Choose the experimental features you want to try

This document is an excerpt from the EUR-Lex website

Document 62021CJ0680

Acórdão do Tribunal de Justiça (Grande Secção) de 21 de dezembro de 2023.
UL e SA Royal Antwerp Football Club contra Union royale belge des sociétés de football association ASBL (URBSFA).
Reenvio prejudicial — Concorrência — Mercado interno — Regulamentação instituída por associações desportivas, internacional e nacional — Futebol profissional — Entidades de direito privado investidas de poderes de regulamentação, de fiscalização e de sanção — Regras que impõem que os clubes de futebol profissional recorram a um número mínimo de jogadores “formados localmente” — Artigo 101.o, n.o 1, TFUE — Decisão de uma associação de empresas que prejudica a concorrência — Conceitos de “objetivo” e de “efeito” anticoncorrenciais — Isenção ao abrigo do artigo 101.o, n.o 3, TFUE — Requisitos — Artigo 45.o TFUE — Discriminação indireta em razão da nacionalidade — Obstáculo à livre circulação de trabalhadores — Justificação — Requisitos — Ónus da prova.
Processo C-680/21.

Court reports – general – 'Information on unpublished decisions' section

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2023:1010

 ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção)

21 de dezembro de 2023 ( *1 )

Índice

 

I. Quadro jurídico

 

A. Estatutos da UEFA

 

B. Regulamentação da UEFA e da URBSFA relativa aos «jogadores formados localmente»

 

1. Regulamentação da UEFA

 

2. Regulamentação da URBSFA

 

II. Factos no processo principal e questões prejudiciais

 

III. Quanto à admissibilidade

 

A. Quanto aos requisitos processuais de adoção da decisão de reenvio

 

B. Quanto ao conteúdo da decisão de reenvio

 

C. Quanto à realidade do litígio e à pertinência das questões submetidas ao Tribunal de Justiça

 

D. Quanto à dimensão transfronteiriça do litígio no processo principal

 

IV. Quanto às questões prejudiciais

 

A. Observações preliminares

 

1. Quanto ao objeto do processo principal

 

2. Quanto à aplicabilidade do direito da União ao desporto e à atividade das associações desportivas

 

3. Quanto ao artigo 165.o TFUE

 

B. Quanto às questões prejudiciais na medida em que dizem respeito ao artigo 101.o TFUE

 

1. Quanto à interpretação do artigo 101.o, n.o 1, TFUE

 

a) Quanto à existência de uma «decisão de uma associação de empresas»

 

b) Quanto à afetação do comércio entre Estados‑Membros

 

c) Quanto ao conceito de «comportamento que tem por “objetivo” ou por “efeito” prejudicar a concorrência» e quanto à caracterização da existência de tal comportamento

 

1) Quanto à caracterização da existência de um comportamento que tem por «objetivo» impedir, restringir ou falsear a concorrência

 

2) Quanto à caracterização da existência de um comportamento que tem por «efeito» impedir, restringir ou falsear a concorrência

 

3) Quanto à qualificação, enquanto decisão de uma associação de empresas que tem por «objetivo» ou por «efeito» restringir a concorrência, das regras que impõem que os clubes tenham nas suas equipas uma quota mínima de jogadores «formados localmente»

 

d) Quanto à possibilidade de se considerar que determinados comportamentos específicos não são abrangidos pelo artigo 101.o, n.o 1, TFUE

 

2. Quanto à interpretação do artigo 101.o, n.o 3, TFUE

 

C. Quanto às questões prejudiciais na medida em que dizem respeito ao artigo 45.o TFUE

 

1. Quanto à existência de discriminação indireta ou de um obstáculo à liberdade de circulação de trabalhadores

 

2. Quanto à existência de uma eventual justificação

 

V. Quanto às despesas

«Reenvio prejudicial — Concorrência — Mercado interno — Regulamentação instituída por associações desportivas, internacional e nacional — Futebol profissional — Entidades de direito privado investidas de poderes de regulamentação, de fiscalização e de sanção — Regras que impõem que os clubes de futebol profissional recorram a um número mínimo de jogadores “formados localmente” — Artigo 101.o, n.o 1, TFUE — Decisão de uma associação de empresas que prejudica a concorrência — Conceitos de “objetivo” e de “efeito” anticoncorrenciais — Isenção ao abrigo do artigo 101.o, n.o 3, TFUE — Requisitos — Artigo 45.o TFUE — Discriminação indireta em razão da nacionalidade — Obstáculo à livre circulação de trabalhadores — Justificação — Requisitos — Ónus da prova»

No processo C‑680/21,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 267.o TFUE, apresentado pelo Tribunal de première instance francophone de Bruxelles (Tribunal de Primeira Instância de Língua Francesa de Bruxelas, Bélgica), por Decisão de 15 de outubro de 2021, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 11 de novembro de 2021, no processo

UL,

SA Royal Antwerp Football Club

contra

Union royale belge des sociétés de football association ASBL (URBSFA),

sendo interveniente:

Union des associations européennes de football (UEFA),

TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção),

composto por: K. Lenaerts, presidente, L. Bay Larsen, vice‑presidente, A. Arabadjiev, K. Jürimäe, C. Lycourgos e O. Spineanu‑Matei, presidentes de secção, M. Safjan, L. S. Rossi, I. Jarukaitis, A. Kumin, N. Jääskinen, N. Wahl, J. Passer (relator), M. L. Arastey Sahún e M. Gavalec, juízes,

advogado‑geral: M. Szpunar,

secretária: M. Krausenböck, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 15 de novembro de 2022,

considerando as observações apresentadas:

em representação de UL, por J.‑L. Dupont, S. Engelen, M. Hissel e F. Stockart, avocats,

em representação da SA Royal Antwerp Football Club, por J.‑L. Dupont, M. Hissel e F. Stockart, avocats,

em representação da Union royale belge des sociétés de football association ASBL (URBSFA), por N. Cariat, E. Matthys e A. Stévenart, avocats,

em representação da Union des associations européennes de football (UEFA), por B. Keane, D. Slater e D. Waelbroeck, avocats,

em representação do Governo Belga, por P. Cottin, J.‑C. Halleux, C. Pochet e L. Van den Broeck, na qualidade de agentes,

em representação do Governo Helénico, por K. Boskovits, na qualidade de agente,

em representação do Governo Polaco, por B. Majczyna, A. Kramarczyk-Szaładzińska e M. Wiącek, na qualidade de agentes,

em representação do Governo Português, por P. Barros da Costa, R. Capaz Coelho e C. Chambel Alves, na qualidade de agentes,

em representação do Governo Romeno, por L.‑E. Baţagoi, E. Gane, L. Liţu e A. Rotăreanu, na qualidade de agentes,

em representação do Governo Sueco, por H. Eklinder, J. Lundberg, C. Meyer‑Seitz, A. Runeskjöld, M. Salborn Hodgson, R. Shahsavan Eriksson, H. Shev e O. Simonsson, na qualidade de agentes,

em representação da Comissão Europeia, por S. Baches Opi, B.‑R. Killmann, D. Martin e G. Meessen, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 9 de março de 2023,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial diz respeito à interpretação dos artigos 45.o e 101.o TFUE.

2

Esse pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe UL e a SA Royal Antwerp Football Club (a seguir «Royal Antwerp») à Union royale belge des sociétés de football association ASBL (URBSFA) a respeito de um pedido de anulação de uma decisão arbitral que julgou parcialmente inadmissível e parcialmente improcedente uma ação de anulação e de indemnização intentada por UL e pelo Royal Antwerp contra a Union des associations européennes de football (UEFA) e a URBSFA.

I. Quadro jurídico

A. Estatutos da UEFA

3

A UEFA é uma associação de direito privado sediada na Suíça. De acordo com o artigo 2.o dos seus estatutos, na versão adotada durante o ano de 2021 (a seguir «Estatutos da UEFA»), esta tem como finalidades, nomeadamente, «tratar todas as questões que dizem respeito ao futebol europeu», «supervisionar e fiscalizar o desenvolvimento do futebol na Europa em todas as suas formas» e «preparar e organizar competições internacionais e torneios internacionais de futebol em todas as suas formas a nível europeu».

4

Em conformidade com o artigo 5.o dos Estatutos da UEFA, qualquer associação que esteja sediada num país europeu reconhecido como Estado independente pela maioria dos membros da Organização das Nações Unidas (ONU) e que seja responsável pela organização do futebol nesse país pode tornar‑se membro da UEFA. Por força do artigo 7.o‑A desses estatutos, tal qualidade implica a obrigação de as associações em causa respeitarem, nomeadamente, os estatutos, os regulamentos e as decisões da UEFA e assegurarem o seu cumprimento, no país onde estão sediadas, pelas ligas profissionais que lhes estão subordinadas, bem como pelos clubes e pelos jogadores. Na prática, mais de 50 federações nacionais de futebol são atualmente membros da UEFA.

5

Nos termos dos artigos 11.o e 12.o dos referidos estatutos, os órgãos da UEFA incluem, nomeadamente, um «órgão supremo» designado «Congresso» e um «Comité executivo».

B. Regulamentação da UEFA e da URBSFA relativa aos «jogadores formados localmente»

1.   Regulamentação da UEFA

6

Em 2 de fevereiro de 2005, o Comité executivo da UEFA adotou regras que preveem que os clubes de futebol profissional que participem em competições internacionais de futebol interclubes organizadas pela UEFA devem registar na ficha de jogo um numero máximo de 25 jogadores, no qual deve estar incluído um número mínimo de jogadores qualificados de «jogadores formados localmente» e definidos como jogadores que, independentemente da sua nacionalidade, foram formados durante pelo menos três anos, entre os 15 e os 21 anos, pelo seu clube ou por outro clube filiado na mesma federação nacional de futebol (a seguir «regras relativas aos “jogadores formados localmente”»).

7

Em 21 de abril de 2005, as regras relativas aos «jogadores formados localmente» foram aprovadas pelo Congresso da UEFA numa reunião em que estiveram presentes todas as federações nacionais de futebol membros desta, que se realizou em Taline (Estónia) (a seguir «congresso de Taline»).

8

Desde a época de 2007/2008, essas regras preveem que os clubes de futebol profissional que participem numa competição internacional de futebol interclubes organizada pela UEFA devem registar na ficha de jogo um número mínimo de 8 «jogadores formados localmente», numa lista que contenha um número máximo de 25 jogadores. Desses 8 jogadores, pelo menos 4 devem ter sido formados pelo clube que os regista.

2.   Regulamentação da URBSFA

9

A URBSFA é uma associação sediada na Bélgica. Tem por objeto assegurar a organização e a promoção do futebol nesse Estado‑Membro. Como tal, é membro tanto da UEFA como da Fédération internationale de football association (FIFA).

10

Em 2011, a URBSFA incluiu no seu regulamento federal regras relativas aos «jogadores formados localmente».

11

Na versão aplicável durante o processo arbitral que antecedeu o processo principal, essas regras tinham a seguinte redação:

«Artigo P335.11 — Divisões de futebol profissional 1A e 1B: envio da lista “Squad size limit”

1. Listas a enviar

11. Todos os clubes de futebol profissional 1A e 1B devem enviar as seguintes listas […] e mantê‑las atualizadas:

uma lista com um número máximo de 25 jogadores […], dos quais pelo menos 8 devem ser formados por clubes belgas, na aceção do [artigo] P1422.12, sendo que pelo menos 3 jogadores devem preencher o requisito complementar reproduzido [no artigo] P1422.13. Se estes requisitos mínimos não estiverem preenchidos, estes jogadores não poderão ser substituídos por jogadores que não possuam estas qualidades.

[…]

Artigo P1422 — Registo obrigatório na ficha de jogo

1. Para as equipas principais dos clubes de futebol profissional

11. No âmbito da sua participação nas competições oficiais das equipas principais […], os clubes de futebol profissional estão obrigados a registar na ficha de jogo um número mínimo de 6 jogadores que tenham sido formados por um clube belga, dos quais pelo menos 2 preencham o requisito complementar reproduzido no ponto 13, infra. Quando o clube não possa registar o número mínimo de jogadores exigido pelo número anterior, não os pode substituir através do registo de jogadores que não possuam essa qualidade.

12. Considera‑se que foram formados por um clube belga os jogadores que, antes do seu 23.o aniversário, tenham preenchido todos os requisitos para jogar em jogos oficiais durante, pelo menos, três épocas completas por um clube na Bélgica.

13. Preenchem o requisito complementar os jogadores que, antes do seu 21.o aniversário, tenham sido utilizados durante, pelo menos, três épocas completas num clube na Bélgica.

[…]

15. Os clubes de futebol profissional 1A e 1B só podem registar na ficha de jogo jogadores constantes das listas “Squad size limit” do Clube ([artigo] P335).

16. Em caso de violação das regras supramencionadas, o órgão federal competente aplicará as sanções previstas para o registo de jogadores que não preencham os requisitos para jogar em jogos oficiais […], com exceção das coimas.»

12

Posteriormente, essas regras foram alteradas. Na versão à qual o órgão jurisdicional de reenvio faz referência no seu pedido de decisão prejudicial, estas têm a seguinte redação:

«Artigo B4.1[12]

Quanto à participação nos jogos oficiais das equipas principais do futebol de competição, aplicam‑se requisitos específicos para o futebol profissional e para o futebol amador.

Artigo P

Todos os clubes de futebol profissional 1A e 1B devem enviar as seguintes listas […] e mantê‑las atualizadas:

uma lista com um número máximo de 25 jogadores […], dos quais pelo menos 8 devem ser formados por clubes belgas (trata‑se dos jogadores que, antes do seu 23.o aniversário, tenham preenchido todos os requisitos para jogar em jogos oficiais durante, pelo menos, três épocas completas por um clube na Bélgica), sendo que, pelo menos, 3 jogadores devem preencher o requisito complementar de o terem feito antes do seu 21.o aniversário. Se estes requisitos mínimos não estiverem preenchidos, estes jogadores não poderão ser substituídos por jogadores que não possuam estas qualidades.

[…]

Para poderem registar um jogador na lista “Squad Size Limit”:

o jogador deve estar filiado na federação e estar afeto ao clube que solicita o registo ou preencher temporariamente os requisitos para participar nos jogos oficiais nesse clube; e

se se tratar de um atleta remunerado que não seja nacional de um país membro do [Espaço Económico Europeu (EEE)], deve ser fornecida uma cópia da autorização única ainda válida ou do certificado oficial emitido pela administração local do seu local de residência na Bélgica a confirmar que o atleta remunerado se apresentou na administração para que lhe possa ser emitida a autorização única a que tem direito […].

o jogador deve preencher os requisitos para participar nos jogos oficiais. As alterações a esta lista apenas podem ser validadas pela administração federal.

[…]

Artigo B6.109

As obrigações seguintes aplicam‑se no que diz respeito ao registo de jogadores na ficha de jogo.

Artigo P

As disposições seguintes aplicam‑se às equipas principais dos clubes de futebol profissional:

No âmbito da sua participação em competições oficiais das equipas principais, os clubes de futebol profissional estão obrigados a registar na ficha de jogo um número mínimo de 6 jogadores que tenham sido formados por um clube belga, dos quais pelo menos 2 preencham o requisito complementar reproduzido infra.

Quando o clube não possa registar o número mínimo de jogadores exigido pelo parágrafo anterior, não os pode substituir através do registo de jogadores que não possuam essa qualidade.

Considera‑se que foram formados por um clube belga os jogadores que, antes do seu 23.o aniversário, tenham preenchido todos os requisitos para jogar em jogos oficiais durante, pelo menos, três épocas completas por um clube na Bélgica.

Preenchem o requisito complementar os jogadores que, antes do seu 21.o aniversário, tenham sido utilizados durante, pelo menos, três épocas completas por um clube na Bélgica.

[…]

Os clubes de futebol profissional 1A e 1B só podem registar na ficha de jogo jogadores constantes das listas de “Squad size limit” do clube.

Em caso de violação das regras supramencionadas, o órgão federal competente aplicará as sanções previstas para o registo de jogadores que não preencham os requisitos para jogar em jogos oficiais, com exceção das coimas.»

II. Factos no processo principal e questões prejudiciais

13

UL é um jogador de futebol profissional que possui a nacionalidade de um país terceiro e também a nacionalidade belga. Exerce a sua atividade profissional na Bélgica há muitos anos. Jogou sucessivamente pelo Royal Antwerp, um clube de futebol profissional estabelecido na Bélgica, e, depois, por outro clube de futebol profissional.

14

Em 13 de fevereiro de 2020, UL intentou uma ação na Cour Belge d'Arbitrage pour le Sport (Tribunal de Arbitragem do Desporto da Bélgica; a seguir «CBAS») a fim de obter, designadamente, a declaração de que as regras relativas aos «jogadores formados localmente» adotadas pela UEFA e pela URBSFA são nulas, com o fundamento de que violam os artigos 45.o e 101.o TFUE, bem como de obter uma indemnização pelos danos que sofreu em consequência da aplicação dessas regras. Posteriormente, o Royal Antwerp interveio voluntariamente no processo, pedindo igualmente a reparação dos danos causados pelas referidas regras.

15

Por Decisão arbitral proferida em 10 de julho de 2020, a CBAS declarou que esses pedidos eram inadmissíveis na parte em que diziam respeito às regras relativas aos «jogadores formados localmente» adotadas pela UEFA e admissíveis, mas improcedentes, na parte em que diziam respeito às regras estabelecidas pela URBSFA.

16

Quanto às regras adotadas pela UEFA, que não era parte no processo de arbitragem, a CBAS considerou, nomeadamente, que, tendo em conta a sua natureza específica e distinta em relação às adotadas pelas várias federações nacionais de futebol membros da UEFA, entre as quais a URBSFA, não se podia considerar que essas regras resultavam de um acordo entre estas diferentes entidades, na aceção do artigo 101.o, n.o 1, TFUE.

17

No que diz respeito às regras adotadas pela URBSFA, a CBAS considerou, em substância, por um lado, que não violavam a liberdade de circulação de trabalhadores consagrada no artigo 45.o TFUE, dado que eram indistintamente aplicáveis, não davam origem a nenhuma discriminação direta ou indireta em razão da nacionalidade e eram, em todo o caso, justificadas por objetivos legítimos, necessárias à prossecução destes e proporcionadas para esse efeito. Por outro lado, decidiu que essas regras não tinham por objetivo nem por efeito restringir a concorrência e eram, além disso, necessárias e proporcionadas para alcançar objetivos legítimos, pelo que também não violavam o artigo 101.o, n.o 1, TFUE.

18

Consequentemente, a CBAS julgou improcedentes os pedidos de UL e do Royal Antwerp.

19

Por citação de 1 de setembro de 2020, UL e o Royal Antwerp interpuseram recurso contra a URBSFA no Tribunal de première instance francophone de Bruxelles (Tribunal de Primeira Instância de Língua Francesa de Bruxelas, Bélgica), a fim de obter a anulação da decisão arbitral proferida, com o fundamento de que esta violava a ordem pública na aceção do artigo 1717 do Code judiciaire (Código Judiciário) belga.

20

Em apoio dos seus pedidos, alegam, em substância, por um lado, que as regras relativas aos «jogadores formados localmente» adotadas pela UEFA e pela URBSFA instituem um plano conjunto que tem por objetivo restringir a concorrência na aceção do artigo 101.o, n.o 1, TFUE. Por outro lado, essas regras violam a liberdade de circulação de trabalhadores consagrada no artigo 45.o TFUE, uma vez que limitam tanto a possibilidade de um clube de futebol profissional como o Royal Antwerp recrutar jogadores que não preencham o requisito da origem local ou nacional nelas estabelecido, e utilizá‑los num jogo, como a possibilidade de um jogador como UL ser recrutado e jogar por um clube em relação ao qual não pode invocar essa origem.

21

Em 9 de novembro de 2021, a UEFA apresentou um pedido de intervenção voluntária no processo, em apoio dos pedidos da URBSFA.

22

Por Decisão de 26 de novembro de 2021, ou seja, posterior à data em que o presente pedido de decisão prejudicial deu entrada no Tribunal de Justiça, o pedido de intervenção voluntária da UEFA foi declarado admissível. Em 13 de dezembro de 2021, o órgão jurisdicional de reenvio comunicou ao Tribunal de Justiça a admissão dessa nova parte no processo principal, em conformidade com o artigo 97.o, n.o 2, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça.

23

Na sua decisão de reenvio, o Tribunal de première instance francophone de Bruxelles (Tribunal de Primeira Instância de Língua Francesa de Bruxelas) salienta, em primeiro lugar, que a decisão arbitral em causa no processo principal, tanto na medida em que declara a inadmissibilidade parcial dos pedidos de UL e do Royal Antwerp como na medida em que julga improcedentes esses pedidos quanto ao restante, se baseia na interpretação e na aplicação de duas disposições do direito da União — designadamente os artigos 45.o e 101.o TFUE — cuja violação pode ser qualificada de «violação da ordem pública» na aceção do artigo 1717 do Code judiciaire (Código Judiciário) belga, tendo em conta a sua natureza e a jurisprudência pertinente do Tribunal de Justiça (Acórdãos de 1 de junho de 1999, Eco Swiss, C‑126/97, EU:C:1999:269, e de 26 de outubro de 2006, Mostaza Claro, C‑168/05, EU:C:2006:675).

24

Em segundo lugar, o órgão jurisdicional de reenvio considera que necessita de obter esclarecimentos do Tribunal de Justiça quanto à interpretação dos artigos 45.o e 101.o TFUE para poder proferir a sua decisão. Em substância, esse órgão jurisdicional pretende saber, primeiro, se as regras relativas aos «jogadores formados localmente» adotadas pela UEFA e pela URBSFA podem ser qualificadas de «acordo entre empresas», «decisão de uma associação de empresas» ou «prática concertada» na aceção do artigo 101.o TFUE. Segundo, interroga‑se sobre a conformidade dessas regras com a proibição de acordos constante desse artigo e com a liberdade de circulação de trabalhadores consagrada no artigo 45.o TFUE, bem como sobre o caráter eventualmente justificado, adequado, necessário e proporcionado das referidas regras. Neste contexto, o referido órgão jurisdicional remete, nomeadamente, para um comunicado de imprensa publicado pela Comissão Europeia e para um estudo realizado por iniciativa desta instituição cuja «principal conclusão» é a de que as regras em causa podem ter efeitos discriminatórios indiretos com base na nacionalidade e efeitos restritivos na livre circulação de trabalhadores, não estando demonstrado que estes sejam proporcionais aos benefícios limitados que delas decorrem em termos de equilíbrio competitivo entre clubes de futebol e de formação de jogadores, atendendo às medidas alternativas menos restritivas que se afiguram possíveis.

25

Nestas condições, o Tribunal de première instance francophone de Bruxelles (Tribunal de Primeira Instância de Língua Francesa de Bruxelas) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

Deve o artigo 101.o TFUE ser interpretado no sentido de que se opõe ao plano relativo aos “[jogadores formados localmente]” adotado em 2 de fevereiro de 2005 pelo Comité Executivo da UEFA, aprovado pelas 52 federações membros da UEFA no Congresso de Taline, em 21 de abril de 2005, e executado através de regulamentos adotados tanto pela UEFA como pelas federações membros desta?

2)

Devem os artigos 45.o e 101.o TFUE ser interpretados no sentido de que se opõem à aplicação das regras relativas ao registo e à utilização, na ficha de jogo, dos jogadores formados localmente, formalizadas pelos artigos P335.11 e P.1422 do Regulamento Federal da URBSFA e retomadas nos artigos B4.1[12] do Título 4 e B6.109 do Título 6 do novo Regulamento da URBSFA?»

III. Quanto à admissibilidade

26

A URBSFA, a UEFA, o Governo Romeno e a Comissão puseram em causa a admissibilidade das duas questões submetidas pelo órgão jurisdicional de reenvio.

27

Os argumentos que aduzem a esse respeito são, em substância, de quatro ordens. Incluem, primeiro, argumentos de ordem processual relativos ao facto de a decisão de reenvio ter ocorrido antes de a UEFA ter sido admitida a intervir e, portanto, ouvida no processo principal. Segundo, são invocados argumentos de ordem formal, de acordo com os quais o conteúdo dessa decisão não respeita os requisitos previstos no artigo 94.o, alínea a), do Regulamento de Processo, uma vez que não apresenta de forma suficientemente pormenorizada o quadro jurídico e factual no qual o órgão jurisdicional de reenvio interroga o Tribunal de Justiça, o que pode impedir os interessados de se pronunciarem utilmente sobre as questões a decidir. Terceiro, são apresentados argumentos de ordem material relativos ao caráter hipotético do pedido de decisão prejudicial, visto que não existe um litígio real cujo tratamento possa tornar necessária qualquer decisão interpretativa do Tribunal de Justiça. Tal situação decorre, especialmente, do facto de as regras relativas aos «jogadores formados localmente» não terem impedido UL de ser contratado e utilizado pelo Royal Antwerp e, depois, por outro clube de futebol profissional. Quarto, o litígio no processo principal deve ser considerado «puramente interno» para efeitos do artigo 45.o TFUE e insuscetível de «afetar o comércio entre os Estados‑Membros» na aceção do artigo 101.o TFUE, tendo em conta a sua natureza inter partes, a nacionalidade de UL, o local de estabelecimento do Royal Antwerp, bem como o alcance geográfico limitado das regras adotadas pela URBSFA.

A. Quanto aos requisitos processuais de adoção da decisão de reenvio

28

No âmbito de um processo prejudicial, não cabe ao Tribunal de Justiça, tendo em conta a repartição de funções entre este e os órgãos jurisdicionais nacionais, verificar se a decisão de reenvio foi tomada em conformidade com as regras nacionais de organização e de processo judiciais. Além disso, o Tribunal de Justiça deve ater‑se à decisão de reenvio enquanto esta não tiver sido revogada no quadro das vias de recurso previstas eventualmente pelo direito nacional (Acórdãos de 14 de janeiro de 1982, Reina, 65/81, EU:C:1982:6, n.o 7, e de 29 de março de 2022, Getin Noble Bank, C‑132/20, EU:C:2022:235, n.o 70).

29

Assim, no caso em apreço, não cabe ao Tribunal de Justiça tomar posição sobre as eventuais consequências relacionadas, no âmbito do processo principal e por força das regras nacionais de processo judicial que sejam aplicáveis, com a admissão de uma nova parte posteriormente à adoção da decisão de reenvio.

30

Por outro lado, no que diz respeito ao processo que antecedeu o presente acórdão, há que salientar que o artigo 97.o, n.o 2, do Regulamento de Processo dispõe que, quando seja admitida uma nova parte no litígio no processo principal estando o processo já pendente no Tribunal de Justiça, essa parte aceita o processo no estado em que este se encontre no momento em que o Tribunal de Justiça seja informado da sua admissão. Além disso, no caso em apreço, há que concluir que, tendo em conta o estado em que o referido processo se encontrava no momento em que o Tribunal de Justiça foi informado de que a UEFA fora admitida a intervir no litígio no processo principal, esta parte não só recebeu a comunicação de todos os atos processuais já notificados aos outros interessados, como prevê a referida disposição, mas também pôde apresentar, em seguida, e fê‑lo efetivamente, observações durante a fase escrita e, depois, na audiência de alegações.

B. Quanto ao conteúdo da decisão de reenvio

31

O processo prejudicial instituído no artigo 267.o TFUE é um instrumento de cooperação entre o Tribunal de Justiça e os órgãos jurisdicionais nacionais, graças ao qual o primeiro fornece aos segundos os elementos de interpretação do direito da União de que estes necessitam para a resolução dos litígios que lhes cabe decidir. De acordo com jurisprudência constante, que passou a estar refletida no artigo 94.o, alíneas a) e b), do Regulamento de Processo, a necessidade de obter uma interpretação do direito da União que seja útil ao juiz nacional exige que este defina o quadro factual e regulamentar em que se inserem as questões que submete ou que, pelo menos, explique as hipóteses factuais em que essas questões assentam. Além disso, é indispensável, como dispõe o artigo 94.o, alínea c), do Regulamento de Processo, que o pedido de decisão prejudicial exponha as razões que levaram o órgão jurisdicional de reenvio a interrogar‑se sobre a interpretação ou a validade de certas disposições do direito da União, bem como o nexo que esse órgão estabelece entre essas disposições e a legislação nacional aplicável ao litígio no processo principal. Estas exigências são particularmente válidas nos domínios que se caracterizam por situações de facto e de direito complexas, como o domínio da concorrência (v., neste sentido, Acórdãos de 27 de novembro de 2012, Pringle, C‑370/12, EU:C:2012:756, n.o 83, e de 29 de junho de 2023, Super Bock Bebidas, C‑211/22, EU:C:2023:529, n.os 23 e 24).

32

Por outro lado, as informações fornecidas na decisão de reenvio devem não apenas permitir ao Tribunal de Justiça dar respostas úteis, mas também dar aos Governos dos Estados‑Membros e às outras partes interessadas a possibilidade de apresentar observações em conformidade com o artigo 23.o do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia (v., neste sentido, Acórdãos de 1 de abril de 1982, Holdijk e o., 141/81 a 143/81, EU:C:1982:122, n.o 7, e de 11 de abril de 2000, Deliège, C‑51/96 e C‑191/97, EU:C:2000:199, n.o 31).

33

No caso em apreço, o pedido de decisão prejudicial preenche os requisitos recordados nos dois números anteriores do presente acórdão. De facto, a decisão de reenvio apresenta, de forma pormenorizada, o quadro factual e regulamentar em que se inserem as questões submetidas ao Tribunal de Justiça. Além disso, essa decisão expõe de forma sucinta, mas clara as razões de facto e de direito que levaram o órgão jurisdicional de reenvio a considerar que era necessário submeter estas questões, bem como o nexo existente, na sua opinião, entre os artigos 45.o e 101.o TFUE e o litígio no processo principal, à luz da jurisprudência do Tribunal de Justiça.

34

Por outro lado, o teor das observações escritas submetidas ao Tribunal de Justiça torna evidente que os seus autores não tiveram nenhuma dificuldade em captar o quadro factual e jurídico em que se inserem as questões submetidas pelo órgão jurisdicional de reenvio, em compreender o sentido e o alcance das declarações factuais que lhes subjazem, em apreender as razões pelas quais o órgão jurisdicional de reenvio considerou necessário submetê‑las e, por último, em tomar posição de forma completa e útil sobre este assunto.

C. Quanto à realidade do litígio e à pertinência das questões submetidas ao Tribunal de Justiça

35

O órgão jurisdicional nacional ao qual foi submetido o litígio no processo principal e que deve assumir a responsabilidade pela decisão judicial a tomar tem competência exclusiva para apreciar, tendo em conta as especificidades do processo, tanto a necessidade de uma decisão prejudicial para poder proferir a sua decisão como a pertinência das questões que submete ao Tribunal de Justiça. Daqui decorre que as questões submetidas pelos órgãos jurisdicionais nacionais beneficiam de uma presunção de pertinência e que o Tribunal de Justiça só se pode recusar pronunciar sobre essas questões se for manifesto que a interpretação solicitada não tem nenhuma relação com a realidade ou com o objeto do litígio no processo principal, se o problema for hipotético ou ainda se o Tribunal de Justiça não dispuser dos elementos de facto e de direito necessários para dar uma resposta útil às referidas questões [v., neste sentido, Acórdãos de 16 de dezembro de 1981, Foglia, 244/80, EU:C:1981:302, n.os 15 e 18, e de 7 de fevereiro de 2023, Confédération paysanne e o. (Mutagénese aleatória in vitro), C‑688/21, EU:C:2023:75, n.os 32 e 33].

36

No caso em apreço, importa observar que as declarações do órgão jurisdicional de reenvio resumidas nos n.os 14 a 24 do presente acórdão atestam o caráter real do litígio no processo principal. Além disso, essas mesmas declarações mostram que o facto de o órgão jurisdicional de reenvio interrogar o Tribunal de Justiça, neste âmbito, sobre a interpretação dos artigos 45.o e 101.o TFUE não é manifestamente desprovido de qualquer relação com a realidade e com o objeto do litígio no processo principal.

37

De facto, decorre das referidas declarações, primeiro, que o referido órgão jurisdicional é chamado a apreciar um pedido de anulação de uma decisão arbitral pela qual a CBAS julgou parcialmente inadmissível e parcialmente improcedente uma ação de anulação e de indemnização intentada por UL e pelo Royal Antwerp contra as regras da URBSFA e da UEFA relativas aos «jogadores formados localmente». Segundo, essa decisão arbitral baseia‑se na interpretação e na aplicação dos artigos 45.o e 101.o TFUE. Terceiro, o órgão jurisdicional de reenvio esclarece que, tendo em conta o objeto do litígio que lhe foi submetido, está, nomeadamente, obrigado, para proferir a sua decisão, a fiscalizar a forma como a CBAS interpretou e aplicou os artigos 45.o e 101.o TFUE, a fim de determinar se a decisão arbitral proferida por esta é ou não contrária à ordem pública belga.

D. Quanto à dimensão transfronteiriça do litígio no processo principal

38

As disposições do Tratado FUE em matéria de liberdade de estabelecimento, de livre prestação de serviços e de livre circulação de capitais não são aplicáveis às situações em que todos os elementos estejam confinados a um único Estado‑Membro (Acórdãos de 15 de novembro de 2016, Ullens de Schooten, C‑268/15, EU:C:2016:874, n.o 47, e de 7 de setembro de 2022, Cilevičs e o., C‑391/20, EU:C:2022:638, n.o 31). Por isso, os pedidos de decisão prejudicial que incidam sobre a interpretação dessas disposições em tais situações apenas podem ser considerados admissíveis, em determinados casos específicos, se da decisão de reenvio resultar que os elementos concretos permitem demonstrar que a interpretação prejudicial solicitada é necessária para a resolução do litígio devido à existência de um nexo entre o objeto ou as circunstâncias desse litígio e os artigos 49.o, 56.o ou 63.o TFUE, como exigido no artigo 94.o do Regulamento de Processo (v., neste sentido, Acórdãos de 15 de novembro de 2016, Ullens de Schooten, C‑268/15, EU:C:2016:874, n.os 50 a 55, e de 7 de setembro de 2022, Cilevičs e o., C‑391/20, EU:C:2022:638, n.o 34).

39

Contudo, no caso em apreço, o pedido de decisão prejudicial não pode ser considerado inadmissível com o fundamento de que o artigo 45.o TFUE, relativo à liberdade de circulação de trabalhadores, não tem nenhum nexo com o litígio no processo principal tendo em conta o caráter «puramente interno» deste.

40

De facto, por um lado, se é certo que o litígio no processo principal tem natureza inter partes, que UL tem nacionalidade belga, que o Royal Antwerp está sediado na Bélgica e que as regras adotadas pela URBSFA têm um alcance geográfico limitado ao território desse Estado‑Membro, como salientaram, corretamente, alguns interessados, não é menos certo que esse litígio diz respeito a uma decisão arbitral na qual a CBAS interpretou e aplicou, nomeadamente, o artigo 45.o TFUE, como decorre do n.o 17 do presente acórdão. A questão de saber se esse artigo é aplicável ao referido litígio diz respeito ao mérito deste, pelo que não pode ser invocada, sem prejudicar a sua apreciação, para contestar a admissibilidade do pedido de decisão prejudicial.

41

Além disso, as regras da UEFA e as da URBSFA que estão em causa no processo principal têm, de acordo com o órgão jurisdicional de reenvio, um nexo estreito na medida em que a URBSFA está obrigada, na sua qualidade de membro da UEFA, a respeitar os estatutos, os regulamentos e as decisões da UEFA e em que as suas regras relativas aos «jogadores formados localmente» se inspiraram diretamente nas que foram previamente adotadas e aprovadas por esta última no congresso de Taline, como foi referido no n.o 7 do presente acórdão. Aliás, foram, em substância, esses nexos factuais e jurídicos entre as regras da URBSFA, as da UEFA e o direito da União que levaram o órgão jurisdicional de reenvio a declarar admissível a intervenção voluntária da UEFA na decisão referida no n.o 22 do presente acórdão.

42

Por outro lado, o litígio no processo principal diz respeito, paralelamente, à interpretação e à aplicação, pela CBAS, do artigo 101.o TFUE.

43

Ora, é jurisprudência constante que, embora a aplicação do n.o 1 desse artigo torne necessário, entre outros requisitos, que se demonstre, com um grau de probabilidade suficiente, que um acordo, uma decisão de uma associação de empresas ou uma prática concertada é suscetível de afetar, de forma significativa, o comércio entre os Estados‑Membros ao exercer uma influência direta ou indireta e efetiva ou potencial sobre os fluxos de trocas comerciais que pode obstar à realização ou ao funcionamento do mercado interno, esse requisito pode ser considerado preenchido no caso de comportamentos que abranjam todo o território de um Estado‑Membro (v., neste sentido, Acórdão de 16 de julho de 2015, ING Pensii, C‑172/14, EU:C:2015:484, n.os 48 e 49 e jurisprudência referida).

44

Atendendo a essa jurisprudência, e tendo em conta o alcance geográfico das regras em causa no processo principal e o nexo estreito que as une, não se pode considerar que o artigo 101.o TFUE não tem nenhum nexo com o litígio no processo principal com o fundamento de que as regras sobre as quais este incide não são suscetíveis de «afetar o comércio entre os Estados‑Membros».

45

Por conseguinte, o pedido de decisão prejudicial é admissível na sua totalidade.

IV. Quanto às questões prejudiciais

46

Com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber, em substância, se o artigo 101.o TFUE deve ser interpretado no sentido de que se opõe a regras que tenham sido adotadas por uma associação responsável pela organização de competições de futebol a nível europeu e aplicadas tanto por essa associação como pelas federações nacionais de futebol membros desta, e que imponham que cada clube que participe nessas competições inclua na sua lista de jogadores e registe na ficha de jogo um número mínimo de jogadores formados pelo próprio clube ou no âmbito territorial da federação nacional na qual o referido clube esteja filiado.

47

Com a sua segunda questão, o referido órgão jurisdicional pretende saber, em substância, se os artigos 45.o e 101.o TFUE devem ser interpretados no sentido de que se opõem a regras que tenham sido adotadas por uma associação responsável pela organização de competições de futebol a nível nacional e que imponham que cada clube que participe nessas competições inclua na sua lista de jogadores e registe na ficha de jogo um número mínimo de jogadores formados no âmbito territorial dessa associação.

48

Tendo em conta tanto o teor dessas questões como a natureza do litígio no âmbito do qual estas foram submetidas ao Tribunal de Justiça, importa, antes de as analisar, formular três séries de observações preliminares.

A. Observações preliminares

1.   Quanto ao objeto do processo principal

49

Decorre da própria redação das duas questões submetidas ao Tribunal de Justiça que estas se sobrepõem, em grande medida, no que diz respeito ao artigo 101.o TFUE. De facto, o órgão jurisdicional de reenvio pretende obter esclarecimentos sobre a interpretação deste artigo para poder fiscalizar a aplicação que dele foi feita numa decisão arbitral respeitante à conformidade com o referido artigo das regras relativas aos «jogadores formados localmente», adotadas e aplicadas pela UEFA e pelas várias federações nacionais de futebol que são membros desta, entre as quais a URBSFA.

50

Em contrapartida, essas duas questões diferem no que diz respeito ao artigo 45.o TFUE, uma vez que apenas a segunda, que se refere às regras adotadas e aplicadas pela URBSFA, remete para este artigo. A este respeito, no pedido de decisão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio afirma que não lhe compete submeter ao Tribunal de Justiça uma questão relativa à conformidade com o artigo 45.o TFUE das regras adotadas e aplicadas pela UEFA. Contudo, esse órgão jurisdicional esclarece, em substância, que não exclui tomar em consideração essa questão no âmbito da sua apreciação sobre a existência de um acordo, de uma decisão de uma associação de empresas ou de uma prática concertada na aceção do artigo 101.o TFUE.

51

Tendo em conta estes diferentes elementos, importa tratar conjuntamente as questões submetidas pelo órgão jurisdicional de reenvio, interpretando, num primeiro momento, o artigo 101.o TFUE e, num segundo momento, o artigo 45.o TFUE.

2.   Quanto à aplicabilidade do direito da União ao desporto e à atividade das associações desportivas

52

As questões submetidas ao Tribunal de Justiça dizem respeito à interpretação dos artigos 45.o e 101.o TFUE no contexto de um litígio que põe em causa regras adotadas por duas entidades que têm, de acordo com os respetivos estatutos, a qualidade de associações de direito privado responsáveis pela organização e pela fiscalização do futebol, respetivamente, a nível europeu e a nível belga, e que sujeitam a determinados requisitos, cujo incumprimento implica a aplicação de sanções, a composição das equipas que podem participar nas competições de futebol interclubes.

53

A este respeito, deve recordar‑se que, na medida em que a prática de um desporto constitua uma atividade económica, é abrangida pelas disposições do direito da União aplicáveis a tal atividade (v., neste sentido, Acórdãos de 12 de dezembro de 1974, Walrave e Koch, 36/74, EU:C:1974:140, n.o 4, e de 16 de março de 2010, Olympique Lyonnais, C‑325/08, EU:C:2010:143, n.o 27).

54

Apenas determinadas regras específicas que, por um lado, tenham sido adotadas exclusivamente por motivos de ordem não económica e, por outro, incidam sobre questões que dizem apenas respeito ao desporto enquanto tal devem ser consideradas estranhas a qualquer atividade económica. É o caso, especialmente, das que incidam sobre a exclusão de jogadores estrangeiros da composição das equipas que participam nas competições entre equipas representativas do seu país ou sobre a fixação de critérios de classificação utilizados para selecionar os atletas que participam em competições a título individual (v., neste sentido, Acórdãos de 12 de dezembro de 1974, Walrave e Koch, 36/74, EU:C:1974:140, n.o 8; de 15 de dezembro de 1995, Bosman, C‑415/93, EU:C:1995:463, n.os 76 e 127, e de 11 de abril de 2000, Deliège, C‑51/96 e C‑191/97, EU:C:2000:199, n.os 43, 44, 63, 64 e 69).

55

Com exceção dessas regras específicas, as regras que as associações desportivas adotem para regular o trabalho assalariado ou a prestação de serviços dos jogadores profissionais ou semiprofissionais e, de um modo mais geral, as regras que, ainda que não regulem formalmente esse trabalho ou essa prestação de serviços, tenham um impacto direto no referido trabalho ou na referida prestação de serviços podem ser abrangidas pelos artigos 45.o e 56.o TFUE (v., neste sentido, Acórdãos de 12 de dezembro de 1974, Walrave e Koch, 36/74, EU:C:1974:140, n.os 5, 17 a 19 e 25; de 15 de dezembro de 1995, Bosman, C‑415/93, EU:C:1995:463, n.os 75, 82 a 84, 87, 103 e 116; de 12 de abril de 2005, Simutenkov, C‑265/03, EU:C:2005:213, n.o 32, e de 16 de março de 2010, Olympique Lyonnais, C‑325/08, EU:C:2010:143, n.os 28 e 30).

56

Da mesma forma, as regras adotadas por tais associações e, de um modo mais geral, o comportamento das associações que as tenham adotado são abrangidos pelas disposições do Tratado FUE relativas ao direito da concorrência quando estejam preenchidos os requisitos de aplicação dessas disposições (v., neste sentido, Acórdão de 18 julho de 2006, Meca‑Medina e Majcen/Comissão, C‑519/04 P, EU:C:2006:492, n.os 30 a 33), o que implica que essas associações possam ser qualificadas de «empresas» na aceção dos artigos 101.o e 102.o TFUE ou que as regras em causa possam ser qualificadas de «decisão de uma associação de empresas» na aceção do artigo 101.o TFUE.

57

De um modo mais geral, uma vez que tais regras são, assim, abrangidas pelas referidas disposições do Tratado FUE, devem, caso contenham prescrições aplicáveis aos particulares, ser concebidas e aplicadas de acordo com os princípios gerais do direito da União, especialmente, com os princípios da não discriminação e da proporcionalidade (v., neste sentido, Acórdão de 13 de junho de 2019, TopFit e Biffi, C‑22/18, EU:C:2019:497, n.os 60, 65 e 66 e jurisprudência referida).

58

Ora, as regras em causa no processo principal, quer da UEFA quer da URBSFA, não fazem parte das regras às quais poderia ser aplicada a exceção referida no n.o 54 do presente acórdão, que o Tribunal de Justiça tem reiteradamente recordado que deve permanecer limitada ao seu próprio objeto e não pode ser invocada para excluir toda a atividade desportiva do âmbito de aplicação das disposições do Tratado FUE relativas ao direito económico da União (v., neste sentido, Acórdãos de 14 julho de 1976, Donà, 13/76, EU:C:1976:115, n.os 14 e 15, e de 18 de julho de 2006, Meca‑Medina e Majcen/Comissão, C‑519/04 P, EU:C:2006:492, n.o 26).

59

Pelo contrário, embora essas regras não regulem formalmente as condições de trabalho dos jogadores, deve considerar‑se que têm impacto direto nesse trabalho na medida em que sujeitam a determinados requisitos, cujo incumprimento implica a aplicação de sanções, a composição das equipas que podem participar nas competições de futebol interclubes, bem como, consequentemente, a participação dos próprios jogadores nessas competições (v., neste sentido, Acórdão de 15 de dezembro de 1995, Bosman, C‑415/93, EU:C:1995:463, n.os 116 e 119).

60

Mais concretamente, decorre das declarações do órgão jurisdicional de reenvio que as referidas regras preveem, em substância, que os clubes de futebol profissional que participem nessas competições devem, sob pena de lhes serem aplicadas sanções, registar na ficha de jogo um número mínimo de «jogadores formados localmente». Nas regras adotadas pela UEFA, essa expressão é utilizada para designar, na realidade, não apenas jogadores que tenham sido formados pelo clube que os utiliza, mas igualmente jogadores que tenham sido formados por outro clube filiado na mesma federação nacional de futebol. Nas regras adotadas pela URBSFA, a referida expressão é utilizada exclusivamente para designar jogadores que tenham sido formados por «um clube belga», portanto, um clube filiado nessa associação, seja ele qual for. A circunstância de tais regras limitarem, assim, a possibilidade de os clubes registarem jogadores na ficha de jogo e, portanto, utilizarem esses jogadores no jogo correspondente, e não formalmente a possibilidade de contratarem os referidos jogadores, é indiferente, dado que a participação em jogos e em competições constitui o objeto essencial da atividade dos jogadores e que essa possibilidade de contratação fica, também ela, consequentemente limitada (v., neste sentido, Acórdãos de 15 de dezembro de 1995, Bosman, C‑415/93, EU:C:1995:463, n.o 120, e de 13 de abril de 2000, Lehtonen e Castors Braine, C‑176/96, EU:C:2000:201, n.o 50).

61

Além disso, uma vez que a composição das equipas constitui um dos parâmetros essenciais das competições nas quais os clubes de futebol profissional se defrontam e que essas competições dão origem a uma atividade económica, deve igualmente considerar‑se que as regras em causa no processo principal têm um impacto direto nas condições de exercício dessa atividade económica e na concorrência entre os clubes de futebol profissional que a exercem.

62

Por conseguinte, as regras da UEFA e da URBSFA em relação às quais o órgão jurisdicional de reenvio interroga o Tribunal de Justiça são abrangidas pelo âmbito de aplicação dos artigos 45.o e 101.o TFUE.

3.   Quanto ao artigo 165.o TFUE

63

A maioria das partes no processo principal e alguns dos governos que intervieram no processo no Tribunal de Justiça pronunciaram‑se, em sentidos diferentes, sobre as consequências que podem estar relacionadas com o artigo 165.o TFUE no âmbito das respostas a dar às questões submetidas pelo órgão jurisdicional de reenvio.

64

A este respeito, há que salientar, primeiro, que o artigo 165.o TFUE deve ser interpretado à luz do artigo 6.o, alínea e), TFUE, que prevê que a União dispõe de competência para desenvolver ações destinadas a apoiar, coordenar ou completar a ação dos Estados‑Membros nos domínios da educação, da formação profissional, da juventude e do desporto. Com efeito, o artigo 165.o TFUE concretiza essa disposição especificando quer os objetivos atribuídos à ação da União nos domínios em causa quer os meios aos quais é possível recorrer para contribuir para a realização desses objetivos.

65

Assim, quanto aos objetivos atribuídos à ação da União no domínio do desporto, o artigo 165.o TFUE dispõe, no seu n.o 1, segundo parágrafo, que a União contribui para a promoção dos aspetos europeus do desporto, tendo simultaneamente em conta as suas especificidades, as suas estruturas baseadas no voluntariado e a sua função social e educativa, e, no seu n.o 2, último travessão, que a ação da União nesse domínio tem por objetivo desenvolver a dimensão europeia do desporto, promovendo a equidade e a abertura nas competições desportivas e a cooperação entre os organismos responsáveis pelo desporto, bem como protegendo a integridade física e moral dos desportistas, nomeadamente dos mais jovens de entre eles.

66

No que diz respeito aos meios aos quais é possível recorrer para contribuir para a realização desses objetivos, o artigo 165.o TFUE prevê, no seu n.o 3, que a União incentivará a cooperação com países terceiros e com as organizações internacionais competentes em matéria de desporto e, no seu n.o 4, que o Parlamento Europeu e o Conselho da União Europeia deliberando de acordo com o processo legislativo ordinário ou o Conselho deliberando sob proposta da Comissão podem adotar, respetivamente, ações de incentivo ou recomendações.

67

Segundo, como decorre tanto da redação do artigo 165.o TFUE como da redação do artigo 6.o, alínea e), TFUE, os autores dos Tratados entenderam conferir à União, através destas disposições, uma competência de apoio que lhe permite desenvolver não uma «política», como está previsto noutras disposições do Tratado FUE, mas uma «ação» em vários domínios específicos, entre os quais o desporto. As referidas disposições constituem, assim, uma base jurídica que autoriza a União a exercer essa competência, nas condições e nos limites por elas fixados, entre os quais consta, de acordo com o artigo 165.o, n.o 4, primeiro travessão, TFUE, a exclusão de qualquer harmonização das disposições legislativas e regulamentares adotadas a nível nacional. Além disso, a referida competência de apoio permite à União adotar atos jurídicos com o único objetivo de apoiar, coordenar ou completar a ação dos Estados‑Membros, em conformidade com o artigo 6.o TFUE.

68

Correlativamente, e como decorre também do contexto em que o artigo 165.o TFUE se insere, especialmente, da sua inclusão na parte III do Tratado FUE, consagrada às «Políticas e Ações Internas da União», e não na parte I deste Tratado, que contém disposições de princípio, entre as quais constam, no título II, «[d]isposições de aplicação geral» relativas, nomeadamente, à promoção de um nível elevado de emprego, à garantia de uma proteção social adequada, ao combate à discriminação, à proteção do ambiente ou ainda à proteção dos consumidores, esse artigo não constitui uma disposição de aplicação geral de caráter transversal.

69

Daqui decorre que, embora as instituições competentes da União devam ter em conta os diferentes elementos e objetivos elencados no artigo 165.o TFUE quando adotem, com base neste artigo e nas condições por ele fixadas, ações de incentivo ou recomendações no domínio do desporto, esses diferentes elementos e objetivos, bem como essas ações de incentivo e recomendações, não têm de ser integradas ou tomadas em consideração de forma vinculativa na aplicação das regras sobre cuja interpretação o órgão jurisdicional de reenvio interroga o Tribunal de Justiça, digam estas respeito à liberdade de circulação de trabalhadores (artigo 45.o TFUE) ou ao direito da concorrência (artigo 101.o TFUE). De um modo mais geral, o artigo 165.o TFUE também não pode ser visto como uma regra especial que subtrai o desporto à totalidade ou a parte das outras disposições do direito primário da União que lhe sejam aplicáveis ou que impõe que seja reservado ao desporto um tratamento especial no âmbito dessa aplicação.

70

Terceiro, é igualmente certo que, como o Tribunal de Justiça já salientou várias vezes, a atividade desportiva reveste uma importância social e educativa considerável, atualmente refletida no artigo 165.o TFUE, para a União e para os seus cidadãos (v., neste sentido, Acórdãos de 15 de dezembro de 1995, Bosman, C‑415/93, EU:C:1995:463, n.o 106, e de 13 de junho de 2019, TopFit e Biffi, C‑22/18, EU:C:2019:497, n.os 33 e 34).

71

Além disso, essa atividade tem inegáveis especificidades que, mesmo dizendo respeito, muito especialmente, ao desporto amador, podem também ser encontradas no exercício do desporto enquanto atividade económica (v., neste sentido, Acórdão de 13 de abril de 2000, Lehtonen e Castors Braine, C‑176/96, EU:C:2000:201, n.o 33).

72

Por último, tais especificidades podem eventualmente ser tomadas em consideração, entre outros elementos e desde que se revelem pertinentes, na aplicação dos artigos 45.o e 101.o TFUE, assinalando‑se, contudo, que essa tomada em consideração apenas pode ocorrer no quadro e na observância das condições e dos critérios de aplicação previstos em cada um desses artigos.

73

Em especial, quando se alegue que uma regra adotada por uma associação desportiva constitui um obstáculo à liberdade de circulação de trabalhadores ou um acordo anticoncorrencial, a caracterização dessa regra como obstáculo ou como acordo anticoncorrencial deve, em qualquer caso, assentar numa análise concreta do conteúdo da referida regra, no contexto real em que esta deva ser aplicada (v., neste sentido, Acórdãos de 15 de dezembro de 1995, Bosman, C‑415/93, EU:C:1995:463, n.os 98 a 103; de 11 de abril de 2000, Deliège, C‑51/96 e C‑191/97, EU:C:2000:199, n.os 61 a 64, e de 13 de abril de 2000, Lehtonen e Castors Braine, C‑176/96, EU:C:2000:201, n.os 48 a 50). Essa análise pode implicar que se tenha em conta, por exemplo, a natureza, a organização ou ainda o funcionamento do desporto em causa e, mais concretamente, o seu grau de profissionalização, a forma como é exercido, a forma como interagem os diferentes atores que nele participam, bem como o papel desempenhado pelas estruturas ou pelos organismos por ele responsáveis a todos os níveis, com os quais a União incentiva a cooperação, em conformidade com o artigo 165.o, n.o 3, TFUE.

74

Por outro lado, quando se prove que existe um obstáculo à liberdade de circulação de trabalhadores, a associação que tenha adotado a regra em causa tem a possibilidade de demonstrar que esta é justificada, necessária e proporcionada atendendo a determinados objetivos que possam ser considerados legítimos (v., neste sentido, Acórdão de 15 de dezembro de 1995, Bosman, C‑415/93, EU:C:1995:463, n.o 104), os quais dependem, por seu turno, das especificidades do desporto que esteja em causa num determinado caso.

75

É à luz de todas as considerações precedentes que importa analisar as questões submetidas pelo órgão jurisdicional de reenvio na medida em que dizem respeito ao artigo 101.o TFUE e, depois, ao artigo 45.o TFUE.

B. Quanto às questões prejudiciais na medida em que dizem respeito ao artigo 101.o TFUE

76

O artigo 101.o TFUE é aplicável a qualquer entidade que exerça uma atividade económica e deva, enquanto tal, ser qualificada de empresa, independentemente do seu estatuto jurídico e do seu modo de financiamento (v., neste sentido, Acórdãos de 23 de abril de 1991, Höfner e Elser, C‑41/90, EU:C:1991:161, n.o 21; de 11 de dezembro de 2007, ETI e o., C‑280/06, EU:C:2007:775, n.o 38, e de 1 de julho de 2008, MOTOE, C‑49/07, EU:C:2008:376, n.os 20 e 21).

77

Consequentemente, o referido artigo é aplicável, nomeadamente, a entidades constituídas sob a forma de associações que tenham como finalidade, de acordo com os seus estatutos, a organização e a fiscalização de um determinado desporto, na medida em que essas entidades exerçam uma atividade económica relacionada com esse desporto, de oferta de bens ou de serviços, e sejam qualificadas, enquanto tal, de «empresas» (v., neste sentido, Acórdão de 1 de julho de 2008, MOTOE, C‑49/07, EU:C:2008:376, n.os 22, 23 e 26).

78

Por outro lado, o artigo 101.o TFUE é igualmente aplicável a entidades que, embora elas próprias não constituam necessariamente empresas, possam ser qualificadas de «associações de empresas».

79

No caso em apreço, tendo em conta o objeto do processo principal e as afirmações do órgão jurisdicional de reenvio, importa considerar que o artigo 101.o TFUE é aplicável à UEFA e à URBSFA, uma vez que estas duas associações têm como membros ou como filiados, direta ou indiretamente, entidades que podem ser qualificadas de «empresas» na medida em que exercem uma atividade económica, à semelhança dos clubes de futebol.

1.   Quanto à interpretação do artigo 101.o, n.o 1, TFUE

80

O artigo 101.o, n.o 1, TFUE declara incompatíveis com o mercado interno e proibidos todos os acordos entre empresas, todas as decisões de associações de empresas e todas as práticas concertadas que sejam suscetíveis de afetar o comércio entre os Estados‑Membros e que tenham por objetivo ou efeito impedir, restringir ou falsear a concorrência no mercado interno.

a)   Quanto à existência de uma «decisão de uma associação de empresas»

81

A aplicação do artigo 101.o, n.o 1, TFUE a uma entidade como a UEFA ou a URBSFA, enquanto associação de empresas, torna necessário, primeiro, demonstrar a existência de uma «decisão de uma associação de empresas», como uma decisão em que a associação em causa adote ou execute uma regulamentação que tenha um impacto direto nas condições de exercício da atividade económica das empresas que são, direta ou indiretamente, membros dessa associação (v., neste sentido, Acórdãos de 19 de fevereiro de 2002, Wouters e o., C‑309/99, EU:C:2002:98, n.o 64, e de 28 de fevereiro de 2013, Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas, C‑1/12, EU:C:2013:127, n.os 42 a 45).

82

Ora, no presente processo, é o caso das duas decisões em relação às quais o órgão jurisdicional de reenvio interroga o Tribunal de Justiça, ou seja, as decisões pelas quais a UEFA e a URBSFA adotaram as regras relativas aos «jogadores formados localmente».

b)   Quanto à afetação do comércio entre Estados‑Membros

83

Segundo, a aplicação do artigo 101.o, n.o 1, TFUE a tais decisões implica que se demonstre, com um grau de probabilidade suficiente, que estas são «suscetíveis de afetar o comércio entre os Estados‑Membros», de forma significativa, ao exercer uma influência direta ou indireta e efetiva ou potencial sobre os fluxos de trocas comerciais que pode obstar à realização e ao funcionamento do mercado interno.

84

No caso em apreço, o alcance geográfico das decisões em causa no processo principal permite considerar, tendo em conta a jurisprudência constante do Tribunal de Justiça recordada no n.o 43 do presente acórdão e sem prejuízo da verificação pelo órgão jurisdicional de reenvio, que esse requisito está preenchido.

c)   Quanto ao conceito de «comportamento que tem por “objetivo” ou por “efeito” prejudicar a concorrência» e quanto à caracterização da existência de tal comportamento

85

Para se poder considerar, num determinado caso, que um acordo, uma decisão de uma associação de empresas ou uma prática concertada é abrangido(a) pela proibição constante do artigo 101.o, n.o 1, TFUE, é necessário, em conformidade com os próprios termos dessa disposição, demonstrar que esse comportamento tem por objetivo impedir, restringir ou falsear a concorrência ou que esse comportamento tem este efeito (v., neste sentido, Acórdãos de 30 de junho de 1966, LTM, 56/65, EU:C:1966:38, p. 359, e de 29 de junho de 2023, Super Bock Bebidas, C‑211/22, EU:C:2023:529, n.o 31).

86

Para tal, há que proceder, num primeiro momento, à análise do objetivo do comportamento em causa. Caso, no termo dessa análise, se verifique que esse comportamento tem um objetivo anticoncorrencial, não é necessário proceder à análise do seu efeito na concorrência. Assim, apenas no caso de não se poder considerar que o referido comportamento tem um objetivo anticoncorrencial é que é necessário proceder, num segundo momento, à análise desse efeito (v., neste sentido, Acórdãos de 30 de junho de 1966, LTM, 56/65, EU:C:1966:38, p. 359, e de 26 de novembro de 2015, Maxima Latvija, C‑345/14, EU:C:2015:784, n.os 16 e 17).

87

A análise que importa efetuar difere consoante incida sobre a questão de saber se o comportamento em causa tem por «objetivo» ou por «efeito» impedir, restringir ou falsear a concorrência, estando cada um desses conceitos sujeito a um regime jurídico e probatório diferente [v., neste sentido, Acórdão de 30 de janeiro de 2020, Generics (UK) e o., C‑307/18, EU:C:2020:52, n.o 63].

1) Quanto à caracterização da existência de um comportamento que tem por «objetivo» impedir, restringir ou falsear a concorrência

88

Como resulta da jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, recordada, em especial, nos Acórdãos de 23 de janeiro de 2018, F. Hoffmann‑La Roche e o. (C‑179/16, EU:C:2018:25, n.o 78), e de 30 de janeiro de 2020, Generics (UK) e o. (C‑307/18, EU:C:2020:52, n.o 67), o conceito de «objetivo anticoncorrencial», embora não constitua, como decorre dos n.os 85 e 86 do presente acórdão, uma exceção em relação ao conceito de «efeito concorrencial», deve ser interpretado de forma restritiva.

89

Assim, esse conceito deve ser entendido no sentido de que remete exclusivamente para certos tipos de coordenação entre empresas que revelem um grau suficiente de nocividade para a concorrência para se poder considerar que a análise dos seus efeitos não é necessária. De facto, certas formas de coordenação entre empresas podem ser consideradas, pela sua própria natureza, nocivas para o bom funcionamento do jogo normal da concorrência [v., neste sentido, Acórdãos de 30 de junho de 1966, LTM, 56/65, EU:C:1966:38, p. 359; de 23 de janeiro de 2018, F. Hoffmann‑La Roche e o., C‑179/16, EU:C:2018:25, n.o 78, e de 30 de janeiro de 2020, Generics (UK) e o., C‑307/18, EU:C:2020:52, n.o 67].

90

Entre os tipos de comportamentos que devem ser considerados como tal incluem‑se, maioritariamente, determinados comportamentos colusórios especialmente nocivos para a concorrência, como os carteis horizontais que levam à fixação dos preços, à limitação da capacidade de produção ou à repartição da clientela. De facto, esses tipos de comportamentos podem provocar um aumento dos preços ou uma redução da produção e, portanto, da oferta, levando a uma má utilização dos recursos, em detrimento das empresas utilizadoras e dos consumidores (v., neste sentido, Acórdãos de 20 de novembro de 2008, Beef Industry Development Society e Barry Brothers, C‑209/07, EU:C:2008:643, n.os 17 e 33; de 11 de setembro de 2014, CB/Comissão, C‑67/13 P, EU:C:2014:2204, n.o 51, e de 16 de julho de 2015, ING Pensii, C‑172/14, EU:C:2015:484, n.o 32).

91

Pode igualmente considerar‑se que outros tipos de comportamentos, não sendo necessariamente tão nocivos para a concorrência, em determinados casos, têm um objetivo anticoncorrencial. É o caso, nomeadamente, de certos tipos de acordos horizontais que não os cartéis, por exemplo, os que levem à exclusão de empresas concorrentes do mercado [v., neste sentido, Acórdãos de 30 de janeiro de 2020, Generics (UK) e o., C‑307/18, EU:C:2020:52, n.os 76, 77, 83 a 87 e 101, e de 25 de março de 2021, Lundbeck/Comissão, C‑591/16 P, EU:C:2021:243, n.os 113 e 114], ou ainda de certos tipos de decisões de associações de empresas que tenham por objetivo coordenar o comportamento dos seus membros, nomeadamente em termos de preços (v., neste sentido, Acórdão de 27 de janeiro de 1987, Verband der Sachversicherer/Comissão, 45/85, EU:C:1987:34, n.o 41).

92

Para se determinar, num determinado caso, se um acordo, uma decisão de uma associação de empresas ou uma prática concertada apresenta, pela sua própria natureza, um grau suficiente de nocividade para a concorrência para se poder considerar que tem por objetivo impedir, restringir ou falsear a concorrência, é necessário analisar, primeiro, o teor do acordo, da decisão ou da prática em causa, segundo, o contexto económico e jurídico no qual se inserem e, terceiro, as finalidades que pretendem alcançar (v., neste sentido, Acórdãos de 11 de setembro de 2014, CB/Comissão, C‑67/13 P, EU:C:2014:2204, n.o 53, e de 23 de janeiro de 2018, F. Hoffmann‑La Roche e o., C‑179/16, EU:C:2018:25, n.o 79).

93

A este respeito, antes de mais, quanto ao contexto económico e jurídico no qual se insere o comportamento em causa, há que tomar em consideração a natureza dos produtos ou dos serviços afetados e as condições reais que caracterizam a estrutura e o funcionamento do ou dos setores ou mercados em questão (Acórdãos de 11 de setembro de 2014, CB/Comissão, C‑67/13 P, EU:C:2014:2204, n.o 53, e de 23 de janeiro de 2018, F. Hoffmann‑La Roche e o., C‑179/16, EU:C:2018:25, n.o 80). Em contrapartida, não é, de modo nenhum, necessário analisar e, por maioria de razão, demonstrar os efeitos desse comportamento na concorrência, sejam eles reais ou potenciais e negativos ou positivos, como decorre da jurisprudência referida nos n.os 85 e 86 do presente acórdão.

94

Em seguida, no que diz respeito às finalidades prosseguidas pelo comportamento em causa, há que determinar as finalidades objetivas que esse comportamento pretende alcançar relativamente à concorrência. Em contrapartida, a circunstância de as empresas envolvidas terem atuado sem a intenção subjetiva de impedir, restringir ou falsear a concorrência e o facto de terem prosseguido determinados objetivos legítimos não são determinantes para efeitos de aplicação do artigo 101.o, n.o 1, TFUE (v., neste sentido, Acórdãos de 6 de abril de 2006, General Motors/Comissão, C‑551/03 P, EU:C:2006:229, n.os 64 e 77 e jurisprudência referida, e de 20 de novembro de 2008, Beef Industry Development Society e Barry Brothers, C‑209/07, EU:C:2008:643, n.o 21).

95

Em especial, o Tribunal de Justiça considerou reiteradamente que acordos destinados a compartimentar os mercados em função de fronteiras nacionais, a reconstituir a compartimentação dos mercados nacionais ou a tornar mais difícil a interpenetração dos mercados nacionais podem contrariar o objetivo dos Tratados UE e FUE de realizar a integração desses mercados através do estabelecimento do mercado interno, devendo, por isso, ser qualificados, em princípio, de acordos que têm «por objetivo» restringir a concorrência na aceção do artigo 101.o, n.o 1, TFUE (v., neste sentido, Acórdãos de 16 de setembro de 2008, Sot. Lélos kai Sia e o., C‑468/06 a C‑478/06, EU:C:2008:504, n.o 65 e jurisprudência referida, e de 4 de outubro de 2011, Football Association Premier League e o., C‑403/08 e C‑429/08, EU:C:2011:631, n.o 139).

96

Essa jurisprudência, que foi igualmente aplicada a comportamentos que não acordos, quer de empresas quer de associações de empresas (v., neste sentido, Acórdãos de 17 de outubro de 1972, Vereeniging van Cementhandelaren/Comissão, 8/72, EU:C:1972:84, n.os 23 a 25 e 29, e de 16 de setembro de 2008, Sot. Lélos kai Sia e o., C‑468/06 a C‑478/06, EU:C:2008:504, n.o 66), baseia‑se no facto de, como resulta do artigo 3.o, n.o 1, alínea b), TFUE, o estabelecimento das regras de concorrência necessárias ao funcionamento do mercado interno ser parte integrante do objetivo de estabelecimento desse mercado, que o artigo 3.o, n.o 3, TUE atribui, entre outros, à União (v., neste sentido, Acórdão de 12 de maio de 2022, Servizio Elettrico Nazionale e o., C‑377/20, EU:C:2022:379, n.os 42 e 43 e jurisprudência referida). Com efeito, ao compartimentar os mercados em função das fronteiras nacionais, ao reconstituir a sua compartimentação ou ao tornar mais difícil a sua interpenetração, tais comportamentos neutralizam as vantagens que os consumidores poderiam retirar de uma concorrência efetiva e não falseada no mercado interno (v., neste sentido, Acórdão de 16 de setembro de 2008, Sot. Lélos kai Sia e o., C‑468/06 à C‑478/06, EU:C:2008:504, n.o 66).

97

Assim, a qualificação de «objetivo» anticoncorrencial, na aceção do artigo 101.o, n.o 1, TFUE, foi adotada no caso de diferentes formas de acordos destinados ou tendentes a restringir a concorrência em função das fronteiras nacionais, quer se trate, nomeadamente, de impedir ou de restringir o comércio paralelo, de garantir uma proteção territorial absoluta a titulares de direitos exclusivos ou de limitar, de outros modos, a concorrência transfronteiriça no mercado interno (v., neste sentido, Acórdãos de 6 de outubro de 2009, GlaxoSmithKline Services e o./Comissão e o., C‑501/06 P, C‑513/06 P, C‑515/06 P e C‑519/06 P, EU:C:2009:610, n.o 61, e de 4 de outubro de 2011, Football Association Premier League e o., C‑403/08 e C‑429/08, EU:C:2011:631, n.os 139 a 142).

98

Por último, a caracterização de um determinado comportamento como tendo por «objetivo» impedir, restringir ou falsear a concorrência deve, em todo o caso, revelar as razões concretas pelas quais esse comportamento apresenta um grau suficiente de nocividade para a concorrência, que justifica que se considere que tem tal objetivo (v., neste sentido, Acórdão de 11 de setembro de 2014, CB/Comissão, C‑67/13 P, EU:C:2014:2204, n.o 69).

2) Quanto à caracterização da existência de um comportamento que tem por «efeito» impedir, restringir ou falsear a concorrência

99

O conceito de «comportamento que tem um “efeito” anticoncorrencial» inclui, por seu turno, qualquer comportamento que não se possa considerar que tem um «objetivo» anticoncorrencial, desde que se demonstre que esse comportamento tem por efeito real ou potencial impedir, restringir ou falsear a concorrência de forma significativa [v., neste sentido, Acórdãos de 28 de maio de 1998, Deere/Comissão, C‑7/95 P, EU:C:1998:256, n.o 77, e de 30 de janeiro de 2020, Generics (UK) e o., C‑307/18, EU:C:2020:52, n.o 117].

100

Para esse feito, é necessário analisar o jogo da concorrência no quadro real em que se verificaria se não existisse o acordo, a decisão de uma associação de empresas ou a prática concertada em causa [Acórdãos de 30 de junho de 1966, LTM, 56/65, EU:C:1966:38, p. 360, e de 30 de janeiro de 2020, Generics (UK) e o., C‑307/18, EU:C:2020:52, n.o 118], definindo o ou os mercados em que esse comportamento se destina a produzir os seus efeitos e, depois, caracterizando estes últimos, sejam eles reais ou potenciais. Esta análise implica, por seu turno, que se tenha em conta todas as circunstâncias relevantes.

3) Quanto à qualificação, enquanto decisão de uma associação de empresas que tem por «objetivo» ou por «efeito» restringir a concorrência, das regras que impõem que os clubes tenham nas suas equipas uma quota mínima de jogadores «formados localmente»

101

No caso em apreço, quanto ao conteúdo das regras da UEFA e da URBSFA em relação às quais o órgão jurisdicional de reenvio interroga o Tribunal de Justiça, importa recordar, por um lado, que essas regras impõem que os clubes de futebol profissional que participem em competições de futebol interclubes no âmbito dessas associações, registem na ficha de jogo um número mínimo de jogadores que preencham os requisitos necessários para poderem ser considerados «jogadores formados localmente», tal como definidos pelas referidas regras, sob pena de lhes serem aplicadas sanções. Ao fazê‑lo, essas regras limitam, pela sua própria natureza, a possibilidade de esses clubes registarem nessa ficha jogadores que não preencham tais requisitos.

102

Por outro lado, decorre das afirmações do órgão jurisdicional de reenvio que essa limitação da possibilidade de os clubes comporem livremente as suas equipas ocorre de duas formas diferentes. De facto, as regras da UEFA e da URBSFA impõem que esses clubes registem na ficha de jogo um número mínimo de jogadores que, embora sejam qualificados de «jogadores formados localmente», na verdade, não foram formados necessariamente pelo clube que os contrata, mas por um clube filiado na mesma federação nacional de futebol que este, seja ele qual for e independentemente de qualquer requisito de localização geográfica no âmbito territorial dessa federação. Nessa medida, a limitação causada por essas regras ocorre, na verdade, a nível da federação em causa, portanto, a nível nacional. Paralelamente, as regras da UEFA impõem também que os referidos clubes incluam, entre os «jogadores formados localmente» que devem registar na ficha de jogo, um número mínimo de jogadores que tenham efetivamente sido formados pelo clube que os contrata. Assim, a limitação por elas causada ocorre a nível do clube em questão.

103

No que diz respeito ao contexto económico e jurídico no qual se inserem as regras em relação às quais o órgão jurisdicional de reenvio interroga o Tribunal de Justiça, decorre, antes de mais, da jurisprudência do Tribunal de Justiça que, tendo em conta a natureza específica dos «produtos» que, do ponto de vista económico, as competições desportivas constituem, é permitido, de um modo geral, às associações que sejam responsáveis por uma disciplina desportiva, como a UEFA e a URBSFA, adotar regras relativas, nomeadamente, à organização das competições nessa disciplina, à sua boa evolução e à participação dos desportistas nessas competições (v., neste sentido, Acórdãos de 11 de abril de 2000, Deliège, C‑51/96 e C‑191/97, EU:C:2000:199, n.os 67 e 68, e de 13 de junho de 2019, TopFit e Biffi, C‑22/18, EU:C:2019:497, n.o 60), desde que essas associações, ao fazê‑lo, não limitem o exercício dos direitos e das liberdades conferidos pelo direito da União aos particulares (v., neste sentido, Acórdãos de 15 de dezembro de 1995, Bosman, C‑415/93, EU:C:1995:463, n.os 81 e 83, e de 13 de junho de 2019, TopFit e Biffi, C‑22/18, EU:C:2019:497, n.o 52).

104

Em seguida, as especificidades do futebol profissional e das atividades económicas que o exercício deste desporto origina permitem considerar que é legítimo que associações como a UEFA e a URBSFA enquadrem, mais concretamente, os pressupostos com base nos quais os clubes de futebol profissional podem constituir as equipas que participam em competições interclubes no seu âmbito territorial.

105

De facto, este desporto, que, na União, reveste uma importância considerável, não apenas social e cultural (Acórdãos de 15 de dezembro de 1995, Bosman, C‑415/93, EU:C:1995:463, n.o 106, e de 16 de março de 2010, Olympique Lyonnais, C‑325/08, EU:C:2010:143, n.o 40), mas também mediática, caracteriza‑se, entre outras especificidades, pelo facto de dar origem à organização de muitas competições tanto a nível europeu como a nível nacional, nas quais são chamados a participar um grande número de clubes e um grande número de jogadores. Além disso, caracteriza‑se, à semelhança de alguns outros desportos, pelo facto de a participação nessas competições ser reservada a equipas que tenham obtido determinados resultados desportivos (v., neste sentido, Acórdão de 15 de dezembro de 1995, Bosman, C‑415/93, EU:C:1995:463, n.o 132), baseando‑se o desenrolar das referidas competições no confronto e na eliminação progressiva dessas equipas. Por conseguinte, assenta essencialmente no mérito desportivo, que só pode ser demonstrado se todas as equipas participantes tiverem sido constituídas de acordo com requisitos regulamentares e técnicas homogéneas, assegurando uma certa igualdade de oportunidades.

106

Por último, as condições reais que caracterizam o funcionamento do «mercado» que constituem, do ponto de vista económico, as competições de futebol profissional explicam que as regras que podem ser adotadas por associações como a UEFA e a URBSFA, e mais concretamente as relativas à organização e ao bom desenrolar das competições no âmbito destas, possam continuar a remeter, em determinados aspetos e em certa medida, para um requisito ou para um critério de ordem nacional. De facto, do ponto de vista funcional, este desporto caracteriza‑se pela coexistência de competições interclubes e de competições entre equipas que representam federações nacionais de futebol, cuja composição pode, legitimamente, estar sujeita ao cumprimento de «cláusulas de nacionalidade» atendendo à natureza especifica desses encontros (v., neste sentido, Acórdão de 15 de dezembro de 1995, Bosman, C‑415/93, EU:C:1995:463, n.os 127 e 128 e jurisprudência referida).

107

No que se refere à finalidade que as regras em causa no processo principal pretendem objetivamente alcançar, em relação à concorrência, decorre das afirmações do órgão jurisdicional de reenvio relativas ao conteúdo dessas regras que estas limitam ou controlam um dos parâmetros essenciais da concorrência em que os clubes de futebol profissional se podem envolver, ou seja, o recrutamento de jogadores talentosos, independentemente do clube e do local onde se formaram, que possam permitir à sua equipa vencer no confronto com a equipa adversária. Nesta perspetiva, o Governo Belga acrescentou, com razão, que essa limitação pode ter impacto na concorrência em que os clubes se podem envolver, não só no «mercado a montante ou de abastecimento» constituído, do ponto de vista económico, pelo recrutamento de jogadores, mas também no «mercado a jusante», constituído, do mesmo ponto de vista, pelas competições de futebol interclubes.

108

É, contudo, ao órgão jurisdicional de reenvio que caberá determinar se as regras em causa no processo principal apresentam, pela sua própria natureza, um grau suficiente de nocividade para a concorrência para se poder considerar que têm por «objetivo» restringir a concorrência.

109

Para esse efeito, caber‑lhe‑á ter em conta, em conformidade com a jurisprudência recordada no n.o 92 do presente acórdão, o teor dessas regras e determinar se estas limitam, em suficiente medida para se considerar que apresentam um grau de nocividade que as permite qualificar de anticoncorrenciais por «objetivo», o acesso dos clubes de futebol profissional aos «recursos» essenciais para o seu sucesso que são, do ponto de vista económico, os jogadores já formados, ao impor‑lhes que recrutem um número mínimo de jogadores formados num âmbito nacional, em detrimento da concorrência transfronteiriça em que se poderiam, normalmente, envolver recrutando jogadores formados noutras federações nacionais de futebol. A proporção de jogadores em causa tem, nessa perspetiva, especial relevância.

110

Competirá igualmente ao órgão jurisdicional de reenvio tomar em consideração, em conformidade com a jurisprudência recordada nos n.os 70 a 73, 93 e 94 do presente acórdão, o contexto económico e jurídico no qual as regras em causa no processo principal foram adotadas, bem como as especificidades do futebol, e apreciar se a adoção dessas regras teve ou não como finalidade restringir o acesso dos clubes a esses recursos, compartimentar ou recompartimentar os mercados em função de fronteiras nacionais ou tornar mais difícil a interpenetração dos mercados nacionais, instituindo uma forma de «preferência nacional».

111

Se, no termo da sua análise, o órgão jurisdicional de reenvio chegar à conclusão de que o grau de nocividade das regras em causa no processo principal é suficiente para justificar que se considere que estas têm por objetivo restringir a concorrência e, consequentemente, são abrangidas pela proibição constante do artigo 101.o, n.o 1, TFUE, não será necessário analisar os seus efeitos reais ou potenciais.

112

Caso contrário, competir‑lhe‑á analisar esses efeitos.

d)   Quanto à possibilidade de se considerar que determinados comportamentos específicos não são abrangidos pelo artigo 101.o, n.o 1, TFUE

113

Decorre de jurisprudência assente do Tribunal de Justiça que qualquer acordo entre empresas ou qualquer decisão de uma associação de empresas que restrinja a liberdade de ação das empresas partes nesse acordo ou sujeitas ao respeito por essa decisão não fica necessariamente sob a alçada da proibição constante do artigo 101.o, n.o 1, TFUE. De facto, a análise do contexto económico e jurídico no qual se inserem alguns desses acordos e algumas dessas decisões pode levar a concluir, primeiro, que estes se justificam pela prossecução de um ou mais objetivos legítimos de interesse geral desprovidos, em si, de caráter anticoncorrencial, segundo, que os meios concretos a que se recorreu para prosseguir esses objetivos são verdadeiramente necessários para esse fim e, terceiro, que, mesmo que se verifique que esses meios têm por efeito inerente restringir ou falsear, pelo menos potencialmente, a concorrência, este efeito inerente não vai além do necessário, em especial eliminando toda a concorrência. Esta jurisprudência pode ser aplicada, particularmente, a acordos ou decisões que assumam a forma de regras adotadas por uma associação como uma associação profissional ou uma associação desportiva, com vista a prosseguir determinados objetivos de ordem ética ou deontológica e, de um modo mais geral, a enquadrar o exercício de uma atividade profissional, se a associação em causa demonstrar que os requisitos que acabam de ser recordados estão preenchidos (v., neste sentido, Acórdãos de 19 de fevereiro de 2002, Wouters e o., C‑309/99, EU:C:2002:98, n.o 97; de 18 de julho de 2006, Meca‑Medina e Majcen/Comissão, C‑519/04 P, EU:C:2006:492, n.os 42 a 48, e de 28 de fevereiro de 2013, Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas, C‑1/12, EU:C:2013:127, n.os 93, 96 e 97).

114

Mais concretamente, no domínio do desporto, o Tribunal de Justiça foi levado a concluir, atendendo aos elementos de que dispunha, que a regulamentação antidopagem adotada pelo Comité Olímpico Internacional (COI) não fica sob a alçada da proibição constante do artigo 101.o, n.o 1, TFUE, apesar de limitar a liberdade de ação dos atletas e de ter por efeito inerente restringir a concorrência potencial entre estes ao definir um limite acima do qual a presença de nandrolona constitui dopagem, com o objetivo de preservar o desenrolar leal, íntegro e objetivo da competição desportiva, assegurar a igualdade de oportunidades dos atletas, proteger a sua saúde e fazer respeitar os valores éticos que estão no cerne do desporto, entre os quais se inclui o mérito (v., neste sentido, Acórdão de 18 de julho de 2006, Meca‑Medina e Majcen/Comissão, C‑519/04 P, EU:C:2006:492, n.os 43 a 55).

115

Em contrapartida, a jurisprudência referida no n.o 113 do presente acórdão não pode ser aplicada a comportamentos que, longe de se limitarem a ter por «efeito» inerente restringir, pelo menos potencialmente, a concorrência ao limitar a liberdade de ação de certas empresas, apresentam, relativamente a essa concorrência, um grau de nocividade que justifica que se considere que têm mesmo por «objetivo» impedi‑la, restringi‑la ou falseá‑la. Assim, só se se verificar, no termo da análise do comportamento que está em causa num determinado caso concreto, que esse comportamento não tem por objetivo impedir, restringir ou falsear a concorrência, é que há que determinar, em seguida, se pode ser abrangido por essa jurisprudência (v., neste sentido, Acórdãos de 28 de fevereiro de 2013, Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas, C‑1/12, EU:C:2013:127, n.o 69; de 4 de setembro de 2014, API e o., C‑184/13 a C‑187/13, C‑194/13, C‑195/13 e C‑208/13, EU:C:2014:2147, n.o 49, e de 23 de novembro de 2017, CHEZ Elektro Bulgaria e FrontEx International, C‑427/16 e C‑428/16, EU:C:2017:890, n.os 51, 53, 56 e 57).

116

Quanto aos comportamentos que têm por objetivo impedir, restringir ou falsear a concorrência, é, pois, unicamente em aplicação do artigo 101.o, n.o 3, TFUE e desde que sejam respeitados todos os requisitos previstos nesta disposição, que lhes pode ser concedido o benefício de uma isenção da proibição constante do artigo 101.o, n.o 1, TFUE (v., neste sentido, Acórdão de 20 de novembro de 2008, Beef Industry Development Society e Barry Brothers, C‑209/07, EU:C:2008:643, n.o 21).

117

Assim, no caso em apreço, só se o órgão jurisdicional de reenvio, no termo da sua análise das regras em causa no processo principal, chegar à conclusão de que estas não têm por objetivo restringir a concorrência, mas têm esse efeito, é que lhe caberá verificar se as mesmas preenchem os requisitos referidos no n.o 113 do presente acórdão, tendo em conta, nesse âmbito, os objetivos apresentados, nomeadamente, pelas associações desportivas em causa no processo principal, que consistem em assegurar a homogeneidade dos pressupostos com base nos quais são constituídas as equipas que participam nas competições de futebol interclubes no âmbito dessas associações e encorajar a formação de jovens jogadores de futebol profissional.

2.   Quanto à interpretação do artigo 101.o, n.o 3, TFUE

118

Decorre da própria redação do artigo 101.o, n.o 3, TFUE que qualquer acordo, qualquer decisão de uma associação de empresas ou qualquer prática concertada que seja contrária ao artigo 101.o, n.o 1, TFUE, seja devido ao seu objetivo ou ao seu efeito anticoncorrencial, pode beneficiar de uma isenção se preencher todos os requisitos previstos para esse efeito (v., neste sentido, Acórdãos de 11 de julho de 1985, Remia e o./Comissão, 42/84, EU:C:1985:327, n.o 38, e de 11 de setembro de 2014, MasterCard e o./Comissão, C‑382/12 P, EU:C:2014:2201, n.o 230), sendo que estes requisitos são mais restritos do que os referidos no n.o 113 do presente acórdão.

119

Em conformidade com o artigo 101.o, n.o 3, TFUE, o benefício dessa isenção, num determinado caso, está sujeito a quatro requisitos cumulativos. Primeiro, deve demonstrar‑se, com um grau de probabilidade suficiente (Acórdão de 6 de outubro de 2009, GlaxoSmithKline Services e o./Comissão e o., C‑501/06 P, C‑513/06 P, C‑515/06 P e C‑519/06 P, EU:C:2009:610, n.o 95), que o acordo, a decisão de uma associação de empresas ou a prática concertada em causa deve permitir obter ganhos de eficiência, contribuindo para melhorar a produção ou a distribuição dos produtos ou dos serviços em causa ou para promover o progresso técnico ou económico. Segundo, deve demonstrar‑se, na mesma medida, que uma parte equitativa do lucro resultante desses ganhos de eficiência é reservada aos utilizadores. Terceiro, o acordo, a decisão ou a prática em causa não deve impor às empresas participantes quaisquer restrições que não sejam indispensáveis à obtenção de tais ganhos de eficiência. Quarto, esse acordo, essa decisão ou essa prática não deve dar às empresas participantes a possibilidade de eliminar qualquer concorrência efetiva relativamente a uma parte substancial dos produtos ou dos serviços em questão.

120

Cabe à parte que invoca tal isenção demonstrar, através de argumentos e elementos de prova convincentes, que todos os requisitos exigidos para beneficiar dessa isenção estão preenchidos (v., neste sentido, Acórdãos de 11 de julho de 1985, Remia e o./Comissão, 42/84, EU:C:1985:327, n.o 45, e de 6 de outubro de 2009, GlaxoSmithKline Services e o./Comissão e o., C‑501/06 P, C‑513/06 P, C‑515/06 P e C‑519/06 P, EU:C:2009:610, n.o 82). Caso esses argumentos e elementos de prova possam obrigar a outra parte a refutá‑los de modo convincente, é permitido, na falta de tal refutação, concluir que o ónus da prova que incumbe à parte que invoca o artigo 101.o, n.o 3, TFUE foi satisfeito (v., neste sentido, Acórdãos de 7 de janeiro de 2004, Aalborg Portland e o./Comissão, C‑204/00 P, C‑205/00 P, C‑211/00 P, C‑213/00 P, C‑217/00 P e C‑219/00 P, EU:C:2004:6, n.o 79, e de 6 de outubro de 2009, GlaxoSmithKline Services e o./Comissão e o., C‑501/06 P, C‑513/06 P, C‑515/06 P e C‑519/06 P, EU:C:2009:610, n.o 83).

121

Em especial, quanto ao primeiro requisito recordado no n.o 119 do presente acórdão, os ganhos de eficiência que o acordo, a decisão de uma associação de empresas ou a prática concertada deve permitir obter não correspondem a vantagens que as empresas participantes retirem desse acordo, dessa decisão ou dessa prática no âmbito da sua atividade económica, mas apenas às vantagens objetivas sensíveis que o referido acordo, a referida decisão ou a referida prática, em concreto, permita obter no ou nos diferentes setores ou mercados em causa. Além disso, para que este primeiro requisito possa ser considerado preenchido, importa não apenas determinar a realidade e a extensão desses ganhos de eficiência mas igualmente demonstrar que estes são passíveis de compensar os inconvenientes resultantes do acordo, da decisão ou da prática em causa no plano da concorrência (v., neste sentido, Acórdãos de 13 de julho de 1966, Consten e Grundig/Comissão, 56/64 e 58/64, EU:C:1966:41, p. 502, e de 11 de setembro de 2014, MasterCard e o./Comissão, C‑382/12 P, EU:C:2014:2201, n.os 232, 234 e 236, bem como, por analogia, de 27 de março de 2012, Post Danmark, C‑209/10, EU:C:2012:172, n.o 43).

122

No que diz respeito ao segundo requisito recordado no n.o 119 do presente acórdão, este implica que se demonstre que os ganhos de eficiência que o acordo, a decisão de uma associação de empresas ou a prática concertada em causa deve permitir obter têm um impacto positivo em todos os utilizadores, quer se trate de profissionais, de consumidores intermédios ou de consumidores finais, nos diferentes setores ou mercados em causa (v., neste sentido, Acórdãos de 23 de novembro de 2006, Asnef‑Equifax e Administración del Estado, C‑238/05, EU:C:2006:734, n.o 70, e de 11 de setembro de 2014, MasterCard e o./Comissão, C‑382/12 P, EU:C:2014:2201, n.os 236 e 242).

123

Daqui decorre que, numa situação em que o comportamento que viola o artigo 101.o, n.o 1, TFUE seja anticoncorrencial por objetivo, isto é, apresente um grau suficiente de nocividade para a concorrência e, por outro lado, possa afetar diferentes categorias de utilizadores ou de consumidores, importa determinar se e, se for o caso, em que medida, esse comportamento, não obstante a sua nocividade, tem um impacto positivo em cada uma delas.

124

No que se refere ao terceiro requisito recordado no n.o 119 do presente acórdão, relativo ao caráter indispensável ou necessário do comportamento em causa, este implica que se aprecie e se compare o impacto respetivo desse comportamento e das medidas alternativas realmente possíveis, com vista a determinar se os ganhos de eficiência esperados do referido comportamento podem ser obtidos por medidas menos restritivas para a concorrência. Em contrapartida, não pode levar a que se efetue, oportunamente, uma escolha entre tal comportamento e tais medidas alternativas quando estas não se revelem menos restritivas para a concorrência.

125

Quanto ao quarto requisito recordado no n.o 119 do presente acórdão, a verificação do seu cumprimento, num determinado caso, implica que se proceda a uma análise dos elementos de natureza quantitativa e qualitativa que caracterizam o funcionamento da concorrência nos setores ou nos mercados em causa, a fim de determinar se o acordo, a decisão de uma associação de empresas ou a prática concertada em causa dá às empresas participantes a possibilidade de eliminar qualquer concorrência efetiva relativamente a uma parte substancial dos produtos ou dos serviços em questão. Em especial, no caso de uma decisão de uma associação de empresas ou de um acordo à(ao) qual tenham aderido coletivamente empresas, a quota de mercado muito significativa detida por estas pode constituir, entre outras circunstâncias relevantes e no âmbito de uma análise de conjunto destas, um indicador da possibilidade que essa decisão ou esse acordo, atendendo ao seu conteúdo e ao seu objetivo ou ao seu efeito, dá às empresas participantes de eliminar qualquer concorrência efetiva, razão que exclui, por si só, o benefício da isenção prevista no artigo 101.o, n.o 3, TFUE.

126

De um modo mais geral, a análise dos diferentes requisitos referidos no n.o 119 do presente acórdão pode tornar necessário que se tenha em conta as características e as especificidades do ou dos setores ou mercados a que o acordo, a decisão de uma associação de empresas ou a prática concertada em causa diz respeito, se essas características e essas especificidades forem determinantes para o resultado dessa análise (v., neste sentido, Acórdãos de 6 de outubro de 2009, GlaxoSmithKline Services e o./Comissão e o., C‑501/06 P, C‑513/06 P, C‑515/06 P e C‑519/06 P, EU:C:2009:610, n.o 103, e de 11 de setembro de 2014, MasterCard e o./Comissão, C‑382/12 P, EU:C:2014:2201, n.o 236).

127

Além disso, há que recordar que o incumprimento de um dos quatro requisitos referidos no n.o 119 do presente acórdão é suficiente para excluir o benefício da isenção prevista no artigo 101.o, n.o 3, TFUE.

128

No caso em apreço, caberá ao órgão jurisdicional de reenvio pronunciar‑se sobre a questão de saber se as regras em causa no processo principal preenchem todos os requisitos que lhes permitem beneficiar de uma isenção ao abrigo do artigo 101.o, n.o 3, TFUE, depois de dar às partes a oportunidade de cumprir o ónus da prova que lhes incumbe, como recordado no n.o 120 do presente acórdão.

129

Assim sendo, importa observar, quanto ao primeiro desses requisitos, relativo às vantagens objetivas sensíveis que um comportamento que tenha por objetivo ou por efeito impedir, restringir ou falsear a concorrência deve permitir obter no ou nos setores ou mercados em causa, que as regras em causa no processo principal podem encorajar os clubes de futebol profissional a recrutar e a formar jovens jogadores, portanto, a intensificar a concorrência por meio da formação. Caberá, contudo, apenas ao órgão jurisdicional de reenvio pronunciar‑se, atendendo aos argumentos e aos elementos de prova concretos apresentados ou a apresentar pelas partes, sejam eles de ordem económica, estatística ou outra, sobre a realidade desse encorajamento, sobre a extensão dos ganhos de eficiência daí decorrentes em termos de formação e sobre a questão de saber se esses ganhos de eficiência são passíveis de compensar os inconvenientes resultantes das referidas regras no plano da concorrência.

130

No que diz respeito ao segundo requisito, de acordo com a qual o comportamento em causa deve ter um impacto positivo para os utilizadores, quer se trate de profissionais, de consumidores intermédios ou de consumidores finais, nos diferentes setores ou mercados em causa, importa sublinhar que, no caso em apreço, os «utilizadores» incluem, maioritariamente, os clubes de futebol profissional e os próprios jogadores. Acrescem, de um modo mais geral, os «consumidores» finais que são, no sentido económico do termo, os espectadores ou telespectadores. Quanto a estes últimos, não se pode excluir a priori que o interesse que alguns têm nas competições interclubes dependa, entre outros parâmetros, do local de estabelecimento dos clubes que nelas participam e da existência, nas equipas utilizadas por estes, de jogadores formados localmente. Caberá, pois, ao órgão jurisdicional de reenvio pronunciar‑se, nomeadamente, atendendo aos argumentos e aos elementos de prova concretos apresentados ou a apresentar pelas partes, sobre a questão de saber se as regras em causa no processo principal têm, no mercado por elas mais afetado, ou seja, o do recrutamento dos jogadores por esses clubes, um impacto positivo real, não apenas nos jogadores, mas igualmente em todos os clubes, bem como nos espectadores e nos telespectadores, ou se, como foi sustentado no Tribunal de Justiça, funcionam, na prática, em benefício de determinadas categorias de clubes, mas também, simultaneamente, em detrimento de outros.

131

No que diz respeito ao terceiro requisito, relativo ao caráter estritamente necessário das regras em causa no processo principal, caberá ao órgão jurisdicional de reenvio verificar, atendendo aos argumentos e aos elementos de prova concretos apresentados ou a apresentar pelas partes, se medidas alternativas como as que foram invocadas no Tribunal de Justiça, ou seja, a imposição de requisitos de formação de jogadores para efeitos de concessão de licenças aos clubes de futebol profissional, a adoção de mecanismos de financiamento ou de incentivos financeiros dirigidos, nomeadamente, aos clubes pequenos, ou um sistema de compensação direta dos custos suportados pelos clubes formadores, são passíveis de constituir, de acordo com o direito da União (v., quanto a este aspeto, Acórdãos de 15 de dezembro de 1995, Bosman, C‑415/93, EU:C:1995:463, n.os 108 e 109, e de 16 de março de 2010, Olympique Lyonnais, C‑325/08, EU:C:2010:143, n.os 41 a 45), medidas menos restritivas da concorrência.

132

Quanto ao quarto requisito, relativo à questão de saber se as regras em causa no processo principal, embora restrinjam a concorrência em que os clubes de futebol profissional se podem envolver através do recrutamento de jogadores já formados, não eliminam essa concorrência, o elemento determinante é o nível no qual foram fixadas as proporções mínimas de «jogadores formados localmente» a registar na ficha de jogo, relativamente ao número total de jogadores que dela deve constar. A Comissão referiu, mais concretamente, que, em relação a regras análogas sobre as quais se pronunciou, essas proporções mínimas não lhe parecem desproporcionadas, mesmo tendo em conta que os clubes de futebol profissional podem, na realidade, querer ou ter de recrutar um número superior de «jogadores formados localmente» para fazer face a riscos como a ocorrência de acidentes ou de doenças. Contudo, caberá apenas ao órgão jurisdicional de reenvio pronunciar‑se, em última instância, sobre esta questão.

133

Essa apreciação deve ser efetuada comparando, na medida do possível, a situação que resulta das restrições de concorrência em causa com o que seria a situação do mercado em causa se a concorrência não tivesse sido impedida, restringida ou falseada nesse mercado devido a essas restrições.

134

Em contrapartida, o facto de as regras em causa no processo principal se aplicarem a todas as competições interclubes no âmbito da UEFA e da URBSFA, bem como a todos os clubes de futebol profissional e a todos os jogadores que nelas participam, não é determinante. De facto, esse elemento é inerente à própria existência de associações que disponham, num determinado âmbito territorial, de um poder regulamentar a cujo respeito estão sujeitas todas as empresas que delas sejam membros e todas as pessoas nelas filiadas.

135

Tendo em conta todas as considerações precedentes, importa responder às questões submetidas pelo órgão jurisdicional de reenvio, na medida em que dizem respeito ao artigo 101.o TFUE, que:

O artigo 101.o, n.o 1, TFUE deve ser interpretado no sentido de que se opõe a regras que tenham sido adotadas por uma associação responsável pela organização de competições de futebol a nível europeu e aplicadas tanto por essa associação como pelas federações nacionais de futebol membros desta, e que imponham que cada clube que participe nessas competições inclua na sua lista de jogadores e registe na ficha de jogo um número mínimo de jogadores formados pelo próprio clube ou no âmbito territorial da federação nacional na qual o referido clube esteja filiado, bem como a regras que tenham sido adotadas por uma associação responsável pela organização de competições de futebol a nível nacional e que imponham que cada clube que participe nessas competições inclua na sua lista de jogadores e registe na ficha de jogo um número mínimo de jogadores formados no âmbito territorial dessa associação, se se demonstrar, por um lado, que essas decisões de associações de empresas são suscetíveis de afetar o comércio entre os Estados‑Membros e, por outro, que estas têm por objetivo ou por efeito restringir a concorrência entre os clubes de futebol profissional, a menos que, no segundo caso, se demonstre, através de argumentos e elementos de prova convincentes, que as mesmas são simultaneamente justificadas pela prossecução de um ou mais objetivos legítimos e estritamente necessárias para esse efeito;

o artigo 101.o, n.o 3, TFUE deve ser interpretado no sentido de que só permite que tais decisões de associações de empresas, se se revelarem contrárias ao n.o 1 desse artigo, beneficiem de uma isenção da aplicação deste último número se se demonstrar, através de argumentos e elementos de prova convincentes, que todos os requisitos exigidos para esse efeito estão preenchidos.

C. Quanto às questões prejudiciais na medida em que dizem respeito ao artigo 45.o TFUE

1.   Quanto à existência de discriminação indireta ou de um obstáculo à liberdade de circulação de trabalhadores

136

Importa salientar, em primeiro lugar, que o artigo 45.o TFUE, que tem efeito direto, se opõe a qualquer medida, seja ela baseada na nacionalidade ou aplicada independentemente da nacionalidade, que seja suscetível de desfavorecer os nacionais da União que desejem exercer uma atividade económica no território de um Estado‑Membro diferente do seu Estado‑Membro de origem, impedindo‑os ou dissuadindo‑os de abandonar este último (v., neste sentido, Acórdãos de 15 de dezembro de 1995, Bosman, C‑415/93, EU:C:1995:463, n.os 93 a 96, e de 16 de março de 2010, Olympique Lyonnais, C‑325/08, EU:C:2010:143, n.os 33 e 34).

137

No caso em apreço, como afirma o órgão jurisdicional de reenvio, decorre dos seus próprios termos e da sua economia que regras como as da URBSFA são, prima facie, suscetíveis de desfavorecer os jogadores de futebol profissional que desejem exercer uma atividade económica no território de um Estado‑Membro, ou seja, a Bélgica, diferente do seu Estado‑Membro de origem e que não preencham os requisitos exigidos por essas regras. De facto, embora não se baseiem diretamente num critério de nacionalidade ou de residência, essas regras não deixam de assentar num nexo de conexão de caráter expressamente «nacional», em dois aspetos, como salientou, nomeadamente, a Comissão. Por um lado, definem «jogadores formados localmente» como jogadores que tenham sido formados num clube «belga». Por outro, impõem que os clubes de futebol profissional que desejem participar nas competições de futebol interclubes no âmbito da URBSFA incluam na sua lista de jogadores e registem na ficha de jogo um número mínimo de jogadores que preencham os requisitos exigidos para poderem ser qualificados como tal.

138

Assim, as referidas regras limitam a possibilidade de os jogadores que não possam invocar tal nexo de conexão «nacional» serem incluídos na lista dos jogadores desses clubes e registados na ficha de jogo, portanto, de poderem alinhar por esses clubes. Como foi salientado no n.o 60 do presente acórdão, a circunstância de se tratar, assim, da participação dos jogadores nas equipas, e não formalmente da possibilidade de contratar esses jogadores, é indiferente, dado que a participação em jogos e em competições constitui o objeto essencial da atividade dos jogadores.

139

Nessa medida, as regras em causa no processo principal são suscetíveis, como salientou o advogado‑geral nos n.os 43 e 44 das suas conclusões, de criar uma discriminação indireta dos jogadores originários de outro Estado‑Membro, pois podem funcionar principalmente em detrimento destes.

140

Daqui decorre que essas regras violam, prima facie, a liberdade de circulação de trabalhadores, sem prejuízo das verificações a efetuar pelo órgão jurisdicional de reenvio.

2.   Quanto à existência de uma eventual justificação

141

Podem ser admitidas medidas de origem não estatal apesar de constituírem um obstáculo a uma liberdade de circulação consagrada no Tratado FUE se se demonstrar, primeiro, que a sua adoção prossegue um objetivo legítimo de interesse geral compatível com esse Tratado e, portanto, de natureza diferente da puramente económica, e, segundo, que essas medidas respeitam o princípio da proporcionalidade, o que implica que sejam adequadas para garantir a realização desse objetivo e não vão além do necessário para o alcançar (v., neste sentido, Acórdãos de15 de dezembro de 1995, Bosman, C‑415/93, EU:C:1995:463, n.o 104; de 16 de março de 2010, Olympique Lyonnais, C‑325/08, EU:C:2010:143, n.o 38, e de 13 de junho de 2019, TopFit e Biffi, C‑22/18, EU:C:2019:497, n.o 48). No que se refere, mais concretamente, ao requisito relativo à adequação de tais medidas, importa recordar que estas só podem ser consideradas adequadas para garantir a realização do objetivo invocado se corresponderem verdadeiramente à intenção de o alcançar de forma coerente e sistemática [v., neste sentido, Acórdãos de 8 de setembro de 2009, Liga Portuguesa de Futebol Profissional e Bwin International, C‑42/07, EU:C:2009:519, n.o 61, e de 6 de outubro de 2020, Comissão/Hungria (Ensino superior),C‑66/18, EU:C:2020:792, n.o 178].

142

Da mesma forma que no caso de medidas de origem estatal, é ao autor dessas medidas de origem não estatal que cabe demonstrar que estes dois requisitos cumulativos são respeitados [v., por analogia, Acórdãos de 21 de janeiro de 2016, Comissão/Chipre, C‑515/14, EU:C:2016:30, n.o 54, e de 18 de junho de 2020, Comissão/Hungria (Transparência associativa), C‑78/18, EU:C:2020:476, n.o 77].

143

No caso em apreço, caberá, por isso, ao órgão jurisdicional de reenvio pronunciar‑se sobre a questão de saber se as regras da URBSFA em causa no processo principal preenchem os referidos requisitos, atendendo aos argumentos e aos elementos de prova apresentados pelas partes.

144

Assim sendo, importa recordar, primeiro, que, tendo em conta tanto a função social e educativa do desporto, reconhecida no artigo 165.o TFUE, como, de um modo mais geral, a importância considerável do desporto na União, muitas vezes realçada pelo Tribunal de Justiça, o objetivo de encorajar o recrutamento e a formação de jovens jogadores de futebol profissional constitui um objetivo legítimo de interesse geral (v., neste sentido, Acórdãos de 15 de dezembro de 1995, Bosman, C‑415/93, EU:C:1995:463, n.o 106, e de 16 de março de 2010, Olympique Lyonnais, C‑325/08, EU:C:2010:143, n.o 39).

145

Segundo, quanto à adequação de regras como as que estão em causa no processo principal para atingir o objetivo pretendido, importa salientar, antes de mais, que esse objetivo pode, em certos casos e sob certas condições, justificar medidas que, sem serem concebidas para garantir, de modo seguro e previamente mensurável, um aumento ou uma intensificação do recrutamento e da formação de jovens jogadores, não deixam de poder criar incentivos reais e significativos nesse sentido (v., neste sentido, Acórdãos de 15 de dezembro de 1995, Bosman, C‑415/93, EU:C:1995:463, n.os 108 e 109, e de 16 de março de 2010, Olympique Lyonnais, C‑325/08, EU:C:2010:143, n.os 41 a 45).

146

Em seguida, há que observar que, na medida em que regras como as da URBSFA em causa no processo principal impõem que os clubes de futebol profissional que desejem participar nas competições de futebol interclubes no âmbito dessa associação incluam na sua lista de jogadores e registem na ficha de jogo um número mínimo de jovens jogadores formados por um clube que faça parte da referida associação, seja qual for esse clube, a sua adequação para garantir a realização do objetivo de encorajar o recrutamento e a formação de jovens jogadores a nível local deverá ser verificada pelo órgão jurisdicional de reenvio atendendo a todos os elementos pertinentes.

147

A este respeito, o órgão jurisdicional de reenvio deverá, nomeadamente, ter em conta que, ao pôr no mesmo plano todos os jovens jogadores que tenham sido formados por qualquer dos clubes filiados na federação nacional de futebol em causa, as referidas regras podem não constituir incentivos reais e significativos para alguns desses clubes, especialmente para os que disponham de recursos financeiros importantes, ao recrutamento de jovens jogadores para serem formados pelos próprios clubes. Pelo contrário, tal política de recrutamento e de formação, cujo caráter dispendioso, longo e aleatório para o clube em causa já foi realçado pelo Tribunal de Justiça (v., neste sentido, Acórdão de 16 de março de 2010, Olympique Lyonnais, C‑325/08, EU:C:2010:143, n.o 42), é colocada no mesmo plano que o recrutamento de jovens jogadores já formados por qualquer outro clube igualmente filiado nessa associação, seja qual for a localização desse outro clube no âmbito territorial da referida associação. Ora, é precisamente o investimento local na formação de jovens jogadores, em especial quando se trate de pequenos clubes, se necessário em parceria com outros clubes da mesma região, de dimensão eventualmente transfronteiriça, que contribui para a realização da função social e educativa do desporto (v., neste sentido, Acórdão de 16 de março de 2010, Olympique Lyonnais, C‑325/08, EU:C:2010:143, n.o 44).

148

Terceiro, deve analisar‑se, como decorre dos n.os 131 e 132 do presente acórdão, o caráter necessário e proporcionado das regras em causa no processo principal, especialmente do número mínimo de «jogadores formados localmente» que deve ser incluído na lista de jogadores dos clubes e registado na ficha de jogo, por força dessas regras, relativamente ao número total de jogadores que dela deve constar.

149

Todos os elementos referidos nos números anteriores do presente acórdão e, se necessário, outros elementos que o órgão jurisdicional de reenvio possa considerar pertinentes à luz do presente acórdão deverão ser objeto de uma apreciação aprofundada e global por este órgão jurisdicional, atendendo aos argumentos e aos elementos de prova apresentados ou a apresentar pelas partes no processo principal.

150

Tendo em conta todas as considerações precedentes, importa responder às questões submetidas pelo órgão jurisdicional de reenvio, na medida em que dizem respeito ao artigo 45.o TFUE, que este artigo deve ser interpretado no sentido de que se opõe a regras que tenham sido adotadas por uma associação responsável pela organização de competições de futebol a nível nacional e que impõem que cada clube que participe nessas competições inclua na sua lista de jogadores e registe na ficha de jogo um número mínimo de jogadores formados no âmbito territorial dessa associação, a menos que se demonstre que essas regras são adequadas para garantir, de forma coerente e sistemática, a realização do objetivo de encorajar, a nível local, o recrutamento e a formação de jovens jogadores de futebol profissional e não vão além do necessário para alcançar esse objetivo.

V. Quanto às despesas

151

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Grande Secção) declara:

 

1)

O artigo 101.o, n.o 1, TFUE deve ser interpretado no sentido de que se opõe a regras que tenham sido adotadas por uma associação responsável pela organização de competições de futebol a nível europeu e aplicadas tanto por essa associação como pelas federações nacionais de futebol membros desta, e que imponham que cada clube que participe nessas competições inclua na sua lista de jogadores e registe na ficha de jogo um número mínimo de jogadores formados pelo próprio clube ou no âmbito territorial da federação nacional na qual o referido clube esteja filiado, bem como a regras que tenham sido adotadas por uma associação responsável pela organização de competições de futebol a nível nacional e que imponham que cada clube que participe nessas competições inclua na sua lista de jogadores e registe na ficha de jogo um número mínimo de jogadores formados no âmbito territorial dessa associação, se se demonstrar, por um lado, que essas decisões de associações de empresas são suscetíveis de afetar o comércio entre os Estados‑Membros e, por outro, que estas têm por objetivo ou por efeito restringir a concorrência entre os clubes de futebol profissional, a menos que, no segundo caso, se demonstre, através de argumentos e elementos de prova convincentes, que as mesmas são simultaneamente justificadas pela prossecução de um ou mais objetivos legítimos e estritamente necessárias para esse efeito.

 

2)

O artigo 101.o, n.o 3, TFUE deve ser interpretado no sentido de que só permite que tais decisões de associações de empresas, se se revelarem contrárias ao n.o 1 desse artigo, beneficiem de uma isenção da aplicação deste último número se se demonstrar, através de argumentos e elementos de prova convincentes, que todos os requisitos exigidos para esse efeito estão preenchidos.

 

3)

O artigo 45.o TFUE deve ser interpretado no sentido de que se opõe a regras que tenham sido adotadas por uma associação responsável pela organização de competições de futebol a nível nacional e que impõem que cada clube que participe nessas competições inclua na sua lista de jogadores e registe na ficha de jogo um número mínimo de jogadores formados no âmbito territorial dessa associação, a menos que se demonstre que essas regras são adequadas para garantir, de forma coerente e sistemática, a realização do objetivo de encorajar, a nível local, o recrutamento e a formação de jovens jogadores de futebol profissional e não vão além do necessário para alcançar esse objetivo.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: francês.

Top