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Document 62021CC0323

Conclusões do advogado-geral Richard de la Tour apresentadas em 8 de setembro de 2022.
Staatssecretaris van Justitie en Veiligheid e K. contra B. e o.
Pedidos de decisão prejudicial apresentados pelo Raad van State.
Reenvio prejudicial — Regulamento (UE) n.o 604/2013 — Determinação do Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de proteção internacional — Apresentação de múltiplos pedidos de proteção internacional em três Estados‑Membros — Artigo 29.o — Prazo de transferência — Decurso do prazo — Transferência da responsabilidade pela análise do pedido — Artigo 27.o — Via de recurso — Alcance da fiscalização jurisdicional — Possibilidade de o requerente invocar a transferência da responsabilidade pela análise do pedido.
Processos apensos C-323/21 a C-325/21.

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2022:651

 CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

JEAN RICHARD DE LA TOUR

apresentadas em 8 de setembro de 2022 ( 1 )

Processo C‑323/21

Staatssecretaris van Justitie en Veiligheid

sendo interveniente:

B.

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Raad van State (Conselho de Estado, em formação jurisdicional, Países Baixos)]

e

Processos apensos C‑324/21 e C‑325/21

Staatssecretaris van Justitie en Veiligheid (C‑324/21)

K. (C‑325/21)

sendo intervenientes:

F.,

Staatssecretaris van Justitie en Veiligheid

[pedidos de decisão prejudicial apresentados pelo Raad van State (Conselho de Estado, em formação jurisdicional, Países Baixos)]

«Reenvio prejudicial — Política de asilo — Critérios e mecanismos de determinação do Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de proteção internacional — Regulamento (UE) n.o 604/2013 — Recurso interposto contra uma decisão de transferência — Conceito de “Estado‑Membro requerente” — Relevância de um acordo celebrado anteriormente entre dois outros Estados‑Membros — Alcance do recurso»

I. Introdução

1.

Os presentes pedidos de decisão prejudicial constituem uma oportunidade para o Tribunal de Justiça esclarecer as modalidades de articulação dos procedimentos de retomada a cargo que foram iniciados sucessivamente por dois Estados‑Membros diferentes a respeito do mesmo requerente de proteção internacional, em aplicação do Regulamento (UE) n.o 604/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, que estabelece os critérios e mecanismos de determinação do Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de proteção internacional apresentado num dos Estados‑Membros por um nacional de um país terceiro ou por um apátrida ( 2 ).

2.

Estes pedidos foram apresentados no âmbito de litígios que opõem o Staatssecretaris van Justitie en Veiligheid (Secretário de Estado da Segurança e Justiça, Países Baixos) (a seguir «Secretário de Estado») a B., F. e K., três nacionais de países terceiros requerentes de proteção internacional, relativos à legalidade das decisões de transferência que foram adotadas a seu respeito. Depois de terem apresentado os respetivos primeiros pedidos de proteção internacional em diferentes Estados‑Membros, os requerentes deslocaram‑se para o território da União Europeia, apresentando, nessa ocasião e num curto espaço de tempo, novos pedidos de proteção internacional aos Estados‑Membros para os territórios dos quais se dirigiram.

3.

Na falta de esclarecimentos no Regulamento Dublin III e no seu regulamento de aplicação ( 3 ) sobre a articulação dos procedimentos de retomada a cargo sucessivamente conduzidos por Estados‑Membros diferentes a respeito do mesmo requerente, o Tribunal de Justiça deverá definir as modalidades que permitem, por um lado, manter um método claro, operacional e rápido para determinar o Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de proteção internacional ( 4 ) e, por outro, prevenir os abusos que decorrem de múltiplos pedidos de proteção internacional, apresentados simultânea ou sucessivamente pela mesma pessoa em diversos Estados‑Membros, com o objetivo quer de prolongar a sua permanência na União, beneficiando de condições materiais de acolhimento, quer de escolher o Estado‑Membro responsável pela análise do seu pedido de proteção internacional ( 5 ).

4.

Nas presentes conclusões, irei expor as razões pelas quais considero que, em situações como as que estão em causa nos processos principais, nas quais o primeiro procedimento de retomada a cargo foi iniciado validamente após concertação entre os Estados‑Membros envolvidos, os acontecimentos posteriores a esta concertação, a saber, a partida do requerente do território do Estado‑Membro requerente antes da execução da sua transferência e a apresentação sucessiva de um segundo pedido de retomada a cargo por outro Estado‑Membro no território do qual se encontra o requerente, privam este primeiro procedimento de um elemento essencial à sua validade. Explicarei então por que razão o Estado‑Membro requerido, na medida em que intervém em dois procedimentos de retomada a cargo iniciados num curto espaço de tempo a respeito da mesma pessoa por dois Estados‑Membros requerentes diferentes, pode acordar com o primeiro Estado‑Membro requerente a caducidade do primeiro destes procedimentos, a contar da sua aceitação do segundo pedido de retomada a cargo.

II. Quadro jurídico

5.

Os considerandos 4 e 5 do Regulamento Dublin III enunciam o seguinte:

«(4)

As conclusões do Conselho de Tampere precisaram […] que o [Sistema Europeu Comum de Asilo] deverá incluir, a curto prazo, um método claro e operacional para determinar o Estado‑Membro responsável pela análise dos pedidos de asilo.

(5)

Este método deverá basear‑se em critérios objetivos e equitativos, tanto para os Estados‑Membros como para as pessoas em causa. Deverá permitir, nomeadamente, uma determinação rápida do Estado‑Membro responsável, por forma a garantir um acesso efetivo aos procedimentos de concessão de proteção internacional e a não comprometer o objetivo de celeridade no tratamento dos pedidos de proteção internacional».

6.

No capítulo II, com o título «Princípios gerais e garantias», o artigo 3.o, n.o 2, primeiro parágrafo, do Regulamento Dublin III dispõe o seguinte:

«Caso o Estado‑Membro responsável não possa ser designado com base nos critérios enunciados no presente regulamento, é responsável pela análise do pedido de proteção internacional o primeiro Estado‑Membro em que o pedido tenha sido apresentado».

7.

O capítulo VI do Regulamento Dublin III, intitulado «Procedimentos de tomada e retomada a cargo», abrange os artigos 20.o a 33.o do mesmo. O artigo 20.o, n.o 5, primeiro parágrafo, deste regulamento refere:

«O Estado‑Membro a que tiver sido apresentado pela primeira vez o pedido de proteção internacional é obrigado, nas condições previstas nos artigos 23.o, 24.o, 25.o e 29.o e a fim de concluir o processo de determinação do Estado‑Membro responsável pela análise do pedido de proteção internacional, a retomar a cargo o requerente que se encontre presente noutro Estado‑Membro sem título de residência ou aí tenha formulado um pedido de proteção internacional, após ter retirado o seu primeiro pedido apresentado noutro Estado‑Membro durante o processo de determinação do Estado responsável.»

8.

O artigo 23.o, n.os 1 a 3, do Regulamento Dublin III dispõe:

«1.   Se o Estado‑Membro ao qual foi apresentado um novo pedido de proteção internacional pela pessoa referida no artigo 18.o, n.o 1, alíneas b), c) ou d), considerar que o responsável é outro Estado‑Membro, nos termos do artigo 20.o, n.o 5, e do artigo 18.o, n.o 1, alíneas b), c) ou d), pode solicitar a esse outro Estado‑Membro que retome essa pessoa a seu cargo.

2)   O pedido de retomada a cargo é apresentado o mais rapidamente possível e, em qualquer caso, no prazo de dois meses após a receção do acerto do Eurodac […]

Se o pedido de retomada a cargo se basear em elementos de prova diferentes dos dados obtidos através do sistema Eurodac, deve ser enviado ao Estado‑Membro requerido no prazo de três meses a contar da data de apresentação do pedido de proteção internacional […]

3)   Se o pedido de retomada a cargo não for apresentado nos prazos previstos no n.o 2, a responsabilidade pela análise do pedido de proteção internacional cabe ao Estado‑Membro em que o pedido tiver sido apresentado.»

9.

O artigo 27.o, n.o 1, do Regulamento Dublin III tem a seguinte redação:

«O requerente ou outra pessoa referida no artigo 18.o, n.o 1, alíneas c) ou d), tem direito a uma via de recurso efetiva, sob a forma de recurso ou de pedido de revisão, de facto e de direito, da decisão de transferência, para um órgão jurisdicional.»

10.

O artigo 29.o, n.os 1 e 2, do Regulamento Dublin III prevê:

«1.   A transferência do requerente […] do Estado‑Membro requerente para o Estado‑Membro responsável efetua‑se em conformidade com o direito nacional do Estado‑Membro requerente, após concertação entre os Estados‑Membros envolvidos, logo que seja materialmente possível e, o mais tardar, no prazo de seis meses a contar da aceitação do pedido de tomada ou retomada a cargo da pessoa em causa por outro Estado‑Membro ou da decisão final sobre o recurso ou revisão, nos casos em que exista efeito suspensivo […]

[…]

2)   Se a transferência não for executada no prazo de seis meses, o Estado‑Membro responsável fica isento da sua obrigação de tomada ou retomada a cargo da pessoa em causa, e a responsabilidade é transferida para o Estado‑Membro requerente. Este prazo pode ser alargado para um ano, no máximo, se a transferência não tiver sido efetuada devido a retenção da pessoa em causa, ou para 18 meses, em caso de fuga.»

III. Factos dos litígios nos processos principais e questões prejudiciais

A.   Processo C‑323/21

11.

Em 3 de julho de 2017, B. apresentou um pedido de proteção internacional na Alemanha. Uma vez que B tinha anteriormente pedido esta proteção em Itália, as autoridades alemãs pediram às autoridades italianas que o retomassem a cargo. Em 4 de outubro de 2017, as autoridades italianas aceitaram este pedido de retomada a cargo. O prazo de transferência foi posteriormente prorrogado até 4 de abril de 2019 devido à fuga de B.

12.

Em 17 de fevereiro de 2018, B. apresentou um pedido de proteção internacional nos Países Baixos. Em 17 de março de 2018, o Secretário de Estado pediu às autoridades italianas que retomassem B. a cargo. Em 1 de abril de 2018, as autoridades italianas aceitaram este pedido de retomada a cargo. Por carta de 29 de junho de 2018, o Secretário de Estado comunicou a fuga de B. a estas autoridades, o que implicou a prorrogação do prazo de transferência até 1 de outubro de 2019.

13.

Em 9 de julho de 2018, B. apresentou um segundo pedido de proteção internacional na Alemanha. Em 14 de setembro de 2018, as autoridades alemãs adotaram uma decisão ao abrigo do Regulamento Dublin III, que não foi objeto de recurso.

14.

Em 27 de dezembro de 2018, B. apresentou um segundo pedido de proteção internacional nos Países Baixos. Por Decisão de 8 de março de 2019, o Secretário de Estado indeferiu o pedido sem exame, com o fundamento de que a República Italiana continuava a ser o Estado‑Membro responsável pela sua análise.

15.

Em 29 de abril de 2019, B. foi transferido para Itália.

16.

B. interpôs recurso contra a decisão do Secretário de Estado de 8 de março de 2019 para o tribunal competente. Por Sentença de 12 de junho de 2019, este tribunal deu provimento ao recurso e anulou esta decisão, com o fundamento de que a República Federal da Alemanha se tinha tornado, em 4 de abril de 2019, o Estado‑Membro responsável em razão do decurso do prazo de transferência.

17.

O Secretário de Estado interpôs recurso contra essa sentença para o órgão jurisdicional de reenvio. Alegou, nomeadamente, em apoio deste recurso, por um lado, que o cálculo do prazo de transferência devia ser efetuado tendo em conta a relação entre o Reino dos Países Baixos e a República Italiana e, por outro, que, em conformidade com a «regra da cadeia», tinha começado a correr um novo prazo de transferência para a República Federal da Alemanha quando B. apresentou um pedido de proteção internacional nos Países Baixos.

18.

O órgão jurisdicional de reenvio salienta que é pacífico que a República Italiana era o Estado‑Membro responsável à data da apresentação do último pedido de proteção internacional de B. Em contrapartida, as partes no processo principal opõem‑se quanto ao eventual decurso do prazo de transferência antes da transferência de B., uma vez que o prazo de 18 meses a contar da aceitação do primeiro pedido de retomada a cargo pela República Italiana já tinha decorrido.

19.

No caso em apreço, dado que coexistiram dois «acordos válidos» de retomada a cargo, com dois prazos de transferência diferentes, é necessário clarificar a relação entre estes dois prazos. Para o efeito, importa determinar se o primeiro Estado‑Membro a apresentar um pedido de retomada a cargo ainda deve ser considerado o «Estado‑Membro requerente», na aceção do artigo 29.o, n.o 2, do Regulamento Dublin III, ou se esta qualidade deve ser reservada ao último Estado‑Membro a formular este pedido.

20.

Se for acolhida a segunda interpretação, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se este último Estado‑Membro está de algum modo vinculado ao prazo de transferência imposto ao primeiro Estado‑Membro. Em contrapartida, se for escolhida a primeira interpretação, há que determinar se B. pode invocar perante os órgãos jurisdicionais neerlandeses o decurso do prazo de transferência acordado entre a República Federal da Alemanha e a República Italiana, situação que favoreceria o «forum shopping».

21.

Nestas condições, o Raad van State (Conselho de Estado, em formação jurisdicional, Países Baixos) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

a)

Deve o conceito de “Estado‑Membro requerente” na aceção do artigo 29.o, n.o 2, do Regulamento [Dublin III], ser interpretado no sentido de que esse é o último Estado‑Membro (in casu, o terceiro Estado‑Membro, a saber, os Países Baixos) que apresentou a outro Estado‑Membro um pedido de tomada ou de retomada a cargo?

b)

Em caso de resposta negativa: o facto de ter sido celebrado anteriormente um acordo de tomada a cargo entre dois Estados‑Membros (in casu, a Alemanha e a Itália) afeta as obrigações jurídicas do terceiro Estado‑Membro (in casu, os Países Baixos) por força do Regulamento [Dublin III] relativamente ao estrangeiro ou aos Estados‑Membros abrangidos pelo acordo anterior? Em caso afirmativo, quais?

2)

Em caso de resposta negativa à questão 1, deve o artigo 27.o, n.o 1, do Regulamento [Dublin III] lido à luz do considerando 19 do referido regulamento, ser interpretado no sentido de que se opõe à procedência do argumento apresentado por um requerente de proteção internacional, no âmbito do recurso judicial interposto de uma decisão de transferência, de que a transferência não pode ter lugar porque o prazo para a transferência previamente acordada entre dois Estados‑Membros (in casu, a Alemanha e a Itália) já expirou?»

B.   Processos apensos C‑324/21 e C‑325/21

1. Processo C‑324/21

22.

Em 24 de novembro de 2017, F. apresentou um pedido de proteção internacional nos Países Baixos. Uma vez que F. tinha anteriormente pedido esta proteção em Itália, o Secretário de Estado pediu às autoridades italianas que o retomassem a cargo. Em 19 de dezembro de 2017, as autoridades italianas aceitaram este pedido de retomada a cargo. Por carta de 12 de abril de 2018, o Secretário de Estado comunicou a fuga de F. a estas autoridades, o que implicou a prorrogação do prazo de transferência até 19 de junho de 2019.

23.

Em 29 de março de 2018, F. apresentou um pedido de proteção internacional na Alemanha. O órgão jurisdicional de reenvio não tem conhecimento da eventual tramitação deste pedido.

24.

Em 30 de setembro de 2018, F. apresentou um segundo pedido de proteção internacional nos Países Baixos. Por Decisão de 31 de janeiro de 2019, o Secretário de Estado indeferiu este pedido sem exame, com o fundamento de que a República Italiana continuava a ser o Estado‑Membro responsável pela sua análise.

25.

Depois de ter deixado o centro de requerentes de asilo no qual estava alojado, F. foi interpelado, e posteriormente retido, por Decisão do Secretário de Estado de 1 de julho de 2019, com vista à sua transferência para Itália.

26.

F. interpôs recurso contra essa decisão para o tribunal competente. Por Sentença de 16 de julho de 2019, este tribunal deu provimento ao recurso e anulou a referida decisão, com o fundamento de que o Reino dos Países Baixos se tinha tornado, em 19 de junho de 2019, o Estado‑Membro responsável em razão do decurso do prazo de transferência.

27.

O Secretário de Estado interpôs recurso contra essa sentença para o órgão jurisdicional de reenvio. Alegou, nomeadamente, em apoio deste recurso, que, em conformidade com a «regra da cadeia», tinha começado a correr um novo prazo de transferência para o Reino dos Países Baixos quando F. apresentou um pedido de proteção internacional na Alemanha.

28.

O órgão jurisdicional de reenvio salienta que é pacífico que a República Italiana devia ser considerada como o Estado‑Membro responsável, pelo menos até 19 de junho de 2019.

29.

No entanto, esse órgão jurisdicional interroga‑se sobre a relevância do facto de, antes do decurso do prazo de transferência, a pessoa em causa ter apresentado um novo pedido de proteção internacional noutro Estado‑Membro.

30.

Nestas condições, o Raad van State (Conselho de Estado, em formação jurisdicional) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«Deve o artigo 29.o do Regulamento [Dublin III], ser interpretado no sentido de que um prazo de transferência em curso, conforme referido no artigo 29.o, n.os 1 e 2, começa a correr de novo no momento em que o estrangeiro, depois de ter obstruído a transferência por um Estado‑Membro por ter fugido, apresenta um novo pedido de proteção internacional noutro Estado‑Membro (in casu num terceiro Estado‑Membro)?»

2. Processo C‑325/21

31.

Em 6 de setembro de 2018, K. apresentou um pedido de proteção internacional em França. Uma vez que K. tinha anteriormente pedido esta proteção na Áustria, as autoridades francesas pediram às autoridades austríacas que o retomassem a cargo. Em 4 de outubro de 2018, as autoridades austríacas aceitaram este pedido de retomada a cargo.

32.

Em 27 de março de 2019, K. apresentou um pedido de proteção internacional nos Países Baixos. Em 3 de maio de 2019, o Secretário de Estado pediu às autoridades austríacas que retomassem K. a cargo. Em 10 de maio de 2019, estas autoridades indeferiram este pedido de retomada a cargo, com o fundamento de que a República Francesa era, desde 4 de abril de 2019, o Estado‑Membro responsável pela análise do pedido de K.

33.

Em 20 de maio de 2019, o Secretário de Estado pediu às autoridades francesas que retomassem K. a cargo. Estas autoridades indeferiram este pedido de retomada a cargo, com o fundamento de que o prazo de transferência ainda não tinha decorrido no dia em que K. apresentou um pedido de proteção internacional nos Países Baixos.

34.

Em 31 de maio de 2019, o Secretário de Estado pediu às autoridades austríacas e às autoridades francesas que reconsiderassem o pedido de retomada a cargo. No pedido dirigido às autoridades austríacas, alegou que tinha começado a correr um novo prazo de transferência entre a República Francesa e a República da Áustria a contar da apresentação, por K., de um pedido de proteção internacional nos Países Baixos. Em 3 de junho de 2019, as autoridades austríacas aceitaram retomar K. a cargo.

35.

Por Decisão de 24 de julho de 2019, o Secretário de Estado indeferiu sem exame o pedido de proteção internacional apresentado por K.

36.

K. interpôs recurso contra essa decisão para o tribunal competente. Por Sentença de 17 de outubro de 2019, este tribunal negou provimento ao recurso, com o fundamento de que o Secretário de Estado tinha considerado corretamente que a República da Áustria era o Estado‑Membro responsável pela análise do pedido de proteção internacional de K.

37.

K. interpôs recurso contra essa sentença para o órgão jurisdicional de reenvio. Em apoio deste recurso, alegou que a apresentação de um pedido de proteção internacional num terceiro Estado‑Membro não pode obstar ao decurso do prazo de transferência previsto entre dois outros Estados‑Membros.

38.

O órgão jurisdicional de reenvio salienta que é pacífico que a República da Áustria devia ser considerada como o Estado‑Membro responsável, pelo menos até 4 de abril de 2019, na medida em que este Estado‑Membro não tinha sido informado da fuga de K pelas autoridades francesas.

39.

Nestas condições, o Raad van State (Conselho de Estado, em formação jurisdicional) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

Deve o artigo 29.o do Regulamento [Dublin III] ser interpretado no sentido de que um prazo de transferência em curso, conforme referido no artigo 29.o, n.os 1 e 2, começa a correr de novo no momento em que o estrangeiro, depois de ter obstruído a transferência por um Estado‑Membro por ter fugido, apresenta um novo pedido de proteção internacional noutro (in casu, num terceiro) Estado‑Membro?

2)

Em caso de resposta negativa à questão 1, deve o artigo 27.o, n.o 1, do Regulamento [Dublin III], lido à luz do considerando 19 do referido regulamento, ser interpretado no sentido de que se opõe à procedência do argumento apresentado por um requerente de proteção internacional, no âmbito do recurso judicial interposto de uma decisão de transferência, de que a transferência não pode ter lugar porque o prazo para a transferência previamente acordada entre dois Estados‑Membros (in casu, a França e a Áustria) já expirou, daí resultando que o prazo no qual os Países Baixos podem transferir expirou?»

C.   Tramitação dos processos no Tribunal de Justiça

40.

Os processos C‑324/21 e C‑325/21 foram apensos nesta fase do processo. Em contrapartida, o processo C‑323/21 não foi apenso aos outros dois. Todavia, atenta a ligação entre estes três processos, foi realizada uma audiência de alegações comum, em 5 de maio de 2022, no decurso da qual as partes foram ouvidas e convidadas, designadamente, a responder às perguntas para resposta oral formuladas pelo Tribunal de Justiça.

IV. Análise

A.   Quanto à primeira questão prejudicial submetida no processo C‑323/21, à questão única submetida no processo C‑324/21 e à primeira questão prejudicial submetida ao Tribunal de Justiça no processo C‑325/21

41.

Examinarei conjuntamente a primeira questão submetida no processo C‑323/21, a questão única submetida no processo C‑324/21 e a primeira questão submetida ao Tribunal de Justiça no processo C‑325/21.

42.

Com efeito, embora estas questões tenham sido colocadas em termos diferentes, visam, em substância, a interpretação das disposições relativas à contagem dos prazos de transferência, enunciadas no artigo 29.o, n.os 1 e 2, do Regulamento Dublin III, numa situação em que o Estado‑Membro ao qual foi apresentado o pedido de proteção internacional pela primeira vez é requerido por dois Estados‑Membros diferentes para efeitos da retomada a cargo do mesmo requerente, uma vez que o primeiro Estado‑Membro requerente está impossibilitado de executar a transferência deste requerente, segundo as modalidades e nos prazos previstos nesse artigo, pelo facto de este ter abandonado o território nacional para se dirigir para o território do segundo Estado‑Membro requerente ( 6 ).

43.

Em cada um destes três processos, o órgão jurisdicional de reenvio centra as suas questões na interpretação do artigo 29.o do Regulamento Dublin III.

44.

Recordo que esse artigo define as modalidades e os prazos em que o Estado‑Membro requerente deve, para efeitos de tomada ou retomada a cargo de um requerente, transferir este último para o Estado‑Membro responsável.

45.

O artigo 29.o, n.o 1, primeiro parágrafo, desse regulamento dispõe que a transferência se efetua em conformidade com o direito nacional do Estado‑Membro requerente, após concertação entre os Estados‑Membros envolvidos, logo que seja materialmente possível e, o mais tardar, no prazo de seis meses a contar da aceitação do pedido de tomada ou retomada a cargo da pessoa em causa por outro Estado‑Membro ou da decisão final sobre o recurso ou revisão, nos casos em que exista efeito suspensivo.

46.

O artigo 29.o, n.o 2, do Regulamento Dublin III esclarece, todavia, que este prazo pode ser prorrogado, a título excecional, a fim de ter em conta o facto de ser materialmente impossível para o Estado‑Membro requerente proceder à transferência da pessoa em causa devido à sua retenção ou fuga. O referido prazo é então alargado para um ano, no máximo, se a transferência não tiver sido efetuada devido à retenção dessa pessoa, tendo este conceito sido definido no Acórdão de 31 de março de 2022, Bundesamt für Fremdenwesen und Asyl e o. (Internamento de um requerente de asilo num serviço de psiquiatria) ( 7 ), ou para dezoito meses, no máximo, em caso de fuga, tendo o conceito de «fuga» sido esclarecido no Acórdão de 19 de março de 2019, Jawo ( 8 ).

47.

O artigo 29.o, n.o 2, desse regulamento dispõe, além disso, que, decorridos esses prazos, o Estado‑Membro responsável fica isento da sua obrigação de tomada ou retomada a cargo da pessoa em causa e que a responsabilidade é transferida para o Estado‑Membro requerente. Em conformidade com a jurisprudência do Tribunal de Justiça, este último deixa de estar habilitado a proceder à transferência e deve, pelo contrário, tomar oficiosamente as providências necessárias para admitir a responsabilidade do primeiro Estado‑Membro e para, sem demora, dar início à análise do pedido de proteção internacional ( 9 ).

48.

A redação dessa disposição está consagrada no âmbito de um procedimento de retomada a cargo típico entre dois Estados‑Membros, por um lado, o Estado‑Membro requerido e, por outro, o Estado‑Membro requerente, ao qual o requerente apresentou um novo pedido de proteção internacional.

49.

Ora, as questões prejudiciais submetidas pelo órgão jurisdicional de reenvio inscrevem‑se em quadros diferentes, uma vez que dizem respeito às modalidades de transferência de um requerente que, devido à multiplicidade dos pedidos de proteção internacional que apresentou, está sujeito a procedimentos de retomada a cargo, conduzidos sucessivamente por Estados‑Membros diferentes.

50.

Nenhuma disposição do Regulamento Dublin III ou do Regulamento n.o 1560/2003 prevê regras específicas para este caso, que é característico do fenómeno dos «movimentos secundários», através dos quais numerosos requerentes de proteção internacional se deslocam do Estado‑Membro responsável pelo tratamento do seu pedido para outros Estados‑Membros onde pretendem pedir proteção internacional e instalar‑se.

51.

Neste contexto, as disposições previstas no artigo 29.o do Regulamento Dublin III, relativas à tramitação do procedimento de transferência, parecem‑me demasiado circunscritas para dar uma resposta útil ao órgão jurisdicional de reenvio e, nomeadamente, para definir as modalidades que permitem, por um lado, manter um método claro, operacional e rápido para determinar o Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de proteção internacional e, por outro, prevenir os abusos decorrentes da deslocação de certos requerentes na União.

52.

Para o efeito, parece‑me essencial analisar os termos em que os Estados‑Membros envolvidos celebram um procedimento de retomada a cargo, estando estes termos previstos, nomeadamente, no artigo 20.o, n.o 5, e no artigo 23.o, n.o 1, do Regulamento Dublin III, bem como examinar a finalidade prosseguida pelo legislador da União nestas circunstâncias.

1. Termos em que o procedimento de retomada a cargo é definido no artigo 20.o, n.o 5, do Regulamento Dublin III

53.

Resulta da exposição dos factos dos processos principais que os requerentes apresentaram pela primeira vez os respetivos pedidos de proteção internacional num Estado‑Membro, a saber, a Itália nos processos C‑323/21 e C‑324/21 e a Áustria no processo C‑325/21, antes de se deslocarem para a União e de se dirigirem para o território de outros Estados‑Membros nos quais apresentaram sucessivamente outros pedidos de proteção internacional.

54.

Isto significa que os requerentes estão abrangidos pelo âmbito de aplicação do artigo 18.o, n.o 1, alíneas b) a d), do Regulamento Dublin III. Este artigo refere‑se a uma pessoa que, por um lado, apresentou um pedido de proteção internacional que está em fase de análise [alínea b)] ou que foi retirado pelo requerente quando estava em fase de análise [alínea c)], ou que foi indeferido [alínea d)] e que, por outro, apresentou um pedido noutro Estado‑Membro ou se encontra, sem possuir um título de residência, no território de outro Estado‑Membro ( 10 ).

55.

Além disso, tal significa que o primeiro Estado‑Membro no qual foi apresentado o pedido de proteção internacional, a saber, a Itália nos processos C‑323/21 e C‑324/21 e a Áustria no processo C‑325/21, é obrigado a retomar o requerente a cargo, em conformidade com o artigo 20.o, n.o 5, do Regulamento Dublin III.

56.

Com efeito, recordo que, em conformidade com o artigo 3.o, n.o 1, do Regulamento Dublin III, um pedido de proteção internacional apresentado por um nacional de um país terceiro no território de um dos Estados‑Membros, seja qual for, é, em princípio, analisado unicamente pelo Estado‑Membro designado como responsável segundo os critérios enunciados no capítulo III deste regulamento ( 11 ). No entanto, para além dos critérios enunciados no capítulo III do Regulamento Dublin III, o capítulo VI deste regulamento institui procedimentos de tomada e de retomada a cargo por outro Estado‑Membro que «contribuem igualmente, da mesma maneira que os critérios enunciados no capítulo III do referido regulamento, para determinar o Estado‑Membro responsável» ( 12 ).

57.

É este o caso das disposições enunciadas no artigo 20.o, n.o 5, do Regulamento Dublin III.

58.

Esse artigo 20.o diz respeito, como indica a sua epígrafe, ao início do procedimento de tomada e de retomada a cargo.

59.

O n.o 5 do referido artigo dispõe que o Estado‑Membro a que tiver sido apresentado pela primeira vez o pedido de proteção internacional é obrigado a retomar a cargo o requerente que, antes da conclusão do processo de determinação do Estado‑Membro responsável, tenha abandonado o território nacional e apresentado um pedido de proteção internacional noutro Estado‑Membro ( 13 ). A retoma a cargo do requerente tem como objetivo permitir ao Estado‑Membro no qual o pedido foi apresentado pela primeira vez «concluir o processo de determinação do Estado‑Membro responsável pela análise do pedido de proteção internacional», e não proceder à análise do pedido de proteção internacional ( 14 ).

60.

Em conformidade com a jurisprudência do Tribunal de Justiça, esta disposição também se aplica à situação em que um requerente retirou implicitamente o seu pedido ao abandonar o território do Estado‑Membro ao qual foi apresentado o pedido de proteção internacional pela primeira vez sem informar a autoridade nacional competente da sua vontade de renunciar a esse pedido e na qual, por conseguinte, o processo de determinação do Estado‑Membro responsável continua em curso ( 15 ).

61.

Além disso, o artigo 20.o, n.o 5, do Regulamento Dublin III prevê que o procedimento de retomada a cargo do requerente deve ser conduzido em conformidade com as condições enunciadas nos seus artigos 23.o, 24.o, 25.o e 29.o

62.

Nos termos do artigo 23.o, n.o 1, do referido regulamento, o Estado‑Membro requerente só pode apresentar um pedido de retomada a cargo se o Estado‑Membro requerido preencher os requisitos previstos no artigo 20.o, n.o 5, ou no artigo 18.o, n.o 1, alíneas b) a d), deste regulamento ( 16 ). Por conseguinte, a condução do procedimento de retomada a cargo pressupõe o preenchimento de dois requisitos cumulativos previstos pelo legislador da União no artigo 20.o, n.o 5, do Regulamento Dublin III: em primeiro lugar, o requerente deve ter apresentado o seu primeiro pedido de proteção internacional ao Estado‑Membro requerido e, em segundo lugar, este requerente deve encontrar‑se no território do Estado‑Membro requerente sem título de residência ou deve ter apresentado às autoridades nacionais deste último Estado um novo pedido de proteção internacional.

63.

O legislador da União não prevê a situação em que os requisitos estabelecidos para a condução deste procedimento deixam de estar preenchidos devido à ocorrência de factos supervenientes ao seu início.

64.

Do artigo 29.o do Regulamento Dublin III decorre apenas que o procedimento de retomada a cargo termina de três formas: a transferência foi efetuada de acordo com as modalidades e nos prazos estabelecidos neste artigo (n.o 1), ou a transferência não pôde ser efetuada nos prazos aplicáveis, por exemplo, devido à retenção ou à fuga da pessoa em causa (n.o 2), ou a decisão de transferência foi anulada por recurso ou revista apresentado pelo requerente, em conformidade com o artigo 27.o, n.o 1, deste regulamento (n.o 3).

65.

Ora, na minha opinião, nada impede que a «concertação» entre os Estados‑Membros envolvidos com vista a definir as modalidades da transferência, prevista no artigo 29.o, n.o 1, primeiro parágrafo, do Regulamento Dublin III, leve à conclusão de que o procedimento de retomada a cargo que foi anteriormente iniciado ficou desprovido do seu objeto e que caduca a contar da aceitação pelo Estado‑Membro requerido de um novo pedido de retomada a cargo do requerente. Efetivamente, em situações como as que estão em causa nos processos principais, embora o primeiro procedimento de retomada a cargo tenha sido validamente iniciado após concertação entre os Estados‑Membros envolvidos, os acontecimentos posteriores a esta concertação, a saber, a partida do requerente do território do Estado‑Membro requerente e a sua permanência no território de outro Estado‑Membro no qual apresentou um novo pedido de proteção internacional, privam este primeiro procedimento de um elemento essencial à sua validade. Com efeito, contrariamente aos requisitos enunciados no artigo 20.o, n.o 5, do Regulamento Dublin III, o requerente já não se encontra no território do Estado‑Membro requerente e, devido à sua partida, o pedido de proteção internacional que apresentou deve considerar‑se retirado. Recordo que o Tribunal de Justiça declarou que a partida do requerente do território de um Estado‑Membro no qual apresentou um pedido de proteção internacional deve ser equiparada, para efeitos da aplicação do artigo 20.o, n.o 5, deste regulamento, a uma retirada implícita desse pedido ( 17 ). No meu entender, esta conclusão impõe‑se, sobretudo em situações como as que estão em causa nos processos principais, em que o requerente não só abandonou o território do Estado‑Membro requerente, como também se dirigiu para o território de outro Estado‑Membro ao qual apresentou um novo pedido de proteção internacional.

66.

Daqui decorre que os requisitos estabelecidos no artigo 20.o, n.o 5, do Regulamento Dublin III, para efeitos da retomada a cargo do requerente, já não estão preenchidos.

67.

A este respeito, considero que o Estado‑Membro requerido, na medida em que intervém em dois procedimentos de retomada a cargo, iniciados num curto espaço de tempo e a respeito da mesma pessoa por dois Estados‑Membros diferentes, está em condições de acordar com o primeiro Estado‑Membro requerente a caducidade do primeiro procedimento de retomada a cargo que celebraram.

68.

Com efeito, o Estado‑Membro requerido é informado do facto de o primeiro Estado‑Membro requerente estar impossibilitado de proceder, devido à fuga do requerente, à execução da transferência nos prazos e segundo as modalidades que tinham acordado conjuntamente, quando, ao mesmo tempo, é chamado a decidir sobre o segundo pedido de retomada a cargo dirigido pelo segundo Estado‑Membro e no território do qual se encontra o requerente.

69.

Tendo em conta a natureza das informações que o Estado‑Membro requerido é chamado a conhecer, no que respeita, nomeadamente, à localização do requerente e ao estado dos procedimentos iniciados a seu respeito, considero que não se pode comprometer validamente junto do segundo Estado‑Membro requerente a retomar o requerente a cargo e, assim, acordar as modalidades da transferência deste último, sem acordar com o primeiro Estado‑Membro requerente a caducidade dos compromissos anteriormente celebrados no âmbito do primeiro procedimento de retomada a cargo. Como já referi anteriormente, esta interpretação não parece contrariar a redação do artigo 29.o do Regulamento Dublin III.

70.

Além disso, considero que as informações comunicadas no âmbito do segundo procedimento de retomada a cargo, relativas à localização do requerente e ao estado dos procedimentos iniciados a seu respeito, estão abrangidas pelas informações que o Estado‑Membro requerido pode partilhar com os Estados‑Membros envolvidos, em conformidade com o artigo 34.o, n.o 1, do Regulamento Dublin III. Este artigo, que figura no capítulo VII deste regulamento, intitulado «Cooperação administrativa», prevê, no seu n.o 2, alíneas d), f) e g), que estas informações podem dizer respeito aos locais de estadia e aos itinerários de viagem do requerente, bem à data de apresentação de um eventual pedido de proteção internacional anterior, à data de apresentação do pedido atual, à situação do processo e, eventualmente, ao teor da decisão tomada.

71.

A caducidade do primeiro procedimento de retomada a cargo faz igualmente parte dos objetivos prosseguidos pelo legislador da União no âmbito do Regulamento Dublin III.

1. Finalidade do Regulamento Dublin III

72.

Como resulta dos seus considerandos 4 e 5, o Regulamento Dublin III tem como finalidade estabelecer um método que se pretende «claro e operacional» para determinar o Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de proteção internacional, método que deve se basear em critérios «objetivos e equitativos, tanto para os Estados‑Membros como para as pessoas em causa». Este método deve, acima de tudo, permitir «uma determinação rápida do Estado‑Membro responsável, por forma a […] não comprometer o objetivo de celeridade no tratamento dos pedidos de proteção internacional». O legislador da União pretende, assim, racionalizar o tratamento destes pedidos, garantindo aos requerentes o exame do mérito do seu pedido por um único Estado‑Membro determinado de forma clara. Através da criação de mecanismos e de critérios uniformes para a determinação do Estado‑Membro responsável, este legislador visa, além disso, prevenir os movimentos secundários dos nacionais de países terceiros que tenham apresentado um pedido de proteção internacional num Estado‑Membro para outros Estados‑Membros ( 18 ).

73.

Ora, é evidente que dois procedimentos de retomada a cargo não podem ser conduzidos validamente ao mesmo tempo por Estados‑Membros diferentes a respeito da mesma pessoa, sob pena de violar a finalidade do Regulamento Dublin III.

74.

Em primeiro lugar, a condução do primeiro procedimento de retomada a cargo até ao seu termo após a partida da pessoa em causa do território do Estado‑Membro requerente, e a transferência de responsabilidade que este procedimento pode implicar, não garante de modo algum a celeridade do referido procedimento. Pelo contrário, a condução deste primeiro procedimento, até ao seu termo, por um lado, seria suscetível de limitar significativamente a eficácia pretendida pelo legislador da União e, por outro, poderia incitar as pessoas em causa a abandonarem o território do Estado‑Membro requerente com o objetivo de impedir a sua transferência para o Estado‑Membro responsável ou de prolongar a sua permanência na União, beneficiando de condições materiais de acolhimento.

75.

A transferência de responsabilidade exigida ao abrigo do artigo 29.o, n.o 2, primeiro período, do Regulamento Dublin III equivale a determinar o Estado‑Membro responsável pela análise do pedido através de uma «sanção» imposta ao Estado‑Membro requerente, quando este não tiver executado a transferência que ele próprio pediu. A partir do momento em que o Estado‑Membro requerente não cumpre os prazos fixados nesta disposição, a transferência de responsabilidade é automática e opera independentemente das circunstâncias do caso em apreço.

76.

Todavia, em situações como as que estão em causa nos processos principais, o automatismo deste mecanismo não permite ter em conta o facto de o requerente ter abandonado o território do primeiro Estado‑Membro requerente, violando deste modo as obrigações de cooperação que lhe incumbem. Por conseguinte, as autoridades competentes deste Estado não estão em condições de o transferir, segundo as modalidades e nos prazos enunciados no artigo 29.o, n.os 1 e 2, do Regulamento Dublin III, nem estão em condições de efetuar a análise do seu pedido de proteção internacional em caso de devolução da responsabilidade, contrariamente às autoridades competentes do segundo Estado‑Membro requerente.

77.

Com efeito, recordo que tanto o procedimento de transferência como o da análise do pedido de proteção internacional implicam que o requerente esteja à disposição das autoridades nacionais competentes.

78.

Ora, embora essas autoridades possam localizar o requerente devido às formalidades que este teve de cumprir com vista à apresentação do seu pedido de proteção internacional noutro Estado‑Membro (em especial, graças à inscrição no sistema Eurodac) ( 19 ), estas não dispõem, em contrapartida, de nenhuma competência para proceder à execução da transferência desta pessoa, em conformidade com o artigo 29.o do Regulamento Dublin III, dado que a referida pessoa se encontra fora do território nacional e que o procedimento instituído por este regulamento não tem natureza penal.

79.

Do mesmo modo, o procedimento de análise de um pedido de proteção internacional implica que o requerente se sujeite às obrigações que lhe são impostas tanto pela Diretiva 2013/32 como pela Diretiva 2013/33/UE ( 20 ), para efeitos do tratamento célere e do seguimento eficaz do seu pedido de proteção internacional. Entre estas obrigações constam a de residir no local indicado e a de se apresentar regularmente às autoridades nacionais competentes.

80.

Nestas circunstâncias, não vejo nenhuma razão que permita justificar a continuidade deste procedimento e, em especial, a prorrogação do prazo de transferência, estando este último condenado ao fracasso.

81.

Em segundo lugar, a continuidade do primeiro procedimento de retomada a cargo não contribui para a manutenção do método claro e operacional que o legislador da União pretende estabelecer no âmbito do Regulamento Dublin III.

82.

Por um lado, o automatismo da transferência de responsabilidade não permite ter em conta o facto de esta transferência dizer respeito à análise de um pedido de proteção internacional que é um pedido provavelmente idêntico ao que foi apresentado anteriormente no primeiro Estado‑Membro e ao apresentado posteriormente noutro Estado‑Membro.

83.

Por outro lado, a tramitação sucessiva destes dois procedimentos comporta, por força da regra da devolução de responsabilidade, enunciada nomeadamente no artigo 29.o, n.o 2, primeiro período, do Regulamento Dublin III, dificuldades suscetíveis de entravar o funcionamento efetivo do «sistema de Dublin» ( 21 ).

84.

Assim, o segundo procedimento de retomada a cargo é iniciado quando o primeiro procedimento de retomada a cargo está em curso, e pode conduzir a uma transferência de responsabilidade para o primeiro Estado‑Membro requerente, caso os prazos enunciados no artigo 29.o, n.o 2, do Regulamento Dublin III tenham decorrido. Por conseguinte, atendendo ao prazo de dois meses em que o segundo Estado‑Membro requerente é obrigado a formular o seu pedido de retomada a cargo, este pedido será apresentado e, se for caso disso, aceite pelo Estado‑Membro requerido, quando a responsabilidade deste último não está definitivamente fixada, uma vez que pode ser transferida para o primeiro Estado‑Membro requerente por força da devolução da responsabilidade. Tal mecanismo expõe as autoridades nacionais dos Estados‑Membros envolvidos a incertezas quanto às responsabilidades que lhes incumbem, tanto mais que o sistema Eurodac não permite obter informações sobre a situação dos procedimentos de tomada a cargo ou de retomada a cargo conduzidos nos outros Estados‑Membros. Como ilustram os presentes processos, a autoridade competente do segundo Estado‑Membro requerente sujeita‑se, assim, a que a decisão de transferência que notificou ao requerente seja objeto de recurso em conformidade com o artigo 27.o, n.o 1, do Regulamento Dublin III e, sendo caso disso, a que a transferência que efetuou seja anulada, estando este Estado obrigado, em conformidade com o artigo 29.o, n.o 3, do referido regulamento, a retomar imediatamente essa pessoa a cargo.

85.

Na minha opinião, tal mecanismo pode conduzir à paralisia do sistema de Dublin, incentivando paradoxalmente a circulação dos requerentes de proteção internacional na União.

86.

Por conseguinte, nestas circunstâncias, parece‑me essencial preservar o efeito útil do artigo 20.o, n.o 5, do Regulamento Dublin III, mantendo o «estatuto especial» e o «papel específico» que o legislador da União atribui ao Estado‑Membro ao qual foi apresentado pela primeira vez o pedido de proteção internacional ( 22 ). Para tal, em situações como as que estão em causa nos processos principais, que se caracterizam pela apresentação de múltiplos pedidos de proteção internacional em diferentes Estados‑Membros, é necessário estabelecer um mecanismo ordenado e controlado, de modo a evitar que o papel e a missão de cada um sejam constantemente postos em causa devido às deslocações do requerente.

87.

Em terceiro lugar, considero importante destacar o arsenal jurídico de que dispõe o segundo Estado‑Membro requerente para garantir um procedimento de retomada a cargo muito mais célere e eficaz do que o procedimento que o primeiro Estado‑Membro requerente está em condições de conduzir, devido à presença da pessoa em causa no seu território. É evidente que, como confirma a regra de atribuição de competências, prevista no artigo 20.o, n.o 4, do Regulamento Dublin III, a presença da pessoa em causa no território do Estado‑Membro constitui um elemento essencial para efeitos da condução do procedimento de retomada a cargo ( 23 ).

88.

Assim, recordo que a apresentação de um novo pedido de proteção internacional implica, no âmbito do Sistema Europeu Comum de Asilo, a aplicação de um quadro legislativo vinculativo, que impõe ao Estado‑Membro em causa obrigações jurídicas definidas tanto no Regulamento Dublin III como na Diretiva 2013/32 e na Diretiva 2013/33.

89.

Antes de mais, este Estado‑Membro é obrigado, em conformidade com o artigo 4.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento Dublin III e a partir do momento em que é apresentado um pedido de proteção internacional, na aceção do artigo 20.o, n.o 2, deste regulamento, a informar o requerente, por escrito e numa língua que compreenda, das consequências associadas à apresentação do seu novo pedido de proteção internacional, bem como das consequências da sua deslocação de um Estado‑Membro para outro durante as fases de determinação do Estado‑Membro responsável e de análise do pedido de proteção internacional. Neste contexto, considero que as autoridades nacionais competentes podem informar este requerente da situação dos procedimentos que foram iniciados a seu respeito e das consequências associadas à apresentação de múltiplos pedidos de proteção internacional na União.

90.

Em seguida, o Estado‑Membro requerente deve, ao abrigo do artigo 23.o, n.o 1, do Regulamento Dublin III, requerer ao Estado‑Membro responsável, ao abrigo do artigo 20.o, n.o 5, e do artigo 18.o, n.o 1, deste regulamento, que retome o requerente a seu cargo nos prazos e nas condições enunciadas no referido regulamento. Para garantir a efetividade do procedimento de retomada a cargo, o Estado‑Membro requerente pode determinar, em conformidade com o artigo 7.o, n.o 2, da Diretiva 2013/33, o lugar onde o requerente deve residir e exigir, em aplicação do artigo 13.o, n.o 2, alínea a), da Diretiva 2013/32, que este último se manifeste junto das autoridades competentes ou que se apresente pessoalmente, de imediato ou numa data precisa.

91.

Por último, esse Estado‑Membro pode decidir, tendo em conta a existência de um risco significativo de fuga do requerente e sem prejuízo do respeito pelos direitos e garantias que lhe são concedidos, recorrer a medidas coercivas destinadas a garantir a eficácia do procedimento de transferência, como a retenção, segundo os requisitos previstos no artigo 8.o, n.o 3, alínea f), da Diretiva 2013/33 e no artigo 28.o, n.o 2, do Regulamento Dublin III.

92.

À luz de todos estes elementos e, em especial, dos requisitos previstos no artigo 20.o, n.o 5, do Regulamento Dublin III para efeitos da condução de um procedimento de retomada a cargo e dos objetivos prosseguidos pelo legislador da União, considero essencial que, em situações como as que estão em causa nos processos principais, se declare a caducidade do primeiro procedimento de retomada a cargo.

93.

Tendo em conta estas considerações, proponho ao Tribunal de Justiça que declare que o artigo 29.o, n.os 1 e 2, do Regulamento Dublin III deve ser interpretado no sentido de que, quando um Estado‑Membro, no território do qual foi apresentado um pedido de proteção internacional pela primeira vez, é requerido, com fundamento no artigo 23.o, n.o 1, deste regulamento, em dois procedimentos de retomada a cargo iniciados sucessivamente por dois Estados‑Membros diferentes a respeito do mesmo requerente, o Estado‑Membro requerido e o primeiro Estado‑Membro requerente devem, se este último não puder executar a transferência do requerente segundo as modalidades e nos prazos enunciados no artigo 29.o do referido regulamento devido à partida desta pessoa do território do primeiro Estado‑Membro, declarar a caducidade desse primeiro procedimento de retomada a cargo a contar da aceitação pelo Estado‑Membro do segundo pedido de retomada a cargo formulado pelo segundo Estado‑Membro requerente.

B.   Quanto à segunda questão prejudicial nos processos C‑323/21 e C‑325/21

94.

Com a sua segunda questão prejudicial nos processos C‑323/21 e C‑325/21, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta ao Tribunal de Justiça, em substância, se o artigo 27.o, n.o 1, do Regulamento Dublin III deve ser interpretado no sentido de que, quando um segundo procedimento de retomada a cargo é iniciado a respeito da mesma pessoa num Estado‑Membro diferente daquele que conduziu o primeiro procedimento de retomada a cargo, o requerente pode, no âmbito do recurso que interpôs contra a decisão de transferência adotada pelo segundo Estado‑Membro requerente, invocar o decurso dos prazos enunciados no artigo 29.o, n.os 1 e 2, deste regulamento e a transferência de responsabilidade que daí resulta.

95.

Atendendo à proposta de resposta à primeira questão prejudicial, considero que não há que responder a esta segunda questão prejudicial.

V. Conclusão

96.

Tendo em conta todas as considerações anteriores, proponho ao Tribunal de Justiça que responda às questões prejudiciais submetidas pelo Raad van State (Conselho de Estado, em formação jurisdicional, Países Baixos) nos processos C‑323/21, C‑324/21 e C‑325/21 do seguinte modo:

O artigo 29.o, n.os 1 e 2, do Regulamento (UE) n.o 604/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, que estabelece os critérios e mecanismos de determinação do Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de proteção internacional apresentado num dos Estados‑Membros por um nacional de um país terceiro ou por um apátrida,

deve ser interpretado no sentido de que:

quando um Estado‑Membro, no território do qual foi apresentado um pedido de proteção internacional pela primeira vez, é requerido, com fundamento no artigo 23.o, n.o 1, deste regulamento, em dois procedimentos de retomada a cargo iniciados sucessivamente por dois Estados‑Membros diferentes a respeito do mesmo requerente, o Estado‑Membro requerido e o primeiro Estado‑Membro requerente devem, se este último não puder executar a transferência do requerente segundo as modalidades e nos prazos enunciados no artigo 29.o do referido regulamento devido à partida desta pessoa do território do primeiro Estado‑Membro, declarar a caducidade desse primeiro procedimento de retomada a cargo a contar da aceitação pelo Estado‑Membro do segundo pedido de retomada a cargo formulado pelo segundo Estado‑Membro requerente.


( 1 ) Língua original: francês.

( 2 ) JO 2013, L 180, p. 31, a seguir «Regulamento Dublin III».

( 3 ) Regulamento (CE) n.o 1560/2003 da Comissão, de 2 de setembro de 2003, relativo às modalidades de aplicação do Regulamento (CE) n.o 343/2003 do Conselho, que estabelece os critérios e mecanismos de determinação do Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de asilo apresentado num dos Estados‑Membros por um nacional de um país terceiro (JO 2003, L 222, p. 3), conforme alterado pelo Regulamento de Execução (UE) n.o 118/2014 da Comissão, de 30 de janeiro de 2014 (JO 2014, L 39, p. 1) (a seguir «Regulamento n.o 1560/2003»).

( 4 ) V., neste sentido, Acórdão de 19 de março de 2019, Jawo (C‑163/17, EU:C:2019:218, n.os 58 e 59). V., também, considerandos 4 e 5 do Regulamento Dublin III.

( 5 ) V. Proposta de Regulamento do Conselho que estabelece os critérios e mecanismos de determinação do Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de asilo apresentado num dos Estados‑Membros por um nacional de um país terceiro, apresentada pela Comissão Europeia em 26 de julho de 2001 [COM(2001) 447 final, ponto 2.1].

( 6 ) A primeira questão prejudicial submetida no processo C‑323/21 distingue‑se sobretudo, na sua formulação, da questão única submetida no processo C‑324/21 e da primeira questão submetida ao Tribunal de Justiça no processo C‑325/21, uma vez que o órgão jurisdicional de reenvio se centra na interpretação do conceito de «Estado‑Membro requerente», utilizado no artigo 29.o, n.o 2, do Regulamento Dublin III. Em especial, questiona‑se se, na situação em que o Estado‑Membro requerente não pode executar a transferência do requerente pelo facto de este ter abandonado o território nacional para se deslocar para outro Estado‑Membro no qual apresentou um novo pedido de proteção internacional e em cujo território se encontra, o conceito de «Estado‑Membro requerente» (utilizado no artigo 29.o, n.o 2, deste regulamento) visa o último Estado‑Membro ao qual foi apresentado o novo pedido de proteção internacional e em consequência do qual foi apresentado um novo pedido de retomada a cargo do requerente.

( 7 ) C‑231/21, EU:C:2022:237 (n.os 55 e 58).

( 8 ) C‑163/17, EU:C:2019:218 (n.os 56 e 57).

( 9 ) V., a este respeito, Acórdão de 25 de outubro de 2017, Shiri (C‑201/16, EU:C:2017:805, n.o 43).

( 10 ) V., nomeadamente, Acórdão de 2 de abril de 2019, H. e R. (C‑582/17 e C‑583/17, a seguir «Acórdão H. e R.», EU:C:2019:280, n.o 51, e jurisprudência referida).

( 11 ) V. Acórdão de 16 de fevereiro de 2017, C. K. e o. (C‑578/16 PPU, EU:C:2017:127, n.o 56).

( 12 ) Acórdão de 25 de outubro de 2017, Shiri (C‑201/16, EU:C:2017:805, n.o 39). No Acórdão de 26 de julho de 2017, Mengesteab (C‑670/16, EU:C:2017:587), o Tribunal de Justiça declarou que, «embora as disposições do artigo 21.o, n.o 1, [do Regulamento Dublin III, relativas à apresentação de um pedido de tomada a cargo] visem regular o procedimento de tomada a cargo, contribuem também, à semelhança dos critérios enunciados no capítulo III do referido regulamento, para determinar o Estado‑Membro responsável, na aceção do mesmo regulamento» (n.o 53).

( 13 ) Além disso, resulta do artigo 3.o, n.o 2, do Regulamento Dublin III que, caso o Estado‑Membro responsável não possa ser designado com base nos critérios enunciados neste regulamento, é responsável pela análise do pedido de proteção internacional o primeiro Estado‑Membro em que o pedido tenha sido apresentado.

( 14 ) V. Acórdão H. e R. (n.os 59 a 64).

( 15 ) V. Acórdão H. e R. (n.os 47 a 50).

( 16 ) V. Acórdão H. e R. (n.os 59 a 61).

( 17 ) V. Acórdão H. e R. (n.o 50). Sublinho igualmente que, nos termos do artigo 28.o, n.o 1, segundo parágrafo, da Diretiva 2013/32/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, relativa a procedimentos comuns de concessão e retirada do estatuto de proteção internacional (JO 2013, L 180, p. 60, a seguir «Diretiva 2013/32»), sob a epígrafe «Procedimento em caso de retirada tácita ou desistência do pedido», os Estados‑Membros «podem presumir que o requerente retirou tacitamente ou desistiu do pedido de proteção internacional, em especial quando se determinar que o requerente […] desapareceu ou se ausentou sem autorização do local onde vivia ou estava detido, sem ter contactado as autoridades competentes num prazo razoável, ou não cumpriu obrigações de se apresentar ou outras obrigações de comunicar, num prazo razoável, salvo se o requerente demonstrar que isso se deveu a razões estranhas à sua vontade» [alínea b)].

( 18 ) V. Acórdão de 10 de dezembro de 2013, Abdullahi (C‑394/12, EU:C:2013:813, n.o 53 e jurisprudência referida). V., também, Acórdão H. e R. (n.o 77 e jurisprudência referida).

( 19 ) Com vista, nomeadamente, a assegurar uma aplicação efetiva destas disposições, o artigo 9.o, n.o 1, do Regulamento (UE) n.o 603/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, relativo à criação do sistema «Eurodac» de comparação de impressões digitais para efeitos da aplicação efetiva do Regulamento (UE) n.o 604/2013, que estabelece os critérios e mecanismos de determinação do Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de proteção internacional apresentado num dos Estados‑Membros por um nacional de um país terceiro ou um apátrida, e de pedidos de comparação com os dados Eurodac apresentados pelas autoridades responsáveis dos Estados‑Membros e pela Europol para fins de aplicação da lei e que altera o Regulamento (UE) n.o 1077/2011 que cria uma Agência europeia para a gestão operacional de sistemas informáticos de grande escala no espaço de liberdade, segurança e justiça (JO 2013, L 180, p. 1) prevê que cada Estado‑Membro recolhe sem demora as impressões digitais de todos os dedos de cada requerente de proteção internacional e transmite‑as o mais rapidamente possível e no prazo de 72 horas a contar da apresentação do pedido de proteção internacional, tal como definido no artigo 20.o, n.o 2, do Regulamento Dublin III. V. também artigo 6.o, n.o 4, da Diretiva 2013/32.

( 20 ) Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, que estabelece normas em matéria de acolhimento dos requerentes de proteção internacional (JO 2013, L 180, p. 96).

( 21 ) O «sistema de Dublin» abrange o Regulamento Dublin III, o Regulamento n.o 603/2013 e o Regulamento n.o 1560/2003.

( 22 ) V. Acórdão de 26 de julho de 2017, Mengesteab (C‑670/16, EU:C:2017:587, n.o 93) e Acórdão H. e R. (n.o 64).

( 23 ) Além disso, o legislador da União faz deste elemento um critério decisivo no artigo 20.o, n.o 4, do Regulamento Dublin III. Este artigo prevê que, se um pedido de proteção internacional for apresentado num Estado‑Membro diferente daquele em que se encontra o requerente, a determinação do Estado‑Membro responsável incumbe a este último Estado, que é considerado, para efeitos deste regulamento, como o Estado‑Membro ao qual foi apresentado o pedido de proteção internacional. Neste caso, o requerente deve ser informado por escrito desta alteração e da data em que a mesma ocorreu, sendo que este requisito consta das disposições enunciadas no artigo 4.o, n.o 1, alínea a), e n.o 2, do Regulamento Dublin III.

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