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Document 62020CC0432

Conclusões do advogado-geral P. Pikamäe apresentadas em 21 de outubro de 2021.
ZK.
Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Verwaltungsgericht Wien.
Reenvio prejudicial — Espaço de liberdade, segurança e justiça — Política de imigração — Diretiva 2003/109/CE — Artigo 9.o, n.o 1, alínea c) — Perda do estatuto de nacional de um país terceiro residente de longa duração — Ausência do território da União Europeia durante um período de doze meses consecutivos — Interrupção desse período de ausência — Estadas irregulares e de curta duração no território da União.
Processo C-432/20.

Court reports – general – 'Information on unpublished decisions' section

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2021:866

 CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

PRIIT PIKAMÄE

apresentadas em 21 de outubro de 2021 ( 1 )

Processo C‑432/20

ZK

sendo interveniente:

Landeshauptmann von Wien

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Verwaltungsgericht Wien (Tribunal Administrativo de Viena, Áustria)]

«Reenvio prejudicial — Espaço de liberdade, segurança e justiça — Política de imigração — Diretiva 2003/109/CE — Artigo 9.o, n.o 1, alínea c) — Perda do estatuto de nacional de um país terceiro residente de longa duração — Ausência do território da União durante um período de 12 meses consecutivos — Interrupção desse período de ausência — Estadas irregulares e de curta duração no território de União»

I. Introdução

1.

No presente processo, que tem como objeto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 267.o TFUE, o Verwaltungsgericht Wien (Tribunal Administrativo de Viena, Áustria) submete ao Tribunal de Justiça três questões prejudiciais relativas à interpretação do artigo 9.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva 2003/109/CE do Conselho, de 25 de novembro de 2003, relativa ao estatuto dos nacionais de países terceiros residentes de longa duração ( 2 ), conforme alterada pela Diretiva 2011/51/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de maio de 2011 ( 3 ) (a seguir «Diretiva 2003/109»).

2.

Este pedido foi apresentado no quadro de um litígio que opõe ZK, nacional cazaque, ao Landeshauptmann von Wien (Governador do Land de Viena, Áustria) a propósito da recusa deste último em renovar o estatuto de nacional de um país terceiro residente de longa duração de ZK. A decisão de indeferimento fundamentou‑se no facto de, entre agosto de 2013 e agosto de 2018, ZK apenas ter estado, em cada ano, alguns dias na União Europeia. O órgão jurisdicional de reenvio considera que a legislação austríaca aplicável ao caso em apreço, que prevê que estadas de curta duração e intermitentes na União não são suficientes para impedir a perda do referido estatuto jurídico devido a ausência do território da União durante mais de 12 meses, não é compatível com o artigo 9.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva 2003/109. Por força desta disposição, um nacional de um país terceiro perde o direito ao estatuto de residente de longa duração em caso de«[a]usência do território da [União] por um período de 12 meses consecutivos». De acordo com o órgão jurisdicional de reenvio, a legislação austríaca referida supra vai além do que o direito da União exige e autoriza.

3.

O presente processo dá ao Tribunal de Justiça a oportunidade de se pronunciar sobre uma questão de direito inédita, ou seja, sobre as condições que o artigo 9.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva 2003/109 impõe para a retirada, pelas autoridades nacionais, do estatuto de nacional de um país terceiro residente de longa duração. Mais concretamente, o Tribunal de Justiça deverá especificar quais são as exigências quanto à duração e à qualidade da estada no território da União que qualquer nacional de um país terceiro deverá cumprir para poder manter o estatuto jurídico que a Diretiva 2003/109 lhe confere. A resposta que o Tribunal de Justiça der a estas questões prejudiciais pode ter impacto na integração dos nacionais de países terceiros no espaço de liberdade, segurança e justiça previsto nos Tratados da União.

II. Quadro jurídico

A. Direito da União

4.

Os considerandos 2, 4, 6, 10 e 12 da Diretiva 2003/109 dispõem:

«(2)

Aquando da reunião extraordinária de Tampere, de 15 e 16 de outubro de 1999, o Conselho Europeu proclamou que o estatuto jurídico dos nacionais de países terceiros deveria aproximar‑se do estatuto dos nacionais dos Estados‑Membros e que uma pessoa que resida legalmente num Estado‑Membro, durante um período a determinar, e seja titular de uma autorização de residência de longa duração deveria beneficiar neste Estado‑Membro de um conjunto de direitos uniformes tão próximos quanto possível dos que gozam os cidadãos da União Europeia.

[…]

(4)

A integração dos nacionais de países terceiros que sejam residentes de longa duração nos Estados‑Membros constitui um elemento‑chave para promover a coesão económica e social, que é um dos objetivos fundamentais da Comunidade consagrado no Tratado.

[…]

(6)

O critério principal para a aquisição do estatuto de residente de longa duração deverá ser a duração da residência no território de um Estado‑Membro. Esta residência deverá ter sido legal e ininterrupta a fim de comprovar o enraizamento da pessoa no país. Deve ser prevista uma certa flexibilidade para ter em conta determinadas circunstâncias que podem levar alguém a afastar‑se do território de forma temporária.

[…]

(10)

Importa estabelecer um sistema de regras processuais para regular a análise do pedido de aquisição do estatuto de residente de longa duração. Estes procedimentos deverão ser eficazes e poder ser geridos tendo em conta a carga normal de trabalho das administrações dos Estados‑Membros, devendo igualmente ser transparentes e justos, a fim de proporcionarem um nível adequado de segurança jurídica às pessoas em questão. [Essas regras não devem constituir um meio de impedir o exercício do direito de residência.]

[…]

(12)

A fim de constituir um verdadeiro instrumento de integração na sociedade em que se estabeleceu o residente de longa duração, este deverá ser tratado em pé de igualdade com os cidadãos do Estado‑Membro num amplo leque de domínios económicos e sociais, de acordo com as condições relevantes definidas na presente diretiva.»

5.

O artigo 1.o dessa diretiva dispõe:

«A presente diretiva estabelece:

a)

As condições de concessão e perda de estatuto de residente de longa duração conferido por um Estado‑Membro a nacionais de países terceiros legalmente residentes no seu território, bem como os direitos correspondentes; e

b)

As condições de residência de nacionais de países terceiros que beneficiem do estatuto de residente de longa duração noutros Estados‑Membros que não aquele que lhes concedeu o referido estatuto.»

6.

De acordo com o artigo 4.o da referida diretiva, intitulado «Duração da residência»:

«1.   Os Estados‑Membros devem conceder o estatuto de residente de longa duração aos nacionais de países terceiros que tenham residência legal e ininterrupta no seu território durante os cinco anos que antecedem imediatamente a apresentação do respetivo pedido.

[…]

3.   Os períodos de ausência do território do Estado‑Membro em questão não interrompem o período referido no n.o 1 e entram no cálculo deste, desde que sejam inferiores a seis meses consecutivos e não excedam, na totalidade, dez meses compreendidos no período referido no n.o 1.

[…]»

7.

O artigo 8.o da Diretiva 2003/109, intitulado «Título [UE] de residência de longa duração», prevê:

«1.   O estatuto de residente de longa duração tem caráter permanente, sem prejuízo do disposto no artigo 9.o

2.   Os Estados‑Membros concedem aos residentes de longa duração um título [UE] de residência de longa duração. Esse título tem uma validade mínima de cinco anos, sendo automaticamente renovável, mediante pedido se exigido, no termo do período de validade.

[…]»

8.

O artigo 9.o da mesma diretiva, intitulado «Retirada ou perda do estatuto», dispõe:

«1.   Os residentes de longa duração deixam de ter direito a manter o estatuto de residente de longa duração nos seguintes casos:

[…]

c)

Ausência do território da [União] por um período de 12 meses consecutivos.

2.   Em derrogação do disposto na alínea c) do n.o 1, os Estados‑Membros podem estabelecer que as ausências superiores a 12 meses consecutivos ou por razões específicas ou excecionais não impliquem a retirada ou perda do estatuto.

[…]

5.   No que respeita aos casos referidos na alínea c) do n.o 1 e no n.o 4, os Estados‑Membros que tiverem concedido o estatuto devem prever um procedimento simplificado para a reaquisição do estatuto de residente de longa duração.

[…]»

9.

O artigo 11.o da referida diretiva, intitulado «Igualdade de tratamento», prevê:

«1.   O residente de longa duração beneficia de igualdade de tratamento perante os nacionais em matéria de:

[…]

b)

Ensino e formação profissional, incluindo subsídios e bolsas de estudo em conformidade com o direito nacional;

[…]

d)

Segurança social, assistência social e proteção social, tal como definidas na legislação nacional;

e)

Benefícios fiscais;

f)

Acesso a bens e serviços e ao fornecimento de bens e serviços à disposição do público, bem como aos procedimentos de obtenção de alojamento;

g)

Liberdade de associação, filiação e adesão a uma organização representativa de trabalhadores ou empregadores ou a qualquer organização cujos membros se dediquem a determinada ocupação, incluindo as vantagens proporcionadas por esse tipo de organizações, sem prejuízo das disposições nacionais em matéria de ordem pública e segurança pública;

[…]

2.   No que respeita ao disposto nas alíneas b), d), e), f) e g) do n.o 1, o Estado‑Membro em causa pode restringir a igualdade de tratamento aos casos em que o local de residência legal ou habitual do residente de longa duração, ou dos familiares para os quais pede benefícios, se situe no seu território.

[…]»

B. Direito austríaco

10.

As disposições pertinentes do direito nacional constam da Niederlassungs‑ und Aufenthaltsgesetz (Lei relativa ao Estabelecimento e à Residência ( 4 ), a seguir «NAG»).

11.

O § 2, n.o 7, da NAG tem a seguinte redação:

«As estadas de curta duração no território nacional e no estrangeiro, em especial para fins de visita, não interrompem a contagem da duração da permanência ou da instalação exigida para efeitos da aquisição ou da perda do direito ao título de residência. […]»

12.

O § 20 da NAG, intitulado «Período de validade dos títulos de residência», prevê:

«[…]

(3)   Os titulares de um título de residência “Residente de longa duração — UE” (§ 45) estão estabelecidos na Áustria — sem prejuízo da validade limitada do documento relativo a esses títulos de residência — por um período indeterminado. Este documento é emitido por um período de cinco anos e, em derrogação do § 24, é renovado mediante pedido mesmo após ter caducado, desde que não seja aplicável nenhuma medida adotada ao abrigo da Fremdenpolizeigesetz 2005 [(Lei de 2005 relativa à Polícia de Estrangeiros)].

(4)   O título de residência emitido ao abrigo do n.o 3, supra, caduca quando o cidadão estrangeiro permaneça fora do território do EEE durante um período superior a 12 meses consecutivos. Por razões particularmente atendíveis, como doença grave, cumprimento de uma obrigação social ou de um serviço equiparável ao serviço militar obrigatório ou ao serviço civil, o cidadão estrangeiro pode permanecer até 24 meses fora do território do EEE, desde que tenha informado previamente a autoridade competente dessa circunstância. Caso exista um interesse legítimo do cidadão estrangeiro, a autoridade competente deve, mediante requerimento, declarar que o título de residência não caducou. O ónus da prova da permanência no território do EEE incumbe ao cidadão estrangeiro.

[…]»

III. Factos na origem do litígio, processo principal e questões prejudiciais

13.

Em 6 de setembro de 2018, ZK, nacional cazaque, apresentou um pedido de renovação do seu título de residência de longa duração. Esse pedido foi indeferido por Decisão de 9 de julho de 2019 do Landeshauptmann von Wien (Governador do Land de Viena).

14.

Em 12 de agosto de 2019, ZK interpôs recurso dessa decisão no órgão jurisdicional de reenvio.

15.

O órgão jurisdicional de reenvio salienta que embora no período decorrido entre agosto de 2013 e agosto de 2018, e mesmo posteriormente, ZK nunca tenha residido fora do território da União durante um período de 12 meses consecutivos ou mais, é ponto assente que, ao longo desse período, ZK apenas esteve neste território durante alguns dias por ano. Este facto serviu de fundamento à autoridade administrativa recorrida para recusar a renovação do título de residência do recorrente.

16.

Decorre da decisão de reenvio que o recorrente apresentou no órgão jurisdicional de reenvio uma análise jurídica realizada pelo grupo de peritos da Comissão Europeia sobre migração legal, a qual concluiu por uma interpretação restrita da condição de aplicação relativa à ausência do território da União, prevista no artigo 9.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva 2003/109, no sentido de que apenas a ausência física desse território durante um período de 12 meses consecutivos deve implicar a perda do estatuto de residente de longa duração por força desta disposição. De acordo com essa análise, a este respeito, é indiferente saber se, durante o período relevante, o residente de longa duração estava, além disso, materialmente estabelecido no referido território ou aí tinha estabelecido a sua residência habitual.

17.

O órgão jurisdicional de reenvio considera que tal análise, que tende a subscrever, conforta a argumentação do recorrente. De facto, se essa análise jurídica fosse seguida, mesmo as estadas de curta duração, ou até, como no caso em apreço, as de apenas alguns dias por ano, seriam suficientes para excluir a aplicação do artigo 9.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva 2003/109, pelo que o recorrente conservaria o seu estatuto de residente de longa duração.

18.

Nestas circunstâncias, o Verwaltungsgericht Wien (Tribunal Administrativo de Viena) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

Deve o artigo 9.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva [2003/109] ser interpretado no sentido de que qualquer estada física, por muito breve que seja, de um nacional de um país terceiro residente de longa duração no território da [União durante] um período de doze meses consecutivos [basta para excluir] a perda do estatuto de residente de longa duração por força dessa disposição?

2)

Caso o Tribunal de Justiça dê uma resposta negativa à primeira questão: quais os requisitos qualitativos e/ou quantitativos que as estadas no território da [União durante] um período de doze meses consecutivos devem satisfazer para excluir a perda, por um nacional de um país terceiro, do estatuto de residente de longa duração? As estadas [durante] um período de doze meses consecutivos no território da [União] só excluem a perda do estatuto de residente de longa duração se os nacionais de países terceiros em causa tiverem, durante esse período, a sua residência habitual ou o seu centro de interesses no território da [União]?

3)

As regras das ordens jurídicas dos Estados‑Membros que preveem que os nacionais de países terceiros residentes de longa duração perdem o seu estatuto quando, embora tenham permanecido no território da [União] durante um período de doze meses consecutivos, não tenham na [União] a sua residência habitual nem o seu centro de interesses são compatíveis com o artigo 9.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva [2003/109]?»

IV. Processo no Tribunal de Justiça

19.

A decisão de reenvio datada de 28 de agosto de 2020 deu entrada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 14 de setembro de 2020.

20.

O órgão jurisdicional de reenvio pediu que o Tribunal de Justiça submetesse o reenvio prejudicial à tramitação urgente, ao abrigo do artigo 107.o, n.o 1, do Regulamento de Processo no Tribunal de Justiça.

21.

Por Decisão de 28 de setembro de 2020, o Tribunal de Justiça, ouvido o advogado‑geral, indeferiu esse pedido.

22.

O Governo austríaco, bem como a Comissão Europeia, apresentaram observações escritas no prazo previsto no artigo 23.o do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia.

23.

Na audiência de 15 de julho de 2021, os mandatários ad litem de ZK, do Governo austríaco, bem como da Comissão, apresentaram observações.

V. Análise jurídica

A. Observações preliminares

24.

Os nacionais de países terceiros migram para a União Europeia por várias razões: razões económicas, razões familiares, para prosseguir estudos ou para obter proteção internacional. Algumas dessas pessoas permanecem no território dos Estados‑Membros durante muitos anos e criam laços com o Estado‑Membro em questão. Por este motivo, a integração dos nacionais de países terceiros residentes de longa duração nos Estados‑Membros é considerada um elemento chave para promover a coesão económica e social na União, objetivo fundamental enunciado no artigo 3.o TUE. Importa, além disso, recordar que o artigo 79.o, n.o 1, TFUE, prevê o desenvolvimento de uma política comum de imigração destinada, nomeadamente, a «garantir um tratamento equitativo dos nacionais de países terceiros que residam legalmente nos Estados‑Membros» ( 5 ).

25.

Um dos primeiros textos legislativos adotados pela União em matéria de imigração foi a Diretiva 2003/109. Esta diretiva tem como objetivo conceder um estatuto «europeu» aos nacionais de países terceiros que sejam residentes legais e de longa duração na União. Para assegurar a sua integração, a referida diretiva visa aproximar os direitos destas pessoas dos direitos de que gozam os cidadãos da União, nomeadamente instituindo a igualdade de tratamento em relação a estes últimos num vasto leque de domínios económicos e sociais. Os direitos que lhes são reconhecidos continuam a ser de alcance mais limitado relativamente aos dos cidadãos da União ( 6 ), mas incluem, contudo, disposições em matéria de livre circulação, oferecendo o direito de permanecer por um período superior a três meses no território de Estados‑Membros que não aquele que lhes concedeu o estatuto de residente de longa duração. Além disso, o titular do estatuto de residente de longa duração tem acesso ao mercado de trabalho desde que as suas atividades não estejam ligadas ao exercício da autoridade pública ou que os empregos não sejam reservados aos nacionais e aos cidadãos da União e do EEE. Em matéria de proteção social, os Estados‑Membros podem decidir limitar o acesso dos residentes de longa duração às «prestações essenciais».

26.

O acesso ao estatuto de residente de longa duração é reservado aos nacionais de países terceiros que tenham residido legal e ininterruptamente no território de um Estado‑Membro durante um período de cinco anos. São excluídos todos aqueles cuja residência possa ser considerada temporária. Os Estados‑Membros conservam amplas margens de apreciação das condições que conferem o direito ao estatuto de residente de longa duração ( 7 ). Às condições de recursos estáveis, regulares e suficientes e de posse de um seguro de doença, que são igualmente exigidas aos cidadãos de União que residam noutro Estado‑Membro, acresce uma condição opcional relativa a «condições de integração» que permite limitar o acesso ao estatuto de residente de longa duração. A prova de um conhecimento suficiente da língua do Estado‑Membro, em vários graus de competência, é a principal condição de integração exigida, em todos os Estados‑Membros.

27.

O legislador da União pretende atingir o objetivo da integração duradoura dos nacionais de países terceiros através da harmonização das condições de concessão e de retirada (ou de perda) do estatuto de residente de longa duração. Assim sendo, importa salientar que o presente processo se distingue de outros processos já tratados pelo Tribunal de Justiça pelo facto de dizer respeito sobretudo ao segundo aspeto, ou seja, à interpretação das condições de retirada (ou de perda) do referido estatuto por ausência contínua do território da União, por força do artigo 9.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva 2003/109. Embora decorra desta disposição que o nacional de um país terceiro perde o estatuto de residente de longa duração em caso de ausência do território da União durante um período de 12 meses consecutivos, a mesma não especifica como se deve tratar as estadas esporádicas e de curta duração, em especial se estas são passíveis de impedir a concretização dessa consequência jurídica.

B. Análise das questões prejudiciais

28.

Através das suas três questões, que importa analisar conjuntamente, o órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se, no essencial, sobre os critérios de acordo com os quais se deve determinar se um residente de longa duração esteve «ausente» do território da União durante um período de 12 meses consecutivos na aceção do artigo 9.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva 2003/109, ausência essa que implica, em princípio, a perda do direito ao estatuto de residente de longa duração. Em especial, pretende saber se qualquer estada durante esse período, por muito breve que seja, pode interromper essa ausência e, portanto, excluir a perda do referido estatuto ou se o interessado deve antes, durante o mesmo período, ter a sua residência habitual ou o seu centro de interesses nesse território.

1.   Recurso aos diversos métodos de interpretação

29.

Uma vez que o artigo 9.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva 2003/109 não contém qualquer remissão para o direito nacional, há que partir da premissa de que o conceito de «ausência» constitui um conceito autónomo do direito da União que deve ser objeto de interpretação uniforme, tendo em conta os termos dessa disposição, bem como os objetivos prosseguidos pela regulamentação de que esta faz parte e o seu contexto ( 8 ).

a)   Interpretação literal

30.

Quanto à redação da referida disposição, há que salientar que existe uma certa variação entre as suas diferentes versões linguísticas.

31.

Com efeito, por um lado, um número significativo de versões linguísticas ( 9 ) refere uma «ausência» do território de União durante o período de 12 meses consecutivos, o que poderia dar a entender que a mera presença física põe termo a essa ausência. Por outro lado, outras versões linguísticas ( 10 ) referem o facto de não «permanecer», durante esse período, no referido território, podendo a utilização deste verbo implicar uma presença um pouco mais «sólida», sem, contudo, excluir estadas de apenas alguns dias.

32.

Todavia, parece‑me que, excetuando estas ligeiras nuances linguísticas, a redação do artigo 9.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva 2003/109 não permite, por si só, determinar inequivocamente o alcance exato do conceito de «ausência». Da interpretação literal desta disposição não se pode retirar qualquer conclusão clara. Consequentemente, torna‑se necessário recorrer aos outros métodos de interpretação reconhecidos pela jurisprudência do Tribunal de Justiça ( 11 ).

b)   Interpretação contextual

1) Exceção à regra geral que confere um estatuto jurídico especial aos residentes de longa duração deve ser interpretada restritivamente

33.

O contexto do artigo 9.o da Diretiva 2003/109 fornece algumas indicações úteis para melhor identificar o alcance desta disposição. De facto, por um lado, o artigo 8.o, n.o 1, dessa diretiva dispõe que o estatuto de residente de longa duração tem caráter permanente, «sem prejuízo do disposto no artigo 9.o». Assim, uma vez que o caráter permanente desse estatuto é a «regra geral», o artigo 9.o, n.o 1, alínea c), da mesma diretiva parece ser a «exceção», devendo, portanto, ser objeto de interpretação restritiva, de acordo com um princípio de interpretação reconhecido na jurisprudência do Tribunal de Justiça ( 12 ).

34.

Além disso, importa recordar que a Diretiva 2003/109 estabelece um direito subjetivo dos nacionais de países terceiros de obter o estatuto de residente de longa duração, bem como os outros direitos que decorrem da concessão desse estatuto, na medida em que as condições previstas para esse efeito estejam efetivamente preenchidas ( 13 ) e os respetivos procedimentos tenham sido respeitados ( 14 ). Como já foi referido na introdução das presentes conclusões ( 15 ), esta diretiva harmoniza de forma exaustiva as condições de obtenção do estatuto de residente de longa duração. O mesmo se aplica às condições de retirada do referido estatuto referidas no artigo 9.o da Diretiva 2003/109 ( 16 ). Consequentemente, os Estados‑Membros não podem introduzir condições complementares ( 17 ) ou interpretar de forma lata o disposto no artigo 9.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva 2003/109 sem comprometer a manutenção do estatuto de residente de longa duração.

35.

A este respeito, a proteção dos direitos adquiridos afigura‑se‑me imperativa a fim de não privar do seu efeito útil as disposições referidas no artigo 4.o, n.o 1, e no artigo 8.o, n.o 1, da referida diretiva, que conferem um estatuto jurídico especial aos residentes de longa duração. O facto de o legislador da União ter igualmente incluído garantias processuais no artigo 10.o da mesma diretiva, prevendo, entre outras, a obrigação de fundamentar quaisquer decisões de retirada do referido estatuto, bem como de informar o nacional de país terceiro em causa das vias de recurso disponíveis e do prazo no qual pode agir, realça a importância que se deve atribuir à proteção do referido estatuto jurídico. Todas estas considerações militam igualmente a favor de uma interpretação restritiva dessa disposição.

2) Eventuais limitações à igualdade de tratamento não afetam o estatuto de residente de longa duração

36.

O artigo 11.o, n.o 2, da Diretiva 2003/109 fornece um indício a favor da tese de que a manutenção do estatuto de residente de longa duração não exige que este tenha a sua residência no território do Estado‑Membro em causa ou da União. Por um lado, o artigo 11.o, n.o 1, dessa diretiva prevê que o residente de longa duração beneficia de igualdade de tratamento perante os nacionais num vasto leque de domínios. Por outro lado, o artigo 11.o, n.o 2, dessa diretiva autoriza o Estado‑Membro em causa a restringir a igualdade de tratamento aos nacionais de países terceiros que tenham o seu local de residência legal ou habitual no seu território. Ora, importa salientar o facto de estes manterem o seu estatuto de residente de longa duração apesar desta restrição da igualdade de tratamento.

37.

Essa disposição mostra claramente que há que distinguir entre, por um lado, as vantagens de que o nacional de um país terceiro pode beneficiar pelo facto de ter o seu local de residência legal ou habitual no território do Estado‑Membro em causa e, por outro, o estatuto de residente de longa duração que este nacional possui. O facto de não ter um local de residência legal ou habitual no território do Estado‑Membro em causa pode ter consequências negativas no que toca à amplitude das vantagens conferidas pela Diretiva 2003/109 e pela legislação nacional que a transpôs, mas não implica necessariamente a perda do referido estatuto jurídico.

3) Condições de manutenção do estatuto de residente de longa duração menos estritas do que as de concessão desse estatuto

38.

A Diretiva 2003/109 regulamenta, em substância, dois aspetos distintos: a obtenção e a manutenção do estatuto de residente de longa duração. A obtenção deste estatuto exige um esforço de integração por parte do nacional de um país terceiro. Através da fixação de um período de cinco anos de residência contínua, o legislador da União pressupõe que a integração do nacional de um país terceiro na sociedade do Estado‑Membro de acolhimento está assegurada após o termo desse período. Como o Tribunal de Justiça observou no Acórdão Singh, «a duração da residência legal e ininterrupta de cinco anos […] comprova o enraizamento da pessoa em causa no país e, consequentemente, a instalação de longa duração desta última» ( 18 ). Uma vez atingido esse objetivo de integração, tendo o nacional de um país terceiro que estabelecido uma ligação estreita com o Estado‑Membro de acolhimento, o que é confirmado do ponto de vista jurídico pela concessão do estatuto de residente de longa duração, as exigências para a sua manutenção tornam‑se menos estritas.

39.

Com efeito, importa observar que as condições de concessão e de manutenção do estatuto de residente de longa duração divergem significativamente. O artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva 2003/109 exige, para a concessão do referido estatuto, a «residência» ininterrupta durante cinco anos no Estado‑Membro em causa ( 19 ), enquanto a retirada é condicionada pela «ausência» do território da União por um período de 12 meses consecutivos, sem que seja especificado onde deve, exatamente, residir o nacional do país terceiro. Daqui decorre que a residência contínua no território da União deixa de ser indispensável após o termo do período de cinco anos fixado para a obtenção do estatuto de residente de longa duração.

4) Interpretação tendo em conta o quadro contextual mais amplo

40.

Na medida em que a Diretiva 2003/109 tem como objetivo aproximar os direitos desses nacionais dos direitos de que gozam os cidadãos da União, é possível interpretar o artigo 9.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva 2003/109 tendo em conta o quadro contextual mais amplo, ou seja, as disposições da Diretiva 2004/38/CE ( 20 ). A jurisprudência do Tribunal de Justiça mostra que as disposições desta diretiva se prestam, efetivamente, a uma análise comparada com as da Diretiva 2003/109, permitindo tirar conclusões úteis para efeitos da exegese, não obstante determinadas diferenças que se explicam, nomeadamente, pelos seus objetivos legislativos específicos ( 21 ).

41.

A este respeito, há que chamar a atenção para a disposição referida no artigo 16.o, n.o 1, da Diretiva 2004/38, que prevê que os cidadãos da União que tenham residido legalmente por um período de cinco anos consecutivos no território do Estado‑Membro de acolhimento têm direito de residência permanente no mesmo. Esta disposição apresenta uma semelhança especial com a do artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva 2003/109, dado que exige aos nacionais de países terceiros a residência legal e ininterrupta igualmente durante cinco anos para obterem o estatuto de residente de longa duração.

42.

O mesmo sucede relativamente às disposições que regem a perda do direito de residência. De acordo com o artigo 16.o, n.o 4, da Diretiva 2004/38, uma vez adquirido, «o direito de residência permanente só se perde devido a ausência do Estado‑Membro de acolhimento por um período que exceda dois anos consecutivos» (o sublinhado é meu). A este respeito, importa recordar que, no Acórdão Dias ( 22 ), relativo, precisamente, à interpretação da Diretiva 2004/38, o Tribunal de Justiça considerou que a perda do direito de residência permanente, por parte do cidadão da União, devido à ausência do Estado‑Membro de acolhimento por um período que exceda dois anos consecutivos se justifica pelo facto de, após tal ausência, «a ligação ao Estado‑Membro de acolhimento ser menos forte».

43.

O artigo 9.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva 2003/109 baseia‑se na mesma lógica, no sentido de que se deve pressupor que a ligação do nacional de um país terceiro à União, estabelecida pelo esforço de integração feito ao longo dos cinco anos previstos no artigo 4.o, n.o 1, dessa diretiva, é «menos forte» quando esse nacional se ausente durante mais de 12 meses consecutivos.

44.

Importa observar, neste contexto, que a proposta da Comissão que antecedeu a adoção da Diretiva 2003/109 também previa inicialmente uma ausência de dois anos consecutivos ( 23 ). Assim, a génese dessa disposição realça a intenção inicial de alinhar as disposições que regem a residência permanente dos cidadãos da União e a dos nacionais de países terceiros.

45.

Tendo em conta todos os elementos acima referidos, afigura‑se possível rejeitar a interpretação defendida pelo Governo austríaco, que exige que o nacional de um país terceiro continue efetivamente a «residir habitualmente» no território do Estado‑Membro em causa ou no território da União.

c)   Interpretação teleológica

46.

Na medida em que a Diretiva 2003/109 visa, como decorre do seu quarto considerando, promover a integração dos nacionais de países terceiros residentes de longa duração nos Estados‑Membros, no intuito de promover a coesão económica e social ( 24 ), importa assegurar que o estatuto jurídico de residente de longa duração seja concedido apenas a quem deva beneficiar dele, ou seja, a todas as pessoas que tenham uma ligação suficientemente estreita e real com a União e os seus Estados‑Membros, estabelecida através de uma integração bem‑sucedida que se desenvolveu ao longo de cinco anos de residência legal e ininterrupta.

47.

Em contrapartida, pode deduzir‑se do artigo 9.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva 2003/109 que é necessário retirar o estatuto de residente de longa duração quando as pessoas em causa deixem de ter essa ligação com o Estado‑Membro de acolhimento. Com efeito, não existe nenhuma razão legítima que justifique a manutenção do estatuto jurídico de residente de longa duração em caso de «dissolução» da referida ligação, dado que o objetivo visado pela Diretiva 2003/109 já não seria atingido. Todas estas considerações devem ser tidas em conta na interpretação da disposição em causa.

48.

Uma interpretação à luz do objetivo legislativo invocado nos números anteriores das presentes conclusões tem como consequência que o artigo 9.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva 2003/109 deverá ser aplicado de forma diferenciada, em função das circunstâncias de cada caso concreto. A fim de fornecer ao órgão jurisdicional de reenvio elementos úteis para a interpretação, considero oportuno explicar, recorrendo a alguns exemplos práticos, a forma como a interpretação teleológica influencia a aplicação dessa disposição.

2.   Consequências para a aplicação do artigo 9.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva 2003/109

a)   Perda obrigatória do estatuto de residente de longa duração após o termo do período de 12 meses consecutivos

49.

Antes de mais, há que sublinhar que a ausência durante um período de 12 meses consecutivos implica, regra geral, a perda do direito ao estatuto de residente de longa duração, como prevê o artigo 9.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva 2003/109 ( 25 ). Não só a redação inequívoca desta disposição não deixa qualquer margem de interpretação a este respeito, como também se pode deduzir que, do ponto de vista da integração do nacional de um país terceiro, a ligação com o Estado‑Membro de acolhimento após o termo de um período tão longo está, geralmente, «dissolvida».

50.

Tal consequência jurídica não se me afigura desproporcionada, tendo em conta que resulta do artigo 9.o, n.o 5, da Diretiva 2003/109 que os Estados‑Membros que tiverem concedido o estatuto de residente de longa duração devem prever um «procedimento simplificado» para a reaquisição do referido estatuto. Por conseguinte, existe sempre a possibilidade de a pessoa em causa restabelecer a ligação com o Estado‑Membro de acolhimento, no interesse mútuo de ambas as partes.

51.

Devo esclarecer que tal consequência jurídica resulta de uma situação na qual o Estado‑Membro de acolhimento não tenha utilizado a exceção referida no artigo 9.o, n.o 2, da Diretiva 2003/109. Por força desta disposição, os Estados‑Membros podem, em derrogação do disposto na alínea c) do n.o 1, estabelecer que as «ausências superiores a 12 meses consecutivos ou por razões específicas ou excecionais» não impliquem a retirada ou a perda do estatuto ( 26 ). Daqui decorre que é deixada aos Estados‑Membros uma grande margem de apreciação no que diz respeito à aplicação da referida disposição, o que permite, assim, evitar a consequência jurídica que decorre da interpretação defendida supra.

b)   Tratamento jurídico das estadas esporádicas e de curta duração

52.

Desde que a pessoa em causa resida a maior parte do tempo, durante esse período de 12 meses, no território da União, esse facto não deve ser suscetível de criar dificuldades no que diz respeito à aplicação da Diretiva 2003/109, pois é evidente que as condições previstas no artigo 9.o, n.o 1, alínea c), desta diretiva não estão preenchidas. Em contrapartida, coloca‑se a questão de saber como tratar uma situação na qual a estada da pessoa em causa no território da União seja esporádica e se limite a períodos de curta duração durante o ano.

53.

Na minha opinião, mesmo tal presença esporádica e de curta duração no território da União deve ser passível de impedir a perda do direito ao estatuto de residente de longa duração, contanto que seja possível demonstrar com precisão que ainda existe um «enraizamento» da pessoa em causa no país, na aceção do sexto considerando da diretiva. Por outras palavras, o nacional de um país terceiro, titular do estatuto de residente de longa duração, deve demonstrar que possui um «vínculo de integração» suficientemente estreito com o Estado‑Membro de acolhimento. Caso esta condição não esteja preenchida, a aplicação da regra geral, que implica a perda do direito ao estatuto de residente de longa duração ( 27 ), parece‑me que se impõe ( 28 ).

54.

Na medida em que o artigo 4.o da Diretiva 2003/109, em conjugação com o seu artigo 8.o, prevê a concessão de um direito de residência permanente na condição de o nacional de um país terceiro apresentar, em conformidade com o artigo 5.o dessa diretiva, provas de que as condições de aquisição desse estatuto estão reunidas, parece‑me lógico e justo considerar que cabe, por seu turno, às autoridades nacionais analisar todas as circunstâncias relevantes do caso concreto e, se for caso disso, provar a inexistência de tal ligação antes de tomar uma decisão sobre a retirada do estatuto da pessoa em causa. A imposição às autoridades nacionais do ónus da prova quanto à existência de elementos factuais no caso concreto, passíveis de justificar o recurso ao artigo 9.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva 2003/109, afigura‑se‑me imperativo para não privar as disposições referidas supra, que conferem um estatuto jurídico especial aos residentes de longa duração, do seu efeito útil.

55.

Tal abordagem parece‑me adequada para garantir que o estatuto de residente de longa duração não seja utilizado para fins diferentes dos previstos pelo legislador da União. Em especial, é necessário evitar que seja retirada uma vantagem indevida do referido estatuto, como a escolha de um órgão jurisdicional nacional com o objetivo de assegurar a aplicação de uma lei mais favorável aos seus interesses («forum shopping»), a obtenção de prestações sociais, a facilitação de atividades ilícitas, etc. ( 29 ). Atendendo a que os Estados‑Membros são destinatários da Diretiva 2003/109, e são chamados a transpô‑la para a respetiva ordem jurídica interna, cabe‑lhes o papel crucial de zelar pela realização dos objetivos dessa diretiva.

56.

A exigência, nomeadamente, da presença no território da União, que decorre do artigo 9.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva 2003/109, traduz a ideia de que os nacionais de países terceiros residentes de longa duração devem, para poderem conservar esse estatuto de forma permanente, manter uma ligação «real», e não apenas «formal», com o Estado‑Membro em causa.

57.

A este respeito, importa, contudo, esclarecer que não podem ser feitas exigências excessivamente rigorosas no que toca à existência de tal vínculo de integração suficientemente estreito e real, uma vez que o «enraizamento» do nacional de um país terceiro no Estado‑Membro em causa já terá sido objeto de uma apreciação aprofundada pelas autoridades nacionais no quadro do procedimento que permite adquirir o estatuto de residente de longa duração. Além disso, parece‑me que a imposição de exigências excessivamente rigorosas obstaria à realização do objetivo de aproximar o estatuto jurídico dos nacionais de países terceiros do estatuto jurídico dos nacionais dos Estados‑Membros ( 30 ).

58.

Com efeito, como já foi referido nas presentes conclusões, uma interpretação demasiado lata das condições que regem a retirada ou a perda do estatuto de residente de longa duração poderia pôr em causa o objetivo de assegurar a integração dos nacionais de países terceiros. A abordagem proposta nas presentes conclusões abrange apenas os casos em que a manutenção do referido estatuto jurídico já não parece justificar‑se porque não contribui para a coesão económica e social prosseguida pelo legislador da União.

59.

Atendendo a que a tarefa de apreciar a existência de um vínculo de integração pode revelar‑se especialmente complicada na prática, proponho que se forneçam algumas orientações ao órgão jurisdicional de reenvio sob a forma de critérios que ponham em evidência a vontade do nacional de um país terceiro de participar na vida económica e social do Estado‑Membro de acolhimento. As autoridades nacionais competentes poderiam servir‑se dessa lista de critérios no âmbito do exercício do seu poder de apreciação. Essa lista de critérios a desenvolver por via jurisprudencial deve ser entendida como meramente indicativa e não exaustiva. Uma vez que a integração numa sociedade se baseia sempre em fatores espaciais, temporais e qualitativos ( 31 ), considero que essa lista deverá ser constituída por critérios relativos às referidas categorias.

60.

Embora o artigo 9.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva 2003/109 esteja, à primeira vista, associado a um critério «espacial», parece‑me necessário interpretar o conceito de «ausência» de uma forma que responda melhor às exigências de uma sociedade globalizada como a nossa. A mera presença «física» no território da União pode revelar‑se enganadora se a pessoa em causa não estiver verdadeiramente integrada na sociedade. Neste contexto, não devemos esquecer que a integração de uma pessoa numa sociedade estrangeira constitui um processo complexo de aculturação cujos elementos‑chave, de acordo com os princípios de base comuns da política de integração dos imigrantes, enunciados pelo Conselho em 2004 e confirmados no Programa de Estocolmo ( 32 ), são a interação, a intensificação dos intercâmbios entre imigrantes e cidadãos do Estado‑Membro em causa e a promoção do diálogo intercultural.

61.

Inversamente, a estada de duração relativamente curta de uma pessoa que tenha ligações pessoais e/ou profissionais diversas e profundas, estabelecidas durante o processo de integração acima descrito, pode ser suficiente para evitar a perda do estatuto de residente de longa duração. Compete às autoridades nacionais analisar as circunstâncias do caso concreto à luz dos critérios propostos em seguida.

c)   Lista indicativa e não exaustiva de critérios que revelam a existência de uma ligação real com a União

62.

Num primeiro momento, as autoridades nacionais estarão obrigadas a determinar a duração da ausência do território da União, devendo ter em conta eventuais estadas suscetíveis de interromper essa ausência, incluindo as de curta duração. Mais concretamente, elementos como a relação entre os períodos de ausência e os de presença, a duração total e a frequência dessas ausências, bem como as razões que levaram o titular do estatuto de residente de longa duração a deixar o Estado‑Membro de acolhimento, podem fornecer um primeiro indício sobre o seu grau de integração.

63.

Importa, de facto, verificar se as ausências em questão implicam a deslocação do centro de interesses pessoais, familiares ou profissionais do interessado para outro Estado ( 33 ). Tal deve, em princípio, estar excluído no caso de estadas no estrangeiro justificadas por motivos específicos ou excecionais de caráter temporário, por analogia com os casos referidos no artigo 4.o, n.o 3, segundo parágrafo, da Diretiva 2003/109, que os Estados‑Membros podem não ter em conta enquanto período de «ausência» no cálculo do período de cinco anos de residência «ininterrupta» no seu território, período que constitui uma das condições legais de obtenção do estatuto de residente de longa duração. Os motivos para as estadas temporárias no estrangeiro podem ser, por exemplo, viagens de férias ou estadas por razões profissionais de duração semelhante, bem como estadas para o cuidado temporário de familiares, para cumprimento do serviço militar ou estadas durante a formação escolar ou profissional que sejam apenas limitadas no tempo, mas seguramente não as que desloquem a formação, no seu conjunto, para o estrangeiro. Ainda assim, serão indispensáveis indícios adicionais para identificar uma ligação suficientemente estreita e real com o Estado‑Membro de acolhimento ( 34 ).

64.

Para além da presença física da própria pessoa, que, pelas razões expostas nas presentes conclusões, não pode ser mais do que um ponto de partida para uma apreciação mais aprofundada das circunstâncias do caso concreto, considero que a existência de património sob a forma de contas bancárias, de propriedade privada de bens imóveis ou de empresas estabelecidas nos Estados‑Membros pode revelar‑se útil ( 35 ). De facto, investimentos financeiros podem revelar um certo enraizamento na economia de um país, bem como um interesse pessoal em participar no seu desenvolvimento.

65.

Além disso, não se pode excluir que o facto de ter passado uma parte não negligenciável da sua vida no território da União e de se ter familiarizado com as tradições, os costumes e a língua do Estado‑Membro de acolhimento, tenha permitido ao nacional de um país terceiro estabelecer laços familiares com cidadãos da União, por exemplo, na sequência de um casamento do qual, eventualmente, resultem filhos. Este tipo de relações de parentesco com membros da população local pode revestir especial importância no âmbito da apreciação a efetuar pelas autoridades nacionais.

66.

O mesmo sucede relativamente às relações profissionais, por exemplo, sob a forma de relações comerciais ou de contactos académicos que tenham sido estabelecidas ao longo do tempo. A prossecução de uma atividade económica está seguramente ligada a este critério ( 36 ), à qual a Diretiva 2003/109 parece atribuir especial importância porque, por um lado, o artigo 5.o, n.o 1, alínea a), exige que o nacional de um país terceiro disponha de recursos estáveis e regulares que sejam suficientes para a sua própria subsistência e para a dos seus familiares, sem recorrer ao sistema de assistência social do Estado‑Membro em causa e, por outro, o artigo 11.o, n.o 1, alíneas a) e c), garante a igualdade de tratamento em matéria de acesso ao mercado de trabalho no Estado‑Membro de acolhimento, bem como o reconhecimento de diplomas profissionais, certificados e outros títulos, em conformidade com os procedimentos nacionais pertinentes. Todas estas medidas visam, manifestamente, promover o desenvolvimento profissional do nacional de um país terceiro na União em benefício deste e da sociedade no seu conjunto.

67.

Por outro lado, na medida em que a Diretiva 2003/109 visa promover a coesão económica e social, parece‑me que um compromisso social da pessoa em causa no Estado‑Membro de acolhimento não deve ser subestimado. A qualidade de membro ativo em partidos políticos, em organizações sociais que prossigam fins caritativos ou cívicos, bem como em atividades de voluntariado, podem indiciar um vínculo real à comunidade local na qual a pessoa em causa viveu.

68.

De igual modo, a existência de obrigações fiscais, eventualmente ligadas à existência de património ou ao exercício de uma atividade económica no Estado‑Membro de acolhimento, parece‑me passível de evidenciar a vontade do nacional de um país terceiro que tenha adquirido o estatuto de residente de longa duração de assumir responsabilidades para com a sociedade e de contribuir para o seu desenvolvimento ( 37 ).

69.

Por último, considero que deve ser igualmente possível ter em conta atividades ilícitas imputáveis ao titular do estatuto de residente de longa duração e que, enquanto critério «negativo», possam, assim, revelar uma falta de enraizamento ou, pelo menos, uma atitude contrária à integração na sociedade do Estado‑Membro de acolhimento ( 38 ). Para respeitar o princípio da proporcionalidade é, contudo, necessário que tanto a gravidade como a natureza da infração sejam devidamente tomadas em consideração na apreciação do caso concreto. Daqui decorre que, mesmo que antecedentes penais possam influenciar uma decisão relativa à retirada ou à perda do estatuto de residente de longa duração, impõe‑se uma análise global da situação do titular do estatuto de residente de longa duração.

70.

Devo, todavia, sublinhar que a possibilidade de recorrer a esse critério «negativo» não deve, de modo nenhum, ser interpretada no sentido de que as autoridades nacionais deixam de estar obrigadas a respeitar as disposições constantes dos artigos 6.o e 12.o da Diretiva 2003/109. Pelo contrário, estas disposições mantêm todo seu valor no respetivo âmbito de aplicação, ou seja, no exercício da competência para recusar a concessão do estatuto de residente de longa duração e de adotar uma decisão de expulsão por razões de ordem pública ou de segurança pública. O recurso a essas competências está sujeito a determinadas condições que o Tribunal de Justiça recordou recentemente no Acórdão Subdelegación del Gobierno en Barcelona (Residentes de longa duração) ( 39 ).

71.

Na medida em que a abordagem proposta nas presentes conclusões se caracteriza por uma flexibilidade que tem em conta o caso concreto, permitindo às autoridades nacionais eventualmente concluir, após uma apreciação global de todas as circunstâncias relevantes da situação concreta do referido nacional de país terceiro em causa, que mesmo uma estada de curta duração evita a perda do estatuto de residente de longa duração, há que constatar que a mesma abordagem se opõe a uma legislação nacional como a que está em causa no caso em apreço, que prevê a perda do referido estatuto quando o seu titular não tenha o seu local de residência legal ou habitual na União.

72.

A consequência desta constatação é que as autoridades nacionais encarregadas de efetuar essa apreciação global não podem legitimamente concluir pela inexistência de uma ligação real com a União apenas pelo facto de a pessoa em causa não preencher a referida condição. Estas devem antes ter em conta um vasto leque de critérios relevantes, como os enumerados a título de exemplo nos números anteriores das presentes conclusões. Com efeito, o local de residência legal ou habitual não se afigura, por si só, apto a servir de indicador do grau de integração de um nacional de país terceiro na sociedade do Estado‑Membro de acolhimento. A jurisprudência do Tribunal de Justiça relativa à Diretiva 2004/38 mostra claramente que a integração de uma pessoa só pode ser apreciada com base em vários critérios, entre os quais os fatores sociais e culturais revestem especial importância ( 40 ). Pelas razões já invocadas nas presentes conclusões, designadamente o objetivo pretendido pelo legislador e que consiste em aproximar os direitos dos nacionais de países terceiros dos direitos de que gozam os cidadãos da União ( 41 ), entendo que essas considerações devem influir na interpretação da Diretiva 2003/109.

73.

Para sintetizar, podemos concluir que a abordagem proposta se baseia numa interpretação do artigo 9.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva 2003/109 que tem devidamente em conta os termos desta disposição, bem como os objetivos prosseguidos pela regulamentação de que esta faz parte e o seu contexto legislativo, em conformidade com a metodologia reconhecida na jurisprudência do Tribunal de Justiça. Estou convencido de que só uma abordagem flexível, como a que apresentei, que assente no poder de apreciação das autoridades nacionais, fornecendo simultaneamente critérios úteis que lhes permitam apreciar a existência de uma relação real com a União, é apta a garantir um tratamento adequado da diversidade das circunstâncias com as quais estas se deparam diariamente.

VI. Conclusão

74.

À luz das considerações precedentes, proponho que o Tribunal de Justiça responda da seguinte forma às questões prejudiciais submetidas pelo Verwaltungsgericht Wien (Tribunal Administrativo de Viena, Áustria):

O artigo 9.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva 2003/109/CE do Conselho, de 25 de novembro de 2003, relativa ao estatuto dos nacionais de países terceiros residentes de longa duração, conforme alterada pela Diretiva 2011/51/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de maio de 2011, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma regulamentação nacional que prevê a perda do estatuto de nacional de país terceiro residente de longa duração quando o titular desse estatuto não tenha o seu local de residência legal ou habitual na União.

Esta disposição deve igualmente ser interpretada no sentido de que, nos casos em que um nacional de país terceiro residente de longa duração tenha a sua residência habitual fora da União, as autoridades nacionais competentes gozam de um certo poder de apreciação para avaliar se uma estada de curta duração no território da União durante um período de 12 meses consecutivos se opõe à perda do estatuto de nacional de país terceiro residente de longa duração nos termos da referida disposição. Os Estados‑Membros podem, nomeadamente, considerar, em conformidade com a Diretiva 2003/109, conforme alterada pela Diretiva 2011/51, que estadas breves apenas excluem a perda desse estatuto se o nacional de país terceiro tiver mantido, por outro lado, durante a sua ausência, uma ligação real com a União.

Para determinar a existência de tal ligação real com a União, devem ser tidos em conta todos os aspetos relevantes da situação concreta do nacional de país terceiro, nomeadamente a duração total e a frequência das suas ausências, as razões que o levaram a deixar o Estado‑Membro de acolhimento, a existência de património, bem como de laços familiares, de relações profissionais, de compromissos sociais e de obrigações fiscais no referido Estado‑Membro.


( 1 ) Língua original: francês.

( 2 ) JO 2004, L 16, p. 44.

( 3 ) JO 2011, L 132, p. 1.

( 4 ) BGBl. I, 100/2005.

( 5 ) Iglésias Sánchez, S., «Free movement of third country national in the European Union? Main features, deficiencies and challenges of the new mobility rights in the area of freedom security and justice», European Law Journal, vol. 15, n.o 6, pp. 798 e 799, explica que o reconhecimento do direito de circulação de nacionais de países terceiros foi inspirado por dois motivos que estão estreitamente relacionados, designadamente, a promoção da integração social e o objetivo de atrair trabalhadores qualificados, em concorrência com os Estados Unidos da América e o Canadá.

( 6 ) Halleskov, L., «The Long‑Term Residents Directive: a fulfillment of the Tampere objetive of near‑equality», European Journal of Migration and Law, vo. 7, n.o 2, 2005, p. 200.

( 7 ) Balleix, C., La politique migratoire de l’Union européenne, Paris, 2013, p. 218.

( 8 ) V., neste sentido, Acórdão de 18 de outubro de 2012, Singh (C‑502/10, EU:C:2012:636, n.o 42).

( 9 ) V., a título de exemplo, versões búlgara («отсъствие»), espanhola («ausencia»), dinamarquesa («fraværende»), estónia («äraolek»), grega («απουσία»), inglesa («absence»), francesa («absence»), italiana («assenza»), polaca («nieobecność») e sueca («bortovaro»).

( 10 ) V., a título de exemplo, versões alemã («aufgehalten») e neerlandesa («verblijven»). Contudo, as duas versões linguísticas do n.o 2 desse artigo 9.o, o qual confere a possibilidade de derrogar o seu n.o 1, empregam igualmente expressões equivalentes a «ausência», ou seja, «Abwesenheit» e «afwezigheid», respetivamente.

( 11 ) V., a este respeito, Lenaerts, K., Gutiérrez‑Fons, A., Les méthodes d’interprétation de la Cour de justice de l’Union européenne, Bruxelas, 2020.

( 12 ) V., neste sentido, Acórdãos de 25 de julho de 2008, Metock e o. (C‑127/08, EU:C:2008:449, n.o 84), e de 18 de dezembro de 2014, McCarthy e o. (C‑202/13, EU:C:2014:2450, n.o 32).

( 13 ) V. Acórdão de 26 de abril de 2012, Comissão/Países Baixos (C‑508/10, EU:C:2012:243, n.o 68), e Conclusões do advogado‑geral Y. Bot no processo que deu origem ao Acórdão Singh (C‑502/10, EU:C:2012:294, n.os 29 e 35), nas quais o advogado‑geral considera que as disposições em causa devem ser interpretadas no sentido de que existe uma obrigação de os Estados‑Membros concederem o referido estatuto se as condições pertinentes estiverem preenchidas.

( 14 ) V., a esse respeito, Acórdão de 8 de novembro de 2012, Iida (C‑40/11, EU:C:2012:691, n.os 45 a 48). Como refere Peers, S., EU Justice and Home Affairs Law, Volume I: EU Immigration and Asylum Law, 4.a ed., Oxford 2016, p. 425, a concessão do estatuto de residente de longa duração não é automática, mas requer que seja apresentado, pelo interessado, um pedido nesse sentido às autoridades nacionais competentes.

( 15 ) V. n.o 27 das presentes conclusões.

( 16 ) Thym, D., «Long Term Residents Directive 2003/109/EC», EU Immigration and Asylum Law, 04/2016, p. 473, n.o 1, observa que a Diretiva 2003/109 harmoniza de forma exaustiva as condições de obtenção e de retirada (ou de perda) do estatuto de residente de longa duração. Consequentemente, assim que o nacional de um país terceiro adquire o referido estatuto tem direito a mantê‑lo mesmo que posteriormente deixe de preencher as condições referidas nos artigos 5.o e 6.o da Diretiva 2003/109. De igual modo, a retirada (ou a perda) do referido estatuto só pode ocorrer se forem preenchidas as condições referidas no artigo 9.o dessa diretiva.

( 17 ) V., neste sentido, Boelaert‑Suominen, S., «Non‑EU nationals and Council Directive 2003/109/EC on the status of third‑country nationals who are long‑term residents: Five paces forward and possibly three paces back», Common Market Law Review, vol. 42, n.o 4, 2005, p. 1025.

( 18 ) Acórdão de 18 de outubro de 2012, Singh (C‑502/10, EU:C:2012:636, n.o 46). O sublinhado é meu.

( 19 ) V., a este respeito, Acórdão de 17 de julho de 2014, Tahir (C‑469/13, EU:C:2014:2094, n.o 30), no qual o Tribunal de Justiça observou que a condição de residência é indispensável para a concessão do estatuto de residente de longa duração.

( 20 ) Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de abril de 2004, relativa ao direito de livre circulação e residência dos cidadãos da União e dos membros das suas famílias no território dos Estados‑Membros, que altera o Regulamento (CEE) n.o 1612/68 e que revoga as Diretivas 64/221/CEE, 68/360/CEE, 72/194/CEE, 73/148/CEE, 75/34/CEE, 75/35/CEE, 90/364/CEE, 90/365/CEE e 93/96/CEE (JO 2004, L 158, p. 77).

( 21 ) Acórdão de 3 de outubro de 2019, X (Residentes de longa duração — Recursos estáveis, regulares e suficientes) (C‑302/18, EU:C:2019:830, n.os 32 e segs.).

( 22 ) Acórdão de 21 de julho de 2011 (C‑325/09, EU:C:2011:498, n.o 59). O sublinhado é meu.

( 23 ) V. artigo 10.o, n.o 1, alínea a), da proposta de diretiva do Conselho relativa ao estatuto dos nacionais de países terceiros residentes de longa duração [COM(2001) 127 final (JO 2001, C 240 E, p. 79)].

( 24 ) V. n.o 24 das presentes conclusões.

( 25 ) Thym, D., «Long Term Residents Directive 2003/109/EC», EU Immigration and Asylum Law, 04/2016, p. 474, n.o 6, interpreta essa disposição no sentido de que implica a perda «automática» do estatuto de residente de longa duração.

( 26 ) V., a este respeito, Relatório da Comissão ao Parlamento Europeu e ao Conselho sobre a aplicação da Diretiva [2003/109] [COM(2019) 161 final, p. 6], do qual resulta que a Áustria se valeu da possibilidade constante do artigo 9.o, n.o 2, da Diretiva 2003/109, tendo previsto, por um lado, que uma ausência de 12 meses consecutivos do território da União implica, regra geral, a perda do estatuto e, por outro, a possibilidade de permitir um período de ausência mais longo devido a circunstâncias excecionais.

( 27 ) V. n.o 49 das presentes conclusões.

( 28 ) V., a este respeito, Thym, D., «Long Term Residents Directive 2003/109/EC», EU Immigration and Asylum Law, 04/2016, p. 475, n.o 7, que considera que, tendo em conta o objetivo visado pela Diretiva 2003/1009 de promover a integração dos nacionais de Estados terceiros e de assegurar o seu «enraizamento» no Estado‑Membro de acolhimento, as visitas de curta duração não devem, em princípio, permitir interromper o período de 12 meses. Por outro lado, o autor pronuncia‑se a favor de uma abordagem menos «formalista» se uma avaliação individual da situação na qual a pessoa em causa se encontra justificar uma decisão a favor da manutenção do estatuto de residente de longa duração.

( 29 ) V., por analogia, Acórdão de 14 de março de 2019, Y. Z. e o. (Fraude no reagrupamento familiar) (C‑557/17, EU:C:2019:203, n.o 64), relativo à revogação do estatuto de residente de longa duração baseado numa fraude.

( 30 ) V., por analogia, Acórdão de 26 de abril de 2012, Comissão/Países Baixos (C‑508/10, EU:C:2012:243, n.o 65), no qual o Tribunal de Justiça referiu que o poder de apreciação concedido aos Estados‑Membros pela Diretiva 2003/109 quanto às taxas reclamadas aos nacionais de países terceiros e aos membros da sua família para a emissão de títulos e autorizações de residência não é ilimitado. Referindo‑se à sua jurisprudência, o Tribunal de Justiça recordou que os Estados‑Membros não podem aplicar uma legislação nacional suscetível de pôr em perigo a realização dos objetivos prosseguidos por uma diretiva e, assim, privá‑la do seu efeito útil.

( 31 ) V., a este respeito, Acórdão de 21 de julho de 2011, Dias (C‑325/09, EU:C:2011:498, n.o 64), no qual o Tribunal de Justiça observou, relativamente à interpretação do artigo 16.o, n.o 1, da Diretiva 2004/38, que «a integração, que preside à aquisição do direito de residência permanente […], se baseia não apenas em fatores espaciais e temporais mas também em fatores qualitativos, relativos ao grau de integração no Estado‑Membro de acolhimento». O sublinhado é meu.

( 32 ) Programa de Estocolmo — uma Europa aberta e segura que sirva e proteja os cidadãos (JO 2010, C 115, p. 1). V. comunicado de imprensa n.o 14615/04 do Conselho, de 19 de novembro de 2004, e Nota n.o 17024/09 do Conselho de 2 de dezembro de 2009, bem como Comunicação da Comissão, de 1 de setembro de 2005, intitulada «Agenda Comum para a Integração. Enquadramento para a integração de nacionais de países terceiros na União Europeia» [COM(2005) 389 final].

( 33 ) V., por analogia, Acórdão de 23 de novembro de 2010, Tsakouridis (C‑145/09, EU:C:2010:708, n.o 33), relativo à interpretação do artigo 28.o, n.o 3, da Diretiva 2004/38. Esta disposição confere aos cidadãos da União uma proteção reforçada contra qualquer decisão de afastamento do Estado‑Membro de acolhimento se estes tiverem residido no Estado‑Membro de acolhimento durante os 10 anos que precederam a decisão de afastamento. Uma vez que esta disposição nada diz quanto à questão de saber em que medida as ausências do território do Estado‑Membro de acolhimento impedem a pessoa em causa de beneficiar dessa proteção reforçada, cabe ao Tribunal de Justiça fornecer critérios úteis às autoridades nacionais.

( 34 ) V., neste contexto, Conclusões do advogado‑geral M. Szpunar no processo P e S (C‑579/13, EU:C:2015:39, n.o 92), nas quais este refere o conjunto de relações que uma pessoa que viva durante um longo período num determinado ambiente estabelece e que lhe permitem integrar‑se. Menciona «[o] casamento [e a] família, [a] vida de bairro, [o] trabalho, [a] prática de uma atividade de lazer [e o] exercício de uma atividade junto de organismos não governamentais».

( 35 ) V., por analogia, Conclusões do advogado‑geral E. Tanchev no processo Hummel Holding (C‑617/15, EU:C:2017:13, n.o 85), nas quais este refere «o estabelecimento do demandado» como critério para determinar a competência jurisdicional em direito processual civil.

( 36 ) V., neste contexto, Conclusões do advogado‑geral G. Hogan no processo Oberösterreich (Subsídio de habitação) (C‑94/20, EU:C:2021:155, n.o 75), nas quais este sublinha a importância da aprendizagem da língua enquanto meio para assegurar o acesso dos nacionais de países terceiros ao mercado de trabalho e à formação profissional.

( 37 ) V., por analogia, Acórdão de 18 de junho de 2015, Kieback (C‑9/14, EU:C:2015:406, n.o 22), no qual o Tribunal de Justiça refere o «local onde [o sujeito passivo] tem o centro dos seus interesses pessoais e patrimoniais» como critério para apreciar a capacidade contributiva deste, o que corresponde, geralmente, à sua «residência habitual».

( 38 ) V., a este respeito, Conclusões da advogada‑geral V. Trstenjak no processo Dias (C‑325/09, EU:C:2011:86, n.o 106), nas quais esta alega, em relação à interpretação do artigo 16.o da Diretiva 2004/38, que uma conduta desleal do ponto de vista jurídico por parte de um cidadão da União é inteiramente passível de enfraquecer a sua integração no Estado‑Membro de acolhimento no plano qualitativo.

( 39 ) Acórdão de 3 de setembro de 2020 (C‑503/19 e C‑592/19, EU:C:2020:629, n.o 43).

( 40 ) V., neste sentido, Acórdão de 23 de novembro de 2010, Tsakouridis (C‑145/09, EU:C:2010:708, n.o 26).

( 41 ) V. n.o 40 das presentes conclusões.

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