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Document 62020CJ0525

    Acórdão do Tribunal de Justiça (Segunda Secção) de 5 de maio de 2022.
    Association France Nature Environnement contra Premier ministre e Ministre de la Transition écologique et solidaire.
    Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Conseil d'État (França).
    Reenvio prejudicial — Ambiente — Diretiva 2000/60/CE — Quadro de ação da União Europeia no domínio da política da água — Artigo 4.o, n.o 1, alínea a) — Objetivos ambientais relativos às águas de superfície — Obrigação de os Estados‑Membros não autorizarem um projeto suscetível de provocar uma deterioração do estado de uma massa de água — Conceito de “deterioração” do estado de uma massa de água de superfície — Artigo 4.o, n.os 6 e 7 — Derrogações à proibição de deterioração — Requisitos — Programa ou projeto com impactos temporários de curta duração e sem consequências a longo prazo para o estado de uma massa de água de superfície.
    Processo C-525/20.

    Court reports – general

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:2022:350

     ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção)

    5 de maio de 2022 ( *1 )

    «Reenvio prejudicial — Ambiente — Diretiva 2000/60/CE — Quadro de ação da União Europeia no domínio da política da água — Artigo 4.o, n.o 1, alínea a) — Objetivos ambientais relativos às águas de superfície — Obrigação de os Estados‑Membros não autorizarem um projeto suscetível de provocar uma deterioração do estado de uma massa de água — Conceito de “deterioração” do estado de uma massa de água de superfície — Artigo 4.o, n.os 6 e 7 — Derrogações à proibição de deterioração — Requisitos — Programa ou projeto com impactos temporários de curta duração e sem consequências a longo prazo para o estado de uma massa de água de superfície»

    No processo C‑525/20,

    que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Conseil d’État (Conselho de Estado, em formação jurisdicional, França), por Decisão de 14 de outubro de 2020, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 19 de outubro de 2020, no processo

    Association France Nature Environnement

    contra

    Premier ministre,

    Ministre de la Transition écologique et solidaire,

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção),

    composto por: A. Prechal, presidente de secção, J. Passer (relator), F. Biltgen, N. Wahl e M. L. Arastey Sahún, juízes,

    advogado‑geral: A. Rantos,

    secretário: M. Ferreira, administradora principal,

    vistos os autos e após a audiência de 28 de outubro de 2021,

    vistas as observações apresentadas:

    em representação da associação France Nature Environnement, por B. Hogommat,

    em representação do Governo francês, por T. Stéhelin, W. Zemamta e E. Toutain, na qualidade de agentes,

    em representação do Governo checo, por M. Smolek, J. Vláčil e L. Dvořáková, na qualidade de agentes,

    em representação do Governo neerlandês, por K. Bulterman e A. M. de Ree, na qualidade de agentes,

    em representação da Comissão Europeia, por C. Valero e O. Beynet, na qualidade de agentes,

    ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 13 de janeiro de 2022,

    profere o presente

    Acórdão

    1

    O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 4.o da Diretiva 2000/60/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de outubro de 2000, que estabelece um quadro de ação comunitária no domínio da política da água (JO 2000, L 327, p. 1).

    2

    Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a association France Nature Environnement ao Premier ministre (Primeiro Ministro) e à ministre de la Transition écologique et solidaire (Ministra da Transição Ecológica e Solidária) a respeito da legalidade de um decreto relativo aos planos diretores de ordenamento e de gestão das águas e aos planos de ordenamento e gestão das águas.

    Quadro jurídico

    Direito da União

    3

    Nos termos dos considerandos 11, 25, 26 e 32 da Diretiva 2000/60:

    «(11)

    Segundo o artigo 174.o do Tratado, a política comunitária no âmbito do ambiente contribuirá para a prossecução dos objetivos de preservação, proteção e melhoria da qualidade do ambiente, mediante uma utilização prudente e racional dos recursos naturais, e deve basear‑se nos princípios da precaução e da ação preventiva, da correção, prioritariamente na fonte, dos danos causados ao ambiente e do poluidor‑pagador.

    […]

    (25)

    Devem‑se estabelecer definições comuns do estado das águas em termos de qualidade e, quando pertinente para efeitos de proteção ambiental, de quantidade. Devem‑se definir objetivos ambientais para garantir o bom estado das águas de superfície e subterrâneas em todo o território da Comunidade e para evitar a deterioração do estado das águas.

    (26)

    Os Estados‑Membros devem procurar alcançar, pelo menos, o objetivo de um bom estado das águas, através da definição e execução das medidas necessárias em programas integrados de medidas, tendo em conta as exigências comunitárias em vigor. Nos casos em que o estado da água já seja bom, esse estado deve ser mantido. Para as águas subterrâneas, para além dos requisitos de bom estado, deverá ser identificada e invertida qualquer tendência significativa e persistente para o aumento da concentração de poluentes.

    […]

    (32)

    Podem existir motivos que justifiquem isenções à obrigação de prevenir uma maior deterioração ou de alcançar um bom estado das águas, sob condições específicas, isto é, se o incumprimento resultar de circunstâncias imprevistas ou excecionais, designadamente inundações ou secas, ou se, por razões de perentório interesse público, derivar de alterações recentes das características físicas de uma massa de águas de superfície ou de alterações do nível de massas de águas subterrâneas, desde que sejam tomadas todas as medidas viáveis para atenuar o impacto adverso no estado da massa de água.»

    4

    O artigo 1.o desta diretiva, sob a epígrafe «Objeto», prevê:

    «O objetivo da presente diretiva é estabelecer um enquadramento para a proteção das águas de superfície interiores, das águas de transição, das águas costeiras e das águas subterrâneas que:

    a)

    Evite a continuação da degradação e proteja e melhore o estado dos ecossistemas aquáticos, e também dos ecossistemas terrestres e zonas húmidas diretamente dependentes dos ecossistemas aquáticos, no que respeita às suas necessidades em água;

    […]»

    5

    Nos termos do artigo 2.o da referida diretiva, sob a epígrafe «Definições»:

    «Para efeitos da presente diretiva, entende‑se por:

    1)

    “Águas de superfície”: as águas interiores, com exceção das águas subterrâneas, das águas de transição e das águas costeiras, exceto no que se refere ao estado químico; este estado aplica‑se também às águas territoriais.

    […]

    10)

    “Massa de águas de superfície”: uma massa distinta e significativa de águas de superfície, como por exemplo um lago, uma albufeira, um ribeiro, rio ou canal, um troço de ribeiro, rio ou canal, águas de transição ou uma faixa de águas costeiras.

    […]

    17)

    “Estado das águas de superfície”: a expressão global do estado em que se encontra uma determinada massa de águas de superfície, definido em função do pior dos dois estados, ecológico ou químico, dessas águas.

    18)

    “Bom estado das águas de superfície”: o estado em que se encontra uma massa de águas de superfície quando os seus estados ecológico e químico são considerados, pelo menos, “bons”.

    […]»

    6

    O artigo 4.o da mesma diretiva, sob a epígrafe «Objetivos ambientais», dispõe, nos seus n.os 1 e 6 a 8:

    «1.   Ao garantir a operacionalidade dos programas de medidas especificados nos planos de gestão de bacias hidrográficas:

    a)

    Para as águas de superfície:

    i)

    Os Estados‑Membros aplicarão as medidas necessárias para evitar a deterioração do estado de todas as massas de águas de superfície, em aplicação dos n.os 6 e 7 e sem prejuízo do disposto no n.o 8;

    ii)

    Os Estados‑Membros protegerão, melhorarão e recuperarão todas as massas de águas de superfície, sob reserva de aplicação da alínea iii) para as massas de água artificiais e fortemente modificadas, com o objetivo de alcançar um bom estado das águas de superfície 15 anos, o mais tardar, a partir da entrada em vigor da presente diretiva nos termos do anexo V, sob reserva da aplicação das prorrogações determinadas nos termos do n.o 4 e da aplicação dos n.os 5, 6 e 7 e sem prejuízo do disposto no n.o 8;

    iii)

    Os Estados‑Membros protegerão e melhorarão o estado de todas as massas de água artificiais e fortemente modificadas, a fim de alcançar um bom potencial ecológico e um bom estado químico das águas de superfície 15 anos, o mais tardar, a partir da entrada em vigor da presente diretiva, nos termos do disposto no anexo V, sem prejuízo da aplicação das prorrogações determinadas nos termos do n.o 4 e da aplicação dos n.os 5, 6 e 7, bem como do n.o 8;

    […]

    6.   A deterioração temporária do estado das massas de água não será considerada uma violação dos requisitos da presente diretiva se resultar de circunstâncias imprevistas ou excecionais, de causas naturais ou de força maior que sejam excecionais ou não pudessem razoavelmente ter sido previstas, particularmente inundações extremas e secas prolongadas, ou de circunstâncias devidas a acidentes que não pudessem razoavelmente ter sido previstos, desde que se verifiquem todas as seguintes condições:

    a)

    Sejam tomadas todas as medidas para evitar uma maior deterioração do estado das águas e para não comprometer o cumprimento dos objetivos da presente diretiva noutras massas de água não afetadas por essas circunstâncias;

    b)

    Se encontrem indicadas no plano de gestão de bacia hidrográfica as condições em que podem ser declaradas as referidas circunstâncias imprevistas ou excecionais, incluindo a adoção dos indicadores apropriados;

    c)

    As medidas a tomar nessas circunstâncias excecionais estejam incluídas no programa de medidas e não comprometam a recuperação da qualidade da massa de água quando essas circunstâncias deixarem de se verificar;

    d)

    Os efeitos das circunstâncias excecionais ou que não poderiam razoavelmente ter sido previstas sejam analisados anualmente e, sob reserva dos motivos previstos na alínea a) do n.o 4, sejam tomadas todas as medidas para restabelecer a massa de água no estado em que se encontrava antes de sofrer os efeitos dessas circunstâncias, tão cedo quanto for razoavelmente viável; e

    e)

    Seja incluída na atualização seguinte do plano de gestão de bacia hidrográfica uma breve descrição dos efeitos dessas circunstâncias e das medidas tomadas ou a tomar nos termos das alíneas a) e d).

    7.   Não se considerará que os Estados‑Membros tenham violado o disposto na presente diretiva quando:

    o facto de não se restabelecer o bom estado das águas subterrâneas, o bom estado ecológico ou, quando aplicável, o bom potencial ecológico, ou de não se conseguir evitar a deterioração do estado de uma massa de águas de superfície ou subterrâneas, resultar de alterações recentes das características físicas de uma massa de águas de superfície ou de alterações do nível de massas de águas subterrâneas, ou

    o facto de não se evitar a deterioração do estado de uma massa de água de excelente para bom resultar de novas atividades humanas de desenvolvimento sustentável,

    e se encontrarem preenchidas todas as seguintes condições:

    a)

    Sejam tomadas todas as medidas exequíveis para mitigar o impacto negativo sobre o estado da massa de água;

    b)

    As razões que explicam as alterações estejam especificamente definidas e justificadas no plano de gestão de bacia hidrográfica exigido nos termos do artigo 13.o e os objetivos sejam revistos de seis em seis anos;

    c)

    As razões de tais modificações ou alterações sejam de superior interesse público e/ou os benefícios para o ambiente e para a sociedade decorrentes da realização dos objetivos definidos no n.o 1 sejam superados pelos benefícios das novas modificações ou alterações para a saúde humana, para a manutenção da segurança humana ou para o desenvolvimento sustentável; e

    d)

    Os objetivos benéficos decorrentes dessas modificações ou alterações da massa de água não possam, por motivos de exequibilidade técnica ou de custos desproporcionados, ser alcançados por outros meios que constituam uma opção ambiental significativamente melhor.

    8.   Ao aplicarem os n.os 3, 4, 5, 6 e 7, os Estados‑Membros assegurar‑se‑ão de que essa aplicação não compromete o cumprimento dos objetivos da presente diretiva noutras massas de água pertencentes à mesma região hidrográfica e não colide com a execução da restante legislação comunitária no domínio do ambiente.»

    7

    O artigo 5.o da Diretiva 2000/60, sob a epígrafe «Características da região hidrográfica, estudo dos efeitos da atividade humana no ambiente e análise económica da utilização da água», prevê:

    «1.   Cada Estado‑Membro garantirá que, em relação a cada região hidrográfica ou a cada secção de uma região hidrográfica internacional que abranja o seu território, se realizarão, de acordo com as especificações técnicas definidas nos anexos II e III:

    uma análise das respetivas características,

    um estudo do impacto da atividade humana sobre o estado das águas de superfície e sobre as águas subterrâneas, e

    uma análise das respetivas características,

    que deverão estar concluídos o mais tardar quatro anos a contar da data de entrada em vigor da presente diretiva.

    2.   As análises e estudos referidos no n.o 1 serão revistos e, se necessário, atualizados o mais tardar 13 anos a contar da data de entrada em vigor da presente diretiva e, posteriormente, de seis em seis anos.»

    8

    O artigo 8.o desta diretiva, sob a epígrafe «Monitorização do estado das águas de superfície e subterrâneas e das zonas protegidas», tem a seguinte redação:

    «1.   Os Estados‑Membros garantirão a elaboração de programas de monitorização do estado das águas, por forma a permitir uma análise coerente e exaustiva do estado das águas em cada região hidrográfica:

    para as águas de superfície, esses programas incluirão:

    i)

    o volume e o débito, na medida em que tal seja pertinente para o estado ecológico e químico e para o potencial ecológico, e

    ii)

    o estado ecológico e químico e o potencial ecológico,

    […]

    2.   Esses programas deverão estar operacionais o mais tardar seis anos a contar da data de entrada em vigor da presente diretiva, salvo disposição em contrário da legislação pertinente. A monitorização deve preencher os requisitos do anexo V.

    […]»

    9

    Nos termos do artigo 11.o da referida diretiva, sob a epígrafe «Programa de medidas»:

    «1.   Cada Estado‑Membro assegurará, para cada região hidrográfica ou para a parte de qualquer região hidrográfica internacional que pertença ao seu território, o estabelecimento de um programa de medidas, tendo em conta os resultados das análises exigidas nos termos do artigo 5.o com o objetivo da prossecução dos objetivos definidos no artigo 4.o Esses programas de medidas podem fazer referência a medidas decorrentes de legislação adotada a nível nacional e abrangendo todo o território de um Estado‑Membro. Sempre que necessário, os Estados‑Membros podem adotar medidas aplicáveis a todas as regiões hidrográficas e/ou às partes das regiões hidrográficas internacionais situadas no seu território.

    […]

    8.   Os programas de medidas serão revistos e, se necessário, atualizados o mais tardar 15 anos a contar da data de entrada em vigor da presente diretiva e, posteriormente, de seis em seis anos. Qualquer medida nova ou revista que seja estabelecida ao abrigo de um programa atualizado deve estar operacional num prazo de três anos a contar da sua adoção.»

    10

    O artigo 13.o da mesma diretiva, sob a epígrafe «Planos de gestão de bacia hidrográfica», prevê:

    «1.   Os Estados‑Membros garantirão a elaboração de um plano de gestão de bacia hidrográfica, para cada região hidrográfica inteiramente situada no seu território.

    […]

    4.   O plano de gestão de bacia hidrográfica deve incluir a informação especificada no anexo VII.

    […]

    6.   Os planos de gestão de bacia hidrográfica serão publicados o mais tardar nove anos a contar da data de entrada em vigor da presente diretiva.

    7.   Os planos de gestão de bacia hidrográfica serão avaliados e atualizados o mais tardar 15 anos a contar da data de entrada em vigor da presente diretiva e, posteriormente, de seis em seis anos.»

    11

    O anexo V da Diretiva 2000/60 enuncia, nos seus pontos 1.3 e 1.3.4:

    «1.3. Monitorização do estado ecológico e químico das águas de superfície

    A rede de monitorização das águas de superfície será estabelecida segundo os requisitos do artigo 8.o Esta rede será concebida de modo a proporcionar uma panorâmica coerente e completa do estado ecológico e químico em cada bacia hidrográfica, e permitirá classificar as massas de água em cinco classes, de acordo com as definições normativas enunciadas no ponto 1.2. Os Estados‑Membros fornecerão um ou mais mapas que mostrem a rede de monitorização das águas de superfície no plano de gestão de bacia hidrográfica.

    […]

    1.3.4. Frequência da monitorização

    Durante o período de monitorização de vigilância, aplicar‑se‑ão, para a monitorização dos parâmetros indicativos dos elementos de qualidade físico‑química, as frequências previstas no quadro seguinte, a não ser que os conhecimentos técnicos e o parecer dos peritos justifiquem intervalos maiores. Para os elementos de qualidade biológica ou hidromorfológica, a monitorização será efetuada pelo menos uma vez durante o período de monitorização de vigilância.

    Para a monitorização operacional: a frequência de monitorização necessária para cada parâmetro será determinada pelos Estados‑Membros de modo a fornecer dados suficientes para uma avaliação fiável do estado do elemento de qualidade pertinente. A título de orientação, a monitorização deverá realizar‑se a intervalos não superiores aos indicados no quadro abaixo, a não ser que os conhecimentos técnicos e o parecer dos peritos justifiquem intervalos maiores.

    As frequências serão escolhidas de modo a que se atinja um nível de fiabilidade e precisão aceitável. O plano de gestão de bacia hidrográfica deverá conter estimativas da fiabilidade e precisão alcançadas pelo sistema de monitorização.

    Serão selecionadas frequências de monitorização que tenham em conta a variabilidade dos parâmetros resultante tanto das condições naturais como das condições antropogénicas. Os momentos para a realização da monitorização serão selecionados de modo a minimizar o impacto das variações sazonais nos resultados, garantindo assim que estes reflitam as alterações registadas na massa de água, em resultado de pressões antropogénicas. Para atingir este objetivo, será, quando necessário, realizada monitorização suplementar em estações diferentes do mesmo ano.

    Elemento de

    qualidade

    Rios

    Lagos

    Águas de transição

    Águas costeiras

    Biológica

    Fitoplâncton

    6 meses

    6 meses

    6 meses

    6 meses

    Outra flora

    aquática

    3 anos

    3 anos

    3 anos

    3 anos

    Macroinvertebrados

    3 anos

    3 anos

    3 anos

    3 anos

    Peixes

    3 anos

    3 anos

    3 anos

     

    Hidromorfológica

    Continuidade

    6 anos

     

     

     

    Hidrologia

    contínua

    1 mês

     

     

    Morfologia

    6 anos

    6 anos

    6 anos

    6 anos

    Físico‑química

    Condições térmicas

    3 meses

    3 meses

    3 meses

    3 meses

    Oxigenação

    3 meses

    3 meses

    3 meses

    3 meses

    Salinidade

    3 meses

    3 meses

    3 meses

     

    Estado em nutrientes

    3 meses

    3 meses

    3 meses

    3 meses

    Estado de acidificação

    3 meses

    3 meses

     

     

    Outros

    poluentes

    3 meses

    3 meses

    3 meses

    3 meses

    Substâncias prioritárias

    1 mês

    1 mês

    1 mês

    1 mês

    […]»

    12

    Nos termos do anexo VII da Diretiva 2000/60, sob a epígrafe «Planos de gestão das bacias hidrográficas»:

    «A. Os planos de gestão das bacias hidrográficas devem abranger os seguintes elementos:

    […]

    5.

    Uma lista dos objetivos ambientais estabelecidos no artigo 4.o para as águas de superfície, as águas subterrâneas e as zonas protegidas, incluindo, em especial, a identificação dos casos em que tenha havido recurso aos n.os 4, 5, 6 e 7 do artigo 4.o, e as informações relacionadas exigidas nos termos desse artigo.

    […]»

    Direito francês

    13

    O artigo L. 212‑1 do code de l’environnement (Código do Ambiente) prevê:

    «[…]

    III. — Cada bacia ou agrupamento de bacias hidrográficas é dotada de um ou mais planos diretores de ordenamento e de gestão das águas que fixam os objetivos referidos no IV do presente artigo […]

    IV. — Os objetivos de qualidade e de quantidade das águas fixados pelos planos diretores de ordenamento e de gestão das águas correspondem:

    1o Para as águas de superfície, com exceção das massas de água artificiais ou fortemente modificadas pelas atividades humanas, em bom estado ecológico e químico;

    2o Para as massas de água de superfície artificiais ou fortemente modificadas por atividades humanas, num bom potencial ecológico e num bom estado químico;

    […]

    4o À prevenção da deterioração da qualidade das águas;

    […]

    VII. — Alterações das características físicas das águas ou o exercício de novas atividades humanas podem justificar, nas condições definidas pelo decreto previsto no ponto XIII, derrogações fundamentadas ao cumprimento dos objetivos mencionados nos n.os 1 a 4 do ponto IV […].

    […]

    XI. — Os programas e as decisões administrativas no domínio da água devem ser compatíveis ou tornados compatíveis com as disposições dos planos diretores de ordenamento e de gestão das águas.

    […]

    XIII. — Um decreto do Conseil d’État (Conselho de Estado) estabelece as modalidades de aplicação do presente artigo.»

    14

    O artigo R. 212‑13 do code de l’environnement (Código do Ambiente), conforme alterado pelo décret no 2018‑847 du 4 octobre 2018 relatif aux schémas directeurs d’aménagement et de gestion des eaux et schémas d’aménagement et de gestion des eaux (Decreto n.o 2018‑847, de 4 de outubro de 2018, Relativo aos Planos Diretores de Ordenamento e Gestão das Águas e Planos de Ordenamento e de Gestão das Águas) (JORF de 6 de outubro de 2018, texto n.o 11), dispõe:

    «Para efeitos de aplicação do n.o 4 do ponto IV do artigo L. 212‑1, a prevenção da deterioração da qualidade das águas consiste em assegurar que:

    no que respeita ao estado ecológico e ao potencial ecológico das águas de superfície, nenhum dos elementos de qualidade que caracterizam esse estado ou esse potencial se encontre num estado correspondente a uma classe inferior à que o caracterizava anteriormente;

    no que respeita ao estado químico das águas de superfície, as concentrações de poluentes não ultrapassem as normas de qualidade ambiental quando não as ultrapassavam anteriormente;

    […]

    Para apreciar a compatibilidade dos programas e decisões administrativas mencionadas no ponto XI do artigo L. 212‑1 com o objetivo de prevenção da deterioração da qualidade das águas referido no n.o 4 do ponto IV do mesmo artigo, serão tidas em conta as medidas de prevenção e de redução e não serão tidos em conta os impactos temporários de curta duração e sem consequências a longo prazo.»

    15

    Nos termos do artigo R. 212‑16 do code de l’environnement (Código do Ambiente):

    «[…]

    I‑A. — As derrogações previstas no ponto VII do artigo L. 212‑1 só podem ser concedidas para um projeto que implique modificações nas características físicas das águas ou no exercício de novas atividades humanas quando se verifiquem todas as seguintes condições:

    1o Sejam tomadas todas as medidas exequíveis para mitigar o impacto negativo sobre o estado das massas de água em causa;

    2o As modificações ou alterações das massas de água respondem a um interesse público superior ou os benefícios esperados do projeto em matéria de saúde humana, da manutenção da segurança para as pessoas ou de desenvolvimento sustentável são superiores aos benefícios para o ambiente e para a sociedade relacionados com a realização dos objetivos estabelecidos no ponto IV do artigo L. 212‑1;

    3o Os objetivos benéficos prosseguidos pelo projeto não podem, por razões de exequibilidade técnica ou de custos desproporcionados, ser alcançados por outros meios que constituam uma opção ambiental significativamente melhor.

    O prefeito coordenador da bacia elabora a lista dos projetos que satisfaçam ou possam preencher essas condições, prevista no ponto VII do artigo L. 212‑1.

    As razões das modificações ou alterações das massas de água sob estas condições são expressamente indicadas e justificadas no plano diretor de ordenamento e gestão das águas aquando da sua atualização.

    […]»

    Litígio no processo principal e questões prejudiciais

    16

    Por petição e outro articulado, registados, respetivamente, em 1 de abril de 2019 e 22 de setembro de 2020, a associação France Nature Environnement interpôs no Conseil d’État (Conselho de Estado, em formação jurisdicional, França) um recurso de anulação do Decreto n.o 2018‑847 na medida em que prevê que é aditado ao artigo R. 212‑13 do code de l’environnement (Código do Ambiente) um último parágrafo, nos termos do qual, para apreciar a compatibilidade dos programas e das decisões administrativas adotados no domínio da água com o objetivo de prevenir a deterioração da qualidade das águas, «não são tidos em conta os impactos temporários de curta duração e sem consequências a longo prazo», e da decisão tácita decorrente do indeferimento, pelo Primeiro‑Ministro, do seu pedido de revogação da referida disposição.

    17

    Em apoio do seu recurso, esta associação alegou que a referida disposição viola a Diretiva 2000/60, nomeadamente o seu artigo 4.o, n.o 1, que proíbe qualquer deterioração, temporária ou a longo prazo, do estado das massas de água.

    18

    O órgão jurisdicional de reenvio salienta que, no seu Acórdão de 1 de julho de 2015, Bund für Umwelt und Naturschutz Deutschland (C‑461/13, EU:C:2015:433), o Tribunal de Justiça declarou que o artigo 4.o, n.o 1, alínea a), i) a iii), da Diretiva 2000/60 deve ser interpretado no sentido de que os Estados‑Membros são obrigados, sob reserva das derrogações previstas nos n.os 6 e 7 do referido artigo, a recusar a aprovação de um projeto concreto quando este seja suscetível de provocar uma deterioração do estado de uma massa de águas de superfície ou quando comprometa a obtenção de um bom estado das águas de superfície ou de um bom potencial ecológico e de um bom estado químico das águas de superfície na data prevista nesta diretiva.

    19

    No referido órgão jurisdicional, a ministre de la Transition écologique et solidaire (Ministra da Transição Ecológica e Solidária) sustenta que a disposição em causa no processo principal não é abrangida pela derrogação prevista no artigo 4.o, n.o 6, da Diretiva 2000/60, que deve resultar de circunstâncias devidas a causas naturais ou de força maior, mas pela visada no n.o 7 desse artigo, que exclui do âmbito das violações à referida diretiva as deteriorações do estado de uma massa de água resultantes de novas atividades de desenvolvimento humano sustentável, desde que se encontrem cumulativamente preenchidas as quatro condições mencionadas nesse número. A este respeito, a referida Ministra apresentou o documento de orientação n.o 36, consagrado às «derrogações aos objetivos ambientais nos termos do n.o 7 do artigo 4.o», elaborado no âmbito do processo denominado «Estratégia Comum de execução da diretiva‑quadro sobre a água e a diretiva inundações» pelas administrações em causa dos Estados‑Membros e da Comissão Europeia, em dezembro de 2017, segundo o qual, quando essas atividades só têm um impacto temporário no estado de uma massa de água e não têm consequências a longo prazo, podem ser objeto de uma autorização sem que esta esteja subordinada ao respeito das condições mencionadas no artigo 4.o, n.o 7, da referida diretiva.

    20

    Segundo o órgão jurisdicional de reenvio, a resposta ao fundamento invocado pela associação recorrente depende, portanto, da questão de saber se, tendo em conta o objetivo de prevenção da deterioração da qualidade das águas de superfície, a autoridade administrativa pode não ter em conta os impactos temporários de curta duração e sem consequências a longo prazo dos programas e projetos sujeitos à sua autorização e, em caso afirmativo, em que condições e limites.

    21

    Foi nestas circunstâncias que o Conseil d’État (Conselho de Estado, em formação jurisdicional) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

    «1)

    Deve o artigo 4.o da Diretiva [2000/60] ser interpretado no sentido de que permite aos Estados‑Membros, ao autorizarem um programa ou um projeto, não ter em conta os seus impactos temporários de curta duração e sem consequências a longo prazo para o estado das águas de superfície?

    2)

    Em caso de resposta afirmativa, que condições devem estes programas e projetos preencher para efeitos do artigo 4.o da diretiva, em especial, dos seus n.os 6 e 7?»

    Quanto às questões prejudiciais

    22

    Com as suas duas questões, que importa examinar em conjunto, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 4.o da Diretiva 2000/60 deve ser interpretado no sentido de que permite aos Estados‑Membros, quando apreciam a compatibilidade de um programa ou de um projeto particular com o objetivo de prevenir a deterioração da qualidade das águas, não terem em conta os impactos temporários de curta duração e sem consequências a longo prazo para estas e, se for caso disso, em que condições.

    23

    Nos termos do artigo 4.o, n.o 1, alínea a), i), da Diretiva 2000/60, ao garantir a operacionalidade dos programas de medidas especificados nos planos de gestão de bacias hidrográficas, os Estados‑Membros aplicarão as medidas necessárias para evitar a deterioração do estado de todas as massas de águas de superfície, sob reserva da aplicação dos n.os 6 e 7 deste artigo e sem prejuízo do disposto no seu n.o 8.

    24

    A este respeito, o Tribunal de Justiça declarou que o artigo 4.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva 2000/60 não se limita a enunciar, através de uma formulação programática, simples objetivos de planeamento de gestão, mas tem efeitos vinculativos, uma vez determinado o estado ecológico da massa de águas em causa em cada etapa do procedimento descrito por esta diretiva. Por conseguinte, esta disposição não contém apenas obrigações programáticas, mas diz também respeito a projetos concretos (v., neste sentido, Acórdão de 1 de julho de 2015, Bund für Umwelt und Naturschutz Deutschland, C‑461/13, EU:C:2015:433, n.os 43 e 47).

    25

    Assim, sob reserva da concessão de uma derrogação, deve ser evitada qualquer deterioração do estado de uma massa de águas, independentemente dos planos a mais longo prazo previstos pelos planos de gestão e pelos programas de medidas. A obrigação de prevenir a deterioração do estado das águas de superfície continua a ser vinculativa em cada fase de execução da Diretiva 2000/60 e é aplicável a qualquer tipo e estado de massa de águas de superfície para o qual tenha sido ou devia ter sido adotado um plano de gestão. O Estado‑Membro em causa é, por conseguinte, obrigado a recusar a autorização de um projeto quando este último for suscetível de deteriorar o estado da massa de águas em causa ou de comprometer a obtenção de um bom estado das massas de águas de superfície, com exceção dos casos em que se considere que o referido projeto é abrangido por uma derrogação ao abrigo do artigo 4.o, n.o 7, desta diretiva (Acórdão de 1 de julho de 2015, Bund für Umwelt und Naturschutz Deutschland, C‑461/13, EU:C:2015:433, n.o 50).

    26

    Isto implica que, no decurso do processo de aprovação de um projeto, e, portanto, antes da tomada de decisão, as autoridades competentes são obrigadas, por força do artigo 4.o da Diretiva 2000/60, a verificar se esse projeto pode acarretar efeitos negativos para a água que sejam contrários às obrigações de prevenir a deterioração e de melhorar o estado das massas de água de superfície e subterrâneas (Acórdão de 28 de maio de 2020, Land Nordrhein‑Westfalen, C‑535/18, EU:C:2020:391, n.o 76).

    27

    No que se refere ao conceito «deterioração do estado» de uma massa de águas de superfície, não definido na Diretiva 2000/60, o Tribunal de Justiça precisou que há que considerar que há deterioração do estado de uma massa de águas de superfície, na aceção do artigo 4.o, n.o 1, alínea a), i), desta diretiva, a partir do momento em que o estado de pelo menos um dos elementos de qualidade, na aceção do anexo V da referida diretiva, se degradar uma classe, mesmo que essa deterioração não se traduza numa deterioração da classificação da massa de águas de superfície no seu conjunto. No entanto, se o elemento de qualidade em causa, na aceção deste anexo, já se encontrar na classe mais baixa, qualquer deterioração deste elemento constitui uma deterioração do estado de uma massa de águas de superfície (Acórdão de 4 de maio de 2016, Comissão/Áustria, C‑346/14, EU:C:2016:322, n.o 59 e jurisprudência referida).

    28

    No caso em apreço, a disposição nacional em causa no processo principal dispõe que, para efeitos da fiscalização relativa à prevenção da deterioração do estado das massas de águas de superfície, referida no n.o 26 do presente acórdão, «não são tidos em conta os impactos temporários de curta duração e sem consequências a longo prazo».

    29

    Assim, decorre da própria redação desta disposição e do pedido de decisão prejudicial que a referida disposição visa, nomeadamente, permitir a autorização de um programa ou de um projeto que tenha apenas esse impacto temporário no estado de uma massa de águas de superfície, sem que seja necessário, nesse caso, verificar se estão preenchidas as condições cumulativas previstas no artigo 4.o, n.o 7, da Diretiva 2000/60 e reproduzidas, em substância, no artigo R. 212‑16 do code de l’environnement (Código do Ambiente).

    30

    A este respeito, os governos que intervieram e a Comissão sustentam, em substância, que, mesmo quando provocam uma deterioração na aceção indicada no n.o 27 do presente acórdão, os impactos temporários de curta duração e sem consequências de longo prazo para o estado de uma massa de águas de superfície não constituem necessariamente uma deterioração proibida pelo artigo 4.o, n.o 1, alínea a), i), da Diretiva 2000/60, como resulta nomeadamente dos desenvolvimentos contidos no documento de orientação referido no n.o 19 do presente acórdão. Neste contexto, referem‑se, especialmente, à periodicidade estabelecida para o estudo do impacto da atividade humana para o estado das águas de superfície, no artigo 5.o desta diretiva, e para a atualização dos programas de medidas, no seu artigo 11.o, bem como aos intervalos de controlo que são indicados, para efeitos dos programas de monitorização do estado das águas referidos no artigo 8.o da referida diretiva, no quadro que figura no seu anexo V, ponto 1.3.4. Ora, na falta de uma deterioração proibida, também não há matéria de derrogação na aceção do artigo 4.o, n.o 7, da mesma diretiva.

    31

    Todavia, tal interpretação, como veiculada, nomeadamente pelo referido documento de orientação, cujo caráter juridicamente não vinculativo foi sublinhado pelo advogado‑geral no n.o 75 das suas conclusões, não decorre das disposições da Diretiva 2000/60 e é, por outro lado, contrariada pela sistemática geral desta diretiva e pelos objetivos que prossegue. Com efeito, embora a obrigação de prevenir a deterioração do estado das massas de águas de superfície não implique que os Estados‑Membros sejam obrigados, quando apreciam a compatibilidade de um programa ou de um projeto concreto com o objetivo de prevenir a deterioração da qualidade das águas, a ter em conta os impactos temporários de curta duração e sem consequências a longo prazo, quando for demonstrado que esses impactos, por natureza, têm apenas poucos efeitos no estado das massas de água e que, por conseguinte, não são de molde a provocar deteriorações para as mesmas, tal não sucede quando é demonstrado que esses impactos podem provocar uma deterioração na aceção indicada no n.o 27 do presente acórdão, quando esta tenha caráter temporário.

    32

    Antes de mais, decorre da leitura conjugada dos n.os 1 e 6 do artigo 4.o da Diretiva 2000/60 que a obrigação de prevenir a deterioração do estado das massas de águas de superfície inclui a obrigação de prevenir uma deterioração temporária do estado das referidas massas. Com efeito, o facto de prever, no artigo 4.o, n.o 6, desta diretiva, uma derrogação para essa deterioração confirma que o artigo 4.o, n.o 1, alínea a), i), da referida diretiva obriga os Estados‑Membros a prevenir igualmente essa deterioração.

    33

    Seguidamente, cabe salientar que, nos termos do artigo 1.o, alínea a), da Diretiva 2000/60, esta tem por objetivo estabelecer um enquadramento para a proteção das águas de superfície interiores, das águas de transição, das águas costeiras e das águas subterrâneas que evite «a» continuação da degradação e proteja e melhore o estado dos ecossistemas aquáticos, e também dos ecossistemas terrestres e zonas húmidas diretamente dependentes dos ecossistemas aquáticos, no que respeita às suas necessidades em água. Do mesmo modo, o considerando 32 dessa diretiva refere‑se à «obrigação» de prevenir «uma maior» deterioração do estado das águas.

    34

    Por outro lado, o Tribunal de Justiça decidiu que o artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva 2000/60 impõe dois objetivos distintos, embora intrinsecamente ligados. Por um lado, em conformidade com o artigo 4.o, n.o 1, alínea a), i), desta diretiva, os Estados‑Membros aplicarão as medidas necessárias para evitar a deterioração do estado de todas as massas de águas de superfície (obrigação de evitar a deterioração). Por outro lado, em aplicação deste artigo 4.o, n.o 1, alínea a), ii) e iii), os Estados‑Membros protegerão, melhorarão e recuperarão todas as massas de águas de superfície a fim de alcançar um bom estado das mesmas, o mais tardar no fim de 2015 (obrigação de melhoria) (Acórdão de 28 de maio de 2020, Land Nordrhein‑Westfalen, C‑535/18, EU:C:2020:391, n.o 68 e jurisprudência referida).

    35

    Assim, a obrigação de prevenir a deterioração do estado das massas de águas recebeu do legislador da União um estatuto autónomo, não se limitando a um instrumento colocado ao serviço da obrigação de melhoria do estado das massas de águas (Acórdão de 1 de julho de 2015, Bund für Umwelt und Naturschutz Deutschland, C‑461/13, EU:C:2015:433, n.o 49).

    36

    No que se refere à obrigação de prevenir a deterioração, o Tribunal de Justiça sublinhou que, de resto, sob reserva da concessão de uma derrogação, deve ser evitada qualquer deterioração do estado de uma massa de águas de superfície (Acórdão de 4 de maio de 2016, Comissão/Áustria, C‑346/14, EU:C:2016:322, n.o 64 e jurisprudência referida).

    37

    Mais especificamente, o Tribunal de Justiça declarou reiteradamente que, no que respeita aos critérios que permitem concluir no sentido da deterioração do estado de uma massa de águas, resulta da economia do artigo 4.o da Diretiva 2000/60, e nomeadamente dos seus n.os 6 e 7, que as deteriorações do estado de uma massa de águas, ainda que transitórias, só são autorizadas em condições muito estritas e que, por conseguinte, o limiar além do qual se verifica uma violação da obrigação de prevenir a deterioração do estado de uma massa de águas deve ser tão baixo quanto possível [v., neste sentido, Acórdãos de 1 de julho de 2015, Bund für Umwelt und Naturschutz Deutschland, C‑461/13, EU:C:2015:433, n.o 67, e de 24 de junho de 2021, Comissão/Espanha (Deterioração do espaço natural de Doñana), C‑559/19, EU:C:2021:512, n.o 48].

    38

    Por último, há que recordar, neste contexto, que a Diretiva 2000/60 foi adotada com base no artigo 175.o, n.o 1, CE (atual artigo 192.o, n.o 1, TFUE). A este respeito, o considerando 11 desta diretiva recorda que, segundo o artigo 174.o CE (atual artigo 191.o TFUE), a política da União no domínio do ambiente contribuirá para a prossecução dos objetivos de preservação, proteção e melhoria da qualidade do ambiente, mediante uma utilização prudente e racional dos recursos naturais, e se deve basear nos princípios da precaução e da ação preventiva e no princípio da correção, prioritariamente na fonte, dos danos causados ao ambiente.

    39

    Ora, tanto os objetivos e os princípios assim recordados como o objetivo último da Diretiva 2000/60 que consiste em atingir no mínimo um «bom estado» de todas as águas de superfície na União e em manter esse estado, como enuncia o seu considerando 26 (v., neste sentido, Acórdão de 1 de julho de 2015, Bund für Umwelt und Naturschutz Deutschland, C‑461/13, EU:C:2015:433, n.o 37), confirmam por sua vez a interpretação segundo a qual, sob reserva da aplicação do artigo 4.o, n.os 6 e 7, da referida diretiva e sem prejuízo do n.o 8 deste artigo, deve ser evitada qualquer deterioração do estado de uma massa de água, ainda que temporária ou transitória e de curta duração, tendo em conta os efeitos nefastos no ambiente ou na saúde humana que daí podem resultar.

    40

    É certo que, na prática, tendo em conta as frequências dos controlos previstos no anexo V, ponto 1.3.4, da Diretiva 2000/60, pode acontecer que, no âmbito da monitorização do estado das águas de superfície exigida no artigo 8.o desta diretiva, não seja detetada uma deterioração temporária de um elemento de qualidade na aceção recordada no n.o 27 do presente acórdão.

    41

    Todavia, como salientou o advogado‑geral no n.o 51 das suas conclusões, essas frequências dos controlos levados a cabo para efeitos de análise, vigilância e deteção eventual que se podem, consoante os casos, prolongar de um mês a seis anos não podem ser consideradas um critério pertinente para avaliar uma deterioração potencial do estado de uma massa de águas de superfície no âmbito do controlo ex ante referido no n.o 26 do presente acórdão. Aceitar uma interpretação segundo a qual uma deterioração do estado de uma massa de águas superficiais com uma duração previsível que se conta assim em meses ou em anos não é contrária à obrigação de prevenir a deterioração, prevista no artigo 4.o, n.o 1, desta diretiva, e que, por conseguinte, um projeto suscetível de provocar tal deterioração pode ser autorizado sem que as condições previstas no artigo 4.o, n.o 7, da referida diretiva estejam preenchidas, a saber, fora de qualquer controlo, seria manifestamente incompatível com o que foi salientado, nomeadamente, nos n.os 38 e 39 do presente acórdão.

    42

    Em contrapartida, contrariamente ao que alega o Governo francês, uma interpretação segundo a qual a obrigação de prevenir uma deterioração do estado de uma massa de águas de superfície visa igualmente uma deterioração temporária de curta duração e sem consequências a longo prazo não priva de coerência as disposições do artigo 4.o da Diretiva 2000/60. Com efeito, como qualquer outro projeto suscetível de provocar uma deterioração no estado de uma massa de águas de superfície, um projeto suscetível de provocar uma deterioração de curta duração e sem consequências a longo prazo pode, em princípio, ser autorizado com base no seu artigo 4.o, n.o 7.

    43

    Neste contexto, e no que respeita, nomeadamente aos projetos destinados a proteger ou mesmo a melhorar o estado das massas de água de superfície, como os projetos ditos de «renaturação», evocados pelo Governo francês, afigura‑se assim, nomeadamente, que, a priori, esses projetos respondem a um interesse geral superior ou que os benefícios para o ambiente e para a sociedade associados à realização dos objetivos definidos no artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva 2000/60 serão, no caso desses projetos, superados pelos benefícios para a saúde humana, para a manutenção da segurança humana ou para o desenvolvimento sustentável que daí resultarão, como exige o artigo 4.o, n.o 7, alínea c) da referida diretiva.

    44

    Quanto ao requisito previsto no artigo 4.o, n.o 7, alínea b), da Diretiva 2000/60, segundo o qual «as razões que explicam as alterações [devem ser] especificamente definidas e justificadas no plano de gestão de bacia hidrográfica exigido nos termos do artigo 13.o [desta diretiva] e os objetivos revistos de seis em seis anos», resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça (Acórdão de 4 de maio de 2016, Comissão/Áustria, C‑346/14, EU:C:2016:322, n.os 66 e 68 e jurisprudência referida) e dos termos da parte A, ponto 5, do anexo VII da referida diretiva que o mesmo se pode considerar preenchido quando as razões que estão na origem do projeto em causa estão apenas contidas, na data da autorização do referido projeto, na decisão que o autoriza.

    45

    Tendo em conta todas as considerações precedentes, há que responder às duas questões submetidas que o artigo 4.o da Diretiva 2000/60 deve ser interpretado no sentido de que não permite aos Estados‑Membros, quando apreciam a compatibilidade de um programa ou de um projeto concreto com o objetivo de prevenir a deterioração da qualidade das águas, não ter em conta os impactos temporários de curta duração e sem consequências de longo prazo sobre estas, a menos que seja manifesto que esses impactos só têm, por natureza, pouca incidência no estado das massas de água em causa e que não são suscetíveis de provocar uma «deterioração» desse estado, na aceção da referida disposição. Quando, no âmbito do processo de aprovação de um programa ou de um projeto, as autoridades nacionais competentes determinam que este é suscetível de provocar tal deterioração, esse programa ou esse projeto só pode, mesmo que essa deterioração seja de caráter temporário, ser autorizado se estiverem preenchidas as condições previstas no artigo 4.o, n.o 7, da referida diretiva.

    Quanto às despesas

    46

    Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

     

    Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Segunda Secção) declara:

     

    O artigo 4.o da Diretiva 2000/60/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de outubro de 2000, que estabelece um quadro de ação comunitária no domínio da política da água, deve ser interpretado no sentido de que não permite aos Estados‑Membros, quando apreciam a compatibilidade de um programa ou de um projeto concreto com o objetivo de prevenir a deterioração da qualidade das águas, não ter em conta os impactos temporários de curta duração e sem consequências de longo prazo sobre estas, a menos que seja manifesto que esses impactos só têm, por natureza, pouca incidência no estado das massas de água em causa e que não são suscetíveis de provocar uma «deterioração» desse estado, na aceção da referida disposição. Quando, no âmbito do processo de aprovação de um programa ou de um projeto, as autoridades nacionais competentes determinam que este é suscetível de provocar tal deterioração, esse programa ou esse projeto só pode, mesmo que essa deterioração seja de caráter temporário, ser autorizado se estiverem preenchidas as condições previstas no artigo 4.o, n.o 7, da referida diretiva.

     

    Assinaturas


    ( *1 ) Língua do processo: francês.

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