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Document 62021CJ0693

Acórdão do Tribunal de Justiça (Quarta Secção) de 14 de dezembro de 2023.
EDP España, SA e Naturgy Energy Group, SA, anciennement Gas Natural SDG, SA contra Comissão Europeia.
Recurso de decisão do Tribunal Geral — Auxílios de Estado — Medida de incentivo ambiental adotada por Espanha a favor das centrais a carvão — Decisão de dar início ao procedimento formal de investigação — Recurso de anulação.
Processos apensos C-693/21 P e C-698/21 P.

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2023:989

 ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quarta Secção)

14 de dezembro de 2023 ( *1 )

«Recurso de decisão do Tribunal Geral — Auxílios de Estado — Medida de incentivo ambiental adotada por Espanha a favor das centrais a carvão — Decisão de dar início ao procedimento formal de investigação — Recurso de anulação»

Nos processos apensos C‑693/21 P e C‑698/21 P,

que têm por objeto dois recursos de um acórdão do Tribunal Geral nos termos do artigo 56.o do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia interpostos, respetivamente, em 18 de novembro de 2021 e 19 de novembro de 2021,

EDP España, S. A., com sede em Oviedo (Espanha), representada inicialmente por J. L. Buendía Sierra, A. Lamadrid de Pablo e V. Romero Algarra, abogados, e, em seguida, por A. Lamadrid de Pablo e V. Romero Algarra, abogados,

recorrente no processo C‑693/21 P,

apoiada por:

Endesa Generación, S. A. U., com sede em Sevilha (Espanha), representada por M. B. Barrantes Díaz, abogada, e M. Petite, avocat,

interveniente no presente recurso,

sendo as outras partes no processo:

Naturgy Energy Group, S. A., anteriormente Gas Natural SDG, S. A., com sede em Madrid (Espanha), representada por J. Blanco Carol e F. E. González Díaz, abogados,

recorrente em primeira instância,

Comissão Europeia, representada por C.‑M. Carrega, P. Němečková e D. Recchia, na qualidade de agentes,

recorrida em primeira instância,

Generaciones Eléctricas Andalucía, S. L. U., anteriormente Viesgo Producción, S. L., com sede em Santander (Espanha), representada por L. de Pedro Martín e L. Ques Mena, abogados,

interveniente em primeira instância,

e

Naturgy Energy Group, S. A., anteriormente Gas Natural SDG, S. A., com sede em Madrid, representada por J. Blanco Carol e F. E. González Díaz, abogados,

recorrente no processo C‑698/21 P,

apoiada por:

Endesa Generación, S. A. U., com sede em Sevilha, representada por M. B. Barrantes Díaz, abogada, e M. Petite, avocat,

interveniente no presente recurso,

sendo as outras partes no processo:

Comissão Europeia, representada por C.‑M. Carrega, P. Němečková e D. Recchia, na qualidade de agentes,

recorrida em primeira instância,

EDP España, S. A., com sede em Oviedo, representada inicialmente por J. L. Buendía Sierra, A. Lamadrid de Pablo e V. Romero Algarra, abogados, e, em seguida, por A. Lamadrid de Pablo e V. Romero Algarra, abogados,

Generaciones Eléctricas Andalucía, S. L. U., anteriormente Viesgo Producción, S. L., com sede em Santander, representada por L. de Pedro Martín e L. Ques Mena, abogados,

intervenientes em primeira instância,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quarta Secção),

composto por: C. Lycourgos, presidente de secção, O. Spineanu‑Matei, J.‑C. Bonichot (relator), S. Rodin e L. S. Rossi, juízes,

advogado‑geral: G. Pitruzzella,

secretário: A. Calot Escobar,

vistos os autos,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 13 de julho de 2023,

profere o presente

Acórdão

1

Por meio dos seus recursos, a EDP España, S. A., (C‑693/21) e a Naturgy Energy Group, S. A., (C‑698/21) pedem a anulação do Acórdão do Tribunal Geral da União Europeia de 8 de setembro de 2021, Naturgy Energy Group/Comissão (T‑328/18, a seguir «acórdão recorrido», EU:T:2021:548), com o qual este negou provimento ao recurso de anulação, interposto pela Naturgy Energy Group, anteriormente Gas Natural SDG, S. A., da Decisão C (2017) 7733 final da Comissão, de 27 de novembro de 2017, relativa ao auxílio de Estado SA.47912 (2017/NN) — Medida de incentivo ambiental a favor das centrais térmicas a carvão (a seguir «decisão recorrida»).

Quadro jurídico

2

O artigo 4.o, n.o 4, do Regulamento (UE) 2015/1589 do Conselho, de 13 de julho de 2015, que estabelece as regras de execução do artigo 108.o [TFUE] (JO 2015, L 248, p. 9), prevê:

«Quando, após uma análise preliminar, a Comissão [Europeia] considerar que a medida notificada suscita dúvidas quanto à sua compatibilidade com o mercado interno, decidirá dar início ao procedimento formal de investigação nos termos do artigo 108.o, n.o 2, [TFUE] […].»

3

O artigo 6.o, n.o 1, deste regulamento enuncia:

«1.   A decisão de dar início a um procedimento formal de investigação resumirá os elementos pertinentes em matéria de facto e de direito, incluirá uma apreciação preliminar da Comissão quanto à natureza de auxílio da medida proposta e indicará os elementos que suscitam dúvidas quanto à sua compatibilidade com o mercado interno. A decisão incluirá um convite ao Estado‑Membro em causa e a outras partes interessadas para apresentarem as suas observações num prazo fixado, normalmente não superior a um mês. A Comissão pode prorrogar este prazo em casos devidamente justificados.»

4

O artigo 9.o, n.os 1 e 2, do referido regulamento indica:

«1.   Sem prejuízo do disposto no artigo 10.o, o procedimento formal de investigação será encerrado por via de decisão, nos termos dos n.os 2 a 5 do presente artigo.

2.   Quando a Comissão verificar que, eventualmente após alterações pelo Estado‑Membro em causa, uma medida notificada não constitui um auxílio, fará constar esse facto por via de decisão.»

Antecedentes do litígio e decisão recorrida

5

De 1998 a 2007, todas as centrais espanholas de produção de energia elétrica, independentemente da tecnologia utilizada, podiam beneficiar de um auxílio denominado «garantia de potência», destinado a assegurar a permanência e a instalação da capacidade de produção no sistema elétrico, com vista a alcançar um nível de garantia de abastecimento adequado, com exceção, todavia, das centrais de produção de eletricidade a partir de fontes de energia renovável, que eram objeto de uma medida de incentivo financeiro distinta.

6

Em 2007, o legislador espanhol atribuiu ao Ministério da Indústria, do Turismo e do Comércio poderes para substituir a garantia de potência por um novo incentivo financeiro denominado «remuneração pela capacidade».

7

Esta decisão foi implementada pelo Real Decreto 871/2007, por el que se ajuste las tarifas fixas a partir de del 1 de julio de 2007 (Decreto Real 871/2007 que adapta as Tarifas de Eletricidade a partir de 1 de julho de 2007), de 29 de junho de 2007 (BOE n.o 156, de 30 de junho de 2007, p. 28324), que prevê que a «remuneração pela capacidade» entrava em vigor a partir de 1 de outubro de 2007.

8

O regime da «remuneração pela capacidade» foi precisado pela Orden ITC/2794/2007, por la que se revisan las tarifas eléctricas a partir del 1 de octubre de 2007 (Decisão ITC/2794/2007, que revê as Tarifas de Eletricidade a partir de 1 de outubro de 2007), de 27 de setembro de 2007 (BOE n.o 234, de 29 de setembro de 2007, p. 39690, a seguir «Decreto ITC/2794/2007»).

9

Esta decisão prevê uma «remuneração pela capacidade» destinada, nomeadamente, a incentivar o investimento na produção. Para este efeito, comporta duas medidas de incentivo que beneficiam as instalações de produção sujeitas ao regime normal do sistema peninsular com uma potência instalada igual ou superior a 50 megawatts (MW).

10

A primeira medida de incentivo diz respeito às instalações em funcionamento após 1 de janeiro de 1998 e que ainda não tenham completado dez anos de funcionamento. O seu objetivo é promover a construção e o funcionamento efetivo de novas instalações através da compensação financeira dos custos dos investimentos. O seu montante ascende a 20000 euros por MW por ano.

11

A segunda medida de incentivo (a seguir «medida controvertida»), que o ministro da Indústria, do Turismo e do Comércio está habilitado a conceder em aplicação do anexo III, ponto 10, da Decisão ITC/2794/2007, diz respeito às ampliações ou a outras alterações substanciais das instalações existentes, bem como aos investimentos em novas instalações de tecnologias prioritárias para responder aos objetivos de política energética e de segurança do abastecimento.

12

O seu regime foi precisado pela Orden ITC/3860/2007, por la que se revisan las tarifas eléctricas a partir del 1 de enero de 2008 (Decisão ITC/3860/2007, que revê as Tarifas de Eletricidade a partir de 1 de janeiro de 2008), de 28 de dezembro de 2007 (BOE n.o 312, de 29 de dezembro de 2007, p. 53781, a seguir «Decisão ITC/3860/2007»).

13

Resulta da Decisão ITC/3860/2007 que só as centrais a carvão referidas no Plano Nacional de Redução das Emissões das Grandes Instalações de Combustão Existentes (a seguir «PNRE‑GIC»), aprovado por ato do Consejo de Ministros (Conselho de Ministros, Espanha), de 7 de dezembro de 2007, podem beneficiar da referida medida.

14

Estas centrais devem ser incluídas na denominada «bolha» de emissões estabelecida pelo PNRE‑GIC, que prescreve as quantidades autorizadas de emissões por empresa, para uma das causas enumeradas por este.

15

Além disso, os investimentos devem ter sido aprovados antes da data de entrada em vigor da Decisão ITC/2794/2007, em 1 de outubro de 2007, ou o seu pedido de aprovação deve ter sido apresentado pelo menos três meses antes desta data.

16

Em 2011, o benefício da medida controvertida foi alargado às centrais a carvão que tinham efetuado não só investimentos destinados a instalações de dessulfurização mas também outros investimentos «ambientais» destinados a reduzir as emissões de óxido de enxofre, efetuados antes da data de entrada em vigor da Decisão ITC/3860/2007.

17

Quando estas condições são respeitadas, as centrais a carvão têm direito a um auxílio financeiro no valor de 8750 euros por MW por ano, durante dez anos a contar da data da decisão que aprova o ato de entrada em funcionamento das instalações subvencionadas.

18

Em 29 de abril de 2015, a Comissão abriu um inquérito em matéria de auxílios de Estado no mercado dos mecanismos de capacidade em onze Estados‑Membros, entre os quais o Reino de Espanha.

19

Em 4 de abril de 2017, na sequência desse inquérito, a Comissão notificou às autoridades espanholas a abertura de um inquérito sobre a medida controvertida.

20

Em 27 de novembro de 2017, a Comissão adotou a decisão recorrida através da qual deu início ao procedimento formal de investigação previsto no artigo 108.o, n.o 2, TFUE.

21

Nesta decisão, a Comissão indicou ter chegado à conclusão preliminar de que a medida controvertida constituía um auxílio estatal e ter dúvidas quanto à sua compatibilidade com o mercado interno.

Recurso no Tribunal Geral e acórdão recorrido

22

Em 28 de maio de 2018, por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral, a Naturgy Energy Group, uma empresa espanhola que exerce, nomeadamente, atividades de produção de eletricidade através de centrais a carvão, pediu a anulação da decisão recorrida.

23

A EDP España e a Viesgo Producción, S. L., duas sociedades espanholas beneficiárias da medida controvertida, foram admitidas a intervir em seu apoio.

24

No acórdão recorrido, o Tribunal Geral indeferiu o pedido de anulação.

25

Em primeiro lugar, o Tribunal Geral julgou improcedente o primeiro fundamento, relativo à violação do dever de fundamentação no que respeita ao caráter seletivo da medida controvertida.

26

No n.o 60 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral recordou que, em aplicação do Regulamento 2015/1589, uma decisão de dar início ao procedimento formal de investigação pode limitar‑se a resumir os elementos pertinentes em matéria de facto e de direito, a incluir uma apreciação preliminar da medida estatal em causa para determinar se tem caráter de auxílio e a expor as razões que suscitam dúvidas quanto à sua compatibilidade com o mercado interno.

27

No n.o 61 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral acrescentou que a Comissão estava obrigada a dar início a esse procedimento se uma primeira investigação não lhe permitisse ultrapassar todas as dificuldades suscitadas pela questão de saber se a medida investigada constituía um auxílio na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, pelo menos quando, durante a primeira investigação, não tinha podido adquirir a convicção de que essa medida, admitindo que constituía um auxílio de Estado, era, em todo o caso, compatível com o mercado interno.

28

No n.o 62 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral recordou que a decisão de dar início ao procedimento tinha por objetivo permitir às partes interessadas participar eficazmente no procedimento formal de investigação. Também esclareceu que esta decisão incluía apreciações preliminares e que a Comissão não estava obrigada a esclarecer todas as questões potencialmente não resolvidas nesta fase.

29

No n.o 63 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral acrescentou que o caráter necessariamente provisório da qualificação de uma medida estatal como auxílio estatal nessa decisão era confirmado pelo artigo 9.o, n.o 2, do Regulamento 2015/1589, que prevê que, no termo do procedimento formal de investigação, a Comissão pode concluir que a medida não constitui um auxílio.

30

Nos n.os 64 e 65 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral julgou improcedentes os argumentos da recorrente relativos aos processos que deram origem aos Acórdãos de 20 de dezembro de 2017, Comunidad Autónoma de Galicia e Retegal/Comissão (C‑70/16 P, EU:C:2017:1002), e de 21 de dezembro de 2016, Comissão/Hansestadt Lübeck (C‑524/14 P, EU:C:2016:971), com o fundamento que o primeiro acórdão dizia respeito a uma decisão de encerramento do procedimento formal de investigação e que o segundo não tinha por objeto a fiscalização do respeito do dever de fundamentação.

31

No n.o 73 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral considerou que, tendo em conta a natureza da decisão recorrida, o seu teor, o seu conteúdo, o contexto da sua adoção e o conjunto das regras jurídicas pertinentes, a Naturgy Energy Group tinha estado em condições, apesar do caráter sumário da fundamentação relativa ao caráter seletivo da medida controvertida, de compreender as razões pelas quais a Comissão tinha considerado, a título preliminar, que esta se afigurava seletiva uma vez que favorecia certas centrais a carvão relativamente às outras ou em relação às centrais que produziam eletricidade a partir de outras tecnologias. O Tribunal Geral precisou que esta constatação resultava também do n.o 30 da decisão recorrida, que, embora não fizesse parte da fundamentação do caráter seletivo da medida controvertida, indicava que os beneficiários desta medida estavam em concorrência com outros produtores de eletricidade.

32

No n.o 74 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral rejeitou o argumento da Naturgy Energy Group de que a Comissão tinha violado o dever de fundamentação ao não explicar se a medida controvertida favorecia determinadas empresas ou produções relativamente a outras empresas que se encontravam numa situação factual e jurídica comparável à luz do objetivo prosseguido por esta medida. No mesmo número, sublinhou que o facto de impor, em todas as circunstâncias, na fase da análise preliminar constante de uma decisão de dar início ao procedimento formal de investigação, uma fundamentação relativa à comparabilidade das situações podia revelar‑se prematuro e antecipava as conclusões a retirar do resultado deste procedimento.

33

Por conseguinte, no n.o 81 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral julgou improcedente o primeiro fundamento.

34

Em segundo lugar, o Tribunal Geral também julgou improcedente o segundo fundamento, relativo à violação do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, no que respeita à seletividade da medida controvertida e, portanto, negou provimento ao recurso na sua totalidade.

35

Por último, o Tribunal Geral condenou a Naturgy Energy Group a suportar, além das suas próprias despesas, as despesas efetuadas pela Comissão e condenou igualmente a Viesgo Producción e a EDP España a suportarem as suas próprias despesas.

Tramitação processual no Tribunal de Justiça e pedidos das partes no recurso do acórdão do Tribunal Geral

36

Com os respetivos recursos, nos processos C‑693/21 P e C‑698/21 P, a EDP España e a Naturgy Energy Group, respetivamente interveniente e recorrente em primeira instância, pedem ao Tribunal de Justiça que anule tanto o acórdão recorrido como a decisão recorrida. Além disso, a EDP España pede a condenação da Comissão nas despesas do processo no Tribunal de Justiça e da Naturgy Energy Group nas despesas das duas instâncias.

37

Nos processos C‑693/21 P e C‑698/21 P, a Comissão pede ao Tribunal de Justiça que negue provimento aos recursos e condene as recorrentes nas despesas, ao passo que a Generaciones Elétricas Andalucía, S. L. U., anteriormente Viesgo Producción, interveniente em primeira instância, pede ao Tribunal de Justiça que anule o acórdão recorrido, que anule a decisão recorrida e que condene a Comissão nas despesas das duas instâncias.

38

Por Despachos do presidente do Tribunal de Justiça de 31 de maio de 2022, EDP España/Naturgy Energy Group e Comissão (C‑693/21 P, EU:C:2022:415), e de 31 de maio de 2022, Naturgy Energy Group/Comissão (C‑698/21 P, EU:C:2022:417), foi admitida a intervenção da Endesa Generación, S. A. U., em apoio das recorrentes. No seu articulado de intervenção no processo C‑698/21 P, pede ao Tribunal de Justiça que anule o acórdão recorrido, que anule a decisão recorrida e que condene a Comissão nas despesas.

39

Por Decisão de 31 de janeiro de 2023, os processos C‑693/21 P e C‑698/21 P foram apensados para efeitos da fase oral e do acórdão.

Quanto aos recursos do acórdão do Tribunal Geral

Quanto aos primeiros fundamentos, relativos à violação do dever de fundamentação no que diz respeito ao caráter seletivo da medida controvertida

Argumentos das partes

40

Com os seus primeiros fundamentos, que contêm três partes, a EDP España e a Naturgy Energy Group sustentam que o Tribunal Geral errou ao julgar improcedente o fundamento da Naturgy Energy Group relativo à violação do dever de fundamentação no que respeita ao caráter seletivo da medida controvertida.

41

Com as primeiras partes destes primeiros fundamentos, estas alegam que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito, nos n.os 64 e 65 do acórdão recorrido, na sua interpretação dos princípios decorrentes dos Acórdãos de 21 de dezembro de 2016, Comissão/Hansestadt Lübeck (C‑524/14 P, EU:C:2016:971), e de 20 de dezembro de 2017, Comunidad Autónoma de Galicia e Retegal/Comissão (C‑70/16 P, EU:C:2017:1002).

42

A EDP España e a Naturgy Energy Group consideram que as exigências em matéria de fundamentação das decisões da Comissão são as mesmas, quer se trate de uma decisão de dar início ou de encerrar o procedimento formal de investigação. Assim, os princípios decorrentes do Acórdão de 20 de dezembro de 2017, Comunidad Autónoma de Galicia e Retegal/Comissão (C‑70/16 P, EU:C:2017:1002), não são apenas pertinentes para as decisões de encerramento.

43

Contrariamente ao que o Tribunal Geral indicou no n.o 65 do acórdão recorrido, o Tribunal de Justiça pronunciou‑se, além disso, no Acórdão de 21 de dezembro de 2016, Comissão/Hansestadt Lübeck (C‑524/14 P, EU:C:2016:971), sobre o dever de fundamentação relativo ao caráter seletivo de uma medida.

44

Com as segundas partes dos seus primeiros fundamentos, as recorrentes sustentam que, no n.o 66 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral interpretou de modo errado os princípios decorrentes dos Acórdãos de 10 de março de 2016, HeidelbergCement/Comissão (C‑247/14 P, EU:C:2016:149), e de 16 de outubro de 2014, Alcoa Trasformazioni/Comissão (T‑177/10, EU:T:2014:897), ao considerar que o contexto da adoção de um ato permitia «sanar o caráter sucinto, vago e genérico» da sua fundamentação.

45

O objetivo do dever de fundamentação é permitir ao destinatário conhecer a justificação de uma decisão e ao órgão jurisdicional competente exercer a sua fiscalização, pelo que, contrariamente ao que resulta do n.o 72 do acórdão recorrido, a fundamentação do n.o 28 da decisão recorrida é manifestamente insuficiente.

46

Ora, embora tenha reconhecido, no n.o 73 do acórdão recorrido, o caráter «sumário» do raciocínio da Comissão relativo à natureza seletiva da medida controvertida, o Tribunal Geral tentou saná‑lo, no n.o 66 do acórdão recorrido, através da remissão para o contexto em que a Naturgy Energy Group exerce as suas atividades e para os elementos contidos na sua petição em primeira instância.

47

Por outro lado, contrariamente ao que o Tribunal Geral sustentou, no n.o 74 do acórdão recorrido, o facto de a decisão recorrida ser uma decisão de dar início a um procedimento formal de investigação não dispensa a Comissão de proceder à análise da comparabilidade com vista a apreciar o critério da seletividade.

48

Além disso, há que ter em conta as consequências jurídicas de dar início a um procedimento formal de investigação, recordadas no n.o 28 do Acórdão de 21 de dezembro de 2016, Comissão/Hansestadt Lübeck (C‑524/14 P, EU:C:2016:971), relativamente às pessoas beneficiárias da medida que é objeto deste procedimento.

49

Com as terceiras partes dos seus primeiros fundamentos, as recorrentes sustentam, por último, que, nos n.os 68 a 73 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral também violou o dever de fundamentação ao reconhecer o caráter «sumário» da fundamentação da decisão recorrida ao mesmo tempo que a tentava «reconstituir». Além disso, e em todo o caso, o ponto 30 da decisão recorrida, a que o Tribunal Geral fez referência no n.o 73 do acórdão recorrido, não é pertinente para explicar o caráter seletivo da medida.

50

A Generaciones Elétricas Andalucía interveio em apoio dos pedidos das recorrentes nos processos C‑693/21 P e C‑698/21 P, com argumentos semelhantes.

51

A Comissão considera que o primeiro fundamento invocado nos processos C‑693/21 P e C‑698/21 P deve ser julgado improcedente.

52

Esta alega que, nos n.os 59 a 63 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral recordou, sem cometer um erro de direito, as exigências associadas ao dever de fundamentação e que tinha, em seguida, rejeitado corretamente, em especial nos n.os 64 e 66 a 77 do acórdão recorrido, os argumentos da recorrente e dos intervenientes em primeira instância em apoio do caráter insuficiente da fundamentação no que respeita ao caráter seletivo da medida controvertida.

53

A Comissão acrescenta que, para declarar, no Acórdão de 20 de dezembro de 2017, Comunidad Autónoma de Galicia e Retegal/Comissão (C‑70/16 P, EU:C:2017:1002), que o dever de fundamentação tinha sido violado, o Tribunal de Justiça se baseou na circunstância, por um lado, de a decisão em causa nesse processo não conter nenhuma indicação que permita compreender o caráter seletivo da medida em causa e, por outro, de a seletividade não poder resultar apenas da precisão de que a medida investigada só se aplicava a um setor de atividade. Segundo a Comissão, a situação é diferente no caso em apreço, visto que, para fundamentar a seletividade da medida controvertida, se baseou na circunstância de essa medida só beneficiar determinadas centrais térmicas que utilizam o carvão como combustível principal. Além disso, e em todo o caso, nesse acórdão, o Tribunal de Justiça não teve de ter em conta o contexto específico de dar início a um procedimento formal de investigação.

54

A Comissão sustenta também que o Tribunal Geral não procedeu, no n.o 66 do acórdão recorrido, a uma interpretação e a uma aplicação erradas dos Acórdãos de 10 de março de 2016, HeidelbergCement/Comissão (C‑247/14 P, EU:C:2016:149), e de 16 de outubro de 2014, Alcoa Trasformazioni/Comissão (T‑177/10, EU:T:2014:897), uma vez que se limitou a constatar que a decisão recorrida tinha sido adotada num contexto bem conhecido da recorrente em primeira instância.

55

Quanto ao argumento de que o Tribunal Geral tentou sanar o caráter sumário da fundamentação baseando‑se no contexto e no conhecimento pela recorrente em primeira instância do quadro regulamentar aplicável, a Comissão indica que, ao contrário da fundamentação do ato em causa no Acórdão de 10 de março de 2016, HeidelbergCement/Comissão (C‑247/14 P, EU:C:2016:149), a fundamentação da decisão recorrida não é vaga, nem genérica, nem extremamente sucinta.

56

A Comissão acrescenta que a fundamentação da decisão recorrida pode ser sucinta se as partes interessadas puderem compreender as razões pelas quais esta considerou, a título preliminar, que a medida controvertida é seletiva e que o Tribunal Geral pode exercer a sua fiscalização da legalidade. A Comissão baseia‑se, nomeadamente, no artigo 6.o, n.o 1, do Regulamento 2015/1589.

57

No que respeita à alegada inexistência de qualquer raciocínio relativo à seletividade da medida controvertida, o Tribunal Geral salientou corretamente, no n.o 75 do acórdão recorrido, que a recorrente em primeira instância compreendeu que a Comissão tinha demonstrado que a medida era concedida exclusivamente às centrais a carvão, excluindo as centrais que utilizam outras tecnologias. No que respeita às consequências jurídicas desfavoráveis que decorrem do início de um procedimento formal de investigação para os beneficiários de uma medida em fase de execução, estas são hipotéticas no caso em apreço.

58

Quanto ao argumento das recorrentes de que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito ao basear‑se, no n.o 73 do acórdão recorrido, em passagens da decisão recorrida que não figuravam necessariamente na parte desta decisão consagrada à análise da seletividade, a Comissão alega que a constatação enunciada nesse número apenas serviu para corroborar a sua análise.

59

Além disso, e em todo o caso, o respeito do dever de fundamentação não pressupõe que as decisões da Comissão sigam uma estrutura particular e basta, segundo esta instituição, que as partes estejam em condições de conhecer as razões que justificaram a decisão em causa.

60

Além disso, há que ter em conta diferentes elementos da decisão e examinar o seu conteúdo «no seu conjunto» (Acórdão de 25 de julho de 2018, Comissão/Espanha e o., C‑128/16 P, EU:C:2018:591, n.o 93).

Apreciação do Tribunal de Justiça

61

Decorre de jurisprudência constante que a fundamentação exigida pelo artigo 296.o TFUE deve ser adaptada à natureza do ato em causa e revelar clara e inequivocamente o raciocínio da instituição, autora do ato impugnado, para permitir aos interessados conhecerem as justificações da medida tomada e ao juiz da União Europeia exercer a sua fiscalização. A exigência de fundamentação deve ser apreciada em função de todas as circunstâncias do caso concreto, designadamente do conteúdo do ato, da natureza dos fundamentos invocados e do interesse que os destinatários do ato ou outras pessoas direta e individualmente interessadas no mesmo podem ter em obter explicações. Não se exige que a fundamentação especifique todos os elementos de facto e de direito pertinentes, uma vez que a questão de saber se a fundamentação de um ato satisfaz as exigências do artigo 296.o TFUE deve ser apreciada tendo em conta não só o seu teor mas também o seu contexto e o conjunto de regras jurídicas que regulam a matéria em causa (Acórdão de 10 de março de 2016, HeidelbergCement/Comissão, C‑247/14 P, EU:C:2016:149, n.o 16 e jurisprudência referida).

62

No que respeita a uma decisão da Comissão de dar início a um procedimento formal de investigação, importa recordar que o artigo 6.o, n.o 1, do Regulamento 2015/1589 prevê que essa decisão resumirá os elementos pertinentes em matéria de facto e de direito, incluirá uma «apreciação preliminar» da Comissão quanto à natureza de auxílio da medida estatal em causa e indicará os elementos que suscitam dúvidas quanto à sua compatibilidade com o mercado interno.

63

Além disso, e como o Tribunal Geral salientou, com razão, no n.o 63 do acórdão recorrido, o caráter provisório da qualificação de uma medida estatal como auxílio de Estado nessa decisão é confirmado pelo artigo 9.o, n.o 2, do Regulamento 2015/1589, que prevê que, no termo do procedimento formal de investigação, a Comissão pode verificar que essa medida não constitui um auxílio.

64

Todavia, como resulta do artigo 4.o, n.o 4, deste regulamento, não deixa de ser certo que, no âmbito de uma decisão de dar início a um procedimento formal de investigação, a Comissão considera, ainda que apenas a título preliminar, tanto a qualificação de auxílio de Estado da medida investigada como a existência de dúvidas quanto à sua compatibilidade com o mercado interno.

65

Além disso, esta decisão produz efeitos jurídicos autónomos, em especial no que respeita à suspensão da medida investigada (v., neste sentido, Acórdão de 24 de outubro de 2013, Deutsche Post/Comissão, C‑77/12 P, EU:C:2013:695, n.o 53 e jurisprudência referida). Os órgãos jurisdicionais nacionais devem abster‑se de tomar decisões que vão contra uma tal decisão da Comissão, ainda que a mesma tenha natureza provisória. Por conseguinte, esses órgãos jurisdicionais são obrigados a adotar todas as medidas necessárias para extrair as consequências de uma eventual violação da obrigação de suspensão da execução da medida em causa (v., neste sentido, Acórdão de 21 de novembro de 2013, Deutsche Lufthansa, C‑284/12, EU:C:2013:755, n.os 41 e 42).

66

Por último, importa também ter em conta o facto de que, em conformidade com o artigo 6.o, n.o 1, do Regulamento 2015/1589, o procedimento formal de investigação permite ao Estado‑Membro em causa e às outras partes interessadas apresentarem as suas observações sobre a análise da Comissão.

67

Daqui resulta que, mesmo que a análise da Comissão tenha caráter provisório, esta instituição está, no entanto, obrigada a revelar clara e inequivocamente as razões pelas quais considerou que a medida em causa era suscetível de constituir um auxílio de Estado.

68

Por conseguinte, a análise do Tribunal Geral, no n.o 64 do acórdão recorrido, segundo a qual eram improcedentes os argumentos da Naturgy Energy Group e dos intervenientes em primeira instância relativos à violação do dever de fundamentação da decisão recorrida, relativos ao processo que deu origem ao Acórdão de 20 de dezembro de 2017, Comunidad Autónoma de Galicia e Retegal/Comissão (C‑70/16 P, EU:C:2017:1002), pelo simples facto de esse processo ter por objeto uma decisão da Comissão de encerramento do procedimento formal de investigação, enferma de um erro de direito.

69

A este respeito, não se pode, em princípio, considerar que não é pertinente a jurisprudência do Tribunal de Justiça relativa ao dever de fundamentação da decisão de encerramento do procedimento formal de investigação no que respeita à decisão de dar início a este procedimento.

70

Além disso, o Tribunal Geral cometeu um erro de direito, no n.o 74 do acórdão recorrido, quando declarou que a Comissão não tinha a obrigação de apresentar, ainda que sucintamente, as razões pelas quais a medida controvertida favorecia determinadas empresas ou produções em relação a outras empresas que se encontravam numa situação factual e jurídica comparável, com o fundamento de que, nomeadamente, impor em todas as circunstâncias, na fase da análise preliminar que figura numa decisão de dar início ao procedimento formal de investigação, uma fundamentação relativa à comparabilidade das situações pode revelar‑se prematuro.

71

Com efeito, importa recordar que resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que uma medida de que apenas beneficia um setor de atividade ou uma parte das empresas deste setor não é necessariamente seletiva e que apenas o é se, no âmbito de um determinado regime jurídico, tiver por efeito beneficiar certas empresas relativamente a outras que pertencem a outros setores ou ao mesmo setor e que se encontram, à luz do objetivo prosseguido por este regime, numa situação factual e jurídica comparável (v., neste sentido, Acórdãos de 21 de dezembro de 2016, Comissão/Hansestadt Lübeck, C‑524/14 P, EU:C:2016:971, n.o 58, e de 20 de dezembro de 2017, Comunidad Autónoma de Galicia e Retegal/Comissão, C‑70/16 P, EU:C:2017:1002, n.o 61).

72

Resulta do exposto que, se a Comissão considerar, para decidir dar início a um procedimento formal de investigação, que uma medida é seletiva, incumbe-lhe especificar, ainda que de forma sucinta, os motivos pelos quais considera que, no âmbito de um dado regime jurídico, esta medida tem por efeito beneficiar certas empresas em relação a outras que se encontram, à luz do objetivo prosseguido por este regime, numa situação factual e jurídica comparável.

73

Todavia, não resulta de modo algum dos n.os 72 e 73 do acórdão recorrido, para os quais remete o seu n.o 74, que a Comissão tenha exposto os motivos pelos quais as centrais a carvão que figuram no PNRE‑GIC, que beneficiam da medida controvertida, se encontravam numa situação factual e jurídica comparável à de outras centrais, que não beneficiavam desta medida, à luz do objetivo por esta prosseguido.

74

Com efeito, no n.o 72 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral limitou‑se a constatar que a decisão recorrida indicava que as centrais a carvão que figuram no PNRE‑GIC beneficiavam de modo exclusivo da medida controvertida, para considerar que o termo «exclusivamente», que figura no seu n.o 28, permitia distinguir as centrais a carvão inscritas no PNRE‑GIC das centrais que utilizam outra tecnologia ou de qualquer central que não estivesse incluída neste plano.

75

Por outro lado, no n.o 73 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral remeteu, de forma geral, para a natureza da decisão recorrida, o seu teor, o seu conteúdo, o contexto da sua adoção e o conjunto das regras jurídicas pertinentes para considerar que, apesar do caráter — reconhecido por si próprio como «sumário» — da fundamentação relativa ao caráter seletivo da medida controvertida, a recorrente em primeira instância tinha podido compreender as razões pelas quais a Comissão considerou, a título preliminar, que a medida controvertida se afigurava seletiva.

76

Importa indicar que, embora, no mesmo número, o Tribunal Geral, para fundamentar a sua análise, se tenha referido também ao n.o 30 da decisão recorrida, que menciona a existência de uma relação de concorrência entre os beneficiários da medida e outros produtores de eletricidade, tal elemento também não é suficiente para fazer prova bastante da comparabilidade das situações entre as centrais que beneficiam da medida controvertida e as que dela não beneficiam (v., por analogia, Acórdão de 21 de dezembro de 2016, Comissão/Hansestadt Lübeck, C‑524/14 P, EU:C:2016:971, n.o 59).

77

Importa acrescentar que, embora, para apreciar a fundamentação de uma decisão, haja necessidade de examinar o conteúdo da mesma no seu conjunto (v., neste sentido, Acórdão de 25 de julho de 2018, Comissão/Espanha e o., C‑128/16 P, EU:C:2018:591, n.o 93), este exame não pode suprir a falta de qualquer indicação da comparabilidade das situações, como no caso em apreço, entre as centrais que beneficiam da medida controvertida e as que dela não beneficiam.

78

Tendo em conta o que precede, há que julgar procedentes os primeiros fundamentos das recorrentes nos processos C‑693/21 P e C‑698/21 P.

79

Por conseguinte, sem que seja necessário analisar os segundos fundamentos invocados a título subsidiário pelas recorrentes em apoio dos respetivos recursos e relativos à violação do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, no que respeita ao critério da seletividade, há que anular o acórdão recorrido.

Quanto ao recurso no Tribunal Geral

80

Em conformidade com o artigo 61.o, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, este último pode, em caso de anulação da decisão do Tribunal Geral, decidir definitivamente o litígio, se estiver em condições de ser julgado.

81

É o que acontece no caso em apreço, uma vez que os fundamentos do recurso de anulação em primeira instância da decisão recorrida foram objeto de um debate contraditório no Tribunal Geral e que o seu exame não exige adotar nenhuma medida suplementar de organização do processo ou de instrução do processo (v., neste sentido, Acórdão de 16 de março de 2023, Comissão e o./Pharmaceutical Works Polpharma, C‑438/21 P a C‑440/21 P, EU:C:2023:213, n.o 98).

82

A este respeito, importa salientar que, pelos motivos enunciados nos n.os 61 a 67 do presente acórdão, numa decisão de dar início a um procedimento formal de investigação, a Comissão é obrigada, por força do artigo 296.o TFUE, a revelar clara e inequivocamente as razões pelas quais considerou que a medida em causa era suscetível de constituir um auxílio de Estado. Como foi exposto no n.o 72 do presente acórdão, se esta instituição considerar que uma medida é seletiva, incumbe‑lhe precisar, mesmo de forma sucinta, os motivos pelos quais considera que, no âmbito de um dado regime jurídico, esta medida tem por efeito beneficiar certas empresas em relação a outras que se encontram, à luz do objetivo prosseguido por este regime, numa situação factual e jurídica comparável.

83

Ora, basta salientar que, no caso em apreço, pelos motivos enunciados nos n.os 73 a 77 do presente acórdão, a Comissão não respeitou a exigência de fundamentação que lhe incumbe por força do artigo 296.o TFUE, uma vez que não expôs os motivos pelos quais a medida controvertida beneficia certas empresas ou produções relativamente a outras empresas que se encontram numa situação factual e jurídica comparável e tem, por conseguinte, caráter seletivo.

84

Por conseguinte, há que julgar procedente o primeiro fundamento do recurso da Naturgy Energy Group em primeira instância e anular a decisão recorrida, sem que seja necessário examinar o segundo fundamento desse recurso.

Quanto às despesas

85

Nos termos do artigo 184.o, n.o 2, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, se o recurso for julgado procedente e o Tribunal de Justiça decidir definitivamente o litígio, decidirá igualmente sobre as despesas.

86

Segundo o artigo 138.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, aplicável ao processo de recurso de uma decisão do Tribunal Geral por força do artigo 184.o, n.o 1, deste regulamento, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Nos presentes processos, tendo a Comissão sido vencida e tendo a Naturgy Energy Group e a EDP España pedido a sua condenação nas despesas, há que condená‑la a suportar as suas próprias despesas e as despesas efetuadas pela Naturgy Energy Group em primeira instância e no Tribunal de Justiça e pela EDP España no Tribunal de Justiça.

87

O artigo 184.o, n.o 4, do Regulamento de Processo, prevê que um interveniente em primeira instância, quando não tenha ele próprio interposto o recurso da decisão do Tribunal Geral, só pode ser condenado nas despesas do processo de recurso se tiver participado na fase escrita ou oral do processo no Tribunal de Justiça. Quando participa no processo, o Tribunal de Justiça pode decidir que essa parte suporte as suas próprias despesas. Em conformidade com estas disposições, a Generaciones Elétricas Andalucía, interveniente em primeira instância, que participou no processo no Tribunal de Justiça, suportará as suas próprias despesas.

88

Por último, segundo o artigo 140.o, n.o 3, do Regulamento de Processo, aplicável ao processo de recurso de uma decisão do Tribunal Geral por força do artigo 184.o, n.o 1, deste regulamento, o Tribunal de Justiça pode decidir que um interveniente diferente dos mencionados no artigo 140.o, n.os 1 e 2, do referido regulamento suportará as suas próprias despesas. Em conformidade com estas disposições, a Endesa Generación, interveniente nos processos C‑693/21 P e C‑698/21 P, suportará as suas próprias despesas.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Quarta Secção) decide:

 

1)

É anulado o Acórdão do Tribunal Geral da União Europeia de 8 de setembro de 2021, Naturgy Energy Group/Comissão (T‑328/18, EU:T:2021:548).

 

2)

É anulada a Decisão C (2017) 7733 final da Comissão, de 27 de novembro de 2017, relativa ao auxílio de Estado SA.47912 (2017/NN) — Medida de incentivo ambiental a favor das centrais térmicas a carvão.

 

3)

A Comissão Europeia é condenada a suportar, além das suas próprias despesas, as despesas efetuadas pela Naturgy Energy Group, S. A., relativas quer ao processo em primeira instância no processo T‑328/18 quer no processo de recurso nos processos C‑693/21 P e C‑698/21 P, e as despesas efetuadas pela EDP España, S. A., relativas ao seu recurso no processo C‑693/21 P.

 

4)

A Generaciones Eléctricas Andalucía, S. L. U., suporta as suas próprias despesas.

 

5)

A Endesa Generación, S. A. U., suporta as suas próprias despesas.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: espanhol.

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