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Document 62020TJ0742

    Acórdão do Tribunal Geral (Sétima Secção) de 15 de fevereiro de 2023 (Extratos).
    UPL Europe Ltd e Indofil Industries (Netherlands) BV contra Comissão Europeia.
    Produtos fitofarmacêuticos — Substância ativa mancozebe — Não renovação da aprovação — Regulamento (CE) n.o 1107/2009 e Regulamento de Execução (UE) n.o 844/2012 — Procedimento de avaliação do pedido de renovação da aprovação de uma substância ativa — Designação de um novo Estado‑Membro relator devido à retirada do antigo Estado‑Membro relator da União — Direitos de defesa — Princípio da boa administração — Erro manifesto de apreciação — Procedimento de classificação e rotulagem harmonizadas — Regulamento (CE) n.o 1272/2008 — Confiança legítima.
    Processo T-742/20.

    ECLI identifier: ECLI:EU:T:2023:74

     ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Sétima Secção)

    15 de fevereiro de 2023 ( *1 )

    «Produtos fitofarmacêuticos — Substância ativa mancozebe — Não renovação da aprovação — Regulamento (CE) n.o 1107/2009 e Regulamento de Execução (UE) n.o 844/2012 — Procedimento de avaliação do pedido de renovação da aprovação de uma substância ativa — Designação de um novo Estado‑Membro relator devido à retirada do antigo Estado‑Membro relator da União — Direitos de defesa — Princípio da boa administração — Erro manifesto de apreciação — Procedimento de classificação e rotulagem harmonizadas — Regulamento (CE) n.o 1272/2008 — Confiança legítima»

    No processo T‑742/20,

    UPL Europe Ltd, com sede em Warrington (Reino Unido),

    Indofil Industries (Netherlands) BV, com sede em Amesterdão (Países Baixos),

    representadas por C. Mereu e P. Sellar, advogados,

    recorrentes,

    contra

    Comissão Europeia, representada por A. Dawes, G. Koleva e F. Castilla Contreras, na qualidade de agentes,

    recorrida,

    O TRIBUNAL GERAL (Sétima Secção),

    composto, nas deliberações, por R. da Silva Passos, presidente, V. Valančius e I. Reine (relatora), juízes,

    secretário: I. Kurme, administradora,

    vistos os autos,

    após a audiência de 30 de junho de 2022,

    profere o presente

    Acórdão ( 1 )

    1

    Com o seu recurso baseado no artigo 263.o TFUE, as recorrentes, UPL Europe Ltd e Indofil Industries (Netherlands) BV, pedem a anulação do Regulamento de Execução (UE) 2020/2087 da Comissão, de 14 de dezembro de 2020, relativo à não renovação da aprovação da substância ativa mancozebe em conformidade com o Regulamento (CE) n.o 1107/2009 do Parlamento Europeu e do Conselho relativo à colocação dos produtos fitofarmacêuticos no mercado, e que altera o anexo do Regulamento de Execução (UE) n.o 540/2011 da Comissão (JO 2020, L 423, p. 50, a seguir «regulamento de execução impugnado»).

    [Omissis]

    II. Pedidos das partes

    51

    As recorrentes concluem pedindo que o Tribunal Geral se digne:

    anular o regulamento de execução impugnado;

    condenar a Comissão nas despesas.

    52

    A Comissão conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

    negar provimento ao recurso;

    condenar as recorrentes nas despesas.

    III. Questão de direito

    [Omissis]

    B.   Quanto ao primeiro e segundo fundamentos, relativos à preterição de formalidades essenciais e à violação dos direitos de defesa das recorrentes

    [Omissis]

    2. Quanto à alegação de inobservância do procedimento de renovação previsto no Regulamento de Execução n.o 844/2012

    a) Quanto às alegadas faltas de consulta pública sobre a avaliação do novo EMR [Estado‑Membro Relator] e de conclusões da EFSA [Autoridade Europeia para a Segurança dos Alimentos] sobre essa avaliação

    95

    As recorrentes sustentam, em substância, que a escolha da Comissão de prosseguir o procedimento de renovação do mancozebe, sem submeter a avaliação do novo EMR à consulta pública e sem assegurar que a EFSA apresentasse as suas conclusões sobre essa avaliação, teve o efeito de o regulamento de execução impugnado se basear numa avaliação incompleta e, por conseguinte, cientificamente não fiável, o que implica que a Comissão excedeu os seus poderes regulamentares de gestor dos riscos e usurpou o mandato de avaliador dos riscos da EFSA.

    96

    A título preliminar, refira‑se que o Regulamento de Execução n.o 844/2012, que aprova nomeadamente as regras das diversas etapas do procedimento de renovação de uma substância ativa, incluindo a da sua avaliação pelo EMR (v. n.o 59, supra), não contém nenhuma disposição relativa à tramitação dessas etapas em caso de designação de um novo EMR durante esse procedimento.

    97

    Assim, no silêncio do Regulamento de Execução n.o 844/2012 quanto à tramitação do procedimento de renovação de uma substância ativa em caso de designação de um novo EMR na pendência desse procedimento, não se pode considerar que a designação de um novo EMR exija que se recomece o processo de avaliação, previsto nos artigos 12.o e 13.o do mesmo regulamento de execução.

    98

    Além disso, resulta dos artigos 11.o a 14.o do Regulamento de Execução n.o 844/2012 (v. n.o 59, supra) que a avaliação do EMR no procedimento de renovação de uma substância constitui uma das suas etapas obrigatórias. Essa avaliação tem que ser imperativamente submetida à EFSA e ao requerente e ser sujeita a consulta pública seguida da adoção de conclusões da EFSA, a menos que a Comissão decida informá‑la de que essas conclusões não são necessárias (v. artigo 13.o, n.o 1, segundo parágrafo, do Regulamento de Execução n.o 844/2012).

    99

    No caso, a designação do novo EMR para a avaliação do mancozebe, em 1 de fevereiro de 2020, e a sua avaliação dessa substância ocorreram posteriormente à conclusão do processo de avaliação dos riscos do mancozebe pelo EMR inicial no seu projeto de RAR [relatório de avaliação da renovação] de setembro de 2017, conforme atualizado pelo projeto de RAR de março de 2019, e pela EFSA nas suas conclusões de 12 de junho de 2019 (v. n.os 17, 18 e 20, supra). Portanto, neste caso, as recorrentes já tinham tido a possibilidade de apresentar observações, em 16 de julho de 2019, fazendo assim uso dos seus direitos previstos no artigo 12.o, n.o 3, do Regulamento de Execução n.o 844/2012, sobre o projeto de RAR atualizado de março de 2019 e sobre as conclusões da EFSA de 12 de junho de 2019 (v. n.os 10 e 21, supra).

    100

    No entanto, as recorrentes consideram, no essencial, que, se tivessem tido a possibilidade de apresentar as suas observações sobre a avaliação do novo EMR, a saber, sobre o projeto atualizado de RAR de setembro de 2020, e se a Comissão tivesse pedido à EFSA que atualizasse as suas conclusões de 12 de junho de 2019, a Comissão teria possivelmente apresentado uma proposta diferente ao comité permanente. A este respeito, recordam que o novo EMR concluiu, no capítulo consagrado à saúde humana do seu relatório de setembro de 2020, pela utilização sem risco nas aplicações únicas da substância no domínio da exposição não alimentar (isto é, para os operadores, os trabalhadores e os residentes nas imediações). Além disso, no que respeita aos resíduos, esse relatório concluiu pela utilização sem risco, nomeadamente para os cereais, a vinha e as batatas.

    101

    A este respeito, há que lembrar que resulta do projeto de RAR de março de 2019 que o EMR inicial propôs que se concluísse que o mancozebe não preenchia os requisitos de aprovação previstos no artigo 4.o do Regulamento n.o 1107/2009, uma vez que o mancozebe era considerado um perturbador endócrino para o ser humano e existia um risco resultante de uma exposição não alimentar, bem como um risco para as aves e mamíferos, para os artrópodes não visados e para os organismos do solo (v. n.o 18, supra).

    102

    Do mesmo modo, nas suas conclusões de 12 de junho de 2019, a EFSA expressou certas preocupações específicas (v. n.o 44, supra). Com efeito, concluiu nomeadamente que o mancozebe estava classificado como tóxico para a reprodução da categoria 1B e que os novos critérios para identificação das propriedades desreguladoras do sistema endócrino se encontravam preenchidos no que se referia aos seres humanos e, muito provavelmente, aos organismos não visados. Concluiu ainda que as estimativas de exposição não alimentar excediam os valores de referência para as utilizações representativas no tomate, na batata, nos cereais e nas videiras. Entendeu, por conseguinte, que, para as utilizações representativas consideradas, a exposição não alimentar ao mancozebe também não podia ser considerada negligenciável no respeitante aos efeitos desreguladores do sistema endócrino nefastos para o homem (ponto 3.6.5 do anexo II do Regulamento n.o 1107/2009). A EFSA considerou igualmente que, tendo em conta as preocupações suscitadas, a derrogação prevista no artigo 4.o, n.o 7, do Regulamento n.o 1107/2009 não podia ser aplicada.

    103

    É certo que, na sua atualização do projeto de RAR em setembro de 2020, após a sua própria avaliação dos riscos da mancozebe, o novo EMR constatou que, alterando as BPA [boas práticas agrícolas] nos cereais e utilizando sacos hidrossolúveis, era possível concluir pela utilização sem risco para a saúde humana (isto é, para os operadores, os trabalhadores e os residentes nas imediações) (v. n.o 38, supra). Os recorrentes precisaram, nas suas respostas às medidas de organização do processo, que esta conclusão apenas dizia respeito à exposição não alimentar ao mancozebe.

    104

    Contudo, como indica a Comissão, sem impugnação das recorrentes, a avaliação do novo EMR chegou à mesma conclusão que a do EMR inicial no seu projeto de RAR de março de 2019, a saber, que o mancozebe não preenchia as condições de aprovação previstas no artigo 4.o do Regulamento n.o 1107/2009. Com efeito, na sua avaliação, o novo EMR indicou, nomeadamente, que o mancozebe era considerado um desregulador endócrino para o ser humano e para os organismos não visados e que existia um risco para as aves e para os mamíferos e para os artrópodes não visados (v. n.o 38, supra).

    105

    Como acima lembrado no n.o 98, no âmbito do procedimento de renovação de uma substância, cabe ao EMR e à EFSA efetuar uma avaliação científica. No caso, há que observar que a conclusão do novo EMR não é substancialmente diferente das conclusões da EFSA quanto a duas preocupações identificadas segundo as quais, por um lado, o mancozebe era considerado um perturbador endócrino para o ser humano e para os organismos não visados e, por outro, existia um risco para as aves e mamíferos e para os artrópodes não visados.

    106

    Daí resulta que estas preocupações já tinham sido avaliadas pelo EMR inicial e pela EFSA e que o novo EMR tinha adotado a mesma posição a esse respeito.

    107

    Além disso, na audiência, a Comissão alegou, sem impugnação das recorrentes a esse respeito, que cada risco identificado só por si era suficiente para a não renovação do mancozebe. É certo que a possibilidade de concluir por uma utilização sem riscos para a saúde humana no que respeita à exposição não alimentar ao mancozebe, identificada pelo novo EMR na sua avaliação (v. n.o 103, supra), podia significar, como indicaram as recorrentes durante o processo de renovação da substância em causa (v. n.o 39, supra), que elas podiam pedir para beneficiarem da exceção prevista no artigo 4.o, n.o 7, do Regulamento n.o 1107/2009. Todavia, a aplicação dessa exceção não ocorre na fase da avaliação científica, mas sim na fase de gestão do risco.

    108

    Ora, no processo de aprovação dos produtos fitofarmacêuticos a nível da União, como resulta do considerando 12 do Regulamento n.o 1107/2009, é a Comissão que assume o papel de gestão dos riscos e toma a decisão definitiva sobre uma substância ativa.

    109

    Assim, nas circunstâncias acima descritas nos n.os 99 a 108, e tendo em conta o amplo poder de apreciação reconhecido à Comissão pelo Regulamento n.o 1107/2009 para adotar medidas de proteção adequadas na fase de gestão dos riscos identificados na avaliação científica, a Comissão podia optar por prosseguir o procedimento de renovação do mancozebe sem submeter a avaliação do novo EMR à consulta pública e sem velar por que a EFSA apresentasse as suas conclusões sobre essa avaliação.

    110

    À luz destas considerações, há que rejeitar o argumento das recorrentes de que a Comissão excedeu os seus poderes regulamentares de gestor dos riscos e usurpou o mandato de avaliador dos riscos da EFSA. Além disso, também não pode prosperar o seu argumento quanto à prática habitual da Comissão que consiste em mandatar a EFSA para que esta atualize as suas conclusões. No caso, a Comissão cumpriu a sua função prevista pelo Regulamento n.o 1107/2009. Por outro lado, as recorrentes não precisam de que modo os quatro exemplos que invocam são comparáveis à situação no caso presente nem como permitiriam estes demonstrar que a escolha da Comissão, no caso presente, de prosseguir o processo teria o efeito de o regulamento de execução impugnado se basear numa avaliação incompleta e, portanto, cientificamente não fiável dos riscos.

    111

    Em face do exposto, há que julgar improcedente a alegação de inobservância do procedimento de renovação pelo facto de a Comissão ter optado por prosseguir o procedimento de renovação do mancozebe sem submeter a avaliação do novo EMR a consulta pública e sem zelar por que a EFSA apresente as suas conclusões sobre essa avaliação.

    b) Quanto à alegada falta de consulta pública sobre a eventual versão atualizada das conclusões da EFSA

    112

    As recorrentes esclarecem que o artigo 12.o, n.o 3, do Regulamento de Execução n.o 844/2012 exige uma consulta pública sobre a eventual versão atualizada das conclusões da EFSA.

    113

    Ora, como acertadamente refere a Comissão, esta disposição não exige que as conclusões da EFSA ou a sua versão atualizada sejam objeto de consulta pública, uma vez que esta apenas a impõe para o projeto de RAR. Por conseguinte, improcede esta alegação.

    c) Quanto à adoção pela Comissão do seu projeto de relatório de renovação de janeiro de 2020 antes do fim da avaliação pelo novo EMR

    114

    As recorrentes acusam a Comissão de ter elaborado o seu relatório de renovação em janeiro de 2020, antes do fim da avaliação pelo novo EMR. É certo que, antes do fim dessa avaliação e do termo do prazo fixado pela Comissão a este respeito, no início de março de 2020, esta adotou, em janeiro de 2020, um projeto de relatório de renovação nos termos do artigo 14.o do Regulamento de Execução n.o 844/2012. Transmitiu esse projeto às recorrentes em 16 de janeiro de 2020 para observações, concedendo‑lhes um prazo para esse efeito até 31 de janeiro de 2020, e apresentou o projeto de regulamento de execução ao comité permanente que continha a proposta de não renovação do mancozebe, para inscrição na ordem de trabalhos da reunião de 23 e 24 de março de 2020 (v. n.os 26, 31 e 32, supra).

    115

    No entanto, resulta dos autos que, mais tarde no procedimento de renovação do mancozebe, a saber, em outubro de 2020, a Comissão comunicou às recorrentes e ao comité permanente a versão atualizada do seu projeto de relatório de renovação na sequência da apresentação, pelo novo EMR, da versão atualizada do projeto de RAR de setembro de 2020 (v. n.os 38 a 42, supra).

    116

    Nestas circunstâncias, não se pode sustentar que a Comissão adotou o seu relatório de renovação antes de o novo EMR terminar a sua própria avaliação dos riscos. Por conseguinte, improcede esta alegação por não ter suporte nos factos.

    117

    Em conclusão, em face do exposto, há que julgar improcedente a alegação de inobservância do procedimento de renovação previsto pelo Regulamento de Execução n.o 844/2012 e, com ela, o primeiro fundamento.

    3. Quanto à alegada violação dos direitos de defesa das recorrentes

    118

    Refira‑se que os argumentos das recorrentes acima examinados nos n.os 95 a 111 se confundem, em substância, com os que apresentam no âmbito do seu segundo fundamento, relativo à violação dos seus direitos de defesa por não terem podido expressar‑se sobre o projeto de RAR de setembro de 2020, em conformidade com o artigo 12.o, n.o 1, do Regulamento de Execução n.o 844/2012. Com efeito, há que observar que as recorrentes não apresentam, no âmbito do segundo fundamento, qualquer elemento concreto quanto aos aspetos sobre os quais pretenderiam pronunciar‑se a esse respeito. Impugnam, novamente, o respeito da tramitação do processo após a elaboração do projeto de RAR de setembro de 2020 e, mais particularmente, a falta de consulta pública sobre este projeto de RAR, nos termos do artigo 12.o do Regulamento n.o 1107/2009. Por conseguinte, tendo em conta a conclusão a que acima se chegou no n.o 111, há que julgar igualmente improcedente o segundo fundamento.

    [Omissis]

    D.   Quanto ao quarto fundamento, relativo a erro manifesto de apreciação

    130

    As recorrentes alegam que a Comissão cometeu um erro manifesto de apreciação no processo de renovação do mancozebe por três razões.

    131

    Antes de mais, indicam que, no regulamento de execução impugnado, a Comissão adotou uma proposta de classificação baseada nas propriedades do metabolito ETU e não nas propriedades da própria substância. Assim, a Comissão integrou elementos desprovidos de pertinência no seu processo decisório ligado ao mancozebe. A este respeito, as recorrentes sustentam que resulta claramente do artigo 3.o, ponto 32, do Regulamento n.o 1107/2009 que os metabolitos não são um fator determinante no procedimento de renovação de uma substância ativa. Além disso, este critério da Comissão contradiz o princípio de que cada substância deve ser avaliada separadamente com base nas suas propriedades intrínsecas.

    132

    Seguidamente, as recorrentes acusam a Comissão de não ter tido em conta novos elementos importantes que apoiam a classificação do mancozebe como substância tóxica para a reprodução de categoria 2 no âmbito do processo CEH. Mais em particular, alegam e existência de falhas científicas cometidas na classificação do mancozebe como substância tóxica para a reprodução de categoria 1B e na notificação da República de Malta quanto à sua intenção de apresentar um novo processo de classificação dessa substância à ECHA [Agência Europeia dos Produtos Químicos] em março de 2020, que entendem confirmar uma classificação de categoria 2. As recorrentes invocam ainda atualizações posteriores do registo de intenções da ECHA, em 4 de maio e 13 de julho de 2020. Consideram igualmente que a Comissão ignorou os estudos recentes que invocaram nas suas observações sobre as conclusões da EFSA, quando esses estudos refutaram as conclusões de um estudo de 1980, no qual o CAR [Comité de Avaliação dos Riscos da ECHA] tinha baseado a sua proposta de classificação do mancozebe como substância tóxica para a reprodução de categoria 1B.

    133

    Por último, o parecer do CAR, que visa classificar esta substância como substância tóxica para a reprodução da categoria 1B, não é vinculativo, uma vez que só são juridicamente vinculativos os atos delegados que decidem sobre o procedimento de classificação de uma substância e publicados no Jornal Oficial da União Europeia.

    134

    A Comissão contesta os argumentos das recorrentes.

    135

    Antes de mais, há que examinar as alegações relativas, por um lado, à inexistência de caráter juridicamente vinculativo da classificação da mancozebe como substância tóxica para a reprodução da categoria 1B e, por outro, à omissão da Comissão de ter em conta novos elementos importantes no que respeita à classificação do mancozebe como substância tóxica.

    1. Quanto à alegação de inexistência de caráter juridicamente vinculativo da classificação do mancozebe como substância tóxica para a reprodução de categoria 1B

    136

    A título preliminar, refira‑se que a conclusão da EFSA, reproduzida no considerando 12 do regulamento de execução impugnado, de que o mancozebe «foi classificado como tóxico para a reprodução da categoria 1B» (v. n.o 44, supra), se baseou no parecer do CAR (v. n.o 47, supra), adotado em novembro de 2018 sobre a proposta do EMR inicial do mês de agosto de 2017 (v. n.o 45, supra), apresentada à ECHA nos termos do Regulamento n.o 1272/2008.

    137

    O Regulamento n.o 1272/2008 aprova, nomeadamente, as regras das diferentes etapas do procedimento de harmonização da classificação e rotulagem das substâncias. De acordo com o seu artigo 37.o, n.o 4, quando uma proposta de classificação for submetida à ECHA, o CAR, instituído em conformidade com o artigo 76.o, n.o 1, alínea c), do Regulamento (CE) n.o 1907/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de dezembro de 2006, relativo ao registo, avaliação, autorização e restrição de substâncias químicas (REACH), que cria a Agência Europeia dos Produtos Químicos, que altera a Diretiva 1999/45/CE e revoga o Regulamento (CEE) n.o 793/93 do Conselho e o Regulamento (CE) n.o 1488/94 da Comissão, bem como a Diretiva 76/769/CEE do Conselho e as Diretivas da Comissão 91/155/CEE, 93/67/CEE, 93/105/CE e 2000/21/CE (JO 2006, L 396, p. 1, retificativo JO 2007, L 136, p. 3), adota um parecer sobre essa proposta de classificação, parecer que a ECHA apresenta à Comissão com as observações recebidas das partes em causa. O n.o 5 do mesmo artigo prevê que, se a Comissão considerar que a harmonização da classificação da substância em causa é adequada, apresentará um projeto de decisão relativo à inclusão dessa substância e dos elementos de classificação pertinentes na lista das classificações harmonizadas de substâncias perigosas.

    138

    Como indicam, em substância, as recorrentes, o parecer do CAR é apenas uma recomendação no âmbito do procedimento de classificação e rotulagem harmonizadas de uma substância ativa, uma vez que só os atos delegados adotados no âmbito do procedimento de classificação de uma substância e publicados no Jornal Oficial são juridicamente vinculativos. Por outro lado, como resulta igualmente das informações disponíveis nos autos, no momento da adoção do regulamento de execução impugnado em 14 de dezembro de 2020, nenhum ato delegado que se pronunciasse sobre o procedimento de classificação da substância tinha ainda sido adotado na sequência do parecer do CAR. Daí resulta que, nessa data, o mancozebe estava formalmente classificado como substância tóxica para a reprodução de categoria 2 à luz da toxicidade para o desenvolvimento, o que a Comissão não impugna.

    139

    Assim, coloca‑se a questão de saber se a EFSA, e em seguida a Comissão, podiam ter em consideração o parecer do CAR sobre a classificação do mancozebe como substância tóxica para a reprodução da categoria 1B, quando, formalmente, no momento da adoção das conclusões da EFSA e do regulamento de execução impugnado, essa substância estava classificada como tóxica para a reprodução de categoria 2 no respeitante à toxicidade para o desenvolvimento.

    140

    Segundo a jurisprudência, como resulta do artigo 4.o, n.os 1 e 7, e do ponto 3.6.4 do anexo II do Regulamento n.o 1107/2009, os elementos resultantes do procedimento de classificação e rotulagem harmonizadas de uma substância ativa, regulado pelo Regulamento n.o 1272/2008, podem ter efeitos substanciais na aprovação desta nos termos do Regulamento n.o 1107/2009 (v., neste sentido, Acórdão de 19 de dezembro de 2019, Probelte/Comissão, T‑67/18, EU:T:2019:873, n.o 91). Com efeito, a questão de saber se uma substância ativa é ou deve ser classificada numa classe de perigo determinada pode ser pertinente não apenas para efeitos da identificação e da comunicação dos perigos das substâncias, em conformidade com o Regulamento n.o 1272/2008, mas também para saber se preenche ou não os critérios de aprovação previstos no artigo 4.o do Regulamento n.o 1107/2009.

    141

    Contudo, resulta igualmente da jurisprudência que os procedimentos previstos nos Regulamentos n.os 1272/2008 e 1107/2009 são distintos, estando cada um organizado segundo as suas próprias regras (v., neste sentido, Acórdão de 19 de dezembro de 2019, Probelte/Comissão, T‑67/18, EU:T:2019:873, n.o 91). Por um lado, em conformidade com o Regulamento n.o 1272/2008, os operadores são obrigados a classificar e rotular as substâncias ou misturas de determinada maneira, e é a ECHA a autoridade competente para classificar ou reclassificar substâncias como perigosas. Por outro lado, no âmbito do Regulamento n.o 1107/2009, as substâncias ativas são controladas para efeitos de aprovação para a sua colocação no mercado, cabendo à EFSA a avaliação do respeito de categorias ou das classes de perigo objetivas.

    142

    No entanto, o caráter não vinculativo do parecer do CAR no âmbito do procedimento de classificação e rotulagem harmonizadas do mancozebe não diminui o valor científico desse parecer e, portanto, não impede que este seja tomado em consideração para efeitos da aprovação de uma substância ativa em conformidade com o Regulamento n.o 1107/2009. A este respeito, à semelhança da Comissão, há que observar que a existência de uma classificação formal de uma substância ativa não é determinante para efeitos da sua aprovação ao abrigo do Regulamento n.o 1107/2009. Com efeito, em conformidade com o ponto 3.6.4 do anexo II do Regulamento n.o 1107/2009, uma substância ativa só é aprovada se «não for» ou «não tiver de» ser classificada como tóxica para a reprodução da categoria 1A ou 1B, em conformidade com as disposições do Regulamento n.o 1272/2008.

    143

    Em face do exposto, há que considerar que a Comissão não cometeu nenhum erro manifesto de apreciação quando tomou em consideração, para efeitos do procedimento de renovação do mancozebe, o parecer do CAR sobre a classificação desta substância como tóxica para a reprodução da categoria 1B, apesar do seu caráter juridicamente não vinculativo para efeitos do procedimento de harmonização da classificação e rotulagem previstas no Regulamento n.o 1272/2008.

    2. Quanto à alegação de a Comissão não ter tido em conta novos elementos importantes a respeito da classificação do mancozebe como substância tóxica

    144

    No âmbito desta alegação, as recorrentes contestam novamente a consideração, primeiro pela EFSA e depois pela Comissão, do parecer do CAR. Por um lado, consideram que este parecer se baseia num estudo antigo, o estudo «Gallo» de 1980, que não satisfaz as orientações aplicáveis, nomeadamente no que respeita ao número de animais, à posologia e à duração da exposição. Pondo em causa a fiabilidade desse estudo, invocam um outro recente de 2015 sobre a toxicidade para o desenvolvimento. Por outro lado, segundo as recorrentes, este parecer do CAR não apresenta os últimos desenvolvimentos científicos para efeitos da classificação do mancozebe como substância tóxica. Com efeito, em seu entender, a Comissão deveria ter tido em conta a notificação da República de Malta relativa à sua intenção de apresentar um novo processo de classificação para esta substância à ECHA em março de 2020, que confirma a classificação do mancozebe como substância tóxica para a reprodução de categoria 2.

    145

    Segundo o artigo 114.o, n.o 3, TFUE, no qual se baseia, nomeadamente, o Regulamento n.o 1107/2009, nas suas propostas em matéria de saúde, de segurança, de proteção do ambiente e de defesa dos consumidores, feitas ao abrigo da aproximação das legislações que tenham por objeto o estabelecimento e o funcionamento do mercado interno, a Comissão basear‑se‑á num nível de proteção elevado, tendo nomeadamente em conta qualquer nova evolução baseada em dados científicos. Além disso, já foi declarado que essa proteção, nomeadamente da saúde pública e do ambiente, tem uma importância preponderante face às considerações económicas, pelo que é suscetível de justificar consequências económicas negativas, mesmo consideráveis, para certos operadores. Resulta desses princípios, que constituem a base do objetivo geral de proteção do regulamento, que, salvo disposição em contrário, as decisões que a Comissão é chamada a tomar ao abrigo do regulamento devem ter sempre em conta os conhecimentos científicos e técnicos mais recentes (v. Acórdão de 17 de maio de 2018, Bayer CropScience e o./Comissão, T‑429/13 e T‑451/13, EU:T:2018:280, n.o 289 e jurisprudência referida).

    146

    Mais especificamente, no que respeita ao procedimento de renovação da aprovação de uma substância ativa, essas considerações de princípio são expressas, por um lado, no artigo 2.o, n.o 2, do Regulamento de Execução n.o 844/2012. Com efeito, como foi acima recordado no n.o 58, essa disposição prevê que o pedido de renovação deve conter a lista das novas informações que o requerente pretende apresentar e que são necessárias, nos termos do artigo 15.o, n.o 2, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 1107/2009. Resulta desta última disposição que a necessidade de prestar novas informações visa satisfazer, nomeadamente, os requisitos em matéria de dados ou critérios que não se aplicavam aquando da última aprovação da substância ativa. Além disso, é aos requerentes que cabe identificar essas novas informações científicas.

    147

    Por outro lado, no que respeita aos processos complementares apresentados com vista a uma renovação, o considerando 8 do Regulamento de Execução n.o 844/2012 dispõe que esses processos devem incluir novos dados necessários e novas avaliações dos riscos. A este respeito, resulta do artigo 7.o do referido Regulamento de Execução, relativo ao conteúdo dos processos complementares, que esses processos devem incluir os dados e as avaliações dos riscos que não figuravam no processo de aprovação ou nos processos de renovação posteriores e que são necessários para a consideração, nomeadamente, das alterações ocorridas nas exigências legais desde a aprovação ou a última renovação da aprovação da substância ativa em causa, bem como das alterações ocorridas nos conhecimentos científicos e técnicos desde a aprovação. É igualmente aos requerentes que cabe identificar as novas informações em causa.

    148

    No caso, o parecer do CAR foi adotado no âmbito do procedimento de harmonização da classificação e da rotulagem das substâncias em conformidade com o Regulamento n.o 1272/2008. Como acima resulta do n.o 137, o CAR efetua a sua avaliação científica sobre qualquer proposta apresentada no âmbito desse procedimento.

    149

    Assim, foi ao abrigo do Regulamento n.o 1272/2008, e não do Regulamento n.o 1107/2009, que o CAR adotou o seu parecer sobre a classificação do mancozebe como substância tóxica para a reprodução da categoria 1B, uma classificação que foi adotada pela EFSA e, posteriormente, pela Comissão no âmbito do procedimento de renovação desta substância nos termos do Regulamento n.o 1107/2009. Daí resulta que qualquer alegação de falta de fundamento dessa classificação pelo CAR deve ser examinada unicamente à luz das regras estabelecidas pelo Regulamento n.o 1272/2008, pelo que as recorrentes não podem invocar uma pretensa violação material ocorrida no âmbito desse processo a fim de porem em causa a legalidade do regulamento de execução impugnado. Por conseguinte, improcede a alegação de que o parecer do CAR se baseia num estudo antigo.

    150

    Quanto à questão de saber se a Comissão podia considerar que o parecer do CAR era o último desenvolvimento científico para efeitos de classificação do mancozebe como substância tóxica, refira‑se que esse parecer foi adotado sob proposta do EMR inicial e antes da adoção das conclusões da EFSA no procedimento de renovação dessa substância (v. n.os 45 a 47, supra), a saber, no momento em que estava em curso a avaliação científica do mancozebe nesse procedimento. Daí resulta que o parecer do CAR podia ser considerado um documento que apresentava os conhecimentos científicos mais recentes relativos à classificação do mancozebe como substância tóxica, tanto mais que, durante o procedimento de renovação dessa substância, as recorrentes forneceram os dados solicitados pela EFSA após o termo do prazo fixado para a sua comunicação.

    151

    Por outro lado, no que respeita à notificação da República de Malta relativa à sua intenção de apresentar um novo processo de classificação para o mancozebe à ECHA em março de 2020, há que observar, à semelhança da Comissão, que a apresentação de um processo por uma autoridade competente de um Estado‑Membro constitui apenas a primeira etapa do procedimento de harmonização da classificação e da rotulagem das substâncias em conformidade com o Regulamento n.o 1272/2008, sem prejuízo do resultado final. Segundo as informações disponíveis no processo, à data da adoção do regulamento de execução impugnado, essa proposta ainda não tinha sido avaliada do ponto de vista científico no âmbito deste último procedimento.

    152

    Por conseguinte, há que considerar que a Comissão não cometeu nenhum erro manifesto de apreciação quando se baseou no parecer do CAR, e não na notificação da República de Malta em causa, para propor a classificação do mancozebe como substância tóxica.

    3. Quanto à alegação de concessão pelo parecer do CAR de uma influência indevida ao metabolito ETU e não à própria substância

    153

    As recorrentes alegam que a Comissão adotou uma proposta de classificação do mancozebe como substância tóxica para a reprodução da categoria 1B, baseada nas propriedades do metabolito ETU e não nas propriedades da própria substância. Ao fazê‑lo, as recorrentes confirmam que esta proposta resulta do parecer do CAR.

    154

    Como acima se concluiu no n.o 149, as recorrentes não podem invocar uma pretensa violação material ocorrida no âmbito do procedimento de harmonização da classificação e da rotulagem das substâncias em conformidade com o Regulamento n.o 1272/2008 a fim de pôr em causa a legalidade do regulamento de execução impugnado.

    155

    Além disso, por um lado, embora as recorrentes indiquem que resulta do artigo 3.o, ponto 32, do Regulamento n.o 1107/2009 que os metabolitos não são um fator determinante no procedimento de renovação de uma substância ativa, resulta, todavia, desse artigo que, em certos casos, os metabolitos podem sê‑lo.

    156

    A este respeito, o artigo 3.o, ponto 32, do Regulamento n.o 1107/2009 dispõe o seguinte:

    «[…]

    Considera‑se que determinado metabolito é relevante caso existam motivos para presumir que possui propriedades intrínsecas comparáveis às da substância original em termos de atividade biológica‑alvo, apresenta para os organismos um risco superior ou comparável ao da substância original ou possui determinadas propriedades toxicológicas consideradas inaceitáveis. Tal metabolito é relevante para a decisão global de aprovação ou para a definição das medidas de redução dos riscos.»

    157

    Por outro lado, quanto ao argumento das recorrentes de que cada substância deve ser avaliada separadamente com base nas suas propriedades intrínsecas, é pacífico que o mancozebe é uma substância metabolizada. A este respeito, as recorrentes não impugnam a alegação da Comissão de que, se uma substância é metabolizada e se os metabolitos que dela resultam produzem efeitos críticos, este elemento é pertinente para a classificação de uma substância ativa, uma vez que a exposição à substância induz o efeito tóxico crítico (diretamente ou através da atividade metabólica no ser humano).

    158

    Por conseguinte, os argumentos das recorrentes em apoio da presente alegação não demonstram que o parecer do CAR tenha atribuído uma influência indevida ao metabolito ETU e não à própria substância. A presente alegação deve, portanto, ser julgada improcedente.

    159

    Em face do exposto, a Comissão não cometeu nenhum erro manifesto de apreciação, improcedendo, portanto, o quarto fundamento.

    [Omissis]

     

    Pelos fundamentos expostos,

    O TRIBUNAL GERAL (Sétima Secção)

    decide:

     

    1)

    Nega‑se provimento ao recurso.

     

    2)

    A UPL Europe Ltd e a Indofil Industries (Netherlands) BV suportarão as suas próprias despesas e as despesas da Comissão Europeia no presente recurso.

     

    3)

    A Indofil Industries (Netherlands) suportará as suas próprias despesas e as despesas da Comissão no processo de medidas provisórias.

     

    da Silva Passos

    Valančius

    Reine

    Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 15 de fevereiro de 2023.

    Assinaturas


    ( *1 ) Língua do processo: inglês.

    ( 1 ) Apenas são reproduzidos os números do presente Acórdão cuja publicação o Tribunal Geral considera útil.

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