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Document 62023CJ0230

Acórdão do Tribunal de Justiça (Primeira Secção) de 14 de novembro de 2024.
Reprobel CV contra Copaco Belgium NV.
Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo ondernemingsrechtbank Gent, afdeling Gent.
Reenvio prejudicial — Aproximação das legislações — Harmonização de certos aspetos do direito de autor e dos direitos conexos na sociedade da informação — Diretiva 2001/29/CE — Artigo 2.° — Direito de reprodução — Artigo 5.°, n.° 2, alíneas a) e b) — Exceções e limitações — Compensação equitativa — Efeito direto — Entidade encarregada pelo Estado da cobrança e repartição da compensação equitativa — Poderes exorbitantes.
Processo C-230/23.

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2024:951

 ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção)

14 de novembro de 2024 ( *1 )

«Reenvio prejudicial — Aproximação das legislações — Harmonização de certos aspetos do direito de autor e dos direitos conexos na sociedade da informação — Diretiva 2001/29/CE — Artigo 2.o — Direito de reprodução — Artigo 5.o, n.o 2, alíneas a) e b) — Exceções e limitações — Compensação equitativa — Efeito direto — Entidade encarregada pelo Estado da cobrança e repartição da compensação equitativa — Poderes exorbitantes»

No processo C‑230/23,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo ondernemingsrechtbank Gent, afdeling Gent (Tribunal das Empresas de Gante, divisão de Gante, Bélgica), por Decisão de 16 de fevereiro de 2023, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 13 de abril de 2023, no processo

Reprobel CV,

contra

Copaco Belgium NV,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção),

composto por: T. von Danwitz, vice‑presidente do Tribunal de Justiça, exercendo funções de presidente da Primeira Secção, A. Arabadjiev e I. Ziemele (relatora), juízes,

advogado‑geral: M. Szpunar,

secretário: A. Lamote, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 6 de março de 2024,

vistas as observações apresentadas:

em representação da Reprobel CV, por A. Lambert e J.‑F. Puyraimond, advocaten,

em representação da Copaco Belgium NV, por T. van Innis, advocaat,

em representação do Governo Belga, por P. Cottin e C. Pochet, na qualidade de agentes, assistidos por S. Depré, G. Ryelandt e J. Van Vyve, avocats,

em representação do Governo Francês, por E. Timmermans, na qualidade de agente,

em representação da Comissão Europeia, por F. Ronkes Agerbeek, J. Samnadda e P. J. O. Van Nuffel, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 6 de junho de 2024,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 5.o, n.o 2, alíneas a) e b), da Diretiva 2001/29/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de maio de 2001, relativa à harmonização de certos aspetos do direito de autor e dos direitos conexos na sociedade da informação (JO 2001, L 167, p. 10).

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a Reprobel CV, uma sociedade de gestão coletiva de direitos de autor e de editor, encarregada pelo Estado belga da cobrança e repartição dos direitos à remuneração para compensação equitativa que cabem aos autores e aos editores a título de atividades de reprografia, à Copaco Belgium NV (a seguir «Copaco»), sociedade anónima, a propósito da recusa desta última de pagar à Reprobel quantias alegadamente devidas a título destas remunerações.

Quadro jurídico

Direito da União

3

Os considerandos 31, 35 e 38 da Diretiva 2001/29 enunciam:

«(31)

Deve ser salvaguardado um justo equilíbrio de direitos e interesses entre as diferentes categorias de titulares de direitos, bem como entre as diferentes categorias de titulares de direitos e utilizadores de material protegido. […]

[…]

(35)

Em certos casos de exceção ou limitação, os titulares dos direitos devem receber uma compensação equitativa que os compense de modo adequado da utilização feita das suas obras ou outra matéria protegida. Na determinação da forma, das modalidades e do possível nível dessa compensação equitativa, devem ser tidas em conta as circunstâncias específicas a cada caso. Aquando da avaliação dessas circunstâncias, o principal critério será o possível prejuízo resultante do ato em questão para os titulares de direitos. Nos casos em que os titulares dos direitos já tenham recebido pagamento sob qualquer outra forma, por exemplo como parte de uma taxa de licença, não dará necessariamente lugar a qualquer pagamento específico ou separado. O nível da compensação equitativa deverá ter devidamente em conta o grau de utilização das medidas de caráter tecnológico destinadas à proteção referidas na presente diretiva. Em certas situações em que o prejuízo para o titular do direito seja mínimo, não há lugar a obrigação de pagamento.

[…]

(38)

Deve dar‑se aos Estados‑Membros a faculdade de preverem uma exceção ou limitação ao direito de reprodução mediante uma equitativa compensação, para certos tipos de reproduções de material áudio, visual e audiovisual destinadas a utilização privada. Tal pode incluir a introdução ou a manutenção de sistemas de remuneração para compensar o prejuízo causado aos titulares dos direitos. […]»

4

O artigo 2.o desta diretiva, sob a epígrafe «Direito de reprodução», dispõe:

«Os Estados‑Membros devem prever que o direito exclusivo de autorização ou proibição de reproduções, diretas ou indiretas, temporárias ou permanentes, por quaisquer meios e sob qualquer forma, no todo ou em parte, cabe:

a)

Aos autores, para as suas obras;

b)

Aos artistas intérpretes ou executantes, para as fixações das suas prestações;

c)

Aos produtores de fonogramas, para os seus fonogramas;

d)

Aos produtores de primeiras fixações de filmes, para o original e as cópias dos seus filmes;

e)

Aos organismos de radiodifusão, para as fixações das suas radiodifusões, independentemente de estas serem transmitidas por fio ou sem fio, incluindo por cabo ou satélite.»

5

O artigo 5.o da referida diretiva, sob a epígrafe «Exceções e limitações», dispõe, no seu n.o 2:

«Os Estados‑Membros podem prever exceções ou limitações ao direito de reprodução previsto no artigo 2.o nos seguintes casos:

a)

Em relação à reprodução em papel ou suporte semelhante, realizada através de qualquer tipo de técnica fotográfica ou de qualquer outro processo com efeitos semelhantes, com exceção das partituras, desde que os titulares dos direitos obtenham uma compensação equitativa;

b)

Em relação às reproduções em qualquer meio efetuadas por uma pessoa singular para uso privado e sem fins comerciais diretos ou indiretos, desde que os titulares dos direitos obtenham uma compensação equitativa que tome em conta a aplicação ou a não aplicação de medidas de caráter tecnológico, referidas no artigo 6.o, à obra ou outro material em causa;

[…]»

Direito belga

6

O artigo 59.o da wet betreffende het auteursrecht en de naburige rechten (Lei relativa aos Direitos de Autor e Direitos Conexos), de 30 de junho de 1994 (Belgisch Staatsblad de 27 de julho de 1994, p. 19297), na sua versão aplicável ao litígio no processo principal (a seguir «LDA»), dispunha:

«Os autores e os editores de obras fixadas em suporte gráfico ou análogo têm direito a uma remuneração em razão da sua reprodução, incluindo nas condições previstas nos artigos 22.o, § 1, 4° e 4°‑bis, […]

A remuneração é paga pelo fabricante, pelo importador ou pelo adquirente intracomunitário de aparelhos que permitam efetuar cópias de obras protegidas, no momento da entrada em circulação desses aparelhos no território nacional.»

7

O artigo 60.o da LDA previa:

«Além disso, é devida uma remuneração proporcional, determinada em função do número de cópias realizadas, pelas pessoas singulares ou coletivas que realizem cópias de obras ou, se for caso disso, através de quitação a favor das primeiras, pelas pessoas que coloquem, a título oneroso ou gratuito, um aparelho de reprodução à disposição de outrem.»

8

O artigo 60.obis da LDA tinha a seguinte redação:

«A sociedade de gestão de direitos designada pelo Rei no âmbito do presente capítulo poderá obter as informações necessárias ao cumprimento da sua missão, em conformidade com o artigo 78.o, junto das seguintes entidades:

Administração Aduaneira e dos Impostos Especiais de Consumo, nos termos do artigo 320.o da Lei Geral relativa aos Direitos Aduaneiros e aos Impostos Especiais de Consumo, de 18 de julho de 1977, substituída pela Lei de 27 de dezembro de 1993;

Administração do [Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA)] por aplicação do artigo 93.obis do Código do IVA de 3 de julho de 1969;

e Instituto Nacional da Segurança Social, em conformidade com a Lei de 15 de janeiro de 1990 relativa à Instituição e à Organização de um Crossroads Bank for Social Security.

Sem prejuízo do disposto no artigo 78.o da presente lei, a sociedade de gestão de direitos designada poderá fornecer informações às administrações aduaneiras e do IVA a pedido destas. Sem prejuízo do disposto no artigo 78.o da presente lei, a sociedade de gestão de direitos designada poderá comunicar e receber informações:

do Serviço Controlo e Mediação do [Serviço Público Federal (SPF)] Economia;

das sociedades de gestão de direitos que exerçam uma atividade semelhante no estrangeiro, sob condição de reciprocidade.»

9

Nos termos do artigo 61.o da LDA:

«O Rei, através de decreto adotado em Conselho de Ministros, fixa o montante das remunerações previstas nos artigos 59.o e 60.o A remuneração prevista no artigo 60.o pode variar em função dos setores em causa.

O Rei fixa as modalidades de cobrança, de repartição e de controlo dessas remunerações, bem como o momento em que estas são devidas.

Sem prejuízo das convenções internacionais, as remunerações previstas nos artigos 59.o e 60.o são atribuídas em partes iguais aos autores e aos editores.

Nos termos dos requisitos e das modalidades por Si fixadas, o Rei encarrega uma sociedade representativa de todas as sociedades de gestão de direitos de assegurar a cobrança e a repartição da remuneração.»

10

Os montantes da remuneração fixa e da remuneração proporcional, referidas, respetivamente, nos artigos 59.o e 60.o da LDA, foram fixados pelo Koninklijk besluit betreffende de vergoeding verschuldigd aan auteurs en uitgevers voor het kopiëren voor privé‑gebruik or didatisch gebruik van werken die op grafische of op soortgelijke wizje zijn vastgelegd (Decreto Real relativo à Remuneração dos Autores e dos Editores pela Cópia, para Fins Privados ou Didáticos, de Obras Fixadas em Suporte Gráfico ou Análogo), de 30 de outubro de 1997 (Belgisch Staatsblad de 7 de novembro de 1997, p. 29874).

11

O artigo 7.o deste decreto real prevê:

«§ 1.   Os devedores apresentam mensalmente uma declaração à sociedade de gestão dos direitos antes do vigésimo dia seguinte ao mês a que se refere.

§ 2.   A declaração referida no § 1 menciona, por um lado, as informações que permitem identificar o devedor e, por outro, o número e as características necessárias à determinação do montante da remuneração fixa dos aparelhos colocados em circulação no território nacional durante o período abrangido pela declaração.

[…]»

12

O artigo 1.o do Koninklijk besluit tot het belasten van een vennootschap met de inning en de verdeling van de vergoeding voor het kopiëren van werken die op grafische of soortgelijke wijze zijn vastgelegd (Decreto Real relativo à Determinação da Entidade Encarregada da Cobrança e Repartição da Remuneração pela Reprodução de Obras Fixadas em Suportes Gráficos ou Análogos), de 15 de outubro de 1997 (Belgisch Staatsblad de 7 de novembro de 1997, p. 29873), dispõe:

«A sociedade civil sob a forma de sociedade cooperativa de responsabilidade limitada denominada “Reprobel”, […] está encarregada de assegurar a cobrança e a repartição dos direitos à remuneração previstos nos artigos 59.o a 61.o da [LDA].»

Litígio no processo principal e questões prejudiciais

13

Enquanto distribuidor de produtos informáticos destinados às empresas e aos consumidores, a Copaco distribui igualmente aparelhos de reprodução, tais como fotocopiadoras e scanners. Por esta razão, até ao final de 2016 devia pagar à sociedade Reprobel remunerações fixas pela reprodução de obras protegidas por direitos de autor ou direitos conexos (a seguir «remunerações para compensação equitativa»).

14

Considerando que, no seu Acórdão de 12 de novembro de 2015, Hewlett‑Packard Belgium (C‑572/13, EU:C:2015:750), o Tribunal de Justiça tinha declarado que o artigo 5.o, n.o 2, alíneas a) e b), da Diretiva 2001/29 se opunha à parte «fixa» do sistema de remuneração previsto pela regulamentação belga em matéria de remuneração para compensação equitativa, a Copaco suspendeu o pagamento das faturas emitidas pela Reprobel, relativas a essa remuneração para o período compreendido entre os meses de novembro de 2015 e janeiro de 2017, invocando o efeito direto desta disposição e indicando que a suspensão desse pagamento duraria até que as disposições dessa regulamentação fossem alinhadas com as da Diretiva 2001/29.

15

No mês de março de 2017, entrou em vigor um novo regime de remuneração para compensação equitativa.

16

Em 16 de dezembro de 2020, a Reprobel intentou uma ação judicial contra a Copaco no ondernemingsrechtbank Gent, afdeling Dendermonde (Tribunal das Empresas de Gante, divisão de Dendermonde, Bélgica), que, por Decisão Interlocutória de 4 de março de 2022, remeteu o processo ao ondernemingsrechtbank Gent, afdeling Gent (Tribunal das Empresas de Gante, divisão de Gante, Bélgica), que é o órgão jurisdicional de reenvio, por razões de competência territorial.

17

Este último salienta que resulta do Acórdão de 12 de novembro de 2015, Hewlett‑Packard Belgium (C‑572/13, EU:C:2015:750), que as modalidades previstas pelo regime belga de remunerações para compensação equitativa, em causa no processo que deu origem a esse acórdão, eram, pelo menos em parte, contrárias à Diretiva 2001/29, na medida em que a compensação equitativa prevista no artigo 5.o, n.o 2, alínea b), desta diretiva não tinha encontrado eco nesse regime que previa, até 29 de dezembro de 2016, a aplicação de remunerações fixas sem correlação quantitativa objetiva com a utilização efetiva dos aparelhos de reprodução, pelo que essas remunerações corriam o risco de exceder o seu caráter puramente indemnizatório.

18

O órgão jurisdicional de reenvio refere que, no Acórdão de 12 de novembro de 2015, Hewlett‑Packard Belgium (C‑572/13, EU:C:2015:750), o Tribunal de Justiça interpretou as exceções ou limitações que um Estado‑Membro pode prever na sua legislação nacional ao abrigo do artigo 5.o, n.o 2, alíneas a) e b), da Diretiva 2001/29, as quais não tinham sido integradas no regime belga de remunerações para compensação equitativa em vigor até 29 de dezembro de 2016. O Tribunal de Justiça considerou, nomeadamente, que este regime não era conforme com esta disposição. A este respeito, salientou que o referido regime fazia depender o montante da remuneração fixa unicamente do número de cópias por minuto que podia ser feito com as fotocopiadoras em causa, que previa o pagamento, pelo menos em parte, dessas remunerações em função do prejuízo que as reproduções ilícitas podiam causar aos autores em causa, que atribuía as remunerações, em parte ou não, a pessoas diferentes dos autores, que o pagamento de remunerações era exigido a pessoas que colocavam fotocopiadoras à disposição de utilizadores identificáveis e que previa um sistema suscetível de conduzir a uma sobrecompensação dos beneficiários das remunerações, impondo simultaneamente uma remuneração fixa e uma remuneração proporcional, sem mecanismos de reembolso.

19

O órgão jurisdicional de reenvio refere igualmente que, quando não é possível nenhuma interpretação conforme com uma diretiva, as disposições nacionais devem ceder perante as da diretiva em causa. Todavia, observa que as partes no litígio que lhe foi submetido estão em desacordo quanto aos requisitos necessários para esse efeito.

20

Segundo a Copaco, o artigo 5.o, n.o 2, alíneas a) e b), da Diretiva 2001/29 tem um efeito direto e pode ser invocado contra a Reprobel, que deve ser considerada uma entidade estatal devido à missão que lhe foi confiada pelo Estado, de cobrar e repartir remunerações para compensação equitativa.

21

Em contrapartida, a Reprobel contesta o caráter incondicional, claro e preciso do artigo 5.o, n.o 2, alíneas a) e b), da Diretiva 2001/29, uma vez que os Estados‑Membros podem prever as exceções e limitações referidas nesta disposição como entenderem e que cabe a esses Estados definir o caráter equitativo da compensação prevista no artigo 5.o, n.o 2, desta diretiva.

22

A Reprobel considera, por outro lado, que, por ser uma associação de direito privado, a Diretiva 2001/29 não lhe pode ser oposta.

23

Foi nestas circunstâncias que o ondernemingsrechtbank Gent, afdeling Gent (Tribunal das Empresas de Gante, divisão de Gante) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

Pode um particular opor, em sua defesa, a uma entidade, como a REPROBEL, na medida em que esta tenha sido encarregada pelo Estado, mediante mandato real, de assegurar a cobrança e a repartição da(s) compensação(ões) equitativa(s) prevista(s) no artigo 5.o, n.o 2, alíneas a) e b), da Diretiva 2001/29, e seja controlada pelo Estado, a incompatibilidade com o direito da União de uma norma nacional que essa entidade pretende impor a esse particular?

2)

É relevante para a resposta a esta questão o facto de o controlo exercido pelo Estado sobre esta entidade incluir, nomeadamente:

A obrigação de essa entidade transmitir sempre ao ministro competente uma cópia do pedido de dados enviado aos devedores, necessário tanto para a cobrança como para a repartição da taxa de reprografia, para que o mesmo possa conhecer o modo como a entidade exerce o seu direito de controlo e decidir se é oportuno determinar, por decreto ministerial, o conteúdo, o número e a frequência dos pedidos de dados para que a referida entidade não perturbe mais do que o necessário a atividade das pessoas inquiridas;

A obrigação de a entidade recorrer ao representante do ministro para transmitir um pedido de dados, necessário para a cobrança da taxa de reprografia proporcional, a enviar aos devedores, aos concessionários, grossistas ou retalhistas, às sociedades de leasing ou às sociedades de manutenção de aparelhos, se o devedor não tiver colaborado na cobrança, entendendo‑se para o efeito que a entidade tem igualmente a obrigação de transmitir uma cópia deste pedido ao ministro competente a fim de que este possa determinar o conteúdo, o número e a frequência dos pedidos de dados para que a referida entidade não perturbe mais do que o necessário a atividade das pessoas inquiridas;

A obrigação de a entidade submeter à aprovação do ministro competente as regras de repartição da taxa de reprografia, bem como quaisquer alterações aí introduzidas;

A obrigação de a entidade submeter à aprovação do ministro competente o formulário de declaração por si elaborado, sob pena de este não poder ser distribuído?

3)

É relevante para a resposta à questão submetida o facto de a entidade dispor dos seguintes poderes:

O poder de exigir todos os dados necessários à cobrança da taxa de reprografia a todas as pessoas devedoras da taxa, pessoas sujeitas à obrigação de contribuição, concessionários, grossistas ou retalhistas, sociedades de leasing e empresas de manutenção de aparelhos. O pedido deve sempre incluir obrigatoriamente a menção das sanções penais aplicáveis em caso de incumprimento do prazo fixado ou de comunicação de informações incompletas ou inexatas;

O poder de exigir a todos os devedores que forneçam todos os dados relativos às obras copiadas necessários à repartição da taxa de reprografia;

O poder de obter todas as informações necessárias ao desempenho das suas funções junto da Administração Aduaneira e dos Impostos Especiais de Consumo, da Administração do IVA e do Instituto Nacional de Segurança Social?

4)

O artigo 5.o, n.o 2, alíneas a) e b), da Diretiva 2001/29 tem efeito direto?

5)

Deve um órgão jurisdicional nacional, a pedido de um particular, afastar a aplicação de uma norma nacional se esta norma imposta pelo Estado for contrária ao referido artigo 5.o, [n.o 2,] alíneas a) e b), da Diretiva 2001/29, mais especificamente porque esta norma impõe ao particular, em violação do referido artigo, o pagamento de taxas?»

Quanto às questões prejudiciais

Quanto à primeira, segunda e terceira questões

24

Com a sua primeira, segunda e terceira questões, que devem ser analisadas conjuntamente, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 5.o, n.o 2, alíneas a) e b), da Diretiva 2001/29 deve ser interpretado no sentido de que um particular pode opor, no órgão jurisdicional nacional, a uma entidade encarregada por um Estado‑Membro da cobrança e da repartição das compensações equitativas estabelecidas em aplicação desta disposição, o facto de a regulamentação nacional que prevê essas compensações ser contrária ao direito da União, quando essa entidade cumpra uma missão de interesse público, esteja sujeita ao controlo desse Estado e disponha, para o exercício dessa missão, de poderes exorbitantes face às regras aplicáveis às relações entre os particulares.

25

A título preliminar, importa salientar que resulta do quadro jurídico nacional aplicável ao litígio no processo principal, apresentado na decisão de reenvio, que a Reprobel tem a forma jurídica de uma sociedade cooperativa, de direito privado, na qual o Estado belga não está representado.

26

No entanto, segundo jurisprudência constante, as disposições incondicionais e suficientemente precisas de uma diretiva podem ser invocadas pelos particulares não apenas contra os Estados‑Membros e os seus órgãos stricto sensu, mas também, nomeadamente, contra organismos que estejam sujeitos à autoridade ou ao controlo de uma autoridade pública, que desempenhem uma missão de interesse público e que disponham de poderes exorbitantes face às regras aplicáveis nas relações entre particulares. Tais organismos ou entidades distinguem‑se dos particulares e devem ser equiparados ao Estado, quer porque são pessoas coletivas de direito público que fazem parte do Estado em sentido amplo, quer porque estão sujeitos à autoridade ou ao controlo de uma autoridade pública, quer ainda porque foram encarregados, por essa autoridade, de exercer uma missão de interesse público e foram dotados, para esse efeito, dos referidos poderes exorbitantes (v., neste sentido, Acórdãos de 12 de julho de 1990, Foster e o., C‑188/89, EU:C:1990:313, n.o 20, e de 10 de outubro de 2017, Farrell, C‑413/15, EU:C:2017:745, n.os 33 e 34).

27

A este respeito, o Tribunal de Justiça precisou que os requisitos segundo os quais o organismo em causa deve, respetivamente, estar sujeito à autoridade ou ao controlo do Estado e dispor de poderes exorbitantes face aos que resultam das regras aplicáveis nas relações entre particulares não são cumulativos (Acórdão de 10 de outubro de 2017, Farrell, C‑413/15, EU:C:2017:745, n.o 28).

28

No caso em apreço, resulta dos autos de que o Tribunal de Justiça dispõe que a Reprobel não é um organismo de direito público e também não é controlada pelo Estado belga. Há, portanto, que ponderar se a Reprobel cumpre uma missão de interesse público e se dispõe, para o efeito, de poderes exorbitantes face às regras aplicáveis nas relações entre particulares.

29

Em primeiro lugar, em conformidade com a jurisprudência referida no n.o 26 do presente acórdão, no que respeita ao requisito relativo ao exercício de uma missão de interesse público, o Decreto Real relativo à Determinação da Entidade Encarregada da Cobrança e Repartição da Remuneração pela Reprodução de Obras Fixadas em Suportes Gráficos ou Análogos, de 15 de outubro de 1997, encarregou a Reprobel da cobrança e da repartição dos direitos a remunerações por compensação equitativa, previstos nos artigos 59.o a 61.o da LDA.

30

A este respeito, importa recordar que os Estados‑Membros estão habilitados, por força do artigo 5.o, n.o 2, alíneas a) e b), da Diretiva 2001/29, a prever, nas respetivas ordens jurídicas, exceções ao direito de reprodução aí previsto e também têm a obrigação de prever, a esse título, uma compensação equitativa e um sistema de financiamento dessa compensação (v., neste sentido, Acórdão de 23 de novembro de 2023, Seven.One Entertainment Group, C‑260/22, EU:C:2023:900, n.o 23).

31

Por outro lado, no que respeita à forma, às modalidades e ao nível da compensação equitativa, o Tribunal de Justiça já declarou que esta compensação, bem como, por conseguinte, o regime em que assenta e o seu nível devem estar ligados ao dano causado aos titulares de direitos devido à realização de cópias privadas (Acórdãos de 22 de setembro de 2016, Microsoft Mobile Sales International e o., C‑110/15, EU:C:2016:717, n.o 28, e de 24 de março de 2022, Austro‑Mechana, C‑433/20, EU:C:2022:217, n.o 49).

32

Além disso, o Tribunal de Justiça pronunciou‑se sobre as modalidades de cobrança e de repartição das remunerações para compensação equitativa previstas pela legislação belga. Por um lado, considerou que a compensação equitativa prevista no artigo 5.o, n.o 2, alínea b), da Diretiva 2001/29 dizia respeito às reproduções efetuadas em qualquer meio e por qualquer técnica, ou seja, que é suportada por todos os utilizadores de aparelhos, suportes ou serviços que permitam efetuar ou incluam essas reproduções, podendo estes utilizadores beneficiar das exceções previstas nesta disposição (v., neste sentido, Acórdão de 12 de novembro de 2015, Hewlett‑Packard Belgium, C‑572/13, EU:C:2015:750, n.os 30 a 34).

33

Acresce que o Tribunal de Justiça declarou que a compensação equitativa, em princípio, se destina a compensar o prejuízo sofrido na sequência das reproduções efetivamente realizadas e que cabe, em princípio, às pessoas que efetuaram as reproduções reparar o prejuízo decorrente das mesmas, financiando a compensação que será paga ao titular de direitos. Tendo em conta as dificuldades práticas de identificação dos utilizadores, os Estados‑Membros podem prever um sistema em que esta compensação seja da responsabilidade das pessoas que dispõem de equipamentos, de aparelhos e de suportes de reprodução digital e que disponibilizam esses equipamentos, aparelhos ou suportes aos utilizadores, ou prestam a estes últimos serviços de reprodução, e que repercutem o respetivo encargo financeiro sobre os utilizadores finais (v., neste sentido, Acórdão de 12 de novembro de 2015, Hewlett‑Packard Belgium, C‑572/13, EU:C:2015:750, n.os 69 e 70).

34

Neste contexto, como salientou, em substância, o advogado‑geral no n.o 40 das suas conclusões no presente processo, seria, com efeito, muito difícil para o titular do direito de reprodução fazer valer esse direito em relação a atos que os utilizadores praticam no domínio privado. A introdução das exceções a este direito previstas no artigo 5.o, n.o 2, da Diretiva 2001/29 assegura, portanto, aos titulares de direitos o benefício de rendimentos que seriam altamente difíceis de obter diretamente dos utilizadores.

35

A regulamentação belga prevê que os titulares de direitos de autor e de direitos conexos recebem, a título destas exceções, uma indemnização pelo prejuízo sofrido, constituída por uma parte, calculada de forma fixa e determinada a montante, e por uma remuneração proporcional determinada a jusante, que são financiadas pelas remunerações pagas por todos os adquirentes de aparelhos e de suportes de cópia ou destinatários de serviços de reprodução autorizados a beneficiar dessas exceções. A cobrança dessa remuneração e o pagamento de uma compensação equitativa aos titulares dos referidos direitos constituem, portanto, missões de interesse público.

36

A este respeito, há que rejeitar a tese do Governo Francês de que a Reprobel não cumpre uma missão de interesse público, mas que atua unicamente no interesse privado dos titulares de direitos de autor e direitos conexos. Com efeito, através da missão confiada a uma entidade encarregada da cobrança e da repartição dos direitos à remuneração para compensação equitativa, um Estado‑Membro cumpre a obrigação de resultado que lhe é imposta pelo artigo 5.o, n.o 2, alíneas a) e b), da Diretiva 2001/29, a saber, assegurar, em benefício dos titulares desses direitos, a cobrança efetiva de uma compensação equitativa destinada a preservar um equilíbrio justo entre os interesses em presença, o que é inteiramente do interesse público (v., neste sentido, Acórdão de 8 de setembro de 2022, Ametic, C‑263/21, EU:C:2022:644, n.o 69).

37

Em segundo lugar, no que respeita à apreciação dos poderes de um organismo como a Reprobel, cabe lembrar, desde logo, que esta é a única entidade encarregada da cobrança e da repartição dos direitos à remuneração para compensação equitativa, previstos nos artigos 59.o a 61.o da LDA.

38

Neste contexto, como sublinhou, em substância, o advogado‑geral no n.o 45 das suas conclusões, resulta dos autos de que o Tribunal de Justiça dispõe que foram atribuídos à Reprobel poderes exorbitantes face às normas aplicáveis às relações entre particulares, nomeadamente o direito de exigir aos fabricantes e distribuidores de aparelhos e suportes de cópia as remunerações para compensação equitativa.

39

Com efeito, um organismo que, como a Reprobel, tem o direito de cobrar a remuneração para compensação equitativa tem, por força da lei, o direito de exigir o pagamento desta remuneração a qualquer pessoa que faça parte de um conjunto de devedores definido em abstrato pela regulamentação nacional.

40

A este respeito, pouco importa a circunstância, alegada pela sociedade Reprobel e pelo Governo belga, de serem as autoridades públicas, e não o referido organismo, quem determina o montante da referida remuneração. Com efeito, o cumprimento de missões de interesse público não implica que o organismo que executa essas missões determine ele próprio todos os aspetos das mesmas ou que os poderes que detém para o fazer devam ser discricionários. De resto, o enquadramento, por uma autoridade pública, da ação de um organismo encarregado de uma missão de interesse público confirma ainda mais que este organismo atua em nome do Estado e constitui uma emanação deste.

41

Acresce que, como resulta da decisão de reenvio, a Reprobel dispõe de uma série de poderes específicos, nomeadamente em matéria de pedidos de informações, que lhe permitem executar a missão de interesse público que lhe é confiada.

42

Primeiro, tem o direito de solicitar tanto aos devedores da remuneração para compensação equitativa como aos outros operadores ativos no mercado dos equipamentos de cópia, como as sociedades encarregadas da manutenção desses equipamentos, que forneçam, sob pena de sanções penais, todas as informações necessárias à identificação dos devedores e à determinação dos montantes devidos por estes. Tal poder deve ser considerado exorbitante face às regras aplicáveis nas relações entre particulares.

43

Neste contexto, pouco importa que, como alegam a Reprobel e o Governo Belga, a Reprobel não disponha do poder de aplicar sanções às pessoas que não cumpram a obrigação de lhe fornecer informações. Com efeito, o incumprimento desta obrigação é, segundo as indicações constantes da decisão de reenvio, passível de sanções penais que, pela sua própria natureza, só os órgãos jurisdicionais são competentes para aplicar. Por conseguinte, a própria existência dessas sanções demonstra a especificidade dos poderes atribuídos à Reprobel.

44

Segundo, resulta dos autos de que dispõe o Tribunal de Justiça que a Reprobel tem o direito de obter as informações necessárias para o cumprimento das suas missões junto das autoridades aduaneiras, fiscais e da segurança social. Esse direito constitui, sem prejuízo das verificações que incumbe ao órgão jurisdicional de reenvio efetuar, um poder exorbitante face às regras aplicáveis nas relações entre particulares. Com efeito, as informações como o volume das importações de equipamentos ou suportes de cópia ou o volume de negócios dos produtores ou distribuidores de tais aparelhos e suportes não são, em princípio, suscetíveis de ser comunicadas a pessoas que não dispõem desse poder.

45

Tendo em conta as considerações anteriores, há que responder à primeira, segunda e terceira questões que o artigo 5.o, n.o 2, alíneas a) e b), da Diretiva 2001/29, deve ser interpretado no sentido de que um particular pode opor, no órgão jurisdicional nacional, a uma entidade encarregada por um Estado‑Membro da cobrança e da repartição das compensações equitativas estabelecidas em aplicação desta disposição, o facto de a regulamentação nacional que prevê essas compensações ser contrária às disposições do direito da União com efeito direto, quando essa entidade disponha, para o cumprimento dessa missão de interesse público, de poderes exorbitantes face às regras aplicáveis nas relações entre os particulares.

Quanto à quarta e quinta questões

46

Com a quarta e quinta questões, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 5.o, n.o 2, alíneas a) e b), da Diretiva 2001/29 deve ser interpretado no sentido de que produz efeito direto, pelo que, não tendo esta disposição sido objeto de uma transposição correta, um particular pode invocá‑la, para afastar a aplicação de regras nacionais que o obrigam a pagar uma remuneração para compensação equitativa imposta em violação da referida disposição.

47

A título preliminar, importa recordar que, nos termos de jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, em todos os casos em que, do ponto de vista do seu conteúdo, as disposições de uma diretiva se afigurem incondicionais e suficientemente precisas, os particulares podem invocá‑las perante os órgãos jurisdicionais nacionais contra o Estado‑Membro, quer quando este não tenha transposto a diretiva para o direito nacional nos prazos previstos quer quando tenha feito uma transposição incorreta (Acórdão de 6 de novembro de 2018, Max‑Planck‑Gesellschaft zur Förderung der Wissenschaften, C‑684/16, EU:C:2018:874, n.o 63 e jurisprudência referida).

48

A este respeito, o Tribunal de Justiça precisou que uma disposição do direito da União é, por um lado, incondicional quando prevê uma obrigação que não está sujeita a nenhuma condição nem está subordinada, na sua execução ou nos seus efeitos, à adoção de um ato das instituições da União ou dos Estados‑Membros e, por outro, é suficientemente precisa para ser invocada por um litigante e aplicada pelo juiz quando prevê uma obrigação em termos inequívocos [Acórdão de 8 de março de 2022, Bezirkshauptmannschaft Hartberg‑Fürstenfeld (Efeito direto), C‑205/20, EU:C:2022:168, n.o 18].

49

No caso em apreço, a Reprobel e os Governos Belga e Francês alegam que, tendo em conta a ampla margem de apreciação de que dispõem os Estados‑Membros na organização do sistema de compensação equitativa previsto no artigo 5.o, n.o 2, alíneas a) e b), da Diretiva 2001/29 e do seu financiamento, esta disposição não é suficientemente incondicional e precisa para que lhe seja atribuído efeito direto com base na jurisprudência do Tribunal de Justiça acima referida.

50

No entanto, o Tribunal de Justiça já especificou que, ainda que uma diretiva deixe aos Estados‑Membros uma certa margem de apreciação na adoção das modalidades de execução da mesma, se pode considerar que uma disposição dessa diretiva tem caráter incondicional e preciso quando impõe aos Estados‑Membros, em termos inequívocos, uma obrigação de resultado precisa, que não está subordinada a nenhuma condição relativa à aplicação da regra nela contida [Acórdão de 8 de março de 2022, Bezirkshauptmannschaft Hartberg‑Fürstenfeld (Efeito direto), C‑205/20, EU:C:2022:168, n.o 19].

51

A este respeito, há que recordar que o princípio do primado impõe ao juiz nacional encarregado de aplicar, no âmbito da sua competência, as disposições do direito da União, a obrigação, na impossibilidade de proceder a uma interpretação da regulamentação nacional conforme com as exigências do direito da União, de assegurar o pleno efeito das exigências deste direito no litígio que é chamado a decidir, afastando, se necessário, a aplicação, por sua própria iniciativa, de qualquer regulamentação ou prática nacional, ainda que posterior, que seja contrária a uma disposição do direito da União que tenha efeito direto, sem que tenha de pedir ou de esperar pela supressão prévia desta regulamentação ou prática nacional por via legislativa ou por qualquer outro procedimento constitucional [Acórdão de 8 de março de 2022, Bezirkshauptmannschaft Hartberg‑Fürstenfeld (Efeito direto), C‑205/20, EU:C:2022:168, n.o 37].

52

Quanto à questão de saber se o artigo 5.o, n.o 2, alíneas a) e b), da Diretiva 2001/29 é incondicional e suficientemente preciso, a análise a realizar para este efeito abrange, nomeadamente, três aspetos, a saber, a determinação dos beneficiários da proteção prevista nesta disposição, o conteúdo desta proteção e a identidade do devedor da referida proteção (v., por analogia, Acórdão de 6 de setembro de 2018, Hampshire, C‑17/17, EU:C:2018:674, n.o 56).

53

A este respeito, o Tribunal de Justiça já declarou que o artigo 5.o, n.o 2, alíneas a) e b), da Diretiva 2001/29 impõe obrigações concretas aos Estados‑Membros que optem por aplicar exceções ou limitações ao direito de reprodução, para assegurar uma compensação equitativa aos titulares de direitos (v., neste sentido, Acórdãos de 21 de outubro de 2010, Padawan, C‑467/08, EU:C:2010:620, n.o 36, e de 22 de setembro de 2016, Microsoft Mobile Sales International e o., C‑110/15, EU:C:2016:717, n.o 25).

54

É verdade que os Estados‑Membros não são obrigados a prever no seu direito nacional as exceções previstas no artigo 5.o, n.o 2, alíneas a) e b), da Diretiva 2001/29 (v., neste sentido, Acórdãos de 21 de abril de 2016, Austro‑Mechana, C‑572/14, EU:C:2016:286, n.o 18, e de 22 de setembro de 2016, Microsoft Mobile Sales International e o., C‑110/15, EU:C:2016:717, n.o 27 e jurisprudência referida). Todavia, se o fizerem, devem prever igualmente o pagamento de uma compensação equitativa aos autores lesados devido à aplicação dessas exceções (v., neste sentido, Acórdão de 21 de outubro de 2010, Padawan, C‑467/08, EU:C:2010:620, n.o 36) e ter em conta as condições relativas à estrutura e ao nível desta compensação, tal como resultam da interpretação desta disposição.

55

Entre estas condições figuram as que o Tribunal de Justiça estabeleceu no Acórdão de 12 de novembro de 2015, Hewlett‑Packard Belgium (C‑572/13, EU:C:2015:750), no que respeita às modalidades de cálculo da remuneração para compensação equitativa. Nesse acórdão, para o qual remete o órgão jurisdicional de reenvio, o Tribunal de Justiça declarou que, embora o artigo 5.o, n.o 2, alíneas a) e b), da Diretiva 2001/29 atribua aos Estados‑Membros a faculdade de determinar as modalidades de financiamento e de cobrança da compensação equitativa, bem como o nível dessa compensação, um sistema que combina uma remuneração fixa determinada a montante e uma remuneração proporcional determinada a jusante deve permitir, no seu conjunto, a cobrança de uma taxa a título da compensação equitativa cujo montante corresponde, em substância, ao prejuízo efetivo sofrido pelos titulares de direito. Para preencher este requisito, esse sistema deve incluir mecanismos, nomeadamente de reembolso, destinados a corrigir qualquer situação de excesso de compensação que seja contrária à exigência, enunciada no considerando 31 da Diretiva 2001/29, segundo a qual deve ser salvaguardado um justo equilíbrio entre os titulares de direito e os utilizadores do material protegido, e, portanto, ao artigo 5.o, n.o 2, alíneas a) e b), da Diretiva 2001/29 (v., neste sentido, Acórdão de 12 de novembro de 2015, Hewlett‑Packard Belgium, C‑572/13, EU:C:2015:750, n.os 83 a 86).

56

No que respeita, em especial, ao conteúdo dos direitos que decorrem das disposições da Diretiva 2001/29 suscetíveis de ter efeito direto, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que os particulares têm o direito de não suportar o encargo financeiro de uma remuneração para compensação equitativa se esta for cobrada em violação dos princípios que decorrem, segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, do artigo 5.o, n.o 2, alíneas a) e b), desta diretiva (v., neste sentido, Acórdãos de 12 de novembro de 2015, Hewlett‑Packard Belgium, C‑572/13, EU:C:2015:750, n.os 85 a 87, e de 22 de setembro de 2016, Microsoft Mobile Sales International e o., C‑110/15, EU:C:2016:717, n.os 37, 54 e 55). Assim, o Tribunal de Justiça salientou expressamente a necessidade de incluir no sistema de compensação equitativa o direito ao reembolso de uma remuneração indevidamente cobrada para financiar essa compensação.

57

No caso em apreço, uma vez que a regulamentação nacional em causa no processo principal é incompatível com o artigo 5.o, n.o 2, alíneas a) e b), da Diretiva 2001/29, como resulta, em substância, do Acórdão de 12 de novembro de 2015, Hewlett‑Packard Belgium (C‑572/13, EU:C:2015:750), o órgão jurisdicional de reenvio, chamado a pronunciar‑se sobre um litígio relativo à suspensão, por um particular, do pagamento da remuneração para compensação equitativa exigida por essa regulamentação, é obrigado a garantir o pleno efeito dessa disposição, não aplicando a referida regulamentação nacional para efeitos da solução do litígio nele pendente.

58

Tendo em conta o que precede, há que responder à quarta e quinta questões que o artigo 5.o, n.o 2, alíneas a) e b), da Diretiva 2001/29 deve ser interpretado no sentido de que produz efeito direto, pelo que, não tendo esta disposição sido objeto de uma transposição correta, um particular pode invocá‑la, para afastar a aplicação de regras nacionais que o obrigam a pagar uma remuneração para compensação equitativa imposta em violação da referida disposição.

Quanto às despesas

59

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Primeira Secção) declara:

 

1)

O artigo 5.o n.o 2, alíneas a) e b), da Diretiva 2001/29/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de maio de 2001, relativa à harmonização de certos aspetos do direito de autor e dos direitos conexos na sociedade da informação,

deve ser interpretado no sentido de que:

um particular pode opor, no órgão jurisdicional nacional, a uma entidade encarregada por um Estado‑Membro da cobrança e da repartição das compensações equitativas estabelecidas em aplicação desta disposição, o facto de a regulamentação nacional que prevê essas compensações ser contrária às disposições do direito da União com efeito direto, quando essa entidade disponha, para o cumprimento dessa missão de interesse público, de poderes exorbitantes face às regras aplicáveis nas relações entre os particulares.

 

2)

O artigo 5.o, n.o 2, alíneas a) e b), da Diretiva 2001/29

deve ser interpretado no sentido de que:

produz efeito direto, pelo que, não tendo esta disposição sido objeto de uma transposição correta, um particular pode invocá‑la, para afastar a aplicação de regras nacionais que o obrigam a pagar uma remuneração para compensação equitativa imposta em violação da referida disposição.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: neerlandês.

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