EUR-Lex Access to European Union law

Back to EUR-Lex homepage

This document is an excerpt from the EUR-Lex website

Document 62022CJ0518

Acórdão do Tribunal de Justiça (Segunda Secção) de 7 de dezembro de 2023.
J.M.P. contra AP Assistenzprofis GmbH.
Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Bundesarbeitsgericht.
Reenvio prejudicial — Política social — Igualdade de tratamento no emprego e na atividade profissional — Diretiva 2000/78/CE — Artigo 2.o, n.o 5 — Proibição de discriminação em razão da idade — Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência — Artigo 19.o — Direito a viver de forma independente e a ser incluído na comunidade — Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia — Artigo 26.o — Integração social e profissional das pessoas portadoras de deficiência — Serviço de assistência pessoal às pessoas portadoras de deficiência — Oferta de emprego com indicação da idade mínima e da idade máxima da pessoa a recrutar — Tomada em consideração da vontade e dos interesses da pessoa portadora de deficiência — Justificação.
Processo C-518/22.

Court reports – general

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2023:956

 ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção)

7 de dezembro de 2023 ( *1 )

«Reenvio prejudicial — Política social — Igualdade de tratamento no emprego e na atividade profissional — Diretiva 2000/78/CE — Artigo 2.o, n.o 5 — Proibição de discriminação em razão da idade — Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência — Artigo 19.o — Direito a viver de forma independente e a ser incluído na comunidade — Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia — Artigo 26.o — Integração social e profissional das pessoas portadoras de deficiência — Serviço de assistência pessoal às pessoas portadoras de deficiência — Oferta de emprego com indicação da idade mínima e da idade máxima da pessoa a recrutar — Tomada em consideração da vontade e dos interesses da pessoa portadora de deficiência — Justificação»

No processo C‑518/22,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Bundesarbeitsgericht (Supremo Tribunal do Trabalho Federal, Alemanha), por Decisão de 24 de fevereiro de 2022, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 3 de agosto de 2022, no processo

J.M.P.

contra

AP Assistenzprofis GmbH,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção),

composto por: A. Prechal, presidente de secção, F. Biltgen, N. Wahl, J. Passer e M. L. Arastey Sahún (relatora), juízes,

advogado‑geral: J. Richard de la Tour,

secretário: A. Calot Escobar,

vistos os autos,

vistas as observações apresentadas:

em representação de J.M.P., por T. Nick, Rechtsanwalt,

em representação da AP Assistenzprofis GmbH, por O. Viehweg, Rechtsanwalt,

em representação do Governo Helénico, por V. Baroutas e M. Tassopoulou, na qualidade de agentes,

em representação do Governo Polaco, por B. Majczyna, na qualidade de agente,

em representação do Governo Português, por P. Barros da Costa e A. Pimenta, na qualidade de agentes,

em representação da Comissão Europeia, por D. Martin e E. Schmidt, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 13 de julho de 2023,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 2.o, n.o 5, do artigo 4.o, n.o 1, do artigo 6.o, n.o 1, e do artigo 7.o da Diretiva 2000/78/CE do Conselho, de 27 de novembro de 2000, que estabelece um quadro geral de igualdade de tratamento no emprego e na atividade profissional (JO 2000, L 303, p. 16), lidos à luz da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta») e da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, que foi aprovada em nome da União Europeia pela Decisão 2010/48/CE do Conselho, de 26 de novembro de 2009 (JO 2010, L 23, p. 35; a seguir «Convenção da ONU»).

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe J.M.P. à AP Assistenzprofis GmbH, um prestador de serviços de assistência e de aconselhamento às pessoas portadoras de deficiência, a respeito do pagamento de uma indemnização solicitada por J.M.P. com fundamento na discriminação em razão da idade ocorrida no âmbito de um processo de recrutamento.

Quadro jurídico

Direito internacional

3

Nos termos do preâmbulo da Convenção da ONU:

«Os Estados Partes na presente Convenção,

[…]

c)

Reafirmando a universalidade, indivisibilidade, interdependência e correlação de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais e a necessidade de garantir às pessoas com deficiências o seu pleno gozo sem serem alvo de discriminação;

[…]

h)

Reconhecendo também que a discriminação contra qualquer pessoa com base na deficiência é uma violação da dignidade e valor inerente à pessoa humana;

[…]

j)

Reconhecendo a necessidade de promover e proteger os direitos humanos de todas as pessoas com deficiência, incluindo aquelas que desejam um apoio mais intenso;

[…]

n)

Reconhecendo a importância para as pessoas com deficiência da sua autonomia e independência individual, incluindo a liberdade de fazerem as suas próprias escolhas;

[…]»

4

O artigo 1.o desta Convenção, sob a epígrafe «Objeto», dispõe:

«O objeto da presente Convenção é promover, proteger e garantir o pleno e igual gozo de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais por todas as pessoas com deficiência e promover o respeito pela sua dignidade inerente.

[…]»

5

O artigo 3.o da referida Convenção, sob a epígrafe «Princípios gerais», enuncia:

«Os princípios da presente Convenção são:

a)

O respeito pela dignidade inerente, autonomia individual, incluindo a liberdade de fazerem as suas próprias escolhas, e independência das pessoas;

b)

Não discriminação;

c)

Participação e inclusão plena e efetiva na sociedade;

d)

O respeito pela diferença e aceitação das pessoas com deficiência como parte da diversidade humana e humanidade;

[…]»

6

O artigo 5.o da mesma Convenção, sob a epígrafe «Igualdade e não discriminação», tem a seguinte redação:

«1.   Os Estados Partes reconhecem que todas as pessoas são iguais perante e nos termos da lei e que têm direito, sem qualquer discriminação, a igual proteção e benefício da lei.

[…]

4.   As medidas específicas que são necessárias para acelerar ou alcançar a igualdade de facto das pessoas com deficiência não serão consideradas discriminação nos termos da presente Convenção.»

7

O artigo 12.o da Convenção da ONU, sob a epígrafe «Reconhecimento igual perante a lei», prevê, no seu n.o 2:

«Os Estados Partes reconhecem que as pessoas com deficiências têm capacidade jurídica, em condições de igualdade com as outras, em todos os aspetos da vida.»

8

Nos termos do artigo 19.o desta Convenção, sob a epígrafe «Direito a viver de forma independente e a ser incluído na comunidade»:

«Os Estados Partes na presente Convenção reconhecem o igual direito de direitos de todas as pessoas com deficiência a viverem na comunidade, com escolhas iguais às demais e tomam medidas eficazes e apropriadas para facilitar o pleno gozo, por parte das pessoas com deficiência, do seu direito e a sua total inclusão e participação na comunidade, assegurando nomeadamente que:

a)

As pessoas com deficiência têm a oportunidade de escolher o seu local de residência e onde e com quem vivem em condições de igualdade com as demais e não são obrigadas a viver num determinado ambiente de vida;

b)

As pessoas com deficiência têm acesso a uma variedade de serviços domiciliários, residenciais e outros serviços de apoio da comunidade, incluindo a assistência pessoal necessária para apoiar a vida e inclusão na comunidade a prevenir o isolamento ou segregação da comunidade;

c)

Os serviços e instalações da comunidade para a população em geral são disponibilizados, em condições de igualdade, às pessoas com deficiência e que estejam adaptados às suas necessidades.»

Direito da União

9

Nos termos dos considerandos 23 e 25 da Diretiva 2000/78:

«(23)

Em circunstâncias muito limitadas, podem justificar‑se diferenças de tratamento sempre que uma característica relacionada com a religião ou as convicções, com uma deficiência, com a idade ou com a orientação sexual constitua um requisito genuíno e determinante para o exercício da atividade profissional, desde que o objetivo seja legítimo e o requisito proporcional. Essas circunstâncias devem ser mencionadas nas informações fornecidas pelos Estados‑Membros à Comissão [Europeia].

[…]

(25)

A proibição de discriminações relacionadas com a idade constitui um elemento essencial para atingir os objetivos estabelecidos pelas orientações para o emprego e encorajar a diversidade no emprego. Todavia, em determinadas circunstâncias, podem‑se justificar diferenças de tratamento com base na idade, que implicam a existência de disposições específicas que podem variar consoante a situação dos Estados‑Membros. Urge pois distinguir diferenças de tratamento justificadas, nomeadamente por objetivos legítimos de política de emprego, do mercado de trabalho e da formação profissional, de discriminações que devem ser proibidas.»

10

O artigo 1.o desta diretiva, sob a epígrafe «Objeto», enuncia:

«A presente diretiva tem por objeto estabelecer um quadro geral para lutar contra a discriminação em razão da religião ou das convicções, de uma deficiência, da idade ou da orientação sexual, no que se refere ao emprego e à atividade profissional, com vista a pôr em prática nos Estados‑Membros o princípio da igualdade de tratamento.»

11

O artigo 2.o da referida diretiva tem a seguinte redação:

«1.   Para efeitos da presente diretiva, entende‑se por “princípio da igualdade de tratamento” a ausência de qualquer discriminação, direta ou indireta, por qualquer dos motivos referidos no artigo 1.o

2.   Para efeitos do n.o 1:

a)

Considera‑se que existe discriminação direta sempre que, por qualquer dos motivos referidos no artigo 1.o, uma pessoa seja objeto de um tratamento menos favorável do que aquele que é, tenha sido ou possa vir a ser dado a outra pessoa em situação comparável;

[…]

5.   A presente diretiva não afeta as medidas previstas na legislação nacional que, numa sociedade democrática, sejam necessárias para efeitos de segurança pública, defesa da ordem e prevenção das infrações penais, proteção da saúde e proteção dos direitos e liberdades de terceiros.»

12

O artigo 3.o da mesma diretiva, sob a epígrafe «Âmbito de aplicação», dispõe, no seu n.o 1, alínea a):

«Dentro dos limites das competências atribuídas à Comunidade, a presente diretiva é aplicável a todas as pessoas, tanto no setor público como no privado, incluindo os organismos públicos, no que diz respeito:

a)

Às condições de acesso ao emprego, ao trabalho independente ou à atividade profissional, incluindo os critérios de seleção e as condições de contratação, seja qual for o ramo de atividade e a todos os níveis da hierarquia profissional, incluindo em matéria de promoção».

13

O artigo 4.o da Diretiva 2000/78, sob a epígrafe «Requisitos para o exercício de uma atividade profissional», prevê, no seu n.o 1:

«Sem prejuízo do disposto nos n.os 1 e 2 do artigo 2.o, os Estados‑Membros podem prever que uma diferença de tratamento baseada numa característica relacionada com qualquer dos motivos de discriminação referidos no artigo 1.o não constituirá discriminação sempre que, em virtude da natureza da atividade profissional em causa ou do contexto da sua execução, essa característica constitua um requisito essencial e determinante para o exercício dessa atividade, na condição de o objetivo ser legítimo e o requisito proporcional.»

14

O artigo 6.o desta diretiva, sob a epígrafe «Justificação das diferenças de tratamento com base na idade», dispõe:

«1.   Sem prejuízo do disposto no n.o 2 do artigo 2.o, os Estados‑Membros podem prever que as diferenças de tratamento com base na idade não constituam discriminação se forem objetiva e razoavelmente justificadas, no quadro do direito nacional, por um objetivo legítimo, incluindo objetivos legítimos de política de emprego, do mercado de trabalho e de formação profissional, e desde que os meios para realizar esse objetivo sejam apropriados e necessários.

Essas diferenças de tratamento podem incluir, designadamente:

a)

O estabelecimento de condições especiais de acesso ao emprego e à formação profissional, de emprego e de trabalho, nomeadamente condições de despedimento e remuneração, para os jovens, os trabalhadores mais velhos e os que têm pessoas a cargo, a fim de favorecer a sua inserção profissional ou garantir a sua proteção;

b)

A fixação de condições mínimas de idade, experiência profissional ou antiguidade no emprego para o acesso ao emprego ou a determinadas regalias associadas ao emprego;

c)

A fixação de uma idade máxima de contratação, com base na formação exigida para o posto de trabalho em questão ou na necessidade de um período razoável de emprego antes da reforma.

[…]»

15

O artigo 7.o da referida diretiva, sob a epígrafe «Ação positiva e medidas específicas», enuncia:

«1.   A fim de assegurar a plena igualdade na vida ativa, o princípio da igualdade de tratamento não obsta a que os Estados‑Membros mantenham ou adotem medidas específicas destinadas a prevenir ou compensar desvantagens relacionadas com qualquer dos motivos de discriminação referidos no artigo 1.o

2.   No que respeita às pessoas deficientes, o princípio da igualdade de tratamento não afeta o direito dos Estados‑Membros de manterem ou adotarem disposições em matéria de proteção da saúde e da segurança no local de trabalho nem medidas destinadas a criar ou a manter disposições ou facilidades para salvaguardar ou fomentar a sua inserção no mundo do trabalho.»

Direito alemão

GG

16

O § 1 da Grundgesetz für die Bundesrepublik Deutschland (Lei Fundamental da República Federal da Alemanha), de 23 de maio de 1949 (BGBl. 1949 I, p. 1), na sua versão aplicável ao litígio no processo principal (a seguir «GG»), tem a seguinte redação:

«1.   A dignidade do ser humano é inviolável. Todos os poderes públicos têm a obrigação de a respeitar e proteger.

2.   Consequentemente, o povo alemão reconhece os direitos invioláveis e inalienáveis do ser humano como base para toda a comunidade humana, da paz e da justiça no mundo.

[…]»

17

O § 2, n.o 1, da GG prevê:

«Todos têm direito ao livre desenvolvimento da sua personalidade, desde que não violem os direitos de terceiros, e não atentem contra a ordem constitucional ou o direito consuetudinário.»

AGG

18

A Allgemeines Gleichbehandlungsgesetz (Lei Geral sobre a Igualdade de Tratamento), de 14 de agosto de 2006 (BGBl. 2006 I, p. 1897, a seguir «AGG»), visa transpor a Diretiva 2000/78 para o direito alemão.

19

Nos termos do § 1 da AGG:

«A presente lei tem por objetivo impedir ou eliminar qualquer desvantagem baseada na raça ou na origem étnica, no sexo, na religião ou nas convicções, numa deficiência, na idade ou na identidade sexual.»

20

O § 3, n.o 1, da AGG dispõe:

«Considera‑se que existe discriminação direta sempre que, por qualquer dos motivos referidos no § 1, uma pessoa seja objeto de um tratamento menos favorável do que aquele que é, tenha sido ou possa vir a ser dado a outra pessoa em situação comparável. […]»

21

O § 5 da AGG enuncia:

«Sem prejuízo dos motivos referidos nos §§ 8 a 10 […], é igualmente autorizada uma diferença de tratamento quando as medidas adequadas e apropriadas visem prevenir ou compensar desvantagens existentes em razão de um motivo referido no § 1.»

22

O § 7, n.o 1, da AGG tem a seguinte redação:

«Os trabalhadores assalariados não podem ser alvo de discriminação em razão de um dos motivos referidos no § 1 […]»

23

O § 8, n.o 1, da AGG prevê:

«É permitida uma diferença de tratamento baseada num dos motivos a que alude o § 1 quando a natureza da atividade a exercer ou as condições do seu exercício constituem um requisito profissional essencial e decisivo, desde que o objetivo seja legítimo e o requisito seja proporcional.»

24

Nos termos do § 10, da AGG:

«Sem prejuízo do § 8, uma diferença de tratamento em razão da idade é igualmente autorizada quando for objetiva e razoavelmente justificada por um objetivo legítimo. Os meios adotados para alcançar esse objetivo devem ser apropriados e necessários. Essas diferenças de tratamento podem incluir, designadamente:

1.   A fixação de condições especiais de acesso ao emprego e à formação profissional, de emprego e de trabalho, incluindo as condições de remuneração e de cessação da relação de trabalho, para os jovens, os trabalhadores mais velhos e os que têm pessoas a cargo, a fim de favorecer a sua inserção profissional ou garantir a sua proteção,

2.   A fixação de condições mínimas de idade, experiência profissional ou antiguidade no emprego, para o acesso ao emprego ou a determinadas regalias associadas ao emprego,

3.   A fixação de uma idade máxima de contratação, com base na formação específica exigida para o posto de trabalho em questão ou na necessidade de um período razoável de emprego antes da reforma,

[…]»

25

O § 15 da AGG dispõe:

«1.   Em caso de violação da proibição de discriminação, o empregador fica obrigado a indemnizar o dano causado. […]

2.   O trabalhador pode pedir uma indemnização pecuniária adequada em caso de dano não patrimonial. […]»

SGB

26

O § 33 do Sozialgesetzbuch, Erstes Buch (I) (Código da Segurança Social, livro I), de 11 de dezembro de 1975 (BGBl. 1975 I, p. 3015, a seguir «SGB I»), enuncia:

«Se o conteúdo de direitos ou obrigações não for determinado de forma detalhada quanto à sua natureza ou alcance, há que ter em conta, na sua elaboração, a situação pessoal do titular de direito ou da pessoa sujeita a obrigações, as suas necessidades e a sua capacidade contributiva, bem como as condições locais, na medida em que as disposições legais não se oponham a tal. A este respeito, a vontade do titular de direito ou da pessoa sujeita a obrigações devem ser respeitadas na medida em que sejam razoáveis.»

27

O § 8, n.o 1, do Sozialgesetzbuch, Neuntes Buch (IX) (Código da Segurança Social, livro IX), de 23 de dezembro de 2016 (BGBl. 2016 I, p. 3234, a seguir «SGB IX»), tem a seguinte redação:

«Na tomada de decisões relativas às prestações e na execução das prestações destinadas a favorecer a participação [na sociedade], é respeitada a vontade legítima dos beneficiários das prestações. Neste contexto, são igualmente tidos em conta a situação pessoal, a idade, o sexo, a família, bem como as necessidades religiosas e filosóficas dos beneficiários das prestações; o § 33 do [SGB I] é aplicável quanto ao restante. […]»

28

O § 78, n.o 1, do SGB IX prevê:

«Com vista a uma gestão autónoma e independente da vida quotidiana, incluindo a estruturação do dia, são prestados serviços de assistência. Estes incluem, em especial, serviços relativos à realização de tarefas quotidianas gerais, como a gestão doméstica, a organização das relações sociais, o planeamento da vida pessoal, a participação na vida comunitária e cultural, a organização das atividades de lazer, incluindo as atividades desportivas, assim como a garantia da eficácia dos serviços médicos e medicamente prescritos. Os serviços prestados incluem a interação com os intervenientes nestes domínios.»

Litígio no processo principal e questão prejudicial

29

A AP Assistenzprofis, recorrida no processo principal, é uma sociedade que presta serviços de assistência e de aconselhamento a pessoas portadoras de deficiência, destinados à gestão autónoma e independente da sua vida quotidiana, em conformidade com o § 78, n.o 1, do SGB IX.

30

No decurso do mês de julho de 2018, esta sociedade publicou uma oferta de emprego que indicava que A., uma estudante de 28 anos, procurava assistentes pessoais do sexo feminino para a auxiliar em todos os domínios da vida quotidiana, com «idades, de preferência, entre os 18 e 30 anos».

31

J.M.P., a recorrente no processo principal, nascida em 1968, candidatou‑se a essa oferta de emprego e recebeu uma resposta negativa da parte da AP Assistenzprofis.

32

Depois de ter exercido os seus direitos por via extrajudicial, J.M.P. intentou uma ação contra a AP Assistenzprofis no Arbeitsgericht Köln (Tribunal do Trabalho de Colónia, Alemanha) destinada a obter a indemnização por danos resultantes de uma discriminação em razão da idade, ao abrigo do § 15, n.o 2, da AGG.

33

No âmbito desta ação, J.M.P. alegou, por um lado, que, uma vez que a oferta de emprego se dirigia expressamente às pessoas com idades «entre 18 e 30 anos», era possível presumir que esta não tinha sido selecionada no processo de recrutamento unicamente em razão da sua idade, o que a AP Assistenzprofis não contestou. Por outro lado, a diferença de tratamento em razão da idade que daí resultou não se justifica à luz da natureza dos serviços de assistência pessoal, nem autorizada ao abrigo do § 8, n.o 1, ou do § 10 da AGG, visto que, nomeadamente, para a relação de confiança no âmbito de tal assistência pessoal não é pertinente uma determinada idade.

34

A AP Assistenzprofis pediu que a referida ação fosse julgada improcedente, alegando que a eventual diferença de tratamento em razão da idade é justificada ao abrigo do § 8, n.o 1, ou do § 10 da AGG. A atividade de assistência pessoal consiste num acompanhamento diário altamente pessoal que implica uma dependência permanente por parte da pessoa assistida. Por conseguinte, o requisito de uma determinada idade permite satisfazer as necessidades estritamente pessoais de A. no âmbito da sua vida social enquanto estudante numa universidade.

35

Importa ter em conta, na perspetiva da recorrida no processo principal, por força do § 8, n.o 1, do SGB IX, a vontade legítima e as necessidades subjetivas de cada pessoa que beneficia de assistência pessoal. Neste contexto, a vontade legítima de que a pessoa que presta essa assistência tenha uma determinada idade deve ser considerada um «requisito profissional essencial e decisivo», na aceção do § 8, n.o 1, da AGG, a fim de poder alcançar o objetivo dos serviços de assistência prosseguido pelo § 78, n.o 1, do SGB IX, que protege o direito de personalidade, na aceção do § 2, n.o 1, lido em conjugação com o § 1 da GG. A AP Assistenzprofis considera que o referido requisito é também proporcional. Além disso, uma diferença de tratamento em razão da idade, como a que está em causa no processo principal, é admissível ao abrigo do § 10 da AGG, dado que esta última é objetiva e razoável, é justificada por um objetivo legítimo e os meios para atingir o objetivo da assistência pessoal, referido no § 78 do SGB IX, são adequados e necessários.

36

Uma vez que o Arbeitsgericht Köln (Tribunal do Trabalho de Colónia) julgou procedente a ação intentada por J.M.P. e que o Landesarbeitsgericht Köln (Tribunal Superior do Trabalho de Colónia, Alemanha) deu provimento ao recurso interposto pela AP Assistenzprofis, J.M.P. interpôs, em seguida, recurso de «Revision» desse acórdão no órgão jurisdicional de reenvio, ou seja, o Bundesarbeitsgericht (Supremo Tribunal do Trabalho Federal, Alemanha).

37

A título preliminar, esse órgão jurisdicional constata, por um lado, que uma situação como a que está em causa no processo principal está abrangida pelo âmbito de aplicação da Diretiva 2000/78, visto dizer respeito aos critérios de seleção que visam o acesso ao emprego, na aceção do artigo 3.o, n.o 1, alínea a), da referida diretiva. Por outro, considera que a recorrente no processo principal sofreu, na sequência da resposta negativa da recorrida no processo principal, uma discriminação direta em razão da idade na aceção do artigo 2.o, n.o 2, alínea a), desta diretiva.

38

O referido órgão jurisdicional precisa que, numa situação como a que está em causa no processo principal, no que respeita ao caso específico da assistência pessoal, em que tanto a recorrente no processo principal como a pessoa portadora de deficiência podem beneficiar de proteção contra a discriminação, o presente reenvio prejudicial procura esclarecer em que medida o direito da recorrente no processo principal a uma proteção eficaz contra a discriminação em razão da idade e o direito da pessoa portadora de deficiência a uma proteção efetiva contra a discriminação em razão da sua deficiência devem ser conciliados à luz da Diretiva 2000/78 que concretiza, no que respeita ao emprego e à atividade profissional, o princípio geral da não discriminação consagrado no artigo 21.o da Carta.

39

A este respeito, o órgão jurisdicional de reenvio precisa, primeiro, que a assistência pessoal se baseia, por força da legislação nacional aplicável, ou seja, o § 8 do SGB IX, lido em conjugação com o § 33 do SGB I, no princípio da autodeterminação, visando assim tornar as pessoas portadoras de deficiência capazes de organizar a sua vida quotidiana da forma mais autónoma e independente possível, tendo nomeadamente em conta a vontade legítima dos beneficiários dos serviços de assistência. Em conformidade com o § 78, n.o 1, do SGB IX, os referidos serviços incluem, nomeadamente, prestações para as tarefas quotidianas gerais, como a gestão doméstica, a organização das relações sociais, o planeamento da vida pessoal, e a participação na vida comunitária e cultural.

40

Segundo, esse órgão jurisdicional salienta que, segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, a Diretiva 2000/78 figura entre os atos da União relativos às questões reguladas pela Convenção da ONU, pelo que esta pode ser invocada para interpretar a referida diretiva (Acórdão de 11 de setembro de 2019, Nobel Plastiques Ibérica, C‑397/18, EU:C:2019:703, n.os 39 e 40 e jurisprudência referida), uma vez que esta Convenção, nomeadamente o seu artigo 19.o, contém requisitos concretos para permitir às pessoas portadoras de deficiência viver de forma independente e com escolhas iguais às demais pessoas.

41

Terceiro, o respeito do referido direito à autonomia e à liberdade de escolha permite garantir a dignidade humana, na aceção do artigo 1.o da Carta e do § 1 da GG, tendo em conta o facto de a assistência pessoal dizer respeito a todos os domínios da vida e que, portanto, a pessoa que presta essa assistência se imiscui inevitável e profundamente na esfera privada e íntima da pessoa que beneficia dessa assistência. Por conseguinte, a vontade da pessoa portadora de deficiência em causa que beneficia das prestações de serviços de assistência pessoal deve ser respeitada, desde que essa vontade seja, no caso concreto, razoável.

42

Quarto, no que respeita às disposições do direito da União que podem justificar uma discriminação direta em razão da idade, em circunstâncias como as que estão em causa no processo principal, o órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se, por um lado, sobre a possibilidade de se poder considerar que um dos motivos mencionados no artigo 2.o, n.o 5, da Diretiva 2000/78, como a proteção dos direitos e das liberdades de terceiros, pode justificar essa discriminação, ao mesmo tempo que alega que, em seu entender, numerosos elementos militam no sentido de que esse direito à livre escolha deve ser garantido às pessoas portadoras de deficiência no âmbito da assistência pessoal.

43

Por outro lado, esse órgão jurisdicional não exclui que essa discriminação possa ser justificada ao abrigo do artigo 4.o, n.o 1, desta diretiva. Assim, questiona‑se, nomeadamente, sobre se a vontade expressa por uma pessoa portadora de deficiência, no âmbito do seu direito à autodeterminação, de que a pessoa que presta assistência pessoal pertença a uma determinada faixa etária, constitui uma «característica» e, além disso, se uma preferência por essa faixa etária pode constituir um «requisito essencial e determinante para o exercício dessa atividade», respetivamente na aceção desta disposição.

44

Além disso, coloca‑se a questão de saber se o facto de um legislador nacional prosseguir o objetivo, através do direito à expressão da vontade legítima e à liberdade de escolha das pessoas portadoras de deficiência aquando do fornecimento das prestações de serviços de assistência pessoal, de reforçar a autonomia pessoal das referidas pessoas na sua vida quotidiana e a sua motivação para participarem na sociedade, pode constituir um «objetivo legítimo», na aceção do artigo 6.o, n.o 1, da Diretiva 2000/78.

45

Por último, o órgão jurisdicional de reenvio questiona‑se sobre se o artigo 7.o desta diretiva, que visa a plena igualdade na vida ativa, é pertinente para justificar uma discriminação em razão da idade numa situação como a que está em causa no processo principal.

46

Nestas circunstâncias, o Bundesarbeitsgericht (Supremo Tribunal do Trabalho Federal) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«Podem os artigos 4.o, n.o 1, 6.o, n.o 1, 7.o e/ou 2.o, n.o 5, da [Diretiva 2000/78], à luz das exigências da [Carta] e do artigo 19.o da [Convenção da ONU], ser interpretados no sentido de que, numa situação como a do processo principal, pode ser justificada uma discriminação direta em razão da idade?»

Quanto à questão prejudicial

47

Com a sua questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 2.o, n.o 5, o artigo 4.o, n.o 1, o artigo 6.o, n.o 1, e/ou o artigo 7.o da Diretiva 2000/78, lidos à luz das disposições da Carta e do artigo 19.o da Convenção da ONU, devem ser interpretados no sentido de que se opõem a que o recrutamento de uma pessoa que presta assistência pessoal esteja sujeito a um requisito de idade, em aplicação de uma legislação nacional que prevê a tomada em consideração da vontade individual das pessoas com direito, em razão da sua deficiência, a prestações de serviços de assistência pessoal.

48

A título preliminar, importa observar, por um lado, que a situação objeto do litígio no processo principal está abrangida pelo âmbito de aplicação da Diretiva 2000/78, uma vez que um processo de recrutamento de uma pessoa que presta assistência pessoal no âmbito da qual é exigido que os candidatos tenham «idades, de preferência, entre os 18 e 30 anos» diz respeito às «condições de acesso ao emprego […], incluindo os critérios de seleção e as condições de contratação», na aceção do artigo 3.o, n.o 1, alínea a), desta diretiva.

49

Por outro lado, afigura‑se que a resposta negativa recebida por J.M.P. por parte da AP Assistenzprofis na sequência da apresentação da sua candidatura ocorreu em razão da sua idade e constitui, portanto, uma «discriminação direta» em razão da idade, na aceção do artigo 2.o, n.o 2, alínea a), da Diretiva 2000/78.

50

Nestas condições, há que verificar se esta diferença de tratamento em razão da idade pode ser justificada à luz da Diretiva 2000/78.

51

No que respeita ao artigo 2.o, n.o 5, desta diretiva, que há que examinar em primeiro lugar, importa sublinhar que, nos termos desta disposição, a referida diretiva não afeta as medidas previstas na legislação nacional que, numa sociedade democrática, sejam necessárias para efeitos de segurança pública, defesa da ordem e prevenção das infrações penais, proteção da saúde e proteção dos direitos e das liberdades de terceiros.

52

Decorre da jurisprudência do Tribunal de Justiça que, ao adotar a referida disposição, o legislador da União pretendeu, em matéria de emprego e de atividade profissional, evitar e arbitrar um conflito entre, por um lado, o princípio da igualdade de tratamento e, por outro, a necessidade de garantir a ordem, a segurança e a saúde públicas, a prevenção das infrações e a proteção dos direitos e liberdades individuais, indispensáveis ao funcionamento de uma sociedade democrática. Este mesmo legislador decidiu assim que, em certos casos enumerados no artigo 2.o, n.o 5, da Diretiva 2000/78, os princípios previstos por esta não se aplicam a medidas que contenham diferenças de tratamento com fundamento num dos motivos referidos no artigo 1.o desta diretiva, desde que, contudo, tais medidas sejam necessárias para a realização dos objetivos acima referidos [Acórdão de 12 de janeiro de 2023, TP (Montador audiovisual para a televisão pública), C‑356/21, EU:C:2023:9, n.o 70 e jurisprudência referida].

53

Na medida em que esse artigo 2.o, n.o 5, institui uma derrogação ao princípio da proibição das discriminações, deve ser interpretado de forma estrita [Acórdão de 12 de janeiro de 2023, TP (Montador audiovisual para a televisão pública), C‑356/21, EU:C:2023:9, n.o 71 e jurisprudência referida].

54

No caso em apreço, há que verificar, primeiro, se a diferença de tratamento em causa no processo principal resulta de uma medida prevista na legislação nacional, em conformidade com o referido artigo 2.o, n.o 5.

55

A este respeito, resulta dos autos submetidos ao Tribunal de Justiça que a legislação nacional em causa no processo principal, ou seja, o § 8, n.o 1, do SGB IX, lido em conjugação com o § 33 do SGB I, prevê que, na tomada de decisão relativa às prestações de serviços de assistência pessoal e na execução destas, que visam favorecer a participação na sociedade da pessoa portadora de deficiência, se respeita a vontade legítima dos beneficiários destas prestações, desde que seja razoável e tendo em conta a situação pessoal, a idade, o sexo, a família, bem como as necessidades religiosas e filosóficas dos referidos beneficiários.

56

Afigura‑se, assim, que esta legislação autoriza, ou mesmo obriga, os prestadores de assistência pessoal, em termos suficientemente precisos, a respeitar, aquando da elaboração da assistência pessoal a prestar às pessoas portadoras de deficiência em causa, a vontade individual destes, incluindo, se for caso disso, a relativa à idade da pessoa chamada a prestar‑lhes essa assistência, e a adotar medidas individuais que aplicam a referida legislação tendo em conta essa vontade, incluindo a de submeter o recrutamento dessa pessoa a um requisito de idade. Nestas circunstâncias, e sem prejuízo de uma eventual verificação que cabe ao órgão jurisdicional de reenvio efetuar, a diferença de tratamento em razão da idade em causa no processo principal resulta de uma medida prevista na legislação nacional, na aceção do artigo 2.o, n.o 5, da Diretiva 2000/78.

57

Segundo, há que examinar se a referida medida prossegue um dos objetivos enunciados no referido artigo 2.o, n.o 5, nomeadamente o da «proteção dos direitos e liberdades de terceiros».

58

A este respeito, como resulta da decisão de reenvio, a legislação em aplicação da qual a mesma medida foi adotada prossegue um objetivo de proteção da autodeterminação das pessoas portadoras de deficiência, garantindo o direito à expressão da vontade e à livre escolha das referidas pessoas na tomada de decisões relativas às prestações de serviços de assistência pessoal e no fornecimento destas, uma vez que estas prestações dizem respeito a todos os domínios da vida e se estendem profundamente pela esfera privada e íntima das pessoas que as recebem. A referida legislação visa, assim, assegurar o direito de as pessoas portadoras de deficiência organizarem as suas condições de vida da forma mais autónoma e independente possível.

59

Ora, como salientou o advogado‑geral no n.o 63 das suas conclusões, este objetivo está abrangido pelo artigo 2.o, n.o 5, da Diretiva 2000/78, na medida em que visa a proteção do direito à autodeterminação das pessoas portadoras de deficiência, ao abrigo do qual estas devem poder escolher como, onde e com quem vivem.

60

Tal direito implica necessariamente a possibilidade de conceber o serviço de assistência pessoal que lhes será prestado, o que inclui o facto de definir os critérios de seleção da pessoa encarregada de prestar esse serviço e de participar ativamente no processo de recrutamento dessa pessoa.

61

A este respeito, importa sublinhar, por um lado, que o direito à expressão da vontade e à livre escolha referido no n.o 58 do presente acórdão concretiza o direito das pessoas portadoras de deficiência a beneficiarem de medidas destinadas a assegurar a sua autonomia, a sua integração social e profissional e a sua participação na vida da comunidade, que faz parte dos direitos reconhecidos pelo direito da União, em conformidade com o artigo 26.o da Carta.

62

Por outro lado, o respeito da autodeterminação das pessoas portadoras de deficiência é também um objetivo consagrado no artigo 19.o da Convenção da ONU, cujas disposições podem ser invocadas para interpretar as da Diretiva 2000/78, incluindo o artigo 2.o, n.o 5, da mesma. Com efeito, esta deve ser objeto, tanto quanto possível, de uma interpretação conforme com esta Convenção (v., neste sentido, Acórdão de 11 de setembro de 2019, Nobel Plastiques Ibérica (C‑397/18, EU:C:2019:703, n.o 40 e jurisprudência referida).

63

Terceiro, importa verificar se uma diferença de tratamento em razão da idade, como a que está em causa no processo principal, resulta de uma medida necessária à proteção dos direitos e das liberdades de terceiros, na aceção do artigo 2.o, n.o 5, desta diretiva e, em especial, da proteção do direito à autodeterminação da pessoa portadora de deficiência em causa na prestação de serviços de assistência pessoal.

64

No caso em apreço, verifica‑se que a indicação da preferência de uma faixa etária de 18 a 30 anos na oferta de emprego em questão tem origem na necessidade individual de A. de beneficiar de assistência pessoal para o seu acompanhamento em todos os domínios da sua vida social quotidiana enquanto estudante com 28 anos, uma vez que essa assistência diz assim respeito à sua esfera privada e íntima à luz das tarefas gerais relativas não só à organização da sua vida quotidiana, incluindo o planeamento de necessidades estritamente pessoais, mas também à gestão da sua vida social e cultural. Resulta dos autos de que dispõe o Tribunal de Justiça que a referida preferência por uma determinada faixa etária era motivada, nomeadamente, pela circunstância de a pessoa que presta a assistência dever poder facilmente integrar‑se no ambiente pessoal, social e universitário de A.

65

Por conseguinte, numa situação como a que está em causa no processo principal, a tomada em consideração da preferência por uma determinada faixa etária expressa pela pessoa portadora de deficiência beneficiária de serviços de assistência pessoal é suscetível de promover o respeito do direito à autodeterminação dessa pessoa na prestação desses serviços de assistência pessoal, na medida em que se afigura razoável esperar que uma pessoa que pertença à mesma faixa etária da pessoa portadora de deficiência se integre mais facilmente no ambiente pessoal, social e universitário desta última.

66

Sem prejuízo das verificações a efetuar pelo órgão jurisdicional de reenvio à luz de todas as circunstâncias do processo principal, afigura‑se, portanto, que uma diferença de tratamento em razão da idade como a que está em causa no processo principal resulta de uma medida necessária à proteção dos direitos e das liberdades de terceiros, na aceção do artigo 2.o, n.o 5, da Diretiva 2000/78.

67

Por conseguinte, uma vez que uma diferença de tratamento em razão da idade pode ser justificada à luz deste artigo 2.o, n.o 5, sob condição de a diferença de tratamento resultar de uma medida necessária à proteção dos direitos e das liberdades de terceiros, na aceção desta disposição, não há que averiguar se pode igualmente ser justificada ao abrigo do artigo 4.o, n.o 1, do artigo 6.o, n.o 1, e/ou do artigo 7.o da Diretiva 2000/78.

68

Tendo em conta todas as considerações precedentes, há que responder à questão submetida que o artigo 2.o, n.o 5, da Diretiva 2000/78, lido à luz do artigo 26.o da Carta e do artigo 19.o da Convenção da ONU, deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a que o recrutamento de uma pessoa que presta assistência pessoal esteja sujeito a um requisito de idade, em aplicação de uma legislação nacional que prevê a tomada em consideração da vontade individual das pessoas com direito, em razão da deficiência de que são portadoras, a prestações de serviços de assistência pessoal, se essa medida for necessária para a proteção dos direitos e das liberdades de terceiros.

Quanto às despesas

69

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Segunda Secção) declara:

 

O artigo 2.o, n.o 5, da Diretiva 2000/78/CE do Conselho, de 27 de novembro de 2000, que estabelece um quadro geral de igualdade de tratamento no emprego e na atividade profissional, lido à luz do artigo 26.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia e do artigo 19.o da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, que foi aprovada em nome da União Europeia pela Decisão 2010/48/CE do Conselho, de 26 de novembro de 2009,

 

deve ser interpretado no sentido de que:

 

não se opõe a que o recrutamento de uma pessoa que presta assistência pessoal esteja sujeito a um requisito de idade, em aplicação de uma legislação nacional que prevê a tomada em consideração da vontade individual das pessoas com direito, em razão da deficiência de que são portadoras, a prestações de serviços de assistência pessoal, se essa medida for necessária para a proteção dos direitos e das liberdades de terceiros.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: alemão.

Top