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Document 62021CJ0061

    Acórdão do Tribunal de Justiça (Grande Secção) de 22 de dezembro de 2022.
    JP contra Ministre de la Transition écologique e Premier ministre.
    Pedido de decisão prejudicial apresentado pela Cour administrative d'appel de Versailles.
    Reenvio prejudicial — Ambiente — Diretivas 80/779/CEE, 85/203/CEE, 96/62/CE, 1999/30/CE e 2008/50/CE — Qualidade do ar — Valores‑limite fixados para as micropartículas (PM10) e para o dióxido de azoto (NO2) — Valores excedidos — Planos de qualidade do ar — Prejuízos causados a um particular devido à degradação do ar por os valores‑limite terem sido excedidos — Responsabilidade do Estado‑Membro em causa — Requisitos da verificação dessa responsabilização — Requisito de que a norma jurídica do direito da União violada tenha por objeto conferir direitos aos particulares lesados — Inexistência.
    Processo C-61/21.

    Court reports – general – 'Information on unpublished decisions' section

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:2022:1015

     ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção)

    22 de dezembro de 2022 ( *1 )

    «Reenvio prejudicial — Ambiente — Diretivas 80/779/CEE, 85/203/CEE, 96/62/CE, 1999/30/CE e 2008/50/CE — Qualidade do ar — Valores‑limite fixados para as micropartículas (PM10) e para o dióxido de azoto (NO2) — Valores excedidos — Planos de qualidade do ar — Prejuízos causados a um particular devido à degradação do ar por os valores‑limite terem sido excedidos — Responsabilidade do Estado‑Membro em causa — Requisitos da verificação dessa responsabilização — Requisito de que a norma jurídica do direito da União violada tenha por objeto conferir direitos aos particulares lesados — Inexistência»

    No processo C‑61/21,

    que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pela cour administrative d’appel de Versailles (Tribunal Administrativo de Recurso de Versalhes, França), por Decisão de 29 de janeiro de 2021, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 2 de fevereiro de 2021, no processo

    JP

    contra

    Ministre de la Transition écologique,

    Premier ministre,

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção),

    composto por: K. Lenaerts, presidente, L. Bay Larsen, vice‑presidente, A. Arabadjiev, A. Prechal, E. Regan e L. S. Rossi, presidentes de secção, M. Ilešič, J.‑C. Bonichot, N. Piçarra, I. Jarukaitis, A. Kumin, N. Jääskinen, N. Wahl, J. Passer (relator) e O. Spineanu‑Matei, juízes,

    advogado‑geral: J. Kokott,

    secretário: V. Giacobbo, administradora,

    vistos os autos e após a audiência de 15 de março de 2022,

    vistas as observações apresentadas:

    em representação de JP, por L. Gimalac, avocat,

    em representação do Governo francês, por T. Stéhelin e W. Zemamta, na qualidade de agentes,

    em representação da Irlanda, por M. Browne, M. Lane e J. Quaney, na qualidade de agentes, assistidas por D. Fennelly, barrister, e S. Kingston, SC,

    em representação do Governo italiano, por G. Palmieri, na qualidade de agente, assistida por G. Palatiello, avvocato dello Stato,

    em representação do Governo polaco, por B. Majczyna e D. Krawczyk, na qualidade de agentes,

    em representação do Governo neerlandês, por A. Hanje, na qualidade de agente,

    em representação da Comissão Europeia, por M. Noll‑Ehlers e F. Thiran, na qualidade de agentes,

    ouvidas as conclusões da advogada‑geral na audiência de 5 de maio de 2022,

    profere o presente

    Acórdão

    1

    O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 13.o, n.o 1, e do artigo 23.o, n.o 1, da Diretiva 2008/50/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 21 de maio de 2008, relativa à qualidade do ar ambiente e a um ar mais limpo na Europa (JO 2008, L 152, p. 1).

    2

    Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe JP ao ministre de la Transition écologique (Ministro da Transição Ecológica, França) e ao Premier ministre (Primeiro‑Ministro, França) a respeito dos pedidos formulados por JP por meio dos quais requer, por um lado, a anulação da decisão tácita adotada pelo préfet du Val‑d’Oise (Representante do Governo junto do Departamento do Val‑d’Oise, França) (a seguir «préfet du Val d’Oise») que recusou tomar as medidas necessárias para a resolução dos seus problemas de saúde associados à poluição atmosférica e, por outro, que a República Francesa indemnize diversos danos que JP considera terem sido causados por esta poluição.

    Quadro jurídico

    Direito da União

    Diretiva 80/779/CEE

    3

    O artigo 3.o da Diretiva 80/779/CEE do Conselho, de 15 de julho de 1980, relativa a valores‑limite e a valores‑guia de qualidade do ar para o dióxido de enxofre e as partículas em suspensão (JO 1980, L 229, p. 30; EE 15 F 02, p. 193), previa:

    «1.   Os Estados‑Membros tomarão as medidas adequadas para que, a partir de 1 de abril de 1983, as concentrações de dióxido de enxofre e de partículas em suspensão na atmosfera não sejam superiores aos valores‑limite que constam do anexo I, sem prejuízo das disposições seguintes.

    2.   No caso em que um Estado‑Membro considere que, apesar das medidas tomadas, há o risco de as concentrações de dióxido de enxofre e de partículas em suspensão na atmosfera ultrapassarem, depois de 1 de abril de 1983, em certas zonas, os valores‑limite que constam do anexo I, informará desse facto a Comissão antes de 1 de outubro de 1982.

    Comunicará simultaneamente à Comissão os planos destinados a melhorar progressivamente a qualidade do ar nessas zonas. Esses planos, estabelecidos a partir de informações pertinentes sobre a natureza, a origem e a evolução da poluição, descreverão em especial as medidas tomadas ou a tomar, bem como os procedimentos realizados ou a realizar pelo Estado‑Membro. Estas medidas e procedimentos devem ter por efeito, reduzir nessas zonas, as concentrações de dióxido de enxofre e de partículas em suspensão na atmosfera para valores inferiores ou iguais aos valores‑limite que constam do anexo I, no mais curto prazo e, o mais tardar, antes de 1 de abril de 1993.»

    4

    Nos termos do artigo 7.o, n.os 1 e 2, desta diretiva:

    «1.   A partir da entrada em vigor da presente diretiva, os Estados‑Membros informarão a Comissão, o mais tardar seis meses após o termo (fixado em 31 de março) do período anual de referência, dos casos em que os valores‑limite referidos no anexo I tenham sido ultrapassados e das concentrações obtidas.

    2.   Comunicarão igualmente à Comissão, o mais tardar um ano após o termo do período anual de referência, as razões pelas quais esses valores foram ultrapassados assim como as medidas que tomaram para evitar que tal se repita.»

    5

    O anexo I da referida diretiva, intitulado «Valores‑limite para o dióxido de enxofre e as partículas em suspensão», enunciava no seu quadro B:

    «Valores‑limite para as partículas em suspensão [medidos pelo método dos fumos negros (1)] expressos em μg/m3

    Período considerado

    Valor‑limite para as partículas em suspensão

    Ano

    80

    (mediana dos valores médios diários obtidos durante o ano)

    Inverno

    (1 de outubro – 31 de março)

    130

    (mediana dos valores médios diários obtidos durante o inverno)

    Ano

    (composto por unidades de períodos de medidas de 24 horas)

    250 (2)

    (percentil 98 de todos os valores médios diários durante o ano)

    (1) Os resultados das medidas de fumos negros efetuadas segundo o método “OCDE” foram convertidos em unidades gravimétricas, de acordo com o descrito pela Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Económico (OCDE) (ver anexo III).

    (2) Os Estados‑Membros devem tomar todas as medidas adequadas para que esse valor não seja ultrapassado durante mais de três dias consecutivos. Além disso, os Estados‑Membros devem esforçar‑se por prevenir e reduzir os casos em que este valor seja ultrapassado.»

    Diretiva 85/203/CEE

    6

    O artigo 3.o da Diretiva 85/203/CEE do Conselho, de 7 de março de 1985, relativa [à]s normas de qualidade do ar para o dióxido de azoto (JO 1985, L 87, p. 1; EE 15 F 5, p. 133), enunciava:

    «1.   Os Estados‑Membros tomam as medidas necessárias para que, a partir de 1 de julho de 1987, as concentrações de dióxido de azoto na atmosfera, medidas nos termos do anexo III, não sejam superiores ao valor‑limite constante do anexo I.

    2.   Todavia, logo que, devido a circunstâncias específicas, as concentrações de dióxido de azoto na atmosfera corram o risco, em certas zonas e apesar das medidas tomadas, de ultrapassar, depois de 1 de julho de 1987, o valor‑limite constante do anexo I, o Estado‑Membro interessado informará a Comissão antes de 1 de julho de 1987.

    Comunicará à Comissão, no mais curto prazo, os planos destinados a melhorar progressivamente a qualidade do ar nestas zonas. Estes planos, estabelecidos a partir de informações pertinentes sobre a natureza, a origem e a evolução desta poluição, descrevem, em especial, as medidas tomadas ou a tomar, assim como os processos postos em prática ou a pôr em prática pelo Estado‑Membro. Estas medidas e processos devem ter por objetivo, no interior dessas zonas, levar as concentrações de dióxido de azoto na atmosfera a valores inferiores ou iguais ao valor‑limite constante do anexo I, o mais rapidamente possível e, o mais tardar, até 1 de janeiro de 1994.»

    7

    Nos termos do artigo 7.o, n.os 1 e 2, desta diretiva:

    «1.   A partir de 1 de julho de 1987 e, o mais tardar seis meses após o final (fixado em 31 de dezembro) do período anual de referência, os Estados‑Membros informam a Comissão dos casos em que o valor‑limite constante no anexo I foi ultrapassado e das concentrações assinaladas.

    2.   Os Estados‑Membros comunicam igualmente à Comissão, o mais tardar um ano após o final do período anual de referência, a razão por que esses valores foram ultrapassados, bem como as medidas que tomaram para lhes fazer face.»

    8

    O anexo I da referida diretiva, intitulado «Valor‑limite para o dióxido de azoto», previa:

    «(O valor‑limite é expresso em μg/m3. A expressão do volume deverá ser reduzida às condições de temperatura e de pressão seguintes: 293° Kelvin e 101,3 kPa)

    Período de referência (1)

    Valor‑limite para o dióxido de azoto

    Ano

    200

    98o percentil calculado a partir dos valores médios por hora ou por períodos inferiores [à] hora, registados durante todo o ano (2)

    (1) O período anual de referência começa no dia 1 de janeiro de um ano civil e termina a 31 de dezembro.

    (2) Para que a validade do cálculo do 98o percentil seja reconhecida, é necessário que 75 % dos valores possíveis estejam disponíveis e, tanto quanto possível, uniformemente repartidos pela totalidade do ano considerado, para o sítio de medição considerado.

    No caso de, para certos sítios, os valores registados não terem estado disponíveis por um período superior a dez dias, o percentil calculado deverá mencionar este facto.

    O cálculo do 98o percentil a partir dos valores registados durante todo o ano será efetuado do seguinte modo: o 98o percentil deverá ser calculado a partir dos valores efetivamente registados. Os valores registados serão arredondados para o μg/m3 mais próximo. Todos os valores serão inscritos numa lista estabelecida por ordem crescente para cada situação:

    X1 ≤ X2 ≤ X3 ≤...... ≤ Xk ≤...... ≤ XN‑1 ≤ XN

    O 98o percentil é o valor do elemento de ordem k para o qual k é calculado com a fórmula seguinte:

    k = (q × N)

    sendo q igual a 0,98 para o 98o percentil e a 0,50 para o 50o percentil, sendo N o número dos valores efetivamente registados. O valor de (q × N) é arredondado para o número inteiro mais próximo.

    No caso de os equipamentos de medição não permitirem ainda fornecer os valores discretos e forneçam unicamente classes de valores superiores a 1 μg/m3, o Estado‑Membro em questão poderá, para o cálculo do percentil, utilizar uma interpolação, com a condição de que a fórmula de interpolação seja aceite pela Comissão e que as classes de valores não sejam superiores a 10 μg/m3. Esta derrogação temporária só é válida para os equipamentos presentemente instalados, por um prazo que não exceda o tempo de vida dos equipamentos respetivos e de qualquer modo limitada a 10 anos a partir da entrada em vigor da presente Diretiva.»

    Diretiva 96/62/CE

    9

    O artigo 4.o da Diretiva 96/62/CE do Conselho, de 27 de setembro de 1996, relativa à avaliação e gestão da qualidade do ar ambiente (JO 1996, L 296, p. 55), sob a epígrafe «Fixação dos valores‑limite e dos limiares de alerta para o ar ambiente», enunciava, nos seus n.os 1 e 5:

    «1.   […] a Comissão apresentará ao Conselho [da União Europeia] propostas relativas à fixação dos valores‑limite e, de modo apropriado, aos limiares de alerta […]

    […]

    5.   O Conselho adotará a legislação prevista no n.o 1 […] de acordo com as disposições do Tratado.»

    10

    O artigo 7.o desta diretiva, sob a epígrafe «Melhoramento da qualidade do ar ambiente — Requisitos gerais», previa:

    «1.   Os Estados‑Membros tomarão as medidas necessárias para garantir a observância dos valores‑limite.

    2.   As ações empreendidas para realizar os objetivos da presente diretiva devem:

    a)

    Ter em conta uma abordagem integrada da proteção do ar, da água e do solo;

    b)

    Não infringir a legislação comunitária relativa à proteção da segurança e saúde dos trabalhadores no local de trabalho;

    c)

    Não produzir efeitos negativos e relevantes no ambiente dos outros Estados‑Membros.

    3.   Os Estados‑Membros devem estabelecer planos de ações a tomar de imediato para os casos de risco de ultrapassagem dos valores‑limite e/ou dos limiares de alerta, a fim de reduzir o risco de ultrapassagem e limitar a sua duração. Estes planos podem prever, conforme o caso, medidas de controlo e, se necessário, de suspensão das atividades, inclusive do trânsito automóvel, que contribuam para a ultrapassagem dos valores‑limite.»

    11

    Nos termos do artigo 8.o da referida diretiva, sob a epígrafe «Medidas aplicáveis nas zonas onde os níveis são superiores ao valor‑limite»:

    «1.   Os Estados‑Membros devem estabelecer a lista das zonas e aglomerações em que os níveis de um ou mais poluentes são superiores ao valor‑limite acrescido da margem de tolerância.

    Quando, em relação a determinado poluente, não tiver sido fixada uma margem de tolerância, as zonas e aglomerações em que o nível desse poluente ultrapassar o valor‑limite serão assimiladas às zonas e aglomerações referidas no parágrafo anterior, sendo‑lhes aplicáveis os n.os 3, 4 e 5.

    2.   Os Estados‑Membros devem estabelecer a lista das zonas e aglomerações em que os níveis de um ou vários poluentes se situam entre o valor‑limite e o valor‑limite acrescido da margem de tolerância.

    3.   Nas zonas e aglomerações referidas no n.o 1, os Estados‑Membros devem tomar medidas para garantir que seja elaborado ou aplicado um plano ou programa destinado a fazer cumprir o valor‑limite dentro do prazo fixado.

    Este plano ou programa, a que o público deve ter acesso, incluirá pelo menos as informações enumeradas no anexo IV.

    4.   Nas zonas e aglomerações referidas no n.o 1 em que os níveis de mais de um poluente excedem os valores‑limite, os Estados‑Membros estabelecerão um plano integrado abrangendo todos os poluentes em questão.

    5.   A Comissão verificará regularmente a aplicação dos planos ou programas apresentados em execução do n.o 3, examinando os progressos alcançados e as tendências da poluição atmosférica.

    6.   Sempre que, na sequência de poluição significativa com origem noutro Estado‑Membro, o nível de um poluente for superior, ou tender a ser superior, ao valor‑limite acrescido da margem de tolerância, ou, eventualmente, ao limiar de alerta, os Estados‑Membros interessados consultar‑se‑ão mutuamente para dar remédio à situação. A Comissão pode assistir a estas consultas.»

    12

    O artigo 13.o, n.o 1, da mesma diretiva dispunha:

    «Os Estados‑Membros porão em vigor as disposições legislativas, regulamentares e administrativas necessárias para dar cumprimento à presente diretiva o mais tardar dezoito meses após a sua entrada em vigor, no que diz respeito às disposições relativas aos artigos 1.o a 4.o e 12.o e aos anexos I, II, III e IV, e, no que diz respeito às disposições relativas aos restantes artigos, o mais tardar à data em que as disposições referidas no n.o 5 do artigo 4.o sejam aplicáveis.

    […]»

    Diretiva 1999/30/CE

    13

    O artigo 4.o da Diretiva 1999/30/CE do Conselho, de 22 de abril de 1999, relativa a valores‑limite para o dióxido de enxofre, dióxido de azoto e óxidos de azoto, partículas em suspensão e chumbo no ar ambiente (JO 1999, L 163, p. 41), sob a epígrafe «Dióxido de azoto e óxidos de azoto», dispunha no seu n.o 1:

    «Os Estados‑Membros adotarão as medidas necessárias para garantir que as concentrações de dióxido de azoto e, se for caso disso, de óxidos de azoto no ar ambiente, avaliadas nos termos do artigo 7.o, não excedam os valores‑limite estabelecidos na secção I do anexo II, a partir das datas nela fixadas.

    As margens de tolerância previstas na secção I do anexo II cumprirão o disposto no artigo 8.o da Diretiva 96/62/CE.»

    14

    O artigo 5.o da Diretiva 1999/30, sob a epígrafe «Partículas em suspensão», previa, no seu n.o 1:

    «Os Estados‑Membros adotarão as medidas necessárias para garantir que as concentrações de PM10 no ar ambiente, avaliadas nos termos do artigo 7.o, não excedam os valores‑limite estabelecidos na secção I do anexo III, a partir das datas nela fixadas.

    As margens de tolerância especificadas na secção I do anexo III cumprirão o disposto no artigo 8.o da Diretiva 96/62/CE.»

    15

    O artigo 9.o da Diretiva 1999/30, sob a epígrafe «Revogações e acordos transitórios», dispunha:

    «1.   A Diretiva [80/779] é revogada em 19 de julho de 2001 […] exceto o artigo 1.o, o n.o 1 do artigo 2.o, o n.o 1 do artigo 3.o, e os artigos 9.o, 15.o e 16.o e os anexos I, III b, e IV que são revogados em 1 de janeiro de 2005.

    […]

    3.   A Diretiva 85/203/CEE […] é revogada em 19 de julho de 2001, exceto o artigo n.o 1, primeiro travessão e o n.o 2 do artigo 1.o, o primeiro travessão do artigo 2.o, o n.o 1 do artigo 3.o e os artigos 5.o, 9.o, 15.o e 16.o e o anexo I que são revogados em 1 de janeiro de 2010.

    […]»

    16

    O artigo 12.o, n.o 1, da Diretiva 1999/30, sob a epígrafe «Aplicação», tinha a seguinte redação:

    «Os Estados‑Membros porão em vigor as disposições legislativas, regulamentares e administrativas necessárias para dar cumprimento à presente diretiva em 19 de julho de 2001. Do facto informarão imediatamente a Comissão.

    […]»

    17

    O anexo II desta diretiva, intitulado «Valores‑limite para o dióxido de azoto (NO2) e óxidos de azoto (NOx) e limiar de alerta para o dióxido de azoto», previa:

    «I. Valores‑limite para o dióxido de azoto e os óxidos de azoto

    Os valores‑limite serão expressos em μg/m3. O volume tem de ser calculado à temperatura de 293° K e à pressão de 101,3 kPa.

     

    Período de amostragem

    Valor‑limite

    Margem de tolerância

    Data de cumprimento do valor‑limite

    1. Valor‑limite horário para proteção da saúde humana

    1 hora

    200 μg/m3 NO2 valor a não exce[d]er mais de 18 vezes em cada ano civil

    50 % na data da entrada em vigor da presente diretiva, devendo sofrer uma redução a partir de 1 de janeiro de 2001 e depois, de 12 em 12 meses, numa percentagem anual idêntica, até atingir 0 % em 1 de janeiro de 2010

    1 de janeiro de 2010

    2. Valor‑limite horário para proteção da saúde humana

    ano civil

    40 μg/m3 NO2

    50 % na data da entrada em vigor da presente diretiva, devendo sofrer uma redução a partir de 1 de janeiro de 2001 e depois, de 12 em 12 meses, numa percentagem anual idêntica, até atingir 0 % em 1 de janeiro de 2010

    1 de janeiro de 2010

    3. Valor‑limite anual para proteção da vegetação

    ano civil

    30 μg/m3 NOx

    não se aplica

    19 de julho de 2001

    […]»

    18

    O anexo III da referida diretiva, intitulado «Valores‑limite e níveis de ação para partículas em suspensão na atmosfera», dispunha:

    «

    Período de amostragem

    Valor‑limite

    Margem de tolerância

    Data de cumprimento do valor‑limite

    1.a fase

    1. Valor‑limite para proteção da saúde humana (em 24 horas)

    24 horas

    50 μg/m3 PM10 valor a não exceder mais de 35 vezes em cada ano civil

    50 % na data da entrada em vigor da presente diretiva, devendo sofrer uma redução a partir de 1 de janeiro de 2001 e depois, de 12 em 12 meses, numa percentagem anual idêntica, até atingir 0 % em 1 de janeiro de 2005

    1 de janeiro de 2005

    2. Valor‑limite anual para proteção da saúde humana

    ano civil

    40 μg/m3 PM10

    20 % na data da entrada em vigor da presente diretiva, devendo sofrer uma redução a partir de 1 de janeiro de 2001 e depois, de 12 em 12 meses, numa percentagem anual idêntica até atingir 0 % em 1 de janeiro de 2005

    1 de janeiro de 2005

    2.o fase (1)

    1. Valor‑limite para proteção da saúde humana (em 24 horas)

    24 horas

    50 μg/m3 PM10 valor a não exceder mais de sete vezes em cada ano civil

    a calcular em função dos dados, de modo a ser equivalente ao valor‑limite da 1.a fase

    1 de janeiro de 2010

    2. Valor‑limite anual para proteção da saúde humana

    ano civil

    20 μg/m3 PM10

    50 % em 1 de janeiro de 2005, devendo depois sofrer uma redução de 12 em 12 meses, numa percentagem anual idêntica, até atingir 0 % em 1 de janeiro de 2010

    1 de janeiro de 2010

    (1) Valores‑limite indicativos a rever à luz de novas informações sobre os efeitos na saúde e no meio ambiente, viabilidade técnica e experiência adquirida com a aplicação dos valores‑limite da 1.a fase nos Estados‑Membros.»

    Diretiva 2008/50

    19

    Nos termos do considerando 2 da Diretiva 2008/50:

    «A fim de proteger a saúde humana e o ambiente na sua globalidade, é particularmente importante combater as emissões de poluentes na origem e identificar e implementar as medidas mais eficazes de redução de emissões a nível local, nacional e comunitário. Deverão, portanto, ser evitadas, prevenidas ou reduzidas as emissões de poluentes atmosféricos, e ser fixados objetivos adequados para a qualidade do ar ambiente tendo em conta as normas, orientações e programas da Organização Mundial da Saúde.»

    20

    O artigo 1.o da Diretiva 2008/50, sob a epígrafe «Objeto», enuncia nos seus pontos 1 a 3:

    «A presente diretiva estabelece medidas destinadas a:

    1)

    Definir e fixar objetivos relativos à qualidade do ar ambiente destinadas a evitar, prevenir ou reduzir os efeitos nocivos para a saúde humana e para o ambiente na sua globalidade;

    2)

    Avaliar, com base em métodos e critérios comuns, a qualidade do ar ambiente nos Estados‑Membros;

    3)

    Obter informações sobre a qualidade do ar ambiente a fim de contribuir para a luta contra a poluição atmosférica e os efeitos nocivos e acompanhar as tendências a longo prazo bem como as melhorias obtidas através de medidas nacionais e comunitárias.»

    21

    O artigo 2.o desta diretiva, sob a epígrafe «Definições», prevê nos seus pontos 5, 7, 8, 16 a 18 e 24:

    «Para efeitos da presente diretiva, entende‑se por:

    […]

    5)

    “Valor‑limite”: um nível fixado com base em conhecimentos científicos com o intuito de evitar, prevenir ou reduzir os efeitos nocivos na saúde humana e no ambiente na sua globalidade, a atingir num prazo determinado e que, quando atingido, não deve ser excedido;

    […]

    7)

    “Margem de tolerância”: a percentagem do valor‑limite em que este valor pode ser excedido nas condições fixadas na presente diretiva;

    8)

    “Planos de qualidade do ar”: os planos que estabelecem medidas destinadas a atingir os valores‑limite ou valores‑alvo;

    […]

    16)

    “Zona”: uma parte do território de um Estado‑Membro delimitada por esse Estado‑Membro para fins de avaliação e gestão da qualidade do ar;

    17)

    “Aglomeração”: uma zona que constitui uma conurbação com uma população superior a 250000 habitantes ou, caso a população seja igual ou inferior a 250000 habitantes, com uma densidade populacional por quilómetro quadrado a estabelecer pelos Estados‑Membros;

    18)

    “PM10”: as partículas em suspensão que passam através de um filtro seletivo, definido no método de referência para a amostragem e medição de PM10, norma EN 12341, com 50 % de eficiência para um diâmetro aerodinâmico de 10 μm;

    […]

    24)

    “Óxidos de azoto”: a soma das concentrações volúmicas (em ppbv) de monóxido de azoto (óxido nítrico) e de dióxido de azoto, expressa em unidades de concentração em massa de dióxido de azoto (μg/m3).»

    22

    O artigo 13.o da Diretiva 2008/50, sob a epígrafe «Valores‑limite e limiares de alerta para a proteção da saúde humana», prevê no seu n.o 1:

    «Os Estados‑Membros asseguram que, em todas as suas zonas e aglomerações, os níveis de dióxido de enxofre, PM10, chumbo e monóxido de carbono no ar ambiente não excedam os valores‑limite fixados no anexo XI.

    Os valores‑limite de dióxido de azoto e de benzeno fixados no anexo XI não podem ser excedidos a partir das datas fixadas no mesmo anexo.

    O cumprimento destes requisitos é avaliado de acordo com o anexo III.

    As margens de tolerância fixadas no anexo XI são aplicáveis nos termos do disposto no n.o 3 do artigo 22.o e no n.o 1 do artigo 23.o»

    23

    O artigo 23.o desta diretiva, sob a epígrafe «Planos de qualidade do ar», enuncia no seu n.o 1:

    «Caso, numa determinada zona ou aglomeração, os níveis de poluentes no ar ambiente excedam qualquer valor‑limite ou valor‑alvo, bem como as respetivas margens de tolerância, os Estados‑Membros asseguram a elaboração de planos de qualidade do ar para essas zonas e aglomerações a fim de respeitar o valor‑limite ou o valor‑alvo em causa fixados nos anexos XI e XIV.

    Em caso de excedência dos valores‑limite em relação aos quais já tenha expirado o prazo para a consecução dos objetivos, os planos de qualidade do ar estabelecem medidas adequadas para que o período de excedência possa ser o mais curto possível. Os planos de qualidade do ar podem, adicionalmente, incluir medidas específicas tendentes à proteção dos grupos sensíveis da população, incluindo as crianças.

    Os planos de qualidade do ar devem conter, pelo menos, as informações enumeradas na parte A do anexo XV e podem incluir medidas conformes com o artigo 24.o Esses planos devem ser comunicados à Comissão sem demora e num prazo não superior a dois anos a contar do final do ano em que se tenha verificado a primeira excedência dos limites.

    Caso devam ser elaborados ou aplicados planos de qualidade do ar respeitantes a vários poluentes, os Estados‑Membros elaboram e aplicam, se for caso disso, planos integrados de qualidade do ar que abranjam todos os poluentes em questão.»

    24

    O artigo 31.o da referida diretiva, sob a epígrafe «Disposições revogatórias e transitórias», prevê no seu n.o 1:

    «As Diretivas 96/62/CE, 1999/30/CE […] são revogadas a partir de 11 de junho de 2010, sem prejuízo das obrigações dos Estados‑Membros relativas aos prazos fixados para a transposição ou aplicação destas diretivas.

    […]»

    25

    O artigo 33.o da Diretiva 2008/50, sob a epígrafe «Transposição», prevê, no seu n.o 1:

    «Os Estados‑Membros devem pôr em vigor as disposições legislativas, regulamentares e administrativas necessárias para dar cumprimento à presente diretiva antes de 11 de junho de 2010, e comunicar imediatamente à Comissão o texto das referidas disposições.

    […]»

    26

    O artigo 34.o desta diretiva, sob a epígrafe «Entrada em vigor», tem a seguinte redação:

    «A presente diretiva entra em vigor na data da sua publicação no Jornal Oficial da União Europeia

    27

    Nos termos do anexo XI da referida diretiva, intitulado «Valores‑limite para a proteção da saúde humana»:

    «[…]

    B. Valores‑limite

    Período de referência

    Valor‑limite

    Margem de tolerância

    Data‑limite para a observância do valor‑limite

    […]

    Dióxido de azoto

    1 hora

    200 μg/m3, a não exceder mais de 18 vezes por ano civil

    50 % em 19 de julho de 1999, a reduzir em 1 de janeiro de 2001 e em cada período de 12 meses subsequente numa percentagem anual idêntica, até atingir 0 % em 1 de janeiro de 2010

    1 de janeiro de 2010

    Ano civil

    40 μg/m3

    50 % em 19 de julho de 1999, a reduzir em 1 de janeiro de 2001 e em cada período de 12 meses subsequente numa percentagem anual idêntica até atingir 0 % em 1 de janeiro de 2010

    1 de janeiro de 2010

    […]

    PM10

    1 dia

    50 μg/m3, a não exceder mais de 35 vezes por ano civil

    50 %

    — (1)

    Ano civil

    40 μg/m3

    20 %

    — (1)

    (1) Já em vigor desde 1 de janeiro de 2005.

    […]»

    Litígio no processo principal e questões prejudiciais

    28

    JP pediu ao tribunal administratif de Cergy‑Pontoise (Tribunal Administrativo de Cergy‑Pontoise, França), nomeadamente, por um lado, que anule a decisão tácita do préfet du Val‑d’Oise, que faz parte da aglomeração de Paris (França), de recusar tomar as medidas necessárias para a resolução dos seus problemas de saúde relacionados com a poluição atmosférica nesta aglomeração, que terão começado em 2003, e, por outro, que a República Francesa indemnize diversos danos que essa poluição lhe terá causado e que estima em 21 milhões de euros.

    29

    JP pede, nomeadamente, que seja indemnizado um dano respeitante à degradação do seu estado de saúde, causado pela deterioração da qualidade do ar ambiente na aglomeração de Paris, onde reside. Esta deterioração ocorreu porque as autoridades francesas não cumpriram as obrigações que lhes incumbem por força do disposto na Diretiva 2008/50.

    30

    Por Decisão de 12 de dezembro de 2017, o tribunal administratif de Cergy‑Pontoise (Tribunal Administrativo de Cergy‑Pontoise) julgou integralmente improcedentes os pedidos apresentados por JP, por considerar, em substância, que os artigos 13.o e 23.o da Diretiva 2008/50 não conferem aos particulares nenhum direito de indemnização que resulte de um eventual dano suportado devido à deterioração da qualidade do ar.

    31

    Por petição inicial de 25 de abril de 2018, JP interpôs recurso desta decisão na cour administrative d’appel de Versailles (Tribunal Administrativo de Recurso de Versalhes, França).

    32

    O ministre de la Transition écologique (Ministro da Transição Ecológica) pede que seja negado provimento a este recurso.

    33

    Nestas condições, a cour administrative d’appel de Versailles (Tribunal Administrativo de Recurso de Versalhes) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

    «1)

    Devem as regras aplicáveis do direito da União Europeia, resultantes do disposto no artigo 13.o, n.o 1, e do artigo 23.o, n.o 1, da Diretiva [2008/50] ser interpretadas no sentido de que não têm por objeto conferir aos particulares, em caso de violação suficientemente [caracterizada], por parte de um Estado‑Membro da União Europeia, das obrigações decorrentes desse artigo, o direito de obterem do Estado‑Membro em causa o ressarcimento dos danos de saúde sofridos, quando haja um nexo de causalidade direto e determinado com a degradação da qualidade do ar?

    2)

    Admitindo que as disposições acima referidas são efetivamente suscetíveis de conferir esse direito ao ressarcimento dos danos de saúde, a que requisitos está sujeita a atribuição de tal direito, nomeadamente no que respeita à data em que deve ser apreciada a existência do incumprimento imputável ao Estado‑Membro em causa?»

    Quanto às questões prejudiciais

    Quanto à primeira questão

    34

    Segundo jurisprudência constante, no âmbito do processo de cooperação entre os órgãos jurisdicionais nacionais e o Tribunal de Justiça instituído pelo artigo 267.o TFUE, cabe a este dar ao juiz nacional uma resposta útil que lhe permita decidir o litígio que lhe foi submetido. Nesta ótica, incumbe ao Tribunal, se necessário, reformular as questões que lhe são submetidas. Além disso, o Tribunal pode ser levado a tomar em consideração normas de direito da União a que o juiz nacional não fez referência no enunciado da sua questão (Acórdão de 15 de julho de 2021, Ministrstvo za obrambo, C‑742/19, EU:C:2021:597, n.o 31). Com efeito, a circunstância de um órgão jurisdicional nacional ter, no plano formal, formulado uma questão prejudicial com base em certas disposições do direito da União não obsta a que o Tribunal de Justiça forneça a esse órgão jurisdicional todos os elementos de interpretação que possam ser úteis para a decisão do processo que lhe foi submetido, quer esse órgão jurisdicional lhes tenha ou não feito referência no enunciado das suas questões. A este respeito, cabe ao Tribunal de Justiça extrair do conjunto dos elementos fornecidos pelo órgão jurisdicional nacional, designadamente da fundamentação da decisão de reenvio, os elementos do direito da União que requerem uma interpretação, tendo em conta o objeto do litígio (Acórdão de 22 de junho de 2022, Volvo e DAF Trucks, C‑267/20, EU:C:2022:494, n.o 28).

    35

    No presente caso, decorre da resposta do órgão jurisdicional de reenvio ao pedido de informações que o Tribunal de Justiça lhe enviou que o recorrente no processo principal pede uma indemnização a título dos danos que lhe terão sido causados por os valores‑limite de concentração de NO2 e de PM10 fixados no anexo XI da Diretiva 2008/50 terem sido excedidos, o que afetou o seu estado de saúde a partir de 2003.

    36

    Há que referir que, nos termos do artigo 33.o, n.o 1, e do artigo 34.o da Diretiva 2008/50, esta última entrou em vigor no dia da respetiva publicação no Jornal Oficial da União Europeia, a saber, em 11 de junho de 2008, e impôs aos Estados‑Membros que pusessem em vigor as disposições legislativas, regulamentares e administrativas necessárias para dar cumprimento a esta diretiva antes de 11 de junho de 2010. Por outro lado, decorre do anexo XI da referida diretiva que as datas a partir das quais esses valores‑limite deviam ser observados foram 1 de janeiro de 2005 para os PM10 e 1 de janeiro de 2010 para o NO2.

    37

    Em conformidade com o disposto no artigo 31.o, n.o 1, da Diretiva 2008/50, esta última substituiu, a partir de 11 de junho de 2010, nomeadamente, as Diretivas 96/62 e 1999/30.

    38

    A Diretiva 96/62 entrou em vigor em 21 de novembro de 1996. Esta passou a prever no seu artigo 7.o, em conformidade com o disposto no seu artigo 13.o, n.o 1, e lido em conjugação com o artigo 12.o, n.o 1, da Diretiva 1999/30, a partir de 19 de julho de 2001, requisitos análogos aos decorrentes do artigo 13.o, n.o 1, e do artigo 23.o, n.o 1, da Diretiva 2008/50. No entanto, a Diretiva 96/62 não fixou valores‑limite da concentração de poluentes no ar ambiente. Em conformidade com o artigo 4.o, n.o 5, desta diretiva, estes valores‑limite foram fixados pela Diretiva 1999/30. Os valores‑limite previstos nos anexos II e III desta última diretiva passaram a ter de ser observados, em conformidade com o disposto no artigo 4.o, n.o 1, e o artigo 5.o, n.o 1, da mesma, a partir de 1 de janeiro de 2005 para os PM10 e de 1 de janeiro de 2010 para o NO2.

    39

    Antes destas datas, como decorre do artigo 9.o, n.os 1 e 3, da Diretiva 1999/30, os valores‑limite aplicáveis, sem prejuízo dos requisitos decorrentes do artigo 8.o, n.os 3 e 4, da Diretiva 96/62, eram os previstos no anexo I, quadro B, da Diretiva 80/779 para os PM10 e no anexo I da Diretiva 85/203 para o NO2, anexos aos quais os artigos 3.o destas duas últimas diretivas se referiam.

    40

    Por outro lado, na medida em que, segundo as indicações fornecidas pelo órgão jurisdicional de reenvio, o recorrente no processo principal pede uma indemnização por danos pretensamente causados pelo facto de os valores‑limite de concentração em NO2 e em PM10 terem sido excedidos, sendo que esses danos «se terão iniciado em 2003», não se exclui que os artigos 7.o das Diretivas 80/779 e 85/203, que foram revogados, como decorre igualmente do artigo 9.o, n.os 1 e 3, da Diretiva 1999/30, a partir de 19 de julho de 2001, são, também eles, pertinentes para a resolução do litígio no processo principal.

    41

    Atendendo ao período ao qual o órgão jurisdicional de reenvio se referiu nas suas indicações, há assim que tomar em consideração não apenas as disposições pertinentes da Diretiva 2008/50, mas também as das Diretivas 96/62, 1999/30, 80/779 e 85/203.

    42

    Por conseguinte, atendendo à jurisprudência recordada no n.o 34 do presente acórdão, há que considerar que, com a sua primeira questão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se o artigo 13.o, n.o 1, e o artigo 23.o, n.o 1, da Diretiva 2008/50, os artigos 7.o e 8.o da Diretiva 96/62, o artigo 4.o, n.o 1, e o artigo 5.o, n.o 1, da Diretiva 1999/30, bem como os artigos 3.o e 7.o das Diretivas 80/779 e 85/203 devem ser interpretados no sentido de que estes artigos têm por objeto conferir direitos individuais aos particulares suscetíveis de conferir a estes últimos um direito de indemnização em relação a um Estado‑Membro, ao abrigo do princípio da responsabilidade do Estado a título dos danos causados aos particulares por violações do direito da União que lhe sejam imputáveis.

    43

    A este respeito, resulta de jurisprudência constante do Tribunal de Justiça que o princípio da responsabilidade do Estado a título dos danos causados aos particulares devido a violações do direito da União que lhe sejam imputáveis é inerente ao sistema dos Tratados nos quais esta última se baseia (Acórdão de 18 de janeiro de 2022, Thelen Technopark Berlin, C‑261/20, EU:C:2022:33, n.o 42 e jurisprudência referida). Este princípio é válido para qualquer hipótese de violação do direito da União por parte de um Estado‑Membro, independentemente de qual seja a autoridade pública autora dessa violação (Acórdão de 19 de dezembro de 2019, Deutsche Umwelthilfe, C‑752/18, EU:C:2019:1114, n.o 55 e jurisprudência referida).

    44

    No que se refere aos requisitos que têm de estar preenchidos para efeitos desta responsabilização, o Tribunal de Justiça declarou reiteradamente que os particulares lesados têm direito a serem indemnizados quando estejam preenchidos três requisitos, a saber, que a norma de direito da União violada tenha por objeto conferir‑lhes direitos, que a violação dessa norma esteja suficientemente caracterizada e que exista um nexo de causalidade direto entre essa violação e o dano sofrido por esses particulares [Acórdão de 28 de junho de 2022, Comissão/Espanha (Violação do direito da União pelo legislador), C‑278/20, EU:C:2022:503, n.o 31 e jurisprudência referida].

    45

    Daqui resulta que só a violação de uma norma do direito da União que tenha por objeto conferir direitos aos particulares é, em conformidade com o primeiro dos três requisitos acima referidos, suscetível de desencadear a responsabilidade do Estado.

    46

    Segundo jurisprudência assente, estes direitos não nascem apenas quando sejam atribuídos expressamente por disposições do direito da União, mas também quando obrigações positivas ou negativas sejam impostas de forma bem definida por disposições do direito da União tanto aos particulares como aos Estados‑Membros ou às instituições da União (v., neste sentido, Acórdãos de 5 de fevereiro de 1963, van Gend & Loos, 26/62, EU:C:1963:1, p. 23, de 19 de novembro de 1991, Francovich e o., C‑6/90 e C‑9/90, EU:C:1991:428, n.o 31, de 20 de setembro de 2001, Courage e Crehan, C‑453/99, EU:C:2001:465, n.o 19, e de 11 de novembro de 2021, Stichting Cartel Compensation e Equilib Netherlands, C‑819/19, EU:C:2021:904, n.o 47).

    47

    A violação de semelhantes obrigações positivas ou negativas, por um Estado‑Membro, é suscetível de prejudicar o exercício, pelos particulares em causa, de direitos que lhes são implicitamente conferidos através das disposições do direito da União em causa, e que estes devem poder invocar a nível nacional, e podem assim alterar a situação jurídica que essas disposições visam instituir para esses particulares [v., neste sentido, Acórdãos de 4 de outubro de 2018, Kantarev, C‑571/16, EU:C:2018:807, n.os 103 e 104, e de 10 de dezembro de 2020, Euromin Holdings (Cyprus), C‑735/19, EU:C:2020:1014, n.o 90]. É por este motivo que a plena eficácia dessas normas do direito da União e a proteção dos direitos que estas visam conferir exigem que os particulares tenham a possibilidade de ser indemnizados (v., neste sentido, Acórdão de 19 de novembro de 1991, Francovich e o., C‑6/90 e C‑9/90, EU:C:1991:428, n.os 33 e 34), independentemente da questão de saber se as disposições em causa produzem efeito direto, qualidade esta que, por si só, não é necessária (v., neste sentido, Acórdão de 5 de março de 1996, Brasserie du pêcheur e Factortame, C‑46/93 e C‑48/93, EU:C:1996:79, n.os 18 a 22), nem é suficiente em si mesma (v., neste sentido, Acórdão de 11 de junho de 2015, Berlington Hungary e o., C‑98/14, EU:C:2015:386, n.os 108 e 109) para que seja preenchido o primeiro dos três requisitos recordados no n.o 44 do presente acórdão.

    48

    No presente caso, as Diretivas 2008/50, 96/62, 1999/30, 80/779 e 85/203 impõem aos Estados‑Membros, em substância, por um lado, uma obrigação de assegurar que os níveis, nomeadamente, de PM10 e de NO2 não excedam, nos respetivos territórios e a partir de certas datas, os valores‑limite fixados nestas diretivas e, por outro, no caso de esses valores‑limite serem ainda assim excedidos, uma obrigação de prever medidas adequadas para corrigir o facto de esses valores‑limite serem excedidos, nomeadamente no âmbito de planos relativos à qualidade do ar.

    49

    No que se refere à primeira obrigação, há que referir que os valores‑limite indicam a concentração exata, expressa em μg/m3 e tomando em consideração, se necessário, margens de excesso dos valores, do poluente em questão no ar ambiente, devendo os Estados‑Membros evitar que estes valores sejam excedidos em todas as suas zonas e em todas as suas aglomerações.

    50

    No que se refere à segunda obrigação, o Tribunal de Justiça declarou, a respeito da Diretiva 2008/50, que resulta do artigo 23.o, n.o 1, desta última que embora os Estados‑Membros disponham de uma certa margem de manobra para determinarem as medidas a adotar, estas devem, seja como for, permitir que o período durante o qual os valores‑limite fixados para o poluente em questão são excedidos seja o mais curto possível [Acórdão de 10 de novembro de 2020, Comissão/Itália (Valores‑limite — PM10), C‑644/18, EU:C:2020:895, n.o 136].

    51

    Além disso, é certo que o Tribunal de Justiça considerou que o artigo 7.o, n.o 3, da Diretiva 96/62, que prevê uma obrigação análoga à prevista no artigo 23.o, n.o 1, da Diretiva 2008/50, não impunha aos Estados‑Membros uma obrigação de tomar medidas que permitam assegurar que nenhum valor seja excedido, impondo apenas a obrigação de tomar medidas suscetíveis de reduzir ao mínimo o risco de que esses valores sejam excedidos e a respetiva duração, atendendo a todas as circunstâncias do momento e aos interesses que estejam em causa. No entanto, o Tribunal de Justiça também referiu que esta disposição previa limites ao exercício desse poder de apreciação, suscetíveis de serem invocados perante os órgãos jurisdicionais nacionais, no que respeita à adequação das medidas que o plano de ação deve comportar com o objetivo de reduzir o risco de que os valores‑limite sejam excedidos e limitar a respetiva duração, atendendo ao equilíbrio que há que garantir entre este objetivo e os diferentes interesses públicos e privados que estejam em causa (v., neste sentido, Acórdão de 25 de julho de 2008, Janecek, C‑237/07, EU:C:2008:447, n.os 44 a 46).

    52

    Impõe‑se a mesma interpretação, em substância, no que se refere às obrigações decorrentes do artigo 8.o, n.os 3 e 4, da Diretiva 96/62.

    53

    No que se refere aos artigos 7.o das Diretivas 80/779 e 85/203, há que referir que, no caso de os valores‑limite serem excedidos, estes artigos impõem aos Estados‑Membros a obrigação de tomarem medidas, respetivamente, para «evitar que tal se repita» e para «lhes fazer face».

    54

    Daqui resulta, é certo, que o artigo 13.o, n.o 1, e o artigo 23.o, n.o 1, da Diretiva 2008/50 preveem, à semelhança das disposições análogas das Diretivas 96/62, 1999/30, 80/779 e 85/203, obrigações bastante claras e precisas quanto ao resultado que os Estados‑Membros devem garantir.

    55

    No entanto, estas obrigações prosseguem, como resulta dos artigos 1.o das diretivas mencionadas no número anterior, assim como, nomeadamente, do considerando 2 da Diretiva 2008/50, um objetivo geral de proteção da saúde humana e do ambiente na sua globalidade.

    56

    Assim, além do facto de as disposições em causa da Diretiva 2008/50 e das diretivas que a antecederam não conterem nenhuma atribuição expressa de direitos aos particulares a este título, as obrigações previstas nestas disposições, atento o objetivo geral acima mencionado, não permitem que se considere que, no caso concreto, foram implicitamente conferidos aos particulares ou a categorias de particulares, ao abrigo dessas obrigações, direitos individuais de cuja violação pode resultar a responsabilização de um Estado‑Membro a título dos danos causados aos particulares.

    57

    Decorre de tudo o que precede que o primeiro dos três requisitos recordados no n.o 44 do presente acórdão, requisitos esses que são cumulativos, não está preenchido.

    58

    No entanto, a circunstância, quando um Estado‑Membro não tenha assegurado o respeito dos valores‑limite previstos no artigo 13.o, n.o 1, da Diretiva 2008/50 e em disposições análogas das diretivas anteriores, de os particulares afetados poderem obter junto das autoridades nacionais, submetendo sendo caso disso a questão aos órgãos jurisdicionais competentes, a adoção das medidas exigidas por estas diretivas (v., neste sentido, Acórdãos de 19 de novembro de 2014, ClientEarth, C‑404/13, EU:C:2014:2382, n.o 56 e jurisprudência referida, e de 19 de dezembro de 2019, Deutsche Umwelthilfe, C‑752/18, EU:C:2019:1114, n.o 56), não é suscetível de alterar esta conclusão.

    59

    A este respeito, há que recordar que, no que se refere ao artigo 7.o, n.o 3, da Diretiva 96/62, o Tribunal de Justiça salientou que as pessoas singulares ou coletivas diretamente afetadas por um risco de os valores‑limite ou os limiares de alerta poderem ser excedidos devem poder obter, junto das autoridades competentes e sendo caso disso submetendo a questão aos órgãos jurisdicionais competentes, a elaboração de um plano de ação quando esse risco exista (Acórdão de 25 de julho de 2008, Janecek, C‑237/07, EU:C:2008:447, n.o 39).

    60

    De igual modo, no que se refere ao artigo 23.o, n.o 1, segundo parágrafo, da Diretiva 2008/50, o Tribunal de Justiça declarou que as pessoas singulares ou coletivas diretamente afetadas depois de 1 de janeiro de 2010 por valores‑limite que tenham sido excedidos devem poder obter junto das autoridades nacionais, submetendo, sendo caso disso, a questão aos órgãos jurisdicionais competentes, a elaboração de um plano relativo à qualidade do ar que seja conforme com este artigo 23.o, n.o 1, segundo parágrafo, quando um Estado‑Membro não tenha assegurado o cumprimento dos requisitos decorrentes do artigo 13.o, n.o 1, segundo parágrafo, desta diretiva, ainda que não possa pedir a prorrogação desse prazo nas condições previstas no seu artigo 22.o (Acórdão de 19 de novembro de 2014, ClientEarth, C‑404/13, EU:C:2014:2382, n.o 56).

    61

    Em conformidade com o que foi exposto nos n.os 52 e 53 do presente acórdão, esta interpretação também se aplica no que se refere à implementação efetiva dos artigos 7.o das Diretivas 80/779 e 85/203, bem como do artigo 8.o, n.os 3 e 4, da Diretiva 96/62.

    62

    No entanto, a faculdade assim reconhecida pela jurisprudência do Tribunal de Justiça, que decorre em especial do princípio da efetividade do direito da União, efetividade para a qual os particulares afetados podem contribuir através da apresentação de processos administrativos ou da propositura de ações judiciais à luz da sua situação particular, não implica que as obrigações resultantes do artigo 13.o, n.o 1, e do artigo 23.o, n.o 1, da Diretiva 2008/50, bem como das disposições análogas das diretivas anteriores, tenham tido por objeto conferir aos interessados direitos individuais, na aceção do primeiro dos três requisitos recordados no n.o 44 do presente acórdão, e que a violação dessas obrigações seja, consequentemente, suscetível de alterar uma situação jurídica que estas disposições visam instituir a favor destes.

    63

    Há que acrescentar que a conclusão exposta no n.o 57 do presente acórdão não exclui que o Estado possa ser responsabilizado em condições menos restritivas ao abrigo do direito interno [Acórdão de 28 de junho de 2022, Comissão/Espanha (Violação do direito da União pelo legislador), C‑278/20, EU:C:2022:503, n.o 32 e jurisprudência referida] e que, sendo caso disso, se possa tomar em consideração o incumprimento das obrigações decorrentes do artigo 13.o, n.o 1, e do artigo 23.o, n.o 1, da Diretiva 2008/50, bem como das outras disposições do direito da União referidas no n.o 42 do presente acórdão, como elemento que pode ser pertinente para responsabilizar os poderes públicos ao abrigo de um fundamento diferente do direito da União.

    64

    Esta conclusão também não exclui que os órgãos jurisdicionais do Estado‑Membro em causa possam, eventualmente, decretar injunções que venham acompanhadas de sanções pecuniárias compulsórias para assegurar que este Estado respeita as obrigações decorrentes do artigo 13.o, n.o 1, e do artigo 23.o, n.o 1, da Diretiva 2008/50, bem como das disposições análogas das diretivas anteriores, como as injunções que foram acompanhadas de sanções pecuniárias compulsórias decretadas pelo Conseil d’État (Conselho de Estado, em formação jurisdicional, França) em vários acórdãos recentemente proferidos.

    65

    Atendendo a todos os fundamentos que precedem, há que responder à primeira questão que os artigos 3.o e 7.o da Diretiva 80/779, os artigos 3.o e 7.o da Diretiva 85/203, os artigos 7.o e 8.o da Diretiva 96/62, o artigo 4.o, n.o 1, e o artigo 5.o, n.o 1, da Diretiva 1999/30, bem como o artigo 13.o, n.o 1, e o artigo 23.o, n.o 1, da Diretiva 2008/50 devem ser interpretados no sentido de que não têm por objeto conferir direitos individuais aos particulares suscetíveis de conferir a estes últimos um direito de indemnização em relação a um Estado‑Membro, ao abrigo do princípio da responsabilidade do Estado a título dos danos causados aos particulares por violações do direito da União que lhe sejam imputáveis.

    Quanto à segunda questão

    66

    Atendendo à resposta dada à primeira questão, não há que responder à segunda questão.

    Quanto às despesas

    67

    Revestindo o processo, quanto às partes no processo principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

     

    Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Grande Secção) declara:

     

    Os artigos 3.o e 7.o da Diretiva 80/779/CEE do Conselho, de 15 de julho de 1980, relativa a valores‑limite e a valores‑guia de qualidade do ar para o dióxido de enxofre e as partículas em suspensão, os artigos 3.o e 7.o da Diretiva 85/203/CEE do Conselho, de 7 de março de 1985, relativa [à]s normas de qualidade do ar para o dióxido de azoto, os artigos 7.o e 8.o da Diretiva 96/62/CE do Conselho, de 27 de setembro de 1996, relativa à avaliação e gestão da qualidade do ar ambiente, o artigo 4.o, n.o 1, e o artigo 5.o, n.o 1, da Diretiva 1999/30/CE do Conselho, de 22 de abril de 1999, relativa a valores‑limite para o dióxido de enxofre, dióxido de azoto e óxidos de azoto, partículas em suspensão e chumbo no ar ambiente, bem como o artigo 13.o, n.o 1, e o artigo 23.o, n.o 1, da Diretiva 2008/50/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 21 de maio de 2008, relativa à qualidade do ar ambiente e a um ar mais limpo na Europa,

     

    devem ser interpretados no sentido de que:

     

    não têm por objeto conferir direitos individuais aos particulares suscetíveis de conferir a estes últimos um direito de indemnização em relação a um Estado‑Membro, ao abrigo do princípio da responsabilidade do Estado a título dos danos causados aos particulares por violações do direito da União que lhe sejam imputáveis.

     

    Assinaturas


    ( *1 ) Língua do processo: francês.

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