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Document 62021CC0626

Conclusões da advogada-geral T. Ćapeta apresentadas em 1 de dezembro de 2022.
Funke Sp. z o.o. contra Landespolizeidirektion Wien.
Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Verwaltungsgerichtshof.
Reenvio prejudicial — Aproximação das legislações — Diretiva 2001/95/CE — Artigo 12.o e anexo II — Normas e regulamentações técnicas — Sistema de Troca Rápida de Informação da União Europeia (RAPEX) — Orientações — Produtos não alimentares perigosos — Decisão de Execução (UE) 2019/417 — Regulamento (CE) n.o 765/2008 — Artigos 20.o e 22.o — Notificações à Comissão Europeia — Decisão administrativa — Proibição de venda de certos artigos pirotécnicos e a obrigação de retirada — Pedido de um distribuidor dos produtos em questão de completar as notificações — Autoridade competente para decidir sobre o pedido — Artigo 47.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia — Proteção jurisdicional efetiva.
Processo C-626/21.

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2022:954

 CONCLUSÕES DA ADVOGADA‑GERAL

TAMARA ĆAPETA

apresentadas em 1 de dezembro de 2022 ( 1 )

Processo C‑626/21

Funke Sp. z o.o.

sendo interveniente:

Landespolizeidirektion Wien

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Verwaltungsgerichtshof (Supremo Tribunal Administrativo, Áustria)]

«Reenvio prejudicial — Aproximação de disposições legislativas — Diretiva 2001/95/CE — Segurança geral dos produtos — Sistema de Troca Rápida de Informação da União Europeia (RAPEX) sobre produtos não alimentares perigosos — Decisão de execução (UE) 2019/417 — Orientações RAPEX — Regulamento (CE) n.o 765/2008 — Fiscalização do mercado — Diretiva 2013/29/UE — Colocação no mercado de produtos pirotécnicos — Direito de um operador económico a que seja completada uma notificação RAPEX — Artigo 34.o TFUE — Livre circulação de mercadorias — Medida de efeito equivalente a uma restrição quantitativa»

I. Introdução

1.

A circulação de mercadorias facilitada pelo mercado interno implica que produtos perigosos possam facilmente chegar aos consumidores em vários Estados‑Membros. A fim reagir a tais situações, a União Europeia instituiu o sistema RAPEX ( 2 ) — a sua versão de «três nuvens enviadas por sinais de fumo» ( 3 ).

2.

Em suma, no âmbito do sistema RAPEX, um Estado‑Membro que detete que um produto perigoso foi colocado no seu mercado, notifica os outros Estados‑Membros através da Comissão Europeia. O caso em apreço tem por objeto o referido sistema e, mais especificamente, os direitos dos operadores económicos de intervirem nesse sistema se os bens sobre os quais incide o comércio são objeto dessa notificação.

3.

Os produtos em causa no presente processo são foguetes, nomeadamente, petardos que produzem ruído, importados para a União a partir da China pela Funke Sp. z o.o., recorrente no processo principal. Foram vendidos através de diferentes distribuidores em vários Estados‑Membros, entre os quais a Áustria.

II. Matéria de facto no processo principal, questões prejudiciais e tramitação processual no Tribunal de Justiça

4.

O presente processo tem origem num pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Verwaltungsgerichtshof (Supremo Tribunal Administrativo, Áustria).

5.

Resulta do despacho de reenvio que, durante uma fiscalização do mercado levada a cabo pela Landespolizeidirektion Wien (Direção de Polícia Estadual de Viena, Áustria, a seguir «LPD»), ao abrigo da legislação austríaca aplicável ( 4 ), relativamente a um distribuidor de produtos pirotécnicos, verificou‑se que os petardos detidos em stock por esse distribuidor não apresentavam condições de segurança para serem manipulados pelos consumidores. A LPD impôs a proibição de venda desses produtos pelo distribuidor em causa e ordenou a sua recolha do mercado (a seguir «medidas administrativas de que o distribuidor é destinatário»).

6.

Em seguida, a LPD, na qualidade de entidade competente em matéria de fiscalização do mercado na Áustria para esse tipo de produtos, deu início a um processo de notificação RAPEX. Através do Ponto de Contacto nacional RAPEX, a LPD apresentou em separado três notificações (a seguir «notificações RAPEX»). Após verificação, a Comissão transmitiu essas notificações aos Estados‑Membros.

7.

A Funke Sp. z o.o. (a seguir «Funke»), uma sociedade com sede na Polónia, é a importadora dos petardos abrangidos pelas notificações RAPEX.

8.

A Funke considerou que tais notificações transmitidas através do RAPEX não descreviam corretamente os produtos que foram objeto das medidas administrativas de que o distribuidor é destinatário. Por requerimento de 30 de abril de 2020, a Funke pediu, assim, à LPD que fossem completadas as notificações RAPEX através dos números de lote dos produtos em causa. Conforme explicado na audiência no Tribunal de Justiça, por este meio, pediu efetivamente que fosse indicado o ano de produção (2017) dos petardos em questão ( 5 ). Além disso, a Funke pediu que lhe fosse concedido acesso aos autos do processo de notificação RAPEX, especialmente no que se refere à avaliação do risco dos produtos objeto dessas notificações.

9.

Em 29 de junho de 2020, a LPD indeferiu os pedidos da Funke por inadmissibilidade, alegando que a Funke não era considerada parte no processo. A Funke interpôs recurso.

10.

Conforme resulta do despacho de reenvio, o Verwaltungsgericht Wien (Tribunal Administrativo de Viena, Áustria) julgou improcedentes os pedidos da Funke. Segundo este órgão jurisdicional, as notificações no RAPEX não são decisões administrativas, mas atos materiais (meras ações administrativas). Em conformidade com o direito austríaco, só pode interpor recurso de um ato de uma autoridade administrativa, com base em ilegalidade, para um tribunal administrativo, quem alegar que esse ato viola os seus direitos. Todavia, o referido órgão jurisdicional considerou que o ordenamento jurídico não conferiu aos operadores económicos, como a Funke, um direito a que sejam completadas as notificações RAPEX ou um direito de acesso aos autos. Esse órgão jurisdicional considerou igualmente que não há nada na legislação aplicável da União que permita concluir que a Funke dispõe de tais direitos ou do direito de intervir como parte no processo de notificação RAPEX.

11.

O recurso interposto pela Funke dessa decisão no Verfassungsgerichtshof (Tribunal Constitucional, Áustria) foi remetido ao Verwaltungsgerichtshof (Supremo Tribunal Administrativo), que é o órgão jurisdicional de reenvio no presente processo.

12.

O órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se quanto a saber se o direito da União pertinente em matéria de RAPEX confere diretamente a um operador económico o direito de pedir que a notificação RAPEX seja completada e que lhe seja concedida uma suficiente proteção jurisdicional perante uma medida que o afete em virtude de uma notificação RAPEX. Segundo este órgão jurisdicional, um operador económico não dispõe do direito de pedir que seja completada uma notificação RAPEX que, na sua opinião, não está completa, mas sim que o processo de notificação RAPEX decorra exclusivamente entre a Comissão e as autoridades dos Estados‑Membros, não sendo atribuídos aos operadores económicos direitos autónomos a este respeito.

13.

No entanto, se tal direito existir efetivamente, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber qual a autoridade competente para decidir o pedido de um operador económico no sentido de que seja completada uma notificação RAPEX. Considera que algumas disposições do direito da União apontam no sentido de que são as autoridades do Estado‑Membro que têm competência para decidir tais pedidos (uma vez que essas autoridades são responsáveis pelas informações prestadas), enquanto outras militam a favor da competência da Comissão (uma vez que a Comissão verifica se as notificações RAPEX estão exatas e completas).

14.

O órgão jurisdicional de reenvio questiona ainda se as medidas administrativas de que o distribuidor é destinatário (e não a Funke enquanto importadora) devem ser consideradas o ponto de partida do processo de notificação RAPEX. Se os dois processos forem considerados um só, poderá ser reconhecido ao distribuidor um direito de recurso contra a notificação. Contudo, tal continuaria a não conferir direitos a um importador que não fosse destinatário da decisão administrativa inicial, como é o caso da Funke. O órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se tal proteção jurisdicional é suficiente à luz do direito da União.

15.

Nestas condições, o Verwaltungsgerichtshof (Supremo Tribunal Administrativo) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«‑ A Diretiva 2001/95/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 3 de dezembro de 2001, relativa à segurança geral dos produtos, [(JO 2002, L 11, p. 4)], na versão do Regulamento (CE) n.o 765/2008 [do Parlamento Europeu e do Conselho, de 9 de julho de 2008 (JO 2008, L 218, p. 30)], e do Regulamento (CE) n.o 596/2009 [do Parlamento Europeu e do Conselho de 18 de junho de 2009 (JO 2009, L 188, p. 14)], especialmente o seu artigo 12.o e o seu anexo II,

‑ O Regulamento (CE) n.o 765/2008 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 9 de julho de 2008, que estabelece os requisitos de acreditação e fiscalização do mercado relativos à comercialização de produtos, e que revoga o Regulamento (CEE) n.o 339/93 [(JO 2008, L 218, p. 30)], especialmente os seus artigos 20.o e 22.o, e ainda

‑ A Decisão de Execução (UE) 2019/417 da Comissão, de 8 de novembro de 2018, que estabelece orientações para a gestão do Sistema de Troca Rápida de Informação da União Europeia (RAPEX), estabelecido ao abrigo do artigo 12.o da Diretiva 2001/95/CE relativa à segurança geral dos produtos e do seu sistema de notificação [(JO 2019, L 73, p. 121)]

devem ser interpretados no sentido de que:

1.

resulta diretamente das suas disposições o direito dos operadores económicos de que sejam completadas as notificações RAPEX?

2.

a [Comissão] Europeia tem competência para decidir um pedido nesse sentido?

ou

3.

as autoridades dos Estados‑Membros são competentes para decidir tal pedido?

Em caso de resposta afirmativa à questão 3:

4.

A proteção jurisdicional (nacional) contra tal decisão é suficiente se for concedida, não a todos, mas apenas ao operador económico afetado pela medida (coerciva) e contra essa medida (coerciva)?»

16.

Foram apresentadas observações escritas ao Tribunal de Justiça pela Funke, pelo Governo austríaco e pela Comissão. Estas partes apresentaram alegações orais na audiência que teve lugar em 21 de setembro de 2022.

III. Direito aplicável

17.

O órgão jurisdicional de reenvio pretende obter a interpretação dos seguintes atos de direito da União relativos ao RAPEX, aos quais me irei referir conjuntamente como «direito da União aplicável em matéria de RAPEX»:

Diretiva 2001/95 (a seguir «Diretiva Segurança Geral dos Produtos») ( 6 );

Regulamento (CE) n.o 765/2008 que estabelece os requisitos de acreditação e fiscalização do mercado relativos à comercialização de produtos (a seguir «Regulamento de Fiscalização do Mercado») ( 7 ); e

Decisão de Execução (UE) 2019/417 que estabelece orientações para a gestão do RAPEX (a seguir «Orientações RAPEX») ( 8 ).

18.

As respetivas disposições passaram a ser aplicáveis aos petardos em causa no presente processo por força da Diretiva 2013/29/UE relativa aos artigos de pirotecnia (a seguir «Diretiva Pirotecnia») ( 9 ).

19.

Como a minha análise irá demonstrar, as disposições do Tratado relativas à livre circulação de mercadorias também são aplicáveis no caso em apreço.

IV. Análise

20.

As questões prejudiciais submetidas no âmbito do presente processo decorrem das especificidades do direito administrativo austríaco. Conforme referiu o Governo austríaco na audiência, considera‑se que constitui «ato administrativo» a resposta da autoridade administrativa ao pedido de um interessado que disponha de um direito em relação a essa autoridade. Em tal caso, o interessado tem igualmente o direito de interpor recurso num tribunal administrativo da decisão através da qual a autoridade administrativa respondeu ao seu pedido. Pelo contrário, se o interessado não beneficia de um direito, a resposta da autoridade administrativa não é considerada ato administrativo e não é suscetível de recurso jurisdicional.

21.

Assim, com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber, em substância, se um operador económico, como a Funke na qualidade de parte no processo, dispõe, ao abrigo do direito da União aplicável, do direito de apresentar um pedido no sentido de ser completada a notificação RAPEX. Com a segunda e terceira questões, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se a autoridade responsável pela exatidão das informações é a autoridade do Estado‑Membro ou a Comissão. Se se verificar que um operador económico tem o direito de pedir à autoridade do Estado‑Membro que sejam completadas as notificações RAPEX, então o indeferimento do pedido da Funke, por parte da LPD, no sentido de as notificações RAPEX serem completadas, está sujeito à fiscalização dos tribunais administrativos austríacos.

22.

A quarta questão prejudicial é menos clara. Uma vez que o processo de notificação RAPEX no caso vertente foi desencadeado pelas medidas administrativas de que o distribuidor é destinatário, o órgão jurisdicional de reenvio parece considerar que o direito de pedir que seja completada uma notificação RAPEX pode ser reconhecido ao distribuidor, mas não à Funke. Contudo, interroga‑se se tal proteção jurisdicional seria suficiente ao abrigo do direito da União ou se o acesso aos tribunais deveria ser concedido a outros operadores económicos interessados, incluindo importadores. A fim de dar uma resposta útil ao órgão jurisdicional de reenvio ( 10 ), irei abordar esta questão no sentido de saber se o direito da União impõe aos Estados‑Membros a obrigação de conceder o acesso aos tribunais aos operadores económicos interessados, como a Funke, contra uma notificação RAPEX ( 11 ).

23.

É a primeira vez que o Tribunal de Justiça é chamado a interpretar as disposições do direito da União relativas ao RAPEX. Irei, portanto, começar por tecer algumas considerações preliminares sobre o RAPEX e o funcionamento do seu procedimento de notificação (A). Em seguida, irei responder à segunda e à terceira questões submetidas, explicando que o direito da União aplicável em matéria de RAPEX atribui a responsabilidade pela exatidão das informações constantes das notificações RAPEX à autoridade do Estado‑Membro (B). Contudo, essa mesma legislação não contempla a possibilidade de os operadores económicos serem considerados partes no processo de notificação RAPEX. Por conseguinte, na minha opinião, o direito de um operador económico pedir que uma notificação RAPEX seja completada não pode ter por base o direito da União aplicável em matéria de RAPEX (C). Tal não significa que o operador, numa situação como a do presente processo, seja privado, ao abrigo do direito da União, de meios de tutela jurisdicional contra uma notificação incompleta. Irei defender que uma notificação RAPEX que não esteja completa pode, do ponto de vista de um operador económico, constituir um entrave ao comércio no mercado interno. Por esta razão, o direito de pedir que uma notificação RAPEX seja completada pode decorrer das disposições do Tratado relativas à livre circulação de mercadorias (D). Por fim, abordarei as consequências que decorrem dessa conclusão para o órgão jurisdicional de reenvio (E).

A.   RAPEX e procedimento de notificação

24.

Em termos gerais, o RAPEX, como o próprio nome indica, é um sistema instituído pelo direito da União para a troca rápida de informação entre os Estados‑Membros ( 12 ) e a Comissão no que diz respeito a produtos perigosos não alimentares ( 13 ). Teve origem num conjunto de decisões do Conselho adotadas a partir da década de 1980 ( 14 ). Este sistema foi posteriormente introduzido na Diretiva 92/59/CEE relativa à segurança geral dos produtos ( 15 ), que antecedeu a Diretiva Segurança Geral dos Produtos.

25.

O número de notificações enviadas através do RAPEX aumentou progressivamente ao longo dos anos ( 16 ). Em 2021, foram divulgadas 2.142 notificações e 4.965 notificações de acompanhamento através do RAPEX ( 17 ).

26.

Conforme mencionado, o direito da União aplicável em matéria de RAPEX compreende atualmente a Diretiva Segurança Geral dos Produtos ( 18 ), o Regulamento de Fiscalização do Mercado ( 19 ) e as Orientações RAPEX ( 20 ). Todos estes atos têm por base o artigo 114.o TFUE.

27.

O RAPEX visa essencialmente a troca de informações entre os Estados‑Membros e a Comissão em situações que exijam uma intervenção rápida no mercado de um produto (não alimentar) ( 21 ). Tem por objetivo prevenir acidentes, alertando as autoridades de fiscalização competentes noutros Estados‑Membros para a existência de produtos potencialmente perigosos ( 22 ). O RAPEX desempenha um papel importante no domínio da segurança dos produtos e, sobretudo, previne e restringe o fornecimento de produtos perigosos que representam um risco grave para a saúde e a segurança dos consumidores, contribuindo assim para assegurar o bom funcionamento do mercado interno e um elevado nível de proteção do consumidor ( 23 ).

28.

O próprio RAPEX é constituído por vários elementos, entre os quais o quadro jurídico que regula o modo como o sistema funciona (a saber, a Diretiva Segurança Geral dos Produtos e as Orientações RAPEX); a aplicação em linha RAPEX que permite aos Estados‑Membros e à Comissão trocar informações rapidamente; os Pontos de Contacto RAPEX nacionais responsáveis pelo funcionamento do RAPEX nos Estados‑Membros; e o sítio Web RAPEX ( 24 ), que disponibiliza resumos das notificações RAPEX, bem como atualizações semanais ao público em geral ( 25 ).

29.

O RAPEX funciona em três fases ( 26 ). Em primeiro lugar, existe a fase de notificação, na qual as autoridades competentes de um Estado‑Membro criam uma notificação, que é então transmitida através do ponto de contacto nacional RAPEX à Comissão. Em segundo lugar, há a fase de validação e distribuição, na qual a Comissão verifica todas as notificações a fim de assegurar que estão exatas e completas antes de as transmitir aos Estados‑Membros, e procede à sua publicação no sítio Web RAPEX. Em terceiro lugar, existe a fase de acompanhamento na qual os Estados‑Membros, ao receberem uma notificação RAPEX, examinam as informações nela prestadas e tomam as medidas adequadas, as quais são igualmente notificadas à Comissão ( 27 ).

30.

Nos termos do artigo 12.o da Diretiva Segurança Geral dos Produtos e do artigo 22.o do Regulamento de Fiscalização do Mercado, os Estados‑Membros devem enviar uma notificação RAPEX à Comissão quando estiverem reunidas as quatro seguintes condições ( 28 ). Em primeiro lugar, o produto encontra‑se abrangido pelo âmbito de aplicação da Diretiva Segurança Geral dos Produtos ou do Regulamento de Fiscalização do Mercado. Em segundo lugar, o produto foi sujeito a medidas destinadas a impedir, limitar ou subordinar a condições específicas a sua eventual comercialização ou utilização, que podem ser tomadas por iniciativa de um operador económico (medidas voluntárias) ou conforme decretadas pelas autoridades competentes do Estado‑Membro (medidas compulsivas), como no caso em apreço ( 29 ). Em terceiro lugar, o produto apresenta um risco grave para a saúde e a segurança dos consumidores ou, no caso do Regulamento de Fiscalização do Mercado, para outros interesses públicos pertinentes. Em quarto lugar, o risco grave transpõe o território do Estado‑Membro notificante e, por conseguinte, tem efeitos transfronteiriços ( 30 ).

31.

Mais especificamente, no que respeita ao caso em apreço, é possível distinguir vários aspetos relativos ao procedimento de notificação RAPEX. Em primeiro lugar, verificando‑se, no âmbito da fiscalização do mercado, a existência de um produto que apresente um risco grave e exija uma intervenção rápida, as autoridades competentes de um Estado‑Membro devem proceder à sua recolha, retirada ou proibição do mercado ( 31 ).

32.

Em segundo lugar, quando um Estado‑Membro toma tal medida ou pretende fazê‑lo, deve avaliar se as razões que motivaram a medida ou os efeitos da mesma transpõem o seu território ( 32 ). O Estado‑Membro deve igualmente avaliar se o produto apresenta um risco grave, o que implica efetuar uma avaliação dos riscos antes de decidir apresentar uma notificação RAPEX ( 33 ).

33.

Em terceiro lugar, se estiverem reunidas as condições para uma notificação RAPEX, o Estado‑Membro deve notificar «imediatamente» a Comissão ( 34 ). O Estado‑Membro notificante comunica todas as informações disponíveis, incluindo, em especial, informações que possibilitem a identificação do produto ( 35 ). Uma notificação RAPEX, criada pelas autoridades competentes do Estado‑Membro ( 36 ), é apresentada através de um formulário normalizado de notificação, conforme previsto nas Orientações RAPEX ( 37 ). Cada Estado‑Membro deve estabelecer um único ponto de contacto RAPEX responsável pelo funcionamento do sistema RAPEX a nível nacional ( 38 ). O ponto de contacto nacional RAPEX verifica e valida a exaustividade das informações recebidas das autoridades competentes antes de transmitir uma notificação RAPEX à Comissão ( 39 ).

34.

A este respeito, as notificações RAPEX devem conter vários tipos de dados, nomeadamente informações que permitam a identificação do produto notificado. Tal tem por base o raciocínio segundo o qual «[a] identificação detalhada e exata do produto é um elemento crucial para fins de vigilância e fiscalização do mercado, permitindo às autoridades nacionais identificar o produto notificado, diferenciá‑lo de produtos de tipo ou categoria igual ou semelhante presentes no mercado, bem como encontrá‑lo no mercado e tomar ou decidir as medidas apropriadas» ( 40 ). Para este efeito, conforme sublinhado nas Orientações RAPEX, as notificações devem ser o mais completas possível e todos os campos do formulário de notificação devem ser preenchidos com os dados requeridos. Se estes dados não estiverem disponíveis quando do envio da notificação, tal deve ser claramente indicado e explicado, e assim que as informações estiverem disponíveis, o Estado‑Membro notificante deve atualizar a sua notificação ( 41 ). Segundo o formulário de notificação definido nas Orientações RAPEX, certas informações relativas ao produto — entre as quais o tipo/número do modelo, o número do lote/código de barras e a descrição do produto e da embalagem — são consideradas campos obrigatórios, o que significa que, em princípio, devem ser preenchidos ( 42 ).

35.

Nos termos da Diretiva Segurança Geral dos Produtos, o Estado‑Membro notificante é responsável pelas informações fornecidas ( 43 ). Por este motivo, as Orientações RAPEX exigem que «o Estado‑Membro notificante e a autoridade nacional responsável assegur[em] que os dados fornecidos através da aplicação RAPEX são exatos, a fim de evitar qualquer confusão entre produtos semelhantes da mesma categoria ou do mesmo tipo que estejam disponíveis no mercado da [União]» ( 44 ).

36.

Em quarto lugar, no âmbito do processo de notificação RAPEX, a Comissão é essencialmente a «plataforma central» ( 45 ) ou o «distribuidor de mensagens» ( 46 ) entre os Estados‑Membros. Deve, «com a maior brevidade possível», verificar todas as notificações RAPEX antes de as transmitir aos restantes Estados‑Membros a fim de assegurar que estão exatas e completas ( 47 ). No que respeita à exaustividade, presta‑se especial atenção às partes de uma notificação RAPEX que dizem respeito à identificação do produto ( 48 ). A Comissão publica igualmente resumos das notificações RAPEX no sítio Web RAPEX, a fim de informar o público sobre os produtos que apresentam riscos graves ( 49 ). As orientações RAPEX referem que qualquer ação realizada pela Comissão, como a análise das notificações, a sua validação e distribuição através da aplicação RAPEX e a sua publicação no sítio RAPEX, não implica qualquer responsabilidade pelas informações transmitidas, que permanecem do Estado‑Membro notificante ( 50 ).

37.

Por último, após a receção de uma notificação RAPEX, os restantes Estados‑Membros devem assegurar o acompanhamento adequado ( 51 ). Devem examinar as informações prestadas numa notificação RAPEX e tomar as medidas apropriadas para determinar se o produto foi de facto comercializado no seu território, avaliar quais as medidas preventivas ou restritivas que devem ser tomadas, realizar uma avaliação do risco adicional e ensaios, se necessário, e recolher eventuais informações adicionais que possam ser relevantes para outros Estados‑Membros (por exemplo, informações sobre os canais de distribuição do produto) ( 52 ). Os Estados‑Membros notificam a seguir a Comissão das suas constatações e medidas resultantes dessas atividades sob a forma de notificações de acompanhamento ( 53 ).

38.

É à luz destas considerações que há que analisar as questões submetidas no presente processo.

B.   Responsabilidade pela exatidão das informações constantes das notificações RAPEX

39.

Nos termos do direito da União aplicável em matéria de RAPEX, o Estado‑Membro notificante é responsável pelas informações prestadas numa notificação RAPEX e deve assegurar a sua exatidão (v. n.os 33 a 36 das presentes conclusões).

40.

Simultaneamente, o ponto 5 do anexo II da Diretiva Segurança Geral dos Produtos atribui alguma responsabilidade à Comissão, ao dispor que esta deve verificar, «com a maior brevidade possível», todas as notificações RAPEX a fim de assegurar que estão exatas e completas (v. n.o 36 das presentes conclusões). No entanto, como referido pelo Governo austríaco e pela Comissão, é evidente que se trata, em geral, de uma verificação formal que não substitui a responsabilidade principal do Estado‑Membro notificante de assegurar a exaustividade de uma notificação RAPEX ( 54 ).

41.

O Estado‑Membro notificante continua a ser responsável pelos dados notificados desde que a notificação RAPEX relativa a determinados produtos se encontre no sistema e deve informar a Comissão de quaisquer desenvolvimentos que requeiram alterações numa notificação RAPEX ( 55 ). Além disso, uma vez que o Estado‑Membro notificante assume toda a responsabilidade pelas informações transmitidas através do RAPEX, uma eventual retirada permanente ou temporária de uma notificação RAPEX só pode ocorrer a pedido desse Estado ( 56 ).

42.

Tudo isto indica que o legislador da União pretendia atribuir a responsabilidade primária pela exatidão das informações notificadas através do RAPEX, incluindo a responsabilidade pela exaustividade das informações sobre o produto em causa, ao Estado‑Membro notificante. Proponho, portanto, que o Tribunal de Justiça responda neste sentido à segunda e à terceira questões submetidas.

C.   Direito de pedir que uma notificação RAPEX seja completada ao abrigo do direito da União aplicável em matéria de RAPEX

43.

Na hipótese de o Estado‑Membro notificante ser responsável pela exatidão das informações notificadas, coloca‑se a questão de saber se os operadores económicos interessados, no âmbito do procedimento de notificação RAPEX, dispõem do direito de pedir às autoridades competentes do Estado‑Membro que uma notificação RAPEX seja completada.

44.

Segundo os argumentos aduzidos pela Funke, esse direito pode decorrer do direito da União aplicável em matéria de RAPEX. O Governo austríaco e a Comissão discordam.

45.

É pacífico que não existe nenhuma disposição do direito da União relativa ao RAPEX que preveja expressamente tal direito.

46.

Considero que não decorre do direito da União aplicável em matéria de RAPEX, incluindo das disposições a que o órgão jurisdicional de reenvio faz referência nas suas questões, a existência de um direito de participação no procedimento de notificação RAPEX, que permitiria a um operador económico apresentar um pedido no sentido de ser completada uma notificação RAPEX.

47.

Resulta do direito da União aplicável em matéria de RAPEX que, como referido pelo Governo austríaco e pela Comissão, o procedimento de notificação RAPEX é concebido como um procedimento que envolve a participação das autoridades competentes dos Estados‑Membros e da Comissão. Por força da Diretiva Segurança Geral dos Produtos (artigo 12.o) e do Regulamento de Fiscalização do Mercado (artigo 22.o), um Estado‑Membro deve notificar imediatamente a Comissão através do sistema RAPEX sempre que adote ou decida adotar medidas voluntárias ou compulsivas destinadas a impedir, limitar ou sujeitar a condições específicas a comercialização de produtos que apresentem um risco grave (v. n.os 30 e 33 das presentes conclusões).

48.

É possível que as informações relativas a produtos que representem um risco sejam apresentadas pelos operadores económicos através de uma ferramenta específica [Product Safety Business Alert Gateway (Portal de Alerta para as Empresas sobre Segurança dos Produtos)] no sítio Web RAPEX. No entanto, as avaliações do risco efetuadas pelos operadores económicos não são vinculativas para as autoridades nacionais, as quais são responsáveis pela realização da sua própria avaliação de risco podendo, por conseguinte, chegar a uma conclusão diferente ( 57 ). A este respeito, as Orientações RAPEX indicam claramente que os operadores económicos não estão diretamente envolvidos na apresentação de notificações RAPEX ( 58 ), mesmo que possam estar indiretamente envolvidos até certo ponto. Os operadores económicos devem informar imediatamente as autoridades competentes de todos os Estados‑Membros em cujos mercados o produto tenha sido disponibilizado, caso verifiquem que o mesmo apresenta um risco. No entanto, a notificação RAPEX dessas informações, que obriga todos os Estados‑Membros a dar resposta, é trocada entre os Estados‑Membros e a Comissão.

49.

Por conseguinte, parece‑me que o direito da União aplicável em matéria de RAPEX, seja no que diz respeito à Diretiva Segurança Geral dos Produtos, seja no referente ao Regulamento de Fiscalização do Mercado ou às Orientações RAPEX (ou de outra forma ( 59 )), não foi concebido com o objetivo de considerar que os operadores económicos são partes que dispõem de certos direitos no âmbito do procedimento de notificação RAPEX.

50.

Observo que, conforme salienta a doutrina, existem efetivamente sistemas da União de troca de informação no âmbito dos quais a legislação aplicável concede expressamente aos interessados o direito de pedir a retificação das informações ( 60 ). No entanto, considero que o RAPEX não é, atualmente, um deles.

51.

Por conseguinte, para responder à primeira questão prejudicial, considero que o direito de um operador económico pedir às autoridades competentes do Estado‑Membro que seja completada uma notificação RAPEX não pode ser inferido do direito da União aplicável em matéria de RAPEX.

52.

Posto isto, sou de opinião que os operadores económicos que sejam lesados por uma notificação RAPEX incompleta não ficam sem proteção jurídica no ordenamento jurídico da União. O seu direito de pedir que uma notificação RAPEX seja completada decorre das disposições do Tratado que proíbem os Estados‑Membros de impor obstáculos desproporcionados ao comércio.

D.   Direito de pedir que uma notificação RAPEX seja completada com base nos Tratados

1. Notificação RAPEX incompleta como entrave ao comércio

53.

Considero que uma notificação RAPEX incompleta pode, do ponto de vista de um operador económico, como a Funke, constituir uma medida de efeito equivalente a uma restrição quantitativa (a seguir «medida de efeito equivalente»), caso inviabilize a possibilidade, para esse operador, de colocar produtos objeto de comercialização por parte desse operador nos mercados de outros Estados‑Membros.

54.

A livre circulação de mercadorias entre Estados‑Membros é um princípio fundamental do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, que encontra expressão, entre outros, na proibição enunciada no artigo 34.o (e do artigo 35.o) TFUE, de restrições quantitativas à importação (e exportação) entre os Estados‑Membros, bem como de todas as medidas de efeito equivalente ( 61 ).

55.

É jurisprudência constante que os artigos 34.o e 35.o TFUE têm efeito direto na medida em que criam direitos suscetíveis de proteção jurisdicional na esfera jurídica dos operadores económicos em relação aos Estados‑Membros ( 62 ).

56.

Por conseguinte, se uma notificação RAPEX que não esteja completa pode ser qualificada de medida de efeito equivalente, um operador económico, como a Funke, tem, diretamente ao abrigo dos Tratados, um direito, invocável nos tribunais, de mediante o qual pode pedir que tal medida não se aplique à sua atividade comercial. Uma notificação RAPEX incompleta pode deixar de constituir uma medida de efeito equivalente ao ser completada. Consequentemente, um operador económico pode retirar diretamente dos Tratados o direito de pedir que seja completada uma notificação RAPEX.

57.

Quando questionados sobre este ponto na audiência, o Governo austríaco e a Comissão consideraram que uma notificação RAPEX não pode ser qualificada de medida de efeito equivalente. A Funke defendeu a tese contrária, alegando que foram precisamente as notificações RAPEX que conduziram à violação direta do seu direito, enquanto operador económico, de vender os seus produtos nos mercados de outros Estados‑Membros. A este respeito, a Funke explicou que não pode vender os produtos indevidamente abrangidos pelas notificações RAPEX e que, em virtude da publicação no sítio Web RAPEX, os consumidores são influenciados no sentido de não adquirir esses produtos.

58.

Recorde‑se que, desde o Acórdão Dassonville ( 63 ), é jurisprudência constante que a proibição de medidas de efeito equivalente visa qualquer medida dos Estados‑Membros suscetível de entravar, direta ou indiretamente, efetiva ou potencialmente, o comércio no interior da União.

59.

Consequentemente, não só as medidas adotadas por um Estado‑Membro que tenham por objeto ou por efeito tratar menos favoravelmente os produtos provenientes de outros Estados‑Membros, mas também qualquer outra medida que entrave o acesso ao mercado de um Estado‑Membro dos produtos originários de outro Estado‑Membro deve ser considerada uma medida de efeito equivalente na aceção do artigo 34.o TFUE ( 64 ).

60.

O comércio de produtos seguros que sejam injustificadamente abrangidos por uma notificação RAPEX incompleta pode sofrer entraves. É precisamente por isso que a legislação pertinente da União impõe que os dados notificados sejam tão exatos e completos quanto possível (v. n.os 33 e 34 das presentes conclusões). Esta obrigação que recai sobre as autoridades nacionais permite às autoridades nacionais de outros Estados‑Membros, bem como aos operadores económicos e aos consumidores, identificar o produto que se considera representar um risco e distingui‑lo de outros produtos semelhantes no mercado, de modo a evitar que sejam colocados entraves ao comércio de produtos seguros.

61.

No presente processo, a simples possibilidade de, devido a uma notificação incompleta transmitida pelas autoridades austríacas através do RAPEX, um operador económico de outro Estado‑Membro ser dissuadido de importar ou de comercializar os produtos erradamente incluídos nas notificações RAPEX constitui, a meu ver, uma restrição à livre circulação de mercadorias para um operador económico como a Funke ( 65 ).

62.

É certo que uma notificação RAPEX não constitui uma medida tipicamente controvertida nos processos relativos ao artigo 34.o TFUE. Por norma, o Tribunal de Justiça depara‑se com medidas tomadas pelo Estado‑Membro de importação. Tendo em conta as circunstâncias do caso em apreço, tal medida seria, por exemplo, tomada pelas autoridades alemãs, que, quando da receção das notificações RAPEX, proibiriam a venda de todos os petardos importados pela Funke no mercado alemão. Com efeito, a Funke indicou que as autoridades alemãs tomaram determinadas medidas, sem referir pormenores.

63.

Na minha opinião, mesmo não havendo nenhuma medida tomada pelas autoridades alemãs (como no exemplo supra), os operadores económicos alemães em causa (por exemplo, os distribuidores com os quais a Funke estabeleceu relações comerciais) poderiam decidir não importar os seus produtos para a Alemanha simplesmente devido às notificações RAPEX emitidas pelas autoridades austríacas. Da mesma forma, uma vez que as notificações RAPEX estão disponíveis ao público no sítio RAPEX, alguns consumidores podem decidir não comprar produtos importados pela Funke e distribuídos nos mercados dos diferentes Estados‑Membros, o que, por sua vez, é suscetível de provocar uma redução nas importações.

64.

O Governo austríaco e a Comissão consideram, contudo, que a mera possibilidade de as importações serem afetadas devido a uma notificação RAPEX incompleta é demasiado remota para permitir a sua qualificação como medida de efeito equivalente.

65.

A este propósito, recordo a jurisprudência constante segundo a qual a simples possibilidade de venda de um número menor de produtos em consequência de uma medida (ou ação) do Estado é suficiente para qualificá‑la como medida de efeito equivalente. Para dar um exemplo clássico, no Acórdão Comissão/Irlanda (campanha «Buy Irish») ( 66 ), o Tribunal de Justiça considerou que foram colocados entraves à livre circulação de mercadorias por uma campanha de marketing patrocinada pelo Governo irlandês que incentivava os seus cidadãos a adquirir produtos irlandeses, uma vez que ao influenciar a conduta de comerciantes e consumidores desse Estado‑Membro, o eventual efeito da campanha sobre as importações era comparável ao resultante de medidas de caráter vinculativo. Além disso, no Acórdão AGM‑COS.MET ( 67 ), considerou‑se que as declarações de um funcionário imputadas ao Estado, no sentido de que certos produtos eram perigosos e contrários aos requisitos da legislação aplicável em matéria de harmonização da União, constituíam um entrave, pelo menos indireta ou potencialmente, à colocação dos produtos no mercado e, portanto, ao comércio na aceção do artigo 34.o TFUE.

66.

Daqui decorre que uma notificação RAPEX que não esteja completa pode ser qualificada de medida de efeito equivalente.

2. Tutela jurisdicional efetiva contra supostas medidas de efeito equivalente

67.

Nem todos os entraves ao comércio são proibidos. Alguns são permitidos se houver um objetivo legítimo que os justifique e desde que a medida não seja desproporcionada em relação a esse objetivo.

68.

Embora a proteção da saúde e da segurança dos consumidores seja certamente um objetivo legítimo que justifica as notificações RAPEX, não justifica necessariamente as que não estejam completas. Enquanto uma notificação RAPEX exata impede danos à saúde e à segurança dos consumidores, uma notificação RAPEX incorreta pode obstar à colocação no mercado de produtos que não apresentem um risco grave. Considero, portanto, que uma notificação RAPEX incompleta pode constituir uma medida proibida de efeito equivalente se entravar de forma desproporcionada o comércio de produtos seguros erradamente incluídos na notificação.

69.

Diante dessa possibilidade, um operador económico deve ter acesso a um tribunal competente para verificar se uma notificação RAPEX incompleta é justificada.

70.

O representante do ponto de contacto austríaco RAPEX explicou na audiência que não foi possível encontrar, nos produtos em causa, o ano de produção que, segundo a Funke, é omisso nas notificações RAPEX. Não pôde, portanto, ser indicado nessas notificações. Além disso, alegou que tais informações são irrelevantes para a avaliação do nível de risco que representam os petardos em questão. O defeito do produto (no caso em apreço, um fusível muito curto) é, a seu ver, um indício de vigilância insuficiente no país de produção, tornando tais produtos perigosos de um modo geral, independentemente do ano de produção.

71.

Pode ser o caso. Contudo, aspetos dessa natureza devem ser apreciados e decididos pelas instâncias adequadas nos Estados‑Membros, incluindo necessariamente um órgão jurisdicional que exerça uma fiscalização jurisdicional relativamente às decisões das autoridades administrativas nacionais. Não se pode presumir, como sustenta a Comissão, que os Estados‑Membros transmitem sempre apenas informações exatas e completas e que tal seja garantido pelo sistema instituído no âmbito do RAPEX.

72.

O acesso a um tribunal que disponha de competência para se pronunciar sobre alegadas violações dos direitos dos operadores económicos com base no direito da União é uma exigência que decorre do princípio da tutela jurisdicional efetiva, atualmente consagrado no artigo 47.o da Carta dos Direitos Fundamentais do União Europeia (a seguir «Carta»). Está no cerne do Estado de direito, conforme interpretado na ordem jurídica da União.

73.

A Comissão alega, todavia, que uma ação que permite a um operador económico pedir que seja completada uma notificação RAPEX incompleta não é necessária para preencher o requisito da tutela jurisdicional efetiva. Basta, na opinião da Comissão, que o operador lesado por uma notificação incorreta do RAPEX possa intentar uma ação de indemnização contra o Estado‑Membro notificante.

74.

Não concordo. Não me parece que uma ação de indemnização constitua, nesta situação, um direito à ação na aceção do artigo 47.o da Carta ( 68 ).

75.

Em primeiro lugar, a decisão do juiz, como salientado pela Funke, provavelmente seria proferida anos depois. Mais importante ainda, uma decisão que concede uma indemnização não teria nenhuma incidência direta e concreta na respetiva notificação RAPEX incorreta. Por outras palavras, não eliminaria o entrave injustificado ao comércio. Entretanto, o operador económico terá eventualmente cessado atividade. Além disso, como a ação de indemnização teria por base a alegada violação do direito da União por parte de um Estado‑Membro (o princípio da responsabilidade do Estado), tal implicaria o cumprimento de condições estritas (nomeadamente a existência de uma violação suficientemente caracterizada a uma norma do direito da União que tenha por objeto conferir direitos aos particulares, e de um nexo de causalidade direto entre essa violação e o prejuízo sofrido ( 69 )), o que, de facto, parece regressar à questão dos direitos conferidos.

76.

Uma vez que o acesso direto a um tribunal para impugnar uma medida imposta por um Estado‑Membro alegadamente constitutiva de entraves injustificados ao comércio é previsto pelo direito da União, uma ação de indemnização não pode ser considerada uma substituição efetiva a este respeito.

77.

Por último, contrariamente ao que sustenta o Governo austríaco, o reconhecimento do direito de um operador económico pedir que uma notificação RAPEX seja completada não vai, a meu ver, de encontro ao objetivo prosseguido pelo sistema RAPEX de proceder a uma troca rápida de informações entre os Estados‑Membros e a Comissão sobre produtos não alimentares perigosos.

78.

A solução que proponho não dá a um operador económico a possibilidade de participar no procedimento de notificação RAPEX como parte ou de impedir a notificação ao pedir que seja completada. Apenas reconhece o direito conferido a todos os operadores económicos com base nos Tratados no sentido de que os Estados‑Membros não imponham restrições injustificadas às suas atividades comerciais. Esta obrigação é concretizada pela legislação relativa ao RAPEX que exige que as informações enviadas através do sistema sejam tão exatas e completas quanto possível. Ter em consideração o fundamento de um operador económico relativo ao caráter incompleto da informação enviada pode resultar na decisão das autoridades competentes de completar a notificação ou na sua recusa em fazê‑lo, o que carece de fundamentação. A decisão de completar a notificação continua a ser uma prerrogativa das autoridades do Estado‑Membro.

79.

Pedir às autoridades que tenham em consideração e respondam ao pedido de um operador económico no sentido de que seja completada a notificação não pode ser considerado incompatível com o pretendido pelo RAPEX. Pelo contrário, parece‑me que reconhecer que os operadores económicos dispõem (post festum) do direito de pedir que seja completada uma notificação RAPEX é suscetível de aumentar a eficácia desse sistema, contribuindo assim para assegurar que os produtos corretos sejam identificados e possam ser rastreados em todos os Estados‑Membros, os quais poderão então tomar as medidas adequadas.

80.

Assim, com base nas razões expostas supra, considero que o direito de um operador económico pedir que seja completada uma notificação RAPEX pode decorrer das disposições do Tratado que proíbem os Estados‑Membros de impor entraves injustificados ao comércio. Um operador económico cujo pedido a que seja completada uma notificação RAPEX tenha sido indeferido pela autoridade competente, deve ter acesso a um tribunal para impugnar esse indeferimento e alegar que a notificação incompleta constitui um entrave injustificado ao comércio. A forma mais eficiente de eliminar esse entrave é completar a notificação.

E.   Consequências

81.

Resta saber quais são, no presente processo, as consequências, para o órgão jurisdicional de reenvio, do reconhecimento do direito de um operador económico de pedir que seja completada uma notificação RAPEX com base no direito da União.

82.

Conforme jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, o princípio da interpretação conforme exige, além disso, que os órgãos jurisdicionais nacionais façam tudo o que for da sua competência, tomando em consideração todo o direito interno e aplicando os métodos de interpretação por este reconhecidos, a fim de garantir a plena eficácia da diretiva em causa e de alcançar uma solução conforme com o objetivo por ela prosseguido ( 70 ).

83.

A este respeito, o Governo austríaco referiu que, ao abrigo do direito processual administrativo austríaco, quando um particular é titular do direito, com base numa disposição de direito da União diretamente aplicável, de pedir a uma autoridade administrativa que adote um determinado comportamento, a autoridade em causa deve, em caso de indeferimento do pedido, tomar uma decisão a este respeito. Parece resultar daqui que o reconhecimento do direito de um operador económico pedir que seja completada uma notificação RAPEX, com base nos Tratados, alteraria a apreciação das possíveis vias de recurso no direito processual administrativo austríaco. A recusa da autoridade competente em tomar em consideração o pedido da Funke poderia, portanto, ser qualificada de ato administrativo, o que, por sua vez, permitiria a sua fiscalização jurisdicional nos termos do direito austríaco.

84.

Nestas condições, parece‑me possível uma interpretação conforme com as exigências do direito da União. Todavia, atendendo à repartição de funções entre o Tribunal de Justiça e os órgãos jurisdicionais nacionais no âmbito do processo de reenvio prejudicial, tal compete ao órgão jurisdicional de reenvio verificar.

V. Conclusão

85.

À luz das considerações anteriores, proponho que o Tribunal de Justiça responda às questões submetidas pelo Verwaltungsgerichtshof (Supremo Tribunal Administrativo, Áustria) da seguinte forma:

A Diretiva 2001/95/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 3 de dezembro de 2001, relativa à segurança geral dos produtos, em especial o artigo 12.o e o anexo II, o Regulamento (CE) n.o 765/2008 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 9 de julho de 2008, que estabelece os requisitos de acreditação e fiscalização do mercado relativos à comercialização de produtos, e revoga o Regulamento (CEE) n.o 339/93, em especial os artigos 20.o e 22.o, e a Decisão de Execução (UE) 2019/417 da Comissão, de 8 de novembro de 2018, que estabelece orientações para a gestão do Sistema de Troca Rápida de Informação da União Europeia (RAPEX), estabelecido ao abrigo do artigo 12.o da Diretiva 2001/95/CE relativa à segurança geral dos produtos e do seu sistema de notificação

devem ser interpretados no sentido de que

a responsabilidade principal pela exatidão das informações transmitidas através do procedimento de notificação RAPEX cabe ao Estado‑Membro notificante, mas o direito de um operador económico de pedir que seja completada uma notificação RAPEX não decorre diretamente dessas disposições.

Tal direito pode, contudo, decorrer da proibição de medidas de efeito equivalente a uma restrição quantitativa consagrada no artigo 34.o TFUE.

Os Estados‑Membros têm a obrigação de conceder proteção jurisdicional a todos os operadores económicos que aleguem que uma notificação RAPEX que não esteja completa constitui para si um entrave injustificado ao comércio.


( 1 ) Língua original: inglês.

( 2 ) RAPEX é o acrónimo de Sistema de Troca Rápida de Informação da União Europeia. As suas características serão a seguir abordadas de forma mais exaustiva (v. n.os 24 a 37 das presentes conclusões).

( 3 ) Os povos indígenas norte‑americanos utilizam sinais de fumo para transmitir informações a longas distâncias. Três nuvens indicavam a existência de algum tipo de perigo que ameaçava a pessoa que transmitia o sinal.

( 4 ) Bundesgesetz, mit dem polizeiliche Bestimmungen betreffend pyrotechnische Gegenstände und Sätze sowie das Böllerschießen erlassen werden [Lei Federal que aprova Disposições de Rolícia relativas a Produtos e Explosivos Pirotécnicos e à Utilização de Canhões Pirotécnicos (Pyrotechnikgesetz 2010 — PyroTG 2010)].

( 5 ) Nas suas observações escritas, a Funke alegou ainda que a LPD deveria, no âmbito da sua obrigação de preencher o campo de descrição do produto e da embalagem, ter igualmente incluído nas notificações RAPEX a embalagem externa de Peng 1 e Peng 2 referente aos produtos, e que a LPD tinha ignorado o facto de a denominação exata do produto ou tipo de produto ser a de «gerador de sons».

( 6 ) Existe uma proposta legislativa para substituir esta diretiva. V. adiante nota 18 das presentes conclusões.

( 7 ) Este regulamento foi substancialmente alterado pelo Regulamento (UE) 2019/1020 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de junho de 2019, relativo à fiscalização do mercado e à conformidade dos produtos e que altera a Diretiva 2004/42/CE e os Regulamentos (CE) n.o 765/2008 e (UE) n.o 305/2011 (JO 2019, L 169, p. 1). V. adiante nota 19 das presentes conclusões.

( 8 ) V. igualmente nota 20 das presentes conclusões.

( 9 ) Diretiva 2013/29/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de junho de 2013, relativa à harmonização das legislações dos Estados‑Membros respeitantes à disponibilização no mercado de artigos de pirotecnia (reformulação) (JO 2013, L 178, p. 27).

( 10 ) Discutiu‑se, na audiência, a eventual pertinência do artigo 18.o da Diretiva Segurança Geral dos Produtos e do artigo 21.o do Regulamento de Fiscalização do Mercado, ambos relativos a medidas estatais de restrição à colocação de produtos no mercado. Em relação a tais medidas, as referidas disposições preveem o direito de ser ouvido e as vias de recursos adequadas. No entanto, o Governo austríaco explicou que, ao abrigo do direito austríaco, o distribuidor afetado por tais medidas não teria nenhum direito no que respeita às notificações RAPEX. Portanto, mesmo que fosse admissível uma interpretação ampla do artigo 18.o da Diretiva Segurança Geral dos Produtos e do artigo 21.o do Regulamento de Fiscalização do Mercado e permitisse a inclusão de um importador que não fosse o destinatário das medidas, tal não seria relevante para a questão de saber se um importador, como a Funke, é titular de algum direito contra uma notificação RAPEX.

( 11 ) Segundo jurisprudência constante, há que recordar que, no âmbito do processo de cooperação entre os órgãos jurisdicionais nacionais e o Tribunal de Justiça instituído pelo artigo 267.o TFUE, cabe a este dar ao órgão jurisdicional de reenvio uma resposta útil que lhe permita decidir o litígio que lhe foi submetido. Nesta ótica, incumbe ao Tribunal de Justiça, se necessário, reformular as questões que lhe são submetidas, podendo, além disso, ser levado a tomar em consideração normas do direito da União a que o juiz nacional não fez referência no enunciado das referidas questões. V., por exemplo, Acórdãos de 15 de julho de 2021, Ministrstvo za obrambo (C‑742/19, EU:C:2021:597, n.o 31), e de 24 de fevereiro de 2022, Eulex Kosovo (C‑283/20, EU:C:2022:126, n.o 33).

( 12 ) O RAPEX também inclui os Estados partes no Acordo sobre o Espaço Económico Europeu (Islândia, Listenstaine e Noruega). Além disso, o acesso ao RAPEX é alargado a países terceiros e organizações internacionais no contexto dos acordos internacionais pertinentes celebrados com a União Europeia. V. artigo 12.o, n.o 4, da Diretiva Segurança Geral dos Produtos.

( 13 ) V., neste sentido, Acórdão de 26 de janeiro de 2017, GGP Italy/Comissão (T‑474/15, EU:T:2017:36, n.o 12).

( 14 ) V. Decisão 84/133/CEE do Conselho, de 2 de março de 1984, que cria um sistema comunitário de troca rápida de informação sobre os perigos decorrentes da utilização de produtos de consumo (JO 1984, L 70, p. 16; retificação no JO 1984, L 96, p. 44); Decisão 89/45/CEE do Conselho, de 21 de dezembro de 1988, relativa a um sistema comunitário de troca rápida de informações sobre os perigos decorrentes da utilização de produtos de consumo (JO 1989, L 17, p. 51); Decisão 90/352/CEE do Conselho, de 29 de junho de 1990, que altera a Decisão 89/45/CEE relativa a um sistema comunitário de troca rápida de informações sobre os perigos decorrentes da utilização de produtos de consumo (JO 1990, L 173, p. 49). V. ainda, por exemplo, Falke, J., «The Community System for the Rapid Exchange of Information on Dangers Suring from the Use of Consumer Products»in Micklitz, H.‑W. Roethe, T. e Weatherill, S. (eds), Federalism and Responsibility: A Study on Product Safety Law and Practice in the European Community, Graham & Trotman, Londres, 1994, pp. 215‑232; Howells, G. e Wilhelmsson, T., EC Consumer Law, Ashgate, Oxford, 1997, pp. 75‑79.

( 15 ) Diretiva de 29 de junho de 1992, relativa à segurança geral dos produtos (JO 1992, L 228, p. 24). V., em especial, o décimo quinto considerando; artigo 8.o e anexo («Procedimentos para a aplicação do sistema comunitário de troca rápida de informações previsto no artigo 8.o»).

( 16 ) V. Comissão Europeia, Relatório da Comissão ao Parlamento Europeu e ao Conselho sobre a aplicação da Diretiva 2001/95/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 3 de dezembro de 2001, relativa à segurança geral dos produtos, COM(2021) 342 final, 30 de junho de 2021, pontos 2.4 e 3.

( 17 ) V. Comissão Europeia, resultados do Safety Gate 2021: Modelling cooperation for health and safety of consumers in the European Union, 2022, disponível em: https://ec.europa.eu/safety‑gate/, pp. 9 e 13.

( 18 ) Existe uma proposta legislativa para substituir a Diretiva de Segurança Geral dos Produtos: v. Comissão Europeia, proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo à segurança geral dos produtos, que altera o Regulamento (UE) n.o 1025/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho e revoga a Diretiva 87/357/CEE do Conselho e a Diretiva 2001/95 do Parlamento Europeu e do Conselho, [COM(2021) 346 final], 30 de junho de 2021. Embora esta proposta altere o nome RAPEX para «Safety Gate» (v. considerando 50 da proposta), mantém as mesmas características do sistema (v. Exposição de Motivos, ponto 5, p. 16).

( 19 ) O Regulamento de Fiscalização do Mercado foi substancialmente alterado pelo Regulamento 2019/1020, que faz parte do Pacote «Mercadorias» da Comissão (Comunicação da Comissão, Pacote «Mercadorias»: reforçar a confiança no mercado único, COM(2017) 787 final, 19 de dezembro de 2017). Em especial, o Regulamento 2019/1020 substitui os artigos 15.o a 29.o do Regulamento de Fiscalização do Mercado (v. considerando 7 e artigo 39.o, n.o 1, ponto 4). No entanto, nos termos do artigo 44.o do Regulamento 2019/1020, este entrou em vigor em 16 de julho de 2021. Por conseguinte, como indica o Governo austríaco, não é aplicável ratione temporis ao presente processo. Em todo o caso, como referido pelo Governo austríaco e pela Comissão na audiência, o regulamento não introduz alterações substantivas para efeitos do presente processo.

( 20 ) Estas orientações são as terceiras orientações emitidas pela Comissão, na sequência, em primeiro lugar, da Decisão 2004/418 da Comissão, de 29 de abril de 2004, que estabelece orientações relativas à gestão do sistema comunitário de troca rápida de informação (RAPEX) e às notificações apresentadas em conformidade com o artigo 11.o da Diretiva 2001/95/CE (JO 2004, L 151, p. 83); e, em segundo lugar, da Decisão 2010/15/UE da Comissão, de 16 de dezembro de 2009, que estabelece orientações relativas à gestão do sistema comunitário de troca rápida de informação (RAPEX), estabelecido nos termos do artigo 12.o, e ao procedimento de notificação, estabelecido ao abrigo do artigo 11.o da Diretiva 2001/95 (Diretiva Segurança Geral dos Produtos) (JO 2010, L 22, p. 1). Segundo o considerando 28 da Diretiva Segurança Geral dos Produtos, tais orientações não são vinculativas.

( 21 ) V., a este respeito, Diretiva Segurança Geral dos Produtos, considerando 27 e anexo, parte II, ponto 2; Regulamento de Fiscalização do Mercado, considerando 30; Orientações RAPEX, anexo, parte II, ponto 3.5.1, alínea a).

( 22 ) V. Howells e Wilhelmsson, referido na nota 14 das presentes conclusões, p. 78.

( 23 ) V. Diretiva Segurança Geral dos Produtos, considerando 4; Orientações RAPEX, considerandos 12 e 13; anexo, parte II, ponto 1.1.

( 24 ) Este sítio Web, intitulado Safety Gate: o sistema de alerta rápido da União para produtos não alimentares perigosos, está disponível em https://ec.europa.eu/safety‑gate/.

( 25 ) V. Orientações RAPEX, anexo, parte II, ponto 1.2.

( 26 ) V., por exemplo, Comunicação da Comissão, Guia Azul de 2022 sobre a aplicação das regras da UE em matéria de produtos (JO 2022, C 247, p. 1), ponto 7.6.4.

( 27 ) V. Orientações RAPEX, anexo, parte II, pontos 3.4 e 4.

( 28 ) As notificações RAPEX são, portanto, obrigatórias nos termos do direito da União no que respeita às «notificações ao abrigo do artigo 12.o» e às «notificações ao abrigo do artigo 22.o». O presente processo diz respeito precisamente a uma notificação obrigatória (com base no artigo 22.o do Regulamento de Fiscalização do Mercado). Existem outros tipos de notificações (v. Orientações RAPEX, anexo, parte II, ponto 3.1), que não estão aqui em causa.

( 29 ) V. Diretiva Segurança Geral dos Produtos, artigo 12.o, n.os 1 e 2; Orientações RAPEX, anexo, parte I, ponto 4.1.

( 30 ) V. Diretiva Segurança Geral dos Produtos, artigo 12.o, n.os 1 e 2 e anexo II, ponto 2; Orientações RAPEX, anexo, parte I, pontos 3‑6; parte II, ponto 2.1. Quando estas condições estão preenchidas e há, adicionalmente, outras circunstâncias graves (por exemplo, o produto representa um perigo de morte), a notificação é classificada como «notificação com medida de emergência», portanto, com prazos ainda mais curtos: v. Orientações RAPEX, anexo, parte II, ponto 3.1.1.

( 31 ) V. Regulamento de Fiscalização do Mercado, artigo 20.o

( 32 ) V. Diretiva Segurança Geral dos Produtos, artigo 12.o; Regulamento de Fiscalização do Mercado, artigo 22.o; v., também, Orientações RAPEX, anexo, parte I, ponto 6.1, indicando que «[se incentiva] as autoridades nacionais a interpretar o critério dos efeitos transfronteiriços de uma forma bastante lata».

( 33 ) V. Diretiva Segurança Geral dos Produtos, artigo 12.o; Regulamento de Fiscalização do Mercado, artigo 22.o; v., igualmente, Orientações RAPEX, anexo, parte I, pontos 5.1 e 5.3, indicando que na parte III, apêndice 6 é definido um método de avaliação do risco que pode ser utilizado pelos Estados‑Membros a esse respeito, e que está disponível uma ferramenta específica (Orientações para a Avaliação do Risco ou «RAG») para facilitar as avaliações do risco, bem como ponto 5.4 que refere que a avaliação do risco é executada ou verificada pela autoridade competente do Estado‑Membro que, inter alia, tomou as medidas apropriadas.

( 34 ) V. Diretiva Segurança Geral dos Produtos, artigo 12.o, n.o 1; Regulamento de Fiscalização do Mercado, artigo 22.o, n.o 1. Os Estados‑Membros devem enviar uma notificação RAPEX no prazo de dez dias após a adoção das medidas adequadas (e para notificações de emergência, no prazo de três dias) e devem confirmar as medidas no prazo de 45 dias após a apresentação da notificação se esta foi enviada antes de tomar a decisão de adotar medidas. V. Diretiva Segurança Geral dos Produtos, anexo II, ponto 4; Orientações RAPEX, anexo, parte III, apêndice 4.

( 35 ) V. Diretiva Segurança Geral dos Produtos, anexo II, ponto 3; Orientações RAPEX, anexo, parte II, ponto 3.2.1.

( 36 ) V. Orientações RAPEX, anexo, parte II, pontos 3.4.1 e 3.4.1.1.

( 37 ) V. Diretiva Segurança Geral dos Produtos, anexo II, ponto 3; Orientações RAPEX, anexo, parte III, apêndice 1.

( 38 ) V. Orientações RAPEX, anexo, parte II, ponto 5.1.

( 39 ) V. Orientações RAPEX, anexo, parte II, pontos 3.4.2 e 5.1.2, alínea e).

( 40 ) Orientações RAPEX, anexo, parte II, ponto 3.2.1, alínea a).

( 41 ) V. Orientações RAPEX, anexo, parte II, ponto 3.2.2.

( 42 ) V. Orientações RAPEX, anexo, parte III, apêndice 1.

( 43 ) V. Diretiva Segurança Geral dos Produtos, anexo II, ponto 10.

( 44 ) Orientações RAPEX, anexo, parte II, ponto 3.2.4.

( 45 ) Falke, já referido na nota 14 das presentes conclusões, p. 220.

( 46 ) Howells e Wilhelmsson, já referidos na nota 14 das presentes conclusões, p. 79.

( 47 ) Diretiva Segurança Geral dos Produtos, anexo II, ponto 5; Orientações RAPEX, anexo, parte II, ponto 3.4.3. À Comissão incumbe, em princípio, a obrigação de, no prazo de cinco dias após a receção (ou no prazo de três dias, no que concerne às notificações com medida de emergência) validar e distribuir todas as notificações RAPEX. V. Orientações RAPEX, anexo, parte III, apêndice 5.

( 48 ) V. Orientações RAPEX, anexo, parte II, ponto 3.4.3.2.

( 49 ) V. Orientações RAPEX, anexo, parte II, ponto 3.4.5.1. Existem exceções à divulgação geral, sendo que os Estados‑Membros notificantes podem apresentar um pedido de confidencialidade no que respeita a uma notificação: v. Orientações RAPEX, anexo, parte II, pontos 3.4.5.2 a 3.4.5.5.

( 50 ) V. Orientações RAPEX, anexo, parte II, ponto 3.2.4.

( 51 ) V. Diretiva Segurança Geral dos Produtos, anexo II, ponto 6; Orientações RAPEX, anexo, parte II, ponto 4.1.

( 52 ) V. Orientações RAPEX, anexo, parte II, pontos 3.4.6.1 e 3.4.6.2.

( 53 ) V. Orientações RAPEX, anexo, parte II, ponto 4.2. As notificações de acompanhamento estão sujeitas a um procedimento semelhante ao das notificações RAPEX iniciais. Por exemplo, a notificação de acompanhamento é criada pela autoridade nacional competente, o ponto de contacto nacional RAPEX verifica e valida a notificação de acompanhamento antes de a transmitir à Comissão e a Comissão verifica todas as notificações de acompanhamento a fim de assegurar que estão exatas e completos antes de as transmitir aos Estados‑Membros. V. Orientações RAPEX, anexo, parte II, pontos 4.2.4 e 4.4.

( 54 ) A jurisprudência parece corroborar, em certa medida, esta abordagem. V., a este respeito, Acórdão de 4 de julho de 1989, Francesconi e o./Comissão (326/86 e 66/88, EU:C:1989:282, nomeadamente, n.os 10 a 12 e 23), e Conclusões do advogado‑geral C. O. Lenz nos processos apensos Francesconi e o./Comissão (326/86 e 66/88, EU:C:1989:211, n.os 7, 21, 22 e 25). Nesse acórdão, o Tribunal de Justiça julgou improcedente uma ação de indemnização baseada no pretenso facto culposo da Comissão que não divulgou informações sobre vinhos adulterados, referindo que são os Estados‑Membros que, por força da regulamentação anterior da União que instituiu o RAPEX (v. nota 14 das presentes conclusões), decidem da adoção de medidas urgentes destinadas a impedir a comercialização de um produto em virtude do perigo grave e imediato que representaria para a saúde e a segurança dos consumidores, e que a Comissão transmite essa informação. Houve também processos relativos a ações de indemnização instaurados contra a União Europeia no que concerne a um sistema semelhante de alerta rápido da União para os géneros alimentícios e alimentos para animais (RASFF), que, neste contexto, confirma a responsabilidade dos Estados‑Membros de assegurar a exatidão das informações prestadas, contrapondo a da Comissão. V., a este respeito, Acórdãos de 10 de março de 2004, Malagutti‑Vezinhet/Comissão (T‑177/02, EU:T:2004:72, n.os 43 a 67, em especial n.os 51 e 52) (negando provimento ao recurso interposto pela recorrente cujos produtos tinham sido objeto de uma notificação incorreta), e de 29 de outubro de 2009, Bowland Dairy Products/Comissão (T‑212/06, EU:T:2009:419, n.os 34 a 46, em especial n.os 40 e 41) (julgando improcedente o pedido baseado na alegada recusa da Comissão de divulgar uma notificação complementar).

( 55 ) V. Orientações RAPEX, anexo, parte II, ponto 3.2.3.

( 56 ) V. Orientações RAPEX, anexo parte II, pontos 3.4.7.1.2 e 3.4.7.2.2.

( 57 ) V. Orientações RAPEX, anexo, parte II, ponto 3.3.1.

( 58 ) V. Orientações RAPEX, anexo, parte II, ponto 3.3.1.

( 59 ) Refira‑se que esta conclusão não sofreria alterações em virtude da proposta legislativa de substituição da Diretiva Segurança Geral dos Produtos ou das alterações ao Regulamento de Fiscalização do Mercado introduzidas pelo Regulamento n.o 2019/1020: v. notas 18 e 19 das presentes conclusões.

( 60 ) V., a este respeito, Eliantonio, M., «Information Exchange in European Administrative Law: A Threat to Effective Judicial Protection?», Maastricht Journal of European and Comparative Law, Vol. 23, 2016, p. 531; e número especial, European Public Law, Vol. 20, 2014, p. 65. Mencionam, por exemplo, o artigo 43.o do Regulamento (CE) n.o 1987/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de dezembro de 2006, relativo ao estabelecimento, ao funcionamento e à utilização do Sistema de Informação Schengen de segunda geração (SIS II) (JO 2006, L 381, p. 4) e artigo 59.o da Decisão 2007/533/JAI do Conselho, de 12 de junho de 2007, relativa ao estabelecimento, ao funcionamento e à utilização do Sistema de Informação Schengen de segunda geração (SIS II) (JO 2007, L 205, p. 63), que preveem: «Qualquer pessoa pode instaurar, perante os tribunais ou perante a autoridade competente nos termos da legislação nacional de qualquer Estado‑Membro, uma ação que tenha por objeto, nomeadamente, o acesso, a retificação e a supressão de uma indicação que lhe diga respeito, e a obtenção de informação ou indemnização relativamente a tal indicação». V. igualmente Rede de Investigação sobre Direito Administrativo da União (ReNEUAL) Model Rules on EU Administrative Procedure, artigo VI‑19 «Obrigações de atualizar, retificar ou suprimir dados», 2014, disponível em http://reneual.eu.

( 61 ) V., por exemplo, Acórdãos de 1 de julho de 2014, Ålands Vindkraft (C‑573/12, EU:C:2014:2037, n.o 65), e de 18 de junho de 2019, Áustria/Alemanha (C‑591/17, EU:C:2019:504, n.o 119).

( 62 ) V., relativamente ao artigo 34.o TFUE, Acórdãos de 22 de março de 1977, Iannelli & Volpi (74/76, EU:C:1977:51, n.o 13), e de 29 de novembro de 1978, Redmond (83/78, EU:C:1978:214, n.os 66 e 67). Este último acórdão também confirma o efeito direto do artigo 35.o TFUE. A este respeito, v., igualmente Acórdão de 3 de março de 2011, Kakavetsos‑Fragkopoulos (C‑161/09, EU:C:2011:110, n.o 22).

( 63 ) V. Acórdão de 11 de julho de 1974 (8/74, EU:C:1974:82, n.o 5). V., igualmente, por exemplo, Acórdãos de 10 de fevereiro de 2009, Comissão/Itália (C‑110/05, EU:C:2009:66, n.o 33), e de 15 de julho de 2021, DocMorris (C‑190/20, EU:C:2021:609, n.o 34).

( 64 ) V., por exemplo, Acórdãos de 10 de fevereiro de 2009, Comissão/Itália (C‑110/05, EU:C:2009:66, n.o 37), e de 18 de junho de 2019, Áustria/Alemanha (C‑591/17, EU:C:2019:504, n.o 121).

( 65 ) V., por exemplo, Acórdãos de 20 de setembro de 2007, Comissão/Países Baixos (C‑297/05, EU:C:2007:531, n.o 53), e de 12 de julho de 2012, Fra.bo (C‑171/11, EU:C:2012:453, n.o 22).

( 66 ) V. Acórdão de 24 de novembro de 1982 (249/81, EU:C:1982:402, em especial n.os 27 a 30).

( 67 ) V. Acórdão de 17 de abril de 2007 (C‑470/03, EU:C:2007:213, em especial n.os 56 a 60 e 65).

( 68 ) V., a este respeito, Conclusões da advogada‑geral J. Kokott nos processos apensos État luxembourgeois (Direito à ação contra um pedido de informação em matéria fiscal) (C‑245/19 e C‑246/19, EU:C:2020:516, n.o 102), que considerou que o recurso a título incidental no âmbito de um processo subsequente de responsabilidade do Estado não consubstancia um recurso efetivo na aceção do artigo 47.o da Carta, uma vez que este recurso que, além do mais, está associado a outros requisitos, não é suscetível de impedir a violação dos direitos dos demandantes em questão, mas, quando muito, compensa um prejuízo sofrido, sendo que a mera possibilidade secundária de indemnização não constitui um recurso efetivo. É certo que, no seu acórdão, o Tribunal de Justiça considerou que, no caso concreto, a possibilidade de um interessado intentar uma ação judicial para que seja declarado que os direitos que lhe são garantidos pelo direito da União foram violados e obter uma indemnização pelos danos causados por essa violação garante‑lhe uma tutela jurisdicional efetiva. V. Acórdão de 6 de outubro de 2020, État luxembourgeois (Direito à ação contra um pedido de informação em matéria fiscal) (C‑245/19 e C‑246/19, EU:C:2020:795, n.o 101). No entanto, sou de opinião que, no presente processo, tal recurso não é efetivo.

( 69 ) V., por exemplo, Acórdãos de 5 de março de 1996, Brasserie du pêcheur e Factortame (C‑46/93 e C‑48/93, EU:C:1996:79, n.o 51), e de 28 de junho de 2022, Comissão/Espanha (Violação do direito da União pelo legislador) (C‑278/20, EU:C:2022:503, n.o 31).

( 70 ) V., por exemplo, Acórdãos de 24 de janeiro de 2012, Dominguez (C‑282/10, EU:C:2012:33, n.o 27), e de 13 de julho de 2016, Pöpperl (C‑187/15, EU:C:2016:550, n.o 43).

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