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Documento 62023CJ0244

Acórdão do Tribunal de Justiça (Nona Secção) de 13 de fevereiro de 2025.
Comissão Europeia e o. contra Carpatair SA.
Recurso de decisão do Tribunal Geral — Auxílios de Estado — Setor aéreo — Medidas aplicadas pelo aeroporto internacional de Timișoara (Roménia) a favor da Wizz Air e de outras companhias aéreas que o utilizam — Decisão que declara a inexistência de auxílio de Estado — Recurso de anulação — Artigo 263.o TFUE — Admissibilidade — Condição segundo a qual o ato deve dizer direta e individualmente respeito ao recorrente — Dever de fundamentação — Desvirtuação dos elementos de prova.
Processos apensos C-244/23 P a C-246/23 P.

Identificatore ECLI: ECLI:EU:C:2025:87

 ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Nona Secção)

13 de fevereiro de 2025 ( *1 )

«Recurso de decisão do Tribunal Geral — Auxílios de Estado — Setor aéreo — Medidas aplicadas pelo aeroporto internacional de Timișoara (Roménia) a favor da Wizz Air e de outras companhias aéreas que o utilizam — Decisão que declara a inexistência de auxílio de Estado — Recurso de anulação — Artigo 263.o TFUE — Admissibilidade — Condição segundo a qual o ato deve dizer direta e individualmente respeito ao recorrente — Dever de fundamentação — Desvirtuação dos elementos de prova»

Nos processos apensos C‑244/23 P a C‑246/23 P,

que tem por objeto três recursos de um acórdão nos termos do artigo 56.o do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, interpostos em 17 de abril de 2023,

Comissão Europeia, representada por I. Georgiopoulos e F. Tomat, na qualidade de agentes,

recorrente no processo C‑244/23 P,

sendo as outras partes no processo:

Carpatair SA, com sede em Timişoara (Roménia), representada por P. González Alarcón, J. Rivas Andrés, abogados, e J. Saké, advocaat,

recorrente em primeira instância,

Wizz Air Hungary Légiközlekedési Zrt. (Wizz Air Hungary Zrt.), com sede em Budapeste (Hungria), representada por I.‑G. Metaxas‑Maranghidis, dikigoros, S. Rating, abogado, e E. Vahida, avocat,

Societatea Națională «Aeroportul Internaţional Timişoara — Traian Vuia» SA (AITTV), com sede em Ghiroda (Roménia), representada por V. Power, SC, e R. Hourihan, solicitor,

intervenientes em primeira instância,

e

Wizz Air Hungary Légiközlekedési Zrt. (Wizz Air Hungary Zrt.), com sede em Budapeste (Hungria), representada por I.‑G. Metaxas‑Maranghidis, dikigoros, S. Rating, abogado, e E. Vahida, avocat,

recorrente no processo C‑245/23 P,

sendo as outras partes no processo:

Carpatair SA, com sede em Timişoara, representada por P. González Alarcón, J. Rivas Andrés, abogados, e J. Saké, advocaat,

recorrente em primeira instância,

Comissão Europeia, representada por I. Georgiopoulos e F. Tomat, na qualidade de agentes,

recorrida em primeira instância,

Societatea Națională «Aeroportul Internaţional Timişoara — Traian Vuia» SA (AITTV), com sede em Ghiroda, representada por V. Power, SC, e R. Hourihan, solicitor,

interveniente em primeira instância,

e

Societatea Națională «Aeroportul Internaţional Timişoara — Traian Vuia» SA (AITTV), com sede em Ghiroda, representada por V. Power, SC, e R. Hourihan, solicitor,

recorrente no processo C‑246/23 P,

sendo as outras partes no processo:

Carpatair SA, com sede em Timişoara, representada por P. González Alarcón, J. Rivas Andrés, abogados, e J. Saké, advocaat,

recorrente em primeira instância,

Comissão Europeia, representada por I. Georgiopoulos e F. Tomat, na qualidade de agentes,

recorrida em primeira instância,

Wizz Air Hungary Légiközlekedési Zrt. (Wizz Air Hungary Zrt.), com sede em Budapeste, representada por I.‑G. Metaxas‑Maranghidis, dikigoros, S. Rating, abogado, e E. Vahida, avocat,

interveniente em primeira instância,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Nona Secção),

composto por: C. Lycourgos (relator), presidente da Terceira Secção, exercendo funções de presidente da Nona Secção, S. Rodin e O. Spineanu‑Matei, juízes,

advogado‑geral: M. Szpunar,

secretário: A. Calot Escobar,

vistos os autos,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 4 de outubro de 2024,

profere o presente

Acórdão

1

Com os seus respetivos recursos, a Comissão Europeia (processo C‑244/23 P), a Wizz Air Hungary Légiközlekedési Zrt. (Wizz Air Hungary Zrt.) (a seguir «Wizz Air») (processo C‑245/23 P) e a Societatea Națională «Aeroportul Internaţional Timișoara — Traian Vuia» SA (AITTV) (processo C‑246/23 P) pedem a anulação do Acórdão do Tribunal Geral da União Europeia de 8 de fevereiro de 2023, Carpatair/Comissão (T‑522/20, a seguir acórdão recorrido, EU:T:2023:51), no qual este último anulou o artigo 2.o da Decisão (UE) 2021/1428 da Comissão, de 24 de fevereiro de 2020, relativa ao auxílio estatal SA. 31662 — C/2011 (ex NN/2011) concedido pela Roménia a favor do Aeroporto Internacional de Timișoara — Wizz Air (JO 2021, L 308, p. 1; a seguir «decisão controvertida»), na medida em que conclui que as taxas aeroportuárias que figuram na publicação de informação aeronáutica (a seguir «AIP») de 2010 e os acordos celebrados entre a AITTV e a Wizz Air no decorrer do ano de 2008 (a seguir «acordos de 2008»), incluindo as alterações de que estes acordos foram alvo durante o ano de 2010 (a seguir «acordos de alteração de 2010»), não constituem auxílios estatais.

Antecedentes do litígio

2

O aeroporto internacional de Timișoara (Roménia) é explorado pela AITTV, uma sociedade na qual o Estado romeno detém 80 % das ações.

3

A Carpatair SA é uma companhia aérea regional romena. Em 2000, criou a sua plataforma nesse aeroporto, a partir do qual explorava uma rede de tipo radial.

4

Em 2008, no âmbito de uma estratégia destinada a atrair companhias aéreas de baixo custo e a aumentar a rendibilidade global do referido aeroporto, a AITTV assinou com a Wizz Air, uma companhia aérea húngara de baixo custo, os acordos de 2008, que definem os princípios da sua cooperação, bem como as condições gerais de utilização das infraestruturas e dos serviços aeroportuários pela Wizz Air. Em 25 de junho de 2010, com os acordos de alteração de 2010, dois dos acordos de 2008 foram alterados através de um novo regime acordado entre a Wizz Air e a AITTV, que abrangia o período que ia até 6 de fevereiro de 2011. A Wizz Air começou a efetuar voos com partida do mesmo aeroporto em outubro de 2008.

5

Em 30 de setembro de 2010, a Carpatair apresentou à Comissão uma denúncia relativa a um auxílio estatal alegadamente ilegal a favor da Wizz Air.

6

Em 24 de maio de 2011, a Comissão informou a Roménia da sua decisão de dar início ao procedimento formal de investigação previsto no artigo 108.o, n.o 2, TFUE no que respeita, nomeadamente, aos acordos de 2008 e aos descontos e às reduções das taxas aeroportuárias concedidos em conformidade com as AIP de 2007, de 2008 e de 2010.

7

A partir de 2014, a Carpatair cessou as suas atividades no aeroporto de Timișoara e foi objeto de reestruturação judicial. A sua principal base de operações situa‑se agora no aeroporto de Arad (Roménia), que se situa a 50 quilómetros (km) do aeroporto internacional de Timișoara e a partir do qual propõe, nomeadamente, voos fretados. Já não oferece voos regulares.

8

Em 24 de fevereiro de 2020, a Comissão adotou a decisão controvertida.

9

No que respeita às taxas aeroportuárias que figuram nas AIP de 2007, de 2008 e de 2010, a Comissão considerou, na decisão controvertida, que a taxa de base, os descontos e as reduções sobre essas taxas não eram seletivos.

10

Quanto aos acordos de 2008 e aos acordos de alteração de 2010 (a seguir, em conjunto, «acordos de 2008 e de 2010»), a Comissão salientou, tendo em conta as avaliações económicas elaboradas posteriormente à celebração desses acordos, que estes deviam implicar uma rendibilidade marginal para a AITTV. Consequentemente, considerou que um operador privado prudente numa economia de mercado teria celebrado tais acordos. Além disso, os referidos acordos enquadravam‑se no âmbito de uma estratégia global e de um esforço a longo prazo a favor da rendibilidade global do aeroporto internacional de Timișoara. A Comissão concluiu, portanto, que não tinham conferido à Wizz Air uma vantagem económica que esta empresa não teria obtido em condições normais de mercado.

Recurso para o Tribunal Geral e acórdão recorrido

11

Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 11 de agosto de 2020, a Carpatair interpôs recurso de anulação da decisão controvertida.

12

Com o acórdão recorrido, o Tribunal Geral declarou, por um lado, que a Comissão tinha cometido um erro de direito ao não examinar se a redução das taxas aeroportuárias prevista no n.o 7.3 da AIP de 2010, considerada individualmente, tinha caráter seletivo. Por outro lado, o Tribunal declarou que a Comissão não tinha fundamentado legalmente a apreciação segundo a qual os acordos de 2008 e de 2010 não tinham conferido à Wizz Air uma vantagem económica que não teria obtido em condições normais de mercado. Assim, após ter acolhido o primeiro fundamento e, em parte, o segundo fundamento invocado pela Carpatair em apoio desse recurso, o Tribunal anulou o artigo 2.o da decisão controvertida na medida especificada no n.o 1 do presente acórdão.

Pedidos das partes nos recursos

Pedidos das partes no processo C‑244/23 P

13

Com o seu recurso no processo C‑244/23 P, a Comissão conclui pedindo ao Tribunal de Justiça que se digne:

anular o acórdão recorrido, na parte em que julgou procedente o segundo fundamento da Carpatair;

julgar improcedente o segundo fundamento no processo T‑522/20, e

condenar a Carpatair nas despesas de ambas as instâncias.

14

A Carpatair conclui pedindo ao Tribunal de Justiça que se digne:

negar provimento ao recurso, e

condenar a Comissão nas despesas dos processos de primeira instância e de recurso.

Pedidos das partes no processo C‑245/23 P

15

Com o seu recurso no processo C‑245/23 P, a Wizz Air conclui pedindo ao Tribunal de Justiça que se digne:

anular o acórdão recorrido;

negar provimento ao recurso interposto pela Carpatair no Tribunal Geral, e

condenar a Carpatair nas despesas dos processos de primeira instância e de recurso.

16

A Comissão conclui pedindo ao Tribunal de Justiça que se digne:

anular o acórdão recorrido, e

condenar a Carpatair nas despesas.

17

A Carpatair conclui pedindo ao Tribunal de Justiça que se digne:

negar provimento ao recurso, e

condenar a Wizz Air nas despesas dos processos de primeira instância e de recurso.

Pedidos das partes no processo C‑246/23 P

18

Com o seu recurso no processo C‑246/23 P, a AITTV conclui pedindo ao Tribunal de Justiça que se digne:

anular o acórdão recorrido,

negar provimento ao recurso em primeira instância interposto pela Carpatair ou remeter o processo ao Tribunal Geral e,

condenar a Carpatair nas despesas dos processos de primeira instância e de recurso ou, se decidisse remeter o processo ao Tribunal Geral, reservar para final a questão das despesas.

19

A Comissão conclui pedindo ao Tribunal de Justiça que se digne:

anular o acórdão recorrido, e

condenar a Carpatair nas despesas.

20

A Carpatair conclui pedindo ao Tribunal de Justiça que se digne:

negar provimento ao recurso, e

condenar a AITTV nas despesas dos processos de primeira instância e de recurso.

Quanto aos fundamentos relativos à falta de legitimidade ativa da Carpatair

Argumentos das partes

Quanto ao primeiro fundamento da Wizz Air no processo C‑245/23 P

21

Com o seu primeiro fundamento, a Wizz Air, apoiada pela Comissão, afirma que o Tribunal Geral, ao declarar que os acordos de 2008 e de 2010 eram uma das causas do prejuízo para a sua posição concorrencial, desvirtuou elementos de prova e violou uma formalidade substancial.

22

Em primeiro lugar, o Tribunal Geral considerou que a Carpatair era individual e diretamente afetada pelos acordos de 2008 e de 2010 porque, aquando da adoção da decisão de início do procedimento formal de investigação, em 2011, a Carpatair e a Wizz Air estavam em concorrência em cinco rotas com partida do aeroporto internacional de Timişoara e, entre 2008 e 2010, o número de passageiros, os rendimentos e as receitas da Carpatair nessas cinco rotas tinham diminuído consideravelmente.

23

No entanto, o Tribunal Geral não teve em conta o facto de essa diminuição ser análoga, ou mesmo claramente inferior, à que a Carpatair tinha sofrido nas rotas em que não estava em concorrência com a Wizz Air.

24

Além disso, o acórdão recorrido contém erros manifestos que afetam o cálculo da diminuição dos rendimentos da Carpatair.

25

Em segundo lugar, no n.o 77 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral declarou que resultava das observações apresentadas pela Carpatair no decurso do procedimento administrativo que essa empresa também se queixava de não ter podido retomar os voos assegurados, à partida do aeroporto internacional de Timişoara, por duas outras companhias aéreas que abandonaram esse aeroporto em 2008, sendo esses voos a partir daí assegurados pela Wizz Air. Ora, este elemento não foi debatido no Tribunal Geral. O anexo A.8 do recurso de anulação, intitulado «Observações da Carpatair de 7 de junho de 2011 enviadas à Comissão», foi simplesmente mencionado nesse recurso, sem ser resumido. A fortiori, não foi objeto de uma troca de pontos de vista no Tribunal Geral, em violação da formalidade substancial que constitui o direito da Wizz Air a ser ouvida a este respeito.

26

A Carpatair contesta a admissibilidade do primeiro fundamento da Wizz Air. Esta limita‑se, com efeito, a pedir ao Tribunal de Justiça que proceda a uma nova apreciação dos factos e provas. Além disso, a desvirtuação alegada pela Wizz Air não resulta de forma manifesta dos elementos dos autos.

27

A título subsidiário, a Carpatair considera que este fundamento é improcedente.

28

Em primeiro lugar, a Carpatair alega, antes de mais, que o referido fundamento assenta numa leitura errada do n.o 73 do acórdão recorrido, através do qual o Tribunal Geral se limitou a indicar que a Carpatair tinha demonstrado que os acordos de 2008 e de 2010 eram uma das causas do prejuízo para a sua posição concorrencial. O facto de as rotas exploradas pela Carpatair diferentes daquelas em que estava em concorrência com a Wizz Air também terem sofrido uma diminuição de rendimento não invalida essa constatação.

29

Em seguida, a Wizz Air ignora que os efeitos prejudiciais dos acordos de 2008 e de 2010 não se cingem às rotas em que estava em concorrência com a Carpatair. O acórdão recorrido limita‑se, todavia, a demonstrar esses efeitos nas rotas nas quais a Carpatair se encontrava em concorrência direta com a Wizz Air, como exigido no artigo 263.o, quarto parágrafo, TFUE.

30

Por fim, o Tribunal Geral cometeu, é certo, nos n.os 75 e 76 do acórdão recorrido, um ligeiro erro de cálculo da diminuição dos rendimentos nas rotas da Carpatair. Não obstante, é incontestável que esses rendimentos diminuíram claramente entre 2008 e 2010.

31

Em segundo lugar, o Tribunal Geral não violou o direito da Wizz Air a ser ouvida sobre o argumento relativo à impossibilidade, para a Carpatair, de retomar as rotas de duas outras companhias aéreas com partida do aeroporto internacional de Timişoara. Com efeito, como o Tribunal Geral indicou no n.o 77 do acórdão recorrido, a Carpatair já tinha apresentado as suas observações a este respeito durante o inquérito inicial. A Wizz Air teve, portanto, conhecimento do ponto de vista da Carpatair. Além disso, a Wizz Air ignora o facto de a constatação do Tribunal Geral, no n.o 78 do acórdão recorrido, assentar em elementos de prova contidos nos anexos A.7 e A.8 do recurso de anulação.

32

Em terceiro e último lugar, a Wizz Air não tem em conta todos os elementos com base nos quais o Tribunal Geral, nos n.os 54 a 86 do acórdão recorrido, considerou que a Carpatair era individualmente afetada.

Quanto ao primeiro fundamento da AITTV no processo C‑246/23 P

33

Com o seu primeiro fundamento, a AITTV, apoiada pela Comissão, afirma nomeadamente que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito ao considerar que a decisão controvertida dizia direta e individualmente respeito à Carpatair.

34

Em primeiro lugar, o Tribunal Geral limitou‑se a assumir, sem provas suficientes, que a Carpatair e a Wizz Air eram concorrentes, sem ter em conta os elementos fornecidos pela AITTV que demonstravam que a Carpatair e a Wizz Air não eram companhias aéreas de tipos e dimensões comparáveis, e que operavam em rotas em larga medida diferentes.

35

Em segundo lugar, o Tribunal Geral também admitiu, sem provas suficientes, que a Carpatair era substancialmente afetada pela decisão controvertida, sem ter em conta os argumentos perante si invocados.

36

Por um lado, a AITTV alegou no Tribunal Geral que, independentemente dos acordos de 2008 e de 2010, no momento da celebração desses acordos, a situação jurídica e factual da Carpatair era tal que essa companhia aérea não teria podido continuar a operar com sucesso a partir do aeroporto internacional de Timişoara, uma vez que o seu modelo de exploração estava ultrapassado. Apesar das provas que lhe foram apresentadas nesse sentido, o Tribunal Geral também não teve em conta a crise financeira mundial que afetava as companhias aéreas na época dos factos em causa e que constituiu outra explicação plausível para as dificuldades com que a Carpatair se deparou.

37

Por outro lado, a Carpatair não forneceu nenhuma prova de um qualquer efeito dos acordos de 2008 e de 2010 sobre a sua situação, que ela própria considerou, no n.o 4 do seu recurso de anulação, idêntica à de muitas outras companhias aéreas a operar a partir do aeroporto internacional de Timişoara. Além disso, decorre do n.o 116 desse recurso que os efeitos desses acordos não eram necessariamente específicos dessa companhia aérea. Todavia, o Tribunal Geral não examinou se as eventuais perdas da referida empresa se deviam à concorrência de companhias aéreas diferentes da Wizz Air ou a outros fatores.

38

É certo, como indicado no n.o 70 do acórdão recorrido, que entre 2008 e 2010, o número de passageiros, os rendimentos e as receitas da Carpatair nas cinco rotas em que estava em concorrência com a Wizz Air tinham diminuído consideravelmente. Todavia, as provas submetidas ao Tribunal Geral demonstram que os rendimentos da Carpatair diminuíram no conjunto das rotas dessa companhia aérea com partida do aeroporto internacional de Timişoara e não apenas nas que coincidiam com as rotas exploradas pela Wizz Air. Ora, o acórdão recorrido não aborda esses elementos, que demonstram que a Carpatair não era direta e individualmente afetada, na aceção do artigo 263.o, quarto parágrafo, TFUE.

39

Em terceiro lugar, o Tribunal Geral evocou, no n.o 78 do acórdão recorrido, um lucro cessante para a Carpatair, quando esta última não o invocou nos seus articulados em primeira instância.

40

A Carpatair contesta a admissibilidade do primeiro fundamento da AITTV, por ser vago e impreciso, uma vez que a AITTV não distingue as medidas controvertidas e os critérios jurídicos correspondentes, e confunde o exame da qualidade e do interesse em agir efetuado pelo Tribunal.

41

A título subsidiário, a Carpatair afirma que este fundamento é improcedente.

42

Com efeito, o Tribunal Geral definiu e aplicou de forma meticulosa os critérios jurídicos pertinentes a fim de demonstrar a legitimidade da Carpatair para pedir a anulação da decisão controvertida na parte que respeita quer aos acordos de 2008 e de 2010 quer à AIP de 2010. Resulta claramente da sistemática do acórdão recorrido, que aborda de forma exaustiva a questão de saber se os acordos de 2008 e de 2010 dizem individualmente respeito à Carpatair e se esses acordos e a AIP de 2010 lhe dizem diretamente respeito, que a legitimidade ativa da Carpatair foi demonstrada de forma juridicamente bastante.

Quanto ao quinto fundamento da AITTV no processo C‑246/23 P

43

Com o seu quinto fundamento, a AITTV, apoiada pela Comissão, considera, em primeiro lugar, que o Tribunal Geral não teve suficientemente em conta as provas apresentadas pela Comissão, pela Wizz Air e pela AITTV que demonstravam a inexistência de concorrência efetiva entre a Wizz Air e a Carpatair à data da celebração dos acordos de 2008 e de 2010.

44

A AITTV considera que, embora o Tribunal Geral não tenha de apreciar cada argumento perante si invocado, viola, todavia, uma formalidade substancial quando, como no caso em apreço, enuncia, nos n.os 63 e 69 do acórdão recorrido, um número considerável de argumentos e de elementos de prova materiais, sem proceder à sua apreciação, quando outra apreciação desses elementos teria conduzido à declaração de inadmissibilidade do recurso da Carpatair.

45

Os elementos de prova fornecidos pela AITTV, pela Wizz Air e pela Comissão demonstram, nomeadamente, a racionalidade económica dos acordos de 2008 e de 2010 assim como o facto de as companhias aéreas terem sido selecionadas através de convites à manifestação de interesse, o que permitiu à AITTV selecionar as propostas mais atrativas. Estes elementos teriam permitido demonstrar que esses acordos deviam implicar uma rendibilidade marginal.

46

Além disso, o acórdão recorrido não contém especificações relativas aos mercados e às quotas de mercado em causa, às capacidades das companhias aéreas, à fungibilidade das rotas, aos custos e às margens beneficiárias, e a outros parâmetros que permitam determinar se a Wizz Air e a Carpatair eram concorrentes.

47

Acresce que, embora o Tribunal Geral tenha reconhecido, no n.o 15 do acórdão recorrido, que a Carpatair tinha cessado as suas atividades no aeroporto internacional de Timişoara e já não oferecia voos regulares, continuou a não ter suficientemente em conta esses factos essenciais.

48

Em segundo lugar, o Tribunal Geral violou o seu dever de fundamentação ao não identificar o nexo de causalidade que existia entre as dificuldades financeiras da Carpatair e a alegada concorrência da Wizz Air, bem como ao limitar‑se a formular suposições, no n.o 83 do acórdão recorrido, ignorando outras explicações possíveis resultantes dos autos.

49

Afirmando, no n.o 46 da sua petição em primeira instância, ser concorrente direto da Wizz Air em cinco rotas, a Carpatair admitiu, no n.o 50 dessa petição, ter cessado as suas atividades em quinze rotas com partida do aeroporto internacional de Timişoara. De onde decorre que as dificuldades sentidas pela Carpatair eram demasiado grandes para poderem ser atribuídas à concorrência da Wizz Air num terço, apenas, das rotas asseguradas pela Carpatair a partir desse aeroporto.

50

Por outro lado, a Carpatair não salientou, na sua petição em primeira instância, que, em certas rotas, estava em concorrência com companhias aéreas que não a Wizz Air. Ora, essa concorrência, que podia também ter tido influência na situação da Carpatair, não foi examinada no acórdão recorrido.

51

A Carpatair considera que o quinto fundamento da AITTV é inadmissível na medida em que, com o mesmo, esta última sociedade se limita a repetir argumentos já invocados no Tribunal Geral, sem fazer prova de um erro de direito ou de uma desvirtuação dos elementos de prova.

52

A título subsidiário, a Carpatair afirma que este fundamento é improcedente.

53

A este propósito, salienta que, segundo jurisprudência constante, o prejuízo substancial para a posição concorrencial da recorrente nos mercados em causa não resulta de uma análise aprofundada das diferentes relações de concorrência nesses mercados, mas, em princípio, de uma constatação prima facie de que a concessão da medida visada tem por efeito prejudicar substancialmente essa posição.

54

A análise pormenorizada contida no acórdão recorrido demonstra que o Tribunal Geral examinou suficientemente todas as provas que lhe foram apresentadas e concluiu, corretamente, que os acordos de 2008 e de 2010 podiam afetar substancialmente a posição concorrencial da Carpatair nos mercados em causa.

Apreciação do Tribunal de Justiça

Quanto à admissibilidade

55

Quanto, em primeiro lugar, à admissibilidade do primeiro fundamento da Wizz Air, há que reconhecer que a Carpatair, ainda que afirmando que as constatações de facto do Tribunal Geral não são materialmente inexatas, reconheceu, no entanto, que este cometeu um erro no cálculo da diminuição dos seus rendimentos, à luz dos montantes mencionados num dos anexos do seu recurso de anulação. Além disso, ao invocar a violação, pelo Tribunal Geral, do direito a ser ouvida, a Wizz Air não se limita a pedir ao Tribunal de Justiça que proceda a uma nova apreciação dos factos, mas invoca a violação de uma formalidade substancial, o que constitui um fundamento de direito de que este último pode conhecer em sede de recurso.

56

Quanto, em segundo lugar, à admissibilidade do primeiro fundamento da AITTV, importa salientar, por um lado, que esse fundamento não está redigido de um modo tão impreciso que não permita compreender os argumentos em que assenta. Por outro lado, a simples circunstância de essa sociedade interpretar erradamente as condições de admissibilidade de um recurso de anulação, previstas no artigo 263.o, quarto parágrafo, TFUE, não pode ter como consequência que o referido fundamento deva ser declarado inadmissível. Com efeito, admitindo‑o demonstrado, tal erro deveria conduzir à improcedência do mesmo fundamento.

57

Quanto, em terceiro e último lugar, à admissibilidade do quinto fundamento da AITTV, há que declarar que, através desse fundamento, essa sociedade contesta o acórdão recorrido uma vez que o Tribunal Geral não teve em conta elementos de prova que lhe foram apresentados, e que violou o seu dever de fundamentação. Assim, tendo o referido fundamento origem no acórdão recorrido não pode, por hipótese, constituir uma repetição dos argumentos apresentados em primeira instância.

58

De onde resulta que a argumentação da Carpatair relativa à inadmissibilidade do primeiro fundamento da Wizz Air e do primeiro e quinto fundamentos da AITTV deve ser rejeitada na sua totalidade.

Quanto ao mérito

59

Não é contestado que a decisão controvertida constitui, por um lado, um ato individual, uma vez que nela se constata que os acordos de 2008 e de 2010 não são auxílios de Estado e, por outro, um ato regulamentar que não necessita de medidas de execução, na aceção do artigo 263.o, quarto parágrafo, terceiro membro da frase, TFUE, uma vez que nela se constata que o regime de taxas aeroportuárias, estabelecido pela AIP de 2010, não é um auxílio de Estado. Por conseguinte, o Tribunal Geral declarou, corretamente, que, para provar a sua legitimidade ativa, a Carpatair devia demonstrar que a parte da decisão controvertida relativa aos acordos de 2008 e de 2010 lhe dizia direta e individualmente respeito, bastando‑lhe demonstrar que a parte dessa decisão relativa à AIP de 2010 lhe dizia diretamente respeito.

60

A AITTV e a Wizz Air, apoiadas pela Comissão, contestam as apreciações do Tribunal Geral através das quais este declarou que a parte da decisão controvertida relativa aos acordos de 2008 e de 2010 dizia direta e individualmente respeito à Carpatair e a parte dessa decisão relativa à AIP de 2010 lhe dizia diretamente respeito.

– Quanto à condição segundo a qual a Carpatair deve ser individualmente afetada

61

Quando a recorrente põe em causa o mérito de uma decisão de apreciação do auxílio tomada com fundamento no artigo 108.o, n.o 3, TFUE ou no termo do procedimento formal de investigação, deve demonstrar que essa decisão a prejudica em razão de certas qualidades que lhe são particulares ou de uma situação de facto que a caracteriza em relação a qualquer outra pessoa e, dessa forma, a individualiza de modo análogo ao que o destinatário de tal decisão o seria. É o que sucede, nomeadamente, quando a posição do recorrente no mercado é substancialmente prejudicada pelo auxílio objeto da decisão em causa (v., neste sentido, Acórdãos de 17 de setembro de 2015, Mory e o./Comissão, C‑33/14 P, EU:C:2015:609, n.o 97, e de 31 de janeiro de 2023, Comissão/Braesch e o., C‑284/21 P, EU:C:2023:58, n.o 54).

62

Nos n.os 61 a 86 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral declarou que a parte da decisão controvertida relativa aos acordos de 2008 e de 2010 dizia individualmente respeito à Carpatair. Mais particularmente, após ter recusado conceder uma importância decisiva ao facto de a Carpatair ter desempenhado um papel ativo no desenrolar do procedimento administrativo, o Tribunal Geral sublinhou, por um lado, que essa sociedade tinha fornecido elementos relativos aos mercados em que mantinha uma relação de concorrência com a Wizz Air e tinha demonstrado que esses acordos eram uma das causas do prejuízo substancial para a sua posição concorrencial nesses mercados e, por outro, que a referida sociedade tinha demonstrado que dispunha de um estatuto especial que a caracterizava em relação às outras companhias aéreas presentes no aeroporto internacional de Timișoara.

63

Quanto, em primeiro lugar, à apreciação do Tribunal Geral, nos n.os 63 a 70 e 73 a 85 do acórdão recorrido, segundo a qual a Carpatair demonstrou que os acordos de 2008 e de 2010 podiam afetar de forma substancial a sua posição concorrencial nos mercados em causa, importa recordar que a demonstração, pelo recorrente, de um prejuízo substancial para a sua posição no mercado em causa não implica que se pronuncie de modo definitivo sobre as relações de concorrência entre esse recorrente e as empresas beneficiárias da medida controvertida, necessitando apenas que o referido recorrente indique de maneira pertinente as razões pelas quais a decisão da Comissão pode lesar os seus interesses legítimos ao prejudicar substancialmente a sua posição nesse mercado. Com efeito, o prejuízo substancial para a posição concorrencial do recorrente no referido mercado resulta, não de uma análise aprofundada das diferentes relações de concorrência no mesmo mercado, que permita determinar com precisão o alcance do prejuízo para a sua posição concorrencial, mas, em princípio, de uma constatação, prima facie, de que a concessão da medida visada pela decisão da Comissão conduz ao prejuízo substancial para essa posição (v., neste sentido, Acórdãos de 12 de julho de 1990, COFAZ/Comissão, C‑169/84, EU:C:1990:301, n.o 28, e de 20 de janeiro de 2022, Deutsche Lufthansa/Comissão, C‑594/19 P, EU:C:2022:40, n.os 74 e 75 e jurisprudência referida).

64

No caso em apreço, a AITTV censura, primeiro, o Tribunal Geral por ter declarado, no n.o 69 do acórdão recorrido, que a Wizz Air e a Carpatair estavam em concorrência em cinco rotas com partida do aeroporto internacional de Timișoara, sem ter em conta os contra‑argumentos perante si invocados.

65

A este respeito, importa recordar, por um lado, que o fundamento relativo à falta de resposta do Tribunal Geral a argumentos invocados em primeira instância equivale, em substância, a invocar uma violação do dever de fundamentação que decorre do artigo 36.o do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, aplicável ao Tribunal Geral por força do artigo 53.o, primeiro parágrafo, deste Estatuto, e do artigo 117.o do Regulamento de Processo do Tribunal Geral (v., neste sentido, Acórdãos de 20 de maio de 2010, Gogos/Comissão, C‑583/08 P, EU:C:2010:287, n.o 29, e de 14 de setembro de 2023, Land Rheinland‑Pfalz/Deutsche Lufthansa, C‑466/21 P, EU:C:2023:666, n.o 93).

66

Por outro lado, resulta dos n.os 64 a 69 do acórdão recorrido que o Tribunal Geral declarou que a Wizz Air e a Carpatair eram concorrentes em cinco rotas com partida do aeroporto internacional de Timișoara, por essas rotas servirem os mesmos aeroportos ou aeroportos que distavam menos de 100 km. Em contrapartida, não resulta de nenhuma passagem do acórdão recorrido que o Tribunal Geral examinou os argumentos através dos quais a AITTV contestava a existência dessa concorrência, alegando esta última sociedade, nomeadamente no n.o 15 do ser articulado de intervenção no Tribunal Geral, que a Wizz Air e a Carpatair tinham modelos comerciais diferentes e uma frota de aviões com características técnicas distintas.

67

É certo que o Tribunal Geral não está obrigado a apresentar uma exposição que acompanhe exaustiva e individualmente todos os passos do raciocínio articulado pelas partes no litígio, podendo a fundamentação do Tribunal Geral, portanto, ser implícita, na condição de permitir aos interessados conhecerem as razões pelas quais o Tribunal Geral não acolheu os seus argumentos e ao Tribunal de Justiça dispor dos elementos suficientes para exercer a sua fiscalização (Acórdãos de 9 de setembro de 2008, FIAMM e o./Conselho e Comissão, C‑120/06 P e C‑121/06 P, EU:C:2008:476, n.o 96, e de 14 de setembro de 2023, Land Rheinland‑Pfalz/Deutsche Lufthansa, C‑466/21 P, EU:C:2023:666, n.o 94).

68

É também verdade, como recordado no n.o 63 do presente acórdão, que, no âmbito da apreciação da admissibilidade de um recurso nos termos do artigo 263.o, quarto parágrafo, TFUE, a demonstração, pelo recorrente, de um prejuízo substancial para a sua posição no mercado em causa não implica que se pronuncie de modo definitivo sobre as relações de concorrência entre esse recorrente e o alegado beneficiário do auxílio em causa.

69

Não obstante, na medida em que, no caso em apreço, os dados apresentados pela AITTV visavam contestar a pertinência dos elementos fornecidos pela Carpatair para demonstrar que, prima facie, essa companhia aérea estava em concorrência com a Wizz Air, o Tribunal Geral, para cumprir o dever de fundamentação a que está obrigado, devia ter exposto as razões pelas quais considerava que esses dados não podiam pôr em causa a sua apreciação segundo a qual a Carpatair e a Wizz Air eram concorrentes.

70

Resulta do exposto que o Tribunal Geral, ao declarar que a Carpatair estava em concorrência com a Wizz Air em cinco rotas com partida do aeroporto internacional de Timișoara, sem expor as razões pelas quais não acolheu os argumentos da AITTV destinados a contestar a existência dessa concorrência, violou o dever de fundamentar os seus acórdãos de forma bastante para permitir aos interessados tomar conhecimento dos fundamentos em que se baseou e ao Tribunal de Justiça dispor dos elementos para exercer o seu controlo em sede de recurso.

71

Segundo, a Wizz Air e a AITTV entendem que o Tribunal Geral não demonstrou, nos n.os 73 a 85 do acórdão recorrido, que os acordos de 2008 e de 2010 podiam ser a causa da afetação substancial da posição concorrencial da Carpatair.

72

No acórdão recorrido, o Tribunal Geral baseou‑se em dois fundamentos para concluir, no n.o 79 do mesmo, que a Carpatair tinha demonstrado que os acordos de 2008 e de 2010 eram uma das causas da afetação substancial da sua posição nos mercados e do prejuízo para a sua posição concorrencial.

73

Por um lado, o Tribunal Geral salientou, no n.o 77 do acórdão recorrido, que, durante o procedimento administrativo, a Carpatair se queixou de um lucro cessante resultante da impossibilidade, para essa companhia aérea, de retomar duas rotas com partida do aeroporto internacional de Timișoara para o norte de Itália.

74

Como resulta da jurisprudência referida no n.o 61 do presente acórdão, cabe, todavia, ao recorrente fornecer ao Tribunal Geral os elementos de prova que demonstram a sua legitimidade ativa. Ora, como salientam a Wizz Air e a AITTV, apoiadas pela Comissão, a Carpatair não invocou esse lucro cessante na sua petição em primeira instância.

75

Embora seja verdade que a Carpatair juntou a essa petição, como anexo A.8, as observações que tinha apresentado por ocasião do procedimento administrativo e nas quais mencionava o referido lucro cessante, há que indicar que a referida petição só menciona esse anexo na nota de rodapé 31 e que essa nota remete unicamente de forma global para o referido anexo. Nenhuma passagem da petição da Carpatair consagrada à admissibilidade do seu recurso de anulação menciona esse lucro cessante causado pela concorrência desleal da Wizz Air.

76

Ora, a «exposição sumária dos fundamentos», que deve ser indicada em qualquer petição, na aceção do artigo 21.o do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, aplicável ao Tribunal Geral por força do artigo 53.o, primeiro parágrafo, desse estatuto, e do artigo 76.o, alínea d) do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, significa que a petição deve explicitar em que consiste o fundamento em que o recurso se baseia. Assim, para que um recurso no Tribunal Geral seja admissível, é designadamente necessário que os elementos essenciais de facto e de direito em que se baseia resultem, pelo menos sumariamente, mas de um modo coerente e compreensível, do texto da própria petição. Embora seja verdade que a petição pode ser sustentada e completada, no que respeita a aspetos específicos, por remissões para passagens determinadas de documentos que lhe estão anexados, uma remissão global para outros documentos, mesmo anexados à petição, não pode compensar a falta dos elementos essenciais da argumentação jurídica que, por força dessas disposições, devem figurar na petição (v., neste sentido, Acórdãos de 3 de março de 2022, WV/SEAE, C‑162/20 P, EU:C:2022:153, n.os 67 e 68, e de 27 de fevereiro de 2024, EUIPO/The KaiKai Company Jaeger Wichmann, C‑382/21 P, EU:C:2024:172, n.o 96).

77

Por conseguinte, nestas condições, não incumbe ao Tribunal Geral completar a argumentação desenvolvida pela Carpatair na sua petição, procurando e identificando, nos seus anexos, elementos de prova passíveis de apoiar a admissibilidade do recurso dessa sociedade.

78

O Tribunal Geral cometeu, portanto, um erro de direito ao basear‑se, no n.o 77 do acórdão recorrido, na existência de um lucro cessante resultante da impossibilidade, para a Carpatair, de retomar duas rotas com partida do aeroporto internacional de Timișoara para o norte de Itália.

79

Por outro lado, o Tribunal Geral salientou, nos n.os 74 a 76 do acórdão recorrido, que resultava do anexo A.7 da petição que, entre 2008 e 2010, o rendimento líquido da Carpatair nas cinco rotas com partida do aeroporto internacional de Timișoara nas quais entendeu que essa sociedade estava em concorrência com a Wizz Air tinha diminuído 52 %, no que respeita a quatro rotas para Itália, e 57 %, no que respeita à rota para Dusseldorf (Alemanha).

80

A este propósito, há que observar que, como a Wizz Air afirmou, essa constatação decorre de uma desvirtuação do anexo A.7 do recurso de anulação da Carpatair. Com efeito, essas percentagens não refletem a diminuição de rendimento dessas rotas, equivalendo ao rácio entre os rendimentos nas referidas rotas em 2010 e os rendimentos nas mesmas rotas em 2008, o que, aliás, a Carpatair reconhece na sua contestação.

81

Além disso, como a Wizz Air e a AITTV alegam, sem ser contrariadas pela Carpatair, resulta desse anexo A.7 que, no decurso do mesmo período, o rendimento de certas rotas asseguradas pela Carpatair com partida do aeroporto internacional de Timișoara, relativamente às quais o Tribunal Geral declarou, no n.o 69 do acórdão recorrido, que esta última sociedade não tinha demonstrado que estava em concorrência com a Wizz Air, diminuiu tanto, se não mais, que o rendimento das rotas nas quais, segundo o Tribunal, a Carpatair estava em concorrência direta com a Wizz Air.

82

Ao não ter em conta esses elementos quando eles resultavam manifestamente do anexo A.7 da petição em primeira instância da Carpatair, e ao não explicar as razões dessa omissão, o Tribunal Geral desvirtuou esse elemento de prova e violou o seu dever de fundamentação.

83

Acresce que, à luz de tal diminuição global do rendimento das rotas operadas pela Carpatair com partida do aeroporto internacional de Timișoara, o Tribunal Geral não se podia limitar a afirmar, no n.o 80 do acórdão recorrido, que os elementos apresentados pela companhia aérea para demonstrar que os acordos de 2008 e de 2010 podiam afetar de forma substancial a sua posição concorrencial nos mercados em questão não eram postos em causa pela argumentação destinada a demonstrar que essa diminuição podia ter sido causada por outros fatores, como o modelo comercial alegadamente obsoleto da referida companhia aérea, a concorrência que a mesma companhia mantinha com outras companhias aéreas que não a Wizz Air ou a crise financeira mundial, sem ter em consideração esses argumentos e, de qualquer modo, sem explicar as razões pelas quais os referidos argumentos deviam ser rejeitados.

84

É certo, como recorda o Tribunal Geral no n.o 82 do acórdão recorrido, que não pode ser exigido à Carpatair que demonstre que as suas dificuldades financeiras substanciais se devem exclusivamente aos acordos de 2008 e de 2010. Não obstante, é ainda necessário que o Tribunal Geral tenha podido concluir que era, pelo menos, plausível, que esses acordos fossem a causa dessas dificuldades.

85

Decorre de todas as considerações expostas que o Tribunal Geral não justificou a sua apreciação segundo a qual os acordos de 2008 e de 2010 podiam afetar de forma substancial a posição concorrencial da Carpatair nos mercados em causa.

86

Quanto, em segundo lugar, à apreciação do Tribunal Geral, nos n.os 71 e 72 do acórdão recorrido, segundo a qual a Carpatair demonstrou ter um estatuto especial, que a caracterizava em relação às outras companhias aéreas presentes no aeroporto internacional de Timișoara, importa recordar, a título liminar, que as questões relativas à admissibilidade de um recurso de anulação constituem questões de ordem pública que compete aos órgãos jurisdicionais da União examinar a qualquer momento, mesmo oficiosamente (Acórdão de 21 de setembro de 2023, China Chamber of Commerce for Import and Export of Machinery and Electronic Products e o./Comissão, C‑478/21 P, EU:C:2023:685, n.o 42 e jurisprudência referida).

87

Ora, a afirmação contida no n.o 72 do acórdão recorrido, segundo a qual a Carpatair dispunha de um estatuto especial na medida em que era a única empresa que estava em concorrência direta com a Wizz Air em cinco rotas com partida do aeroporto internacional de Timișoara, está viciada por falta de fundamentação, como salientado no n.o 70 do presente acórdão.

88

As alegadas relações de concorrência entre a Wizz Air e a Carpatair não podem, portanto, apoiar a constatação segundo a qual esta última companhia aérea dispunha de um estatuto especial que a caracterizava em relação a qualquer outra pessoa e, por isso, a individualizava de um modo análogo ao do destinatário da decisão controvertida, ou seja, a Roménia.

89

Nestas condições, a afirmação, no n.o 71 do acórdão recorrido, segundo a qual a atividade do aeroporto internacional de Timișoara estava centrada nas atividades da Carpatair e esta retirava 90 % do seu volume de negócios das suas atividades a partir desse aeroporto não é suficiente para demonstrar que esta última sociedade, cuja concorrência com a Wizz Air não foi demonstrada de forma juridicamente bastante, é afetada individualmente pela parte da decisão controvertida que declara que os acordos de 2008 e de 2010, celebrados entre o referido aeroporto e a Wizz Air, não constituem auxílios de Estado, na aceção do artigo 107.o TFUE.

90

Resulta de todas as considerações expostas que o Tribunal Geral não justificou de forma juridicamente bastante a sua conclusão segundo a qual a Carpatair tinha demonstrado que a parte da decisão controvertida relativa aos acordos de 2008 e de 2010 lhe dizia individualmente respeito.

– Quanto à condição segundo a qual a Carpatair deve ser diretamente afetada

91

Como o Tribunal Geral recordou, corretamente, nos n.os 87 e 89 do acórdão recorrido, para demonstrar que a decisão controvertida lhe dizia diretamente respeito, a Carpatair devia, nomeadamente, demonstrar que essa decisão produz diretamente efeitos na sua situação jurídica ao expor, de maneira pertinente, as razões pelas quais a referida decisão a pode colocar numa situação concorrencial desvantajosa.

92

A este propósito, o Tribunal Geral salientou, no n.o 90 do acórdão recorrido, que resultava dos autos que a Wizz Air era a alegada beneficiária dos acordos de 2008 e de 2010 e da AIP de 2010, que esta sociedade e a Carpatair exerciam atividades semelhantes e estavam ativas no mesmo mercado de serviços e no mesmo mercado geográfico. Concluiu, portanto, que a Carpatair tinha justificado de maneira pertinente que a decisão controvertida a podia colocar numa situação concorrencial desvantajosa.

93

Todavia, a AITTV censura o Tribunal Geral por ter, em substância, declarado, nesse n.o 90, que a Wizz Air e a Carpatair eram concorrentes, sem ter em conta contra‑argumentos a este respeito que tinham sido perante si avançados.

94

Como já exposto no n.o 70 do presente acórdão, tal constatação do Tribunal Geral está efetivamente viciada por falta de fundamentação.

95

O acórdão recorrido está, portanto, também viciado por falta de fundamentação uma vez que o Tribunal Geral declarou que a decisão controvertida na medida em que visa quer os acordos de 2008 e de 2010 quer a AIP de 2010 diz diretamente respeito à Carpatair.

96

Resulta de todas as considerações expostas que o Tribunal Geral não justificou de forma juridicamente bastante que a Carpatair tinha legitimidade ativa para pedir a anulação da decisão controvertida. Logo, o primeiro fundamento da Wizz Air e o primeiro e quinto fundamentos da AITTV, na medida em que contestam essa legitimidade ativa da Carpatair, devem ser julgados procedentes.

97

Sem que seja necessário decidir sobre os outros fundamentos dos recursos da AITTV e da Wizz Air, ou sobre o recurso da Comissão, nomeadamente na medida em que põem em causa o raciocínio do Tribunal Geral quanto ao mérito, há que anular o acórdão recorrido.

Quanto ao recurso no Tribunal Geral

98

Em conformidade com o disposto no artigo 61.o, primeiro parágrafo, segundo período, do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, o Tribunal de Justiça pode, em caso de anulação da decisão do Tribunal Geral, decidir definitivamente o litígio se este estiver em condições de ser julgado.

99

Não é o que sucede no presente caso.

100

Com efeito, tendo em conta a existência, no acórdão recorrido, de desvirtuações dos elementos de prova e de faltas de fundamentação, o exame da admissibilidade do recurso em primeira instância e, sendo caso disso, do mérito desse recurso implica apreciações de facto que exigem, por parte do Tribunal de Justiça, a adoção de medidas suplementares de organização do processo ou de instrução do mesmo.

101

Por conseguinte, há que remeter o processo ao Tribunal Geral.

Quanto às despesas

102

Uma vez que o processo é remetido ao Tribunal Geral, reserva‑se para final a decisão quanto às despesas relativas aos presentes recursos.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Nona Secção) decide:

 

1)

É anulado o Acórdão do Tribunal Geral da União Europeia de 8 de fevereiro de 2023, Carpatair/Comissão (T‑522/20, EU:T:2023:51).

 

2)

O processo é remetido ao Tribunal Geral da União Europeia.

 

3)

Reserva‑se para final a decisão quanto às despesas.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: inglês.

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