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Document 62021CJ0050

    Acórdão do Tribunal de Justiça (Primeira Secção) de 8 de junho de 2023.
    Prestige and Limousine, S.L. contra Área Metropolitana de Barcelona e o.
    Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Tribunal Superior de Justicia de Cataluña.
    Reenvio prejudicial — Artigo 49.o TFUE — Artigo 107.o, n.o 1, TFUE — Serviço de aluguer de transporte individual e remunerado de passageiros em veículos descaracterizados a partir de plataforma eletrónica (TVDE) — Regime de autorização que implica a concessão, além de uma autorização que permite a prestação de serviços, tanto urbanos como interurbanos, de transporte em todo o território nacional, de uma segunda autorização de exploração para a prestação de serviços urbanos de transporte numa zona metropolitana — Limitação do número de licenças de serviços de TVDE a um trigésimo das licenças de serviços de táxi.
    Processo C-50/21.

    Court reports – general

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:2023:448

     ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção)

    8 de junho de 2023 ( *1 )

    «Reenvio prejudicial — Artigo 49.o TFUE — Artigo 107.o, n.o 1, TFUE — Serviço de aluguer de transporte individual e remunerado de passageiros em veículos descaracterizados a partir de plataforma eletrónica (TVDE) — Regime de autorização que implica a concessão, além de uma autorização que permite a prestação de serviços, tanto urbanos como interurbanos, de transporte em todo o território nacional, de uma segunda autorização de exploração para a prestação de serviços urbanos de transporte numa zona metropolitana — Limitação do número de licenças de serviços de TVDE a um trigésimo das licenças de serviços de táxi»

    No processo C‑50/21,

    que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Tribunal Superior de Justicia de Cataluña (Tribunal Superior de Justiça da Catalunha, Espanha), por Decisão de 19 de janeiro de 2021, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 29 de janeiro de 2021, no processo

    Prestige and Limousine SL

    contra

    Área Metropolitana de Barcelona,

    Asociación Nacional del Taxi (Antaxi),

    Asociación Profesional Élite Taxi,

    Sindicat del Taxi de Catalunya (STAC),

    Tapoca VTC1 SL,

    Agrupació Taxis Companys,

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção),

    composto por: K. Lenaerts (relator), presidente do Tribunal de Justiça, exercendo funções de presidente da Primeira Secção, L. Bay Larsen, vice‑presidente do Tribunal de Justiça, exercendo funções de juiz da Primeira Secção, P. G. Xuereb, A. Kumin e I. Ziemele, juízes,

    advogado‑geral: M. Szpunar,

    secretário: L. Carrasco Marco, administradora,

    vistos os autos e após a audiência de 5 de outubro de 2022,

    vistas as observações apresentadas:

    em representação da Prestige and Limousine SL, por F. de B. Carvajal Borrero e P. S. Soto Baselga, abogados,

    em representação da Área Metropolitana de Barcelona, por M. Borrás Ribó, abogada,

    em representação da Asociación Nacional del Taxi (Antaxi), por J. M. Baño Fos, J. M. Baño León, E. Llopis Reyna e A. Pascual Morcillo, abogados,

    em representação da Asociación Profesional Élite Taxi, por J. Fontquerni Bas, procurador, e M. Vilar Cuesta, abogado,

    em representação da Tapoca VTC1 SL, por J. A. Díez Herrera e J. L. Ortega Gaspar, abogados,

    em representação da Agrupació Taxis Companys, por A. Canals Compan, abogado,

    em representação do Governo espanhol, por L. Aguilera Ruiz e S. Jiménez García, na qualidade de agentes,

    em representação do Governo checo, por T. Machovičová, M. Smolek e J. Vláčil, na qualidade de agentes,

    em representação da Comissão Europeia, por L. Armati, M. É. Gippini Fournier, P. Němečková e J. Rius Riu, na qualidade de agentes,

    ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 15 de dezembro de 2022,

    profere o presente

    Acórdão

    1

    O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 49.o e do artigo 107.o, n.o 1, TFUE.

    2

    Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a Prestige and Limousine SL (a seguir «P&L»), que oferece serviços de aluguer de transporte individual e remunerado de passageiros em veículos descaracterizados a partir de plataforma eletrónica (a seguir «serviços de TVDE»), nomeadamente à Área Metropolitana de Barcelona (Área Metropolitana de Barcelona, Espanha) (a seguir «AMB»), a respeito da validade de uma regulamentação da AMB que exige a obtenção de uma autorização para exercer serviços de TVDE na aglomeração de Barcelona e limita o número de licenças de serviços de TVDE a um trigésimo das licenças de serviços de táxi concedidas para esta aglomeração.

    Quadro jurídico espanhol

    LOTT

    3

    O artigo 43.o, n.o 1, alínea g), da Ley 16/1987 de Ordenación de los Transportes Terrestres (Lei n.o 16/1987 relativa à Organização dos Transportes Terrestres), de 30 de julho de 1987 (BOE n.o 182, de 31 de julho de 1987, p. 23451), conforme alterada pelo Real Decreto‑Ley 3/2018 (Real Decreto‑Lei n.o 3/2018), de 20 de abril de 2018 (BOE n.o 97, de 21 de abril de 2018, p. 41051) (a seguir «LOTT»), dispõe:

    «A concessão da autorização de transporte público está subordinada ao facto de a empresa requerente provar que, em conformidade com o que a regulamentação prevê, preenche os seguintes requisitos:

    […]

    g)

    preencher, sendo caso disso, os outros requisitos específicos necessários para a prestação adequada dos serviços, estabelecidos por via regulamentar, em conformidade com os princípios da proporcionalidade e da não discriminação, no que se refere à classe de transporte em questão.»

    4

    Nos termos do artigo 48.o, n.os 1 a 3, da LOTT:

    «1.   A concessão das autorizações de transporte público é regulada, pelo que só pode ser recusada se não estiverem preenchidos os requisitos exigidos para esse efeito.

    2.   Contudo, e em conformidade com as regras comunitárias e com outras disposições eventualmente aplicáveis, quando a oferta de transportes públicos de passageiros por veículos de passageiros estiver sujeita a limitações quantitativas no âmbito das comunidades autónomas ou locais, podem ser introduzidas limitações regulamentares à concessão de novas autorizações que permitam efetuar um transporte interurbano nessa classe de veículos, bem como à de autorizações que permitam o aluguer de veículos com motorista.

    3.   Sem prejuízo do disposto no número anterior, de forma a manter um equilíbrio adequado entre a oferta dos dois modos de transporte, deve ser recusada a concessão de novas autorizações de aluguer de veículos com motorista quando a proporção entre o número das autorizações existentes no território da Comunidade Autónoma em que o estabelecimento é pretendido e o das autorizações de transporte de pessoas em veículos de passageiros já estabelecidas nesse território ultrapassar a razão de uma autorização de aluguer por cada trinta autorizações de transporte.

    Contudo, as comunidades autónomas que, por delegação do Estado, assumiram competências em matéria de autorização de aluguer de veículos com motorista podem alterar a regra da proporcionalidade referida no parágrafo anterior, desde que apliquem uma regra menos restritiva.»

    5

    O artigo 91.oda LOTT prevê:

    «1.   As autorizações de transporte público permitem a prestação de serviços em todo o território nacional, sem nenhuma limitação em razão da origem ou do destino do serviço.

    São exceções ao que precede tanto as autorizações que permitem assegurar o transporte interurbano de passageiros em veículos de passageiros como as que permitem o aluguer de veículos com motorista, as quais devem respeitar os requisitos que, se for o caso, sejam determinados por via regulamentar em relação à origem, ao destino ou ao percurso dos serviços.

    2.   Sem prejuízo do facto de, em conformidade com o número anterior, as autorizações de aluguer de veículos com motorista permitirem a prestação de serviços em todo o território nacional, sem nenhuma limitação em razão da origem ou do destino do serviço, os veículos que exerçam essa atividade devem ser utilizados habitualmente para a prestação de serviços destinados a satisfazer necessidades relacionadas com o território da comunidade autónoma em que se encontre domiciliada a autorização a que dizem respeito.

    […]»

    ROTT

    6

    Em conformidade com o artigo 181.o, n.o 1, do Real Decreto 1211/1990 por el que se aprueba el Reglamento de la Ley de Ordenación de los Transportes Terrestres (Real Decreto n.o 1211/1990 de execução da Lei relativa à Organização dos Transportes Terrestres), de 28 de setembro de 1990 (BOE n.o 241, de 8 de outubro de 1990, p. 29406), conforme alterado pelo Real Decreto‑Ley 1057/2015 (Real Decreto‑Lei n.o 1057/2015), de 20 de novembro de 2015 (BOE n.o 279, de 21 de novembro de 2015, p. 109832), e pelo Real Decreto‑Lei n.o 3/2018 (a seguir «ROTT»):

    «A concessão de autorizações de aluguer de veículos com motorista está sujeita ao facto de o seu requerente preencher todos os requisitos previstos no artigo 43.o, n.o 1, da LOTT, de acordo com as precisões constantes no número seguinte.»

    7

    O artigo 182.o, n.os 1 a 3, do ROTT prevê:

    «1.   Os veículos abrangidos pelas autorizações de aluguer de veículos com motorista ocupados por pessoas alheias à empresa titular da autorização só podem circular se se provar que prestam um serviço previamente contratado.

    Para o efeito, o contrato de aluguer de veículos com motorista deve ter sido celebrado antes do início da prestação do serviço contratado e os documentos comprovativos desse contrato devem ser mantidos a bordo do veículo, em conformidade com o que é determinado pelo ministro do Desenvolvimento do Território.

    Os veículos abrangidos pelas autorizações de aluguer de veículos com motorista não podem, em caso algum, circular nas vias públicas à procura de clientes nem tentar atrair clientes que ainda não contrataram o serviço, permanecendo estacionados para esse efeito.

    2.   As autorizações de aluguer de veículos com motorista permitem a prestação de serviços, tanto urbanos como interurbanos, em todo o território nacional, desde que o veículo tenha sido previamente contratado em conformidade com o disposto no número anterior.

    3.   Nos termos do disposto [no artigo 17.o, n.o 1, e no artigo] 18.o da LOTT, as tarifas da atividade de aluguer de viaturas com motorista não são regulamentadas, mas as empresas em causa devem disponibilizar ao público informações sobre os preços praticados.»

    Decreto TVDE

    8

    A Orden FOM/36/2008 por la que se desarrolla la sección segunda del capítulo IV del título V, en materia de arrendamiento de vehículos con conductor, del Reglamento de la Ley de Ordenación de los Transportes Terrestres, aprobado por Real Decreto 1211/1990, de 28 de septiembre (Decreto FOM/36/2008 que aplica a segunda secção do capítulo IV do título V, em Matéria de Aluguer de Veículos com Motorista, do Regulamento da Lei relativa à Organização dos Transportes Terrestres, adotado pelo Real Decreto n.o 1211/1990, de 28 de setembro de 1990), de 9 de janeiro de 2008 (BOE n.o 19, de 22 de janeiro de 2008, p. 4283), conforme alterado pela orden FOM/2799/2015 (Decreto FOM/2799/2015), de 18 de dezembro de 2015 (BOE n.o 307, de 24 de dezembro de 2015, p. 121901) (a seguir «Decreto TVDE»), dispõe, no seu artigo 1.o, sob a epígrafe «Obrigatoriedade da autorização», nomeadamente:

    «Para o exercício da atividade de aluguer de veículos com motorista, é necessário obter, para cada veículo destinado a essa atividade, uma autorização que permita a prestação desse serviço, em conformidade com o artigo 180.o [do ROTT]».

    9

    O artigo 4.o do Decreto TVDE, sob a epígrafe «Âmbito das autorizações», tem a seguinte redação:

    «As autorizações de aluguer de veículos com motorista permitem a prestação de serviços, tanto urbanos como interurbanos, em todo o território nacional, desde que o veículo tenha sido previamente alugado em conformidade com as disposições do presente decreto.»

    10

    O artigo 5.o do referido decreto, sob a epígrafe «Requisitos para a concessão das autorizações», prevê:

    «A concessão das autorizações de aluguer de veículos com motorista está subordinada ao facto de a empresa requerente provar que preenche os requisitos previstos no artigo 181.o, n.os 1 e 2, do ROTT, em conformidade com o disposto nos artigos do presente decreto.»

    11

    O artigo 14.o do mesmo decreto, sob a epígrafe «Concessão das autorizações», dispõe:

    «Quando estiverem preenchidos todos os requisitos previstos no artigo 5.o, o organismo competente só pode recusar a concessão das autorizações solicitadas nas circunstâncias previstas no artigo 181.o, n.o 3, do ROTT.»

    RTVDE

    12

    O Reglamento de ordenación de la actividad de transporte urbano discrecional de viajeros con conductor en vehículos de hasta nueve plazas que circula íntegramente en el ámbito del Área Metropolitana de Barcelona del Consejo Metropolitano del Área Metropolitana de Barcelona (Regulamento relativo à Organização da Atividade de Transporte Urbano Discricionário de Passageiros com Motorista em Veículos até Nove Lugares que Circulam Exclusivamente no Território da Área Metropolitana de Barcelona, adotado pelo Conselho Metropolitano da Área Metropolitana de Barcelona), de 26 de junho de 2018 (Boletín Oficial de la Provincia de Barcelona, de 9 de julho de 2018, e DOGC n.o 7897, de 14 de junho de 2019) (a seguir «RTVDE»), entrou em vigor em 25 de julho de 2018.

    13

    O RTVDE enuncia, nos pontos 4, 5 e 9 do seu preâmbulo:

    «4.

    […] a Ley 19/2003, [del Taxi, de la Comunidad Autónoma de Cataluña (Lei n.o 19/2003 relativa aos Táxis, da Comunidade Autónoma da Catalunha), de 4 de julho de 2003 (BOE n.o 189, de 8 de agosto de 2003, p. 30708)] (LT), regula o transporte de passageiros em veículos até nove lugares, incluindo o do condutor, efetuado por conta de outrem mediante remuneração, em conformidade com a modalidade denominada “serviços de táxi”. O conteúdo desta regulamentação neste setor traduz‑se numa intervenção administrativa, baseada na necessidade de garantir o interesse público na realização de um nível ótimo de qualidade da prestação do serviço, através da limitação do número de autorizações e da fixação de tarifas obrigatórias, de modo a garantir a universalidade, a acessibilidade, a continuidade e o respeito dos direitos dos utilizadores […]

    5.

    Assim, trata‑se de uma atividade definida […] como sendo de interesse geral exercida por particulares, implicando essa qualificação que esteja sujeita às medidas de controlo, de polícia e de intervenção que se impõem, através de uma regulamentação setorial.

    […]

    […]

    9.

    As políticas públicas em matéria de mobilidade e de transporte visam o desenvolvimento sustentável [dos pontos] de vista ambiental e económico e, para esse efeito, são impostas restrições à circulação rodoviária nas cidades, nomeadamente nas fases de forte poluição. O planeamento das vias urbanas, a procura contínua de novos espaços para fins públicos que não a circulação rodoviária, as alternativas de mobilidade a pé ou em bicicleta, ou a prioridade concedida aos corredores de transporte público coletivo são medidas incompatíveis com a promoção do aumento, por um lado, do número de veículos rodoviários de transporte urbano de aluguer com motorista e, por outro, de alugueres para um único utilizador e para a capacidade total do veículo.

    As políticas públicas no setor dos táxis basearam‑se na cessação da concessão de novas licenças para além das emitidas desde 1987. Além disso, são promovidas ações que limitem os dias e o horário de circulação dos veículos e a utilização de tecnologias limpas, como o motor elétrico ou híbrido.»

    14

    O artigo 7.o do RTVDE, sob a epígrafe «Sujeição a autorização prévia», dispõe, nos seus n.os 1, 2 e 4 a 6:

    «1.   A atividade de prestação do serviço de transporte de passageiros com veículos até nove lugares, incluindo o do condutor, na zona de gestão unitária do transporte urbano constituída pelo território da [AMB] é um transporte urbano e, por conseguinte, está sujeita à obtenção prévia de uma autorização que habilite a pessoa titular relativamente a cada um dos veículos que exercem essa atividade.

    2.   Essa autorização é solicitada e, se for caso disso, concedida à pessoa singular ou coletiva que detém a propriedade efetiva da mesma a qualquer momento. As autorizações para o exercício da atividade são nominativas e dizem respeito a um determinado veículo. Estas devem incluir a matrícula do veículo, o número de chassis e outros dados considerados necessários para a sua identificação. A autorização não é válida para todos os veículos pertencentes ou explorados pelo seu titular.

    […]

    4.   No âmbito de aplicação territorial do presente regulamento, apenas as autorizações concedidas pela AMB autorizam a prestação de serviços, com origem e destino, sem prejuízo das disposições da [LOTT] relativas à concessão dessa autorização ou de outras autorizações aí referidas.

    5.   A autorização emitida pela [AMB] acresce às demais autorizações concedidas por outras administrações em virtude das suas competências próprias.

    6.   O serviço [TVDE] não urbano na aceção do artigo 7.o [do presente] regulamento não está sujeito [ao presente] regulamento nem ao regime de autorização que [o presente regulamento] prevê.»

    15

    O artigo 9.o deste regulamento, sob a epígrafe «Regime jurídico das autorizações», tem a seguinte redação:

    «A concessão da autorização obedece ao seguinte regime jurídico:

    1.   A concessão da autorização está sujeita ao cumprimento, pelo requerente da mesma, dos requisitos previstos na Ley 12/1987 [de regulación del transporte de viajeros por carretera mediante vehículos de motor de la Comunidad Autónoma de Cataluña (Lei n.o 12/1987 que regula o Transporte Rodoviário de Passageiros Através de Veículos a Motor, da Comunidade Autónoma da Catalunha), de 28 de maio [de 1987 (BOE n.o 151, de 25 de junho de 1987, p. 19159)], no Decreto 319/1990 [por el cual se aprueba el Reglamento de regulación del transporte de viajeros por carretera mediante vehículos de motor, del Consejo Ejecutivo de la Generalidad de Cataluña (Decreto n.o 319/1990 que aprova a Regulamentação do Transporte Rodoviário de Passageiros Através de Veículos a Motor, do Conselho Executivo dos Órgãos de Governo da Catalunha)], de 21 de dezembro [de 1990 (DOGC n.o 1387, de 31 de dezembro de 1990)], e no presente regulamento.

    […]

    3.   A autorização diz apenas respeito a um veículo e pode ser explorada pelo seu titular ou pelos seus trabalhadores contratados ao abrigo de um contrato de trabalho.

    […]»

    16

    Nos termos do artigo 10.o do referido regulamento, sob a epígrafe «Determinação do número de autorizações»:

    «1.   A AMB é responsável pela fixação, a qualquer momento, do número máximo de autorizações de serviços de transporte urbano ocasional de passageiros em veículos de aluguer com motorista. É determinado com o objetivo de garantir a suficiência do serviço em condições ótimas para os cidadãos, sem prejuízo da garantia da rentabilidade económica dos operadores.

    2.   A criação de novas autorizações, permanentes ou temporárias, ou a redução do seu número atual, exige a tomada de uma decisão que estabeleça a sua necessidade e adequação, tendo em conta nomeadamente os seguintes fatores:

    a)

    o nível da oferta atual;

    b)

    o nível da procura atual;

    c)

    as atividades comerciais, industriais, turísticas ou outras exercidas no âmbito de aplicação territorial que podem dar origem a pedidos específicos de serviços de transporte urbano ocasional em veículos de aluguer com motorista.

    d)

    a compatibilidade das novas autorizações com os objetivos de sustentabilidade ambiental no que diz respeito ao tráfego e à circulação urbana.»

    17

    O artigo 11.o do mesmo regulamento, sob a epígrafe «Regime de concessão de autorizações», prevê:

    «1.   As autorizações são concedidas em conformidade com os princípios e as regras estabelecidos pela Lei n.o 12/1987 [que regula o Transporte Rodoviário de Passageiros Através de Veículos a Motor], pelo Decreto n.o 319/1990 [que aprova a regulamentação do transporte rodoviário de passageiros através de veículos a motor] ou pelo presente regulamento e em conformidade com os procedimentos administrativos estabelecidos em aplicação deste último.

    2.   A AMB concede as autorizações às pessoas singulares ou coletivas que preencham os requisitos necessários para a sua obtenção. Para este efeito, a AMB adota as bases dos avisos de abertura de processos de concessão de novas autorizações, as quais especificam o procedimento de atribuição, que, em qualquer caso, deve garantir o respeito dos princípios da publicidade, da igualdade de oportunidades, da livre concorrência e da não discriminação. A atribuição faz‑se por sorteio entre os pedidos que preenchem os requisitos exigidos.

    3.   As pessoas interessadas na obtenção de uma autorização devem apresentar um pedido em que provem [que preenchem] os requisitos exigidos e serão inscritas na lista de candidatos, de acordo com os prazos e formas determinados pelos respetivos avisos.

    4.   O processo de concessão prevê que os interessados sejam ouvidos e que as organizações do setor possam invocar o que consideram oportuno para defender os seus interesses.

    5.   Esta regulamentação aplica‑se igualmente às autorizações que permitem a prestação do serviço urbano com caráter sazonal ou para eventos específicos.»

    18

    O RTVDE contém uma «[d]isposição transitória», com a seguinte redação:

    «Estão em vigor as autorizações de transporte reguladas pelo [presente] regulamento que foram concedidas pela [extinta] Entidad Municipal Metropolitana de Barcelona (Corporación Metropolitana de Barcelona) [Entidade Municipal Metropolitana de Barcelona (Corporação Metropolitana de Barcelona)] e pela Entidad Metropolitana del Transporte [Entidade Metropolitana de Transporte], bem como as autorizações emitidas pela Generalitat de Cataluña [Órgãos de Governo da Catalunha] em conformidade com a Orden por la que se desarrolla el Reglamento de la Ley de Ordenación de los Transportes Terrestres, aprobado por el Real Decreto 1211/1990, de 28 de septiembre (Decreto que aplica o Regulamento da Lei relativa à Organização dos Transportes Terrestres, adotado pelo Real Decreto n.o 1211/1990, de 28 de Setembro de 1990), de 30 de julho de 1998 (BOE n.o 192, de 12 de agosto de 1998, p. 27466), que estabeleceu a primeira limitação segundo a proporção de um trigésimo relativamente ao número de licenças de táxis, e que estão operacionais no momento da entrada em vigor deste diploma, as quais continuam a ser reguladas e sujeitas à presente regulamentação.»

    19

    Nos termos de duas «Disposições suplementares», que figuram no RTVDE:

    «Primeira. O número total de autorizações limita‑se às autorizações concedidas em conformidade com a disposição transitória anterior. Compete ao Instituto Metropolitano del Taxi [Instituto Metropolitano do Táxi] a proposta de abertura dos processos de determinação do número máximo de autorizações acima das previstas pela disposição transitória. O número de autorizações vigentes a qualquer momento não pode, em caso algum, ultrapassar o ratio de uma autorização de TVDE por cada trinta licenças de táxi. Os poderes conferidos ao Instituto Metropolitano do Táxi no artigo 5.o, n.o 2, [do presente] regulamento incluem o aviso de início e a decisão relativa à concessão de novas autorizações, para além das abrangidas pela disposição transitória […]

    Segunda. Os poderes atribuídos ao Instituto Metropolitano do Táxi no artigo 5.o, n.o 2, [do presente] regulamento incluem o aviso de início e a decisão relativa à concessão de novas autorizações sazonais e para eventos individuais. Esses avisos estão em conformidade com as seguintes regras:

    a.

    os avisos fixam o número de autorizações que serão concedidas, de acordo com os critérios do presente regulamento, com base numa justificação fundamentada e suficiente. O número de autorizações por requerente pode ser limitado, quer seja pessoa singular ou coletiva;

    b.

    os avisos preveem o calendário da duração da validade das autorizações e especificam os períodos ou os eventos relativos a essa validade;

    c.

    o calendário anual de validade das autorizações pode ser prorrogado ou reduzido por razões justificadas por novas necessidades ou circunstâncias, não conferindo a eventual redução, em caso algum, direito a indemnização.»

    Litígio no processo principal e questões prejudiciais

    20

    O Tribunal Superior de Justicia de Cataluña (Tribunal Superior de Justiça da Catalunha, Espanha), que é o órgão jurisdicional de reenvio, salienta que, em 2009, a limitação do número de licenças de serviços de TVDE a um trigésimo das licenças de serviços de táxi, que até então estava prevista na legislação espanhola, foi suprimida. Esta supressão provocou, até 2015, um aumento significativo do número de prestadores desses serviços na zona metropolitana de Barcelona, fenómeno que a AMB pretendeu conter com a adoção do RTVDE.

    21

    O RTVDE visa regulamentar o serviço de TVDE em toda a aglomeração de Barcelona, que constitui uma zona urbana, para efeitos do transporte de pessoas em táxi ou em veículo de passageiros com motorista. Para a prestação desses serviços nessa aglomeração, este regulamento exige, nomeadamente, às empresas que já dispõem de uma autorização para prestar serviços de TVDE urbanos e interurbanos em Espanha que obtenham uma licença suplementar concedida pela AMB. Além disso, o referido regulamento exerce a faculdade oferecida pelo artigo 48.o, n.o 3, da LOTT, de limitar o número de licenças que autorizam os serviços de TVDE a um trigésimo do número de licenças concedidas para os serviços de táxi.

    22

    A P&L é titular de autorizações de exploração de um serviço de TVDE e impugna o RTVDE no órgão jurisdicional de reenvio. Com efeito, a P&L e catorze outras empresas que já prestavam serviços de TVDE nessa área à data da adoção do RTVDE, entre as quais empresas ligadas a plataformas internacionais em linha, consideram que, tendo em conta as limitações e as restrições que lhes são impostas pelo RTVDE, o único objetivo da sua adoção era impedir a sua atividade, com o único propósito de proteger os interesses do setor dos táxis. Por conseguinte, a P&L e essas outras empresas pedem ao órgão jurisdicional de reenvio que declare a nulidade do RTVDE.

    23

    A Asociación Nacional del Taxi (Antaxi) (a seguir «ANT»), a Asociación Profesional Élite Taxi, o Sindicat del Taxi de Catalunya (STAC), a Tapoca VTC1 SL e o Agrupació Taxis Companys intervieram neste litígio em apoio da AMB.

    24

    O Tribunal Superior de Justicia de Cataluña (Tribunal Superior de Justiça da Catalunha) salienta que os táxis e o transporte individual e remunerado de passageiros em veículos descaracterizados a partir de plataforma eletrónica (a seguir «TVDE») estão em concorrência entre si no que diz respeito ao serviço de transporte urbano de passageiros. Os serviços de táxi estão, enquanto «serviços de interesse geral», sujeitos a uma regulação própria e a uma limitação do número de licenças necessárias ao exercício da sua atividade, e as suas tarifas estão sujeitas a uma autorização administrativa prévia. Embora o seu campo de ação habitual se situe em zona urbana, os táxis podem, contudo, prestar serviços de transporte interurbanos, em conformidade com as exigências aplicáveis.

    25

    Segundo o órgão jurisdicional de reenvio, os prestadores de serviços de TVDE devem igualmente obter autorizações para exercer essa atividade, que são concedidas em número limitado. Este especifica que, à data dos factos do litígio no processo principal, os TVDE podiam prestar serviços de transporte interurbano e urbano em todo o território nacional com tarifas não sujeitas a autorização prévia, mas sim a um sistema de preços concertado que permitia ao cliente conhecer antecipadamente, e eventualmente pagar via Internet, o preço total do serviço prestado. Contrariamente aos táxis, os TVDE não podem circular nos corredores reservados aos autocarros, não dispõem de praças na via pública e não podem apanhar clientes diretamente na via pública se o serviço não tiver sido previamente contratado.

    26

    O órgão jurisdicional de reenvio salienta que, em 2018, o Tribunal Supremo (Supremo Tribunal, Espanha) declarou que o ratio de 1 para 30 entre o número de licenças de serviços de TVDE e o número de licenças de serviços de táxi nunca foi justificada por nenhuma consideração objetiva. O órgão jurisdicional de reenvio conclui daí que o artigo 48.o, n.o 3, da LOTT, que permitiu a limitação pelo RTVDE das licenças de serviços de TVDE, pode ser qualificado de arbitrário e que, por conseguinte, é contrário ao artigo 49.o TFUE, na medida em que torna praticamente impossível às empresas que oferecem serviços de TVDE na União Europeia estabelecer‑se na zona metropolitana de Barcelona, e à proibição, prevista no artigo 107.o, n.o 1, TFUE, de impedir as trocas comerciais na União através da concessão de auxílios de Estado.

    27

    O Tribunal Superior de Justicia de Cataluña (Tribunal Superior de Justiça da Catalunha) tem as mesmas dúvidas quanto à compatibilidade com as referidas disposições do direito da União do regime de «dupla autorização» a que foram sujeitos os veículos TVDE na zona metropolitana de Barcelona. Uma vez que o artigo 91.o da LOTT e o artigo 182.o, n.o 2, do ROTT previam, à data dos factos do litígio no processo principal, que as autorizações para exercer a atividade de TVDE permitiam prestar «serviços urbanos e interurbanos em todo o território nacional», o acréscimo pela AMB da exigência de uma licença para poder prestar serviços urbanos de TVDE na zona metropolitana de Barcelona, sujeita a exigências suplementares, pode ser considerado uma estratégia destinada a reduzir ao mínimo a concorrência dos serviços de TVDE em relação aos táxis.

    28

    Segundo o órgão jurisdicional de reenvio, as justificações do RTVDE invocadas pela AMB prendem‑se, antes de mais, com o facto de os serviços de TVDE colocarem em perigo a viabilidade económica dos serviços de táxi, constituírem uma concorrência desleal e conduzirem a uma utilização intensiva das vias de transporte. Em seguida, as 10523 licenças de serviços de táxi concedidas pela AMB são suficientes para satisfazer as necessidades da população e para assegurar, ao mesmo tempo, a rentabilidade da atividade dos táxis. Por último, a AMB insiste na proteção ambiental.

    29

    Todavia, segundo esse órgão jurisdicional, as considerações económicas relativas à situação dos táxis não podem justificar as medidas incluídas no RTVDE. No que respeita às considerações sobre a utilização das vias de transporte, a AMB não ponderou o efeito que os serviços de TVDE podem gerar na diminuição da utilização de veículos privados. Além disso, os TVDE estão obrigados a ter um local de estacionamento e não podem circular à procura de clientes nem estacionar na via pública enquanto esperam por estes. Do mesmo modo, as considerações ambientais ignoram as técnicas existentes suscetíveis de garantir a prestação de serviços através de veículos pouco poluentes, ou mesmo não poluentes. Além disso, a frota de táxis é considerada «limpa» sem que sejam indicadas as razões pelas quais essa qualificação não se estende à frota de TVDE. O objetivo essencial da AMB parece ter sido, através do RTVDE, salvaguardar ou proteger os interesses do setor dos táxis.

    30

    Nestas condições, o Tribunal Superior de Justicia de Catalunya (Tribunal Superior de Justiça da Catalunha) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais):

    «1)

    [O artigo] 49.o e [o artigo] 107.o, n.o 1, TFUE opõem‑se a disposições nacionais — legais e regulamentares — que, sem motivo justificado, limitam as autorizações [TVDE] à razão de uma por cada trinta licenças de táxi, ou menos?

    2)

    [O artigo] 49.o e [o artigo] 107.o, n.o 1, TFUE opõem‑se a uma disposição nacional que, sem motivo justificado, prevê uma segunda autorização e requisitos suplementares para os veículos [TVDE] que pretendam prestar serviços urbanos?»

    Quanto às questões prejudiciais

    Quanto à admissibilidade do pedido de decisão prejudicial

    31

    A AMB considera que o pedido de decisão prejudicial é inadmissível por três razões. Antes de mais, a decisão de reenvio não menciona a legislação regional e local aplicável e não especifica o facto de existir uma regulamentação na qual se baseiam as disposições do RTVDE, tanto no que respeita à competência da AMB como à justificação deste regulamento relativa à proteção do ambiente. Em seguida, os elementos do litígio apenas dizem respeito a um único Estado‑Membro e as questões prejudiciais visam mais a interpretação do direito interno do que a do direito da União. Por último, a AMB sublinha a formulação, em seu entender, tendenciosa das questões prejudiciais, que se destina a influenciar o Tribunal de Justiça quanto ao mérito.

    32

    A P&L salienta que a primeira questão prejudicial se refere, além do RTVDE, a disposições «legais e regulamentares». No entanto, o limite imposto para a concessão de licenças de serviços de TVDE em um trigésimo das licenças de serviços de táxi resulta exclusivamente do RTVDE. Por conseguinte, esta primeira questão ultrapassa o âmbito do litígio pendente no órgão jurisdicional de reenvio e é, consequentemente, irrelevante para a resolução do mesmo.

    33

    Segundo a ANT, o órgão jurisdicional de reenvio coloca, na realidade, quatro questões prejudiciais, duas das quais relativas à interpretação das disposições quanto à liberdade de estabelecimento e as outras duas relativas à interpretação de disposições que fazem parte do regime dos auxílios de Estado.

    34

    As duas questões relativas à liberdade de estabelecimento devem ser declaradas inadmissíveis por já terem sido respondidas pelo Tribunal de Justiça no sentido de que, uma vez que qualquer restrição à liberdade de estabelecimento deve ser justificada por uma razão imperiosa de interesse geral, o juiz nacional deve, se considerar, como o órgão jurisdicional de reenvio, que essa razão não existe, não aplicar ou anular a disposição nacional em causa. Além disso, estas questões seriam inadmissíveis se fossem interpretadas no sentido de que o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se as disposições do RTVDE estão em conformidade com as exigências da necessidade e da proporcionalidade, uma vez que seria assim pedido ao Tribunal de Justiça que efetuasse uma análise que não lhe cabe efetuar, mas que é da competência do órgão jurisdicional nacional. Além disso, o Tribunal Supremo (Supremo Tribunal) já efetuou essa análise sem ter dúvidas quanto à compatibilidade das disposições nacionais em causa com o direito da União, o que prova que as questões submetidas pelo órgão jurisdicional de reenvio não têm utilidade para decidir o litígio no processo principal.

    35

    Do mesmo modo, as duas questões relativas à proibição dos auxílios de Estado são inadmissíveis, uma vez que o Tribunal de Justiça respondeu claramente a questões semelhantes no Acórdão de 14 de janeiro de 2015, Eventech (C‑518/13, EU:C:2015:9), sem que o órgão jurisdicional de reenvio tenha fornecido a menor explicação quanto à necessidade de matizar ou de clarificar essa jurisprudência no caso em apreço.

    36

    Segundo jurisprudência constante, no âmbito do processo instituído pelo artigo 267.o TFUE, o juiz nacional, a quem foi submetido o litígio e que deve assumir a responsabilidade pela decisão judicial a tomar, tem competência exclusiva para apreciar, tendo em conta as especificidades do processo, tanto a necessidade de uma decisão prejudicial para poder proferir a sua decisão como a pertinência das questões que submete ao Tribunal de Justiça. Consequentemente, desde que as questões submetidas sejam relativas à interpretação do direito da União, o Tribunal de Justiça é, em princípio, obrigado a pronunciar‑se (Acórdão de 20 de setembro de 2022, VD e SR, C‑339/20 e C‑397/20, EU:C:2022:703, n.o 56 e jurisprudência referida).

    37

    O Tribunal de Justiça só pode recusar pronunciar‑se sobre uma questão prejudicial submetida por um órgão jurisdicional nacional quando for manifesto que a interpretação solicitada do direito da União não tem nenhuma relação com a realidade ou com o objeto do litígio no processo principal, quando o problema for hipotético ou ainda quando o Tribunal de Justiça não dispuser dos elementos de facto e de direito necessários para dar uma resposta útil às questões que lhe são submetidas (Acórdão de 20 de setembro de 2022, VD e SR, C‑339/20 e C‑397/20, EU:C:2022:703, n.o 57 e jurisprudência referida).

    38

    Quanto a este último aspeto, importa recordar que a necessidade de obter uma interpretação do direito da União que seja útil ao juiz nacional exige que este defina o quadro factual e regulamentar em que se inserem as questões que submete ou que, pelo menos, explique as hipóteses factuais em que essas questões assentam (Acórdão de 5 de março de 2019, Eesti Pagar,C‑349/17, EU:C:2019:172, n.o 49 e jurisprudência referida).

    39

    Assim, resulta do artigo 94.o, alíneas a) e c), do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça que o pedido de decisão prejudicial deve conter, nomeadamente, uma exposição sumária do objeto do litígio bem como dos factos pertinentes, conforme apurados pelo órgão jurisdicional de reenvio, ou, no mínimo, uma exposição dos dados factuais em que as questões assentam, do mesmo modo que uma exposição das razões que conduziram o órgão jurisdicional de reenvio a interrogar‑se sobre a interpretação ou a validade de certas disposições do direito da União, bem como o nexo que esse órgão estabelece entre essas disposições e a legislação nacional aplicável ao litígio no processo principal.

    40

    No caso em apreço, primeiro, no que respeita à objeção da AMB segundo a qual a decisão de reenvio não menciona toda a legislação nacional, regional e local pertinente, é forçoso constatar que esta decisão de reenvio contém elementos suficientes para permitir ao Tribunal de Justiça compreender tanto o quadro jurídico e factual do litígio no processo principal como o sentido e o alcance das questões prejudiciais submetidas. Daqui resulta que a referida decisão preenche os requisitos impostos pelo artigo 94.o, alínea a), do Regulamento de Processo.

    41

    Segundo, alegando que as questões prejudiciais se referem a disposições nacionais legais e regulamentares, apesar de o processo principal apenas dizer respeito à legalidade do RTVDE, a P&L convida, na realidade, o Tribunal de Justiça a identificar, ele próprio, os contornos precisos da legislação nacional aplicável, o que não é da sua competência.

    42

    Com efeito, incumbe ao Tribunal de Justiça ter em conta, no âmbito da repartição de competências entre os órgãos jurisdicionais da União e os órgãos jurisdicionais nacionais, o contexto factual e regulamentar em que se inserem as questões prejudiciais, como definido pela decisão de reenvio. Assim, o exame de um reenvio prejudicial deve ser efetuado à luz da interpretação do direito nacional dada pelo órgão jurisdicional de reenvio [Acórdão de 20 de outubro de 2022, Centre public d’action sociale de Liège (Revogação ou suspensão de uma decisão de regresso), C‑825/21, EU:C:2022:810, n.o 35].

    43

    Por conseguinte, uma vez que o órgão jurisdicional de reenvio definiu o quadro factual e regulamentar em que as questões se inserem, não compete ao Tribunal de Justiça verificar a sua exatidão (Acórdão de 5 de março de 2019, Eesti Pagar,C‑349/17, EU:C:2019:172, n.o 50).

    44

    Terceiro, o artigo 94.o, alínea c), do Regulamento de Processo exige que o órgão jurisdicional de reenvio exponha as razões que o conduziram a interrogar‑se sobre a interpretação das disposições do direito da União que são objeto das questões prejudiciais. Ora, a formulação das questões prejudiciais, mesmo admitindo que se destina, como sustenta a AMB, a influenciar o Tribunal de Justiça, não pode, por si só, tornar inadmissível o pedido de decisão prejudicial, uma vez que tal circunstância não corresponde a nenhuma das hipóteses referidas no n.o 37 do presente acórdão.

    45

    Quarto, mesmo admitindo que, como alega a ANT, as respostas a dar às questões prejudiciais decorrem claramente, no caso em apreço, da jurisprudência do Tribunal de Justiça, resulta do artigo 99.o do Regulamento de Processo que tal circunstância não teria por efeito tornar o pedido de decisão prejudicial inadmissível, mas habilitar o Tribunal de Justiça a responder‑lhe através de despacho.

    46

    Quinto, uma vez que as questões prejudiciais submetidas têm por objeto a interpretação do artigo 49.o e do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, a ANT alega erradamente que estas questões se limitam a pedir ao Tribunal de Justiça que efetue apreciações factuais que não são da sua competência.

    47

    Sexto, a circunstância de o Supremo Tribunal nacional já ter examinado, no âmbito de um litígio que apresenta semelhanças com o que está em causa no processo principal, a eventual pertinência das disposições do direito da União referidas pelo órgão jurisdicional de reenvio não é suscetível de tornar inadmissível um reenvio prejudicial para que o Tribunal de Justiça se pronuncie sobre a interpretação dessas disposições, em conformidade com o artigo 267.o TFUE. Com efeito, tal circunstância não corresponde a nenhuma das hipóteses de inadmissibilidade recordadas no n.o 37 do presente acórdão.

    48

    Sétimo, na medida em que a AMB salienta que todos os aspetos do litígio no processo principal estão confinados ao interior de um único Estado‑Membro, importa recordar que o órgão jurisdicional de reenvio precisou que o recurso da P&L faz parte de um conjunto de quinze recursos de anulação do RTVDE, dos quais um foi interposto por «plataformas internacionais» em linha, o que tende a indicar que o recurso no processo principal visa a anulação de disposições de direito nacional que se aplicam igualmente aos nacionais de outros Estados‑Membros, pelo que a decisão que o órgão jurisdicional de reenvio adotar na sequência do presente acórdão é suscetível de produzir efeitos também relativamente a estes últimos (v., neste sentido, Acórdão de 8 de maio de 2013, Libert e o., C‑197/11 e C‑203/11, EU:C:2013:288, n.o 35).

    49

    Ora, como resulta de jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, quando o órgão jurisdicional de reenvio recorre ao Tribunal de Justiça no âmbito de um recurso de anulação de disposições aplicáveis não apenas aos cidadãos nacionais mas também aos nacionais dos outros Estados‑Membros, a decisão que esse órgão jurisdicional adotar na sequência do seu acórdão proferido a título prejudicial irá produzir efeitos também relativamente a estes últimos nacionais, o que justifica que o Tribunal de Justiça responda às questões que lhe foram submetidas sobre as disposições do Tratado FUE relativas às liberdades fundamentais, ainda que todos os elementos do litígio no processo principal estejam confinados ao interior de um só Estado‑Membro (Acórdão de 7 de setembro de 2022, Cilevičs e o., C‑391/20, EU:C:2022:638, n.o 32 e jurisprudência referida).

    50

    Resulta das considerações que precedem que o pedido de decisão prejudicial é admissível.

    Quanto ao mérito

    Quanto às questões relativas ao artigo 107.o, n.o 1, TFUE

    51

    Com estas questões prejudiciais, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, nomeadamente, se o artigo 107.o, n.o 1, TFUE deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma regulamentação, aplicável a uma aglomeração, que prevê, por um lado, que é exigida uma autorização específica para o exercício da atividade de serviços de TVDE nessa aglomeração, que acresce à autorização nacional exigida para a prestação de serviços urbanos e interurbanos de TVDE, e, por outro, que o número de licenças de serviços de TVDE está limitado a um trigésimo das licenças de serviços de táxi concedidas para a referida aglomeração.

    52

    Segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, a qualificação de uma medida de «auxílio de Estado», na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, requer que estejam preenchidos todos os seguintes requisitos. Em primeiro lugar, deve tratar‑se de uma intervenção do Estado ou ser proveniente de recursos estatais. Em segundo lugar, essa intervenção deve ser suscetível de afetar as trocas comerciais entre os Estados‑Membros. Em terceiro lugar, deve conferir uma vantagem seletiva ao seu beneficiário. Em quarto lugar, deve falsear ou ameaçar falsear a concorrência (Acórdão de 11 de novembro de 2021, Autostrada Wielkopolska/Comissão e Polónia, C‑933/19 P, EU:C:2021:905, n.o 103 e jurisprudência referida).

    53

    Quanto ao requisito relativo à utilização de recursos estatais, há que recordar que o conceito de auxílio abrange não apenas prestações positivas, como subvenções, mas igualmente intervenções que, sob formas diversas, reduzem os encargos que normalmente oneram o orçamento de uma empresa e que, por essa razão, sem serem subvenções em sentido estrito, têm a mesma natureza e produzem efeitos idênticos (Acórdão de 14 de janeiro de 2015, Eventech,C‑518/13, EU:C:2015:9, n.o 33 e jurisprudência referida).

    54

    Consequentemente, para efeitos da declaração da existência de um auxílio de Estado, deve estabelecer‑se um nexo suficientemente direto entre, por um lado, a vantagem concedida ao beneficiário e, por outro, uma diminuição do Orçamento do Estado, ou mesmo um risco económico suficientemente concreto de encargos que o onerem (Acórdão de 14 de janeiro de 2015, Eventech,C‑518/13, EU:C:2015:9, n.o 34 e jurisprudência referida).

    55

    No caso em apreço, basta constatar que não resulta de modo algum da decisão de reenvio que a regulamentação em causa no processo principal implica a afetação de recursos estatais.

    56

    Em especial, por um lado, nem a exigência de uma autorização concedida pela AMB para exercer a atividade de serviços de TVDE na aglomeração de Barcelona, nem a limitação do número de licenças desses serviços a um trigésimo das licenças de serviços de táxi concedidas para a referida aglomeração parecem implicar prestações positivas, como subvenções, em benefício das empresas que prestam serviços de táxi, nem diminuir os encargos que normalmente oneram o orçamento dessas empresas.

    57

    Por outro lado, estas duas medidas não parecem conduzir a uma diminuição do Orçamento do Estado ou a um risco económico suficientemente concreto de encargos que o onerem, que poderiam beneficiar as empresas que prestam serviços de táxi.

    58

    Nestas condições, há que responder às questões submetidas que o artigo 107.o, n.o 1, TFUE não se opõe a uma regulamentação, aplicável a uma aglomeração, que prevê, por um lado, que seja exigida uma autorização específica para o exercício da atividade de serviços de aluguer de transporte individual e remunerado de passageiros em veículos descaracterizados a partir de plataforma eletrónica nessa aglomeração, que acresce à autorização nacional exigida para o mesmo tipo de prestação de serviços, e, por outro, que o número de autorizações desses serviços esteja limitado a um trigésimo das licenças de serviços de táxi concedidas para a referida aglomeração, desde que essas medidas não sejam suscetíveis de implicar uma afetação de recursos estatais na aceção desta disposição.

    Quanto às questões relativas ao artigo 49.o TFUE

    59

    Com estas questões prejudiciais, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta igualmente, em substância, se o artigo 49.o TFUE se opõe a uma regulamentação, aplicável a uma aglomeração, que prevê, por um lado, que é exigida uma autorização específica para o exercício da atividade de serviços de TVDE nessa aglomeração, que acresce à autorização nacional exigida para a prestação de serviços urbanos e interurbanos de TVDE, e, por outro, que o número de licenças desses serviços está limitado a um trigésimo das licenças de serviços de táxi concedidas para a referida aglomeração.

    60

    O artigo 49.o, primeiro parágrafo, TFUE dispõe que, no âmbito das disposições que figuram no capítulo 2 do título IV da parte III do Tratado FUE, são proibidas as restrições à liberdade de estabelecimento dos nacionais de um Estado‑Membro no território de outro Estado‑Membro.

    61

    Segundo jurisprudência constante, devem ser consideradas restrições à liberdade de estabelecimento todas as medidas que proíbam, perturbem ou tornem menos atrativo o exercício da liberdade garantida pelo artigo 49.o TFUE (Acórdão de 7 de setembro de 2022, Cilevičs e o., C‑391/20, EU:C:2022:638, n.o 61 e jurisprudência referida).

    62

    Como salientou o advogado‑geral, em substância, nos n.os 51 a 55 das suas conclusões, por um lado, a exigência de uma autorização específica para o exercício da atividade de serviços de TVDE na aglomeração de Barcelona, que acresce à autorização nacional exigida para a prestação de serviços urbanos e interurbanos de TVDE, constitui, por si só, uma restrição ao exercício da liberdade garantida no artigo 49.o TFUE, uma vez que semelhante exigência restringe efetivamente o acesso ao mercado por parte de qualquer novo operador (v., neste sentido, Acórdão de 10 de março de 2009, Hartlauer,C‑169/07, EU:C:2009:141, n.o 34; v., igualmente, por analogia, Acórdão de 22 de janeiro de 2002, Canal Satélite Digital,C‑390/99, EU:C:2002:34, n.o 29).

    63

    Por outro lado, é também esse o caso da limitação do número de licenças desses serviços de TVDE a um trigésimo do número de licenças de serviços de táxi concedidas para a referida aglomeração, que deve ser qualificada de restrição à liberdade de estabelecimento, uma vez que essa limitação restringe o número de prestadores de serviços de TVDE estabelecidos nessa aglomeração.

    64

    Segundo jurisprudência constante, essas restrições à liberdade de estabelecimento só podem ser admitidas se, em primeiro lugar, forem justificadas por uma razão imperiosa de interesse geral e, em segundo lugar, respeitarem o princípio da proporcionalidade, o que implica que sejam adequadas para garantir, de modo coerente e sistemático, a realização do objetivo prosseguido e não forem além do necessário para o alcançar (Acórdão de 7 de setembro de 2022, Cilevičs e o., C‑391/20, EU:C:2022:638, n.o 65 e jurisprudência referida).

    – Quanto à existência de razões imperiosas de interesse geral

    65

    Resulta do pedido de decisão prejudicial e das observações da AMB e do Governo espanhol no Tribunal de Justiça que, através das duas medidas em causa no processo principal, o RTVDE visa assegurar, antes de mais, a qualidade, segurança e acessibilidade dos serviços de táxi na aglomeração de Barcelona, considerados como «serviço de interesse geral», nomeadamente mantendo um «equilíbrio adequado» entre o número de prestadores de serviços de táxi e o dos prestadores de serviços de TVDE, em seguida, uma boa gestão do transporte, do tráfego e do espaço público nessa aglomeração e, por último, a proteção do ambiente na referida aglomeração.

    66

    No que respeita, mais especificamente, ao objetivo de assegurar a qualidade, segurança e acessibilidade dos serviços de táxi, resulta dos autos de que o Tribunal de Justiça dispõe, antes de mais, que a atividade de serviços de táxi está fortemente regulamentada, na medida em que estes serviços estão sujeitos, nomeadamente, a quotas de licenças, a tarifas regulamentadas, a uma obrigação de transporte universal e a uma acessibilidade para as pessoas com mobilidade reduzida. Tendo em conta estas características, os serviços de táxi são considerados, nomeadamente pela AMB, como um «serviço de interesse geral» que merece ser preservado, enquanto elemento importante da organização geral dos transportes urbanos da aglomeração de Barcelona.

    67

    A AMB salienta, em seguida, que a viabilidade económica da atividade de serviços de táxi parece ser posta em perigo por uma concorrência crescente proveniente da atividade dos serviços de TVDE. Nestas condições, a preservação de um equilíbrio entre estas duas formas de transporte urbano foi entendida pelos poderes políticos, tanto a nível nacional como regional, como um meio adequado e proporcionado para garantir a manutenção dos serviços de táxi, enquanto serviço de interesse geral integrado num modelo global de transporte urbano.

    68

    Por último, o órgão jurisdicional de reenvio e várias partes no processo salientaram que o Tribunal Supremo (Supremo Tribunal) tinha considerado, num Acórdão de 4 de junho de 2018, que a organização e os modos desejados do transporte urbano fazem parte da escolha dos poderes públicos, que esses poderes podem, no âmbito dessa escolha, optar pela manutenção de serviços de táxi com as características recordadas no n.o 66 do presente acórdão e que constituem, por conseguinte, um «serviço de interesse geral», que, consequentemente, se justifica preservar um equilíbrio entre esse modo de transporte urbano e os serviços de TVDE a fim de garantir a manutenção desse serviço de interesse geral e que, para esse efeito, o facto de prever um ratio entre as licenças de serviços de TVDE e as de serviços de táxi, que pode ir até uma por cada trinta, afigura‑se, na falta de alternativa menos restritiva, como uma medida adequada e proporcionada.

    69

    A este respeito, primeiro, como salientou o advogado‑geral nos n.os 75 e 76 das suas conclusões, os objetivos da boa gestão do transporte, do tráfego e do espaço público de uma área metropolitana, por um lado, e o de proteção do ambiente nesse aglomerado, por outro, são suscetíveis de constituir razões imperiosas de interesse geral (v., neste sentido, Acórdãos de 24 de março de 2011, Comissão/Espanha,C‑400/08, EU:C:2011:172, n.o 74, e de 30 de janeiro de 2018, X e Visser, C‑360/15 e C‑31/16, EU:C:2018:44, n.os 134 e 135).

    70

    Segundo, em contrapartida, é jurisprudência constante que objetivos de natureza puramente económica não podem constituir uma razão imperiosa de interesse geral suscetível de justificar uma restrição a uma liberdade fundamental garantida pelo Tratado (Acórdãos de 11 de março de 2010, Attanasio Group,C‑384/08, EU:C:2010:133, n.o 55, e de 24 de março de 2011, Comissão/Espanha,C‑400/08, EU:C:2011:172, n.o 74 e jurisprudência referida). O Tribunal de Justiça decidiu, nomeadamente, no sentido de que o objetivo de garantir a rentabilidade de uma linha de autocarro concorrente, enquanto motivo de natureza puramente económica, não pode constituir uma razão imperiosa de interesse geral (Acórdão de 22 de dezembro de 2010, Yellow Cab Verkehrsbetrieb,C‑338/09, EU:C:2010:814, n.o 51).

    71

    No caso em apreço, como salientou o advogado‑geral no n.o 61 das suas conclusões, o objetivo de assegurar a viabilidade económica dos serviços de táxi deve ser considerado, também ele, um motivo de natureza puramente económica que não pode constituir uma razão imperiosa de interesse geral, na aceção da jurisprudência recordada no número anterior do presente acórdão.

    72

    Daqui decorre que este objetivo não pode ser invocado para justificar, nomeadamente, a preservação de um equilíbrio entre os dois modos de transporte urbanos em causa no processo principal ou um ratio entre as licenças de serviços de TVDE e as de serviços de táxi, que constituem considerações de natureza puramente económica.

    73

    Terceiro, estas apreciações não são contrariadas pelo facto de os serviços de táxi serem qualificados, no direito espanhol, como «serviço de interesse geral».

    74

    Por um lado, como alegou corretamente a Comissão Europeia na audiência, o objetivo prosseguido por uma medida restritiva da liberdade de estabelecimento deve, enquanto tal, constituir uma razão imperiosa de interesse geral na aceção da jurisprudência referida no n.o 64 do presente acórdão, sem que a qualificação desse objetivo no direito nacional possa influenciar a apreciação a efetuar a esse respeito.

    75

    Por outro lado, nenhum elemento dos autos de que o Tribunal de Justiça dispõe revela que os prestadores de serviços de táxi que exercem a sua atividade na aglomeração de Barcelona estão encarregados da gestão de um serviço de interesse económico geral (a seguir «SIEG») na aceção do artigo 106.o, n.o 2, TFUE, nem que a inexistência de restrições à liberdade de estabelecimento dos prestadores de serviços de TVDE constitui um obstáculo ao cumprimento, de direito ou de facto, de uma missão específica de serviço público confiada aos referidos prestadores de serviços de táxi.

    76

    A este respeito, importa recordar que, embora os Estados‑Membros possam definir o alcance e a organização dos seus SIEG, tendo especialmente em conta objetivos próprios da sua política nacional, e que, a este título, os Estados‑32

    77

    Membros dispõem de um amplo poder de apreciação que só pode ser posto em causa pela Comissão em caso de erro manifesto, esse poder não é ilimitado e deve, em qualquer caso, ser exercido com respeito pelo direito da União (Acórdão de 3 de setembro de 2020, Vereniging tot Behoud van Natuurmonumenten in Nederland e o./Comissão, C‑817/18 P, EU:C:2020:637, n.o 95 e jurisprudência referida).

    78

    Segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, um serviço é suscetível de revestir um interesse económico geral quando este interesse apresenta características específicas em relação àquele que revestem outras atividades da vida económica (Acórdão de 7 de novembro de 2018, Comissão/Hungria,C‑171/17, EU:C:2018:881, n.o 51 e jurisprudência referida).

    79

    Além disso, para poder ser qualificado de SIEG, o serviço deve ser prestado no cumprimento de uma missão específica de interesse público cujo desempenho tenha sido confiado ao prestador pelo Estado‑Membro em questão (Acórdão de 7 de novembro de 2018, Comissão/Hungria,C‑171/17, EU:C:2018:881, n.o 52).

    80

    Importa, portanto, que as empresas beneficiárias tenham efetivamente sido encarregadas da execução de obrigações de serviço público e que essas obrigações estejam claramente definidas no direito nacional, o que pressupõe a existência de um ou vários atos de autoridade pública que definam de maneira suficientemente precisa pelo menos a natureza, a duração e o alcance das obrigações de serviço público que incumbem às empresas encarregadas da execução destas obrigações (v., neste sentido, Acórdão de 20 de dezembro de 2017, Comunidad Autónoma del País Vasco e o./Comissão, C‑66/16 P a C‑69/16 P, EU:C:2017:999, n.os 72 e 73).

    81

    Além disso, o artigo 106.o, n.o 2, TFUE prevê, por um lado, que as empresas encarregadas da gestão de SIEG ficam submetidas às regras de concorrência, na medida em que a aplicação destas regras não constitua obstáculo ao cumprimento, de direito ou de facto, da missão particular que lhes foi confiada, e, por outro, que o desenvolvimento das trocas comerciais não deve ser afetado de maneira que contrarie os interesses da União. Deste modo, a própria redação do artigo 106.o, n.o 2, TFUE demonstra que só são permitidas derrogações às regras do Tratado se forem necessárias ao cumprimento da missão particular confiada a uma empresa encarregada da gestão de um SIEG (Acórdão de 3 de setembro de 2020, Vereniging tot Behoud van Natuurmonumenten in Nederland e o./Comissão, C‑817/18 P, EU:C:2020:637, n.os 96 e 97).

    82

    Ora, o facto de a atividade de serviços de táxi apresentar as características enunciadas no n.o 66 do presente acórdão e estar, assim, fortemente regulamentada não permite demonstrar que o interesse que reveste essa atividade, na aceção da jurisprudência referida no n.o 77 do presente acórdão, apresenta características específicas em relação àquele que revestem outras atividades económicas nem que uma missão particular de serviço público foi confiada aos prestadores de serviços de táxi através de atos de autoridade pública suficientemente precisos nesse sentido.

    83

    Quarto, embora as características enunciadas no n.o 66 do presente acórdão revelem que a regulamentação dos serviços de táxi visa, nomeadamente, garantir a qualidade, segurança e acessibilidade desses serviços, em benefício dos utilizadores, afigura‑se, em contrapartida, que as medidas em causa no processo principal não prosseguem, por si só, esses objetivos.

    84

    Tendo em conta as considerações precedentes, apenas podem ser invocados para justificar, no caso em apreço, as medidas em causa no processo principal, como razões imperiosas de interesse geral, os objetivos da boa gestão do transporte, do tráfego e do espaço público, por um lado, e o de proteção do ambiente, por outro.

    – Quanto à proporcionalidade das medidas em causa no processo principal

    85

    Quanto à questão de saber se estas medidas são adequadas para garantir, de forma coerente e sistemática, a realização dos objetivos referidos no n.o 83 do presente acórdão e não vão além do necessário para os alcançar, há que distinguir entre a exigência de uma segunda autorização para o exercício da atividade de serviços de TVDE e a limitação do número de licenças de serviços de TVDE a um trigésimo das licenças de serviços de táxi.

    – Quanto à proporcionalidade da exigência de uma segunda autorização

    86

    No que respeita à exigência de uma autorização específica para a prestação de serviços de TVDE na aglomeração de Barcelona, resulta de jurisprudência constante, antes de mais, que um regime de autorização administrativa prévia não pode legitimar um comportamento discricionário da parte das autoridades nacionais, suscetível de privar as disposições do direito da União, nomeadamente as relativas às liberdades fundamentais em causa no processo principal, do seu efeito útil (Acórdão de 22 de janeiro de 2002, Canal Satélite Digital,C‑390/99, EU:C:2002:34, n.o 35 e jurisprudência referida).

    87

    Por conseguinte, para que um regime de autorização administrativa prévia seja justificado mesmo que derrogue essas liberdades fundamentais, deve, de qualquer forma, ser fundamentado em critérios objetivos, não discriminatórios e conhecidos antecipadamente, de modo que enquadre o exercício do poder de apreciação das autoridades nacionais a fim de este não ser utilizado de modo arbitrário (Acórdão de 22 de janeiro de 2002, Canal Satélite Digital,C‑390/99, EU:C:2002:34, n.o 35 e jurisprudência referida).

    88

    Em seguida, não se pode considerar necessária para atingir o objetivo prosseguido uma medida criada por um Estado‑Membro que, essencialmente, se sobrepõe aos controlos que já foram efetuados no âmbito de outros processos, quer neste mesmo Estado‑Membro, quer noutro Estado‑Membro (v., neste sentido, Acórdão de 22 de janeiro de 2002, Canal Satélite Digital,C‑390/99, EU:C:2002:34, n.o 36).

    89

    Por último, um processo de autorização prévia só será necessário se for de considerar que um controlo a posteriori ocorreria demasiado tarde para garantir a efetiva eficácia deste e permitir‑lhe atingir o objetivo prosseguido (Acórdão de 22 de janeiro de 2002, Canal Satélite Digital,C‑390/99, EU:C:2002:34, n.o 39).

    90

    No caso em apreço, primeiro, é certo que a exigência de uma autorização prévia pode ser adequada para alcançar os objetivos da boa gestão do transporte, do tráfego e do espaço público, bem como da proteção do ambiente. Além disso, tendo em conta a natureza do serviço em causa, que implica a utilização de veículos de passageiros que, muitas vezes, não podem ser distinguidos de outros veículos dessa categoria, utilizados a título privado e, além disso, num vasto território urbano, pode considerar‑se que um controlo a posteriori ocorre demasiado tarde para garantir a sua eficácia real e para lhe permitir alcançar os objetivos prosseguidos. Daqui resulta que a exigência dessa autorização prévia pode ser considerada necessária na aceção da jurisprudência recordada no n.o 88 do presente acórdão.

    91

    No entanto, em conformidade com a jurisprudência recordada nos n.os 64 e 86 do presente acórdão, é ainda necessário que os critérios aplicáveis à concessão, à recusa e, se for caso disso, à revogação de licenças de serviços de TVDE sejam adequados para garantir, de forma coerente e sistemática, a realização desses objetivos, o que incumbe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar.

    92

    Segundo, uma vez que a P&L alega no Tribunal de Justiça, nomeadamente, que a autoridade administrativa competente se reserva, em função da situação do mercado, o direito de anular uma licença de serviços de TVDE, cabe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar, em especial, se o exercício do poder de apreciação conferido, em aplicação dos referidos critérios, a essa autoridade está suficientemente enquadrado, na aceção da jurisprudência recordada no n.o 86 do presente acórdão, para que este não seja exercido de forma arbitrária.

    93

    Em terceiro lugar, uma vez que a P&L sustenta, por outro lado, que a exigência de uma autorização específica para a prestação de serviços de TVDE na aglomeração de Barcelona duplica os procedimentos e exigências existentes impostos para a concessão da autorização nacional prevista para exercer essa atividade, o órgão jurisdicional de reenvio deve, em conformidade com a jurisprudência recordada no n.o 87 do presente acórdão, assegurar‑se de que os procedimentos instituídos para a concessão dessa autorização específica não se sobrepõem aos controlos já efetuados no âmbito desse outro processo no mesmo Estado‑Membro.

    94

    Ao examinar a necessidade da exigência dessa autorização específica, o órgão jurisdicional de reenvio deverá apreciar, nomeadamente, se as particularidades da aglomeração de Barcelona justificam a implementação desta exigência, que acresce à exigência relativa à obtenção da autorização nacional, para alcançar os objetivos de boa gestão do transporte, do tráfego e do espaço público, bem como de proteção do ambiente no seu seio.

    – Quanto à proporcionalidade da limitação das licenças de serviços de TVDE a um trigésimo das licenças de serviços de táxi

    95

    Como salientou o advogado‑geral nos n.os 80 e 81 das suas conclusões, o processo no Tribunal de Justiça não revelou nenhum elemento que permita demonstrar a adequação da medida de limitação das licenças de serviços de TVDE a um trigésimo das licenças de serviços de táxi para garantir a realização dos objetivos de boa gestão dos transportes, do tráfego e do espaço público, bem como de proteção do ambiente.

    96

    A este respeito, parece resultar tanto do ponto 9 do seu preâmbulo como da sistemática do RTVDE, conforme resulta, em especial, dos seus artigos 7.o e 9.o a 11.o, que a limitação das licenças de prestação de serviços de TVDE constitui o elemento‑chave através do qual este regulamento visa alcançar esses objetivos.

    97

    Ora, no âmbito do processo no Tribunal de Justiça, os argumentos apresentados, designadamente, pela P&L, a Tapoca VTC1 e a Comissão, segundo os quais

    os serviços de TVDE reduzem o recurso ao veículo privado;

    não é coerente invocar problemas de estacionamento nas vias públicas da AMB, quando o RTVDE exige às empresas que oferecem serviços de TVDE que disponham do seu próprio estacionamento e que não estacionem nas vias públicas;

    os serviços de TVDE podem contribuir para alcançar o objetivo de uma mobilidade eficiente e inclusiva, através do seu nível de digitalização e de flexibilidade na prestação de serviços, como uma plataforma tecnológica acessível aos invisuais, e

    a regulamentação estatal encoraja o recurso a veículos que utilizam energias alternativas para os serviços de TVDE;

    não foram contrariados pela AMB nem pelo Governo espanhol. Com efeito, em resposta a uma questão colocada pelo Tribunal de Justiça na audiência, este Governo indicou que não estava ao corrente da existência de nenhum estudo do impacto da frota de TVDE no transporte, no tráfego, no espaço público e no ambiente na aglomeração de Barcelona, nem de um estudo que visasse os efeitos da regulamentação introduzida pelo RTVDE na realização dos objetivos mencionados no n.o 94 do presente acórdão.

    98

    Por conseguinte, sem prejuízo de uma apreciação a efetuar pelo órgão jurisdicional de reenvio, incluindo à luz de eventuais elementos que não foram levados ao conhecimento do Tribunal de Justiça, a limitação das licenças de serviços de TVDE a um trigésimo das licenças de serviços de táxi não se afigura adequada para garantir a realização dos objetivos de boa gestão dos transportes, do tráfego e do espaço público.

    99

    Por outro lado, nenhum elemento dos autos de que dispõe o Tribunal de Justiça demonstra que essa limitação das licenças de serviços de TVDE não vai além do necessário para alcançar os referidos objetivos.

    100

    Com efeito, não se pode excluir que um eventual impacto da frota de TVDE no transporte, no tráfego e no espaço público na aglomeração de Barcelona possa ser adequadamente limitado por medidas menos restritivas, como medidas de organização dos serviços de TVDE, por limitações desses serviços durante determinados horários ou ainda por restrições de circulação em determinados espaços.

    101

    Do mesmo modo, não se pode excluir que o objetivo de proteção do ambiente na aglomeração de Barcelona possa ser alcançado através de medidas menos lesivas da liberdade de estabelecimento, como limites de emissão aplicáveis aos veículos que circulam nessa aglomeração.

    102

    No entanto, também aqui compete ao órgão jurisdicional de reenvio verificar se foi demonstrado perante si que os objetivos prosseguidos não podem ser alcançados por medidas menos restritivas.

    103

    Tendo em conta todas as considerações precedentes, há que responder às questões submetidas que o artigo 49.o TFUE

    não se opõe a uma regulamentação, aplicável numa aglomeração, que prevê não se opõe a uma regulamentação, aplicável a uma aglomeração, que prevê que seja exigida uma autorização específica para o exercício da atividade de serviços de aluguer de transporte individual e remunerado de passageiros em veículos descaracterizados a partir de plataforma eletrónica nessa aglomeração, que acresce à autorização nacional exigida para o mesmo tipo de prestação de serviços, se essa autorização específica se basear em critérios objetivos, não discriminatórios e conhecidos antecipadamente, que excluam toda e qualquer arbitrariedade e que não constituam uma sobreposição dos controlos já efetuados no âmbito do processo de autorização nacional, mas que satisfaçam as necessidades específicas dessa aglomeração;

    se opõe a uma regulamentação, aplicável numa aglomeração, que prevê uma limitação do número de licenças de serviços de aluguer de veículos com motorista a um trigésimo das licenças de serviços de táxi concedidas para a referida aglomeração, quando não tenha sido demonstrado que esta medida é adequada para garantir, de forma coerente e sistemática, a realização dos objetivos de boa gestão do transporte, do tráfego e do espaço público dessa aglomeração, bem como de proteção do seu ambiente, nem que essa medida não vai além do necessário para alcançar esses objetivos.

    Quanto às despesas

    104

    Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

     

    Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Primeira Secção) declara:

     

    1)

    O artigo 107.o, n.o 1, TFUE não se opõe a uma regulamentação, aplicável a uma aglomeração, que prevê, por um lado, que seja exigida uma autorização específica para o exercício da atividade de serviços de aluguer de transporte individual e remunerado de passageiros em veículos descaracterizados a partir de plataforma eletrónica nessa aglomeração, que acresce à autorização nacional exigida para o mesmo tipo de prestação de serviços, e, por outro, que o número de autorizações desses serviços esteja limitado a um trigésimo das licenças de serviços de táxi concedidas para a referida aglomeração, desde que essas medidas não sejam suscetíveis de implicar uma afetação de recursos estatais na aceção desta disposição.

     

    2)

    O artigo 49.o TFUE não se opõe a uma regulamentação, aplicável a uma aglomeração, que prevê que seja exigida uma autorização específica para o exercício da atividade de serviços de aluguer de transporte individual e remunerado de passageiros em veículos descaracterizados a partir de plataforma eletrónica nessa aglomeração, que acresce à autorização nacional exigida para o mesmo tipo de prestação de serviços, se essa autorização específica se basear em critérios objetivos, não discriminatórios e conhecidos antecipadamente, que excluam toda e qualquer arbitrariedade e que não constituam uma sobreposição dos controlos já efetuados no âmbito do processo de autorização nacional, mas que satisfaçam as necessidades específicas dessa aglomeração.

     

    3)

    O artigo 49.o TFUE opõe‑se a uma regulamentação, aplicável numa aglomeração, que prevê uma limitação do número de licenças de serviços de aluguer de veículos com motorista a um trigésimo das licenças de serviços de táxi concedidas para a referida aglomeração, quando não tenha sido demonstrado que esta medida é adequada para garantir, de forma coerente e sistemática, a realização dos objetivos de boa gestão do transporte, do tráfego e do espaço público dessa aglomeração, bem como de proteção do seu ambiente, nem que essa medida não vai além do necessário para alcançar esses objetivos.

     

    Assinaturas


    ( *1 ) Língua do processo: espanhol.

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