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Document 62022CJ0390

Acórdão do Tribunal de Justiça (Quinta Secção) de 25 de janeiro de 2024.
Obshtina Pomorie contre «ANHIALO AVTO» OOD.
Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Okrazhen sad - Burgas.
Reenvio prejudicial — Transportes — Regulamento (CE) n.o 1370/2007 — Serviços públicos de transporte ferroviário e rodoviário de passageiros — Contratos de serviço público — Obrigações de serviço público — Compensações por serviço público — Artigo 4.o, n.o 1, alínea b) — Conteúdo obrigatório dos contratos de serviço público — Parâmetros de cálculo da compensação por serviço público — Determinação antecipada, objetiva e transparente dos parâmetros — Inexistência de concurso — Aplicação das regras de cálculo da compensação contidas no anexo do Regulamento (CE) n.o 1370/2007 — Requisitos previstos na legislação nacional para o pagamento da compensação — Determinação do montante da compensação na Lei do Orçamento de Estado para o ano em causa e do pagamento desse montante à autoridade nacional competente — Fixação dos parâmetros de cálculo da compensação através de remissão para regras gerais.
Processo C-390/22.

Court reports – general – 'Information on unpublished decisions' section

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2024:75

 ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção)

25 de janeiro de 2024 ( *1 )

«Reenvio prejudicial — Transportes — Regulamento (CE) n.o 1370/2007 — Serviços públicos de transporte ferroviário e rodoviário de passageiros — Contratos de serviço público — Obrigações de serviço público — Compensações por serviço público — Artigo 4.o, n.o 1, alínea b) — Conteúdo obrigatório dos contratos de serviço público — Parâmetros de cálculo da compensação por serviço público — Determinação antecipada, objetiva e transparente dos parâmetros — Inexistência de concurso — Aplicação das regras de cálculo da compensação contidas no anexo do Regulamento (CE) n.o 1370/2007 — Requisitos previstos na legislação nacional para o pagamento da compensação — Determinação do montante da compensação na Lei do Orçamento de Estado para o ano em causa e do pagamento desse montante à autoridade nacional competente — Fixação dos parâmetros de cálculo da compensação através de remissão para regras gerais»

No processo C‑390/22,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Okrazhen sad — Burgas (Tribunal Regional de Burgas, Bulgária), por Decisão de 7 de junho de 2022, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 14 de junho de 2022, no processo

Obshtina Pomorie

contra

«ANHIALO AVTO» OOD,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção),

composto por: E. Regan (relator), presidente de secção, Z. Csehi, M. Ilešič, I. Jarukaitis e D. Gratsias, juízes,

advogado‑geral: A. Rantos,

secretário: R. Stefanova‑Kamisheva, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 21 de junho de 2023,

vistas as observações apresentadas:

em representação do Obshtina Pomorie, por Y. Boshnakov, advokat,

em representação do Governo Búlgaro, por T. Mitova e L. Zaharieva, na qualidade de agentes,

em representação da Comissão Europeia, por P. Messina, E. Rousseva e F. Tomat, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 5 de outubro de 2023,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação de disposições do Regulamento (CE) n.o 1370/2007 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de outubro de 2007, relativo aos serviços públicos de transporte ferroviário e rodoviário de passageiros e que revoga os Regulamentos (CEE) n.o 1191/69 e (CEE) n.o 1107/70 do Conselho (JO 2007, L 315, p. 1), em especial do seu artigo 4.o, n.o 1, alínea b), i).

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe o Obshtina Pomorie (Município de Pomorie, Bulgária) à «ANHIALO AVTO» OOD (a seguir «Anhialo»), uma sociedade de transportes titular de um contrato de serviço público, a respeito da compensação devida pelo referido município em contrapartida dos custos decorrentes da execução das obrigações de serviço público de transporte de passageiros por autocarro.

Quadro jurídico

Direito da União

3

Nos termos dos considerandos 9, 27 e 30 do Regulamento n.o 1370/2007:

«(9)

[…] A fim de garantir a aplicação dos princípios da transparência, da igualdade de tratamento dos operadores concorrentes e da proporcionalidade, é indispensável, aquando da atribuição de compensações ou de direitos exclusivos, definir num contrato de serviço público celebrado entre a autoridade competente e o operador de serviço público selecionado a natureza das obrigações de serviço público e as contrapartidas concedidas. A forma e a designação desse contrato podem variar em função do direito interno dos Estados‑Membros.

[…]

(27)

A compensação concedida pelas autoridades competentes para cobrir os custos decorrentes da execução das obrigações de serviço público deverá ser calculada de modo a evitar a sobrecompensação. Quando tencionar adjudicar um contrato de serviço público sem concurso, a autoridade competente deverá também respeitar regras pormenorizadas que assegurem a adequação do montante das compensações e que correspondam a uma preocupação de eficácia e qualidade dos serviços.

[…]

(30)

Os contratos de serviço público adjudicados por ajuste direto deverão estar subordinados a maior transparência.»

4

O artigo 1.o do Regulamento n.o 1370/2007, sob a epígrafe «Objetivo e âmbito de aplicação», dispõe, no seu n.o 1:

«O presente regulamento tem por objetivo definir o modo como, no respeito das regras do direito comunitário, as autoridades competentes podem intervir no domínio do transporte público de passageiros para assegurar a prestação de serviços de interesse geral que sejam, designadamente, mais numerosos, mais seguros, de melhor qualidade e mais baratos do que aqueles que seria possível prestar apenas com base nas leis do mercado.

Para este fim, o presente regulamento define as condições em que as autoridades competentes, ao imporem obrigações de serviço público ou ao celebrarem contratos relativos a obrigações de serviço público, compensam os operadores de serviços públicos pelos custos incorridos e/ou concedem direitos exclusivos em contrapartida da execução de obrigações de serviço público.»

5

O artigo 2.o deste regulamento, sob a epígrafe «Definições», prevê:

«Para efeitos do presente regulamento, entende‑se por:

[…]

h)

“Adjudicação por ajuste direto”, a adjudicação de um contrato de serviço público a um determinado operador de serviços públicos sem qualquer processo prévio de concurso;

i)

“Contrato de serviço público”, um ou vários atos juridicamente vinculativos que estabeleçam o acordo entre uma autoridade competente e um operador de serviço público para confiar a este último a gestão e a exploração dos serviços públicos de transporte de passageiros sujeitos às obrigações de serviço público. Nos termos da legislação dos Estados‑Membros, o contrato pode consistir igualmente numa decisão aprovada pela autoridade competente:

sob a forma de um ato individual de tipo legislativo ou regulamentar, ou

que inclua as condições em que a autoridade competente presta ela própria os serviços ou confia a sua prestação a um operador interno;

[…]

l)

“Regra geral”, a medida que é aplicável sem discriminação a todos os serviços de transporte público de passageiros de um mesmo tipo numa determinada zona geográfica da responsabilidade de uma autoridade competente;

[…]»

6

O artigo 3.o do referido regulamento, sob a epígrafe «Contratos de serviço público e regras gerais», enuncia, no seu n.o 1:

«Quando uma autoridade competente decida conceder ao operador da sua escolha um direito exclusivo e/ou uma compensação, qualquer que seja a sua natureza, em contrapartida da execução de obrigações de serviço público, deve fazê‑lo no âmbito de um contrato de serviço público.»

7

O artigo 4.o do Regulamento n.o 1370/2007, sob a epígrafe «Conteúdo obrigatório dos contratos de serviço público e das regras gerais», prevê, no seu n.o 1:

«Os contratos de serviço público e as regras gerais devem:

[…]

b)

Estabelecer, antecipadamente e de modo objetivo e transparente

i)

os parâmetros com base nos quais deve ser calculada a compensação, se for caso disso, e

ii)

a natureza e a extensão dos direitos exclusivos eventualmente concedidos,

por forma a evitar sobrecompensações. No caso de contratos de serviço público adjudicados nos termos dos n.os 2, 4, 5 e 6 do artigo 5.o, esses parâmetros são determinados de modo a que cada compensação não possa, em caso algum, exceder o montante necessário para a cobertura do efeito financeiro líquido sobre os custos e as receitas decorrentes da execução das obrigações de serviço público, tendo em conta as respetivas receitas, conservadas pelo operador de serviço público, e um lucro razoável;

[…]»

8

O artigo 5.o deste regulamento, sob a epígrafe «Adjudicação de contratos de serviço público», dispõe, no seu n.o 5:

«Em caso de rutura ou de risco iminente de rutura dos serviços, a autoridade competente pode tomar uma medida de emergência. Essa medida de emergência assume a forma de uma adjudicação por ajuste direto ou de um acordo formal de prorrogação de um contrato de serviço público, ou ainda de uma imposição de prestar determinadas obrigações de serviço público. […]»

9

O artigo 6.o do referido regulamento, sob a epígrafe «Compensações pelo serviço público», prevê, no seu n.o 1:

«Qualquer compensação ligada a uma regra geral ou a um contrato de serviço público deve obedecer às disposições estabelecidas no artigo 4.o, independentemente das modalidades de adjudicação do contrato. Qualquer compensação, seja qual for a sua natureza, ligada a um contrato de serviço público adjudicado por ajuste direto ao abrigo dos n.o 2, 4, 5 ou 6 do artigo 5.o ou ligada a uma regra geral deve obedecer, além disso, às disposições estabelecidas no anexo.»

10

O ponto 2 do anexo do Regulamento n.o 1370/2007, sob a epígrafe «Regras aplicáveis à compensação nos casos referidos no n.o 1 do artigo 6.o», tem a seguinte redação:

«A compensação não pode exceder um montante que corresponda ao efeito financeiro líquido decorrente da soma das incidências, positivas ou negativas, da execução da obrigação de serviço público sobre os custos e as receitas do operador de serviço público. As incidências devem ser avaliadas comparando a situação em que é executada a obrigação de serviço público com a situação que teria existido se a obrigação não tivesse sido executada. Para calcular as incidências financeiras líquidas, a autoridade competente deve tomar como referencial as seguintes regras:

custos incorridos em relação a uma obrigação de serviço público ou a um conjunto de obrigações de serviço público impostas pela autoridade ou autoridades competentes, incluídas num contrato de serviço público e/ou numa regra geral,

menos as incidências financeiras positivas geradas na rede explorada ao abrigo da obrigação ou obrigações de serviço público em causa,

menos as receitas decorrentes da aplicação do tarifário ou quaisquer outras receitas decorrentes do cumprimento da obrigação ou obrigações de serviço público em causa,

mais um lucro razoável,

igual ao efeito financeiro líquido.»

Direito búlgaro

Lei relativa à Circulação Rodoviária

11

O artigo 4.o das disposições finais da Zakon za avtomobilnite prevozi (Lei relativa à Circulação Rodoviária) (DV n.o 82, de 17 de setembro de 1999), na versão aplicável ao litígio no processo principal, enuncia, nos seus n.os 1 e 3:

«(1)   O Orçamento de Estado da República da Bulgária deve prever anualmente as despesas destinadas à:

1. subvenção de transporte de passageiros em percursos não rentáveis de autocarros nos transportes urbanos, bem como de montanha e noutras zonas, sob proposta do ministro dos Transportes, das Tecnologias da Informação e das Comunicações;

2. compensação por perda de receitas provenientes da aplicação das tarifas de transporte previstas em atos legislativos para determinadas categorias de passageiros.

[…]

(3)   As condições e as modalidades de concessão dos fundos referidos no n.o 1, bem como as condições e modalidades de emissão dos títulos de transporte para o transporte de determinadas categorias de passageiros previstas na legislação, são determinadas por regulamento adotado pelo Conselho de Ministros, sob proposta do ministro dos Transportes, das Tecnologias da Informação e das Comunicações.»

Regulamento n.o 3, de 4 de abril de 2005

12

O Naredba no 3 za usloviata i reda za predostavyane na sredstva za subsidirane na prevoza na patnitsite po nerentabilni avtobusni linii vav vatreshnogradskia transport i transporta v planinski i drugi rayoni (Regulamento n.o 3 sobre as Condições e as Modalidades de Concessão de Fundos para a Subvenção do Transporte de Passageiros em Linhas de Autocarros não Rentáveis nos Transportes Urbanos e de Montanha e outras Zonas) (DV n.o 33, de 15 de abril de 2005), de 4 de abril de 2005, previa, no seu artigo 1.o, n.o 1:

«O presente regulamento fixa as condições e as modalidades de concessão das subvenções previstas no orçamento central para o transporte urbano e interurbano de passageiros nas zonas montanhosas e fronteiriças escassamente povoadas do país.»

Regulamento de 2015

13

O Naredba za usloviata i reda za predostavyane na sredstva za kompensirane na namalenite prihodi ot prilaganeto na tseni za obshtestveni patnicheski prevozi po avtomobilnia transport, predvideni v normativnite aktove za opredeleni kategorii patnitsi, za subsidirane na obshtestveni patnicheski prevozi po nerentabilni avtobusni linii vav vatreshnogradskia transport i transporta v planinski i drugi rayoni i za izdavane na prevozni dokumenti za izvarshvane na prevozite (Regulamento relativo às Condições e às Modalidades de Concessão de Fundos para Compensar a Perda de Receitas devida à Aplicação de Tarifas para o Transporte Público Rodoviário de Passageiros, previstas em Atos Legislativos para determinadas Categorias de Passageiros e para a Subvenção do Transporte Público de Passageiros em Linhas de Autocarro não Rentáveis nos Transportes Urbanos e nos Transportes em Montanha e outras Zonas, e de Emissão de Documentos de Transporte para a Prestação de Serviços de Transporte) (DV n.o 51, de 7 de julho de 2015), de 29 de março de 2015, na versão aplicável ao litígio no processo principal (a seguir «Regulamento de 2015»), dispõe, no seu artigo 1.o, n.os 1 e 2:

«(1)   O presente regulamento define as condições e as modalidades de concessão de fundos previstos no orçamento central para compensar e subvencionar os transportadores que cumprem obrigações de serviço público para o transporte gratuito e a preço reduzido de passageiros e para o transporte urbano e interurbano de passageiros nas zonas montanhosas e outras zonas escassamente povoadas do país.

(2)   Os fundos referidos no n.o 1 constituem uma compensação por serviço público para o transporte público de passageiros na aceção do Regulamento [n.o 1370/2007] e são concedidos sob reserva das condições e modalidades prescritas pelo referido regulamento e pela legislação nacional em vigor.»

14

O artigo 2.o, n.o 1, deste regulamento tem a seguinte redação:

«Os fundos referidos no presente regulamento são concedidos até ao limite do montante determinado pela Lei do Orçamento de Estado para o ano em causa.»

15

Nos termos do artigo 3.o, n.os 1 e 4, do referido regulamento:

«(1)   Os fundos abrangidos pelo presente regulamento são concedidos sob a forma de transferências específicas provenientes do orçamento central através do sistema de pagamentos orçamentais eletrónicos (sistema SEBRA). Para este efeito, são fixados limites para os municípios que respeitaram o processo legal de adjudicação dos serviços públicos de transporte de passageiros nos termos do Regulamento n.o 1370/2007 e das disposições da Lei dos Contratos Públicos ou da Lei das Concessões, sem prejuízo dos princípios da publicidade e da transparência, da concorrência livre e equitativa e da igualdade de tratamento e da não discriminação.

[…]

(4)   Os presidentes dos municípios remuneram os transportadores em função dos serviços de transporte efetivamente prestados.»

16

O artigo 55.o, n.os 1 e 2, do mesmo regulamento enuncia:

«1.   As subvenções para o transporte de passageiros são concedidas às empresas de transporte através dos orçamentos dos municípios, num montante que não exceda a quantia correspondente à incidência financeira líquida do cumprimento da obrigação de serviço público.

2.   A incidência financeira líquida é determinada acrescentando os custos incorridos com a obrigação de serviço público imposta pela autoridade competente, incluída num contrato de serviço público e/ou numa regra geral, menos as incidências financeiras positivas geradas na rede explorada ao abrigo da obrigação de serviço público em causa, menos as receitas decorrentes da aplicação do tarifário ou quaisquer outras receitas decorrentes do cumprimento da obrigação de serviço público em causa, mais um lucro razoável.»

17

O artigo 56.o do Regulamento de 2015 prevê:

«(1)   As subvenções só serão concedidas às empresas de transporte com as quais o município em causa tenha celebrado contratos que cumpram os requisitos do Regulamento n.o 1370/2007.

(2)   Os contratos regulam necessariamente as seguintes condições:

1.

os parâmetros com base nos quais é calculada a subvenção;

2.

a natureza, a extensão e o alcance dos direitos exclusivos conferidos e a duração do contrato;

3.

mecanismos para determinar os custos diretamente relacionados com a prestação de serviços, como os custos de pessoal, a energia, as taxas de utilização da infraestrutura, a manutenção e a reparação de veículos de transporte público, o material circulante e as instalações necessárias à prestação de serviços de transporte de passageiros, bem como a parte dos custos indiretos da prestação de serviços;

4.

os mecanismos de repartição das receitas ligadas às vendas de títulos de transporte, que podem ser conservadas pelo operador de serviço público, transferidas para a autoridade competente ou partilhadas entre ambos.

5.

o montante do lucro razoável;

6.

a obrigação de os presidentes dos municípios e as empresas de transporte procederem a controlos efetivos da regularidade dos passageiros nas linhas de transporte urbanas e interurbanas subvencionadas.

[…]

(4)   Quando as empresas de transporte não cumpram os termos dos contratos, os presidentes dos municípios podem reduzir o montante das subvenções e podem igualmente suspender a sua concessão.»

Litígio no processo principal e questões prejudiciais

18

Por Decisão de 14 de agosto de 2013, o governador da Oblast de Burgas (Província de Burgas, Bulgária) autorizou o presidente do Município de Pomorie a proceder, por um período máximo de seis meses, à adjudicação por ajuste direto de um contrato de serviço público, na aceção do artigo 5.o, n.o 5, do Regulamento n.o 1370/2007, de transporte de passageiros em determinadas linhas de autocarros. A celebração deste contrato tinha por objetivo resolver o problema da interrupção do serviço público de transporte de passageiros nas linhas em causa, devido à cessação dos contratos anteriormente celebrados e à conclusão simultânea de um procedimento de adjudicação de um novo contrato de serviço público.

19

Em 1 de novembro de 2013, com base na referida decisão, o Município de Pomorie, na qualidade de autoridade local competente, e a Anhialo, enquanto operador de serviço público, celebraram um contrato nos termos do qual foi confiada a esta sociedade a exploração do serviço público de transporte de passageiros nas linhas de autocarros em causa (a seguir «contrato em causa»). Nos termos do artigo 2.o deste contrato, este mantinha‑se vigente até à conclusão do procedimento previsto na Lei dos Contratos Públicos. Por outro lado, nos termos do artigo 5.o do referido contrato, a autoridade local competente comprometia‑se a transferir para o operador, nos prazos fixados pelo Ministério das Finanças, os fundos correspondentes, se fosse caso disso, a uma subvenção, em conformidade com a legislação nacional em vigor, e a uma compensação pelas viagens gratuitas e a preço reduzido de determinadas categorias de cidadãos elegíveis, em aplicação desta legislação.

20

Em 15 de janeiro de 2019, o contrato em causa foi rescindido no termo de um procedimento previsto na Lei dos Contratos Públicos. Atendendo a que é facto assente que a Anhialo prestou os serviços de transporte previstos nesse contrato, esta sociedade reclamou ao Município de Pomorie o pagamento das compensações devidas em conformidade com o referido contrato relativamente ao período compreendido entre 1 de janeiro de 2016 e 31 de dezembro de 2018. O Município de Pomorie pagou‑lhe a quantia de 3690 levs búlgaros (BGN) (cerca de 1886 euros), que corresponde ao montante total dos fundos fixados e pagos pelo orçamento central da República da Bulgária a este município a título de subvenções pelos transportes urbanos e interurbanos.

21

Contestando o montante desta quantia, a Anhialo intentou uma ação no Rayonen sad Pomorie (Tribunal de Primeira Instância de Pomorie, Bulgária). Uma peritagem judicial contabilística fixou a incidência financeira líquida, na aceção das disposições do anexo do Regulamento n.o 1370/2007 e do artigo 55.o do Regulamento de 2015, para esta sociedade no período em causa. Esta peritagem demonstrou que a incidência financeira líquida da obrigação de serviço público que recaía sobre a referida sociedade ascendia a cerca de 86000 BGN (cerca de 43800 euros). Neste órgão jurisdicional, a Anhialo pediu o pagamento de 24931,60 BGN (cerca de 12700 euros), que representava parte do montante devido e não pago.

22

Por Sentença de 8 de novembro de 2021, o Rayonen sad Pomorie (Tribunal de Primeira Instância de Pomorie) julgou a ação procedente. Este órgão jurisdicional considerou, nomeadamente, que o objetivo da compensação de serviço público, na aceção do Regulamento n.o 1370/2007, é corrigir o efeito financeiro negativo líquido sofrido pelo operador na prestação do serviço público. Considerou que o Município de Pomorie não pode alegar que a Anhialo não tem direito a uma compensação de serviço público pelo facto do contrato em causa não conter as condições obrigatórias referidas no artigo 56.o, n.o 2, do Regulamento de 2015, uma vez que o referido contrato tinha sido celebrado em 1 de novembro de 2013, ou seja, antes da adoção deste regulamento.

23

O Município de Pomorie interpôs recurso daquela sentença no Okrazhen sad — Burgas (Tribunal Regional de Burgas), que é o órgão jurisdicional de reenvio. Alega que, uma vez que o Regulamento n.o 1370/2007 tem efeito direto desde a sua adoção, a saber, em 23 de outubro de 2007, os requisitos previstos no seu artigo 4.o, n.o 1, estão em vigor desde esta data e que a sua falta no contrato em causa torna o pagamento de uma subvenção totalmente infundado. O Município de Pomorie também conclui do artigo 5.o do contrato em causa que a sua obrigação de transferir subvenções não é incondicional, mas está subordinada à verificação das condições previstas na legislação nacional. Assim, não lhe pode ser atribuída a culpa, na falta de pagamento ao orçamento municipal de uma subvenção proveniente do orçamento central do Estado, pelo facto de nenhuma compensação de serviço público ter sido paga aos transportadores. Por último, o município alega que ele próprio não pode determinar o montante das compensações e das subvenções e apenas pode repartir as quantias que lhe são atribuídas para um fim específico.

24

A Anhialo alega perante o órgão jurisdicional de reenvio que, como resulta da peritagem judicial contabilística, cumpriu todas as exigências previstas no Regulamento n.o 1370/2007 e no Regulamento de 2015. Alega que a objeção de que o Estado é responsável pelo pagamento das subvenções ao município é infundada. Em seu entender, o artigo 3.o, n.o 1, deste regulamento prevê que a responsabilidade pela conformidade dos contratos de transporte público com o Regulamento n.o 1370/2007 incumbe inteiramente aos municípios. Por este motivo, a concessão de subvenções provenientes do orçamento central do Estado depende unicamente do município em causa e do respeito por este pelas exigências legais relativas à adjudicação dos contratos de serviço público. Por conseguinte, o Município de Pomorie, obrigado a assegurar os transportes públicos no seu território, continua a ser devedor de uma compensação integral ao operador de serviço público interessado, independentemente da questão de saber se lhe foi ou não concedida uma subvenção.

25

O órgão jurisdicional de reenvio salienta que o Regulamento de 2015 foi adotado com base na Lei relativa à Circulação Rodoviária, na sua versão aplicável ao litígio no processo principal, nomeadamente no artigo 4.o, n.o 1, das suas disposições finais, e que o artigo 2.o, n.o 1, deste regulamento prevê que os fundos são concedidos até ao montante fixado pela Lei do Orçamento de Estado para o ano em causa. Refere igualmente que o artigo 56.o, n.o 1, do referido regulamento dispõe que só são concedidas subvenções aos operadores de serviço público com os quais o município em causa tenha celebrado contratos que cumpram os requisitos previstos no Regulamento n.o 1370/2007. Ora, a legislação nacional é interpretada pelas autoridades competentes no sentido de que exige, para o pagamento de uma compensação de serviço público, que esta seja prevista por essa lei e paga à autoridade competente. No entanto, o Regulamento n.o 1370/2007, especialmente o seu artigo 6.o, n.o 1, não contém tais requisitos no que respeita ao pagamento de uma compensação por serviço público.

26

Por conseguinte, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se este regulamento permite que um Estado‑Membro preveja requisitos e restrições adicionais em relação ao pagamento de uma compensação por serviço público a uma empresa de transportes em contrapartida pela sua execução de uma obrigação de serviço público.

27

Por outro lado, o contrato em causa não define os parâmetros com base nos quais a compensação por serviço público é calculada, mas remete, a este respeito, para a legislação nacional. Segundo o órgão jurisdicional de reenvio, uma vez que o artigo 4.o, n.o 1, alínea b), i), do Regulamento n.o 1370/2007 prevê que «os contratos de serviço público e as regras gerais» estabelecem esses parâmetros, a utilização da conjunção «e» pode ser interpretada no sentido de que basta que os parâmetros com base nos quais a compensação é calculada sejam fixados em regras gerais, a saber, as adotadas no âmbito do Regulamento de 2015 e, anteriormente, do Regulamento n.o 3, de 4 de abril de 2005. Outra interpretação possível é a de que estes parâmetros devem necessariamente ser estabelecidos não só em regras gerais mas também no contrato de serviço público, na aceção deste regulamento.

28

Neste contexto, o Okrazhen sad — Burgas (Tribunal Regional de Burgas) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

As disposições do Regulamento [n.o 1370/2007] permitem a um Estado‑Membro introduzir, através da legislação nacional ou de regulamentação interna, requisitos e restrições adicionais em relação ao pagamento de compensações a uma empresa de transportes pelo cumprimento de uma obrigação de serviço público que não estejam previstos neste regulamento?

2)

O artigo 4.o, n.o 1, alínea b), i), do Regulamento [n.o 1370/2007] permite o pagamento de uma compensação à empresa de transportes pelo cumprimento de uma obrigação de serviço público quando os parâmetros com base nos quais é calculada a compensação não foram previamente estabelecidos num contrato de serviço público mas em disposições gerais e o efeito financeiro líquido ou o montante da compensação devida foi determinado em conformidade com o procedimento previsto [neste regulamento]?»

Quanto à primeira questão

29

Com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 4.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 1370/2007 deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação de um Estado‑Membro segundo a qual a compensação paga pela autoridade competente a um operador de serviço público no âmbito da execução de um contrato de serviço público só lhe pode ser concedida se os fundos correspondentes a esta compensação tiverem sido previstos na Lei do Orçamento desse Estado‑Membro para o ano em causa e tiverem sido pagos a esta autoridade.

30

Há que recordar que, nos termos do artigo 1.o, n.o 1, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 1370/2007, este tem por objetivo definir o modo como, no respeito das regras do direito da União, as autoridades competentes podem intervir no domínio do transporte público de passageiros para assegurar a prestação de serviços de interesse geral que sejam, designadamente, mais numerosos, mais seguros, de melhor qualidade e mais baratos do que aqueles que seria possível prestar apenas com base nas leis do mercado.

31

Para este efeito, o presente regulamento define, nos termos do artigo 1.o, n.o 1, segundo parágrafo, as condições em que as autoridades competentes, ao imporem obrigações de serviço público ou ao celebrarem contratos relativos a obrigações de serviço público, compensam os operadores de serviços públicos pelos custos incorridos e/ou concedem direitos exclusivos em contrapartida da execução de obrigações de serviço público.

32

Assim, o Regulamento n.o 1370/2007 contém regras especiais que preveem modalidades de intervenção em regimes gerais de contratos públicos, que têm por objetivo estabelecer um quadro jurídico para a compensação e/ou os direitos exclusivos pelos custos decorrentes pela execução das obrigações de serviço público (Acórdão de 21 de dezembro de 2023, DOBELES AUTOBUSU PARKS e o., C‑421/22, EU:C:2023:1028, n.o 35 e jurisprudência referida).

33

Entre as disposições que formam este quadro legal, o artigo 3.o, n.o 1, deste regulamento prevê que, quando uma autoridade competente de um Estado‑Membro decide conceder ao operador da sua escolha um direito exclusivo e/ou uma compensação de serviço público, qualquer que seja a sua natureza, em contrapartida da execução de obrigações de serviço público, deve fazê‑lo no âmbito de um contrato de serviço público, sendo que esta disposição estabelece assim o princípio segundo o qual as obrigações de serviço público e as respetivas compensações devem ser estabelecidas no âmbito desse contrato (Acórdão de 21 de dezembro de 2023, DOBELES AUTOBUSU PARKS e o., C‑421/22, EU:C:2023:1028, n.o 36 e jurisprudência referida).

34

Resulta dos termos explícitos do artigo 6.o, n.o 1, primeira frase, do Regulamento n.o 1370/2007 que uma compensação ligada a tal contrato de serviço público, independentemente das modalidades, deve cumprir os requisitos previstos no artigo 4.o do referido regulamento, que determina o seu conteúdo obrigatório.

35

Além disso, nos termos da segunda frase do referido artigo 6.o, n.o 1, a compensação, quando atribuída sem a realização de concurso, também deve respeitar as disposições pormenorizadas previstas no anexo do Regulamento n.o 1370/2007 relativas ao cálculo da compensação, as quais se destinam, como resulta do seu considerando 27, a assegurar tanto a adequação do montante da compensação como a eficácia e a qualidade do serviço público. É o caso, nomeadamente, de um contrato de serviço público, como no processo principal, adjudicado por ajuste direto, na aceção do artigo 2.o, alínea h), deste regulamento, pela autoridade local competente a um operador de serviço público, como medida de emergência, nos termos do artigo 5.o, n.o 5, do referido regulamento.

36

Ora, por um lado, o artigo 4.o, n.o 1, alínea b), i), do Regulamento n.o 1370/2007 especifica que os contratos de serviço público, independentemente das modalidades da sua celebração, devem estabelecer, antecipadamente e de modo objetivo e transparente, os parâmetros com base nos quais deve ser calculada a compensação, quando prevista.

37

Por outro lado, quando o contrato de serviço público tenha sido celebrado sem a realização de concurso, a segunda frase do artigo 4.o, n.o 1, alínea b), deste regulamento, lida em conjugação com o ponto 2 do seu anexo, estabelece que esses parâmetros devem ser determinados de modo que a compensação não possa exceder um montante correspondente ao efeito financeiro líquido para o operador de serviço público da execução das obrigações de serviço público. Este montante é obtido deduzindo dos custos incorridos pela execução dessas obrigações as incidências financeiras positivas das mesmas e as receitas decorrentes da aplicação do tarifário geradas na execução das obrigações de serviço público e acrescentando o resultado obtido a título de «lucro razoável» a que qualquer operador tem direito.

38

Como resulta dos considerandos 9 e 30 do Regulamento n.o 1370/2007, essas obrigações relativas às contrapartidas concedidas num contrato de serviço público visam garantir o respeito pelos princípios da igualdade de tratamento, da proporcionalidade e da transparência, revestindo este último princípio uma importância tanto mais essencial quando o contrato de serviço público concede uma compensação sem que haja lugar a um concurso.

39

É certo que resulta das disposições do artigo 4.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 1370/2007 que as autoridades competentes, uma vez que lhes incumbe estabelecer os parâmetros de cálculo da compensação devida a um operador de serviço público, gozam necessariamente de uma certa margem de apreciação para conceber um regime de compensação (v., neste sentido, Acórdão de 21 de dezembro de 2023, DOBELES AUTOBUSU PARKS e o., C‑421/22, EU:C:2023:1028, n.o 42), estando, no entanto, estritamente enquadrada pelo segundo parágrafo deste artigo 4.o, n.o 1, alínea b), e pelas regras pormenorizadas que constam do anexo deste regulamento quando, como no processo principal, a compensação é concedida no âmbito de um contrato de serviço público em caso de não realização de concurso.

40

Contudo, não é menos certo que, segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, os Estados‑Membros, quando exercem a margem de apreciação que lhes é conferida por um regulamento, o qual, por força do artigo 288.o, segundo parágrafo, TFUE, é obrigatório em todos os seus elementos e diretamente aplicável em todos os Estados‑Membros, devem utilizar esta margem de apreciação dentro dos limites das disposições desse regulamento, a fim de não prejudicar o seu conteúdo e os seus objetivos (v., neste sentido, Acórdão de 28 de abril de 2022, Meta Platforms Ireland, C‑319/20, EU:C:2022:322, n.os 58 e 60 e jurisprudência referida).

41

Ora, como o advogado‑geral salientou, em substância, nos n.os 43 e 44 das suas conclusões, uma compensação, cujo montante pago a um operador de serviço público no âmbito de um contrato de serviço público depende ele próprio do montante dos fundos determinado anualmente pela Lei do Orçamento do Estado‑Membro em causa e do posterior pagamento desses fundos à autoridade local competente, assenta em parâmetros de cálculo que violam os requisitos resultantes do artigo 4.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 1370/2007, lido em conjugação com o ponto 2 do seu anexo. Com efeito, contrariamente às prescrições destas disposições, esses parâmetros, por um lado, não são estabelecidos antecipadamente, de forma objetiva e transparente, e, por outro, não têm relação com o efeito financeiro líquido, para o operador de transporte público, da execução da obrigação de serviço público.

42

Por conseguinte, há que observar que um regime de compensação como este não permite que o operador de serviço público em causa determine, com a precisão necessária, aquando da celebração do contrato de serviço público, a compensação que tem direito de receber da autoridade competente em contrapartida da execução das obrigações de serviço público que lhe incumbem.

43

Nesta medida, devido à insegurança causada pela falta de transparência do montante da compensação que pode ser paga, este regime pode prejudicar o objetivo prosseguido pelo Regulamento n.o 1370/2007, que consiste, assim como resulta do n.o 30 do presente acórdão, em definir as condições de concessão de uma compensação a fim de garantir, em condições de concorrência equitativas, a prestação de um serviço público de transporte de passageiros simultaneamente eficiente e financeiramente rentável, com vista a alcançar um elevado nível de qualidade desses serviços (Acórdão de 21 de dezembro de 2023, DOBELES AUTOBUSU PARKS e o., C‑421/22, EU:C:2023:1028, n.o 45 e jurisprudência referida).

44

Daqui resulta que este regime excede a margem de apreciação reconhecida aos Estados‑Membros pelo artigo 4.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 1370/2007, para efeitos da determinação dos regimes de compensação pelo serviço público.

45

Consequentemente, há que responder à primeira questão que o artigo 4.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 1370/2007 deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação de um Estado‑Membro segundo a qual a compensação paga pela autoridade competente a um operador de serviço público no âmbito da execução de um contrato de serviço público só lhe pode ser concedida se os fundos correspondentes a esta compensação tiverem sido previstos na Lei do Orçamento deste Estado‑Membro para o ano em causa e tiverem sido pagos a esta autoridade.

Quanto à segunda questão

46

Com a sua segunda questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 4.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 1370/2007 deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação de um Estado‑Membro que permite que seja paga, pela autoridade competente, uma compensação a um operador de serviço público no âmbito da execução de um contrato de serviço público quando os parâmetros com base nos quais esta compensação é calculada não estejam estabelecidos neste contrato, mas foram fixados antecipadamente, de modo objetivo e transparente, em regras gerais que determinam o montante da referida compensação.

47

Conforme jurisprudência constante, na interpretação de uma disposição de direito da União, há que ter em conta não só os seus termos mas também o seu contexto e os objetivos prosseguidos pela legislação de que faz parte [v., neste sentido, Acórdão de 24 de outubro de 2019, Autorità Garante della Concorrenza e del Mercato (Adjudicação por ajuste direto de um contrato de serviço público de transporte), C‑515/18, EU:C:2019:893, n.o 23].

48

No que respeita, em primeiro lugar, aos termos do artigo 4.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 1370/2007, importa salientar que, segundo estes, os contratos de serviço público «e» as regras gerais devem, em conformidade com a alínea i) desta disposição, estabelecer, antecipadamente e de modo objetivo e transparente, os parâmetros com base nos quais deve ser calculada a compensação de serviço público, quando prevista.

49

Resulta claramente destes termos que, entre os atos que permitem determinar o montante da compensação, constam não só os contratos de serviços públicos mas também as regras gerais, definidas no artigo 2.o, alínea l), do Regulamento n.o 1370/2007, como medidas aplicáveis sem discriminação a todos os serviços públicos de transporte de passageiros de um mesmo tipo numa determinada zona geográfica em que uma autoridade competente é responsável.

50

Daqui decorre que o artigo 4.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 1370/2007 não impõe que todos os parâmetros do cálculo da compensação prevista por um contrato de serviço público sejam definidos nesse contrato, mas exige unicamente que estes parâmetros sejam determinados antecipadamente, de modo objetivo e transparente, seja num contrato de serviço público ou em regras gerais.

51

Esta interpretação é corroborada, em segundo lugar, pelo contexto em que se insere esta disposição. Com efeito, o artigo 2.o, alínea i), do Regulamento n.o 1370/2007 prevê que o conceito de «contrato de serviço público» abrange os atos juridicamente vinculativos que estabeleçam o acordo entre uma autoridade competente e um operador de serviço público para confiar a este último a gestão e a exploração dos serviços públicos de transporte de passageiros sujeitos às obrigações de serviço público. Esta disposição também especifica que, segundo o direito dos Estados‑Membros, o contrato de serviço público também pode consistir numa decisão adotada pela autoridade competente, que assume a forma de um ato individual, legislativo ou regulamentar, ou que contém as condições em que esta autoridade presta ela própria os serviços ou confia a prestação destes serviços a um operador interno.

52

Daqui resulta que, como também é confirmado pelo considerando 9 do Regulamento n.o 1370/2007, tendo em conta as diferenças existentes entre os sistemas jurídicos dos Estados‑Membros, há que atender ao conceito de «contrato de serviço público», na aceção deste regulamento, em sentido amplo, no sentido de que não abrange apenas atos de natureza contratual, mas também atos de natureza diferente, nomeadamente legislativa e regulamentar. Daqui resulta que este contrato pode consistir na combinação de um ato jurídico geral que atribui a gestão de um serviço público a um operador e de um ato administrativo que pormenoriza as exigências relativas a este serviço, confirmando assim, tal como o advogado‑geral indicou no n.o 54 das suas conclusões, que os parâmetros de cálculo da compensação por serviço público podem ser determinados por referência a regras gerais, de natureza legislativa ou regulamentar.

53

Em terceiro lugar, no que respeita aos objetivos prosseguidos pelo Regulamento n.o 1370/2007, importa recordar que, como já foi salientado nos n.os 36 e 38 do presente acórdão, o objetivo de transparência reveste uma especial importância no que respeita aos parâmetros de cálculo de uma compensação de serviço público, em especial quando esta não é concedida no âmbito de um concurso.

54

Ora, para alcançar este objetivo, não é necessário que todos os parâmetros de cálculo da compensação estejam incluídos no contrato celebrado entre a autoridade competente e o operador de serviço público. Com efeito, uma vez que as regras gerais relativas a esses parâmetros são, em conformidade com o artigo 4.o, n.o 1, alínea b), i), do Regulamento n.o 1370/2007, estabelecidas antecipadamente, de modo objetivo e transparente e respeitam, além disso, na inexistência de um concurso, as regras pormenorizadas enunciadas no anexo deste regulamento, um operador de serviço público está em condições de determinar, com toda a precisão necessária, o montante da compensação que lhe é devida pela execução das obrigações de serviço público que lhe incumbem.

55

Consequentemente, há que responder à segunda questão que o artigo 4.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 1370/2007 deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a uma legislação de um Estado‑Membro que permite que seja paga, pela autoridade competente, uma compensação a um operador de serviço público no âmbito da execução de um contrato de serviço público quando os parâmetros com base nos quais esta compensação é calculada não estejam estabelecidos nesse contrato, mas foram fixados antecipadamente, de modo objetivo e transparente, em regras gerais que determinam o montante da referida compensação.

Quanto às despesas

56

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Quinta Secção) declara:

 

1)

O artigo 4.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento (CE) n.o 1370/2007 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de outubro de 2007, relativo aos serviços públicos de transporte ferroviário e rodoviário de passageiros e que revoga os Regulamentos (CEE) n.o 1191/69 e (CEE) n.o 1107/70 do Conselho,

deve ser interpretado no sentido de que:

se opõe a uma legislação de um Estado‑Membro segundo a qual a compensação paga pela autoridade competente a um operador de serviço público no âmbito da execução de um contrato de serviço público só lhe pode ser concedida se os fundos correspondentes a esta compensação tiverem sido previstos na Lei do Orçamento deste Estado‑Membro para o ano em causa e tiverem sido pagos a esta autoridade.

 

2)

O artigo 4.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 1370/2007

deve ser interpretado no sentido de que:

não se opõe a uma legislação de um Estado‑Membro que permite que seja paga, pela autoridade competente, uma compensação a um operador de serviço público no âmbito da execução de um contrato de serviço público quando os parâmetros com base nos quais esta compensação é calculada não estejam estabelecidos nesse contrato, mas foram fixados antecipadamente, de modo objetivo e transparente, em regras gerais que determinam o montante da referida compensação.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: búlgaro.

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