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Document 62022CJ0676

    Acórdão do Tribunal de Justiça (Décima Secção) de 29 de fevereiro de 2024.
    B2 Energy s.r.o. contra Odvolací finanční ředitelství.
    Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Nejvyšší správní soud.
    Reenvio prejudicial — Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado (IVA) — Diretiva 2006/112/CE — Artigo 138.o, n.o 1 — Isenção das entregas intracomunitárias de bens — Recusa do benefício da isenção — Provas — Fornecedor de bens que não comprova a entrega dos bens ao destinatário indicado nos documentos fiscais — Fornecedor que apresenta outras informações que provam a qualidade de sujeito passivo do destinatário efetivo.
    Processo C-676/22.

    Court reports – general – 'Information on unpublished decisions' section

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:2024:186

     ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Décima Secção)

    29 de fevereiro de 2024 ( *1 )

    «Reenvio prejudicial — Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado (IVA) — Diretiva 2006/112/CE — Artigo 138.o, n.o 1 — Isenção das entregas intracomunitárias de bens — Recusa do benefício da isenção — Provas — Fornecedor de bens que não comprova a entrega dos bens ao destinatário indicado nos documentos fiscais — Fornecedor que apresenta outras informações que provam a qualidade de sujeito passivo do destinatário efetivo»

    No processo C‑676/22,

    que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Nejvyšší správní soud (Supremo Tribunal Administrativo, República Checa), por Decisão de 26 de outubro de 2022, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 2 de novembro de 2022, no processo

    B2 Energy s. r. o.

    contra

    Odvolací finanční ředitelství,

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Décima Secção),

    composto por: Z. Csehi (relator), presidente de secção, I. Jarukaitis e D. Gratsias,

    advogado‑geral: P. Pikamäe,

    secretário: C. Strömholm, administradora,

    vistos os autos e após a audiência de 4 de outubro de 2023,

    vistas as observações apresentadas:

    em representação da Odvolací finanční ředitelství, por T. Měkýš e T. Rozehnal,

    em representação do Governo Checo, por M. Smolek, L. Březinová, O. Serdula e J. Vláčil, na qualidade de agentes,

    em representação da Comissão Europeia, por A. Armenia e M. Salyková, na qualidade de agentes,

    vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

    profere o presente

    Acórdão

    1

    O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 138.o, n.o 1, da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado (JO 2006, L 347, p. 1, a seguir «Diretiva IVA»).

    2

    Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a B2 Energy s. r. o. à Odvolací finanční ředitelství (Direção de Finanças Competente em Matéria de Recursos, República Checa) (a seguir «Direção de Finanças»), a respeito da recusa das autoridades tributárias de isentarem do imposto sobre o valor acrescentado (IVA) várias entregas intracomunitárias efetuadas por esta sociedade.

    Quadro jurídico

    Direito da União

    Diretiva IVA

    3

    O artigo 131.o da Diretiva IVA dispõe:

    «As isenções previstas nos Capítulos 2 a 9 aplicam‑se sem prejuízo de outras disposições comunitárias e nas condições fixadas pelos Estados‑Membros a fim de assegurar a aplicação correta e simples das referidas isenções e de evitar qualquer possível fraude, evasão ou abuso.»

    4

    Nos termos do artigo 138.o, n.o 1, desta diretiva:

    «Os Estados‑Membros isentam as entregas de bens expedidos ou transportados, para fora do respetivo território mas na Comunidade, pelo vendedor, pelo adquirente ou por conta destes, efetuadas a outro sujeito passivo ou a uma pessoa coletiva que não seja sujeito passivo agindo como tal num Estado‑Membro diferente do Estado de partida da expedição ou do transporte dos bens.»

    5

    O artigo 139.o, n.o 1, da referida diretiva prevê:

    «A isenção prevista no n.o 1 do artigo 138.o não se aplica às entregas de bens efetuadas por sujeitos passivos que beneficiem da isenção para as pequenas empresas prevista nos artigos 282.o a 292.o

    A isenção também não se aplica às entregas de bens efetuadas a sujeitos passivos ou a pessoas coletivas que não sejam sujeitos passivos cujas aquisições intracomunitárias de bens não estejam sujeitas ao IVA por força do disposto no n.o 1.»

    Regulamento (UE) n.o 904/2010

    6

    Nos termos do considerando 7 do Regulamento (UE) n.o 904/2010 do Conselho, de 7 de outubro de 2010, relativo à cooperação administrativa e à luta contra a fraude no domínio do imposto sobre o valor acrescentado (JO 2010, L 268, p. 1):

    «Para que possam cobrar o imposto devido, os Estados‑Membros deverão cooperar a fim de ajudar a garantir que o montante do IVA é fixado de forma correta. Em consequência, deverão não só controlar a aplicação do imposto devido no seu próprio território, mas também prestar assistência a outros Estados‑Membros a fim de assegurar a correta aplicação do imposto que diga respeito a atividades efetuadas no seu próprio território mas que seja devido noutro Estado‑Membro.»

    Direito checo

    7

    De acordo com o § 92, n.o 3, da zákon č. 280/2009 Sb., daňový řád (Lei n.o 280/2009 que aprova o Código de Processo Tributário), na sua versão aplicável ao processo principal, o sujeito passivo presta provas de todas as circunstâncias que é obrigado a indicar na declaração fiscal ordinária, na declaração complementar ou em qualquer outro documento.

    Litígio no processo principal e questão prejudicial

    8

    O pedido de decisão prejudicial foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a B2 Energy, uma sociedade checa, à Direção de Finanças, a respeito da recusa da Administração Tributária de isentar a B2 Energy do IVA relativo a várias entregas de bens, pretensamente intracomunitárias, com destino à Polónia, pelo facto de a B2 Energy não ter provado que estavam preenchidos os requisitos para beneficiar dessa isenção.

    9

    Em 2015, a B2 Energy efetuou entregas de óleo de colza com destino à Polónia. Segundo o órgão jurisdicional de reenvio, esses bens não foram entregues aos destinatários declarados nos documentos fiscais mas a outros destinatários estabelecidos nesse Estado‑Membro, alguns dos quais confirmaram a receção através da aposição do seu carimbo e da sua assinatura em guias de transporte internacionais.

    10

    Depois de ter efetuado, em 15 de julho de 2015, uma auditoria fiscal relativa aos meses de fevereiro a maio de 2015, a Administração Tributária em causa verificou que a B2 Energy não tinha provado, com base nos documentos fornecidos, que preenchia os requisitos para beneficiar da isenção do IVA. Embora não tenha contestado a realização efetiva do transporte dos bens em causa com destino a outro Estado‑Membro, considerou que a B2 Energy não tinha provado que tinha transferido o direito de dispor desses bens como proprietário para as pessoas apresentadas nos documentos fiscais como sendo as suas destinatárias, nem mesmo que os referidos bens tinham sido entregues a uma pessoa registada fiscalmente noutro Estado‑Membro. Por conseguinte, a Administração Tributária considerou que a B2 Energy não preenchia os requisitos para beneficiar do direito à isenção. Consequentemente, nos avisos de liquidação de 6 de outubro de 2017, declarou que o montante do IVA devia ser agravado em relação aos meses de fevereiro a maio de 2015.

    11

    Por Decisão de 21 de novembro de 2019, a Direção de Finanças indeferiu as reclamações apresentadas pela B2 Energy contra esses avisos de liquidação. Por Sentença de 18 de agosto de 2021, o Městský soud v Praze (Tribunal de Praga, República Checa) negou provimento ao recurso interposto pela B2 Energy, salientando, em substância, que a B2 Energy não tinha sequer demonstrado que os bens em causa tinham sido entregues, por intermédio dos destinatários declarados nos documentos fiscais, aos que apresentava como sendo os destinatários finais. Mais especificamente, o Městský soud v Praze (Tribunal de Praga) considerou que os documentos apresentados não indicavam a pessoa que tinha tomado a seu cargo os bens em nome do destinatário nem o destinatário a quem as mercadorias tinham sido entregues. Por este motivo, não é possível identificar a pessoa habilitada a exercer o direito de dispor dessas mercadorias como proprietário.

    12

    A B2 Energy interpôs recurso de cassação dessa sentença no órgão jurisdicional de reenvio, alegando, em substância, que tinha provado que estavam preenchidos os requisitos para o exercício do direito à isenção do IVA para a entrega de bens com destino a outro Estado‑Membro. Os elementos de prova fornecidos, que atestam a receção efetiva dos bens em causa por sociedades diferentes das entidades declaradas nos documentos fiscais pertinentes, permitem, com efeito, determinar a identidade dos destinatários para os quais foi transferido o direito de dispor desses bens.

    13

    Segundo o órgão jurisdicional de reenvio, o Tribunal de Justiça, no Acórdão de 9 de dezembro de 2021, Kemwater ProChemie (C‑154/20, EU:C:2021:989), admitiu que os requisitos para beneficiar do direito à dedução do IVA estão preenchidos, quando a identidade do fornecedor não está demonstrada, se a Administração Tributária dispuser das informações necessárias para verificar se esse fornecedor tinha a qualidade de sujeito passivo de IVA. O órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se sobre a possibilidade de transpor esse acórdão para a apreciação do direito à isenção do IVA das entregas de mercadorias com destino a outro Estado‑Membro, quando os factos demonstram que essas mercadorias não foram tomadas a cargo pelo destinatário declarado nos documentos fiscais, mas por outro destinatário que dispunha da qualidade de sujeito passivo.

    14

    Nestas condições, o Nejvyšší správní soud (Supremo Tribunal Administrativo, República Checa) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

    «Deve o artigo 138.o, n.o 1, da Diretiva [IVA], à luz do Acórdão do Tribunal de Justiça da União Europeia de 9 de dezembro de 2021 no processo C‑154/20, Kemwater ProChemie,EU:C:2021:989, ser interpretado no sentido de que há que recusar o exercício do direito à isenção do [IVA] no caso de uma entrega de bens noutro Estado‑Membro da União Europeia, sem que a autoridade fiscal tenha de provar que a entrega de bens estava envolvida numa fraude ao IVA, quando o fornecedor não tiver provado que o bem foi entregue a um destinatário específico noutro Estado‑Membro da União Europeia com a qualidade de sujeito passivo indicado nos documentos fiscais, apesar de, tendo em conta as circunstâncias de facto e as informações transmitidas pelo sujeito passivo, estarem disponíveis as informações necessárias para verificar que o destinatário efetivo de outro Estado‑Membro da União Europeia tinha essa qualidade?»

    Quanto à questão prejudicial

    15

    Com a sua questão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 138.o, n.o 1, da Diretiva IVA, relativo à isenção das entregas intracomunitárias, deve ser interpretado no sentido de que há que recusar a isenção do IVA a um fornecedor estabelecido num Estado‑Membro, que entregou bens com destino a outro Estado‑Membro, que não provou que essas mercadorias tinham sido entregues a um destinatário que tem a qualidade de sujeito passivo nesse Estado‑Membro, embora, tendo em conta os elementos de facto e as informações apresentados por esse fornecedor, a Administração Tributária do Estado‑Membro de partida disponha dos dados necessários para verificar se a pessoa à qual foram fisicamente entregues os bens tinha a qualidade de sujeito passivo agindo como tal no Estado‑Membro de chegada.

    16

    A título preliminar, há que recordar que o artigo 138.o, n.o 1, da Diretiva IVA prevê a obrigação de os Estados‑Membros isentarem as entregas de bens que satisfaçam as condições aí enumeradas (Acórdão de 9 de fevereiro de 2017, Euro Tyre,C‑21/16, EU:C:2017:106, n.o 23 e jurisprudência referida).

    17

    No que respeita, por um lado, à qualificação de uma operação como entrega intracomunitária, resulta do artigo 138.o, n.o 1, da Diretiva IVA, na sua versão aplicável aos factos no processo principal, em conjugação com o artigo 131.o desta diretiva, que estão abrangidas por este conceito e estão isentas, nas condições fixadas pelos Estados‑Membros para assegurar a aplicação correta e simples das isenções das entregas em causa e evitar eventuais fraudes, evasões e abusos, as entregas de bens expedidos ou transportados, pelo vendedor, pelo adquirente ou por conta destes, fora do território de um Estado‑Membro, mas no interior da União, efetuadas a outro sujeito passivo ou a uma pessoa coletiva que não seja sujeito passivo, agindo como tal num Estado‑Membro diferente do Estado de partida da expedição ou do transporte dos bens.

    18

    A este respeito, importa salientar que, por força do artigo 138.o, n.o 1, da Diretiva IVA, na sua versão aplicável ao processo principal, a isenção de uma operação para efeitos de IVA está sujeita à condição de o direito de dispor de um bem como proprietário ter sido transferido para o adquirente, de o fornecedor provar que esse bem foi expedido ou transportado para outro Estado‑Membro e de, na sequência dessa expedição ou desse transporte, o referido bem ter saído fisicamente do território do Estado‑Membro de partida da expedição ou do transporte (v., neste sentido, Acórdão de 9 de fevereiro de 2017, Euro Tyre,C‑21/16, EU:C:2017:106, n.o 25 e jurisprudência referida).

    19

    Por outro lado, tal como decorre do artigo 139.o, n.o 1, segundo parágrafo, da Diretiva IVA, a isenção deste imposto está sujeita à condição de a entrega não ser efetuada a um sujeito passivo ou a uma pessoa coletiva que não seja sujeito passivo cujas aquisições intracomunitárias de bens não estejam sujeitas ao IVA por força do disposto no n.o 1 do artigo 3.o desta diretiva (Acórdão de 9 de outubro de 2014, Traum,C‑492/13, EU:C:2014:2267, n.o 25).

    20

    Com exceção destas condições, relativas precisamente à qualidade de sujeito passivo, à transferência do poder de dispor de um bem como proprietário e à deslocação física de bens de um Estado‑Membro para outro, não se pode assim exigir o preenchimento de nenhuma outra condição para qualificar uma operação de entrega intracomunitária de bens, sendo certo que o conceito de entrega intracomunitária tem um caráter objetivo e aplica‑se independentemente dos objetivos e dos resultados das operações em causa (Acórdão de 27 de setembro de 2012, VSTR,C‑587/10, EU:C:2012:592, n.o 30).

    21

    Por conseguinte, o princípio da neutralidade fiscal exige que a isenção do IVA seja concedida se os requisitos de fundo estiverem cumpridos, ainda que os sujeitos passivos tenham negligenciado certas exigências formais (Acórdão de 9 de fevereiro de 2017, Euro Tyre,C‑21/16, EU:C:2017:106, n.o 36).

    22

    Neste contexto, é desprovida de pertinência a argumentação da Direção de Finanças baseada no artigo 138.o, n.o 1, alínea b), da Diretiva IVA, conforme alterada pela Diretiva (UE) 2018/1910 do Conselho, de 4 de dezembro de 2018 (JO 2018, L 311, p. 3), que prevê que os Estados‑Membros isentam as entregas de bens expedidos ou transportados para fora do respetivo território, mas na União, quando o sujeito passivo, ou a pessoa coletiva que não seja sujeito passivo, a quem a entrega de bens é efetuada está registada para efeitos do IVA num Estado‑Membro diferente do Estado de partida da expedição ou do transporte dos bens e comunicou esse número de identificação IVA ao fornecedor.

    23

    Com efeito, esta disposição, introduzida pela Diretiva 2018/1910, não é aplicável ratione temporis aos factos do processo principal.

    24

    Por conseguinte, os requisitos estabelecidos no artigo 138.o, n.o 1, da Diretiva IVA, na sua versão aplicável aos factos no processo principal, relativos, por um lado, à existência de uma entrega de um Estado‑Membro a outro e, por outro, à qualidade de sujeito passivo do adquirente, segundo a qual o adquirente deve ser um «sujeito passivo agindo como tal [noutro] Estado‑Membro», não implicam, por si só, que a entrega física dos bens em causa deva ser efetuada ao destinatário indicado nos documentos fiscais.

    25

    No caso em apreço, resulta da decisão de reenvio que a Administração Tributária recusou à B2 Energy o benefício da isenção do IVA por esta sociedade não ter provado que as mercadorias em causa tinham sido entregues aos destinatários declarados nos documentos fiscais nem que essas mercadorias tinham sido entregues a uma pessoa registada para efeitos de IVA noutro Estado‑Membro.

    26

    A este respeito, há que recordar que, segundo jurisprudência do Tribunal de Justiça, existem apenas dois casos nos quais o desrespeito de uma exigência formal pode implicar a perda do direito à isenção do IVA (Acórdão de 9 de fevereiro de 2017, Euro Tyre,C‑21/16, EU:C:2017:106, n.o 38 e jurisprudência referida).

    27

    Em primeiro lugar, o princípio da neutralidade fiscal não pode ser invocado, para efeitos da isenção do IVA, por um sujeito passivo que tenha participado intencionalmente numa fraude fiscal que pôs em perigo o funcionamento do sistema comum do IVA. Com efeito, não é contrário ao direito da União exigir a um operador que atue de boa‑fé e tome todas as medidas que lhe podem ser razoavelmente exigidas para garantir que a operação que efetua não implica a sua participação numa fraude fiscal. Na hipótese de o sujeito passivo em causa saber ou dever saber que a operação que efetuou fazia parte de uma fraude cometida pelo adquirente e de não ter tomado todas as medidas razoáveis ao seu alcance para evitar esta fraude, o direito à isenção deveria ser‑lhe recusado (v., neste sentido, Acórdão de 8 de novembro de 2018, Cartrans Spedition,C‑495/17, EU:C:2018:887, n.o 41 e jurisprudência referida).

    28

    Em segundo lugar, a violação de uma exigência formal pode levar a uma recusa de isenção do IVA se essa violação tiver por efeito impedir a produção da prova incontestável do cumprimento das exigências de fundo (Acórdão de 8 de novembro de 2018, Cartrans Spedition,C‑495/17, EU:C:2018:887, n.o 42 e jurisprudência referida). No entanto, resulta do próprio requisito a que está subordinada a recusa de isenção do IVA, que a Administração não pode impor exigências suplementares que possam ter por efeito eliminar o direito de isenção do sujeito passivo, quando dispõe dos dados necessários para saber que as exigências de fundo foram cumpridas (Acórdão de 20 de outubro de 2016, Plöckl,C‑24/15, EU:C:2016:791, n.o 47), e nomeadamente que as mercadorias foram entregues a um sujeito passivo agindo como tal.

    29

    A este respeito, importa salientar que o órgão jurisdicional de reenvio se limita a questionar o Tribunal de Justiça sobre a necessidade de determinar a qualidade de sujeito passivo do adquirente sem se referir à hipótese de uma fraude. Nestas condições, há que entender a questão submetida pelo órgão jurisdicional de reenvio no sentido de que visa as modalidades de prova suscetíveis de serem impostas ao fornecedor para demonstrar que os requisitos da isenção do IVA no momento de uma entrega de bens para outro Estado‑Membro, e mais especificamente o requisito relativo à qualidade de sujeito passivo do adquirente, estão preenchidos.

    30

    Por conseguinte, importa recordar que, não havendo na Diretiva IVA uma disposição respeitante às provas que os sujeitos passivos devem fornecer para beneficiarem da isenção do IVA, cabe aos Estados‑Membros fixar, em conformidade com o artigo 131.o desta diretiva, os requisitos de isenção das operações intracomunitárias para garantir a aplicação correta e simples dessas isenções e prevenir eventuais fraudes, evasões e abusos. No exercício dos seus poderes, os Estados‑Membros devem respeitar os princípios gerais de direito que fazem parte do ordenamento jurídico da União, entre os quais se incluem os princípios da segurança jurídica e da proporcionalidade (v., neste sentido, Acórdão de 8 de novembro de 2018, Cartrans Spedition,C‑495/17, EU:C:2018:887, n.o 37 e jurisprudência referida).

    31

    Importa constatar, a este respeito, que, desde a abolição do controlo nas fronteiras entre Estados‑Membros, é difícil para a Administração Tributária verificar se as mercadorias saíram ou não fisicamente do território do referido Estado‑Membro. Por este motivo, é principalmente com base nas provas fornecidas pelos sujeitos passivos e nas suas declarações que as autoridades tributárias nacionais procedem a essa verificação (Acórdão de 6 de setembro de 2012, Mecsek‑Gabona, C‑273/11, EU:C:2012:547, n.o 35 e jurisprudência referida).

    32

    Mais especificamente, o Tribunal de Justiça sublinhou que as obrigações que incumbem a um sujeito passivo em matéria de prova devem ser determinadas em função dos requisitos fixados expressamente a esse respeito pelo direito nacional e da prática habitual estabelecida para transações semelhantes (Acórdão de 8 de novembro de 2018, Cartrans Spedition,C‑495/17, EU:C:2018:887, n.o 57 e jurisprudência referida).

    33

    Neste contexto, o órgão jurisdicional de reenvio parece indicar que a B2 Energy apresentou à Administração Tributária, sem provar que entregou os bens em causa aos destinatários declarados, os documentos fiscais relativos às entregas efetuadas, incluindo vários anexos, como notas de entrega, guias de transporte internacionais, talões de pesagem ou extratos bancários, dos quais resulta que as mercadorias foram entregues noutro Estado‑Membro onde a sua receção foi certificada por entidades diferentes das declaradas pela B2 Energy ou que as que apresentou como sendo os destinatários finais dessas mercadorias.

    34

    Resulta também dos termos da decisão de reenvio e da própria redação da questão submetida que esta se baseia na premissa de que a Administração Tributária dispunha das informações necessárias para verificar, à luz dos factos, que os verdadeiros destinatários tinham a qualidade de sujeitos passivos. Mais especificamente, o órgão jurisdicional de reenvio sublinha que o transporte de óleo de colza da República Checa para a Polónia e a sua descarga para destinatários, não identificados pela recorrente no processo principal nas suas declarações fiscais, não foram contestados pela Administração Tributária. Além disso, as entregas em causa no processo principal dizem respeito a bens que, por natureza, parecem destinar‑se a ser utilizados no quadro de uma atividade económica.

    35

    Não obstante, o facto de as mercadorias terem sido recebidas por entidades diferentes das mencionadas nos documentos fiscais pode indicar que foram objeto de uma operação comercial, cujo momento pode ser determinante para a aplicação da isenção. Com efeito, a qualificação de entrega intracomunitária da entrega efetuada pelo fornecedor que aplica a isenção e que consta dos documentos fiscais depende da questão de saber se o transporte pode efetivamente ser imputado a essa entrega (v., neste sentido, Acórdão de 27 de setembro de 2012, VSTR,C‑587/10, EU:C:2012:592, n.o 31).

    36

    A este respeito, importa sublinhar que, para efeitos de isenção do IVA, as autoridades tributárias devem ter em devida conta todos os elementos na sua posse, como os documentos a que se refere o órgão jurisdicional de reenvio, para efeitos de examinar se estes documentos podem corroborar, se for caso disso, a existência verosímil de uma entrega efetiva das mercadorias transportadas para um Estado‑Membro diferente do Estado‑Membro de partida do transporte ou da expedição (v., por analogia, Acórdão de 8 de novembro de 2018, Cartrans Spedition,C‑495/17, EU:C:2018:887, n.os 66 e 67).

    37

    Por outro lado, à luz do princípio da neutralidade fiscal, não se pode exigir ao sujeito passivo que, para poder exercer o seu direito à isenção do IVA, prove, em todos os casos, quando o destinatário dos bens em causa não tenha sido identificado, que esse destinatário tem a qualidade de sujeito passivo na medida em que resulte de forma certa das circunstâncias factuais que o referido destinatário tinha necessariamente essa qualidade (v., por analogia, Acórdão de 9 de dezembro de 2021, Kemwater ProChemie,C‑154/20, EU:C:2021:989, n.o 40).

    38

    Nestas condições, cabe às autoridades tributárias e aos órgãos jurisdicionais nacionais competentes verificar, com base em todos os documentos apresentados, incluindo os documentos que se encontravam na posse do fornecedor, se estavam preenchidos os requisitos materiais do benefício da isenção do IVA.

    39

    Só na hipótese de, tendo em conta as circunstâncias factuais, e não obstante os elementos apresentados pelo sujeito passivo, faltarem os dados necessários para verificar que os requisitos previstos no artigo 138.o, n.o 1, da Diretiva IVA estão preenchidos é que o benefício da isenção do IVA deve ser recusado a este último, sem que a Administração Tributária tenha de provar que esse sujeito passivo esteve implicado numa fraude ao IVA.

    40

    Atendendo a todas as considerações precedentes, há que responder à questão submetida que o artigo 138.o, n.o 1, da Diretiva IVA deve ser interpretado no sentido de que há que recusar a isenção do IVA a um fornecedor estabelecido num Estado‑Membro, que entregou mercadorias com destino a outro Estado‑Membro, quando este fornecedor não tenha provado que as mercadorias foram entregues a um destinatário que tem a qualidade de sujeito passivo neste último Estado‑Membro e quando, tendo em conta as circunstâncias factuais e os elementos apresentados pelo fornecedor, faltarem os dados necessários para verificar que esse destinatário tinha esta qualidade.

    Quanto às despesas

    41

    Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

     

    Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Décima Secção) declara:

     

    O artigo 138.o, n.o 1, da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado,

     

    deve ser interpretado no sentido de que:

     

    há que recusar a isenção do imposto sobre o valor acrescentado a um fornecedor estabelecido num Estado‑Membro, que entregou mercadorias com destino a outro Estado‑Membro, quando este fornecedor não tenha provado que as mercadorias foram entregues a um destinatário que tem a qualidade de sujeito passivo neste último Estado‑Membro e quando, tendo em conta as circunstâncias factuais e os elementos apresentados pelo fornecedor, faltarem os dados necessários para verificar que esse destinatário tinha esta qualidade.

     

    Assinaturas


    ( *1 ) Língua do processo: checo.

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