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Document 62023CJ0388

Acórdão do Tribunal de Justiça (Sexta Secção) de 12 de dezembro de 2024.
Golden Omega S.A contra Inspecteur van de Belastingdienst/Douane, kantoor Rotterdam Rijnmond.
Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Rechtbank Noord-Holland.
Reenvio prejudicial — União aduaneira — Regulamento (CEE) n.o 2658/87 — Pauta aduaneira comum — Classificação pautal — Nomenclatura combinada — Posição 1516 — Gorduras e óleos e respetivas frações — Óleo de peixe sob a forma de ésteres etílicos — Esterificação de ácidos gordos com etanol — Regulamento de Execução (UE) 2019/1661 — Validade.
Processo C-388/23.

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2024:1022

 ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Sexta Secção)

12 de dezembro de 2024 ( *1 )

«Reenvio prejudicial — União aduaneira — Regulamento (CEE) n.o 2658/87 — Pauta aduaneira comum — Classificação pautal — Nomenclatura combinada — Posição 1516 — Gorduras e óleos e respetivas frações — Óleo de peixe sob a forma de ésteres etílicos — Esterificação de ácidos gordos com etanol — Regulamento de Execução (UE) 2019/1661 — Validade»

No processo C‑388/23,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo rechtbank Noord‑Holland (Tribunal de Primeira Instância da Holanda do Norte, Países Baixos), por Decisão de 27 de junho de 2023, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 27 de junho de 2023, no processo

Golden Omega S.A.

contra

Inspecteur van de Belastingdienst/Douane, kantoor Rotterdam Rijnmond,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Sexta Secção),

composto por: T. von Danwitz, vice‑presidente do Tribunal de Justiça, exercendo funções de presidente da Sexta Secção, A. Kumin (relator) e I. Ziemele, juízes,

advogado‑geral: M. Szpunar,

secretário: A. Calot Escobar,

vistos os autos,

vistas as observações apresentadas:

em representação da Golden Omega S.A., por A. J. C. Lindsen e R. R. Ramautarsing, consultores fiscais,

em representação do Governo Neerlandês, por M. K. Bulterman e J. M. Hoogveld, na qualidade de agentes,

em representação da Comissão Europeia, por M. Salyková e F. van Schaik, na qualidade de agentes,

vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto, por um lado, a interpretação da posição 1516 da Nomenclatura Combinada que figura no anexo I do Regulamento (CEE) n.o 2658/87 do Conselho, de 23 de julho de 1987, relativo à nomenclatura pautal e estatística e à pauta aduaneira comum (JO 1987, L 256, p. 1), na sua versão resultante do Regulamento de Execução (UE) 2018/2012 da Comissão, de 11 de outubro de 2018 (JO 2018, L 273, p. 1) (a seguir «NC»), bem como, por outro, da validade do Regulamento de Execução (UE) 2019/1661 da Comissão, de 24 de setembro de 2019, relativo à classificação de determinadas mercadorias na Nomenclatura Combinada (JO 2019, L 251, p. 1).

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a Golden Omega S.A. ao Inspecteur van de Belastingdienst/Douane, kantoor Rotterdam Rijnmond (Inspetor da Administração Fiscal e Aduaneira, Estância Aduaneira de Roterdão/Rijnmond, Países Baixos) (a seguir «Inspetor da Administração Fiscal»), a respeito da classificação pautal, na NC, do óleo de peixe que se apresenta sob a forma de ésteres etílicos, com a denominação comercial «Fish Oil EE 1050».

Quadro jurídico

Direito internacional

SH

3

O Sistema Harmonizado de Designação e Codificação de Mercadorias (a seguir «SH») foi elaborado pelo Conselho de Cooperação Aduaneira, atual Organização Mundial das Alfândegas (a seguir «OMA»), instituído pela Convenção relativa à criação de um Conselho de Cooperação Aduaneira, celebrada em Bruxelas, em 15 de dezembro de 1950. O SH foi instituído pela Convenção Internacional sobre o Sistema Harmonizado de Designação e Codificação de Mercadorias, celebrada em Bruxelas, em 14 de junho de 1983 [Recueil des traités des Nations unies, vol. 1503, p. 4, n.o 25910 (1988)], e aprovada, com o seu Protocolo de Alteração de 24 de junho de 1986, em nome da Comunidade Económica Europeia, pela Decisão 87/369/CEE do Conselho, de 7 de abril de 1987 (JO 1987, L 198, p. 1) (a seguir «Convenção sobre o SH»).

4

A OMA aprova, nas condições fixadas no artigo 8.o da Convenção sobre o SH, as notas explicativas e os pareceres de classificação adotados pelo Comité do SH, instituído pelo artigo 6.o desta convenção.

5

Por força do artigo 3.o, n.o 1, alínea a), da Convenção do SH, cada parte contratante compromete‑se a alinhar as respetivas nomenclaturas pautais e estatísticas com o SH, primeiro, utilizando todas as posições e as subposições do SH, sem aditamentos nem modificações, bem como os respetivos códigos numéricos; segundo, aplicando as regras gerais para a interpretação do SH, bem como todas as notas de secção, de capítulos e de subposições sem alterar o respetivo âmbito e, terceiro, respeitando a ordem numérica do SH.

Notas explicativas publicadas pela OMA

6

As notas explicativas publicadas pela OMA e relativas ao capítulo 15 do SH indicam o seguinte:

«A) Este capítulo contém:

1)

Gorduras e óleos de origem animal, vegetal ou microbiana, em bruto, depurados, refinados ou objeto de qualquer tratamento (por exemplo, cozidos, sulfurados ou hidrogenados).

2)

Certos produtos derivados das gorduras ou dos óleos, nomeadamente os provenientes da sua dissociação, como o glicerol em bruto.

3)

Gorduras e óleos alimentares transformados, como a margarina.

4)

Ceras de origem animal ou vegetal.

5)

Resíduos provenientes do tratamento das substâncias gordas ou das ceras animais ou vegetais.

No entanto, estão excluídos deste capítulo:

[…]

e)

Ácidos gordos, óleos ácidos de refinação, álcoois gordos, glicerol (exceto glicerol em bruto), ceras preparadas, corpos gordos transformados em produtos farmacêuticos, tintas, vernizes, sabões, perfumaria ou toucador preparados ou em preparações cosméticas, óleos sulfonados e outros produtos derivados de gorduras abrangidos pela secção VI.

[…]

Com exceção do óleo de espermacete e do óleo de jojoba, das gorduras e óleos animais, vegetais ou de origem microbiana são ésteres de glicerol e ácidos gordos: designadamente os ácidos palmíticos, esteáricos e oleicos, nomeadamente.

[…]»

7

As notas explicativas publicadas pela OMA e relativas à posição 1516 do SH enunciam:

«[…]

Esta posição compreende as gorduras e os óleos animais, vegetais ou de origem microbiana que tenham sofrido unicamente transformação química particular, de um dos tipos abaixo indicados, mas que não foram transformados de outro modo.

Também inclui as frações que tenham sofrido o mesmo tratamento que essas gorduras e óleos animais, vegetais ou de origem microbiana.

[…]

B) Gorduras e óleos interesterificados, reesterificados ou elaidinizados.

1)

Óleos interesterificados (ou transesterificados). A consistência de um óleo ou de uma gordura pode ser aumentada alterando adequadamente a posição dos radicais dos ácidos gordos nos triglicéridos contidos no produto. A reação e a deslocação dos ésteres podem ser estimuladas por agentes catalisadores.

2)

As gorduras e óleos reesterificados (também designados esterificados) são triglicéridos obtidos por síntese direta de glicerol com misturas de ácidos gordos livres ou com óleos ácidos de refinação. A posição dos radicais dos ácidos gordos nos triglicéridos difere da posição normalmente encontrada nos óleos naturais.

[…]»

Pareceres de classificação adotados pelo Comité do SH

8

O parecer de classificação 1516.10/1, adotado pelo Comité do SH na 61.a sessão realizada em março de 2018, prevê:

«1.

Produto composto por 90 % de triglicéridos reesterificados de ácidos gordos altamente concentrados em ómega 3 EPA (ácido eicosapentaenoico) e DHA (ácido docosa‑hexaenóico), obtido a partir de óleo de biqueirão bruto. Os restantes 10 % do produto são constituídos essencialmente por mono e diglicéridos. O produto contém EPA (400 mg/g) e DHA (300 mg/g). Foi adicionada vitamina E (tocoferol) ao produto como antioxidante. No fabrico do produto, o óleo de biqueirão em bruto foi submetido a processos de desacidificação, esterificação etanólica, destilação, filtração, branqueamento, reesterificação e desodorização. O produto é apresentado em toneladas e é utilizado no fabrico de suplementos alimentares.»

9

Nos termos do parecer de classificação 2106.90/36, adotado pelo Comité do SH na 61.a sessão realizada em março de 2018:

«36.

Produto composto por ésteres etílicos de ácidos gordos altamente concentrados em ómega 3 EPA (ácido eicosapentaenoico) e DHA (ácido docosa‑hexaenóico), obtido a partir de óleo de biqueirão bruto. Foi adicionada vitamina E (tocoferol) ao produto como antioxidante. No fabrico do produto, o óleo de biqueirão em bruto foi submetido a processos de desacidificação, esterificação etanólica, destilação, filtração, branqueamento e desodorização. O produto é apresentado em toneladas e é utilizado no fabrico de suplementos alimentares.»

Direito da União

NC

10

A classificação aduaneira das mercadorias importadas para a União Europeia é regulada pela NC. A NC baseia‑se no SH e retoma as posições e as subposições com seis algarismos do SH, formando o sétimo e oitavo algarismos, por si só, subdivisões que lhe são próprias.

11

Nos termos das Regras Gerais para a Interpretação da NC, que figuram na primeira parte, título I, secção A, do anexo I do Regulamento n.o 2658/87:

«A classificação das mercadorias na [NC] rege‑se pelas seguintes regras:

1.

Os títulos das secções, capítulos e subcapítulos têm apenas valor indicativo. Para os efeitos legais, a classificação é determinada pelos textos das posições e das notas de secção e de capítulo e, desde que não sejam contrárias aos textos das referidas posições e notas, pelas regras seguintes:

[…]

6.

A classificação de mercadorias nas subposições de uma mesma posição é determinada, para efeitos legais, pelos textos dessas subposições e das notas de subposição respetivas, assim como, mutatis mutandis, pelas regras precedentes, entendendo‑se que apenas são comparáveis subposições do mesmo nível. Para os fins da presente regra, as notas de secção e de capítulo são também aplicáveis, salvo disposições em contrário.»

12

A segunda parte da NC contém uma secção III que contém um capítulo 15, intitulado «Gorduras e óleos animais ou vegetais; produtos da sua dissociação; gorduras alimentícias elaboradas; ceras de origem animal ou vegetal», bem como uma secção IV que contém um capítulo 21, intitulado «Preparações alimentícias diversas».

13

O capítulo 15 da NC inclui as seguintes posições e subposições:

«[…]

Código NC

Designação das mercadorias

Taxas dos direitos convencionais (%)

[…]

[…]

[…]

1516

Gorduras e óleos animais ou vegetais e respetivas frações, parcial ou totalmente hidrogenados, interesterificados, reesterificados ou elaidinizados, mesmo refinados, mas não preparados de outro modo:

 

1516 10

— Gorduras e óleos animais e respetivas frações

 

1516 10 10

Apresentados em embalagens imediatas de conteúdo líquido de 1 kg ou menos

12,8

1516 10 90

— — Apresentados de outro modo

10,9

[…]

[…]

 

[…]»

14

O capítulo 21 da NC inclui as seguintes posições e subposições:

«[…]

Código NC

Designação das mercadorias

Taxas dos direitos convencionais (%)

[…]

[…]

[…]

2106

Preparações alimentícias não especificadas nem compreendidas noutras posições:

 

[…]

[…]

[…]

2106 90

Outras

 

[…]

[…]

[…]

2106 90 92

Que não contenham matérias gordas provenientes do leite, sacarose, isoglicose, glicose, amido ou fécula, ou que contenham, em peso, menos de 1,5 % de matérias gordas provenientes do leite, menos de 5 % de sacarose ou de isoglicose, menos de 5 % de glicose ou amido ou fécula

12,8

[…]

[…]

[…]

[…]»

Regulamento de Execução 2019/1661

15

O anexo do Regulamento de Execução 2019/1661 é constituído por um quadro dividido em três colunas. A coluna 1 deste quadro retoma a designação das mercadorias visadas, a coluna 2 retoma a classificação dessas mercadorias na NC e a coluna 3 os motivos de tal classificação. Quanto à subposição 21069092 da NC, o referido quadro prevê:

«[…]

Designação das mercadorias

Classificação (Código NC)

Fundamentos

1)

2)

3)

Produto líquido, amarelo pálido, constituído por 93 % de ésteres etílicos de ácidos gordos, bem como 7 % de oligómeros e glicéridos parciais.

O produto é constituído por óleos de peixe de espécies de peixes como o biqueirão, a sardinha e a sarda. O processo de produção compreende a refinação, a hidrólise, a esterificação etílica e o fracionamento. Durante a hidrólise e a esterificação etílica, os triglicéridos são transformados em ésteres etílicos de ácidos gordos.

O produto destina‑se a transformação posterior na indústria alimentar, na indústria dos alimentos para animais e na indústria farmacêutica. O produto é embalado e expedido em atmosfera protetora em tambores metálicos com uma capacidade de 190 kg.

2106 90 92

A classificação é determinada pelas disposições das Regras Gerais 1 e 6 para a interpretação da Nomenclatura Combinada, pela nota 1 b) do capítulo 38 e pelos descritivos dos códigos NC 2106, 2106 90 e 2106 90 92.

Exclui‑se a classificação na posição 1516, uma vez que o produto é constituído principalmente por ésteres etílicos obtidos por esterificação de ácidos gordos com etanol e não com glicerol. O grau de transformação a que o produto foi submetido excede, por conseguinte, o permitido na posição 1516, uma vez que apenas os triglicéridos reesterificados estão abrangidos por essa posição [ver também as Notas Explicativas do Sistema Harmonizado (NESH) relativas à posição 1516, parte B, ponto 2].

Além disso, os ésteres etílicos de ácidos gordos não são gorduras nem óleos animais ou vegetais (ver também as NESH relativas ao capítulo 15, considerações gerais, parte A, segundo parágrafo).

Exclui‑se a classificação do produto no capítulo 38, uma vez que o produto tem valor nutritivo e é utilizado na preparação de géneros alimentícios [ver nota 1 b) do capítulo 38].

Por conseguinte, o produto classifica‑se no código NC 2106 90 92 como outras preparações alimentícias (ver também o parecer de classificação do SH 2106.90/3[6]).

[…]»

Litígio no processo principal e questões prejudiciais

16

A Golden Omega vende frações de óleo de peixe, designadamente a que se apresenta sob a forma de ésteres etílicos, com a denominação comercial «Fish Oil EE 1050» (a seguir «produto em causa»).

17

Em 25 de novembro de 2019, o Inspetor da Administração Fiscal entregou à Golden Omega uma informação pautal vinculativa (a seguir «IPV»), que tem por objeto o produto em causa e era válida de 25 de novembro de 2019 até 24 de novembro de 2022, na qual classificou o referido produto na subposição 21069092 da NC. O direito aduaneiro aplicável aos produtos classificados nesta subposição ascende a 12,8 %.

18

Considerando que o referido produto devia ser classificado, tal como o óleo de peixe que se apresentava sob a forma de triglicéridos, na posição 15161090, com a aplicação de um direito aduaneiro de 10,9 %, a Golden Omega apresentou uma reclamação contra a IPV de 2019.

19

Por Decisão de 28 de fevereiro de 2020, o Inspetor da Administração Fiscal indeferiu essa reclamação. A Golden Omega interpôs então recurso dessa decisão no rechtbank Noord‑Holland (Tribunal de Primeira Instância da Holanda do Norte, Países Baixos), que é o órgão jurisdicional de reenvio.

20

Resulta da decisão de reenvio que, em 12 de abril de 2016, o Inspetor da Administração Fiscal tinha dirigido à Golden Omega uma primeira IPV na qual tinha classificado o produto em causa na subposição 21069092 da NC. A Golden Omega contestou esta classificação. Por Sentença de 3 de dezembro de 2018, o órgão jurisdicional de reenvio concedeu‑lhe o mérito da causa e, por conseguinte, anulou a IPV emitida em 2016 considerando, designadamente, que as operações de transformação efetuadas por esta sociedade sobre o óleo de peixe em bruto estavam incluídas na redação da posição 1516 do SH. Nessa sentença, o órgão jurisdicional de reenvio concluiu que o produto em causa não podia ser classificado na posição 2106 do SH, uma vez que era abrangido pela posição 1516 do SH.

21

Esse órgão jurisdicional especifica também que o Inspetor da Administração Fiscal não tinha interposto recurso da Sentença de 3 de dezembro de 2018. Além disso, em concertação com a Comissão Europeia, esse inspetor decidiu consultar o Comité do Código Aduaneiro quanto à classificação do produto em causa. Na sequência dessa consulta, foi adotado o Regulamento de Execução 2019/1661, que prevê que um produto como o produto em causa deve ser classificado na subposição 21069092.

22

Perante o órgão jurisdicional de reenvio, a Golden Omega alega que, em aplicação das regras gerais para a interpretação da NC, o produto em causa devia ser classificado na posição 1516 da NC. A este respeito, considera que as gorduras e óleos abrangidos por esta posição correspondem às gorduras e óleos animais que compõem esse produto e que as operações de tratamento e/ou de transformação indicadas na referida posição correspondem às operações de que o referido produto foi objeto, a saber, a refinação, a esterificação e o fracionamento. Na sua opinião, é irrelevante que esse mesmo produto seja esterificado, não com glicerol, mas com etanol. No que respeita ao Regulamento de Execução 2019/1661, considera que a Comissão, ao não se conformar com a redação juridicamente vinculativa da posição 1516 da NC e, deste modo, ao alterar ilicitamente o alcance desta posição, excedeu as suas competências. Por conseguinte, este regulamento é inválido.

23

O órgão jurisdicional de reenvio partilha da posição da Golden Omega. Esse órgão jurisdicional salienta, em particular, que, uma vez que a posição 1516 da NC visa a transformação por «esterificação», sem distinguir consoante o tipo de álcool utilizado para o efeito, é possível considerar que a esterificação com etanol está igualmente abrangida por esta posição. Além disso, embora, como resulta das notas explicativas publicadas pela OMA e relativas ao capítulo 15 do SH, se possa sustentar que, do ponto de vista químico, os ésteres etílicos de ácidos gordos não são gorduras animais, tal constatação não permite excluir que, tendo em conta a redação da referida posição, os ésteres etílicos devam ser classificados nesta mesma posição. Neste contexto, esse órgão jurisdicional salienta que as notas explicativas publicadas pela OMA, que são visadas nos fundamentos do Regulamento de Execução 2019/1661, não têm força vinculativa, pelo que não é necessário atribuir‑lhes um valor preponderante.

24

Nestas circunstâncias, o rechtbank Noord‑Holland (Tribunal de Primeira Instância da Holanda do Norte, Países Baixos) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

Deve a posição 1516 [da NC] ser interpretada no sentido de que contém restrições quanto ao modo como um óleo animal é esterificado e à substância que é utilizada para o efeito? Em caso afirmativo, [em que consistem] as referidas restrições?

2)

Para ser classificado na posição 1516, deve um óleo animal como o óleo de peixe ser esterificado com glicerol?

3)

Deve um óleo animal como o óleo de peixe, que seja esterificado com etanol, ser excluído da classificação na posição 1516?

4)

É relevante para a resposta às questões anteriores a apreciação da questão de saber em que medida o produto foi submetido às operações referidas na posição 1516? Em caso afirmativo, quais são os critérios com base nos quais deve ser feita a apreciação?

5)

A resposta às questões anteriores tem consequências para a validade do Regulamento de Execução [2019/1661]? Em caso afirmativo, quais?»

Quanto às questões prejudiciais

25

A título preliminar, importa recordar que, quando o Tribunal de Justiça é chamado a conhecer de um pedido prejudicial em matéria de classificação pautal, a sua função consiste em esclarecer o órgão jurisdicional de reenvio sobre os critérios cuja aplicação lhe permitirá classificar corretamente os produtos em causa na NC e não em proceder ele próprio a essa classificação. Esta classificação resulta de uma apreciação puramente factual que não cabe ao Tribunal de Justiça efetuar no âmbito de um reenvio prejudicial (Acórdão de 15 de junho de 2023, NOVA TARGOVSKA KOMPANIA 2004, C‑292/22, EU:C:2023:492, n.o 33 e jurisprudência referida).

26

Por conseguinte, incumbirá ao órgão jurisdicional de reenvio proceder à classificação das mercadorias em causa à luz dos elementos de resposta fornecidos pelo Tribunal de Justiça às questões submetidas (Acórdão de 15 de junho de 2023, NOVA TARGOVSKA KOMPANIA 2004, C‑292/22, EU:C:2023:492, n.o 34 e jurisprudência referida).

27

Além disso, há que sublinhar que, segundo jurisprudência constante, no âmbito do processo de cooperação entre o juiz nacional e o Tribunal de Justiça, instituído pelo artigo 267.o TFUE, cabe a este dar ao juiz nacional uma resposta útil que lhe permita decidir o litígio que lhe foi submetido. Nesta ótica, incumbe ao Tribunal de Justiça, se necessário, reformular as questões que lhe foram submetidas (Acórdão de 15 de junho de 2023, NOVA TARGOVSKA KOMPANIA 2004, C‑292/22, EU:C:2023:492, n.o 35 e jurisprudência referida).

28

No caso em apreço, resulta da decisão de reenvio que, no âmbito do processo de produção do produto em causa, o óleo de peixe refinado, que se apresenta sob a forma de triglicéridos, é transformado, por esterificação, num óleo de peixe que se apresenta sob a forma de ésteres etílicos. A este respeito, o órgão jurisdicional de reenvio explica que a diferença entre estes dois óleos diz respeito ao tipo de álcool que liga os ácidos gordos. Na composição de um éster etílico, o álcool utilizado é o etanol, ao passo que na composição de um triglicérido o álcool utilizado é o glicerol. Esse órgão jurisdicional refere também que as partes no processo principal estão de acordo quanto à classificação do óleo de peixe que se apresenta sob a forma de triglicéridos na posição 1516 da NC.

29

Neste contexto, o órgão jurisdicional de reenvio, com a sua primeira a quarta questões, interroga o Tribunal de Justiça sobre a interpretação a dar à posição 1516 da NC para efeitos da classificação pautal de um óleo de peixe que se apresenta sob a forma de ésteres etílicos, obtido por esterificação de ácidos gordos com etanol, e, com a sua quinta questão, pergunta ao Tribunal de Justiça se, tendo em conta a interpretação a dar a esta posição, o Regulamento de Execução 2019/1661 é válido.

Quanto à primeira a quarta questões

30

Com a primeira a quarta questões, que importa examinar em conjunto, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, se a posição 1516 da NC deve ser interpretada no sentido de que abrange um óleo de peixe que se apresenta sob a forma de ésteres etílicos, obtido por esterificação de ácidos gordos com etanol.

31

Há que recordar que, nos termos da regra geral 1 para a interpretação da NC, a classificação pautal das mercadorias na NC é determinada segundo os termos das posições e das notas de secção ou de capítulos, considerando‑se que a redação dos títulos de secção, de capítulos ou de subcapítulos tem apenas valor indicativo. No interesse da segurança jurídica e da facilidade dos controlos, o critério decisivo para a classificação pautal das mercadorias deve ser procurado, de uma maneira geral, nas suas características e propriedades objetivas, tal como definidas na redação da posição em causa da referida nomenclatura e das notas de secção ou dos capítulos correspondentes (Acórdão de 5 de setembro de 2024, BIOR, C‑344/23, EU:C:2024:696, n.o 65 e jurisprudência referida).

32

Nos termos da redação da posição 1516 da NC, esta compreende as «gorduras e óleos animais ou vegetais e respetivas frações, parcial ou totalmente hidrogenados, interesterificados, reesterificados ou elaidinizados, mesmo refinados, mas não preparados de outro modo». Como salientou a Comissão, essa formulação implica que os produtos abrangidos por esta posição possam ser considerados gorduras ou óleos ou frações dessas gorduras ou desses óleos.

33

A este respeito, há que referir que nem a NC nem as suas notas explicativas definem os termos «gorduras e óleos».

34

Neste contexto, há que recordar que, por força de jurisprudência constante, o significado e o alcance dos termos para os quais o direito da União não fornece nenhuma definição devem ser determinados em conformidade com o sentido habitual destes na linguagem comum, tendo em conta o contexto em que são utilizados e os objetivos prosseguidos pela regulamentação de que fazem parte (Acórdão de 25 de maio de 2023, Danish Fluid System Technologies, C‑368/22, EU:C:2023:427, n.o 40 e jurisprudência referida).

35

Quanto ao sentido habitual em linguagem corrente dos termos «gorduras e óleos», resulta de vários dicionários que, em francês, alemão e inglês, estes termos são geralmente definidos como corpos gordos, de origem animal ou vegetal, formados principalmente por glicéridos, isto é, ésteres de glicerol associados a ácidos gordos.

36

Por outro lado, tal definição é corroborada pelas notas explicativas publicadas pela OMA e relativas ao capítulo 15 do SH. Com efeito, essas notas explicativas especificam que, «com exceção do óleo de espermacete e do óleo de jojoba, as gorduras e óleos animais, vegetais ou de origem microbiana são ésteres de glicerol e ácidos gordos».

37

Quanto a este aspeto, importa referir que o Tribunal de Justiça tem declarado reiteradamente que, apesar de as notas explicativas do SH não terem força vinculativa, constituem instrumentos importantes para assegurar a aplicação uniforme da pauta aduaneira comum e fornecem, enquanto tais, elementos válidos para a sua interpretação (Acórdão de 5 de setembro de 2024, BIOR, C‑344/23, EU:C:2024:696, n.o 66 e jurisprudência referida).

38

Resulta das considerações precedentes que uma característica específica das gorduras e óleos é que estes são constituídos principalmente por ésteres de glicerol e ácidos gordos, sob a forma de triglicéridos. Deste modo, um produto constituído principalmente por ésteres etílicos, que são ésteres sintéticos obtidos a partir do etanol e de ácidos gordos, não está abrangido pela posição 1516 da NC.

39

Além disso, a redação desta posição prevê que as gorduras e os óleos animais ou vegetais, bem como as respetivas frações, podem ter sido «parcial ou totalmente hidrogenados, interesterificados, reesterificados ou elaidinizados, mesmo refinados, mas não preparados de outro modo». Assim, esta posição compreende as gorduras e os óleos animais, vegetais ou de origem microbiana que tenham sofrido uma transformação química particular, de um dos tipos indicados na referida posição, mas que não foram preparados de outro modo.

40

No que respeita aos processos de interesterificação e de reesterificação dos óleos e das gorduras, que são relevantes no âmbito do processo principal, as notas explicativas publicadas pela OMA e relativas à posição 1516 do SH indicam em que consiste a transformação química obtida através destes processos.

41

Assim, a parte B, ponto 1, destas notas indica, para os «óleos interesterificados (ou transesterificados)», que «[a] consistência de um óleo ou de uma gordura pode ser aumentada alterando adequadamente a posição dos radicais dos ácidos gordos nos triglicéridos contidos no produto. A reação e a deslocação dos ésteres podem ser estimuladas por agentes catalisadores».

42

No que diz respeito às «gorduras e óleos reesterificados (também denominados esterificados)», a parte B, ponto 2, das referidas notas indica que «são triglicéridos obtidos por síntese direta de glicerol com misturas de ácidos gordos livres ou com óleos ácidos de refinação. A posição dos radicais dos ácidos gordos nos triglicéridos difere da posição normalmente encontrada nos óleos naturais».

43

Por conseguinte, decorre dessas mesmas notas que os produtos resultantes desses processos químicos constituem sempre triglicéridos. Deste modo, para poderem ser abrangidos pela posição 1516 da NC após terem sido submetidos a tais processos, esses produtos devem corresponder sempre à definição de «gorduras ou óleos», conforme referida no n.o 38 do presente acórdão, e, consequentemente, ser principalmente compostos por ésteres de glicerol e ácidos gordos, sob a forma de triglicéridos. Por conseguinte, um produto que, após esterificação, é composto principalmente por ésteres etílicos não pode ser abrangido pela referida posição.

44

Por outro lado, tal interpretação é corroborada pelos pareceres de classificação adotados pelo Comité do SH na 61.a sessão que se realizou em março de 2018. Assim, o parecer de classificação 1516.10/1 aprovado pela OMA especifica, no que respeita às gorduras e óleos animais e respetivas frações, que o produto que deve ser classificado na posição 1516 do SH é composto, nomeadamente, por 90 % de triglicéridos reesterificados de ácidos gordos. Em contrapartida, em conformidade com o parecer de classificação 2106.90/36 aprovado pela OMA, um produto constituído por ésteres etílicos de ácidos gordos deve ser classificado na posição 2106 do SH.

45

A este respeito, há que recordar que, embora os pareceres da OMA que classificam mercadorias no SH não sejam juridicamente vinculativos, constituem, no que respeita à classificação dessas mercadorias na NC, elementos importantes para a interpretação do alcance das diferentes posições da NC (Acórdão de 16 de novembro de 2023, Viterra Hungary, C‑366/22, EU:C:2023:876, n.o 35 e jurisprudência referida).

46

À luz de todas as considerações precedentes, há que responder à primeira a quarta questões que a posição 1516 da NC deve ser interpretada no sentido de que não abrange um óleo de peixe que se apresente sob a forma de ésteres etílicos, obtido por esterificação de ácidos gordos com etanol.

Quanto à quinta questão

47

Com a quinta questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, essencialmente, se, tendo em conta a interpretação da posição 1516 da NC adotada em resposta à primeira a quarta questões, o Regulamento de Execução 2019/1661 deve ser considerado válido.

48

A este respeito, resulta da decisão de reenvio que não é contestado no âmbito do litígio no processo principal que as propriedades do produto em causa são idênticas às do produto indicado na coluna 1 do quadro que figura no anexo deste regulamento de execução.

49

A Comissão fundamentou a classificação do produto indicado no referido regulamento de execução na subposição 21069092 da NC, especificando, nomeadamente, que «[está excluída] a classificação na posição 1516 [da NC] uma vez que o produto é constituído principalmente por ésteres etílicos obtidos por esterificação de ácidos gordos com etanol e não com glicerol. O grau de transformação a que o produto foi submetido excede, por conseguinte, o permitido na posição 1516, uma vez que apenas os triglicéridos reesterificados estão abrangidos por essa posição». O mesmo regulamento de execução remete, a este último respeito, para as notas explicativas publicadas pela OMA e relativas à posição 1516 do SH, parte B, ponto 2.

50

Além disso, o Regulamento de Execução 2019/1661 indica que «os ésteres etílicos de ácidos gordos não são gorduras nem óleos animais ou vegetais» e faz referência, a este respeito, às notas explicativas publicadas pela OMA e relativas ao capítulo 15 do SH, considerações gerais, parte A, segundo parágrafo.

51

Tendo em conta a resposta dada à primeira a quarta questões, a fundamentação relativa à classificação do produto visado por este regulamento de execução e essa classificação, por si só, estão, deste modo, em conformidade com a interpretação que deve ser dada à posição 1516 da NC.

52

Daqui resulta que a Comissão, ao adotar o referido regulamento de execução, não alterou nem o conteúdo nem o alcance desta posição e, consequentemente, não excedeu os seus poderes.

53

Por conseguinte, há que responder à quinta questão que a análise das questões prejudiciais não revelou nenhum elemento suscetível de afetar a validade do Regulamento de Execução 2019/1661.

Quanto às despesas

54

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Sexta Secção) declara:

 

1)

A posição 1516 da Nomenclatura Combinada, que figura no anexo I do Regulamento (CEE) n.o 2658/87 do Conselho, de 23 de julho de 1987, relativo à nomenclatura pautal e estatística e à pauta aduaneira comum, na versão resultante do Regulamento de Execução (UE) 2018/1602 da Comissão, de 11 de outubro de 2018,

deve ser interpretada no sentido de que:

não abrange o óleo de peixe sob a forma de ésteres etílicos, obtido por esterificação de ácidos gordos com etanol.

 

2)

A análise das questões prejudiciais não revelou nenhum elemento suscetível de afetar a validade do Regulamento de Execução (UE) 2019/1661 da Comissão, de 24 de setembro de 2019, relativo à classificação de determinadas mercadorias na Nomenclatura Combinada.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: neerlandês.

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