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Document 62021CO0035

Despacho do Tribunal de Justiça (Décima Secção) de 9 de fevereiro de 2022.
«Konservinvest» OOD contra «Bulkons Parvomay» OOD.
Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Varhoven kasatsionen sad.
Reenvio prejudicial — Artigo 99.o do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça — Regimes de qualidade dos produtos agrícolas e dos géneros alimentícios — Regulamento (UE) n.o 1151/2012 — Denominações de origem e indicações geográficas — Artigo 9.o — Proteção nacional transitória — Indicação geográfica que designa um produto agrícola, registada nos termos da legislação de um Estado‑Membro e que beneficia de proteção a nível nacional.
Processo C-35/21.

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2022:84

 DESPACHO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Décima Secção)

9 de fevereiro de 2022 ( *1 )

«Reenvio prejudicial — Artigo 99.o do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça — Regimes de qualidade dos produtos agrícolas e dos géneros alimentícios — Regulamento (UE) n.o 1151/2012 — Denominações de origem e indicações geográficas — Artigo 9.o — Proteção nacional transitória — Indicação geográfica que designa um produto agrícola, registada nos termos da legislação de um Estado‑Membro e que beneficia de proteção a nível nacional»

No processo C‑35/21,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Varhoven kasatsionen sad (Supremo Tribunal de Cassação, Bulgária), por Decisão de 29 de dezembro de 2020, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 19 de janeiro de 2021, no processo

«Konservinvest» OOD

contra

«Bulkons Parvomay» OOD,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Décima Secção),

composto por: I. Jarukaitis (relator), presidente de secção, M. Ilešič e Z. Csehi, juízes,

advogado‑geral: N. Emiliou,

secretário: A. Calot Escobar,

vistos os autos,

vistas as observações apresentadas:

em representação da «Konservinvest» OOD, por Y. Ivanova e P. Angelov, advokati,

em representação da «Bulkons Parvomay» OOD, por M. Georgieva‑Tabakova, advokat,

em representação da Comissão Europeia, inicialmente por M. Konstantinidis, I. Naglis e G. Koleva e, em seguida, por M. Konstantinidis e G. Koleva, na qualidade de agentes,

vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de decidir por despacho fundamentado, nos termos do artigo 99.o do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça,

profere o presente

Despacho

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 9.o do Regulamento (UE) n.o 1151/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 21 de novembro de 2012, relativo aos regimes de qualidade dos produtos agrícolas e dos géneros alimentícios (JO 2012, L 343, p. 1).

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a «Konservinvest» OOD à «Bulkons Parvomay» OOD (a seguir «Bulkons»), a respeito da utilização, pela Konservinvest, de marcas comerciais que violam os direitos da Bulkons sobre a indicação geográfica «Lyutenitsa Parvomay».

Quadro jurídico

Direito da União

Regulamento (CE) n.o 510/2006

3

O Regulamento (CE) n.o 510/2006 do Conselho, de 20 de março de 2006, relativo à proteção das indicações geográficas e denominações de origem dos produtos agrícolas e dos géneros alimentícios (JO 2006, L 93, p. 12), conforme alterado pelo Regulamento (CE) n.o 1791/2006 do Conselho, de 20 de novembro de 2006 (JO 2006, L 363, p. 1) (a seguir «Regulamento n.o 510/2006»), previa, no seu artigo 5.o, n.o 8, segundo parágrafo, que a República da Bulgária e a Roménia porão em vigor as disposições legislativas, regulamentares ou administrativas necessárias para dar cumprimento ao disposto nos n.os 4 a 7 deste artigo 5.o, o mais tardar um ano após a data da adesão.

4

O Regulamento n.o 510/2006 previa, além disso, no seu artigo 5.o, n.o 11:

«Para a Bulgária e a Roménia[,] a proteção nacional das indicações geográficas e das denominações de origem existente à data da adesão pode continuar durante doze meses a contar da data da adesão.

Se for apresentado à Comissão um pedido de registo ao abrigo do presente regulamento até ao final do período supra mencionado, essa proteção cessa na data em que for tomada uma decisão sobre o registo nos termos do presente regulamento.

As consequências da proteção nacional transitória, no caso de a denominação não ser registada em conformidade com o presente regulamento, são da exclusiva responsabilidade do Estado‑Membro em questão.»

5

Este regulamento foi revogado e substituído, com efeitos a partir de 3 de janeiro de 2013, pelo Regulamento n.o 1151/2012.

Regulamento n.o 1151/2012

6

Nos termos dos considerandos 13 a 15, 17, 18, 20 e 24 do Regulamento n.o 1151/2012:

«(13)

[…] deverá ser estabelecido um quadro jurídico único que incorpore as disposições novas ou atualizadas dos Regulamentos (CE) n.o 509/2006 [do Conselho, de 20 de março de 2006, relativo às especialidades tradicionais garantidas dos produtos agrícolas e dos géneros alimentícios (JO 2006, L 93, p. 1)] e [n.o 510/2006], bem como as disposições dos Regulamentos [n.os 509/2006 e 510/2006] que forem mantidas.

(14)

Por razões de clareza e de transparência, os Regulamentos [n.os 509/2006 e 510/2006] deverão ser revogados e substituídos pelo presente regulamento.

(15)

O âmbito de aplicação do presente regulamento deverá limitar‑se aos produtos agrícolas destinados ao consumo humano constantes do anexo I do Tratado e a uma lista de produtos não abrangidos pelo referido anexo, mas estreitamente ligados à produção agrícola ou à economia rural.

[…]

(17)

É necessário limitar o âmbito de aplicação das denominações de origem e das indicações geográficas aos produtos ou géneros alimentícios cujas características estejam intrinsecamente relacionadas com a origem geográfica. […]

(18)

Os objetivos específicos da proteção das denominações de origem e das indicações geográficas consistem em garantir uma remuneração justa para os agricultores e os produtores que tenha em conta as qualidades e as características de um dado produto ou do seu modo de produção e em fornecer informações claras sobre os produtos com características específicas relacionadas com a sua origem geográfica, de forma a permitir que os consumidores façam opções de compra com informações fiáveis.

[…]

(20)

Um quadro estabelecido ao nível da União que proteja as denominações de origem e as indicações geográficas, prevendo para o efeito a sua inscrição num registo, facilita o desenvolvimento desses instrumentos, uma vez que a abordagem mais uniforme que daí resulta garante condições de concorrência leal entre os produtores de produtos que ostentam estas menções e melhora a credibilidade dos produtos aos olhos dos consumidores. […]

[…]

(24)

Para poderem beneficiar de proteção nos territórios dos Estados‑Membros, as denominações de origem e as indicações geográficas deverão ser registadas unicamente a nível da União. Com efeitos a partir da data do pedido de registo ao nível da União, os Estados‑Membros deverão poder conceder uma proteção provisória ao nível nacional sem prejudicar o comércio interno da União ou o comércio internacional. […]»

7

O artigo 1.o do Regulamento n.o 1151/2012, sob a epígrafe «Objetivos», prevê, no seu n.o 1:

«O presente regulamento destina‑se a ajudar os produtores de produtos agrícolas e de géneros alimentícios a comunicar aos compradores e consumidores as características e os atributos ligados ao modo de obtenção desses produtos e géneros alimentícios, garantindo assim:

a)

Condições de concorrência leal para os agricultores e produtores de produtos agrícolas e de géneros alimentícios com características e atributos que ofereçam uma mais‑valia;

[…]

As medidas previstas no presente regulamento destinam‑se a apoiar as atividades agrícolas e de transformação e os sistemas agrícolas associados a produtos de elevada qualidade, contribuindo desta forma para a realização dos objetivos da política de desenvolvimento rural.»

8

O artigo 2.o deste regulamento, que especifica o âmbito de aplicação deste último, enuncia, no seu n.o 1, primeiro parágrafo:

«O presente regulamento abrange os produtos agrícolas destinados ao consumo humano constantes do anexo I do Tratado [FUE] e outros produtos agrícolas e géneros alimentícios constantes do anexo I do presente regulamento.»

9

O título II do referido regulamento, intitulado «Denominações de origem protegidas e indicações geográficas protegidas», contém os artigos 4.o a 16.o deste. O artigo 4.o do mesmo regulamento, sob a epígrafe «Objetivo», especifica:

«É estabelecido um regime de denominações de origem protegidas e indicações geográficas protegidas, a fim de ajudar os produtores de produtos ligados a uma área geográfica, mediante:

a)

A garantia de uma remuneração justa que corresponda às qualidades dos seus produtos;

b)

A garantia de uma proteção uniforme das denominações como direito de propriedade intelectual no território da União;

c)

A comunicação aos consumidores de informações claras sobre os atributos do produto que lhe conferem uma mais‑valia.»

10

O artigo 5.o do Regulamento n.o 1151/2012, sob a epígrafe «Requisitos das denominações de origem e das indicações geográficas», dispõe, nos seus n.os 1 e 2:

«1.   Para efeitos do presente regulamento, entende‑se por “denominação de origem” uma denominação que identifique um produto:

a)

Originário de um local ou região determinados, ou, em casos excecionais, de um país;

b)

Cuja qualidade ou características se devam essencial ou exclusivamente a um meio geográfico específico, incluindo os seus fatores naturais e humanos; e

c)

Cujas fases de produção tenham todas lugar na área geográfica delimitada.

2.   Para efeitos do presente regulamento, entende‑se por “indicação geográfica” uma denominação que identifique um produto:

a)

Originário de um local ou região determinados, ou de um país;

b)

Que possua determinada qualidade, reputação ou outras características que possam ser essencialmente atribuídas à sua origem geográfica; e

c)

Em relação ao qual pelo menos uma das fases de produção tenha lugar na área geográfica delimitada.»

11

O artigo 9.o deste regulamento, sob a epígrafe «Proteção nacional transitória», prevê:

«Os Estados‑Membros podem, ao abrigo do presente regulamento e apenas a título transitório, conferir, a nível nacional, proteção a uma denominação, com efeitos a partir da data de apresentação do pedido à Comissão.

A proteção nacional transitória cessa na data em que for tomada uma decisão sobre o registo nos termos do presente regulamento, ou em que o pedido for retirado.

Caso a denominação não seja registada nos termos do presente regulamento, as consequências de uma tal proteção nacional são da exclusiva responsabilidade do Estado‑Membro em questão.

As medidas adotadas pelos Estados‑Membros nos termos do primeiro parágrafo só produzem efeitos ao nível nacional e não podem afetar as trocas comerciais no interior da União ou internacionais.»

12

O artigo 12.o do referido regulamento, sob a epígrafe «Denominações, símbolos e menções», tem a seguinte redação:

«1.   As denominações de origem protegidas e as indicações geográficas protegidas podem ser utilizadas por qualquer operador que comercialize um produto conforme com o caderno de especificações correspondente.

[…]

3.   […] Podem ainda figurar na rotulagem as menções “denominação de origem protegida” ou “indicação geográfica protegida” […].

4.   Adicionalmente, podem figurar na rotulagem os seguintes elementos: representações da área geográfica de origem, referida no artigo 5.o, e textos, gráficos ou símbolos relativos ao Estado‑Membro e/ou à região em que se situa essa área geográfica de origem.

[…]»

13

O capítulo IV deste, que figura no título V do mesmo regulamento, intitulado «Disposições comuns», estabelece os processos de pedido e de registo, nomeadamente, das denominações de origem e das indicações geográficas.

Direito búlgaro

Lei Relativa às Marcas e às Denominações Geográficas

14

A Zakon za markite i geografskite oznachenia (Lei Relativa às Marcas e às Denominações Geográficas) (DV n.o 81, de 14 de setembro de 1999), na versão aplicável ao litígio no processo principal (a seguir «ZMGO»), previa, no seu artigo 51.o, n.os 1 a 3:

«(1)   Entende‑se por designação geográfica uma denominação de origem e uma indicação geográfica.

(2)   A denominação de origem é o nome de um país, de uma região ou de um local determinado desse país, que serve para designar um produto originário desse país, dessa região ou desse local determinado e cuja qualidade ou caráter se devam essencial ou exclusivamente a um meio geográfico específico, incluindo os seus fatores naturais e humanos.

(3)   A indicação geográfica é o nome de um país, de uma região ou de um local determinado desse país, que serve para designar um produto originário desse país, dessa região ou desse local determinado e cuja qualidade, reputação ou outras características possam ser atribuídas a essa origem geográfica.»

15

O artigo 53.o da ZMGO especificava, nos seus n.os 1 e 2:

«(1)   A proteção jurídica da designação geográfica é concedida mediante o registo desta última no Instituto de Patentes.

(2)   A proteção jurídica abrange a proibição de:

1. qualquer utilização comercial de designação geográfica de produtos comparáveis ao que está registado, na medida em que tal utilização permita explorar a reputação da designação protegida;

2. qualquer utilização abusiva ou imitação da designação geográfica, ainda que a verdadeira origem do produto seja indicada, ou que a utilização desta última seja traduzida ou acompanhada por termos como “género”, “espécie”, “tipo”, “imitação” ou similares;

3. qualquer utilização de outra indicação falsa ou falaciosa quanto à proveniência, origem, natureza ou qualidades essenciais dos produtos, que conste do acondicionamento ou da embalagem, da publicidade ou dos documentos relativos aos produtos em causa, indicação suscetível de dar uma impressão errada sobre a origem;

4 qualquer outra prática suscetível de induzir o consumidor em erro quanto à verdadeira origem do produto.»

16

Nos termos do artigo 76.o da ZMGO:

«(1)   As ações por violação de direitos ao abrigo da presente lei podem constituir ações:

1. declarativas dos factos da infração;

2. inibitórias, destinadas a pôr termo à infração;

3. de indemnização dos danos;

4. destinadas a obter a apreensão e a destruição da mercadoria que é objeto da infração, bem como os meios utilizados para a cometer.

(2)   Simultaneamente à ação prevista no n.o 1, o demandante pode requerer judicialmente:

[…]

3. a publicação, a expensas da demandada, da parte decisória do acórdão em dois jornais diários e no tempo de emissão de uma estação de radiodifusão televisiva com cobertura nacional, determinados pelo tribunal.»

17

A ZMGO foi revogada em 22 de dezembro de 2019 (DV n.o 98, de 13 de dezembro de 2019).

Disposições temporárias e finais da Lei que Altera e Completa a ZMGO

18

As disposições temporárias e finais da Lei que Altera e Completa a ZMGO (DV n.o 61, de 24 de julho de 2018) previam, no seu artigo 8.o:

«(1)   Os titulares de direitos sobre as designações geográficas registadas para produtos agrícolas ou géneros alimentícios abrangidos pelo âmbito de aplicação do Regulamento [n.o 1151/2012] não podem intentar ações por violações cometidas antes da entrada em vigor da presente lei.

(2)   Não podem ser iniciados processos administrativos de caráter penal por violações anteriores à entrada em vigor da presente lei de direitos sobre as designações geográficas registadas para produtos agrícolas ou géneros alimentícios abrangidos pelo âmbito de aplicação do Regulamento [n.o 1151/2012].»

Litígio no processo principal e questão prejudicial

19

A Konservinvest, sociedade com sede administrativa e social na Bulgária, obteve, em 12 de fevereiro de 1999, o registo da marca comercial complexa «K Konservinvest Parvomayska lyutenitsa» no Instituto de Patentes da República da Bulgária (a seguir «Instituto»), para designar o produto «lyutenitsa». Além disso, em 3 de maio de 2005, obteve o registo da marca complexa «Parvomayska lyutenitsa Rachenitsa», pedido em 15 de maio de 2003, para designar o mesmo produto. Nestas duas marcas, os elementos «parvomayska lyutenitsa» não são protegidos.

20

Por Decisão do presidente do Instituto de 3 de julho de 2013, a Bulkons, sociedade que tem igualmente a sua sede social e administrativa na Bulgária, foi registada, nos termos da ZMGO então em vigor, como utilizadora da indicação geográfica «Lyutenitsa Parvomay» (a seguir «indicação geográfica controvertida»), que designa o produto «lyutenitsa», sendo Parvomay um município búlgaro. O pedido de registo desta indicação geográfica foi apresentado pela Bulkons em 14 de março de 2013.

21

A Konservinvest interpôs nos tribunais administrativos primeiro, uma ação, e, depois, um recurso para a anulação desta decisão, com o fundamento de que o presidente do Instituto não era competente para proceder ao registo de uma indicação geográfica relativa a um produto agrícola, uma vez que, segundo o procedimento previsto nesse regulamento, esse registo era regulado pelo Regulamento n.o 1151/2012 e apenas possível ao nível da União. Por Acórdão de 12 de julho de 2017, o Varhoven administrativen sad (Supremo Tribunal Administrativo, Bulgária) negou provimento ao recurso, considerando que este regulamento não era aplicável ao litígio, uma vez que o registo controvertido não pretendia obter a proteção concedida por este.

22

Por outro lado, a Bulkons intentou ações no Sofiyski gradski sad (Tribunal da cidade de Sófia, Bulgária), que foram apensadas, contra a Konservinvest, nos termos do artigo 76.o, n.o 1, pontos 1 a 3, em conjugação com, em especial, o artigo 76.o, n.o 1, ponto 4, e n.o 2, ponto 3, da ZMGO. Através destas, pediu, nomeadamente, que seja declarado que os seus direitos sobre a indicação geográfica controvertida foram violados pela utilização, pela Konservinvest, de várias marcas comerciais, entre as quais as identificadas no n.o 19 do presente despacho, para designar o produto «lyutenitsa»; que a Konservinvest seja condenada a pôr termo à infração e a indemnizar o prejuízo sofrido no montante de 636284,16 leva búlgaros (BGN) (cerca de 325000 euros), e que seja ordenada a apreensão e a destruição («retirada de serviço») dos produtos ilícitos.

23

Por Acórdão de 30 de novembro de 2017, o Sofiyski gradski sad (Tribunal da cidade de Sófia) julgou essas ações improcedentes, com o fundamento de que estas diziam respeito a um produto ao qual o Regulamento n.o 1151/2012 se aplica diretamente e que este último exige que o registo das denominações geográficas dos produtos agrícolas e dos géneros alimentícios seja efetuado na Comissão.

24

Foi dado provimento ao recurso interposto pela Bulkons desse acórdão, pelo Sofiyski Apelativen sad (Tribunal de Recurso de Sófia, Bulgária), por Acórdão de 28 de fevereiro de 2019, que julgou inteiramente procedentes as ações propostas por esta sociedade. Este órgão jurisdicional considerou que essas ações eram admissíveis, uma vez que o artigo 8.o, n.o 1, das disposições temporárias e finais da Lei que Altera e Completa a ZMGO não era aplicável ao litígio que lhe foi submetido, bem como procedentes, uma vez que a ZMGO e o Regulamento n.o 1151/2012 regulam relações diferentes e garantem uma proteção paralela de direitos diferentes.

25

A Konservinvest interpôs recurso de cassação deste acórdão no Varhoven kasatsionen sad (Supremo Tribunal de Cassação, Bulgária), o órgão jurisdicional de reenvio. Este último indica que deve apreciar a admissibilidade das ações propostas pela Bulkons e que, para esse efeito, deve determinar se a indicação geográfica controvertida beneficia de proteção em conformidade com a legislação búlgara.

26

A este respeito, este especifica que, em conformidade com esta legislação, o registo de uma indicação geográfica no Instituto, incluindo para produtos agrícolas e géneros alimentícios, lhe confere uma proteção nacional que permite uma sanção judicial se a utilização dessa indicação for violada por um sujeito de direito não autorizado. Tal indicação geográfica daria aos consumidores garantias de uma elevada qualidade do produto por ela designado e descreveria as suas especificidades. Além disso, criaria um obstáculo à degradação dessa qualidade que resultaria de uma produção do mesmo produto por produtores não registados.

27

Atendendo à evolução da legislação internacional e da União relativas à proteção das denominações geográficas dos produtos agrícolas e géneros alimentícios cuja qualidade e caráter único estão associados a determinadas regiões da União, e tendo em conta o artigo 9.o e os considerandos 15 e 24 do Regulamento n.o 1151/2012, o órgão jurisdicional de reenvio considera possível que o registo e a proteção jurídica desses produtos sejam excluídos a nível nacional. Todavia, considera que, quando o litígio opõe fabricantes locais de um mesmo produto agrícola a respeito de uma indicação geográfica que obteve apenas um registo nacional e quando estão em causa violações cometidas no território do mesmo Estado‑Membro, a possibilidade de proceder a um registo unicamente a nível nacional para produtos agrícolas e géneros alimentícios abrangidos pelo Regulamento n.o 1151/2012 e de beneficiar de uma proteção concreta unicamente no território desse Estado‑Membro não está expressamente excluída pelo direito da União.

28

Nestas circunstâncias, o Varhoven kasatsionen sad (Supremo Tribunal de Cassação) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«O artigo 9.o do [Regulamento n.o 1151/2012], permite um regime nacional de registo e proteção das indicações geográficas de produtos agrícolas e de géneros alimentícios abrangidas pelo âmbito de aplicação deste regulamento, fora das situações de proteção transitória reguladas nesta disposição, e permite aos Estados‑Membros aplicarem outras disposições que vigoram simultaneamente a nível nacional (de modo semelhante ao regime paralelo das marcas) para regular os litígios relativos a violações do direito a uma indicação geográfica desse tipo entre operadores locais que produzem e comercializam produtos agrícolas e géneros alimentícios abrangidos pelo [Regulamento n.o 1151/2012] no território do Estado‑Membro em que a indicação geográfica foi registada?»

Quanto à questão prejudicial

29

Nos termos do artigo 99.o do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, quando a resposta a uma questão submetida a título prejudicial possa ser claramente deduzida da jurisprudência, o Tribunal de Justiça pode, a qualquer momento, mediante proposta do juiz‑relator, ouvido o advogado‑geral, decidir pronunciar‑se por meio de despacho fundamentado.

30

Há que aplicar esta disposição no presente processo.

31

A título preliminar, há que observar que, embora a redação da questão submetida vise apenas o artigo 9.o do Regulamento n.o 1151/2012, resulta da decisão de reenvio que o órgão jurisdicional de reenvio se interroga sobre o alcance de todo o regime de proteção das denominações de origem e das indicações geográficas, conforme previsto por este regulamento.

32

Por conseguinte, há que considerar que, com a sua questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o Regulamento n.o 1151/2012 deve ser interpretado no sentido de que se opõe à legislação de um Estado‑Membro que prevê um regime nacional de registo e proteção das designações geográficas, relativas a produtos agrícolas e a géneros alimentícios abrangidos pelo âmbito de aplicação deste regulamento, que apenas se aplica aos litígios relativos às violações dos direitos decorrentes dessas designações que opõem comerciantes desse Estado‑Membro que produzem, no território deste último, os produtos para os quais as referidas denominações foram registadas ao abrigo dessa legislação.

33

A este respeito, importa salientar desde logo que, como resulta dos considerandos 13 e 14 do Regulamento n.o 1151/2012, este último funde num quadro jurídico único, nomeadamente, as disposições novas ou atualizadas do Regulamento n.o 510/2006, bem como as disposições deste último que foram mantidas, e substituí‑o. A jurisprudência do Tribunal de Justiça relativa às disposições do Regulamento n.o 510/2006 que foram, em substância, incorporadas no Regulamento n.o 1151/2012 continua, portanto, pertinente para a interpretação das disposições equivalentes que figuram neste último regulamento. Do mesmo modo, uma vez que o próprio Regulamento n.o 510/2006 foi revogado e substituiu o Regulamento (CEE) n.o 2081/92 do Conselho, de 14 de julho de 1992, relativo à proteção das indicações geográficas e denominações de origem dos produtos agrícolas e dos géneros alimentícios (JO 1992, L 208, p. 1), a jurisprudência do Tribunal de Justiça relativa às disposições deste último que foram, em substância, incorporadas no Regulamento n.o 510/2006 e depois no Regulamento n.o 1151/2012, continua igualmente pertinente para esta interpretação.

34

No que respeita à questão submetida, há que salientar, em primeiro lugar, que, como resulta do considerando 20, primeiro período, do considerando 24 e do artigo 4.o do Regulamento n.o 1151/2012, este tem por objetivo, nomeadamente, assegurar uma proteção uniforme, na União, das denominações de origem e indicações geográficas que abrange e, para o efeito, instituiu a obrigação de registo destas ao nível da União, para que possam beneficiar de proteção em qualquer Estado‑Membro (v., por analogia, Acórdão de 8 de setembro de 2009, Budějovický Budvar, C‑478/07, EU:C:2009:521, n.os 107 e 108).

35

Assim, o Regulamento n.o 1151/2012, adotado, nomeadamente, com base no artigo 43.o, n.o 2, TFUE, constitui um instrumento da política agrícola comum que visa essencialmente assegurar aos consumidores que os produtos agrícolas que ostentam uma denominação de origem ou uma indicação geográfica registada nos termos deste regulamento apresentam, em razão da sua proveniência de uma zona geográfica determinada, certas características específicas e, por conseguinte, oferecerem uma garantia de qualidade devida à sua proveniência geográfica, com o objetivo de permitir aos operadores agrícolas que tenham feito esforços qualitativos reais obter em contrapartida melhores rendimentos e impedir que terceiros tirem abusivamente proveito da reputação decorrente da qualidade desses produtos (v., por analogia, Acórdão de 8 de setembro de 2009, Budějovický Budvar, C‑478/07, EU:C:2009:521, n.os 109 a 111 e jurisprudência referida), o que reflete, em especial, o considerando 18 e os artigos 1.o e 4.o deste regulamento.

36

Ora, se os Estados‑Membros pudessem permitir aos seus produtores utilizar nos respetivos territórios nacionais uma das menções ou um dos símbolos que o artigo 12.o do Regulamento n.o 1151/2012 reserva às denominações de origem e às indicações geográficas registadas ao abrigo desse regulamento, com base num regime nacional que pudesse satisfazer requisitos menos rigorosos que os impostos no quadro do referido regulamento para os produtos em causa, esta garantia de qualidade, que constitui a função essencial das denominações de origem e das indicações geográficas conferidas por força do mesmo regulamento, correria o risco de não ser assegurada, o que, no mercado interno, poderia igualmente comprometer o objetivo de uma igual concorrência entre os produtores de produtos que ostentam essas menções ou símbolos e, em especial, seria suscetível de violar os direitos que devem ser reservados aos produtores que fizeram esforços qualitativos reais para poderem utilizar uma denominação de origem ou uma indicação geográfica registada ao abrigo do Regulamento n.o 1151/2012 (v., por analogia, Acórdão de 8 de setembro de 2009, Budějovický Budvar, C‑478/07, EU:C:2009:521, n.o 112).

37

Esse risco de pôr em causa o objetivo central de assegurar a qualidade de tais produtos agrícolas é tanto mais importante quanto, contrariamente às marcas, nenhuma medida da União de harmonização de eventuais regimes nacionais de proteção das denominações de origem e das indicações geográficas foi adotada paralelamente (v., por analogia, Acórdão de 8 de setembro de 2009, Budějovický Budvar, C‑478/07, EU:C:2009:521, n.o 113).

38

Deve concluir‑se que o objetivo do Regulamento n.o 1151/2012 não é estabelecer, a par de regras nacionais que podem continuar a existir, um regime complementar de proteção das denominações de origem e das indicações geográficas qualificadas, ou seja, denominações de origem e indicações geográficas que preenchem os critérios enunciados no artigo 5.o deste regulamento, mas prever um regime de proteção uniforme e exaustivo para tais denominações e indicações (v., por analogia, Acórdão de 8 de setembro de 2009, Budějovický Budvar, C‑478/07, EU:C:2009:521, n.o 114).

39

O caráter exaustivo do regime de proteção das denominações de origem e das indicações geográficas previsto pelo Regulamento n.o 1151/2012 é confirmado pelo facto de o procedimento de registo do Regulamento n.o 1151/2012 se basear na repartição das competências entre o Estado‑Membro em causa e a Comissão. Com efeito, em conformidade com o processo de pedido e de registo previsto no capítulo IV do título V do Regulamento n.o 1151/2012, a decisão de registar uma denominação de origem ou uma indicação geográfica só pode ser tomada pela Comissão se o Estado‑Membro em causa lhe tiver submetido um pedido para esse efeito e esse pedido só pode ser feito se este Estado‑Membro tiver verificado que este se justifica. Os procedimentos nacionais de registo são, portanto, integrados no processo decisório da União e constituem uma parte essencial deste. Estes não podem existir fora do regime de proteção da União (v., por analogia, Acórdão de 8 de setembro de 2009, Budějovický Budvar, C‑478/07, EU:C:2009:521, n.os 116 e 117 e jurisprudência referida).

40

Neste contexto, importa, por um lado, salientar que o artigo 9.o do Regulamento n.o 1151/2012 prevê, em substância, que os Estados‑Membros podem conferir, sob sua exclusiva responsabilidade, uma proteção nacional transitória até que seja tomada uma decisão sobre o pedido de registo ao abrigo deste regulamento ou até que esse pedido seja retirado. Ora, uma disposição dessa natureza não teria sentido se os Estados‑Membros pudessem, em qualquer circunstância, conservar os seus próprios regimes de proteção de denominações de origem e de indicações geográficas na aceção do Regulamento n.o 1151/2012, e fazê‑los coexistir com este regulamento (v., por analogia, Acórdão de 8 de setembro de 2009, Budějovický Budvar, C‑478/07, EU:C:2009:521, n.os 118 e 120).

41

Por outro lado, contrariamente ao que a Bulkons sustenta, em substância, no Tribunal de Justiça, o facto de o Regulamento n.o 1151/2012 não retomar o regime transitório previsto no artigo 5.o, n.o 11, do Regulamento n.o 510/2006 a favor da República da Bulgária e da Roménia na sequência da sua adesão à União, para as indicações geográficas e denominações de origem nacionais existentes à data dessa adesão, não significa, de modo algum, que o Regulamento n.o 1151/2012 tenha alterado o caráter exaustivo do regime de proteção das denominações de origem e das indicações geográficas anteriormente previsto pelo Regulamento n.o 510/2006.

42

O regime transitório que estava previsto nesta disposição retomava, em substância, o regime transitório anteriormente previsto quanto às denominações de origem e às indicações geográficas nacionais existentes nos dez Estados que aderiram à União em 1 de maio de 2004. Ora, este não tinha sido considerado um elemento determinante do caráter exaustivo do regime de proteção previsto no Regulamento n.o 510/2006, mas unicamente como um elemento que confirma este caráter exaustivo (v., neste sentido, Acórdão de 8 de setembro de 2009, Budějovický Budvar, C‑478/07, EU:C:2009:521, n.os 124 a 128).

43

Com efeito, é a própria natureza do regime de proteção estabelecido pelo Regulamento n.o 510/2006, e já anteriormente pelo Regulamento n.o 2081/92, que resulta do seu objetivo de assegurar uma proteção uniforme, na Comunidade, das denominações geográficas a que se refere e de garantir assim uma igual concorrência entre os produtores de produtos que ostentam essas denominações, em benefício tanto desses produtores como dos consumidores, que levou o Tribunal de Justiça a concluir que o Regulamento n.o 510/2006 previa um regime de proteção uniforme e exaustivo para essas denominações, excluindo a existência paralela de regimes nacionais de proteção das denominações de origem e das indicações geográficas, na aceção deste último regulamento (v., neste sentido, Acórdão de 8 de setembro de 2009, Budějovický Budvar, C‑478/07, EU:C:2009:521, n.os 107 a 114). Ora, como foi constatado nos n.os 34 a 38 do presente despacho, o Regulamento n.o 1151/2012 prossegue o mesmo objetivo, no que respeita à proteção das denominações de origem e das indicações geográficas dos produtos agrícolas e dos géneros alimentícios nele previstos.

44

Deve igualmente constatar‑se que a disposição transitória que estava prevista no artigo 5.o, n.o 11, do Regulamento n.o 510/2006 não foi incorporada no Regulamento n.o 1151/2012 simplesmente pelo facto de o período nele previsto ter expirado e de, por conseguinte, esta disposição ter perdido toda a utilidade, uma vez que os Estados‑Membros por ela visados, no termo desse período, foram plenamente obrigados a respeitar as disposições do Regulamento n.o 510/2006, atualmente incorporadas no Regulamento n.o 1151/2012.

45

A este respeito, e considerando as dúvidas expressas pelo órgão jurisdicional de reenvio, bem como as observações apresentadas pela Bulkons no Tribunal de Justiça, importa recordar que, em conformidade com o artigo 288.o, segundo parágrafo, TFUE, um regulamento como o Regulamento n.o 1151/2012 é obrigatório em todos os seus elementos e diretamente aplicável em todos os Estados‑Membros. Por outro lado, o princípio do primado do direito da União, que consagra a preeminência desse direito sobre o direito dos Estados‑Membros, impõe a todas as instâncias dos Estados‑Membros que confiram pleno efeito às diferentes normas do direito da União, não podendo o direito dos Estados‑Membros afetar o efeito reconhecido a essas diferentes normas no território dos referidos Estados (v., por analogia, Acórdão de 2 de abril de 2020, CRPNPAC e Vueling Airlines, C‑370/17 e C‑37/18, EU:C:2020:260, n.o 74 e jurisprudência referida).

46

A fim de garantir a efetividade de todas as disposições do direito da União, o princípio do primado deste direito impõe, assim, aos órgãos jurisdicionais nacionais que, tanto quanto possível, interpretem o seu direito interno em conformidade com o direito da União [Acórdãos de 24 de junho de 2019, Popławski, C‑573/17, EU:C:2019:530, n.o 57; e de 21 de outubro de 2021, ZX (Regularização da acusação), C‑282/20, EU:C:2021:874, n.o 39].

47

Só quando for impossível proceder a uma interpretação da legislação nacional conforme com os requisitos do direito da União é que o juiz nacional encarregado de aplicar as disposições deste direito tem a obrigação de assegurar o pleno efeito das mesmas, não aplicando, se necessário, por sua própria iniciativa, qualquer disposição contrária à legislação nacional, ainda que posterior, sem ter de pedir ou esperar pela sua revogação prévia por via legislativa ou por qualquer outro procedimento constitucional [Acórdãos de 24 de junho de 2019, Popławski, C‑573/17, EU:C:2019:530, n.o 58 e jurisprudência referida; e de 21 de outubro de 2021, ZX (Regularização da acusação), C‑282/20, EU:C:2021:874, n.o 40].

48

Assim, em caso de impossibilidade de interpretação conforme, qualquer juiz nacional, chamado a pronunciar‑se no âmbito da sua competência, tem, enquanto órgão de um Estado‑Membro, a obrigação de não aplicar qualquer disposição nacional contrária a uma disposição do direito da União que tenha efeito direto no litígio que lhe foi submetido [v., neste sentido, Acórdãos de 24 de junho de 2019, Popławski, C‑573/17, EU:C:2019:530, n.o 61 e jurisprudência referida; e de 21 de outubro de 2021, ZX (Regularização da acusação), C‑282/20, EU:C:2021:874, n.o 41].

49

Em segundo lugar, no que respeita ao regime a aplicar no mercado de um Estado‑Membro, há que salientar que, embora o Regulamento n.o 1151/2012 tenha por objetivo prever um regime de proteção uniforme e exaustivo das denominações de origem e indicações geográficas para os produtos agrícolas e géneros alimentícios abrangidos pelo seu âmbito de aplicação, essa exclusividade não impede a aplicação de um regime de proteção das denominações geográficas fora do seu âmbito de aplicação (v., por analogia, Acórdão de 8 de maio de 2014, Assica e Kraft Foods Italia, C‑35/13, EU:C:2014:306, n.o 28 e jurisprudência referida).

50

A este respeito, resulta do considerando 17 e do artigo 5.o, n.os 1 e 2, do Regulamento n.o 1151/2012 que o regime de proteção previsto por este regulamento para as denominações de origem e as indicações geográficas se limita, respetivamente, às denominações de origem relativas a produtos para os quais existe uma ligação direta entre, por um lado, a qualidade ou características destes e, por outro, o seu meio geográfico específico de origem, e às indicações geográficas relativas a produtos para os quais existe uma ligação direta entre, por um lado, uma determinada qualidade, reputação ou outras características destes e, por outro, a sua origem geográfica (v., por analogia, Acórdãos de 7 de novembro de 2000, Warsteiner Brauerei, C‑312/98, EU:C:2000:599, n.o 43 e jurisprudência referida; e de 8 de maio de 2014, Assica e Kraft Foods Italia, C‑35/13, EU:C:2014:306, n.o 29).

51

Consequentemente, as denominações de proveniência geográfica que servem unicamente para indicar a origem geográfica de um produto, independentemente das suas características específicas, não estão abrangidas pelo âmbito de aplicação do Regulamento n.o 1151/2012 no que respeita às denominações de origem e às indicações geográficas (v., por analogia, Acórdão de 8 de maio de 2014, Assica e Kraft Foods Italia, C‑35/13, EU:C:2014:306, n.o 30 e jurisprudência referida).

52

Por conseguinte, o regime de proteção suscetível de ser aplicado, se for caso disso, no mercado de um Estado‑Membro, a uma denominação geográfica desprovida de registo da União é o previsto para as denominações geográficas relativas a produtos para os quais não existe uma ligação específica entre as suas características e a sua origem geográfica (Acórdão de 8 de maio de 2014, Assica e Kraft Foods Italia, C‑35/13, EU:C:2014:306, n.o 31).

53

No entanto, para que esse regime possa ser aplicado, deve estar em conformidade com os requisitos impostos pelo direito da União. A este respeito, é necessário, por um lado, que a sua aplicação não comprometa os objetivos do Regulamento n.o 1151/2012. Tendo em conta o âmbito de aplicação deste último, isso implica que a proteção concedida pelo regime nacional em causa não deve ter por efeito garantir aos consumidores que os produtos que beneficiam dessa proteção apresentam uma qualidade ou uma determinada característica, mas garantir exclusivamente que esses produtos provêm da área geográfica em causa. Por outro lado, é necessário que esta aplicação não seja contrária às disposições do TFUE relativas à livre circulação de mercadorias (v., neste sentido, Acórdão de 8 de maio de 2014, Assica e Kraft Foods Italia, C‑35/13, EU:C:2014:306, n.os 33 a 35).

54

No caso em apreço, resulta da decisão de reenvio que, em conformidade com o artigo 51.o, n.o 1, da ZMGO, o termo «designação geográfica» visa tanto as «denominações de origem» como as «indicações geográficas», na aceção desta lei, e que, segundo, respetivamente, os n.os 2 e 3 deste artigo 51.o, cada um destes tipos de designação pode ser utilizado para designar produtos para os quais existe uma ligação direta entre, por um lado, a sua qualidade, a sua reputação ou outra das suas características e, por outro, a sua origem geográfica. A redação destas duas últimas disposições corresponde, aliás, em substância, respetivamente, à do artigo 5.o, n.o 1, alíneas a) e b), e à do artigo 5.o, n.o 2, alíneas a) e b), do Regulamento n.o 1151/2012.

55

Além disso, o órgão jurisdicional de reenvio especifica que uma indicação geográfica, na aceção da referida lei, dá garantias aos consumidores de uma elevada qualidade do produto designado, descreve as suas especificidades e cria um obstáculo à degradação dessa qualidade que resultaria de uma produção do mesmo produto por produtores não registados.

56

Afigura‑se, portanto, que as denominações geográficas em causa no processo principal não constituem denominações geográficas simples, na aceção da jurisprudência recordada no n.o 52 do presente despacho, mas denominações geográficas qualificadas, na aceção da jurisprudência recordada no n.o 38 deste mesmo despacho, à semelhança das denominações de origem e das indicações geográficas cuja proteção está prevista no Regulamento n.o 1151/2012, o que cabe, não obstante, ao órgão jurisdicional de reenvio verificar.

57

Além disso, resulta da decisão de reenvio e, em especial, da redação da questão prejudicial que o âmbito de aplicação da legislação nacional em causa no processo principal engloba os «produtos agrícolas e géneros alimentícios» abrangidos pelo âmbito de aplicação do Regulamento n.o 1151/2012, conforme especificado no considerando 15 e definido no artigo 2.o deste, o que, de resto, ilustra o litígio no processo principal, no âmbito do qual não se contesta que o produto em causa está abrangido por esse âmbito de aplicação.

58

Nestas condições, e sem prejuízo das verificações que cabe ao órgão jurisdicional de reenvio efetuar, esse regime nacional de registo e proteção de designações geográficas, relativas a produtos agrícolas e a géneros alimentícios abrangidos pelo âmbito de aplicação do Regulamento n.o 1151/2012, não pode coexistir com o regime de proteção das denominações de origem e das indicações geográficas previsto por este regulamento.

59

A este respeito, o facto de esse regime nacional de registo e proteção das designações geográficas qualificadas se destinar apenas a ser aplicado para regular as relações entre comerciantes do Estado‑Membro em causa que produzem, no território deste, os produtos para os quais essas designações foram registadas por força da legislação nacional, e de, por conseguinte, apenas se aplicar no mercado nacional desse Estado‑Membro, não permite considerar que essa coexistência é permitida. Com efeito, esse regime, uma vez que não tem exclusivamente por efeito garantir aos consumidores que os produtos em causa provêm da área geográfica em causa, mas garantir‑lhes igualmente que esses produtos apresentam uma qualidade ou uma determinada característica, compromete os objetivos do Regulamento n.o 1151/2012. Por conseguinte, em aplicação da jurisprudência recordada no n.o 53 do presente despacho, esse regime não pode ser considerado em conformidade com os requisitos impostos pelo direito da União.

60

Tendo em conta todas as considerações que precedem, há que responder à questão submetida que o Regulamento n.o 1151/2012 deve ser interpretado no sentido de que se opõe à legislação de um Estado‑Membro que prevê um regime nacional de registo e proteção das designações geográficas qualificadas, relativas a produtos agrícolas e a géneros alimentícios abrangidos pelo âmbito de aplicação deste regulamento, que apenas se aplica aos litígios relativos às violações dos direitos decorrentes dessas designações que opõem comerciantes desse Estado‑Membro que produzem, no território deste último, os produtos para os quais as referidas denominações foram registadas ao abrigo dessa legislação.

Quanto às despesas

61

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Décima Secção) declara:

 

O Regulamento (UE) n.o 1151/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 21 de novembro de 2012, relativo aos regimes de qualidade dos produtos agrícolas e dos géneros alimentícios, deve ser interpretado no sentido de que se opõe à legislação de um Estado‑Membro que prevê um regime nacional de registo e proteção das designações geográficas qualificadas, relativas a produtos agrícolas e a géneros alimentícios abrangidos pelo âmbito de aplicação deste regulamento, que apenas se aplica aos litígios relativos às violações dos direitos decorrentes dessas designações que opõem comerciantes desse Estado‑Membro que produzem, no território deste último, os produtos para os quais as referidas denominações foram registadas ao abrigo dessa legislação.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: búlgaro.

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