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Document 62023CO0278

Despacho do Tribunal de Justiça (Sétima Secção) de 8 de janeiro de 2024.
M.M. contra Ministero della Difesa.
Pedido de decisão prejudicial apresentado pela Corte suprema di cassazione.
Reenvio prejudicial — Artigo 99.o do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça — Diretiva 1999/70/CE — Acordo‑Quadro CES, UNICE e CEEP relativo a contratos de trabalho a termo — Artigo 5.o — Contratos de trabalho a termo no setor público — Contratos sucessivos — Proibição de conversão dos contratos de trabalho a termo num contrato sem termo — Ensino de disciplinas não militares em escolas militares.
Processo C-278/23.

Court reports – general

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2024:111

 DESPACHO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Sétima Secção)

8 de janeiro de 2024 ( *1 )

«Reenvio prejudicial — Artigo 99.o do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça — Diretiva 1999/70/CE — Acordo‑Quadro CES, UNICE e CEEP relativo a contratos de trabalho a termo — Artigo 5.o — Contratos de trabalho a termo no setor público — Contratos sucessivos — Proibição de conversão dos contratos de trabalho a termo num contrato sem termo — Ensino de disciplinas não militares em escolas militares»

No processo C‑278/23 [Biltena] ( i ),

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pela Corte suprema di cassazione (Tribunal de Cassação, Itália), por Decisão de 27 de abril de 2023, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 28 de abril de 2023, no processo

M.M., na qualidade de sucessor de M.R.,

contra

Ministero della Difesa,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Sétima Secção),

composto por: F. Biltgen (relator), presidente de secção, N. Wahl e J. Passer, juízes,

advogado‑geral: M. Szpunar,

secretário: A. Calot Escobar,

vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de decidir por despacho fundamentado, nos termos do artigo 99.o do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça,

profere o presente

Despacho

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 5.o do Acordo‑Quadro relativo a contratos de trabalho a termo, celebrado em 18 de março de 1999 (a seguir «Acordo‑Quadro»), anexo à Diretiva 1999/70/CE do Conselho, de 28 de junho de 1999, respeitante ao Acordo‑Quadro CES, UNICE e CEEP relativo a contratos de trabalho a termo (JO 1999, L 175, p. 43).

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe M.M., na qualidade de sucessor de M.R., ao Ministero della Difesa (Ministério da Defesa, Itália) (a seguir «Ministério») a respeito das consequências a retirar da sucessiva celebração de contratos de trabalho a termo entre M.R. e este Ministério no período compreendido entre 1987 e 2007.

Quadro jurídico

Direito da União

3

O preâmbulo do acordo‑quadro enuncia no segundo parágrafo:

«As partes signatárias deste acordo reconhecem que os contratos de trabalho sem termo são e continuarão a ser a forma mais comum no que diz respeito à relação laboral entre empregadores e trabalhadores. Reconhecem ainda que os contratos de trabalho a termo respondem, em certas circunstâncias, às necessidades tanto dos empregadores como dos trabalhadores.»

4

Nos termos do terceiro parágrafo do preâmbulo deste Acordo‑Quadro:

«O presente acordo estabelece os princípios gerais e os requisitos mínimos relativos aos contratos de trabalho a termo, reconhecendo que a sua aplicação pormenorizada deve ter em conta a realidade e especificidades das situações nacionais, setoriais e sazonais. Afirma ainda a vontade dos parceiros sociais em estabelecerem um quadro‑geral que garanta a igualdade de tratamento em relação aos trabalhadores contratados a termo, protegendo‑os contra discriminações e a utilização dos contratos de trabalho a termo numa base aceitável tanto para empregadores como para trabalhadores.»

5

Os pontos 6 a 8 e 10 das considerações gerais do Acordo‑Quadro têm a seguinte redação:

«6.

Considerando que os contratos de trabalho de duração indeterminada constituem a forma comum da relação laboral, contribuindo para a qualidade de vida dos trabalhadores e a melhoria do seu desempenho;

7.

Considerando que a utilização de contratos a termo com base em razões objetivas constitui uma forma de evitar abusos;

8.

Considerando que os contratos a termo constituem uma característica do emprego em certos setores, ocupações e atividades, podendo ser da conveniência tanto dos empregadores como dos trabalhadores;

[…]

10.

Considerando que o presente acordo remete para os Estados‑Membros e para os parceiros sociais a definição das modalidades de aplicação dos seus princípios gerais, requisitos e disposições mínimas a fim de ser considerada a situação em cada Estado‑Membro e as circunstâncias de setores e ocupações concretos, incluindo as atividades de caráter sazonal.»

6

O artigo 2.o do Acordo‑Quadro, sob a epígrafe «Âmbito de aplicação», prevê, no seu n.o 1:

«O presente acordo é aplicável aos trabalhadores contratados a termo ou partes numa relação laboral, nos termos definidos pela lei, convenções coletivas ou práticas vigentes em cada Estado‑Membro.»

7

O artigo 3.o, n.o 1, do Acordo‑Quadro dispõe:

 

«Para efeitos do presente acordo, entende‑se por “trabalhador contratado a termo” o trabalhador titular de um contrato de trabalho ou de uma relação laboral concluído diretamente entre um empregador e um trabalhador cuja finalidade seja determinada por condições objetivas, tais como a definição de uma data concreta, de uma tarefa específica ou de um certo acontecimento.»

8

O artigo 5.o do Acordo‑Quadro, sob a epígrafe «Disposições para evitar os abusos», dispõe:

«1.

Para evitar os abusos decorrentes da conclusão de sucessivos contratos de trabalho ou relações laborais a termo e sempre que não existam medidas legais equivalentes para a sua prevenção, os Estados‑Membros, após consulta dos parceiros sociais e de acordo com a lei, acordos coletivos ou práticas nacionais, e/ou os parceiros sociais deverão introduzir, de forma a que se tenham em conta as necessidades de setores e/ou categorias de trabalhadores específicos, uma ou várias das seguintes medidas:

a)

Razões objetivas que justifiquem a renovação dos supramencionados contratos ou relações laborais;

b)

Duração máxima total dos sucessivos contratos de trabalho ou relações laborais a termo;

c)

Número máximo de renovações dos contratos ou relações laborais a termo.

2.

Os Estados‑Membros, após consulta dos parceiros sociais, e/ou os parceiros sociais, deverão, sempre que tal seja necessário, definirem que condições os contratos de trabalho ou relações de trabalho a termo deverão ser considerados:

a)

Como sucessivos;

b)

Como celebrados sem termo.»

9

O artigo 2.o, primeiro parágrafo, da Diretiva 1999/70 prevê:

«Os Estados‑Membros devem pôr em vigor as disposições legislativas, regulamentares e administrativas necessárias para dar cumprimento à presente diretiva até 10 de julho de 2001 ou devem certificar‑se, até esta data, de que os parceiros sociais puseram em prática as disposições necessárias por via de acordo, devendo os Estados‑Membros tomar qualquer disposição necessária para, em qualquer momento, poderem garantir os resultados impostos pela presente diretiva. Devem informar imediatamente a Comissão do facto.»

Direito italiano

10

O artigo 2.o, n.o 1, da legge n. 1023 — Conferimento di incarichi a docenti civili per l’insegnamento di materie non militari presso scuole, Istituti ed enti della Marina e dell’Aeronautica (Lei n.o 1023 — Nomeação de docentes civis para funções de ensino de disciplinas não militares em escolas, institutos e organismos da Marinha e da Força Aérea) de 15 de dezembro de 1969 (GURI n.o 6, de 8 de janeiro de 1970, p. 111) na sua versão aplicável aos factos do litígio (a seguir «Lei n.o 1023/1969»), dispunha:

«O ensino de disciplinas não militares nas escolas, institutos e organismos enumerados no artigo 1.o, primeiro parágrafo pode ser assegurado, mediante celebração de contratos anuais, por pessoal contratado entre os docentes [do quadro] ou [entre os docentes que não pertencem ao quadro] dos institutos e escolas do Estado, sob reserva da não oposição do Ministério da Educação, bem como por magistrados dos tribunais comuns, administrativos e militares e funcionários civis da Administração do Estado em exercício, ou por pessoal contratado externo à Administração do Estado. Os docentes do quadro que ministram o ensino referido no artigo 1.o com horário completo também podem ser contratados em regime de destacamento.»

11

O artigo 2.o, n.o 2, desta lei previa que os critérios e os procedimentos de seleção dos docentes e de determinação da remuneração deviam ser fixados por despacho ministerial.

12

A Lei n.o 1023/1969 foi revogada pelo artigo 2268.o, n.o 1, ponto 629, do decreto legislativo n. 66 sul Codice dell’ordinamento militare (Decreto Legislativo n.o 66, relativo ao Código Militar), de 15 de março de 2010 (GURI n.o 106, de 8 de maio de 2010) (a seguir «Decreto Legislativo n.o 66/2010»).

13

Nos termos do artigo 1531.o, n.o 1, do Decreto Legislativo n.o 66/2010, relativo à nomeação de professores civis para o ensino de disciplinas não militares nas escolas, institutos e organismos das Forças Armadas, é possível nomear pessoal externo à Administração do Estado para o ensino de disciplinas não militares, recorrendo à celebração de contratos anuais.

14

O artigo 1.o do Decreto ministeriale — Conferimento di incarichi a docenti civili per l’insegnanmento di materie non militari presso scuole, istituti ed enti della Marina e dell’Aeronautica (Decreto Ministerial relativo à nomeação de docentes civis para ensino de disciplinas não militares em escolas, institutos e organismos da Marinha e da Força Aérea), de 20 de dezembro de 1971 (GURI n.o 322, de 15 de dezembro de 1973, p. 8211, a seguir «Decreto Ministerial de 1971»), adotado em aplicação da Lei n.o 1023/1969, dispõe:

«O ensino de disciplinas não militares nas escolas, institutos e organismos da Marinha e da Força Aérea referidos na Lei [n.o 1023/1969] pode ser assegurado, mediante celebração de contratos anuais, por pessoal contratado entre os docentes do quadro ou entre os docentes que não pertencem ao quadro dos institutos e escolas do Estado, sob reserva da não oposição do Ministério da Educação, bem como por magistrados dos tribunais comuns, administrativos e militares e por funcionários civis da Administração do Estado em exercício, ou por pessoal contratado externo à Administração do Estado. Os docentes do quadro que ministram o ensino referido na Lei [n.o 1023/1969] com horário completo também podem ser contratados em regime de destacamento.»

15

Nos termos do artigo 4.o deste decreto ministerial, na segunda missão confiada a um professor que não pertença à Administração do Estado, a remuneração sofrerá uma redução de um terço.

16

O artigo 6.o do referido decreto ministerial dispunha:

«O pessoal contratado não pertencente à Administração do Estado, nomeado para exercer funções durante todo o ano letivo, tem direito, apenas relativamente ao período de desempenho efetivo, aos subsídios e abonos adicionais e aos benefícios de reforma, segurança social e assistência previstos para os docentes contratados nos estabelecimentos e escolas dependentes do Ministério da Educação».

17

O artigo 7.o do referido decreto dispõe:

«As funções de docência têm a duração máxima de um ano letivo».

18

O Decreto Ministerial de 1971 foi revogado pelo artigo 2269.o, n.o 1, ponto 204, do Decreto Legislativo n.o 66/2010.

19

O artigo 1.o do decreto legislativo n. 368 — Attuazione della direttiva 1999/70/CE relativa all’accordo quadro sul lavoro a tempo determinato concluso dall’UNICE, dal CEEP e dal CES (Decreto Legislativo n.o 368 — Transposição da Diretiva 1999/70/CE respeitante ao Acordo‑Quadro CES, UNICE e CEEP relativo a contratos a termo certo), de 6 de setembro de 2001 (GURI n.o 235, de 9 de outubro de 2001), na versão aplicável aos factos do processo principal (a seguir «Decreto Legislativo n.o 368/2001») previa, de forma geral, a possibilidade de estipulação de um termo para a duração de um contrato de trabalho por conta de outrem por razões técnicas, de produção, de organização ou de substituição.

20

O artigo 4.o deste decreto legislativo dispunha:

«1.   O contrato a termo só poderá ser prorrogado, com o consentimento do trabalhador, quando a duração inicial for inferior a três anos. Em tal caso, o contrato só poderá ser prorrogado uma vez, desde que essa prorrogação seja justificada por razões objetivas e se refira à mesma atividade laboral para a qual o contrato foi celebrado a termo. A relação a termo não poderá exceder três anos, no total, exclusivamente nessa situação.

2.   O ónus da prova da existência de motivos objetivos que justifiquem uma eventual prorrogação da duração do contrato cabe ao empregador.»

21

Nos termos do artigo 5.o, n.o 4, do referido decreto legislativo:

«No caso de duas contratações sucessivas a termo, isto é, sem que tenha havido uma quebra de continuidade, a relação de trabalho converter‑se‑á numa relação sem termo desde a data de celebração do primeiro contrato.»

22

Nos termos do artigo 36.o Decreto legislativo n.o 165 — Norme generali sull’ordinamento del lavoro alle dipendenze delle amministrazioni pubbliche (Decreto Legislativo n.o 165, relativo às Regras Gerais relativas à Organização do Trabalho na Administração Pública), de 30 de março de 2001 (Suplemento ordinário à GURI n.o 106, de 9 de maio de 2001), na sua versão aplicável aos factos no processo principal:

«1.   Para as exigências relacionadas com as suas necessidades correntes, a Administração Pública recruta exclusivamente através de contratos de trabalho por conta de outrem sem termo […].

2.   Para responder às exigências de natureza exclusivamente temporária e excecional, a Administração Pública pode recorrer a formas contratuais flexíveis de recrutamento e de emprego do pessoal, previstas no Código Civil e nas leis relativas às relações de trabalho na empresa […]

[…]

5.   A violação de disposições imperativas em matéria de recrutamento ou emprego de trabalhadores por parte da Administração Pública não pode conduzir à celebração de contratos de trabalho sem termo com essa Administração, sem prejuízo da responsabilidade e das sanções em que a mesma possa vir a incorrer. O trabalhador em causa tem direito à reparação do prejuízo resultante da prestação de trabalho efetuada em violação das disposições imperativas […].

[…]»

Litígio no processo principal e questões prejudiciais

23

Entre 1987 e 2007, M.R. ensinou disciplinas não militares, concretamente eletrónica e telecomunicação, na Aeronautica Militare (Força Aérea, Itália) ao abrigo de contratos de trabalho a termo, que começaram por ser renovados anualmente e que, desde 2004, passaram a ser renovados semestralmente.

24

No fim do seu último contrato a termo, M.R. intentou uma ação contra o Ministério, no Tribunale di Roma (Tribunal de Primeira Instância de Roma, Itália), pedindo que a celebração dos referidos contratos a termo fosse declarada ilegal e que lhe fossem pagas indemnizações.

25

Esse órgão jurisdicional julgou a ação procedente e declarou os contratos a termo celebrados após a data de entrada em vigor do Decreto Legislativo n.o 368/2001 ilegais, com o fundamento de que os mesmos não identificavam razões técnicas, organizacionais, de substituição ou de produção suscetíveis de justificar a estipulação de um termo nesses contratos. Além disso, condenou o Ministério a pagar a M.R. uma indemnização de montante equivalente a quinze meses de salário.

26

O Ministério interpôs recurso da sentença do Tribunale di Roma (Tribunal de Primeira Instância de Roma) para a Corte d’appello di Roma (Tribunal de Recurso de Roma, Itália), alegando que existia uma relação de trabalho independente e não uma relação de trabalho dependente, pelo que o Decreto Legislativo n.o 368/2001 não era aplicável. Segundo o Ministério, o processo principal rege‑se pelas disposições da Lei n.o 1023/1969 e do Decreto Ministerial de 1971, que permitem confiar a docentes que não pertencem à Administração do Estado missões anuais de ensino.

27

A Corte d’appello di Roma (Tribunal de Recurso de Roma) confirmou a sentença proferida em primeira instância no que respeita à existência de uma relação de trabalho entre M.R. e o Ministério, em razão, nomeadamente, de cláusulas contratuais relativas à concessão do décimo terceiro mês de salário, a férias pagas, a indemnizações por despedimento, a prestações familiares e ao pagamento de contribuições para a segurança social. Anulou contudo essa sentença quanto ao restante, declarando que a situação em causa no processo principal se regia por normas especiais, baseadas na natureza particular das escolas da Marinha e da Força Aérea, bem como nas competências específicas dos professores que não pertencem à Administração do Estado contratados nessas escolas.

28

M.R. interpôs recurso do Acórdão da Corte d’appello di Roma (Tribunal de Recurso de Roma) perante a Corte suprema di cassazione (Supremo Tribunal de Cassação, Itália), órgão jurisdicional de reenvio.

29

Este órgão jurisdicional recorda que, segundo a sua própria jurisprudência, as relações de trabalho, com base em contratos anuais, com pessoal que não pertence à Administração do Estado, têm natureza de relação de trabalho dependente.

30

No que respeita à celebração ilegal de sucessivos contratos a termo, o órgão jurisdicional de reenvio recorda que, em caso de recurso abusivo a contratos a termo, o trabalhador apenas tem direito ao ressarcimento do prejuízo sofrido ao abrigo do artigo 36.o, n.o 5, do Decreto Legislativo n.o 165, de 30 de março de 2001, na versão aplicável aos factos no processo principal, uma vez que a conversão dos contratos de trabalho a termo num contrato de trabalho sem termo é proibida por essa disposição, considerada conforme com o direito da União pelo Tribunal de Justiça no seu Acórdão de 7 de março de 2018, Santoro (C‑494/16, EU:C:2018:166).

31

Ainda que o Tribunal de Justiça já tenha proferido vários acórdãos relativos à celebração de contratos a termo na Administração Pública, nomeadamente os Acórdãos de 4 de julho de 2006, Adeneler e o. (C‑212/04, EU:C:2006:443); de 7 de setembro de 2006, Marrosu e Sardino (C‑53/04, EU:C:2006:517); de 8 de setembro de 2011, Rosado Santana (C‑177/10, EU:C:2011:557); de 26 de novembro de 2014, Mascolo e o. (C‑22/13, C‑61/13 a C‑63/13 e C‑418/13, EU:C:2014:2401); e de 25 de outubro de 2018, Sciotto (C‑331/17, EU:C:2018:859), o órgão jurisdicional de reenvio considera necessário submeter um pedido prejudicial ao Tribunal de Justiça, uma vez que, em seu entender, subsiste uma dúvida quanto à interpretação do artigo 5.o do Acordo‑Quadro relativamente às escolas, aos institutos e aos organismos militares.

32

Nestas circunstâncias, a Corte suprema di cassazione (Supremo Tribunal de Cassação) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1.

Deve o artigo 5.o[…] do Acordo‑Quadro […] ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação nacional, como a italiana, contida no artigo 2.o, n.o 1, da Lei [n.o1023/1969], e no artigo 1.o do Decreto Ministerial [de 1971], que prevê a nomeação anual (na aceção do artigo 7.o do Decreto Ministerial, [de 1971], “pela duração máxima de um ano letivo”) de pessoal civil externo à Administração do Estado para o exercício de funções de ensino de disciplinas não militares em escolas, institutos e organismos da Marinha e da Força Aérea, sem prever que sejam indicadas as razões objetivas que justificam a renovação desses contratos (expressamente prevista no artigo 4.o do mesmo Decreto Ministerial, que prevê uma diminuição da retribuição para a segunda nomeação), a duração total máxima dos contratos a termo e o limite máximo das renovações, e sem prever a possibilidade de esses docentes obterem o ressarcimento dos danos eventualmente sofridos em razão da renovação em causa, tendo além do mais em conta que não existe um quadro de docentes dessas escolas ao qual possam aceder?

2.

Constituem as exigências de organização do sistema de institutos, escolas e organismos da Marinha e da Força Aérea razões objetivas, na aceção do artigo 5.o, n.o 1, [do Acordo‑Quadro], suscetíveis de tornar compatível com o direito da União Europeia uma legislação como a italiana, acima referida, que, em caso de nomeação de pessoal externo aos referidos institutos, escolas e organismos militares para o exercício de funções de ensino, não prevê requisitos de recurso ao trabalho a termo em conformidade com a Diretiva [1999/70] e com o Acordo‑Quadro anexo, nem um direito ao ressarcimento dos danos?»

Quanto às questões prejudiciais

33

Nos termos do artigo 99.o do seu Regulamento de Processo, quando a resposta a uma questão submetida a título prejudicial possa ser claramente deduzida da jurisprudência ou quando a resposta a tal questão não suscite nenhuma dúvida razoável, o Tribunal de Justiça pode, a qualquer momento, mediante proposta do juiz‑relator, ouvido o advogado‑geral, decidir pronunciar‑se por meio de despacho fundamentado.

34

Importa aplicar esta disposição no presente processo.

35

Com as suas duas questões, que importa examinar em conjunto, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, por um lado, se o artigo 5.o do Acordo‑Quadro deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação nacional que exclui o pessoal civil, responsável pelo ensino de disciplinas não militares em escolas militares, do âmbito de aplicação de normas destinadas a sancionar o recurso abusivo a sucessivos contratos a termo e, por outro, se as exigências de organização destas escolas podem ser qualificadas de «razões objetivas» que justificam a renovação desses contratos, na aceção do artigo 5.o, n.o 1, alínea a), do Acordo‑Quadro.

36

A título preliminar, importa recordar que resulta da própria redação do artigo 2.o, n.o 1, do Acordo‑Quadro que o âmbito de aplicação deste último deve ser visto de forma ampla, uma vez que o referido artigo visa, de forma geral, os «trabalhadores contratados a termo ou partes numa relação laboral, nos termos definidos pela lei, convenções coletivas ou práticas vigentes em cada Estado‑Membro». Além disso, a definição do conceito de «trabalhador contratado a termo» na aceção do artigo 3.o, n.o 1, do Acordo‑Quadro abrange todos os trabalhadores, sem distinção consoante a natureza pública ou privada do empregador a que estão vinculados (Acórdão de 13 de janeiro de 2022, MIUR e Ufficio Scolastico Regionale per la Campania, C‑282/19, EU:C:2022:3, n.o 69 e jurisprudência referida).

37

Dado que não exclui nenhum setor específico do seu âmbito de aplicação, o Acordo‑Quadro também é aplicável ao pessoal recrutado no setor do ensino em estabelecimentos públicos (Acórdão de 13 de janeiro de 2022, MIUR e Ufficio Scolastico Regionale per la Campania, C‑282/19, EU:C:2022:3, n.o 70 e jurisprudência referida).

38

No caso em apreço, o órgão jurisdicional de reenvio indicou expressamente que as relações jurídicas com o pessoal civil recrutado para o ensino de disciplinas não militares nas escolas, nos institutos e nos organismos da Marinha e da Força Aérea têm natureza de trabalho dependente. Daqui resulta que um trabalhador como M.R. está abrangido pelo âmbito de aplicação do Acordo‑Quadro.

39

A respeito do artigo 5.o do Acordo‑Quadro, importa recordar que esta disposição procura implementar um dos objetivos prosseguidos pelo acordo, a saber, o de enquadrar o recurso sucessivo aos contratos ou relações laborais a termo, que é considerado uma fonte potencial de abusos em prejuízo dos trabalhadores, mediante a previsão de um certo número de normas de proteção mínima destinadas a evitar a precarização da situação dos trabalhadores dependentes (v., nomeadamente, Acórdãos de 25 de outubro de 2018, Sciotto, C‑331/17, EU:C:2018:859, n.o 30 e jurisprudência referida, e de 13 de janeiro de 2022, MIUR e Ufficio Scolastico Regionale per la Campania, C‑282/19, EU:C:2022:3, n.o 76 e jurisprudência referida).

40

Com efeito, como resulta do segundo parágrafo do preâmbulo do Acordo‑Quadro e dos n.os 6 a 8 das considerações gerais do mesmo, a estabilidade do emprego é concebida como um elemento da maior importância para a proteção dos trabalhadores, sendo que os contratos de trabalho a termo apenas em certas circunstâncias são suscetíveis de dar resposta tanto às necessidades dos empregadores como dos trabalhadores (v., nomeadamente, Acórdãos de 25 de outubro de 2018, Sciotto, C‑331/17, EU:C:2018:859, n.o 31 e jurisprudência referida, e de 13 de janeiro de 2022, MIUR e Ufficio Scolastico Regionale per la Campania, C‑282/19, EU:C:2022:3, n.o 77 e jurisprudência referida).

41

Por conseguinte, com vista a prevenir a utilização abusiva de sucessivos contratos de trabalho ou relações laborais a termo, o artigo 5.o, n.o 1, do Acordo‑Quadro exige que os Estados‑Membros adotem de forma efetiva e coerciva uma ou várias das medidas que enumera, sempre que o direito nacional desses Estados não preveja medidas legislativas equivalentes. As três medidas enumeradas no n.o 1, alíneas a) a c), do referido artigo referem‑se, respetivamente, a razões objetivas que justifiquem a renovação desses contratos ou dessas relações laborais a termo, à duração máxima total desses sucessivos contratos de trabalho ou relações laborais e ao número máximo de renovações dos mesmos (v., nomeadamente, Acórdãos de 25 de outubro de 2018, Sciotto, C‑331/17, EU:C:2018:859, n.o 32 e jurisprudência referida, e de 13 de janeiro de 2022, MIUR e Ufficio Scolastico Regionale per la Campania, C‑282/19, EU:C:2022:3, n.o 78 e jurisprudência referida).

42

Os Estados‑Membros dispõem de uma margem de apreciação a este respeito, uma vez que podem optar por recorrer a uma ou várias medidas enunciadas no artigo 5.o, n.o 1, alíneas a) a c), do Acordo‑Quadro ou ainda a medidas legais equivalentes já existentes. Assim sendo, o artigo 5.o, n.o 1, do Acordo‑Quadro impõe um objetivo geral aos Estados‑Membros, que consiste na prevenção desses abusos, deixando‑lhes, no entanto, a possibilidade de escolherem os meios para o alcançar, desde que os Estados não ponham em causa o objetivo ou o efeito útil do Acordo‑Quadro (v., neste sentido, nomeadamente, Acórdãos de 25 de outubro de 2018, Sciotto, C‑331/17, EU:C:2018:859, n.os 33 e 34 e jurisprudência referida, e de 13 de janeiro de 2022, MIUR e Ufficio Scolastico Regionale per la Campania, C‑282/19, EU:C:2022:3, n.o 79 e jurisprudência referida).

43

Conforme resulta do artigo 5.o, n.o 1, do Acordo‑Quadro e em conformidade com o terceiro parágrafo do preâmbulo e com os pontos 8 e 10 das suas Considerações Gerais, é no contexto da aplicação do Acordo‑Quadro que os Estados‑Membros têm a faculdade, desde que o justifiquem objetivamente, de ter em conta as necessidades de setores de atividades e/ou de categorias de trabalhadores específicos (v., nomeadamente, Acórdãos de 25 de outubro de 2018, Sciotto, C‑331/17, EU:C:2018:859, n.o 35 e jurisprudência referida, e de 13 de janeiro de 2022, MIUR e Ufficio Scolastico Regionale per la Campania, C‑282/19, EU:C:2022:3, n.o 80 e jurisprudência referida).

44

Por outro lado, o artigo 5.o do Acordo‑Quadro não prevê sanções específicas caso se constate que, não obstante, houve abusos. Neste caso, cabe às autoridades nacionais adotar medidas que revistam um caráter proporcionado mas também suficientemente eficaz e dissuasivo de forma que garanta a plena eficácia das normas adotadas em aplicação do Acordo‑Quadro (Acórdão de 13 de janeiro de 2022, MIUR e Ufficio Scolastico Regionale per la Campania, C‑282/19, EU:C:2022:3, n.o 81 e jurisprudência referida).

45

Importa com efeito recordar que o Tribunal de Justiça considerou, no essencial, que uma legislação nacional que prevê uma norma imperativa segundo a qual, em caso de recurso abusivo a contratos de trabalho a termo, estes últimos se convertem numa relação laboral sem termo, é suscetível de conter uma medida que sanciona efetivamente o recurso abusivo a tais contratos (Acórdão de 8 de maio de 2019, Rossato e Conservatorio di Musica F.A. Bonporti, C‑494/17, EU:C:2019:387, n.o 40 e jurisprudência referida).

46

Todavia, o artigo 5.o do Acordo‑Quadro não prevê uma obrigação geral de os Estados‑Membros preverem a conversão dos contratos de trabalho a termo num contrato sem termo. Com efeito, o artigo 5.o, n.o 2, do Acordo‑Quadro atribui, em princípio, aos Estados‑Membros, a tarefa de determinar em que condições os contratos ou as relações laborais a termo são considerados como tendo sido celebrados sem termo. Daqui resulta que o Acordo‑Quadro não prevê as condições de recurso a contratos sem termo (v., nomeadamente, Acórdãos de 25 de outubro de 2018, Sciotto, C‑331/17, EU:C:2018:859, n.o 59 e jurisprudência referida, e de 13 de janeiro de 2022, MIUR e Ufficio Scolastico Regionale per la Campania, C‑282/19, EU:C:2022:3, n.o 82 e jurisprudência referida).

47

Assim, para que uma legislação nacional como a que está em causa no processo principal, que proíbe a conversão de sucessivos contratos de trabalho a termo num contrato de trabalho sem termo, possa ser considerada conforme com o Acordo‑Quadro, a ordem jurídica interna do Estado‑Membro em causa deve prever outra medida eficaz para o setor em causa de forma que evite e, sendo caso disso, sancione, a utilização abusiva de sucessivos contratos a termo (v., nomeadamente, Acórdãos de 25 de outubro de 2018, Sciotto, C‑331/17, EU:C:2018:859, n.o 60 e jurisprudência referida, e de 13 de janeiro de 2022, MIUR e Ufficio Scolastico Regionale per la Campania, C‑282/19, EU:C:2022:3, n.o 83 e jurisprudência referida).

48

Além disso, o Acordo‑Quadro não impõe que, em caso de recurso abusivo a contratos de trabalho a termo, os Estados‑Membros prevejam uma cumulação de medidas no sentido de que o direito a indemnização acresce à transformação da relação laboral a termo em relação laboral sem termo (v., neste sentido, Acórdão de 8 de maio de 2019, Rossato e Conservatorio di Musica F.A. Bonporti, C‑494/17, EU:C:2019:387, n.os 41 e 45).

49

No que diz respeito à reparação do prejuízo sofrido enquanto medida que sanciona efetivamente o recurso abusivo a contratos de trabalho a termo, o princípio da reparação e o princípio da proporcionalidade exigem que os Estados‑Membros prevejam uma reparação adequada, que vá além de uma indemnização puramente simbólica, sem no entanto ultrapassar a compensação na íntegra (v., neste sentido, Acórdão de 8 de maio de 2019, Rossato e Conservatorio di Musica F.A. Bonporti, C‑494/17, EU:C:2019:387, n.os 42 e 43).

50

Por outro lado, o Tribunal de Justiça declarou que o artigo 5.o do Acordo‑Quadro deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a uma legislação nacional que, por um lado, não sanciona a utilização abusiva de contratos a termo sucessivos por parte de um empregador do setor público, mediante a previsão do pagamento ao trabalhador em causa de uma indemnização destinada a compensar a não conversão da relação laboral a termo numa relação laboral sem termo, mas que, por outro, prevê que seja concedida ao trabalhador uma indemnização de um valor compreendido entre 2,5 e 12 salários da sua última remuneração, acrescida da possibilidade de este último obter a reparação integral do prejuízo se fizer prova da perda de oportunidades de encontrar um emprego, desde que essa legislação seja acompanhada de um mecanismo sancionatório efetivo e dissuasor, o que compete ao órgão jurisdicional de reenvio verificar (Acórdão de 7 de março de 2018, Santoro, C‑494/16, EU:C:2018:166, n.o 54).

51

Por conseguinte, se, no caso em apreço, se concluir que a legislação nacional em causa no processo principal não prevê nenhuma outra medida efetiva com vista a prevenir e sancionar os eventuais abusos identificados em relação ao pessoal do setor do ensino público em causa, tal situação é suscetível de prejudicar o objetivo e o efeito útil do artigo 5.o do Acordo‑Quadro (v., neste sentido, Acórdão de 13 de janeiro de 2022, MIUR e Ufficio Scolastico Regionale per la Campania, C‑282/19, EU:C:2022:3, n.o 85).

52

Por último, importa recordar que não cabe ao Tribunal de Justiça pronunciar‑se sobre a interpretação do direito nacional, dado que essa missão incumbe exclusivamente ao órgão jurisdicional de reenvio. No entanto, quando se pronuncia a título prejudicial, o Tribunal de Justiça pode dar esclarecimentos com vista a guiar o órgão jurisdicional na apreciação da questão de saber se as disposições da legislação nacional aplicável satisfazem as exigências previstas no artigo 5.o do Acordo‑Quadro (v., neste sentido, Acórdão de 24 de junho de 2021, Obras y Servicios Públicos e Aciona Agua, C‑550/19, EU:C:2021:514, n.os 50 e 52).

53

Resulta da decisão de reenvio, por um lado, que a legislação nacional em causa no processo principal permite que as escolas da Marinha e da Força Aérea recrutem pessoal civil docente de disciplinas não militares através de sucessivos contratos de trabalho a termo, sem prever nenhum dos limites referidos no artigo 5.o, n.o 1, alíneas b) e c), do Acordo‑Quadro quanto à duração máxima total desses contratos ou ao número de renovações dos mesmos, e, por outro, que os contratos de trabalho a termo celebrados no referido setor de ensino estão excluídos do âmbito de aplicação das disposições nacionais que permitem que esses contratos, sucessivamente celebrados além de uma determinada duração, se convertam num contrato de trabalho sem termo, bem como, sendo caso disso, que os danos sofridos devido a essa sucessão de contratos sejam reparados.

54

Nestas circunstâncias, há que verificar se o recurso a sucessivos contratos de trabalho a termo no setor do ensino de disciplinas não militares nas escolas da Marinha e da Força Aérea, por pessoal civil, pode ser justificado pela existência de razões objetivas no direito nacional, na aceção do artigo 5.o, n.o 1, alínea a), do Acordo‑Quadro, e, mais especificamente, se a natureza específica das escolas da Marinha e da Força Aérea, bem como as competências específicas dos professores empregados por essas escolas, podem constituir tal razão objetiva.

55

Com efeito, como indica o ponto 7 das considerações gerais do Acordo‑Quadro, as partes signatárias consideraram que a utilização de contratos a termo com base em «razões objetivas» é um meio de evitar abusos (v., nomeadamente, Acórdãos de 25 de outubro de 2018, Sciotto, C‑331/17, EU:C:2018:859, n.o 38 e jurisprudência referida, e de 13 de janeiro de 2022, MIUR e Ufficio Scolastico Regionale per la Campania, C‑282/19, EU:C:2022:3, n.o 92 e jurisprudência referida).

56

O conceito de «razões objetivas», na aceção do artigo 5.o, n.o 1, alínea a), do Acordo‑Quadro, deve ser interpretado no sentido de que tem por objeto circunstâncias precisas e concretas que caracterizam uma atividade determinada e que, por conseguinte, num contexto específico, são suscetíveis de justificar a celebração de sucessivos contratos a termo. Essas circunstâncias podem resultar, nomeadamente, da natureza particular das tarefas para cuja realização esses contratos foram celebrados e das características inerentes a essas tarefas ou, eventualmente, da prossecução de um objetivo legítimo de política social de um Estado‑Membro (v., nomeadamente, Acórdãos de 25 de outubro de 2018, Sciotto, C‑331/17, EU:C:2018:859, n.o 39 e jurisprudência referida, e de 13 de janeiro de 2022, MIUR e Ufficio Scolastico Regionale per la Campania, C‑282/19, EU:C:2022:3, n.o 93 e jurisprudência referida).

57

Em contrapartida, uma legislação nacional que, de forma geral e abstrata, se limite a autorizar, por via legislativa ou regulamentar, o recurso a sucessivos contratos de trabalho a termo, não é conforme com as exigências detalhadas no número anterior. Com efeito, tal legislação não permite identificar critérios objetivos e transparentes destinados a verificar se a renovação dos referidos contratos responde de facto a uma verdadeira necessidade, é suscetível de alcançar o objetivo prosseguido e é necessária para esse efeito. Tal legislação comporta, por conseguinte, um risco real de provocar um recurso abusivo a esse tipo de contratos, não sendo, por isso, nem compatível com o objetivo nem com o efeito útil do Acordo‑Quadro (v., nomeadamente, Acórdãos de 25 de outubro de 2018, Sciotto, C‑331/17, EU:C:2018:859, n.o 40 e jurisprudência referida, e de 13 de janeiro de 2022, MIUR e Ufficio Scolastico Regionale per la Campania, C‑282/19, EU:C:2022:3, n.o 94 e jurisprudência referida).

58

Mais especificamente no que se refere ao setor do ensino, é possível que a elaboração de um programa anual de aulas envolva necessidades provisórias em matéria de recrutamento, sendo que a contratação temporária de um trabalhador para satisfazer necessidades provisórias e específicas do empregador em termos de pessoal pode, em princípio, constituir uma «razão objetiva», na aceção do artigo 5.o, n.o 1, alínea a), do Acordo‑Quadro (V., por exemplo, Acórdão de 25 de outubro de 2018, Sciotto (C‑331/17, EU:C:2018:859, n.o 47 e jurisprudência referida).

59

Em contrapartida, a renovação de contratos de trabalho a termo com vista ao desempenho, de forma permanente e duradoura, de tarefas que integram a atividade normal do setor em causa, não pode ser admitida.

60

A este respeito, a observância do disposto no artigo 5.o, n.o 1, alínea a), do Acordo‑Quadro exige que se averigue concretamente se a renovação de sucessivos contratos de trabalho a termo se destina a cobrir necessidades provisórias e se a disposição de direito nacional, como a que está em causa no processo principal, não está, na prática, a ser utilizada para satisfazer necessidades permanentes e duradouras do empregador em matéria de pessoal (v., neste sentido, nomeadamente, Acórdãos de 25 de outubro de 2018, Sciotto, C‑331/17, EU:C:2018:859, n.o 50, e de 24 de junho de 2021, Obras y Servicios Públicos e Aciona Agua, C‑550/19, EU:C:2021:514, n.o 63 e jurisprudência referida).

61

No que respeita ao argumento relativo à natureza específica das escolas da Marinha e da Força Aérea, importa salientar que, embora o ensino de disciplinas sobre dados militares sensíveis possa ser considerado um objetivo digno de proteção constitucional, não decorre todavia dos autos de que dispõe o Tribunal de Justiça que a prossecução deste objetivo implique que os empregadores do setor do ensino militar apenas contratem pessoal a termo. Com efeito, por um lado, no caso concreto, está em causa pessoal civil que foi chamado a ensinar disciplinas não militares e, por outro, parece ser em todo o caso mais adequado, em termos de proteção de dados sensíveis, fidelizar o pessoal através de contratos de trabalho sem termo.

62

Quanto às exigências em matéria de competência do pessoal, cujo recrutamento depende de conhecimentos em frequente evolução, que são de natureza diversificada e estão sujeitos a constante atualização devido à evolução das tecnologias e dos equipamentos militares utilizados nesse domínio específico, não resulta dos autos de que o Tribunal de Justiça dispõe que as disciplinas ensinadas por M.R. fossem específicas, nem por que razão os conhecimentos exigidos teriam originado uma necessidade meramente provisória em termos de pessoal.

63

Verifica‑se, pelo contrário, que os diferentes contratos de trabalho a termo com base nos quais M.R foi contratado deram lugar ao desempenho de tarefas semelhantes durante vários anos, pelo que essa relação de trabalho pode ter satisfeito uma necessidade não provisória, mas, ao invés, duradoura, o que cabe ao órgão jurisdicional de reenvio aferir.

64

A este respeito, cabe igualmente ao órgão jurisdicional de reenvio verificar se, no setor do ensino militar, são atribuídas indemnizações pela cessação das relações laborais aos trabalhadores contratados a termo, se, nesse caso, essas indemnizações são adequadas para evitar, e, se necessário, sancionar, os abusos decorrentes da utilização de sucessivos contratos de trabalho ou relações laborais a termo, e se tais indemnizações podem ser qualificadas de «medida legal equivalente», na aceção do artigo 5.o, n.o 1, do Acordo‑Quadro.

65

Tendo em conta as considerações precedentes, há que responder às questões submetidas que o artigo 5.o do Acordo‑Quadro deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação nacional que exclui o pessoal civil, responsável pelo ensino de disciplinas não militares em escolas militares, do âmbito de aplicação de normas destinadas a sancionar o recurso abusivo a sucessivos contratos a termo, sempre que essa legislação não inclua outras medidas efetivas para evitar e, sendo caso disso, sancionar, a utilização abusiva de sucessivos contratos a termo. Motivos que se prendam com exigências de organização dessas escolas não são suscetíveis de constituir «razões objetivas» que justifiquem a renovação desses contratos com esse pessoal responsável pelo ensino dessas disciplinas, na aceção do artigo 5.o, n.o 1, alínea a), do referido Acordo‑Quadro.

Quanto às despesas

66

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Sétima Secção) declara:

 

O artigo 5.o do Acordo‑Quadro relativo a contratos de trabalho a termo, celebrado em 18 de março de 1999, que figura no anexo da Diretiva 1999/70/CE do Conselho, de 28 de junho de 1999, respeitante ao Acordo‑Quadro CES, UNICE e CEEP relativo a contratos de trabalho a termo,

 

deve ser interpretado no sentido de que:

 

se opõe a uma legislação nacional que exclui o pessoal civil, responsável pelo ensino de disciplinas não militares em escolas militares, do âmbito de aplicação de normas destinadas a sancionar o recurso abusivo a sucessivos contratos a termo, sempre que essa legislação não inclua outras medidas efetivas para evitar e, sendo caso disso, sancionar a utilização abusiva de sucessivos contratos a termo. Motivos que se prendam com exigências de organização dessas escolas não são suscetíveis de constituir «razões objetivas» que justifiquem a renovação desses contratos com esse pessoal responsável pelo ensino dessas disciplinas, na aceção do artigo 5.o, n.o 1, alínea a), do referido Acordo‑Quadro.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: italiano.

( i ) O nome do presente processo é um nome fictício. Não corresponde ao nome verdadeiro de nenhuma das partes no processo.

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