, da Diretiva Acolhimento e artigo 26.o, n.o 1, da Diretiva 2013/32/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, relativa a procedimentos comuns de concessão e retirada do estatuto de proteção internacional (JO 2013, L 180, p. 60). Este princípio é reiterado no artigo 28.o, n.o 1, e no considerando 20 do Regulamento Dublim III.

( 14 ) V. Acórdão de 14 de maio de 2020, Országos Idegenrendészeti Főigazgatóság Dél‑alföldi Regionális Igazgatóság (C‑924/19 PPU e C‑925/19 PPU, a seguir «Acórdão FMS e o., EU:C:2020:367, n.o 250 e jurisprudência referida).

( 15 ) A saber: a) para determinar ou verificar a sua identidade ou nacionalidade; b) para determinar os elementos em que se baseia o pedido de proteção internacional que não poderiam obter‑se sem essa detenção, designadamente se houver risco de fuga do requerente; c) para determinar, no âmbito de um procedimento, o direito de o requerente entrar no território; d) se o requerente detido estiver sujeito a um processo de retorno, ao abrigo da Diretiva Regresso, para preparar o regresso e/ou executar o processo de afastamento, e se o Estado‑Membro puder demonstrar, com base em critérios objetivos, designadamente que o requerente já teve oportunidade de aceder ao procedimento de asilo, que há fundamentos razoáveis para crer que o seu pedido de proteção internacional tem por único intuito atrasar ou frustrar a execução da decisão de regresso; e) se a proteção da segurança nacional ou da ordem pública o exigirem; e f) nos termos do artigo 28.o do [Regulamento Dublim III].

( 16 ) Acórdão FMS e o. (n.o 258).

( 17 ) Acórdão FMS e o. (n.o 262). O Tribunal de Justiça observou, no entanto, que, contrariamente à proposta de diretiva [COM(2008) 815 final], que previa expressamente que a decisão de detenção deve especificar o prazo máximo de detenção, nenhuma disposição da Diretiva Acolhimento prevê um prazo específico além do qual os Estados‑Membros estejam obrigados a pôr termo à detenção dos requerentes de proteção internacional.

( 18 ) Acórdão FMS e o. (n.o 265).

( 19 ) V. Considerando 20 do Regulamento Dublim III.

( 20 ) V. Considerandos 16 e 17 da Diretiva Regresso e Acórdãos de 6 de outubro de 2022, Politsei‑ ja Piirivalveamet (Colocação em detenção — Risco de prática de uma infração penal) (C‑241/21, a seguir «Acórdão Risco de prática de uma infração penal, EU:C:2022:753, n.o 30), e de 27 de abril de 2023, M.D. (Proibição de entrada na Hungria) (C‑528/21, EU:C:2023:341, n.o 72).

( 21 ) Acórdão Risco de prática de uma infração penal (n.os 35 e 36).

( 22 ) Acórdão Risco de prática de uma infração penal (n.os 37 e 40 a 43).

( 23 ) Acórdão FMS e o. (n.o 281).

( 24 ) Acórdão de 21 de setembro de 2023, ADDE e o. (C‑143/22, EU:C:2023:689, n.o 43 e jurisprudência referida).

( 25 ) V., igualmente, Manual do Regresso, capítulo 14 (intitulado «Detenção») e capítulo 15 (intitulado «Condições de detenção»).

( 26 ) V. Acórdãos Exame oficioso da detenção (n.o 72) e «Risco de prática de uma infração penal» (n.o 46).

( 27 ) Acórdão Exame oficioso da detenção (n.o 73). Com efeito, no n.o 224 do Acórdão FMS e o., o Tribunal de Justiça considerou que «nada indica que o legislador da União tenha tido a intenção de dar ao conceito de «detenção», no âmbito da [Diretiva Regresso], um significado diferente do que lhe é dado no âmbito da [Diretiva Acolhimento]».

( 28 ) Acórdão Risco de prática de uma infração penal (n.os 47 a 50). V., neste sentido, igualmente, Acórdão de 15 de março de 2017, Al Chodor (C‑528/15, EU:C:2017:213, n.os 37 a 40), que remete para o Acórdão do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (a seguir «TEDH») de 21 de outubro de 2013, Del Río Prada c. Espanha (EC:ECHR:2013:1021JUD004275009). Na medida em que a Carta contém direitos correspondentes aos garantidos pela CEDH, o artigo 52.o, n.o 3, da Carta prevê que o sentido e o âmbito desses direitos são os mesmos que os conferidos pela CEDH, especificando, no entanto, que o direito da União pode prever uma proteção mais ampla. Para efeitos da interpretação do artigo 6.o da Carta, o artigo 5.o da CEDH deve, por conseguinte, ser tido em conta como um nível mínimo de proteção. A detenção de um nacional de um país terceiro, que constitui uma ingerência grave no seu direito à liberdade, está sujeita ao respeito de garantias rigorosas, nomeadamente a existência de uma base legal, a clareza, a previsibilidade, a acessibilidade e a proteção contra a arbitrariedade.

( 29 ) Acórdão Exame oficioso da detenção (n.o 74).

( 30 ) V., neste sentido, Acórdão Risco de prática de uma infração penal (n.o 32 e jurisprudência referida) e Acórdão de 10 de março de 2022, Landkreis Gifhorn (C‑519/20, a seguir «Acórdão Landkreis Gifhorn, EU:C:2022:178, n.o 38).

( 31 ) Acórdão Landkreis Gifhorn (n.o 36).

( 32 ) Artigo 16.o, n.o 1, da Diretiva Regresso. Sobre as condições de detenção, v. Acórdãos de 17 de julho de 2014, Pham (C‑474/13, EU:C:2014:2096, n.o 23), de 2 de julho de 2020, Stadt Frankfurt am Main (C‑18/19, EU:C:2020:511, n.o 46) e Landkreis Gifhorn (n.os 32 a 57).

( 33 ) V., neste sentido, Acórdão de 30 de junho de 2022, Valstybės sienos apsaugos tarnyba e o. (C‑72/22 PPU, EU:C:2022:505, n.os 83 e 86 e jurisprudência referida). V., igualmente, n.o 26 do Guide sur l’article 5 de la Convention — Droit à la liberté et à la sûreté (Guia sobre o artigo 5.o da [CEDH] — Direito à liberdade e à segurança), atualizado em 29 de fevereiro de 2024, TEDH.

( 34 ) É importante notar que o considerando 3 da Diretiva Regresso remete para as «Vinte orientações sobre o regresso forçado», adotadas em 4 de maio de 2005 pelo Comité de Ministros do Conselho da Europa. De acordo com o sétimo destes princípios, a detenção prévia ao afastamento «só se justifica no contexto de um afastamento em curso. Se não for efetuada com a devida diligência, a detenção deixa de ser legal» [tradução livre]. O TEDH recordou que «a privação de liberdade com base nessa disposição [artigo 5.o, n.o 1, alínea f)] só se justifica se houver um procedimento de afastamento em curso. Se o procedimento não decorrer com a devida diligência, a detenção deixa de ser justificada à luz do artigo 5.o, n.o 1, alínea f)» da Convenção [TEDH, 15 de novembro de 1996, Chahal c. Reino‑Unido (22414/93, § 113)]. Isto significa que, quando o afastamento de uma pessoa num prazo razoável se afigura irrealista, a detenção deixa de ser justificada e a pessoa deve ser libertada [Comissão para os Direitos Humanos, 3 de março de 1978, Caprino c. Reino Unido (CE:ECHR:1978:0303DEC000687175)].

( 35 ) Acórdão Exame oficioso da detenção (n.o 75 e jurisprudência referida).

( 36 ) V. Normas expostas nos n.os 33 a 36 das presentes conclusões.

( 37 ) Acórdão Exame oficioso da detenção (n.os 76 e 77).

( 38 ) Acórdão Exame oficioso da detenção (n.os 78 a 80).

( 39 ) Acórdão FMS e o. (n.o 142) e Acórdão Exame oficioso da detenção (n.o 81)

( 40 ) A este respeito, no Acórdão de 15 de fevereiro de 2016, N. (C‑601/15 PPU, EU:C:2016:84, n.o 81), o Tribunal de Justiça sublinhou que, segundo a jurisprudência do TEDH relativa ao artigo 5.o, n.o 1, da CEDH, para ser conforme ao objetivo que consiste em proteger o indivíduo contra a arbitrariedade, a execução de uma medida de privação de liberdade implica, nomeadamente, que não contenha nenhum elemento de má‑fé ou de dolo por parte das autoridades, que se enquadre no objetivo das restrições autorizadas pelo parágrafo relevante do artigo 5.o, n.o 1, da CEDH e que exista uma relação de proporcionalidade entre o motivo invocado e a privação de liberdade em causa [v., neste sentido, TEDH, 29 de janeiro de 2008, Saadi c. Reino Unido (CE:ECHR:2008:0129JUD001322903, §§ 68 a 74)].

( 41 ) Acórdão FMS e o. (n.o 289).

( 42 ) Acórdão Exame oficioso da detenção (n.os 82 e 83 e jurisprudência referida).

( 43 ) Artigo 15.o, n.o 3, da Diretiva Regresso e artigo 9.o, n.o 5, da Diretiva Acolhimento.

( 44 ) Acórdão Exame oficioso da detenção (n.os 85 e 86).

( 45 ) Acórdão Exame oficioso da detenção (n.os 87 a 99 e jurisprudência referida).

( 46 ) V. n.o 33 e jurisprudência referida na nota de rodapé n.o 14 das presentes conclusões. Assim, a análise não pode ser a mesma se a primeira medida de detenção se «tiver tornado ilegal» devido a uma apreciação errada do risco de fuga [na aceção do artigo 8.o, n.o 3, alínea b), da Diretiva Acolhimento] e se a segunda medida de detenção assentar igualmente nesse mesmo risco de fuga (na aceção do artigo 15.o, n.o 1, da Diretiva Regresso), por um lado, ou num motivo totalmente diferente [como a proteção da segurança nacional ou da ordem pública ao abrigo do artigo 8.o, n.o 3, alínea b), da Diretiva Acolhimento], por outro.

( 47 ) V., no mesmo sentido, Acórdão de 25 de junho de 2020, Ministério Fiscal (Autoridade competente para receber um pedido de proteção internacional) (C‑36/20 PPU, EU:C:2020:495, n.o 96 e jurisprudência referida).

( 48 ) V., por analogia, Acórdão de 21 de setembro de 2023, ADDE e o. (C‑143/22, EU:C:2023:689, n.o 31 e jurisprudência referida).

( 49 ) V., por analogia, Acórdão FMS e o. (n.os 208 a 210).

( 50 ) Quanto a este ponto, o Tribunal de Justiça especificou que não pode ser adotada uma decisão de regresso durante o período compreendido entre a apresentação do pedido de proteção internacional e a pronúncia da primeira decisão sobre o mesmo, uma vez que a existência de uma autorização de permanência no território exclui a irregularidade da permanência do requerente e, por conseguinte, a aplicação da Diretiva Regresso a seu respeito [v. Acórdão de 9 de novembro de 2023, Odbor azylové a migrační politiky MV (Âmbito de aplicação da Diretiva Regresso) (C‑257/22, EU:C:2023:852, n.os 39 e 40 e jurisprudência referida)]. A adoção de uma medida de detenção a título subsidiário por uma razão diferente da que justifica a primeira medida de detenção seria igualmente problemática do ponto de vista do exercício dos direitos de defesa do requerente, que teria de impugnar dois fundamentos da detenção, um a título principal e outro a título subsidiário (e especulativo).

( 51 ) V. Acórdão de 5 de junho de 2014, Mahdi (C‑146/14 PPU, EU:C:2014:1320, n.o 62). O sublinhado é meu.

( 52 ) Acórdão FMS e o. (n.os 292 e 293).

( 53 ) O TEDH declarou nomeadamente que a prática que consiste em manter uma pessoa detida pelo facto de ter sido deduzida uma acusação contra a mesma constitui uma violação do artigo 5.o, n.o 1, da CEDH [TEDH, 28 de março de 2000, Baranowski c. Polónia (EC:ECHR:2000:0328JUD002835895), §§ 50 a 58)]. De igual modo, considerou que a prorrogação automática da prisão preventiva, sem uma base legislativa clara, é contrária ao artigo 5.o, n.o 1, da CEDH (TEDH, 9 de março de 2006, Svipsta c. Letónia (EC:ECHR:2006:0309JUD006682001, § 86). Em contrapartida, o TEDH declarou que manter uma pessoa detida com base num acórdão de uma secção de acusação, que exige que sejam fornecidas informações adicionais, sem que a manutenção da detenção tenha sido objeto de uma decisão formal, não constitui uma violação do artigo 5.o da CEDH [TEDH, 8 de novembro de 2001, Laumont c. França (EC:ECHR:2001:1108JUD004362698), § 50]. Por último, a ausência de uma justificação satisfatória quanto à substituição da base jurídica de uma detenção pode conduzir à violação do artigo 5.o, n.o 1, da CEDH [TEDH, 1 de julho de 2008, Calmanovici c. Roménia (EC:ECHR:2008:0701JUD004225002, § 65)].

( 54 ) V. Acórdãos de 30 de maio de 2013, Arslan (C‑534/11, EU:C:2013:343, n.o 60), e de 6 de dezembro de 2011, Achughbabian (C‑329/11, EU:C:2011:807, n.o 30).

( 55 ) O sublinhado é meu.

( 56 ) O sublinhado é meu.

( 57 ) V. Artigo 15.o, n.o 2, terceiro parágrafo, alíneas a) e b), da Diretiva Regresso. A Comissão considera que, na prática, quando a detenção é decretada por autoridades administrativas (por exemplo, pela polícia), os prazos para um controlo jurisdicional célere variam entre 24 e 72 horas.

( 58 ) V. Definição que consta do Dicionário Larousse, disponível no seguinte endereço: https://www.larousse.fr/dictionnaires/francais/imm%C3%A9diat/41685.

( 59 ) V. TEDH, 8 de abril de 2004, Assanidzé c. Geórgia (CE:ECHR:2004:0408JUD007150301, §§ 173 a 175). Segundo o TEDH, «a detenção de uma pessoa por um prazo indefinido e imprevisível, sem que essa detenção se baseie numa disposição legal concreta ou numa decisão judicial, é incompatível com o princípio da segurança jurídica, é arbitrária e contraria os elementos fundamentais do Estado de Direito».

( 60 ) V. TEDH, 4 de junho de 2015, Ruslan Yakovenko c. Ucrânia (CE:ECHR:2015:0604JUD000542511, a seguir «AcórdãoYakovenko», § 68).

( 61 ) V. Acórdão Yakovenko (atraso de 2 dias) e de 22 de março de 1995, e Quinn c. França (CE:ECHR:1995:0322JUD001858091, §§ 39 a 43) (atraso de 11 horas).

( 62 ) V. TEDH, 21 de setembro de 2021, Kerem Çiftçi c. Turquia (CE:ECHR:2021:0921JUD003520509, §§ 32 a 34), em que o requerente tinha sido detido ilegalmente durante cerca de uma hora e meia.

( 63 ) Acórdão de 6 de dezembro de 2011, Achughbabian (C‑329/11, EU:C:2011:807, n.o 31).

( 64 ) V., neste sentido, Conclusões do advogado‑geral M. Wathelet no processo Arslan (C‑534/11, EU:C:2013:52, n.o 73).

( 65 ) Na audiência, a Comissão referiu que o prazo máximo de 48 horas parece corresponder à duração média praticada nos Estados‑Membros.

( 66 ) Por analogia, o Tribunal de Justiça declarou que nem toda e qualquer violação do direito de ser ouvido é suscetível de ferir sistematicamente de ilegalidade a decisão tomada, na aceção do artigo 15.o, n.o 2, último parágrafo, da Diretiva Regresso, nem, por conseguinte, implica automaticamente a libertação do nacional em questão [Acórdão de 10 de setembro de 2013, G. e R. (C‑383/13 PPU, EU:C:2013:533, n.os 39 e 40].

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