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Document 62022CC0305

Conclusões do advogado-geral Richard de la Tour apresentadas em 13 de junho de 2024.


ECLI identifier: ECLI:EU:C:2024:508

Edição provisória

CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

JEAN RICHARD DE LA TOUR

apresentadas em 13 de junho de 2024 (1)

Processo C305/22

C.J.

Processo penal

[pedido de decisão prejudicial apresentado pela Curtea de Apel Bucureşti (Tribunal de Recurso de Bucareste, Roménia)]

«Reenvio prejudicial — Espaço de liberdade, segurança e justiça — Cooperação judiciária em matéria penal — Decisão‑Quadro 2002/584/JAI — Mandado de detenção europeu — Motivo de não execução facultativa do mandado de detenção europeu — Compromisso do Estado‑Membro de execução de executar a pena privativa de liberdade decretada contra a pessoa procurada — Decisão‑Quadro 2008/909/JAI — Reconhecimento mútuo das sentenças em matéria penal para efeitos da execução dessas sentenças noutro Estado‑Membro — Falta de consentimento do Estado‑Membro de emissão — Direito de o Estado‑Membro de emissão executar ele próprio a pena — Obrigação de a autoridade judiciária de execução executar o mandado de detenção europeu»






I.      Introdução

1.        O presente pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 4.°, n.os 5 e 6, e do artigo 8.°, n.° 1, alínea c), da Decisão‑Quadro 2002/584/JAI do Conselho, de 13 de junho de 2002, relativa ao mandado de detenção europeu e aos processos de entrega entre os Estados‑Membros (2), bem como do artigo 4.°, n.° 2, do artigo 22.°, n.° 1, e do artigo 25.° da Decisão‑Quadro 2008/909/JAI do Conselho, de 27 de novembro de 2008, relativa à aplicação do princípio do reconhecimento mútuo às sentenças em matéria penal que imponham penas ou outras medidas privativas de liberdade para efeitos da execução dessas sentenças na União Europeia (3).

2.        Este pedido foi apresentado no âmbito de um processo nacional em que a Curtea de Apel Bucureşti (Tribunal de Recurso de Bucareste, Roménia) tem de se pronunciar sobre a validade de um mandado nacional de execução de uma pena de prisão aplicada a C.J., residente em Itália, bem como sobre a validade de um mandado de detenção europeu emitido a seu respeito. A execução deste mandado de detenção europeu foi recusada pelas autoridades judiciárias italianas com fundamento no motivo de não execução facultativa previsto no artigo 4.°, n.° 6, da Decisão‑Quadro 2002/584 (4). Estas autoridades emitiram simultaneamente uma decisão de reconhecimento da sentença e de execução da condenação penal proferida contra C.J., apesar da oposição formulada pelas autoridades judiciárias romenas a que esta condenação seja executada em Itália.

3.        O presente processo ilustra um problema de articulação entre esta decisão‑quadro e a Decisão‑Quadro 2008/909, que constituem dois instrumentos fundamentais da cooperação judiciária em matéria penal.

4.        Nas presentes conclusões, que, em conformidade com o pedido do Tribunal de Justiça, serão dirigidas às primeira a terceira questões prejudiciais, defenderei que uma autoridade judiciária não pode recusar a execução de um mandado de detenção europeu emitido para efeitos de execução de uma pena privativa de liberdade invocando o motivo de não execução facultativa mencionado no artigo 4.°, n.° 6, da Decisão‑Quadro 2002/584, quando o reconhecimento e execução da sentença condenatória são efetuados em violação do procedimento e das condições previstas na Decisão‑Quadro 2008/909. Nesta situação, o Estado‑Membro de emissão (5) conserva o direito de executar essa pena e incumbe, por conseguinte, à autoridade judiciária de execução executar o mandado de detenção europeu entregando a pessoa procurada a esse Estado‑Membro.

II.    Factos do litígio no processo principal e questões prejudiciais

5.        Por Sentença de 27 de junho de 2017 da Curtea de Apel București (Tribunal de Recurso de Bucareste), alterada e transitada em julgado por força do Acórdão de 10 de novembro de 2020 da Înalta Curte de Casație și Justiție (Tribunal Superior de Cassação e Justiça, Roménia), C.J. foi condenado, por tal sentença transitada em julgado, numa pena de quatro anos e dois meses de prisão, bem como à interdição do exercício, durante três anos, de certos direitos por várias infrações (a seguir «sentença condenatória»).

6.        Em 20 de novembro de 2020, a Curtea de Apel București (Tribunal de Recurso de Bucareste) emitiu um mandado de execução da pena de prisão proferida contra C.J. Em 25 de novembro de 2020, esse órgão jurisdicional emitiu um mandado de detenção europeu contra C.J.

7.        Em 31 de dezembro de 2020, o Ministero della Giustizia (Ministério da Justiça, Itália) informou a Curtea de Apel București (Tribunal de Recurso de Bucareste) da detenção de C.J. e pediu o envio do mandado de detenção europeu em língua italiana. Esse mandado de detenção europeu foi‑lhe transmitido.

8.        A pedido das autoridades judiciárias italianas, a Curtea de Apel București (Tribunal de Recurso de Bucareste) transmitiu‑lhes, em 14 de janeiro de 2021, a sentença condenatória. Nessa ocasião, esse órgão jurisdicional manifestou o seu desacordo com um eventual reconhecimento dessa sentença pelas autoridades judiciárias italianas com vista à sua execução em Itália.

9.        A pedido das autoridades judiciárias italianas, a Curtea de Apel București (Tribunal de Recurso de Bucareste) informou, em 20 de janeiro de 2021, que, em caso de recusa de execução do mandado de detenção europeu em aplicação do artigo 4.°, n.° 6, da Decisão‑Quadro 2002/584, não daria o seu consentimento ao reconhecimento a título incidental da referida sentença e à execução da pena pela República Italiana, e que solicitaria posteriormente esse reconhecimento e essa execução com base na Decisão‑Quadro 2008/909.

10.      Em seguida, as autoridades romenas enviaram às autoridades judiciárias italianas um pedido de informações sobre a decisão de execução do mandado de detenção europeu, em conformidade com o artigo 22.° da Decisão‑Quadro 2002/584.

11.      Por Sentença de 6 de maio de 2021, a Corte d’appello di Roma (Tribunal de Recurso de Roma, Itália) recusou a entrega de C.J., reconheceu a sentença condenatória e ordenou a sua execução em Itália. Esse órgão jurisdicional considerou que, uma vez que C.J. tinha residência legal e efetiva em Itália, não havia motivos para exigir que a pena fosse executada na Roménia, uma vez que a execução da referida pena em Itália era mais de acordo com o objetivo de facilitar a sua reinserção social. O referido órgão jurisdicional considerou que, ao deduzir os períodos de prisão já cumpridos, a pena residual total era de 3 anos, 6 meses e 21 dias.

12.      Em 20 de maio de 2021, essa sentença da Corte d’appello di Roma (Tribunal de Recurso de Roma) foi comunicada à Curtea de Apel București (Tribunal de Recurso de Bucareste). Em seguida, as autoridades romenas receberam um certificado datado de 11 de junho de 2021 do Serviço de Execução das Penas da Procuradoria de Roma, do qual resulta que C.J. está em situação de prisão domiciliária, em conformidade com o direito italiano. Resulta igualmente desse certificado, no que respeita ao estado da execução, que se trata de um mandado de execução com suspensão simultânea, sob a forma de prisão domiciliária, e que a pena de prisão residual a cumprir é de três anos e onze meses, sendo a data do início do cumprimento da pena o dia 29 de dezembro de 2020 e a data do termo da pena o dia 28 de novembro de 2024 (6).

13.      Por ofício enviado em 28 de junho de 2021, as autoridades judiciárias romenas reiteraram a sua posição indicada no n.° 9 das presentes conclusões e esclareceram que, enquanto não lhes fosse comunicado o início da execução da pena privativa de liberdade pela prisão de C.J., consideravam que conservam o direito de executar a sentença condenatória de 27 de junho de 2017, por força do artigo 22.°, n.° 1, da Decisão‑Quadro 2008/909. Estas autoridades acrescentaram que o mandado nacional de execução da pena de prisão e o pedido de busca internacional não foram anulados e continuam em vigor.

14.      Em 15 de outubro de 2021, o serviço encarregado da execução das penas da Segunda Secção Penal da Curtea de Apel București (Tribunal de Recurso de Bucareste) deduziu oposição à execução da sentença condenatória no órgão jurisdicional de reenvio.

15.      Esse órgão jurisdicional esclarece que tem de se pronunciar sobre a validade do mandado nacional de execução da pena de prisão e do mandado de detenção europeu, tendo em conta a existência de uma divergência de interpretação entre as autoridades judiciárias romenas e italianas no que respeita, em especial, à articulação entre a Decisão‑Quadro 2002/584 e a Decisão‑Quadro 2008/909. Isto significa que o referido órgão jurisdicional tem de decidir se esse mandado nacional, emitido pelas autoridades romenas, deve ser anulado se se considerar que a decisão condenatória foi executada pelas autoridades italianas e que está em fase de execução.

16.      Assim, colocam‑se as questões de saber se o reconhecimento de uma sentença, no âmbito de um processo de execução de um mandado de detenção europeu que deu origem a uma recusa por parte da autoridade judiciária de execução ao abrigo do artigo 4.°, n.° 6, da Decisão‑Quadro 2002/584, exige o consentimento do Estado‑Membro de emissão nos termos do artigo 4.°, n.° 2, e do artigo 25.° da Decisão‑Quadro 2008/909, bem como se a transmissão da sentença condenatória pelo Estado‑Membro de emissão ao Estado‑Membro de execução pode valer como consentimento. Coloca‑se também a questão de saber se tal procedimento, que seria conduzido em violação do artigo 4.°, n.° 2, e do artigo 25.° desta decisão‑quadro, pode produzir efeitos jurídicos em relação à condenação no que respeita à sua execução no território da Roménia. Por outro lado, há que determinar se, enquanto não tiver sido comunicado o início da execução da pena privativa de liberdade por prisão do condenado, o Estado‑Membro de emissão conserva a integralidade do direito de executar as sentenças proferidas no seu território, por força do artigo 22.°, n.° 1, da referida decisão‑quadro.

17.      Nestas circunstâncias, a Curtea de Apel București (Tribunal de Recurso de Bucareste) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)      Devem as disposições do artigo 25.° da Decisão‑Quadro [2008/909] ser interpretadas no sentido de que a autoridade judiciária de execução de um mandado [de detenção] europeu, quando pretenda aplicar o artigo 4.°, n.° 6, da Decisão Quadro [2002/584] para efeitos do reconhecimento da decisão condenatória, é obrigada a pedir a [transmissão] da sentença e da certidão emitidas nos termos da Decisão‑Quadro [2008/909], bem como a obter o consentimento do Estado onde teve lugar a condenação, na aceção do artigo 4.°, n.° 2, da Decisão‑Quadro [2008/909]?

2)      Devem as disposições do artigo 4.°, n.° 6, da Decisão‑Quadro [2002/584], conjugado com o artigo 25.° e com o artigo 4.°, n.° 2, da Decisão‑Quadro [2008/909], ser interpretadas no sentido de que a recusa de executar um mandado de detenção europeu emitido para efeitos da execução de uma pena privativa de liberdade e o reconhecimento da decisão condenatória, sem a sua efetiva execução através da prisão da pessoa condenada em consequência de um indulto e da suspensão da execução da pena, em conformidade com a legislação do Estado de execução, e sem a obtenção do consentimento do Estado onde teve lugar a condenação no âmbito do procedimento de reconhecimento, [implicam] a perda do direito do Estado onde teve lugar a condenação de prosseguir a execução da pena em conformidade com o disposto no artigo 22.°, n.° 1, da Decisão‑Quadro [2008/909]?

3)      Deve o artigo 8.°, n.° 1, alínea c), da Decisão‑Quadro [2002/584] ser interpretado no sentido de que uma decisão de condenação numa pena privativa de liberdade com base na qual foi emitido um mandado de detenção europeu cuja execução foi recusada ao abrigo do artigo 4.°, n.° 6, [da mesma decisão‑quadro], com reconhecimento da sentença mas sem a sua efetiva execução através da prisão da pessoa condenada em consequência de um indulto e da suspensão da execução da pena, em conformidade com a legislação do Estado de execução, e sem a obtenção do consentimento do Estado onde teve lugar a condenação no âmbito do procedimento de reconhecimento, perde o seu caráter executório?

4)      Devem as disposições do artigo 4.°, n.° 5, da Decisão‑Quadro [2002/584] ser interpretadas no sentido de que uma sentença que determina a recusa de execução de um mandado de detenção europeu emitido para efeitos da execução de uma pena privativa de liberdade e o reconhecimento da decisão condenatória nos termos do artigo 4.°, n.° 6, da Decisão‑Quadro [2002/584], mas sem a sua efetiva execução através da prisão da pessoa condenada em consequência de um indulto e da suspensão da execução da pena, em conformidade com a legislação do Estado de execução (Estado‑Membro da [União]), e sem a obtenção do consentimento do Estado onde teve lugar a condenação no âmbito do procedimento de reconhecimento, constitui um “[julgamento definitivo] pelos mesmos factos por um país terceiro”?

5)      Devem as disposições do artigo 4.°, n.° 5, da Decisão‑Quadro [2002/584] ser interpretadas no sentido de que uma sentença que determina a recusa de execução de um mandado de detenção europeu emitido para efeitos da execução de uma pena privativa de liberdade e o reconhecimento da decisão condenatória nos termos do artigo 4.°, n.° 6, da Decisão‑Quadro [2002/584], com suspensão da execução da pena em conformidade com a legislação do Estado de execução, constitui uma “pena […] atualmente em cumprimento” se a vigilância do condenado ainda não tiver começado?»

18.      C.J., os Governos Romeno, Checo e Neerlandês, bem como a Comissão Europeia, apresentaram observações escritas. Estas partes, com exceção de C.J., participaram, como o Governo Francês, na audiência realizada em 13 de março de 2024, durante a qual responderam, nomeadamente, às perguntas para resposta oral colocadas pelo Tribunal de Justiça.

III. Análise

A.      Observações preliminares

19.      Nas suas observações escritas, C.J. referiu que o Tribunale di sorveglianza di Roma (Tribunal de Execução das Penas de Roma, Itália) tinha, em 7 de fevereiro de 2023, ordenado a execução do remanescente da pena sob a forma de prisão domiciliária. O Tribunal de Justiça dirigiu então um pedido de informações ao órgão jurisdicional de reenvio com vista a esclarecer se essa informação tinha incidência nas suas questões prejudiciais.

20.      Este órgão jurisdicional respondeu, em 22 de novembro de 2023, que não podia confirmar a referida informação, visto que as autoridades judiciárias italianas não tinham transmitido nenhum documento respeitante a C.J. desde 2021. Além disso, o referido órgão jurisdicional precisou que, se a informação relativa aos desenvolvimentos do processo italiano fosse confirmada, continuaria a ser útil uma resposta às primeira a quarta questões. Quando muito, só a quinta questão poderia já não ser considerada relevante.

21.      Tendo em conta estes elementos, considero que, nos desenvolvimentos que se seguem, nos devemos limitar aos factos tal como são expostos na decisão de reenvio (7), a saber, que a situação relativa à execução em Itália da pena privativa de liberdade proferida contra C.J. é a de um mandado nacional de execução dessa pena com suspensão simultânea, sob a forma de prisão domiciliária, na pendência de uma decisão das autoridades judiciárias italianas sobre uma medida alternativa à prisão.

B.      Quanto às primeira a terceira questões prejudiciais

22.      Com a primeira a terceira questões, que proponho examinar em conjunto, o órgão jurisdicional de reenvio pede, em substância, ao Tribunal de Justiça que se pronuncie sobre se o artigo 4.°, n.° 6, e o artigo 8.°, n.° 1, alínea c), da Decisão‑Quadro 2002/584, bem como o artigo 4.°, n.os 2 e 5, o artigo 8.°, n.° 1, o artigo 22.°, n.° 1, e o artigo 25.° da Decisão‑Quadro 2008/909 devem ser interpretados no sentido de que uma autoridade judiciária pode validamente recusar executar um mandado de detenção europeu emitido para efeitos de execução de uma pena privativa de liberdade invocando o motivo de não execução facultativa mencionado na primeira destas disposições, quando o reconhecimento e a execução da sentença condenatória são efetuados em violação do procedimento e das condições previstas na Decisão‑Quadro 2008/909. Além disso, esse órgão jurisdicional pretende saber se, nesta situação, o Estado‑Membro de emissão conserva o direito de executar essa pena e se incumbe à autoridade judiciária de execução executar o mandado de detenção europeu entregando a pessoa procurada a esse Estado‑Membro.

23.      Na resposta a estas questões, defrontam‑se duas teses radicalmente opostas. Enquanto o Governo Neerlandês sustenta que a aplicação do motivo de não execução facultativa referido no artigo 4.°, n.° 6, da Decisão‑Quadro 2002/584 pode ser efetuada fora do quadro fixado pela Decisão‑Quadro 2008/909, os outros participantes no presente processo defendem a posição contrária. É esta última posição que me convence.

24.      A este respeito, há que recordar que, ao instituir um sistema simplificado e eficaz de entrega das pessoas condenadas ou suspeitas de terem infringido a lei penal, a Decisão‑Quadro 2002/584 se destina a facilitar e a acelerar a cooperação judiciária com vista a contribuir para a realização do objetivo, fixado à União, de se tornar um espaço de liberdade, segurança e justiça, baseando‑se no elevado grau de confiança que deve existir entre os Estados‑Membros (8).

25.      No domínio regido pela decisão‑quadro, o princípio do reconhecimento mútuo, que, como resulta designadamente do considerando 6 desta, constitui a «pedra angular» da cooperação judiciária em matéria penal, encontra a sua expressão no artigo 1.°, n.° 2, desta decisão‑quadro, que consagra a regra por força da qual os Estados‑Membros são obrigados a executar qualquer mandado de detenção europeu com base no princípio do reconhecimento mútuo e em conformidade com as disposições da mesma decisão‑quadro (9).

26.      Daqui resulta, por um lado, que as autoridades judiciárias de execução só podem recusar executar um mandado de detenção europeu por motivos decorrentes da Decisão‑Quadro 2002/584, conforme interpretada pelo Tribunal de Justiça. Por outro, ao passo que a execução do mandado de detenção europeu constitui o princípio, a recusa de execução é concebida como uma exceção, que deve ser objeto de interpretação restrita (10).

27.      A decisão‑quadro enuncia, no seu artigo 3.°, motivos de não execução obrigatória do mandado de detenção europeu e, nos seus artigos 4.° e 4.°‑A, os motivos de não execução facultativa deste (11).

28.      Assim, embora o princípio do reconhecimento mútuo esteja subjacente à economia da Decisão‑Quadro 2002/584, esse reconhecimento não implica, porém, uma obrigação absoluta de execução do mandado de detenção emitido (12). Com efeito, esta decisão‑quadro permite, em situações específicas, que as autoridades competentes dos Estados‑Membros decidam que uma pena aplicada no Estado‑Membro de emissão deva ser executada no território do Estado‑Membro de execução (13).

29.      No que respeita aos motivos de não execução facultativa do mandado de detenção europeu enumerados no artigo 4.° da Decisão‑Quadro 2002/584, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que, no âmbito da transposição desta decisão‑quadro para o direito interno, os Estados‑Membros dispõem de uma certa margem de apreciação. Assim, estes podem livremente transpor ou não esses motivos para o direito interno. Podem igualmente optar por limitar as situações nas quais a autoridade judiciária de execução pode recusar executar um mandado de detenção europeu, facilitando assim a entrega das pessoas procuradas, em conformidade com o princípio do reconhecimento mútuo consagrado no artigo 1.°, n.° 2, da referida decisão‑quadro (14).

30.      Entre os motivos de não execução facultativa do mandado de detenção europeu, recordo que o artigo 4.°, n.° 6, da Decisão‑Quadro 2002/584 enuncia que a autoridade judiciária de execução pode recusar executar um mandado de detenção europeu se este tiver sido emitido para efeito de execução de uma pena ou de uma medida de segurança privativas de liberdade, quando a pessoa procurada se encontrar no Estado‑Membro de execução, for um nacional deste ou aí residir, e esse Estado se comprometa a executar essa pena ou medida de segurança em conformidade com o seu direito interno.

31.      Assim, a aplicação do motivo de não execução facultativa do mandado de detenção europeu previsto na referida disposição está sujeita à reunião de duas condições, a saber, por um lado, que a pessoa procurada se encontre no Estado‑Membro de execução, seja sua nacional ou aí resida e, por outro, que esse Estado se comprometa a executar, em conformidade com o seu direito interno, a pena ou a medida de segurança para a qual o mandado de detenção europeu foi emitido (15).

32.      No que respeita à primeira destas condições, o Tribunal de Justiça já declarou que uma pessoa procurada «reside» no Estado‑Membro de execução sempre que tenha fixado a sua residência real neste último e aí se «encontra» quando, na sequência de uma permanência estável com uma certa duração nesse Estado‑Membro, criou vínculos que o ligam a esse Estado de modo semelhante aos que resultam de uma residência (16).

33.      Quanto à segunda das referidas condições, decorre da redação do artigo 4.°, n.° 6, da Decisão‑Quadro 2002/584 que qualquer recusa em executar o mandado de detenção europeu pressupõe um verdadeiro compromisso do Estado‑Membro de execução de executar a pena privativa de liberdade decretada contra a pessoa procurada (17). Por conseguinte, não se pode considerar que a mera circunstância de este Estado se declarar «disposto» a assegurar a execução dessa pena seja por si só suscetível de justificar tal recusa. Resulta daqui que qualquer recusa de execução de um mandado de detenção europeu deve ser precedida da verificação, pela autoridade judiciária de execução, da possibilidade de executar realmente a pena de acordo com o seu direito interno (18).

34.      Assim, há que garantir que a faculdade de a autoridade judiciária de execução recusar a execução do mandado de detenção europeu só é exercida na condição de assegurar a execução efetiva, no Estado‑Membro de execução, da pena decretada contra a pessoa procurada e, assim, conduzir a um resultado consistente com a finalidade prosseguida pela Decisão‑Quadro 2002/584 (19).

35.      Quando a autoridade judiciária de execução constata que as duas condições recordadas estão reunidas, deve ainda apreciar se existe um interesse legítimo que justifica que a pena aplicada no Estado‑Membro de emissão seja executada no território do Estado‑Membro de execução. Esta apreciação permite a essa autoridade ter em conta o objetivo prosseguido pelo artigo 4.°, n.° 6, da Decisão‑Quadro 2002/584, que, segundo jurisprudência assente, consiste em aumentar as oportunidades de reinserção social da pessoa procurada no termo da pena a que esta última foi condenada (20). Assim, a fim de decidir se, atendendo ao objetivo visado de reinserção social, há ou não que recusar executar o mandado de detenção europeu, a autoridade judiciária de execução deve dispor da necessária margem de apreciação (21).

36.      O exame, pela autoridade judiciária de execução, da questão de saber se existe um interesse legítimo que justifica que a pena ou a medida de segurança aplicada no Estado‑Membro de emissão seja executada no território do Estado‑Membro de execução deve ser efetuado através de uma apreciação global de todos os elementos concretos que caracterizam a situação da pessoa procurada, suscetíveis de indicar se entre essa pessoa e o Estado‑Membro de execução existem laços que permitem concluir que a referida pessoa está suficientemente integrada nesse Estado e que, portanto, a execução, no Estado‑Membro de execução, da pena ou da medida de segurança privativas de liberdade pronunciada contra ela no Estado‑Membro de emissão contribuirá para a realização do objetivo de reinserção social prosseguido por este artigo 4.°, n.° 6 (22).

37.      Neste contexto, o Tribunal de Justiça precisou que há que tomar em consideração a Decisão‑Quadro 2008/909. Em especial, o considerando 9 desta decisão‑quadro fornece uma lista exemplificativa de elementos suscetíveis de permitir a uma autoridade judiciária obter a certeza de que a execução da condenação pelo Estado‑Membro de execução contribuirá para a realização do objetivo que consiste em facilitar a reinserção social da pessoa condenada. Entre esses elementos figuram, em substância, o vínculo da pessoa ao Estado‑Membro de execução, bem como a circunstância de esse Estado‑Membro constituir o centro da sua vida familiar e dos seus interesses, tendo em conta, designadamente, os seus laços familiares, linguísticos, culturais, sociais ou ainda económicos com o referido Estado (23).

38.      Existe, assim, uma interação entre a Decisão‑Quadro 2002/584 e a Decisão‑Quadro 2008/909. O Tribunal de Justiça sublinhou a existência dessa interação ao afirmar que, dado que o objetivo prosseguido pelo artigo 4.°, n.° 6, da Decisão‑Quadro 2002/584 é idêntico ao mencionado nesse considerando 9 e que é prosseguido pelo artigo 25.° da Decisão‑Quadro 2008/909, o qual se refere ao motivo de não execução facultativa previsto neste artigo 4.°, n.° 6, os referidos elementos são igualmente pertinentes no âmbito da apreciação global que a autoridade judiciária de execução tem de efetuar quando aplica esse motivo (24).

39.      No entanto, a interação entre a Decisão‑Quadro 2002/584 e a Decisão‑Quadro 2008/909 não se limita à apreciação relativa à existência de um interesse legítimo que justifica que a pena ou a medida de segurança aplicada no Estado‑Membro de emissão seja executada no território do Estado‑Membro de execução. Com efeito, é de forma muito mais geral que o artigo 25.° da Decisão‑Quadro 2008/909 prevê a sua aplicação à execução de condenações quando um Estado‑Membro decide aplicar o motivo de não execução facultativa previsto no artigo 4.°, n.° 6, da Decisão‑Quadro 2002/584.

40.      Assim, nos termos do artigo 25.° da Decisão‑Quadro 2008/909, «[s]em prejuízo da Decisão‑Quadro [2002/584], o disposto na presente decisão‑quadro deve aplicar‑se, mutatis mutandis, na medida em que seja compatível com as disposições dessa mesma decisão‑quadro, à execução de condenações, se um Estado‑Membro tiver decidido executar a condenação nos casos abrangidos pelo n.° 6 do artigo 4.° daquela decisão‑quadro ou se, nos termos do disposto no n.° 3 do artigo 5.° da mesma decisão‑quadro, tiver estabelecido como condição que a pessoa seja devolvida ao Estado‑Membro em questão para nele cumprir a pena, de forma a evitar a impunidade da pessoa em causa.»

41.      Na minha opinião, resulta do artigo 25.° da Decisão‑Quadro 2008/909 que a aplicação, pela autoridade judiciária de execução, do motivo de não execução facultativa previsto no artigo 4.°, n.° 6, da Decisão‑Quadro 2002/584 pressupõe que sejam respeitados o procedimento e as condições estabelecidas pela Decisão‑Quadro 2008/909 com vista ao reconhecimento e à execução de uma sentença em matéria penal num Estado‑Membro diferente do Estado‑Membro de condenação (25). Vários elementos militam neste sentido.

42.      Primeiro, importa citar o considerando 12 da Decisão‑Quadro 2008/909 que indica que esta «deverá também aplicar‑se mutatis mutandis à execução de condenações nos casos abrangidos pelo n.° 6 do artigo 4.° e pelo n.° 3 do artigo 5.° da Decisão‑Quadro [2002/584]. O que significa, designadamente, que, sem prejuízo dessa decisão‑quadro, o Estado de execução pode verificar se existem ou não motivos de recusa do reconhecimento e da execução, tal como previsto no artigo 9.° da presente decisão‑quadro, incluindo a verificação da dupla incriminação caso o Estado de execução tenha apresentado uma declaração nos termos do n.° 4 do artigo 7.°, como condição para reconhecer e executar a sentença, a fim de considerar se há que entregar a pessoa condenada ou executar a condenação nos casos previstos no n.° 6 do artigo 4.° da Decisão‑Quadro [2002/584]». Embora o legislador da União se centre, a título de exemplo, na verificação, pelo Estado‑Membro de execução, da existência de motivos de não reconhecimento e de não execução previstos no artigo 9.° da Decisão‑Quadro 2008/909, isso não exclui, na minha opinião, a verificação das outras condições.

43.      A ligação entre os procedimentos previstos na Decisão‑Quadro 2002/584 e na Decisão‑Quadro 2008/909 na aplicação do motivo de não execução facultativa referido no artigo 4.°, n.° 6, da primeira destas decisões‑quadro é igualmente confirmada pela parte f) do formulário‑tipo de certidão, que figura no anexo I da Decisão‑Quadro 2008/909. Esta certidão é transmitida juntamente com a sentença, para efeitos do reconhecimento e da execução da mesma, e deve fazer referência a esse motivo quando este for invocado. Daqui resulta que a recusa de execução de um mandado de detenção europeu pelo referido motivo exige a transmissão, pelo Estado‑Membro de condenação, da sentença e da certidão, em conformidade com as regras estabelecidas por esta decisão‑quadro.

44.      Segundo, a condição segundo a qual qualquer recusa de execução de um mandado de detenção europeu, pelo motivo enunciado no artigo 4.°, n.° 6, da Decisão‑Quadro 2002/584, deve ser precedida da verificação, pela autoridade de execução, da possibilidade de executar realmente a pena privativa de liberdade de acordo com o seu direito interno parece‑me abranger as disposições do direito do Estado‑Membro de execução que transpõem a Decisão‑Quadro 2008/909 (26). Por conseguinte, em conformidade com o disposto no artigo 25.° da presente decisão‑quadro e a fim de assegurar a possibilidade de executar realmente tal pena, a autoridade judiciária de execução deve respeitar tal procedimento e as condições previstas na referida decisão‑quadro para o reconhecimento e execução de uma decisão proferida no Estado‑Membro de condenação.

45.      Terceiro, como o Governo Romeno indicou com razão na audiência, nada permite pensar que o legislador da União tenha pretendido prever dois regimes jurídicos distintos no que respeita ao reconhecimento e à execução de sentenças em matéria penal, em função da existência ou não de um mandado de detenção europeu.

46.      Quarto, resulta do Acórdão de 11 de março de 2020, SF (Mandado de detenção europeu — Garantia de devolução ao Estado de execução) (27), que, quando uma autoridade judiciária de execução pretende proceder à entrega de uma pessoa em aplicação de um mandado de detenção europeu para efeitos de procedimento penal, subordinando essa entrega, em conformidade com o previsto no artigo 5.°, n.° 3, da Decisão‑Quadro 2002/584, à condição de que a pessoa seja devolvida ao Estado‑Membro de execução para nele cumprir a pena proferida contra ela no Estado‑Membro de emissão, a execução desta pena no Estado‑Membro de execução é regulada pela Decisão‑Quadro 2008/909 (28). Por analogia, o mesmo se aplica, na minha opinião, ao motivo de não execução facultativa previsto no artigo 4.°, n.° 6, da Decisão‑Quadro 2002/584.

47.      Decorre destes elementos que, para efeitos da aplicação do motivo de não execução facultativa de um mandado de detenção europeu previsto no artigo 4.°, n.° 6, da Decisão‑Quadro 2002/584, o reconhecimento e a execução da condenação proferida contra a pessoa procurada devem ser efetuados em conformidade com o procedimento e as condições previstos na Decisão‑Quadro 2008/909.

48.      Isto leva‑me a considerar que não pode existir execução efetiva no Estado‑Membro de execução da pena proferida contra a pessoa procurada quando esse procedimento e essas condições não são respeitados por esse Estado‑Membro. Assim, para poder comprometer‑se a executar a pena privativa de liberdade pronunciada contra a pessoa procurada, verificando que dispõe da possibilidade de executar realmente essa pena em conformidade com o seu direito interno (29), e evitar assim qualquer risco de impunidade dessa pessoa, como exige o artigo 4.°, n.° 6, da Decisão‑Quadro 2002/584, o Estado‑Membro de execução deve estar habilitado a retomar a execução da referida pena respeitando as regras previstas na Decisão‑Quadro 2008/909.

49.      Importa agora especificar quais são essas regras.

50.      A este respeito, recordo que, à semelhança da Decisão‑Quadro 2002/584, a Decisão‑Quadro 2008/909 concretiza, no domínio penal, os princípios da confiança e do reconhecimento mútuos. Esta decisão‑quadro aprofunda a cooperação judiciária no que respeita ao reconhecimento e execução de sentenças em matéria penal quando cidadãos da União tiverem sido condenados a penas de prisão ou outras medidas privativas de liberdade noutro Estado‑Membro, para facilitar a sua reinserção social (30).

51.      Nos termos do seu artigo 3.°, n.° 1, a referida decisão‑quadro tem por objetivo estabelecer as regras segundo as quais um Estado‑Membro, tendo em vista facilitar a reinserção social da pessoa condenada, reconhece uma sentença e executa a condenação imposta por um órgão jurisdicional de outro Estado‑Membro.

52.      Com esta finalidade, o artigo 8.° da Decisão‑Quadro 2008/909 prevê que a autoridade competente do Estado‑Membro de execução tem, em princípio, de deferir o pedido, destinado ao reconhecimento de uma sentença e à execução de uma condenação a uma pena ou a uma medida privativa de liberdade aplicadas noutro Estado‑Membro, que lhe foi transmitida em conformidade com os artigos 4.° e 5.° desta decisão‑quadro. Só pode, em princípio, recusar dar seguimento a esse pedido por motivos de não reconhecimento e de não execução taxativamente enumerados no artigo 9.° da referida decisão‑quadro (31).

53.      Além disso, o artigo 8.°, n.os 2 a 4, da Decisão‑Quadro 2008/909 prevê condições estritas para a adaptação, por parte da autoridade competente do Estado‑Membro de execução, da condenação proferida no Estado‑Membro de emissão, que constituem as únicas exceções à obrigação de princípio que impende sobre esta autoridade, por força do artigo 8.°, n.° 1, desta decisão‑quadro, de reconhecer a sentença que lhe foi comunicada e tomar imediatamente todas as medidas necessárias para a execução da condenação cuja duração e natureza correspondem às previstas na sentença proferida no Estado‑Membro de emissão (32).

54.      O artigo 4.°, n.° 1, da Decisão‑Quadro 2008/909 prevê a possibilidade de o Estado‑Membro de condenação, que normalmente inicia o processo tendente ao reconhecimento e à execução noutro Estado‑Membro de uma sentença em matéria penal proferida no seu território, transmitir a esse outro Estado‑Membro essa sentença acompanhada da certidão cujo formulário‑tipo se reproduz no anexo I desta decisão‑quadro.

55.      Nos termos do artigo 4.°, n.° 2, da referida decisão‑quadro, «[a] transmissão da sentença e da certidão pode efetuar‑se quando a autoridade competente do Estado de emissão tiver verificado, se for caso disso, após consultas entre as autoridades competentes dos Estados de emissão e de execução, que a execução da condenação pelo Estado de execução contribuirá para atingir o objetivo de facilitar a reinserção social da pessoa condenada».

56.      Por outro lado, o artigo 4.°, n.° 5, da Decisão‑Quadro 2008/909 dispõe que «[o] Estado de execução pode, por iniciativa própria, solicitar que o Estado de emissão lhe envie a sentença, acompanhada da certidão. [...] Os pedidos feitos ao abrigo da presente disposição não implicam que o Estado de emissão seja obrigado a transmitir a sentença acompanhada da certidão».

57.      O artigo 5.° desta decisão‑quadro descreve, por sua vez, o procedimento de transmissão da sentença e da certidão.

58.      Deduzo destas disposições, por um lado, que a transmissão, pelo Estado‑Membro de condenação, da sentença e da certidão prevista na Decisão‑Quadro 2008/909 é necessária com vista ao reconhecimento dessa sentença e à execução da condenação, constituindo esta transmissão uma forma de expressão do consentimento do Estado‑Membro de condenação quanto à assunção da execução da pena pelo Estado‑Membro de execução. O reconhecimento da sentença e a execução da condenação são efetuados com base nas informações constantes da certidão. Esta certidão pode, aliás, ser revogada pelo Estado‑Membro de condenação, nas condições previstas no artigo 13.° desta decisão‑quadro (33), nomeadamente se a adaptação prevista da pena não lhe convier.

59.      Por outro lado, o Estado‑Membro de condenação não é obrigado a efetuar essa transmissão (34). Se o fizer, significa que consente que a condenação em causa seja executada no Estado‑Membro de execução. Daqui resulta que, na falta de transmissão da sentença acompanhada da certidão prevista nesta decisão‑quadro, o Estado‑Membro de execução não está habilitado a mandar executar no seu território uma pena proferida no Estado‑Membro de condenação, uma vez que este último não deu o seu consentimento. Não pode ser de outro modo no âmbito da aplicação do motivo de não execução facultativa previsto no artigo 4.°, n.° 6, da Decisão‑Quadro 2002/584.

60.      Por conseguinte, a assunção da execução da pena pelo Estado‑Membro de execução só pode ter lugar no quadro estabelecido pela Decisão‑Quadro 2008/909, que exige uma cooperação estreita e ativa com o Estado‑Membro de condenação (35) e, em especial, o acordo desse Estado‑Membro para a execução da pena no Estado‑Membro de execução. A transmissão da sentença pelo Estado‑Membro de condenação ao Estado‑Membro de execução, no âmbito do procedimento relativo à execução do mandado de detenção europeu, não preenche esta condição quando, como no caso em apreço, essa sentença não for acompanhada da certidão prevista nesta decisão‑quadro e, além disso, o primeiro Estado‑Membro manifestar sem ambiguidade a sua oposição a que a pena proferida seja executada no segundo Estado‑Membro.

61.      A aplicação do procedimento previsto na Decisão‑Quadro 2008/909 é, assim, suscetível de estabelecer a confiança mútua entre as autoridades competentes do Estado‑Membro de emissão e do Estado‑Membro de execução, através de consultas prévias, que são a expressão do princípio da cooperação leal. Se o Estado‑Membro de condenação recusar a transferência da execução da pena, o Estado‑Membro de execução não se pode apropriar unilateralmente da competência para executar essa pena e não pode invocar o motivo de não execução facultativa, enunciado no artigo 4.°, n.° 6, da Decisão‑Quadro 2002/584.

62.      Contrariamente ao que sustentou o Governo Neerlandês no âmbito do presente processo, considero que a necessidade de obter o consentimento do Estado‑Membro de condenação não é suscetível de prejudicar o efeito útil do motivo de não execução facultativa previsto no artigo 4.°, n.° 6, da Decisão‑Quadro 2002/584. Com efeito, com esta exigência, a recusa de execução prevista nesta disposição é apenas condicionada e não deve ser considerada inaplicável. Nesta fase, não se pode presumir que o Estado‑Membro de condenação recusará a transmissão da sentença acompanhada da certidão. Com efeito, este Estado‑Membro pode, à semelhança do Estado‑Membro de execução, estar convencido de que a execução da condenação no território deste último contribuirá para alcançar o objetivo que consiste em facilitar a reinserção social da pessoa condenada.

63.      Por outro lado, é certo que o Tribunal de Justiça deduziu do artigo 25.° da Decisão‑Quadro 2008/909 que nenhuma das suas disposições pode afetar o alcance ou as modalidades de aplicação do motivo de não execução facultativa estabelecido no artigo 4.°, n.° 6, da Decisão‑Quadro 2002/584 (36). Contudo, tal não significa que as condições para o reconhecimento e execução de sentenças em matéria penal não sejam aplicáveis quando este motivo de não execução é invocado, mas sim que estas condições só são aplicáveis quando compatíveis com as disposições desta decisão‑quadro (37). O legislador da União demonstrou assim a sua vontade de não prejudicar o objetivo da referida decisão‑quadro, a saber, a entrega de pessoas que são visadas num mandado de detenção europeu.

64.      Ora, não deteto nenhuma incompatibilidade com as disposições da Decisão‑Quadro 2002/584 na exigência de a aplicação do motivo de não execução facultativa enunciado no seu artigo 4.°, n.° 6, estar sujeita ao consentimento do Estado‑Membro de condenação. Pelo contrário, tal condição, por constituir uma limitação à possibilidade de uma autoridade judiciária de execução recusar executar um mandado de detenção europeu, contribui para reforçar o sistema de entrega instituído pela decisão‑quadro a favor de um espaço de liberdade, segurança e justiça (38). Em particular, a aplicação deste motivo de não execução continua a estar sujeito à exigência de uma pena privativa de liberdade proferida contra a pessoa procurada poder ser executada efetivamente nesse Estado‑Membro (39).

65.      Além disso, é certo que o Tribunal de Justiça observou que a articulação prevista pelo legislador da União entre a Decisão‑Quadro 2002/584 e a Decisão‑Quadro 2008/909 deve contribuir para alcançar o objetivo que consiste em facilitar a reinserção social da pessoa em causa e que tal reinserção é no interesse não apenas da pessoa em causa mas também da União Europeia em geral (40). Contudo, o Tribunal de Justiça já declarou igualmente que, embora o motivo de não execução facultativa enunciado no artigo 4.°, n.° 6, da Decisão‑Quadro 2002/584 tenha designadamente por objetivo permitir dar especial relevância à possibilidade de aumentar as oportunidades de reinserção social da pessoa procurada no termo da pena a que foi condenada, tal objetivo, por mais importante que seja, não pode excluir que os Estados‑Membros, ao darem execução a esta decisão‑quadro, limitem, no sentido indicado pela regra essencial enunciada no artigo 1.°, n.° 2, desta, as situações em que deveria ser possível recusar a entrega de uma pessoa abrangida pelo âmbito de aplicação do referido artigo 4.°, n.° 6 (41).

66.      Decorre do que precede que o objetivo que consiste em aumentar as oportunidades de reinserção social da pessoa procurada após o cumprimento da pena a que esta última foi condenada não tem caráter absoluto e não pode prevalecer sobre o que visa criar um sistema eficaz de entrega entre os Estados‑Membros.

67.      Além disso, como o Governo Francês salientou com justeza na audiência, por força do artigo 4.° da Decisão‑Quadro 2008/909, tanto as autoridades competentes do Estado‑Membro de emissão como as do Estado‑Membro de execução devem estar convencidas de que o procedimento de reconhecimento mútuo responde, na situação em causa, ao objetivo de favorecer a reinserção social da pessoa condenada. Esta exigência de consenso contradiz assim diretamente a ideia de que o artigo 4.°, n.° 6, da Decisão‑Quadro 2002/584 permite deixar ao Estado‑Membro de execução determinar sozinho se a execução da pena no seu território é justificada. O Estado‑Membro de emissão deve também considerar que a execução da pena no território do Estado‑Membro de execução facilitaria a reinserção social da pessoa condenada e que esse objetivo ultrapassa o objetivo de que essa pena seja executada no Estado‑Membro de emissão. Decidir de outro modo levaria a criar, em contradição com o previsto no artigo 25.° da Decisão‑Quadro 2008/909, um duplo regime de reconhecimento mútuo das decisões de condenação em matéria penal. Enquanto, fora do contexto de um mandado de detenção europeu, os dois Estados‑Membros teriam de estar convencidos de que o objetivo de favorecer a reinserção social é alcançado, no âmbito da aplicação de um mandado de detenção europeu apenas o Estado‑Membro de execução poderia proceder a essa avaliação. Ora, como referi anteriormente, não penso que o legislador da União tenha pretendido criar esse duplo regime.

68.      Considero igualmente que o objetivo de facilitar as oportunidades de reinserção social da pessoa condenada não pode fazer desaparecer os interesses legítimos que o Estado‑Membro no qual foi proferida uma pena pode ter em que esta última seja executada no seu território. Com efeito, tendo em conta as diferentes funções da pena na sociedade, as considerações de política penal próprias de cada Estado‑Membro podem levar o Estado‑Membro de condenação a desejar que, apesar de considerações relacionadas com a reinserção social da pessoa procurada a tal se poderem opor, a pena proferida seja executada no seu território (42). O exemplo das condenações em matéria de terrorismo pode ser citado a este respeito.

69.      Considero que, quando um Estado‑Membro opta por emitir um mandado de detenção europeu para efeitos de execução de uma pena privativa de liberdade, é porque pretende que a pessoa procurada lhe seja entregue para que execute essa pena no seu território. Se esse Estado‑Membro previsse, primeiramente, a possibilidade de essa pena ser executada noutro Estado‑Membro, teria aplicado o mecanismo de reconhecimento e de execução das sentenças em matéria penal previsto na Decisão‑Quadro 2008/909.

70.      Nessa situação de pedido de reconhecimento de uma sentença e de execução de uma condenação penal impostos no Estado‑Membro de emissão, o verdadeiro objeto desse procedimento não é que a pessoa em causa seja entregue às autoridades deste último Estado‑Membro, mas que permaneça no Estado‑Membro de execução para aí cumprir a sua pena (43).

71.      Ora, na hipótese de o Estado‑Membro de condenação privilegiar a emissão de um mandado de detenção europeu em vez de aplicar o mecanismo de transferência previsto na Decisão‑Quadro 2008/909, o princípio do reconhecimento mútuo produz consequências de outra natureza. Com efeito, este princípio implica que a autoridade judiciária de execução é obrigada a executar o mandado de detenção europeu que lhe é submetido.

72.      A recolha do consentimento do Estado‑Membro de condenação permite respeitar a livre escolha que este deve ter entre os dois instrumentos de cooperação judiciária em matéria penal. Como já expliquei, não existe nenhuma obrigação de este Estado‑Membro emitir a certidão prevista na Decisão‑Quadro 2008/909. Se o referido Estado‑Membro tiver feito a opção soberana de privilegiar o mandado de detenção europeu, essa escolha deve ser respeitada. Assim, não se pode presumir que, em caso de recusa de execução desse mandado, o mesmo Estado‑Membro esteja disposto a renunciar a que a pena seja executada no seu território. Bem pelo contrário, a emissão de um mandado de detenção europeu demonstra o seu desejo de que a pena seja executada no seu território.

73.      A posição do Governo Neerlandês, segundo a qual a aplicação do artigo 4.°, n.° 6, da Decisão‑Quadro 2002/584 equivale ao reconhecimento da sentença condenatória, o que torna inútil a obtenção do consentimento do Estado‑Membro de condenação, conduz ao seguinte paradoxo: equivale a considerar que, quando uma autoridade judiciária emite um mandado de detenção europeu para efeitos de execução de uma pena, isso implica que aceita que essa pena possa, sendo caso disso, ser executada noutro Estado‑Membro, renunciando à sua própria competência para executar a referida pena. Ora, o mandado de detenção europeu visa, antes de mais, que a pessoa procurada seja entregue à autoridade judiciária que emite esse mandado. Por outras palavras, a emissão de um mandado de detenção europeu não tem por objetivo transferir a competência de execução de uma pena para outro Estado‑Membro.

74.      Ao pretender conservar a sua competência de execução, o Estado‑Membro de emissão não viola o princípio da confiança mútua. Com efeito, o Estado‑Membro de execução é, em princípio, obrigado a dar seguimento ao pedido de cooperação que constitui a emissão de um mandado de detenção europeu. Como o Governo Francês alegou com justeza na audiência, em tal configuração, este princípio não pode servir de fundamento ao reconhecimento e à execução de uma decisão judicial por outro Estado‑Membro, quando estas não tenham sido solicitadas nem desejadas.

75.      Uma interpretação contrária teria como consequência permitir ao Estado‑Membro de execução adquirir a competência de executar a condenação, mesmo que o Estado‑Membro no qual esta última foi proferida não tenha renunciado a exercer essa competência, como demonstra o facto de um mandado de detenção europeu para efeitos de execução dessa condenação ter sido emitido. Tal seria contrário ao princípio da confiança mútua que implica, antes de mais, neste tipo de situação, que o Estado‑Membro de execução execute o mandado de detenção europeu. Como a Comissão referiu na audiência, enquanto exceção ao princípio da entrega e tendo em conta o caráter facultativo do motivo de não execução nele previsto, o artigo 4.°, n.° 6, da Decisão‑Quadro 2002/584 não institui um direito à transferência da pessoa condenada, mas apenas uma possibilidade. Esta possibilidade só pode ser aplicada no respeito por certas condições.

76.      Assim, não é possível subtrair‑se ao quadro fixado pela Decisão‑Quadro 2008/909, uma vez que, independentemente das circunstâncias em que o reconhecimento de uma sentença condenatória em matéria penal é considerado, apenas o respeito pelas regras fixadas por esta decisão‑quadro permite alcançar um justo equilíbrio que preserve os direitos do Estado‑Membro de condenação.

77.      No âmbito do presente processo, é pacífico que o procedimento e as condições previstas na Decisão‑Quadro 2008/909 com vista ao reconhecimento e à execução da sentença de que C.J. foi objeto não foram respeitados. Com efeito, as autoridades judiciárias italianas recusaram executar o mandado de detenção europeu emitido contra C.J., reconhecendo simultaneamente a sentença condenatória e ordenando a sua execução em Itália, quando as autoridades judiciárias romenas tinham dado a conhecer a sua oposição a esse reconhecimento e a essa execução fora do território da Roménia.

78.      As autoridades judiciárias italianas não agiram em conformidade com o princípio do reconhecimento mútuo, como concretizado pela Decisão‑Quadro 2008/909, e não podem, portanto, invocar este princípio contra o Estado‑Membro de emissão. Este último conserva então o direito de executar a decisão em causa no seu território. Embora o artigo 22.°, n.° 1, da Decisão‑Quadro 2008/909 preveja que esse Estado‑Membro já não pode executar a condenação uma vez iniciada a sua execução no território do Estado‑Membro de execução, é ainda necessário que essa execução tenha ocorrido em conformidade com as regras previstas nesta decisão‑quadro. Não é esse o caso quando o reconhecimento de uma sentença em matéria penal foi efetuado em violação do procedimento e das condições previstas na referida decisão‑quadro e, em especial, sem que a sentença acompanhada da certidão prevista na mesma decisão‑quadro tenha sido comunicada pelo Estado‑Membro de emissão. Admitir que, em tal situação, um início da execução da pena no Estado‑Membro de execução possa retirar ao Estado‑Membro de emissão a sua competência para executar essa pena permitiria contornar as regras fixadas pela Decisão‑Quadro 2008/909.

79.      Acrescento que, mesmo que a transmissão da sentença acompanhada da certidão prevista nesta decisão‑quadro tivesse ocorrido, podemos interrogar‑nos sobre a questão de saber se um mandado nacional de execução da pena com suspensão simultânea, sob a forma de obrigação de permanência na habitação, na pendência de uma decisão das autoridades judiciárias italianas sobre uma medida alternativa à prisão, pode ser considerado um princípio de execução dessa pena, na aceção do artigo 22.°, n.° 1, da referida decisão‑quadro. No entanto, não me parece necessário tratar este aspeto no âmbito do presente processo, uma vez que, em todo o caso, o procedimento e as condições previstas na mesma decisão‑quadro não foram respeitados (44).

80.      Além disso, uma vez que a decisão da autoridade judiciária de execução de recusar a execução do mandado de detenção europeu emitido contra C.J. não está em conformidade com o direito da União, a autoridade judiciária de emissão pode prosseguir o procedimento de entrega dessa pessoa mantendo esse mandado ou emitindo um novo, de forma que favoreça a realização do objetivo de luta contra a impunidade prosseguido pela Decisão‑Quadro 2002/584 (45). Por outras palavras, não se pode considerar que o mandado de detenção europeu em causa já não tem objeto e esgotou os seus efeitos. Além disso, a sentença proferida no Estado‑Membro de emissão, na qual se baseia esse mandado, e à qual se refere o artigo 8.°, n.° 1, alínea c), da Decisão‑Quadro 2002/584, conserva o seu caráter executório. Como o Governo Romeno referiu na audiência, uma vez feita a entrega, caberá ao Estado‑Membro de emissão ter em conta, se for caso disso, o artigo 26.°, n.° 1, desta decisão‑quadro. Com efeito, como o Tribunal de Justiça já declarou, esta disposição, uma vez que impõe que se tenha em conta o período durante o qual a pessoa condenada esteve presa no Estado‑Membro de execução, garante que essa pessoa não terá de cumprir, em última instância, um período de prisão cuja duração total tanto no Estado‑Membro de execução como no Estado‑Membro de emissão exceda a duração da pena privativa de liberdade que lhe foi aplicada no Estado‑Membro de emissão (46).

IV.    Conclusão

81.      Tendo em conta as considerações que precedem, proponho ao Tribunal de Justiça que responda às primeira a terceira questões prejudiciais submetidas pela Curtea de Apel București (Tribunal de Recurso de Bucareste, Roménia) do seguinte modo:

O artigo 4.°, n.° 6, e o artigo 8.°, n.° 1, alínea c), da Decisão‑Quadro 2002/584/JAI do Conselho, de 13 de junho de 2002, relativa ao mandado de detenção europeu e aos processos de entrega entre os Estados‑Membros, bem como o artigo 4.°, n.os 2 e 5, o artigo 8.°, n.° 1, o artigo 22.°, n.° 1, e o artigo 25.° da Decisão‑Quadro 2008/909/JAI do Conselho, de 27 de novembro de 2008, relativa à aplicação do princípio do reconhecimento mútuo às sentenças em matéria penal que imponham penas ou outras medidas privativas de liberdade para efeitos da execução dessas sentenças na União Europeia,

devem ser interpretados no sentido de que:

uma autoridade judiciária não pode recusar a execução de um mandado de detenção europeu emitido para efeitos de execução de uma pena privativa de liberdade invocando o motivo de não execução facultativa referido na primeira destas disposições, quando o reconhecimento e a execução da sentença condenatória são efetuados em violação do procedimento e das condições previstas na Decisão‑Quadro 2008/909. Nesta situação, o Estado‑Membro de emissão conserva o direito de executar essa pena e incumbe à autoridade judiciária de execução executar o mandado de detenção europeu entregando a pessoa procurada a esse Estado‑Membro.


1      Língua original: francês.


2      JO 2002, L 190, p. 1.


3      JO 2008, L 327, p. 27.


4      Esta disposição prevê que a autoridade judiciária de execução pode recusar a execução de um mandado de detenção europeu «se o mandado de detenção europeu tiver sido emitido para efeitos de cumprimento de uma pena ou medida de segurança privativas de liberdade, quando a pessoa procurada se encontrar no Estado‑Membro de execução, for sua nacional ou sua residente e este Estado se comprometa a executar essa pena ou medida de segurança nos termos do seu direito nacional».


5      Nas presentes conclusões, o Estado‑Membro de emissão poderá igualmente ser designado como Estado‑Membro de condenação.


6      Este certificado foi completado por outro certificado, comunicado às autoridades judiciárias romenas em 14 de julho de 2021, que inclui a seguinte menção: «No que respeita à situação de prisão domiciliária, aguarda‑se que o Tribunal de Execução das Penas profira uma decisão sobre a medida alternativa».


7      Segundo jurisprudência constante, o juiz nacional tem a responsabilidade de definir o quadro regulamentar e factual do reenvio prejudicial: v., nomeadamente, Acórdão de 30 de novembro de 2023, Ministero dell’Istruzione e INPS (C‑270/22, EU:C:2023:933, n.° 34 e jurisprudência referida).


8      V., nomeadamente, Acórdão de 6 de junho de 2023, O. G. (Mandado de detenção europeu contra um nacional de um Estado terceiro) (C‑700/21, a seguir «Acórdão O. G.», EU:C:2023:444, n.° 31 e jurisprudência referida).


9      V., nomeadamente, Acórdão O.G. (n.° 32 e jurisprudência referida).


10      V., nomeadamente, Acórdão O.G. (n.° 33 e jurisprudência referida).


11      V., nomeadamente, Acórdão O.G. (n.° 34 e jurisprudência referida).


12      V., nomeadamente, Acórdão de 11 de março de 2020, SF (Mandado de detenção europeu — Garantia de devolução ao Estado de execução) (C‑314/18, EU:C:2020:191, n.° 40 e jurisprudência referida).


13      V., nomeadamente, Acórdão de 11 de março de 2020, SF (Mandado de detenção europeu—Garantia de devolução ao Estado de execução) (C‑314/18, EU:C:2020:191, n.° 41 e jurisprudência referida).


14      V., nomeadamente, Acórdão O.G. (n.° 35 e jurisprudência referida).


15      V., nomeadamente, Acórdão O.G. (n.° 46 e jurisprudência referida).


16      V., nomeadamente, Acórdão O.G. (n.° 47 e jurisprudência referida).


17      V., nomeadamente, Acórdão O.G. (n.° 48 e jurisprudência referida).


18      V., nomeadamente, Acórdão de 24 de junho de 2019, Popławski (C‑573/17, EU:C:2019:530, n.° 88 e jurisprudência referida).


19      V., nomeadamente, Acórdão de 24 de junho de 2019, Popławski (C‑573/17, EU:C:2019:530, n.° 92 e jurisprudência referida). Como salientou o advogado‑geral Y. Bot nas suas conclusões no processo Poplawski (C‑579/15, EU:C:2017:116), «a aplicação do princípio do reconhecimento mútuo e a necessidade de eliminar qualquer risco de impunidade implicam que se considere que, se a assunção da execução da pena pelo Estado‑Membro de execução não for possível, por qualquer razão, o mandado de detenção europeu deve ser executado» (n.° 57).


20      V., nomeadamente, Acórdão O.G. (n.° 49 e jurisprudência referida).


21      V. Acórdão O.G. (n.° 53).


22      V., nomeadamente, Acórdão O.G. (n.os 60 e 61 e jurisprudência referida).


23      V., nomeadamente, Acórdão O.G. (n.° 62 e jurisprudência referida).


24      V. Acórdão O.G. (n.° 63).


25      V., igualmente, a este respeito, Comunicação da Comissão — Manual sobre a emissão e a execução de um mandado de detenção europeu (JO C, C/2023/1270), pontos 2.5.2 e 5.5.2, de onde resulta que, na hipótese prevista no artigo 4.°, n.° 6, da Decisão‑Quadro 2002/584, a Decisão‑Quadro 2008/909 deve ser aplicada para permitir a transferência da condenação para o Estado‑Membro onde a pena é executada.


26      V., neste sentido, Comunicação da Comissão — Manual sobre a transferência de pessoas condenadas a penas privativas da liberdade (JO 2019, C 403, p. 2), que indica, no seu ponto 11.1, que, «de acordo com o artigo 25.° e o considerando 12 da decisão‑quadro [2008/909], nos casos em que o artigo 4.°, n.° 6, e o artigo 5.°, n.° 3, da Decisão‑Quadro 2002/584 são aplicáveis, a legislação nacional que aplica a decisãoquadro [2008/909] é aplicável, mutatis mutandis e na medida em que for compatível com a Decisão‑Quadro 2002/584, à execução da condenação». Neste mesmo número, é igualmente precisado que «a ligação entre a decisão‑quadro [2008/909] e a Decisão‑Quadro 2002/584 é estabelecida no artigo 25.° e no considerando 12 desta última» e que «qualquer recusa de execução de um [mandado de detenção europeu] nos termos do artigo 4.°, n.° 6, da Decisão‑Quadro 2002/584, deve ser precedida da verificação, pela autoridade judiciária de execução, da possibilidade de executar realmente a pena de acordo com o seu direito interno que aplica a decisãoquadro [2008/909]» (o sublinhado é meu).


27      C‑314/18, EU:C:2020:191.


28      V. Acórdão de 11 de março de 2020, SF (Mandado de detenção europeu — Garantia de devolução ao Estado de execução) (C‑314/18, EU:C:2020:191, n.os 49 e seguintes).


29      V., nomeadamente, Acórdão de 24 de junho de 2019, Popławski (C‑573/17, EU:C:2019:530, n.° 88 e jurisprudência referida).


30      V. Acórdão de 9 de novembro de 2023, Staatsanwaltschaft Aachen (C‑819/21, EU:C:2023:841, n.° 19).


31      V. Acórdão de 9 de novembro de 2023, Staatsanwaltschaft Aachen (C‑819/21, EU:C:2023:841, n.° 20).


32      V., nomeadamente, Acórdão de 15 de abril de 2021, AV (Sentença global) (C‑221/19, EU:C:2021:278, n.° 35 e jurisprudência referida).


33      Nos termos desta disposição, «[e]nquanto a execução da condenação não tiver sido iniciada no Estado de execução, o Estado de emissão pode retirar a certidão junto desse Estado, devendo apresentar uma justificação. Uma vez retirada a certidão, o Estado de execução deixa de poder executar a condenação».


34      V., a este respeito, manual citado na nota 26 das presentes conclusões, que indica, no seu 1.1, que a Decisão‑Quadro 2008/909 não prevê «nenhuma obrigação de o Estado de emissão transmitir uma sentença para efeitos do seu reconhecimento e execução noutro Estado‑Membro» e que «[o] Estado de emissão tem a última palavra no que respeita à transferência, se a adaptação da condenação e as suas regras de execução forem satisfeitas». Além disso, no ponto 3.1 desse manual, precisa‑se que, nos dois casos previstos no artigo 4.°, n.° 5, da Decisão‑Quadro 2008/909, «o Estado de emissão não é obrigado a aceder ao pedido de transmissão da sentença. Tal falta de obrigação decorre logicamente do facto de o Estado de emissão ser o único interveniente que proferiu, no seguimento de uma infração penal, uma sentença com competência soberana para o fazer. Assim, o Estado de emissão conserva a margem de apreciação de que dispõe para avaliar os pedidos tanto do Estado de execução da pessoa condenada, ou dos dois».


35      Em especial, o Estado‑Membro de execução é obrigado a fornecer ao Estado‑Membro de condenação um certo número de informações, como as mencionadas nos artigos 12.° e 21.° da Decisão‑Quadro 2008/909.


36      V. Acórdão de 13 de dezembro de 2018, Sut (C‑514/17, EU:C:2018:1016, n.° 48).


37      V. Acórdão de 13 de dezembro de 2018, Sut (C‑514/17, EU:C:2018:1016, n.° 48).


38      V., também, Acórdão de 13 de dezembro de 2018, Sut (C‑514/17, EU:C:2018:1016, n.os 43 e 44 e jurisprudência referida).


39      V., igualmente, Acórdão de 13 de dezembro de 2018, Sut (C‑514/17, EU:C:2018:1016, n.° 49).


40      V. Acórdão de 11 de março de 2020, SF (Mandado de detenção europeu — Garantia de devolução ao Estado de execução) (C‑314/18, EU:C:2020:191, n.° 51 e jurisprudência referida).


41      V., nomeadamente, Acórdão de 13 de dezembro de 2018, Sut (C‑514/17, EU:C:2018:1016, n.° 46 e jurisprudência referida). Como salientou o advogado‑geral P. Pikamäe a propósito do artigo 5.°, n.° 3, da Decisão‑Quadro 2002/584 nas conclusões que apresentou no processo SF (Mandado de detenção europeu — Garantia de devolução ao Estado de execução) (C‑314/18, EU:C:2019:427), «[o] objetivo de facilitar a reinserção social da pessoa condenada não reveste caráter absoluto e pode ser ponderado juntamente com outras exigências» (n.° 61).


42      V., a este respeito, Manual referido na nota 26 das presentes conclusões, que, no seu n.° 3.1, refere que, «[p]or exemplo, o Estado de emissão pode pretender não transferir a pessoa condenada se estiver previsto um período de prisão menos longo no Estado de execução, tendo em conta as disposições em matéria de libertação antecipada e condicional nesse Estado. Os interesses das vítimas também podem ser tidos em conta quando se decide qual o melhor local para o infrator cumprir a pena. Um Estado‑Membro pode igualmente mostrar‑se relutante em transferir uma pessoa se essa transferência implicar a reintegração no meio criminoso do seu Estado natal, em vez de contribuir para a sua reinserção social». Nesse mesmo número, esclarece que «o poder decisório total do Estado de emissão também é visível no artigo 13.° da Decisão‑Quadro [2008/909], que indica que, enquanto a execução da condenação não tiver sido iniciada no Estado de execução, o Estado de emissão pode retirar a certidão, devendo apresentar uma justificação. Neste contexto, ver também o artigo 17.°, n.° 3». Além disso, observou que «existe uma consciência cada vez maior nos Estados‑Membros de que as opiniões das vítimas devem ser tidas em conta no contexto da execução das condenações dos infratores condenados, nomeadamente no que toca à transferência prisional internacional. As vítimas podem estar presentes tanto no Estado de execução como no Estado de emissão. Muitos Estados‑Membros adotaram um procedimento segundo o qual as vítimas têm a possibilidade de ser consultadas em relação a transferências, sendo as suas opiniões tidas em consideração. Contudo, isto não constitui um direito de oposição à transferência para as vítimas».


43      V. Acórdão de 9 de novembro de 2023, Staatsanwaltschaft Aachen (C‑819/21, EU:C:2023:841, n.° 39).


44      A este respeito, refiro que o processo Fira (C‑215/24) suscita, nomeadamente, a questão de saber se, após ter recusado executar um mandado de detenção europeu para efeitos de execução de uma pena privativa de liberdade, por força do artigo 4.°, n.° 6, da Decisão‑Quadro 2002/584, o Estado‑Membro de execução pode suspender a execução dessa pena.


45      V., neste sentido, Acórdão de 31 de janeiro de 2023, Puig Gordi e o. (C‑158/21, EU:C:2023:57, n.° 141).


46      V., a este respeito, Acórdão de 28 de julho de 2016, JZ (C‑294/16 PPU, EU:C:2016:610, n.° 43).

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