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Document 62020CJ0537

    Acórdão do Tribunal de Justiça (Primeira Secção) de 27 de abril de 2023.
    L Fund contra Finanzamt D.
    Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Bundesfinanzhof.
    Reenvio prejudicial — Artigo 63.o TFUE — Livre circulação de capitais — Imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas — Tributação dos rendimentos provenientes de bens imóveis sitos no território de um Estado‑Membro — Diferença de tratamento entre os fundos residentes e os fundos não‑residentes — Isenção que abrange unicamente os fundos residentes — Comparabilidade das situações — Tomada em consideração do regime fiscal dos investidores — Inexistência — Justificação — Necessidade de preservar a coerência do regime fiscal nacional — Necessidade de preservar uma repartição equilibrada do poder de tributação entre os Estados‑Membros — Inexistência.
    Processo C-537/20.

    Court reports – general – 'Information on unpublished decisions' section

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:2023:339

     ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção)

    27 de abril de 2023 ( *1 )

    «Reenvio prejudicial — Artigo 63.o TFUE — Livre circulação de capitais — Imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas — Tributação dos rendimentos provenientes de bens imóveis sitos no território de um Estado‑Membro — Diferença de tratamento entre os fundos residentes e os fundos não‑residentes — Isenção que abrange unicamente os fundos residentes — Comparabilidade das situações — Tomada em consideração do regime fiscal dos investidores — Inexistência — Justificação — Necessidade de preservar a coerência do regime fiscal nacional — Necessidade de preservar uma repartição equilibrada do poder de tributação entre os Estados‑Membros — Inexistência»

    No processo C‑537/20,

    que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Bundesfinanzhof (Supremo Tribunal Tributário Federal, Alemanha), por Decisão de 18 de dezembro de 2019, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 21 de outubro de 2020, no processo

    L Fund

    contra

    Finanzamt D,

    sendo interveniente:

    Bundesministerium der Finanzen,

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção),

    composto por: A. Arabadjiev, presidente de secção, P. G. Xuereb (relator), T. von Danwitz, A. Kumin e I. Ziemele, juízes,

    advogado‑geral: G. Pitruzzella,

    secretária: S. Beer, administradora,

    vistos os autos e após a audiência de 20 de outubro de 2022,

    vistas as observações apresentadas:

    em representação do L Fund, por K. Rohde, Rechtsanwalt,

    em representação do Governo alemão, por J. Möller e R. Kanitz, na qualidade de agentes,

    em representação da Comissão Europeia, por B. Martenczuk, W. Roels e V. Uher, na qualidade de agentes,

    vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

    profere o presente

    Acórdão

    1

    O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 63.o TFUE.

    2

    Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe o L Fund ao Finanzamt D (Serviço de Finanças D, Alemanha) a respeito da sujeição do L Fund ao imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas a título dos exercícios de 2008 a 2010 (a seguir «exercícios controvertidos»).

    Quadro jurídico

    Direito alemão

    3

    O § 1, n.o 1, ponto 5, da Körperschaftsteuergesetz (Lei relativa ao Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas), na versão em vigor durante os exercícios controvertidos (a seguir «KStG»), prevê:

    «Obrigação total de imposto

    1.   O imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas incide sobre a totalidade dos rendimentos das seguintes pessoas coletivas, grupos de pessoas coletivas e patrimónios cuja administração central ou sede social se situe no território nacional:

    […]

    5)

    associações, instituições, fundações e outros patrimónios autónomos de direito privado sem personalidade jurídica.»

    4

    O § 2, ponto 1, da KStG dispõe:

    «Obrigação parcial de imposto

    O imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas incide sobre parte dos rendimentos das seguintes pessoas coletivas:

    1)

    as pessoas coletivas, os grupos de pessoas coletivas e os patrimónios cuja administração central e sede social não se situem no território nacional, a título dos rendimentos que auferem no referido território.»

    5

    Nos termos do § 1 da Investmentsteuergesetz 2004 (Lei de 2004 relativa à Tributação dos Investimentos), na versão em vigor durante os exercícios controvertidos (a seguir «InvStG de 2004»), sob a epígrafe «Âmbito de aplicação e definições»:

    «Estão abrangidos pela presente lei:

    1)

    os organismos de investimento coletivo de direito nacional, desde que sejam constituídos sob a forma de um fundo comum de investimento na aceção do § 2, n.o 1, da Investmentgesetz [(Lei relativa aos Investimentos; a seguir “InvG”)] ou de uma sociedade anónima de investimento na aceção do § 2, n.o 5, [da InvG] (sociedade de investimento de direito nacional), bem como as participações nos mesmos (participações em organismos de investimento coletivo de direito nacional);

    2)

    os organismos de investimento coletivo estrangeiros e as participações nos mesmos, na aceção do § 2, n.os 8 e 9, [da InvG].

    […]»

    6

    O § 2 da InvStG 2004, sob a epígrafe «Rendimentos de participações», prevê, no n.o 1:

    «Os rendimentos distribuídos a título de participações em organismos de investimento coletivo e os rendimentos equivalentes a essa distribuição, bem como os lucros intercalares, são considerados rendimentos de capitais na aceção do § 20, n.o 1, ponto 1, da Einkommensteuergesetz [(Lei relativa ao Imposto sobre o Rendimento; a seguir “EStG”)] […]»

    7

    O § 4 da InvStG 2004, sob a epígrafe «Rendimentos auferidos no estrangeiro», enuncia, no n.o 2:

    «Se os rendimentos distribuídos a título de participações em organismos de investimento coletivo e os rendimentos equivalentes a essa distribuição incluírem rendimentos provenientes de outro Estado, no qual estão sujeitos a um imposto dedutível do imposto sobre o rendimento ou do imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas nos termos do § 34c, n.o 1, [da EStG] ou do § 26, n.o 1, [da KStG] ou em aplicação de uma convenção destinada a evitar a dupla tributação, o montante do imposto estrangeiro determinado e posteriormente pago pelo investidor sujeito a uma obrigação total de imposto, caso este não beneficie de nenhuma redução, é imputado na parte do imposto sobre o rendimento ou do imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas correspondente a esses rendimentos estrangeiros, acrescidos do montante proporcional do imposto estrangeiro. […] Se os rendimentos distribuídos a título de participações em organismos de investimento coletivo estrangeiros e os rendimentos equivalentes a essa distribuição incluírem rendimentos sujeitos ao imposto sobre os rendimentos de capitais na Alemanha, esses rendimentos, bem como o imposto cobrado sobre os mesmos na Alemanha, são equiparados, para efeitos da sua dedução, no âmbito da aplicação do § 7, n.o 1, a rendimentos e impostos estrangeiros na aceção do primeiro período. […]»

    8

    O § 7 da InvStG 2004, sob a epígrafe «Imposto sobre os rendimentos de capitais», prevê, no n.o 1, ponto 1:

    «São objeto de retenção na fonte sobre os rendimentos de capitais:

    1)

    os rendimentos distribuídos na aceção do § 2, n.o 1, […]»

    9

    O § 11 da InvStG 2004, sob a epígrafe «Património autónomo, isenção de imposto e inspeção tributária», enuncia, no n.o 1:

    «Os organismos de investimento coletivo estatutários abertos regulados pelo direito nacional são equiparados aos patrimónios autónomos na aceção do § 1, n.o 1, ponto 5, [da KStG]. Estão isentos de imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas e de imposto local sobre os lucros das pessoas coletivas. O segundo período é igualmente aplicável às sociedades anónimas de investimento. […]»

    10

    O § 15 da InvStG 2004, sob a epígrafe «Organismos de investimento coletivo especializados abertos regulados pelo direito nacional», dispõe, no n.o 2:

    «Os rendimentos provenientes da locação, da locação comercial e de direitos reais que incidam sobre bens equiparados a bens imóveis situados no território nacional, bem como os lucros resultantes da transmissão entre particulares destes imóveis e direitos, são contabilizados separadamente. Estes rendimentos são equiparados a rendimentos auferidos diretamente pelo investidor sujeito a uma obrigação parcial de imposto na aceção do § 49, n.o 1, ponto 2, alínea f), do § 49, n.o 1, ponto 6, ou do § 49, n.o 1, ponto 8, [da EStG]. O mesmo sucede com a aplicação das disposições das convenções destinadas a evitar a dupla tributação. O § 7 é aplicável, mutatis mutandis, com uma taxa de imposto de 25 % dos rendimentos e retenção na fonte, pela sociedade de investimento, do imposto sobre os rendimentos de capitais. […]»

    11

    O § 2, n.os 8 e 9, da InvG, na versão em vigor durante os exercícios controvertidos, tem a seguinte redação:

    «8.   Os organismos de investimento coletivo estrangeiros são organismos de investimento coletivo, na aceção do § 1, segundo período, regulados pelo direito de outro Estado. Considera‑se que respeitam o princípio da repartição de riscos mesmo que sejam constituídos, numa percentagem significativa, por participações detidas num ou em vários organismos deles distintos, e que estes outros organismos operem direta ou indiretamente em aplicação do referido princípio.

    9.   As participações em organismos de investimento coletivo estrangeiros são participações em investimentos coletivos estrangeiros emitidos por uma empresa com sede no estrangeiro (sociedade de investimento estrangeira) cujo reembolso pode ser solicitado pelos investidores como contrapartida da sua restituição, ou cuja recompra não podem exigir, caso e que a sociedade de investimento estrangeira está sujeita a supervisão prudencial dos ativos destinados a investimento coletivo no Estado no qual tem a sua sede social.»

    Direito luxemburguês

    12

    A loi du 13 février 2007 relative aux fonds d’investissement spécialisés (Mémorial A 2007, n.o 13) (Lei de 13 de fevereiro de 2007 relativa aos Fundos de Investimento Especializados) prevê, no artigo 66.o, n.o 1, que «os fundos de investimento referidos na presente lei não são tributados, à exceção do imposto sobre as transações de capitais a pagar pelas sociedades civis e pelas sociedades comerciais e do imposto de subscrição previsto no artigo 68.o [desta lei]».

    Litígio no processo principal, questão prejudicial e tramitação processual no Tribunal de Justiça

    13

    O recorrente no processo principal, L Fund, é um fundo de investimento imobiliário constituído sob a forma de fundo de investimento especializado, nos termos do direito luxemburguês, cuja sede social e administração central não estão situadas na Alemanha.

    14

    O L Fund é um fundo fechado, com apenas dois investidores institucionais, cuja sede social e administração central não estão situadas na Alemanha.

    15

    De acordo com o direito luxemburguês, enquanto fundo de investimento especializado, o L Fund não é tributável no Luxemburgo, à exceção do imposto sobre as transações de capitais a pagar pelas sociedades civis e pelas sociedades comerciais e do imposto de subscrição previsto no artigo 68.o da Lei relativa aos Fundos de Investimento Especializados. Segundo aquele ordenamento jurídico, os dividendos distribuídos pelo L Fund não são objeto de retenção na fonte no Luxemburgo e não são tributáveis ao nível dos investidores não residentes.

    16

    Durante os exercícios controvertidos, o L Fund auferiu rendimentos pelo arrendamento dos seus bens imóveis sitos na Alemanha e pela alienação de alguns desses imóveis.

    17

    Em julho de 2013, apresentou declarações de imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas relativas aos exercícios controvertidos, por força da sua obrigação parcial de imposto, embora esclarecendo que, no seu entender, não estava sujeito ao imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas na Alemanha.

    18

    Todavia, o Serviço de Finanças D considerou que o L Fund estava parcialmente sujeito ao imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas e emitiu avisos de liquidação relativos aos exercícios controvertidos.

    19

    O L Fund impugnou esses avisos perante o Finanzgericht Münster (Tribunal Tributário de Münster, Alemanha), que os confirmou, em substância, por Sentença de 20 de abril de 2017.

    20

    O L Fund interpôs recurso de «Revision» da referida sentença para o Bundesfinanzhof (Supremo Tribunal Tributário Federal, Alemanha), que é o órgão jurisdicional de reenvio no presente processo.

    21

    Este órgão jurisdicional observa que, em conformidade com o § 2, ponto 1, da KStG, o L Fund, que não tem sede social nem administração central na Alemanha, está parcialmente sujeito ao imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas pela totalidade dos rendimentos que auferiu no território deste Estado‑Membro. Esclarece que o L Fund não beneficia de nenhuma isenção de natureza pessoal ou real. Com efeito, contrariamente aos fundos de investimento comuns abertos regulados pelo direito nacional, o L Fund não pode beneficiar da isenção do imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas prevista no § 11, n.o 1, segundo período, da InvStG 2004, posto que, ao abrigo do § 1, n.o 1, ponto 2, da InvStG 2004, conjugado com o § 2, n.o 8, da InvG, na versão em vigor durante os exercícios controvertidos, é um fundo estrangeiro.

    22

    Neste contexto, o referido órgão jurisdicional pretende saber se o facto de os fundos estrangeiros estarem excluídos do benefício dessa isenção é compatível com o direito da União.

    23

    A este respeito, embora reconheça a existência de posições divergentes, assinala que, devido às especificidades do direito fiscal alemão, essa exclusão pode ser compatível com o artigo 63.o TFUE.

    24

    Relativamente a essas especificidades, o órgão jurisdicional de reenvio explica que a isenção do imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas aplicável aos fundos de direito nacional, prevista no § 11, n.o 1, segundo período, da InvStG 2004, é uma concretização do princípio da transparência, segundo o qual os rendimentos são tributados uma única vez, ao nível dos investidores. Em conformidade com o § 2, n.o 1, da InvStG 2004, os fundos devem pagar impostos sobre os dividendos que lhes são distribuídos ou sobre os rendimentos correspondentes a essa distribuição, no caso dos fundos que acumulam os seus lucros.

    25

    Em relação aos fundos de investimento imobiliário especializados de direito nacional que reúnem exclusivamente investidores não residentes, em conformidade com o § 15, n.o 2, segundo período, da InvStG de 2004, os rendimentos imobiliários auferidos por estes fundos no território alemão são imputados diretamente aos investidores não residentes em causa, enquanto rendimentos próprios e parcialmente tributáveis. Para assegurar a tributação dos investidores não residentes, os fundos têm de fazer retenção na fonte por força do § 15, n.o 2, quarto período, da InvStG 2004.

    26

    O órgão jurisdicional de reenvio menciona que a aplicação do princípio da transparência corresponde à intenção do legislador alemão de impedir os investidores não residentes que, se investissem diretamente em bens imóveis sitos no território nacional, estariam sujeitos a uma obrigação parcial de imposto, de evitarem essa tributação fazendo tais investimentos por intermédio de um fundo de investimento imobiliário especializado. O princípio da transparência implica que os investidores não residentes sejam tributados como se tivessem feito investimentos diretos.

    27

    Em contrapartida, no caso dos fundos de investimento imobiliário especializados não residentes, os rendimentos imobiliários auferidos no território alemão são tributados através do fundo, que está sujeito ao imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas na medida em que não beneficia da isenção prevista no § 11, n.o 1, segundo período, da InvStG 2004, ao passo que os investidores não residentes desse fundo não são tributados porque o § 15, n.o 2, segundo período, da InvStG 2004 só se aplica aos fundos de investimento imobiliário especializados de direito nacional.

    28

    Em ambos os casos, os rendimentos auferidos na Alemanha por investidores não residentes só são tributados uma única vez, mas a diferentes níveis. Esta diferença de tratamento deve‑se ao facto de, no caso dos fundos de investimento imobiliário especializados não residentes que reúnem investidores não residentes, o legislador alemão, em razão do princípio da territorialidade do poder público, não poder garantir o direito da República Federal da Alemanha, enquanto Estado‑Membro em cujo território se situam os bens imóveis em causa, a tributar os referidos investidores não residentes.

    29

    Assim, no caso em apreço, o L Fund, enquanto fundo de investimento imobiliário especializado estrangeiro, está sujeito ao imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas pelos rendimentos que aufere dos bens imóveis sitos na Alemanha, ao passo que os seus dois investidores institucionais não residentes não são tributados neste Estado‑Membro.

    30

    Em contrapartida, um fundo de investimento imobiliário especializado de direito nacional equiparável que reúna dois investidores institucionais não residentes, não está sujeito ao imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas na Alemanha a título daqueles rendimentos porque os mesmos são imputados a esses investidores.

    31

    Tendo em conta o que precede, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em primeiro lugar, se a isenção prevista no § 11, n.o 1, segundo período, da InvStG 2004 constitui uma restrição aos movimentos de capitais, na aceção do artigo 63.o, n.o 1, TFUE. Por um lado, este órgão jurisdicional duvida que a referida isenção possa dissuadir os investidores não residentes de investirem em bens imóveis sitos em território alemão, uma vez que os rendimentos imobiliários provenientes desses bens são tributados uma única vez tanto no que respeita aos fundos de investimento imobiliário especializados residentes como aos não residentes, embora esta tributação ocorra a diferentes níveis.

    32

    Por outro lado, também não é certo que a referida isenção tenha por efeito dissuadir os investidores nacionais de adquirirem participações em fundos de investimento imobiliário especializados não residentes. A dupla tributação que decorre da tributação parcial destes fundos a título do imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas e da sujeição destes investidores ao imposto sobre os rendimentos de capitais a título dos dividendos distribuídos pelos referidos fundos é, em grande medida, suprimida pela dedução prevista no § 4, n.o 2, sétimo período, da InvStG 2004. Além disso, tendo em conta que os fundos especializados servem de instrumento de investimento a um círculo muito restrito de investidores institucionais, para efeitos de investimento num objeto específico, a presença de potenciais investidores institucionais nacionais pode revelar‑se uma possibilidade meramente teórica.

    33

    Em segundo lugar, o órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se sobre se os fundos de investimento imobiliário especializados não residentes e os fundos de investimento imobiliário especializados de direito nacional estão numa situação comparável. Segundo este órgão jurisdicional, os fundos de investimento imobiliário especializados de direito nacional que reúnem investidores institucionais não residentes não são tributados a título do imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas devido à imputação direta dos rendimentos imobiliários aos investidores não residentes, prevista no § 15, n.o 2, segundo período, da InvStG 2004, e à sujeição parcial expressa desses rendimentos ao imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas, o que demonstra que o legislador nacional utilizou a situação fiscal dos investidores como critério distintivo para determinar o tratamento fiscal aplicável e que a tributação dos rendimentos imobiliários é determinada não ao nível do fundo, mas em função do lugar de residência dos investidores.

    34

    Em terceiro lugar, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta‑se se a isenção prevista no § 11, n.o 1, segundo período, da InvStG de 2004 exclusivamente a favor dos fundos residentes pode ser justificada por razões imperiosas de interesse geral.

    35

    Por um lado, segundo o referido órgão jurisdicional, pode invocar‑se a necessidade de assegurar uma repartição equilibrada do poder de tributação entre os Estados‑Membros para justificar a exclusão dos fundos de investimento imobiliário especializados não residentes daquela isenção, uma vez que a tributação ao nível destes fundos dos rendimentos imobiliários provenientes de bens imóveis sitos no território de um Estado‑Membro permite assegurar o direito de esse Estado‑Membro tributar esses bens, direito esse que não pode ser assegurado ao nível da tributação desses investidores não residentes.

    36

    Por outro lado, segundo o referido órgão jurisdicional, a exclusão de L Fund do benefício da referida isenção pode ser justificada pela necessidade de preservar a coerência do regime fiscal, tendo presente que a mesma isenção dos fundos de investimento imobiliário especializados de direito nacional é compensada pela tributação direta dos investidores institucionais não residentes desses fundos, em conformidade com o § 15, n.o 2, segundo período, da InvStG 2004.

    37

    Em quarto e último lugar, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se a recusa em conceder o benefício de uma isenção aos fundos de investimento imobiliário especializados não residentes não vai além do necessário para garantir a coerência do regime fiscal alemão em matéria de investimentos.

    38

    Nestas condições, o Bundesfinanzhof (Supremo Tribunal Tributário Federal) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

    «Opõe‑se o artigo 56.o [TCE] (atual artigo 63.o [TFUE]) à regulamentação de um Estado‑Membro que isenta do imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas os fundos especiais de investimento imobiliário nacionais exclusivamente subscritos por investidores estrangeiros, enquanto os fundos especiais de investimento imobiliário estrangeiros exclusivamente subscritos por investidores estrangeiros estão sujeitos a uma obrigação fiscal limitada em sede de imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas no que respeita aos rendimentos locativos obtidos em território nacional?»

    39

    Após ter sido notificado do Acórdão de 17 de março de 2022, AllianzGI‑Fonds AEVN (C‑545/19, EU:C:2022:193), o referido órgão jurisdicional informou o Tribunal de Justiça, por carta de 25 de abril de 2022, de que pretendia manter o seu pedido de decisão prejudicial.

    Quanto à questão prejudicial

    40

    Com a sua questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 63.o TFUE deve ser interpretado no sentido de que se opõe à legislação de um Estado‑Membro que sujeita parcialmente os fundos de investimento imobiliário especializados não residentes ao imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas, a título dos rendimentos imobiliários que os mesmos auferem no território desse Estado‑Membro, enquanto os fundos de investimento imobiliário especializados residentes estão isentos deste imposto.

    41

    Segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, os Estados‑Membros devem exercer a sua competência em matéria de fiscalidade direta com observância do direito da União e, nomeadamente, das liberdades fundamentais garantidas pelo Tratado FUE [Acórdão de 29 de abril de 2021, Veronsaajien oikeudenvalvontayksikkö (Rendimentos distribuídos por OICVM), C‑480/19, EU:C:2021:334, n.o 25].

    42

    O artigo 63.o, n.o 1, TFUE proíbe, de maneira geral, os entraves aos movimentos de capitais entre os Estados‑Membros. As medidas proibidas por esta disposição, enquanto restrições aos movimentos de capitais, incluem as que são suscetíveis de dissuadir os não residentes de investir num Estado‑Membro ou de dissuadir os residentes desse Estado‑Membro de investir noutros Estados [Acórdão de 29 de abril de 2021, Veronsaajien oikeudenvalvontayksikkö (Rendimentos distribuídos por OICVM), C‑480/19, EU:C:2021:334, n.o 26].

    43

    Não obstante, segundo o artigo 65.o, n.o 1, alínea a), TFUE, o disposto no artigo 63.o TFUE não prejudica o direito de os Estados‑Membros aplicarem as disposições pertinentes do seu direito fiscal que estabeleçam uma distinção entre contribuintes que não se encontrem em idêntica situação no que se refere ao seu lugar de residência ou ao lugar em que o seu capital é investido.

    44

    Esta disposição, enquanto derrogação ao princípio fundamental da livre circulação de capitais, é de interpretação estrita. Por conseguinte, não pode ser interpretada no sentido de que qualquer legislação fiscal que comporte uma distinção entre os contribuintes em função do lugar onde residam ou do Estado‑Membro onde invistam os seus capitais é automaticamente compatível com o Tratado FUE. Com efeito, a derrogação prevista no artigo 65.o, n.o 1, alínea a), TFUE é ela própria limitada pelo disposto no artigo 65.o, n.o 3, TFUE, que prevê que as disposições nacionais a que se refere o n.o 1 desse artigo «não devem constituir um meio de discriminação arbitrária, nem uma restrição dissimulada à livre circulação de capitais e pagamentos, tal como definida no artigo 63.o [TFUE]» (Acórdão de 17 de março de 2022, AllianzGI‑Fonds AEVN, C‑545/19, EU:C:2022:193, n.o 41 e jurisprudência referida).

    45

    O Tribunal de Justiça declarou igualmente que, por conseguinte, há que distinguir as diferenças de tratamento permitidas pelo artigo 65.o, n.o 1, alínea a), TFUE das discriminações proibidas pelo artigo 65.o, n.o 3, TFUE. Ora, para que uma legislação fiscal nacional possa ser considerada compatível com as disposições do Tratado FUE relativas à livre circulação de capitais, é necessário que a diferença de tratamento daí decorrente diga respeito a situações que não sejam objetivamente comparáveis ou se justifique por uma razão imperiosa de interesse geral (Acórdão de 17 de março de 2022, AllianzGI‑Fonds AEVN, C‑545/19, EU:C:2022:193, n.o 42 e jurisprudência referida).

    46

    Consequentemente, importa examinar, em primeiro lugar, a existência de uma diferença de tratamento, em segundo lugar, a eventual comparabilidade das situações, e, sendo caso disso, em último lugar, a possibilidade de justificar o tratamento diferenciado.

    Quanto à existência de uma restrição à livre circulação de capitais

    47

    No caso em apreço, resulta da decisão de reenvio que, por força da legislação alemã em causa no processo principal, os fundos de investimento imobiliário especializados residentes estão isentos do imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas, enquanto os fundos de investimento imobiliário especializados não residentes não beneficiam de tal isenção.

    48

    Assim, os fundos de investimento imobiliário especializados não residentes e os residentes estão sujeitos, no que respeita às regras de tributação que lhes são aplicáveis, a um tratamento diferente, que é desfavorável aos fundos de investimento imobiliário especializados não residentes.

    49

    Uma tal diferença de tratamento fiscal é suscetível de dissuadir, por um lado, os fundos de investimento imobiliário especializados não residentes de procederem a investimentos em bens imóveis situados na Alemanha e, por outro lado, os investidores residentes na Alemanha de recorrerem a fundos de investimento imobiliário especializados não residentes para esses investimentos (v., neste sentido, Acórdãos de 10 de maio de 2012, Santander Asset Management SGIIC e o., C‑338/11 a C‑347/11, EU:C:2012:286, n.o 17, e de 21 de junho de 2018, Fidelity Funds e o., C‑480/16, EU:C:2018:480, n.o 44).

    50

    Esta conclusão não pode ser posta em causa pela tomada em consideração da tributação aplicável aos dividendos distribuídos aos investidores dos fundos de investimento imobiliário especializados residentes, porquanto a legislação alemã em causa no processo principal não subordina a isenção desses fundos à condição de a totalidade dos rendimentos imobiliários ser tributada ao nível dos seus investidores.

    51

    Com efeito, no caso dos fundos de investimento imobiliário especializados não residentes que tenham investidores residentes na Alemanha, resulta dessa decisão que, além da tributação parcial destes fundos a título do imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas, aqueles investidores, que estão totalmente sujeitos ao imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas, se encontram igualmente sujeitos ao imposto sobre os rendimentos de capitais a título dos dividendos distribuídos pelos referidos fundos.

    52

    É certo que a dedução prevista no § 4, n.o 2, sétimo período, da InvStG de 2004 visa suprimir esta dupla tributação. No entanto, resulta dos autos que, na prática, a eliminação total da referida dupla tributação depende da situação fiscal específica de cada participante sendo, por isso, incerta. Aliás, o Governo alemão afirmou, na audiência, que, em função da respetiva situação fiscal, os investidores residentes dos fundos de investimento imobiliário especializados não residentes podem estar numa situação de desvantagem face aos investidores residentes de fundos de investimento imobiliário especializados residentes.

    53

    Nestas condições, há que considerar que uma legislação como a legislação alemã em causa no processo principal constitui uma restrição à livre circulação de capitais proibida, em princípio, pelo artigo 63.o TFUE.

    Quanto à comparabilidade das situações

    54

    Decorre da jurisprudência do Tribunal de Justiça, por um lado, que o caráter comparável ou não de uma situação transfronteiriça com uma situação interna deve ser examinado tendo em conta o objetivo prosseguido pelas disposições nacionais em causa assim como o objeto e o conteúdo destas últimas, e, por outro, que apenas os critérios de distinção pertinentes estabelecidos pela legislação em causa devem ser tidos em conta para apreciar se a diferença de tratamento resultante de tal regulamentação reflete uma diferença de situação objetiva [Acórdão de 29 de abril de 2021, Veronsaajien oikeudenvalvontayksikkö (Rendimentos distribuídos por OICVM), C‑480/19, EU:C:2021:334, n.o 49].

    55

    No que respeita aos objetivos prosseguidos pelas disposições de direito alemão em causa no processo principal, resulta da decisão de reenvio que os rendimentos imobiliários dos fundos de investimento imobiliário especializados residentes que reúnem investidores institucionais não residentes são tributados a título do imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas não ao nível do fundo, mas ao dos investidores, para assegurar a aplicação do princípio da transparência, por força do qual os rendimentos são tributados uma única vez, e a igualdade de tratamento entre os investimentos diretos e os investimentos efetuados por intermédio de um fundo de investimento. Ao tributarem os rendimentos imobiliários dos fundos residentes unicamente ao nível dos investidores, estas disposições visam evitar um cúmulo de encargos fiscais ao nível do fundo e ao dos investidores.

    56

    Resulta igualmente dos autos de que o Tribunal de Justiça dispõe que os fundos de investimento imobiliário especializados não residentes que reúnem investidores não residentes são tributados ao nível do fundo e não dos investidores, posto que, em razão do princípio da territorialidade do poder público, o legislador alemão não pode garantir, mediante retenção na fonte, o direito da República Federal da Alemanha, enquanto Estado‑Membro em cujo território se situam os bens imóveis em causa, a tributar os investidores não residentes.

    57

    A este respeito, há que notar que resulta dos autos de que o Tribunal de Justiça dispõe que o único critério de distinção estabelecido pelo § 11, n.o 1, segundo período, da InvStG 2004 se baseia no local de residência dos fundos, uma vez que só os fundos regulados pelo direito nacional beneficiam da isenção do imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas, ao passo que os fundos de investimento regulados pelo direito de outro Estado estão excluídos do benefício da referida isenção. Do mesmo modo, o § 15, n.o 2, segundo período, da InvStG 2004 só se aplica aos fundos de investimento imobiliário especializados residentes.

    58

    Ora, importa salientar, em primeiro lugar, que um fundo de investimento imobiliário especializado não residente também pode ter investidores residentes na Alemanha, sobre cujos rendimentos a República Federal da Alemanha pode exercer o seu poder de tributação. Nesta perspetiva, um fundo de investimento imobiliário especializado não residente encontra‑se numa situação objetivamente comparável à de um fundo de investimento imobiliário especializado residente (v., neste sentido, Acórdão de 17 de março de 2022, AllianzGI‑Fonds AEVN, C‑545/19, EU:C:2022:193, n.o 69 e jurisprudência referida).

    59

    Em segundo lugar, os fundos residentes e não residentes estão numa situação comparável à luz do objetivo prosseguido pelo princípio da transparência, a saber, assegurar uma igualdade de tratamento entre os investimentos diretos e os investimentos feitos por intermédio de um fundo de investimento. Com efeito, os rendimentos imobiliários dos fundos residentes só são tributados ao nível dos seus investidores para alcançar este objetivo.

    60

    Em terceiro lugar, o objetivo de transferir o nível da tributação do fundo para o investidor também pode ser alcançado relativamente aos fundos não residentes, subordinando a isenção do imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas, prevista no § 11, n.o 1, segundo período, da InvStG 2004, à tributação dos investidores desses fundos. Embora seja verdade que a República Federal da Alemanha não pode, na prática, tributar os investidores não residentes, tal impossibilidade é coerente com a lógica de deslocação do nível de tributação do fundo para o investidor.

    61

    Nestas condições, afigura‑se que o facto de reservar aos fundos especiais de investimento imobiliário residentes a possibilidade de obter uma isenção de retenção na fonte não é justificado por uma diferença de situação objetiva entre estes fundos e os residentes num Estado‑Membro diferente da República Federal da Alemanha (v., por analogia, Acórdão de 17 de março de 2022, AllianzGI‑Fonds AEVN, C‑545/19, EU:C:2022:193, n.o 70 e jurisprudência referida).

    62

    Por conseguinte, à luz dos objetivos da legislação alemã em causa no processo principal e do critério de distinção estabelecido pela mesma, os fundos residentes e os fundos não residentes estão numa situação comparável.

    63

    Por outro lado, é certo que, no processo que deu origem ao Acórdão de 2 de junho de 2016, Pensioenfonds Metaal en Techniek (C‑252/14, EU:C:2016:402), invocado pelo Governo alemão, o Tribunal de Justiça declarou que o tratamento diferenciado da tributação dos dividendos pagos a fundos de pensões segundo a qualidade de residente ou de não residente destes últimos, resultante da aplicação, a esses fundos respetivos, de dois métodos de tributação diferentes, era justificado pela diferença de situação entre estas duas categorias de contribuintes à luz do objetivo prosseguido pela regulamentação nacional em causa nesse processo, bem como do seu objeto e do seu conteúdo (Acórdão de 17 de março de 2022, AllianzGI‑Fonds AEVN, C‑545/19, EU:C:2022:193, n.o 51).

    64

    Todavia, no referido processo, os fundos residentes e não residentes, que eram fundos de pensões, eram eles mesmos tributados, mas de modo diferente, tendo em conta o objetivo da legislação nacional em causa, que era, no âmbito do regime das pensões de reforma, o de introduzir uma tributação neutra e independente do contexto de diferentes tipos de ativos e de todas as modalidades de poupança‑reforma em causa, dado que o Estado em causa não podia garantir esse objetivo tributando do mesmo modo os fundos residentes e os fundos não residentes.

    65

    Ora, no presente caso, os fundos residentes estão isentos do imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas e não estão sujeitos a outro tipo de imposto.

    Quanto à existência de uma razão imperiosa de interesse geral

    66

    Há que recordar que, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, uma restrição à livre circulação de capitais pode ser admitida se for justificada por razões imperiosas de interesse geral, for adequada a garantir a realização do objetivo por ela prosseguido e não for além do necessário para alcançar esse objetivo (Acórdão de 17 de março de 2022, AllianzGI‑Fonds AEVN, C‑545/19, EU:C:2022:193, n.o 75 e jurisprudência referida).

    67

    No caso em apreço, o Governo alemão alega, nas suas observações escritas, que, admitindo que a legislação alemã em causa no processo principal constitui uma restrição à livre circulação de capitais, esta é justificada à luz de duas razões imperiosas de interesse geral, a saber, por um lado, a necessidade de preservar a coerência do regime fiscal nacional e, por outro, a de preservar uma repartição equilibrada do poder de tributação entre os Estados‑Membros.

    Quanto à necessidade de preservar a coerência do regime fiscal nacional

    68

    Há que recordar que, embora o Tribunal de Justiça tenha declarado que a necessidade de preservar a coerência de um regime fiscal nacional pode justificar uma regulamentação nacional suscetível de restringir as liberdades fundamentais, esclareceu, todavia, que, para que um argumento assente em tal justificação possa prosperar, é necessário que se demonstre a existência de um nexo direto entre o benefício fiscal em causa e a compensação deste benefício através de uma determinada cobrança fiscal, devendo o caráter direto deste nexo ser apreciado à luz do objetivo da legislação em causa [Acórdãos de 16 de dezembro de 2021, UBS Real Estate, C‑478/19 e C‑479/19, EU:C:2021:1015, n.os 65 e 66, e de 7 de abril de 2022, Veronsaajien oikeudenvalvontayksikkö (Isenção dos fundos de investimento contratuais), C‑342/20, EU:C:2022:276, n.os 91 e 92 e jurisprudência referida].

    69

    O órgão jurisdicional de reenvio e o Governo alemão consideram que aquele nexo se verifica, visto que o benefício fiscal que consiste na isenção dos fundos residentes é compensado pela tributação direta dos investidores institucionais não residentes desses fundos, uma vez que o § 15, n.o 2, segundo período, da InvStG 2004 prevê a imputação direta dos rendimentos imobiliários aos investidores não residentes. Para assegurar a tributação destes últimos, os referidos fundos têm de proceder a uma retenção na fonte por força do § 15, n.o 2, quarto período, da InvStG 2004. Além disso, se a isenção prevista no § 11, n.o 1, segundo período, da InvStG de 2004 fosse tida em conta, a mesma seria compensada pela tributação dos investidores, prevista no § 2, n.o 1, InvStG 2004, dado que estes estão sujeitos a retenção na fonte na aceção do § 7 da InvStG 2004.

    70

    A este respeito, há que salientar que, embora a isenção prevista no § 11, n.o 1, segundo período, da InvStG de 2004 não esteja expressamente sujeita, ao abrigo desta disposição, à condição de a tributação dos investidores do fundo permitir compensar a referida isenção, tal nexo direto pode, contudo, decorrer do regime fiscal em causa.

    71

    Cabe ao órgão jurisdicional de reenvio, que tem competência exclusiva para interpretar o direito nacional, determinar se a imputação direta dos rendimentos imobiliários aos investidores não residentes e a tributação dos investidores residentes dos fundos residentes compensa a isenção concedida a estes fundos. Cabe‑lhe, em particular, verificar se estes investidores são sempre tributados e não podem beneficiar da isenção do referido imposto.

    72

    Mesmo admitindo que esse nexo direto possa decorrer do regime fiscal em causa, há ainda que verificar se, pelo facto de reservar apenas aos fundos de investimento imobiliário especializados residentes a possibilidade de beneficiar da isenção dos rendimentos imobiliários do imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas, a legislação em causa no processo principal não vai além do necessário para garantir a coerência desse regime fiscal (v., neste sentido, Acórdão de 21 de junho de 2018, Fidelity Funds e o., C‑480/16, EU:C:2018:480, n.o 83).

    73

    A este respeito, importa salientar, por um lado, que, no caso dos investidores residentes de um fundo de investimento imobiliário especializado não residente, a tributação deste fundo conduz a uma dupla tributação económica dos referidos rendimentos, uma vez que estes são tributados, em primeiro lugar, ao nível do referido fundo e, em segundo lugar, ao nível do investidor residente. Ora, como foi recordado nos n.os 51 e 52 do presente acórdão, a eliminação desta dupla tributação nem sempre pode ser concretizada, o que contraria, precisamente, o objetivo visado pela legislação em causa no processo principal (v., neste sentido, Acórdão de 21 de junho de 2018, Fidelity Funds e o., C‑480/16, EU:C:2018:480, n.o 85).

    74

    Por outro lado, a coerência interna do regime fiscal em causa no processo principal poderia ser mantida se os fundos de investimento imobiliário especializados não residentes pudessem beneficiar da isenção do imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas, desde que as autoridades fiscais alemãs consigam garantir, com a plena colaboração desses fundos, que os investidores dos referidos fundos pagam um imposto equivalente àquele a que estão sujeitos os investidores de um fundo de investimento imobiliário especializado residente. Permitir a tais fundos de investimento imobiliário especializados não residentes beneficiar dessa isenção, nestas condições, constituiria uma medida menos restritiva do que o regime atual (v., neste sentido, Acórdão de 21 de junho de 2018, Fidelity Funds e o., C‑480/16, EU:C:2018:480, n.o 84).

    75

    Por conseguinte, a necessidade de preservar a coerência do regime fiscal nacional não pode ser invocada para justificar a restrição à livre circulação de capitais que decorre da legislação alemã em causa no processo principal.

    Quanto à necessidade de preservar uma repartição equilibrada do poder de tributação entre os Estados‑Membros

    76

    Importa recordar que, como o Tribunal de Justiça declarou reiteradamente, a justificação baseada na preservação da repartição equilibrada do poder de tributação entre os Estados‑Membros pode ser admitida quando o regime em causa vise prevenir comportamentos suscetíveis de comprometer o direito de um Estado‑Membro exercer a sua competência fiscal em relação às atividades realizadas no seu território (Acórdão de 17 de março de 2022, AllianzGI‑Fonds AEVN, C‑545/19, EU:C:2022:193, n.o 82 e jurisprudência referida).

    77

    No entanto, como o Tribunal de Justiça também já declarou, quando um Estado‑Membro tenha optado, como na situação em causa no processo principal, por não tributar os fundos residentes beneficiários de dividendos de origem nacional, não pode invocar a necessidade de garantir uma repartição equilibrada do poder de tributar entre os Estados‑Membros para justificar a tributação dos fundos não residentes beneficiários desses rendimentos (v., por analogia, Acórdão de 17 de março de 2022, AllianzGI‑Fonds AEVN, C‑545/19, EU:C:2022:193, n.o 83 e jurisprudência referida).

    78

    Daqui resulta que a justificação baseada na preservação de uma repartição equilibrada do poder de tributação entre os Estados‑Membros também não pode ser acolhida.

    79

    Tendo em conta todas as considerações que precedem, há que responder à questão submetida que o artigo 63.o TFUE deve ser interpretado no sentido de que se opõe à legislação de um Estado‑Membro que sujeita parcialmente os fundos de investimento imobiliário especializados não residentes ao imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas, a título dos rendimentos imobiliários que auferem no território desse Estado‑Membro, ao passo que os fundos de investimento imobiliário especializados residentes estão isentos deste imposto.

    Quanto às despesas

    80

    Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

     

    Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Primeira Secção) declara:

     

    O artigo 63.o TFUE deve ser interpretado no sentido de que se opõe à legislação de um Estado‑Membro que sujeita parcialmente os fundos de investimento imobiliário especializados não residentes ao imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas, a título dos rendimentos imobiliários que auferem no território desse Estado‑Membro, ao passo que os fundos de investimento imobiliário especializados residentes estão isentos deste imposto.

     

    Assinaturas


    ( *1 ) Língua do processo: alemão.

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