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Document 62023CJ0196

    Acórdão do Tribunal de Justiça (Segunda Secção) de 11 de julho de 2024.
    CL e o. contra DB e Fondo de Garantía Salarial (FOGASA).
    Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Tribunal Superior de Justicia de Cataluña.
    Reenvio prejudicial — Política social — Diretiva 98/59/CE — Despedimentos coletivos — Artigo 1.o, n.o 1, alínea a), e artigo 2.o — Informação e consulta dos representantes dos trabalhadores — Âmbito de aplicação — Cessações de contratos de trabalho devido à reforma do empregador — Artigos 27.o e 30.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia.
    Processo C-196/23.

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:2024:596

     ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção)

    11 de julho de 2024 ( *1 )

    «Reenvio prejudicial — Política social — Diretiva 98/59/CE — Despedimentos coletivos — Artigo 1.o, n.o 1, alínea a), e artigo 2.o — Informação e consulta dos representantes dos trabalhadores — Âmbito de aplicação — Cessações de contratos de trabalho devido à reforma do empregador — Artigos 27.o e 30.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia»

    No processo C‑196/23 [Plamaro] ( 1 ),

    que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Tribunal Superior de Justicia de Cataluña (Tribunal Superior de Justiça da Catalunha, Espanha), por Decisão de 20 de janeiro de 2023, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 24 de março de 2023, no processo

    CL,

    GO,

    GN,

    VO,

    TI,

    HZ,

    DN,

    DL

    contra

    DB, na qualidade de herdeira universal de FC,

    Fondo de Garantía Salarial (Fogasa),

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção),

    composto por: A. Prechal (relatora), presidente de secção, F. Biltgen, N. Wahl, J. Passer e M. L. Arastey Sahún, juízes,

    advogado‑geral: P. Pikamäe,

    secretário: A. Calot Escobar,

    vistos os autos,

    vistas as observações apresentadas:

    em representação de CL, GO, GN, VO, TI, HZ, DN e DL, por J. M. Moragues Martínez, abogado,

    em representação de DB, na qualidade de herdeira universal de FC, por L. Sánchez Frías, abogado,

    em representação do Governo Espanhol, por M. Morales Puerta, na qualidade de agente,

    em representação da Comissão Europeia, por F. Clotuche‑Duvieusart e I. Galindo Martín, na qualidade de agentes,

    vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

    profere o presente

    Acórdão

    1

    O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação da Diretiva 98/59/CE do Conselho, de 20 de julho de 1998, relativa à aproximação das legislações dos Estados‑Membros respeitantes aos despedimentos coletivos (JO 1998, L 225, p. 16).

    2

    Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe CL, GO, GN, VO, TI, HZ, DN e DL a DB, na qualidade de herdeira universal do seu antigo empregador FC, e ao Fondo de Garantía Salarial (Fogasa) [Fundo de Garantia Salarial (Fogasa), Espanha] a respeito da cessação dos seus contratos de trabalho na sequência da reforma de FC.

    Quadro jurídico

    Direito da União

    3

    Incluído na secção I da Diretiva 98/59, intitulada «Definições e âmbito de aplicação», o artigo 1.o, n.o 1, desta diretiva enuncia:

    «Para efeitos da aplicação da presente diretiva:

    a)

    Entende‑se por “despedimentos coletivos” os despedimentos efetuados por um empregador, por um ou vários motivos não inerentes à pessoa dos trabalhadores, quando o número de despedimentos abranger, segundo a escolha efetuada pelos Estados‑Membros:

    i)

    ou, num período de 30 dias:

    no mínimo 10 trabalhadores, nos estabelecimentos que empreguem habitualmente mais de 20 e menos de 100,

    no mínimo 10 % do número dos trabalhadores, nos estabelecimentos que empreguem habitualmente no mínimo 100 e menos de 300 trabalhadores,

    no mínimo 30 trabalhadores, nos estabelecimentos que empreguem habitualmente no mínimo 300;

    ii)

    ou, num período de 90 dias, no mínimo 20 trabalhadores, qualquer que seja o número de trabalhadores habitualmente empregados nos estabelecimentos em questão;

    […]

    Para o cálculo do número de despedimentos previsto no primeiro parágrafo, alínea a), são equiparadas a despedimentos as cessações do contrato de trabalho por iniciativa do empregador por um ou vários motivos não inerentes à pessoa dos trabalhadores, desde que o número de despedimentos seja, pelo menos, de cinco.»

    4

    O artigo 2.o da referida diretiva, constante da sua secção II, intitulada «Informação e consulta», prevê:

    «1.   Sempre que tenciona efetuar despedimentos coletivos, a entidade patronal é obrigada a consultar em tempo útil os representantes dos trabalhadores, com o objetivo de chegar a um acordo.

    2.   A consulta incidirá, pelo menos, sobre as possibilidades de evitar ou de reduzir os despedimentos coletivos, bem como sobre os meios de atenuar as suas consequências recorrendo a medidas sociais de acompanhamento destinadas, nomeadamente, a auxiliar a reintegração ou reconversão dos trabalhadores despedidos.

    […]

    3.   Para que os representantes dos trabalhadores possam formular propostas construtivas, o empregador deve, em tempo útil, no decurso da consulta:

    a)

    Facultar‑lhes todas as informações necessárias; e

    b)

    Comunicar‑lhes, sempre por escrito:

    i)

    os motivos do despedimento previsto,

    ii)

    o número e as categorias dos trabalhadores a despedir,

    iii)

    o número e as categorias dos trabalhadores habitualmente empregados,

    iv)

    o período durante o qual se pretende efetuar os despedimentos,

    v)

    os critérios a utilizar na seleção dos trabalhadores a despedir, na medida em que as leis e/ou práticas nacionais deem essa competência ao empregador,

    vi)

    o método previsto para o cálculo de qualquer eventual indemnização de despedimento que não a que decorre das leis e/ou práticas nacionais.

    O empregador deve remeter cópia à autoridade pública competente pelo menos dos elementos da comunicação escrita previstos nas subalíneas i) a v) da alínea b).

    […]»

    5

    Incluído na secção III da Diretiva 98/59, intitulada «Processo de despedimento e coletivo», o artigo 3.o desta diretiva tem a seguinte redação:

    «1.   O empregador deve notificar por escrito a autoridade pública competente de qualquer projeto de despedimento coletivo.

    No entanto, os Estados‑Membros podem prever que, caso de um projeto de despedimento coletivo resultante da cessação das atividades de um estabelecimento na sequência de uma decisão judicial, o empregador seja obrigado a notificar por escrito a autoridade pública competente apenas se esta a solicitar.

    A notificação deve conter todas as informações úteis respeitantes ao projeto de despedimento coletivo e à consulta aos representantes dos trabalhadores previstas no artigo 2.o, nomeadamente, os motivos do despedimento, o número de trabalhadores a despedir, o número dos trabalhadores habitualmente empregados e o período no decurso do qual se pretende efetuar os despedimentos.

    2.   O empregador deve remeter aos representantes dos trabalhadores uma cópia da notificação prevista no n.o 1.

    Os representantes dos trabalhadores podem transmitir as suas eventuais observações à autoridade pública competente.»

    6

    O artigo 4.o da referida diretiva, também incluído na sua secção III, dispõe:

    «1.   Os despedimentos coletivos, de cujo projeto tenha sido notificada a autoridade pública competente, não podem produzir efeitos antes de decorridos 30 dias após a notificação prevista no n.o 1 do artigo 3.o e devem respeitar as disposições reguladoras dos direitos individuais em matéria de aviso prévio de despedimento.

    Os Estados‑Membros podem conceder à autoridade pública competente a faculdade de reduzir o prazo referido no primeiro parágrafo deste número.

    […]

    4.   Os Estados‑Membros não são obrigados a aplicar o presente artigo em caso de despedimentos coletivos resultantes da cessação das atividades de um estabelecimento, quando esta resultar de uma decisão judicial.»

    7

    Ao abrigo do artigo 5.oda Diretiva 98/59, esta «não prejudica a faculdade que os Estados‑Membros têm de aplicar ou de introduzir disposições legislativas, regulamentares ou administrativas mais favoráveis aos trabalhadores ou de permitir ou promover a aplicação de disposições convencionais mais favoráveis aos trabalhadores».

    Direito espanhol

    8

    O artigo 49.o do Estatuto de los Trabajadores (Estatuto dos Trabalhadores), na sua versão resultante do Real Decreto legislativo 2/2015, por el que se aprueba el texto refundido de la Ley del Estatuto de los Trabajadores (Real Decreto Legislativo n.o 2/2015, que aprova o texto consolidado da Lei relativa ao Estatuto dos Trabalhadores), de 23 de outubro de 2015 (BOE n.o 255, de 24 de outubro de 2015, p. 100224) (a seguir «Estatuto dos Trabalhadores»), com a epígrafe «Resolução do contrato», prevê, no n.o 1:

    «O contrato de trabalho cessa nos seguintes casos:

    […]

    g)

    Por morte, reforma nos casos previstos no respetivo regime da segurança social, ou incapacidade do empregador, sem prejuízo do disposto no artigo 44.o, ou por extinção da personalidade jurídica do contratante.

    Em caso de morte, reforma ou incapacidade do empregador, o trabalhador tem direito ao pagamento de uma quantia equivalente a um mês de salário.

    Em caso de extinção da personalidade jurídica do contratante, é aplicável o disposto no artigo 51.o [do presente estatuto].

    […]

    i)

    Despedimento coletivo baseado em razões económicas, técnicas, de organização ou de produção.

    […]»

    9

    O artigo 51.o do Estatuto dos Trabalhadores dispõe:

    «1.   Para efeitos do disposto [no presente estatuto], entende‑se por “despedimento coletivo” a cessação de contratos de trabalho por razões económicas, técnicas, de organização ou de produção, quando, num período de noventa dias, a cessação afetar, no mínimo:

    a)

    dez trabalhadores, nas empresas que empreguem menos de cem trabalhadores;

    b)

    10 % do número total dos trabalhadores, nas empresas que empreguem entre cem e trezentos trabalhadores;

    c)

    trinta trabalhadores, nas empresas que empreguem mais de trezentos trabalhadores.

    Consideram‑se razões económicas quando os resultados da empresa revelam uma situação económica negativa, em casos caracterizados pela existência de perdas atuais ou futuras, ou pela diminuição persistente do nível de receitas correntes ou de vendas. Em todo o caso, entende‑se que a diminuição é persistente se, durante três trimestres consecutivos, o nível de receitas correntes ou de vendas de cada trimestre for inferior ao registado no mesmo trimestre do ano anterior.

    Consideram‑se razões técnicas quando ocorrem alterações, designadamente, no domínio dos meios ou dos instrumentos de produção; consideram‑se razões de organização quando ocorrem alterações, designadamente, no domínio dos sistemas e métodos de trabalho do pessoal ou no modo de organização da produção; e consideram‑se razões de produção quando ocorrem alterações, designadamente, na procura de produtos ou serviços que a empresa tenciona colocar no mercado.

    Considera‑se também despedimento coletivo a cessação de contratos de trabalho que afeta todos os trabalhadores da empresa, sempre que o número de trabalhadores em causa for superior a cinco, desde que ocorra devido à cessação total da atividade da empresa com fundamento nas razões anteriormente referidas.

    Para o cálculo do número de cessações de contratos de trabalho a que se refere o n.o 1 do presente artigo, será também tida em conta uma cessação ocorrida durante o período em causa por iniciativa do empregador, por motivos não inerentes à pessoa do trabalhador e distintos dos previstos no artigo 49.o, n.o 1, alínea c), desde que o número de cessações deste tipo seja igual ou superior a cinco.

    Quando, durante períodos sucessivos de noventa dias, com o objetivo de contornar as disposições do presente artigo, a empresa proceda a cessações de contratos de trabalho ao abrigo do artigo 52.o, alínea c), cujo número é inferior aos limiares acima referidos e sem que existam novas razões que justifiquem esse comportamento, estas novas cessações consideram‑se efetuadas em violação da lei e serão declaradas nulas e sem efeito.

    2.   O despedimento coletivo deve ser precedido de um período de consulta dos representantes legais dos trabalhadores com uma duração que não exceda 30 dias de calendário ou, no caso de empresas com menos de cinquenta trabalhadores, 15 dias de calendário. A consulta dos representantes legais dos trabalhadores deve incidir, pelo menos, sobre as possibilidades de evitar ou de reduzir os despedimentos coletivos, bem como sobre os meios de atenuar as suas consequências recorrendo a medidas sociais de acompanhamento, como medidas de reintegração ou ações de formação ou de reconversão profissional para melhorar a empregabilidade. A consulta é realizada no âmbito de uma comissão de negociação única, no pressuposto de que, quando existem vários estabelecimentos, se limita aos estabelecimentos envolvidos no processo. A comissão de negociação é composta por um máximo de treze membros, representando cada uma das partes.

    […]»

    Litígio no processo principal e questões prejudiciais

    10

    Os recorrentes no processo principal trabalhavam num dos 8 estabelecimentos pertencentes à empresa de FC. Em 17 de junho de 2020, foram informados por FC da cessação dos seus contratos de trabalho, com efeitos a partir de 17 de julho de 2020, devido à reforma deste último. A reforma, que se concretizou em 3 de agosto de 2020, teve como consequência a cessação de 54 contratos de trabalho em vigor nesses 8 estabelecimentos, entre os quais os 8 contratos de trabalho dos recorrentes no processo principal.

    11

    Em 10 de julho de 2020, estes últimos intentaram uma ação contra FC e o Fogasa no Juzgado de lo Social de Barcelona (Tribunal do Trabalho de Barcelona, Espanha), pedindo a impugnação do despedimento ilícito de que consideram ter sido objeto. Por Acórdão de 12 de janeiro de 2022, este órgão jurisdicional julgou a ação improcedente.

    12

    No âmbito do recurso interposto desse acórdão, o Tribunal Superior de Justicia de Cataluña (Tribunal Superior de Justiça da Catalunha, Espanha) foi chamado a pronunciar‑se, nomeadamente, sobre a questão de saber se as cessações de contratos de trabalho dos recorrentes no processo principal devem ser consideradas despedimentos nulos e sem efeitos, por não terem sido respeitados os procedimentos de consulta dos representantes dos trabalhadores previstos no artigo 51.o do Estatuto dos Trabalhadores, apesar de estas cessações terem sido consequência da reforma de FC.

    13

    Este órgão jurisdicional afirma que, nessa situação, as disposições do artigo 51.o do Estatuto dos Trabalhadores relativas à referida consulta não são, em princípio, aplicáveis, como resulta das disposições conjugadas, por um lado, do n.o 1, quinto parágrafo, deste artigo 51.o, que só autoriza a tomada em consideração da cessação de um contrato de trabalho por motivos não inerentes à pessoa do trabalhador se tiverem ocorrido despedimentos por razões económicas, de organização ou de produção na aceção do primeiro parágrafo do mesmo número, e, por outro, do artigo 49.o, n.o 1, alínea g), desse estatuto, que prevê a aplicação do procedimento de consulta previsto no referido artigo 51.o quando a cessação de contratos de trabalho resulta da extinção da personalidade jurídica do cocontratante, e não da reforma do empregador enquanto pessoa singular.

    14

    No entanto, o referido órgão jurisdicional interroga‑se sobre se a exclusão desta situação do âmbito de aplicação do procedimento de consulta em causa está em conformidade com a Diretiva 98/59 e, em caso negativo, se os trabalhadores em causa podem invocar esta diretiva contra o seu empregador enquanto pessoa singular, apesar de a referida diretiva não ter sido corretamente transposta para o direito interno. A este respeito, o órgão jurisdicional declara ter conhecimento de que, regra geral, não se pode atribuir às disposições de uma diretiva um efeito direto dito «horizontal» nos litígios entre particulares. Contudo, uma vez que o Tribunal de Justiça já admitiu, em determinados casos, exceções a esta regra quando o direito em causa também está consagrado por um princípio geral do direito da União ou por uma disposição da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta») cuja aplicação concreta é assegurada por uma diretiva, este mesmo órgão jurisdicional interroga‑se sobre se uma exceção análoga não pode ser aplicada, no caso em apreço, tendo em conta as disposições dos artigos 27.o e/ou 30.o da Carta.

    15

    Nestas condições, o Tribunal Superior de Justicia de Cataluña (Tribunal Superior de Justiça da Catalunha) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

    «1)

    É conforme com o artigo 2.o da Diretiva [98/59] uma legislação como a espanhola, que, nos termos do artigo 49.o, n.o 1, alínea [g)], do [Estatuto dos Trabalhadores][,] não prevê um período de consulta em caso de cessação de contratos de trabalho em número superior ao previsto no artigo l.o da referida diretiva, devido a reforma do empregador enquanto pessoa singular?

    2)

    Caso a resposta à questão anterior não seja afirmativa, a Diretiva 98/59 tem efeito direto horizontal entre particulares?»

    Quanto às questões prejudiciais

    Quanto à admissibilidade

    16

    Recordando que os 54 trabalhadores empregados pela empresa de FC estavam repartidos entre os 8 estabelecimentos que lhe pertenciam no momento da sua reforma, a Comissão Europeia interroga‑se sobre a questão de saber se os limiares relativos ao número de trabalhadores que deviam ter sido afetados por um despedimento coletivo, conforme especificados no artigo 1.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva 98/59, foram efetivamente alcançados no caso em apreço. Com efeito, a referida disposição define o âmbito de aplicação desta diretiva por referência apenas ao conceito de «estabelecimento», no qual devem estar habitualmente empregadas, no mínimo, 20 pessoas.

    17

    A este respeito, há que recordar que o juiz nacional, a quem foi submetido o litígio e que deve assumir a responsabilidade pela decisão judicial a tomar, tem competência exclusiva para apreciar, tendo em conta as especificidades do processo, tanto a necessidade de uma decisão prejudicial para poder proferir a sua decisão como a pertinência da questão que submete ao Tribunal de Justiça. Consequentemente, desde que a questão submetida seja relativa à interpretação de uma regra de direito da União, o Tribunal de Justiça é, em princípio, obrigado a pronunciar‑se. Daqui se conclui que uma questão prejudicial relativa ao direito da União goza de uma presunção de pertinência. O Tribunal de Justiça só se pode recusar pronunciar sobre essa questão se for manifesto que a interpretação de uma regra de direito da União solicitada não tem nenhuma relação com a realidade ou com o objeto do litígio no processo principal, quando o problema for hipotético ou ainda quando o Tribunal de Justiça não dispuser dos elementos de facto e de direito necessários para dar uma resposta útil às questões que lhe são submetidas (Acórdão de 29 de maio de 2018, Liga van Moskeeën en Islamitische Organisaties Provincie Antwerpen e o., C‑426/16, EU:C:2018:335, n.os 30 e 31 e jurisprudência referida).

    18

    No caso em apreço, há que observar, por um lado, que a decisão de reenvio não contém nenhuma indicação factual ou jurídica no que respeita às características dos estabelecimentos da empresa de FC no momento em que ocorreram as cessações de contratos de trabalho em causa no processo principal. Por outro lado, com as suas questões prejudiciais, o órgão jurisdicional de reenvio não solicita nenhuma interpretação relativa aos limiares quantitativos enunciados no artigo 1.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva 98/59, nem ao alcance do conceito de «estabelecimento» a que se refere a referida disposição. Pelo contrário, resulta da própria redação da primeira questão prejudicial que esta é submetida especificamente em relação aos casos de cessação de contratos de trabalho «em número superior ao previsto no artigo l.o da referida diretiva».

    19

    Nestas condições, é ao órgão jurisdicional de reenvio que caberá, se for caso disso, à luz dos ensinamentos que decorrem, a este respeito, da jurisprudência do Tribunal de Justiça e, em especial, do Acórdão de 13 de maio de 2015, Rabal Cañas (C‑392/13, EU:C:2015:318), apreciar e qualificar os factos no processo principal à luz do conceito de «estabelecimento», na aceção do artigo 1.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva 98/59, e dos limiares quantitativos previstos nesta disposição.

    20

    Neste contexto, o órgão jurisdicional de reenvio pode, além disso, ter também em conta a circunstância de que, como resulta da redação do artigo 51.o, n.o 1, do Estatuto dos Trabalhadores e como o Tribunal de Justiça já salientou no mesmo Acórdão de 13 de maio de 2015, Rabal Cañas (C‑392/13, EU:C:2015:318), e no Acórdão de 10 de dezembro de 2009, Rodríguez Mayor e o. (C‑323/08, EU:C:2009:770), ao invocar, a este respeito, o artigo 5.o da Diretiva 98/59, o legislador espanhol adotou, no caso em apreço, uma definição do conceito de «despedimentos coletivos» utilizando a da empresa e não do estabelecimento como unidade de referência para proceder ao cálculo do número de trabalhadores que devem ser afetados por esses despedimentos.

    21

    Tendo em conta o que precede, não é manifesto que a interpretação das disposições da Diretiva 98/59 solicitada pelo órgão jurisdicional de reenvio não tenha nenhuma relação com a realidade ou com o objeto do litígio no processo principal ou que o problema suscitado por este órgão jurisdicional seja hipotético.

    22

    Daqui resulta que as questões prejudiciais são admissíveis.

    Quanto à primeira questão

    23

    Com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 1.o, n.o 1, e o artigo 2.o da Diretiva 98/59, lidos em conjunto, devem ser interpretados no sentido de que se opõem a uma regulamentação nacional por força da qual a cessação de contratos de trabalho de um número de trabalhadores superior ao previsto neste artigo 1.o, n.o 1, devido à reforma do empregador, não é qualificada de «despedimento coletivo» e não dá assim lugar a que se proceda à informação e à consulta dos representantes dos trabalhadores previstas nesse artigo 2.o

    24

    Nos termos do disposto no artigo 1.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva 98/59, para efeitos de aplicação da mesma, entende‑se por «despedimentos coletivos» os despedimentos efetuados por um empregador, por um ou vários motivos não inerentes à pessoa dos trabalhadores, desde que estejam preenchidos determinados requisitos de natureza quantitativa/temporal (Acórdão de 12 de outubro de 2004, Comissão/Portugal, C‑55/02, EU:C:2004:605, n.o 43).

    25

    A este respeito, há que recordar que, embora a Diretiva 98/59 não defina expressamente o conceito de «despedimentos», é jurisprudência constante que, tendo em conta o objetivo prosseguido por esta diretiva e o contexto em que se insere o seu artigo 1.o, n.o 1, alínea a), este conceito, que constitui um conceito autónomo do direito da União que deve ser objeto de uma interpretação uniforme e não pode ser definido por referência às legislações dos Estados‑Membros, deve ser interpretado no sentido de que engloba uma cessação do contrato de trabalho não pretendida pelo trabalhador e, por conseguinte, sem o seu consentimento (v., neste sentido, Acórdão de 11 de novembro de 2015, Pujante Rivera, C‑422/14, EU:C:2015:743, n.o 48 e jurisprudência referida).

    26

    O Tribunal de Justiça também declarou que, tendo em conta a finalidade da Diretiva 98/59 que visa, como resulta do seu considerando 2, nomeadamente, o reforço da proteção dos trabalhadores em caso de despedimento coletivo, os conceitos que definem o âmbito de aplicação desta diretiva, incluindo o conceito de «despedimentos», que figura no seu artigo 1.o, n.o 1, alínea a), não podem ser objeto de interpretação restritiva (v., neste sentido, Acórdão de 11 de novembro de 2015, Pujante Rivera, C‑422/14, EU:C:2015:743, n.o 51 e jurisprudência referida).

    27

    Para contestar essa qualificação no que respeita às cessações de contratos de trabalho em causa no processo principal, DB alega que um empregador como FC se deve, à semelhança do trabalhador que emprega, poder reformar legitimamente e pôr termo aos contratos de trabalho que celebrou, o que constitui, além disso, um facto previsível para o trabalhador que celebra assim um contrato de trabalho sem termo com uma pessoa singular. DB também considera que um procedimento de consulta como o previsto na Diretiva 98/59 não é pertinente quando as cessações de contratos de trabalho previstas estão relacionadas com a reforma do empregador que, como aconteceu no caso em apreço, torna inevitáveis os despedimentos em causa.

    28

    No entanto, a este respeito, há que recordar, por um lado, que o conceito de «despedimentos», na aceção do artigo 1.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva 98/59, não exige, nomeadamente, que as causas subjacentes à cessação do contrato de trabalho correspondam à vontade do empregador e, por outro, que a cessação do contrato de trabalho não fique isenta da aplicação desta diretiva pelo simples facto de resultar de circunstâncias independentes da vontade do empregador (Acórdão de 12 de outubro de 2004, Comissão/Portugal, C‑55/02, EU:C:2004:605, n.os 50 e 60).

    29

    Por outro lado, o Tribunal de Justiça também especificou que, mesmo nos casos em que a cessação definitiva da atividade da empresa não depende da vontade do empregador e em que se verifique que a aplicação integral da Diretiva 98/59 não é possível, a verdade é que a aplicação desta diretiva não pode ser excluída na sua totalidade (v., neste sentido, Acórdão de 12 de outubro de 2004, Comissão/Portugal, C‑55/02, EU:C:2004:605, n.o 57).

    30

    Deve ainda salientar‑se, em especial, que, nos termos do artigo 2.o, n.o 2, primeiro parágrafo, da Diretiva 98/59, as consultas aos representantes dos trabalhadores não têm apenas como objetivo reduzir ou evitar os despedimentos coletivos, mas incidem, entre outros, sobre os meios de atenuar as consequências desses despedimentos, recorrendo a medidas sociais de acompanhamento destinadas, nomeadamente, a auxiliar a reintegração ou reconversão dos trabalhadores despedidos (Acórdão de 12 de outubro de 2004, Comissão/Portugal, C‑55/02, EU:C:2004:605, n.o 58). Por conseguinte, estas consultas continuam a ser pertinentes quando as cessações de contratos de trabalho previstas estão relacionadas com a reforma do empregador.

    31

    É certo que o Tribunal de Justiça, no seu Acórdão de 10 de dezembro de 2009, Rodríguez Mayor e o. (C‑323/08, EU:C:2009:770), que também dizia respeito a disposições do Estatuto dos Trabalhadores, declarou que o artigo 1.o, n.o 1, da Diretiva 98/59 deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a uma regulamentação nacional que prevê que a cessação de contratos de trabalho de vários trabalhadores devido à morte do seu empregador não deve ser qualificada de «despedimento coletivo» nem sujeita às disposições nacionais que transpõem esta diretiva.

    32

    No entanto, há que sublinhar que o Tribunal de Justiça só chegou a esta interpretação depois de salientar, nomeadamente, nos n.os 34 a 41 do referido acórdão, que resulta da conjugação do disposto no artigo 1.o, n.o 1, da Diretiva 98/59 com o disposto no artigo 1.o, n.o 1, segundo parágrafo, no artigo 2.o, n.os 1 e 3, e no artigo 3.o desta diretiva, que o conceito de «despedimentos coletivos», na aceção do artigo 1.o, n.o 1, alínea a), da referida diretiva, pressupõe a existência de um empregador que projete tais despedimentos e que esteja em condições, por um lado, de praticar, com esse intuito, os atos referidos nos artigos 2.o e 3.o da mesma diretiva e, por outro, de efetuar, se for caso disso, tais despedimentos. Ora, no n.o 42 do mesmo acórdão, o Tribunal de Justiça salientou que esses requisitos deixavam de estar preenchidos em caso de morte de um empregador que explora uma empresa enquanto pessoa singular.

    33

    A este respeito, o Tribunal de Justiça também sublinhou, no n.o 44 deste Acórdão de 10 de dezembro de 2009, Rodríguez Mayor e o. (C‑323/08, EU:C:2009:770), que o objetivo principal da Diretiva 98/59, a saber, de que os despedimentos coletivos sejam precedidos de uma consulta dos representantes dos trabalhadores e da informação da autoridade pública competente, não pode ser alcançado caso a cessação de contratos de trabalho de todos os trabalhadores de uma empresa explorada por uma pessoa singular em consequência da cessação da atividade dessa empresa resultante da morte do empregador seja qualificada de «despedimento coletivo», uma vez que essa consulta não poderia ocorrer e, por conseguinte, não seria possível evitar ou reduzir as cessações de contratos de trabalho nem atenuar as suas consequências.

    34

    Por último, o Tribunal de Justiça recordou, no n.o 48 do referido acórdão, que as obrigações de consulta e de notificação que impendem sobre o empregador se constituem em momento anterior à decisão de resolver os contratos de trabalho e salientou, a este respeito, no n.o 50 do mesmo acórdão, que, em caso de morte do empregador enquanto pessoa singular, não existe nem a decisão de resolver contratos de trabalho nem a intenção prévia de o fazer.

    35

    Ora, há que salientar que as especificidades da situação em que o empregador enquanto pessoa singular morre, referidas nos n.os 32 a 34 do presente acórdão, não se verificam no caso de a cessação de contratos de trabalho ser consequência da reforma do referido empregador.

    36

    Com efeito, nesta última situação, o empregador que prevê estas cessações de contratos de trabalho na perspetiva da sua reforma está, em princípio, em condições de cumprir os atos previstos nos artigos 2.o e 3.o da Diretiva 98/59 e, neste contexto, de proceder a consultas destinadas, nomeadamente, a evitar essas cessações ou a reduzir o seu número ou, em todo o caso, a atenuar as respetivas consequências.

    37

    Por outro lado, é irrelevante que situações como as que estão em causa no processo principal sejam qualificadas, no direito espanhol, não de despedimentos, mas de cessações de pleno direito de contratos de trabalho. Com efeito, trata‑se de uma cessação de contratos de trabalho não pretendida pelo trabalhador e, consequentemente, de despedimentos na aceção da Diretiva 98/59 (v., por analogia, Acórdão de 12 de outubro de 2004, Comissão/Portugal, C‑55/02, EU:C:2004:605, n.o 62).

    38

    Assim, uma regulamentação nacional ou interpretação da mesma que consistisse em considerar que a cessação de contratos de trabalho causada pela reforma de um empregador enquanto pessoa singular não constitui um «despedimento», na aceção da Diretiva 98/59, alteraria o âmbito de aplicação desta diretiva, privando‑a, deste modo, do seu efeito útil (v., neste sentido, Acórdão de 11 de novembro de 2015, Pujante Rivera, C‑422/14, EU:C:2015:743, n.o 54 e jurisprudência referida).

    39

    Tendo em conta todas as considerações que precedem, há que responder à primeira questão que o artigo 1.o, n.o 1, e o artigo 2.o da Diretiva 98/59, lidos em conjunto, devem ser interpretados no sentido de que se opõem a uma regulamentação nacional por força da qual a cessação de contratos de trabalho de um número de trabalhadores superior ao previsto neste artigo 1.o, n.o 1, devido à reforma do empregador, não é qualificada de «despedimento coletivo» e não dá assim lugar a que se proceda à informação e à consulta dos representantes dos trabalhadores previstas neste artigo 2.o

    Quanto à segunda questão

    40

    Com a sua segunda questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o direito da União deve ser interpretado no sentido de que obriga um órgão jurisdicional nacional chamado a conhecer de um litígio entre particulares a não aplicar uma regulamentação nacional, como a referida no n.o 39 do presente acórdão, em caso de contradição da mesma com as disposições do artigo 1.o, n.o 1, e do artigo 2.o da Diretiva 98/59.

    41

    Antes de mais, há que recordar que, segundo jurisprudência constante, ao aplicar o direito interno, o órgão jurisdicional nacional deve interpretar o direito nacional, na medida do possível, à luz do texto e da finalidade da diretiva em causa, para atingir o resultado por ela prosseguido e cumprir assim o artigo 288.o, terceiro parágrafo, TFUE (Acórdão de 6 de novembro de 2018, Bauer e Willmeroth, C‑569/16 e C‑570/16, EU:C:2018:871, n.o 66 e jurisprudência referida).

    42

    Há ainda que sublinhar, a este respeito, o facto de o princípio da interpretação conforme do direito nacional exigir que os órgãos jurisdicionais nacionais façam tudo o que for da sua competência, tomando em consideração todo o direito interno e aplicando os métodos de interpretação por este reconhecidos, para garantir a plena eficácia da diretiva em causa e alcançar uma solução conforme ao objetivo por ela prosseguido (Acórdão de 6 de novembro de 2018, Bauer e Willmeroth, C‑569/16 e C‑570/16, EU:C:2018:871, n.o 67 e jurisprudência referida).

    43

    No entanto, como o Tribunal de Justiça afirmou reiteradamente, o princípio da interpretação conforme conhece alguns limites. Assim, a obrigação de o juiz nacional se basear no direito da União quando procede à interpretação e à aplicação das normas pertinentes do direito interno está limitada pelos princípios gerais do direito e não pode servir de fundamento a uma interpretação contra legem do direito nacional (Acórdão de 19 de abril de 2016, DI, C‑441/14, EU:C:2016:278, n.o 32 e jurisprudência referida).

    44

    No caso em apreço, DB e o Governo Espanhol têm opiniões divergentes quanto à questão de saber se a regulamentação em causa no processo principal pode ou não ser interpretada de modo que seja assegurada a sua conformidade com as disposições conjugadas do artigo 1.o, n.o 1, e do artigo 2.o da Diretiva 98/59, sendo DB da opinião de que os termos claros e precisos em que está redigido o artigo 49.o, n.o 1, alínea g), do Estatuto dos Trabalhadores se opõem a essa interpretação conforme e, de modo contrário, o Governo Espanhol considera que essa interpretação é possível e não tem caráter contra legem.

    45

    No entanto, não compete ao Tribunal de Justiça, mas apenas aos órgãos jurisdicionais nacionais se pronunciarem sobre a interpretação do direito nacional, pelo que cabe ao órgão jurisdicional de reenvio, se for caso disso, decidir a questão de saber se a regulamentação nacional em causa no processo principal pode ou não ser interpretada de modo que seja assegurada a sua conformidade com a Diretiva 98/59.

    46

    Em seguida, há que recordar que, segundo jurisprudência constante, uma diretiva não pode, por si mesma, criar obrigações na esfera jurídica de um particular e não pode, portanto, ser invocada enquanto tal contra ele. Com efeito, alargar a invocabilidade de uma disposição de uma diretiva não transposta, ou transposta incorretamente, ao domínio das relações entre particulares equivaleria a reconhecer à União Europeia o poder de criar, com efeito imediato, deveres na esfera jurídica dos particulares, quando esta só tem essa competência nas áreas em que lhe é atribuído o poder de adotar regulamentos (Acórdão de 6 de novembro de 2018, Bauer e Willmeroth, C‑569/16 e C‑570/16, EU:C:2018:871, n.o 76 e jurisprudência referida).

    47

    Daqui resulta que as disposições conjugadas do artigo 1.o, n.o 1, e do artigo 2.o da Diretiva 98/59 não podem ser invocadas, enquanto tais, num litígio entre particulares como o que está em causa no processo principal, para garantir o pleno efeito das referidas disposições através da não aplicação de uma regulamentação nacional considerada contrária às mesmas (v., por analogia, Acórdão de 6 de novembro de 2018, Bauer e Willmeroth, C‑569/16 e C‑570/16, EU:C:2018:871, n.o 78).

    48

    Por último, há que examinar os respetivos alcances do artigo 27.o e do artigo 30.o da Carta, para determinar, como solicita o órgão jurisdicional de reenvio no seu pedido de decisão prejudicial, se uma e/ou outra destas disposições devem ser interpretadas no sentido de que podem ser invocadas, isoladamente ou em conjugação com o artigo 1.o, n.o 1, e com o artigo 2.o da Diretiva 98/59, num litígio entre particulares como o que está em causa no processo principal, para que o juiz nacional afaste uma regulamentação nacional que seja considerada contrária às referidas disposições desta diretiva.

    49

    No que respeita, por um lado, ao artigo 27.o da Carta, com a epígrafe «Direito à informação e à consulta dos trabalhadores na empresa», que prevê que deve ser garantida aos trabalhadores, em diferentes níveis, a informação e consulta nos casos e nas condições previstos pelo direito da União e pelas legislações e práticas nacionais, basta, no caso em apreço, recordar que o Tribunal de Justiça declarou que resulta claramente da redação desta disposição que, para que esta produza plenamente os seus efeitos, deve ser prevista por disposições do direito da União ou do direito nacional (Acórdãos de 15 de janeiro de 2014, Association de médiation sociale, C‑176/12, EU:C:2014:2, n.os 44 e 45, e de 6 de novembro de 2018, Bauer e Willmeroth, C‑569/16 e C‑570/16, EU:C:2018:871, n.o 84).

    50

    A este respeito, regras como as constantes das disposições do artigo 1.o, n.o 1, e do artigo 2.o da Diretiva 98/59, dirigidas aos Estados‑Membros e que determinam as circunstâncias em que deve ser realizado um procedimento de informação e de consulta dos representantes dos trabalhadores em caso de despedimento coletivo, bem como os requisitos substantivos e processuais a que essa informação e consulta devem preencher, não podem ser inferidas, enquanto regras jurídicas diretamente aplicáveis, da redação do artigo 27.o da Carta (v., por analogia, Acórdão de 15 de janeiro de 2014, Association de médiation sociale, C‑176/12, EU:C:2014:2, n.o 46).

    51

    Por conseguinte, o artigo 27.o da Carta não pode, enquanto tal, ser invocado num litígio entre particulares como o que está em causa no processo principal, para concluir que as disposições nacionais não conformes com o artigo 1.o, n.o 1, e com o artigo 2.o da Diretiva 98/59 devem ser afastadas (v., por analogia, Acórdão de 15 de janeiro de 2014, Association de médiation sociale, C‑176/12, EU:C:2014:2, n.o 48).

    52

    Esta conclusão não pode ser infirmada pela conjugação do artigo 27.o da Carta com o artigo 1.o, n.o 1, e com o artigo 2.o da Diretiva 98/59, uma vez que, não sendo este artigo 27.o suficiente, por si só, para conferir aos particulares um direito invocável enquanto tal, o mesmo não pode acontecer no caso de tal conjugação (v., neste sentido, Acórdão de 15 de janeiro de 2014, Association de médiation sociale, C‑176/12, EU:C:2014:2, n.o 49).

    53

    No que respeita, por outro lado, ao artigo 30.o da Carta, que dispõe que todos os trabalhadores têm direito a proteção contra os despedimentos sem justa causa, de acordo com o direito da União e com as legislações e práticas nacionais, há que considerar que os fundamentos expostos nos n.os 49 a 52 do presente acórdão devem, mutatis mutandis, conduzir a uma conclusão análoga à que resulta destes números relativamente ao artigo 27.o da Carta.

    54

    Com efeito, à semelhança do que foi recordado no n.o 49 do presente acórdão no que respeita a este artigo 27.o, resulta claramente da redação do artigo 30.o da Carta que, para que esta última disposição produza plenamente os seus efeitos, deve ser prevista por disposições do direito da União ou do direito nacional.

    55

    Assim, mesmo independentemente da questão de saber se a inobservância das regras relativas à informação e à consulta dos representantes dos trabalhadores em caso de despedimento coletivo, como as previstas no artigo 1.o, n.o 1, e no artigo 2.o da Diretiva 98/59, é ou não suscetível de estar abrangida pelo âmbito de aplicação material do artigo 30.o da Carta e pelo conceito de «despedimentos sem justa causa», na aceção desta disposição, basta constatar que estas regras dirigidas aos Estados‑Membros, que determinam as circunstâncias em que deve ser realizado um procedimento de informação e de consulta dos representantes dos trabalhadores em caso de despedimento coletivo, bem como os requisitos substantivos e processuais a que essa informação e consulta devem preencher, não podem ser inferidos, enquanto regras jurídicas diretamente aplicáveis, da redação deste artigo 30.o

    56

    Por conseguinte, e de modo análogo ao exposto nos n.os 51 e 52 do presente acórdão a propósito do artigo 27.o da Carta, o artigo 30.o da mesma não pode ser invocado, enquanto tal ou em conjugação com o artigo 1.o, n.o 1, e o artigo 2.o da Diretiva 98/59, num litígio entre particulares como o que está em causa no processo principal, para concluir que as disposições nacionais não conformes com as referidas disposições da Diretiva 98/59 devem ser afastadas.

    57

    Tendo em conta o que precede, há que responder à segunda questão que o direito da União deve ser interpretado no sentido de que não obriga um órgão jurisdicional nacional chamado a conhecer de um litígio entre particulares a não aplicar uma regulamentação nacional, como a referida no n.o 39 do presente acórdão, em caso de contradição da mesma com as disposições do artigo 1.o, n.o 1, e do artigo 2.o da Diretiva 98/59.

    Quanto às despesas

    58

    Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

     

    Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Segunda Secção) declara:

     

    1)

    O artigo 1.o, n.o 1, e o artigo 2.o da Diretiva 98/59/CE do Conselho, de 20 de julho de 1998, relativa à aproximação das legislações dos Estados‑Membros respeitantes aos despedimentos coletivos, lidos em conjunto,

    devem ser interpretados no sentido de que:

    se opõem a uma regulamentação nacional por força da qual a cessação de contratos de trabalho de um número de trabalhadores superior ao previsto neste artigo 1.o, n.o 1, devido à reforma do empregador, não é qualificada de «despedimento coletivo» e não dá assim lugar a que se proceda à informação e à consulta dos representantes dos trabalhadores previstas neste artigo 2.o

     

    2)

    O direito da União deve ser interpretado no sentido de que não obriga um órgão jurisdicional nacional chamado a conhecer de um litígio entre particulares a não aplicar uma regulamentação nacional, como a referida no n.o 1 do presente dispositivo, em caso de contradição da mesma com as disposições do artigo 1.o, n.o 1, e do artigo 2.o da Diretiva 98/59.

     

    Assinaturas


    ( *1 ) Língua do processo: espanhol.

    ( 1 ) O nome do presente processo é um nome fictício. Não corresponde ao nome verdadeiro de nenhuma das partes no processo.

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