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Document 62020CC0271

Conclusões do advogado-geral G. Hogan apresentadas em 24 de junho de 2021.
Aurubis AG contra Bundesrepublik Deutschland.
Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Verwaltungsgericht Berlin.
Reenvio prejudicial — Regime de comércio de licenças de emissão de gases com efeito de estufa — Regime de atribuição de licenças a título gratuito — Decisão 2011/278/UE — Artigo 3.o, alínea d) — Subinstalação abrangida por um parâmetro de referência relativo a combustíveis — Conceitos de “combustão” e de “combustível” — Produção de cobre primário por fusão rápida — Pedido de atribuição — Licenças pedidas e ainda não atribuídas no termo de um período de comércio — Possibilidade de emitir essas licenças durante o período de comércio subsequente a título de execução de uma decisão judicial proferida após essa data.
Processo C-271/20.

Court reports – general – 'Information on unpublished decisions' section ; Court reports – general – 'Information on unpublished decisions' section

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2021:519

 CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

GERARD HOGAN

apresentadas em 24 de junho de 2021 ( 1 )

Processo C‑271/20

Aurubis AG

contra

República Federal da Alemanha

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Verwaltungsgericht Berlin (Tribunal Administrativo de Berlim, Alemanha)]

«Pedido de decisão prejudicial — Ambiente — Regime de comércio de licenças de emissão de gases com efeito de estufa — Disposição transitória relativa à atribuição harmonizada de licenças de emissão a título gratuito — Decisão 2011/278/UE — Artigo 3.o, alínea d) — Conceito de “subinstalação abrangida por um parâmetro de referência relativo a combustíveis” — Fusão rápida — Reação autotérmica — Pedido de atribuição indeferido após o decurso de um período de comércio»

I. Introdução

1.

O presente pedido de decisão prejudicial do Verwaltungsgericht Berlin (Tribunal Administrativo de Berlim, Alemanha) tem por objeto a interpretação do conceito de «subinstalação abrangida por um parâmetro de referência relativo a combustíveis» na aceção do artigo 3.o, alínea d), da Decisão 2011/278/UE da Comissão, de 27 de abril de 2011, sobre a determinação das regras transitórias da União relativas à atribuição harmonizada de licenças de emissão a título gratuito nos termos do artigo 10.o‑A da Diretiva 2003/87/CE do Parlamento Europeu e do Conselho[, de 13 de outubro de 2003, relativa à criação de um regime de comércio de licenças de emissão de gases com efeito de estufa na Comunidade e que altera a Diretiva 96/61/CE do Conselho (JO 2003, L 275, p. 32)] ( 2 ).

2.

A «subinstalação abrangida por um parâmetro de referência relativo a combustíveis» é uma das categorias de instalações industriais às quais podem ser atribuídas licenças de emissão a título gratuito para efeitos da Diretiva 2003/87. É esta diretiva que estabelece um regime de comércio de licenças de emissão de gases com efeito de estufa na União Europeia.

3.

Este pedido foi apresentado no âmbito de um processo que opõe a Aurubis AG (a seguir «Aurubis») e a Bundesrepublik Deutschland (República Federal da Alemanha), representada pelo Umweltbundesamt, Deutsche Emissionshandelsstelle (Instituto Federal do Meio Ambiente, Serviço de Comércio de Licenças de Emissão alemão; a seguir «DEHSt»), a respeito da quantidade de licenças de emissão atribuídas a título gratuito à Aurubis para a sua atividade de produção de cobre primário.

II. Quadro jurídico

A.   Direito da União

1. Diretiva 2003/87

4.

A Diretiva 2003/87 foi alterada várias vezes, incluindo pela Diretiva 2009/29/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de abril de 2009, que altera a Diretiva 2003/87/CE a fim de melhorar e alargar o regime comunitário de comércio de licenças de emissão de gases com efeito de estufa ( 3 ), e pela Diretiva (UE) 2018/410 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 14 de março de 2018, que altera a Diretiva 2003/87/CE para reforçar a relação custo‑eficácia das reduções de emissões e o investimento nas tecnologias hipocarbónicas, e a Decisão (UE) 2015/1814 ( 4 ). Tendo em conta os factos do litígio no processo principal, é a versão aplicável em 2012 que me parece pertinente para a resposta à primeira questão e será, portanto, utilizada, salvo indicação em contrário.

5.

O artigo 1.o da Diretiva 2003/87, intitulado «Objeto», dispõe:

«A presente diretiva cria um regime de comércio de licenças de emissão de gases com efeito de estufa na [União], […] a fim de promover a redução das emissões de gases com efeito de estufa em condições que ofereçam uma boa relação custo‑eficácia e sejam economicamente eficientes.

[…]»

6.

O artigo 2.o da Diretiva 2003/87, intitulado «Âmbito de aplicação», prevê, no n.o 1:

«A presente diretiva aplica‑se às emissões provenientes das atividades enumeradas no anexo I e aos gases com efeito de estufa enumerados no anexo II.»

7.

O artigo 3.o da Diretiva 2003/87, intitulado «Definições», dispõe:

«Para efeitos da presente diretiva, entende‑se por:

[…]

b)

“Emissão”, a libertação de gases com efeito de estufa na atmosfera a partir de fontes existentes numa instalação;

[…]

e)

“Instalação”, a unidade técnica fixa onde se realizam uma ou mais das atividades enumeradas no anexo I e quaisquer outras atividades diretamente associadas que tenham uma relação técnica com as atividades realizadas nesse local e que possam ter influência nas emissões e na poluição;

[…]

t)

“Combustão”, qualquer oxidação de combustíveis, independentemente da forma de utilização da energia térmica, elétrica ou mecânica produzida por esse processo e quaisquer outras atividades diretamente associadas, incluindo a depuração de efluentes gasosos;

[…]»

8.

O artigo 10.o‑A, n.o 1, da Diretiva 2003/87, intitulado «Regras [da União] transitórias relativas à atribuição harmonizada de licenças de emissão a título gratuito», dispõe:

«Até 31 de dezembro de 2010, a Comissão aprova medidas de execução a nível comunitário plenamente harmonizadas para a atribuição das licenças de emissão a que se referem os n.os 4, 5, 7 e 12, incluindo todas as disposições necessárias para uma aplicação harmonizada do n.o 19.

Essas medidas, que têm por objeto alterar elementos não essenciais da presente diretiva, completando‑a, são aprovadas pelo procedimento de regulamentação com controlo a que se refere o n.o 3 do artigo 23.o

As medidas referidas no primeiro parágrafo devem, na medida do possível, estabelecer parâmetros de referência ex ante a nível [da União] que assegurem que a atribuição se processe de uma forma que incentive reduções das emissões de gases com efeito de estufa e técnicas energéticas eficientes, ao tomar em consideração as mais eficientes técnicas, substitutos, processos de produção alternativos, cogeração de alta eficiência, recuperação eficiente de energia a partir de gases residuais, utilização da biomassa e captura, transporte e armazenamento de CO2, sempre que existam as instalações necessárias, não podendo incentivar o aumento das emissões. Não podem ser atribuídas licenças de emissão a título gratuito para a produção de eletricidade, salvo nos casos abrangidos pelo artigo 10.o‑C e no caso da eletricidade produzida a partir de gases residuais.

Para cada setor e subsetor, o parâmetro de referência deve ser, em princípio, calculado relativamente aos produtos e não aos fatores de produção, a fim de maximizar a redução das emissões de gases com efeito de estufa e as economias em termos de eficiência energética através de cada processo produtivo do setor ou subsetor em causa.

[…]»

2. Decisão 2011/278

9.

Os considerandos 1, 5, 12 e 18 da Decisão 2011/278 previam o seguinte:

«(1)

O artigo 10.o‑A da diretiva dispõe que as medidas plenamente harmonizadas e a nível da [União] de atribuição de licenças de emissão a título gratuito devem, na medida do possível, estabelecer parâmetros de referência ex ante que assegurem que essa atribuição de licenças de emissão a título gratuito se processe de uma forma que incentive reduções das emissões de gases com efeito de estufa e técnicas energéticas eficientes, ao tomar em consideração as mais eficientes técnicas, substitutos, processos de produção alternativos, cogeração de alta eficiência, recuperação eficiente de energia a partir de gases residuais, utilização da biomassa e captura e armazenamento de dióxido de carbono, sempre que existam as instalações necessárias, não devendo incentivar o aumento das emissões. As atribuições devem ser fixadas antes do período de comércio de emissões, a fim de permitir o bom funcionamento do mercado.

[…]

(5)

A Comissão considerou que era possível estabelecer um parâmetro de referência em relação a um produto quando, tendo em conta a complexidade dos processos de produção, existiam definições e classificações dos produtos que permitiam verificar os dados de produção e aplicar uniformemente o parâmetro de referência em toda a União, para efeitos de atribuição das licenças de emissão. Não foi feita qualquer diferenciação com base na geografia ou nas tecnologias, matérias‑primas ou combustíveis utilizados, para não distorcer as vantagens comparativas existentes na economia da União no que diz respeito à eficiência em termos de emissões de carbono e para harmonizar adicionalmente a atribuição de licenças de emissão transitórias a título gratuito.

[…]

(12)

Nos casos em que não foi possível calcular o parâmetro de referência de um produto, mas são produzidos gases com efeito de estufa elegíveis para a atribuição de licenças de emissão a título gratuito, essas licenças devem ser atribuídas com base em abordagens de recurso genéricas. Foram formuladas três abordagens de recurso hierarquizadas para maximizar a redução das emissões de gases com efeito de estufa e a economia de energia, pelo menos em parte dos processos de produção em causa. O parâmetro de referência relativo ao calor aplica‑se aos processos de consumo de calor em que é utilizado um vetor térmico mensurável. O parâmetro de referência relativo ao combustível aplica‑se quando é consumido calor não mensurável. Os valores dos parâmetros de referência relativos ao calor e ao combustível foram calculados com base nos princípios de transparência e simplicidade, utilizando a eficiência de referência de um combustível amplamente disponível e que possa ser considerado como o segundo melhor em termos de eficiência quanto à emissão de gases com efeito de estufa, tendo em conta as técnicas energéticas eficientes. No caso das emissões resultantes de processos, as licenças de emissão devem ser atribuídas com base nas emissões históricas. […]

[…]

(18)

A fim de evitar distorções da concorrência e assegurar um funcionamento correto do mercado do carbono, os Estados‑Membros devem garantir, ao determinar a atribuição de licenças a cada instalação, que não se verifique dupla contagem ou dupla atribuição. Neste contexto, deverão prestar especial atenção aos casos em que um produto abrangido por um parâmetro de referência é produzido em mais de uma instalação, em que vários produtos abrangidos por parâmetros de referência são produzidos na mesma instalação ou em que há troca de produtos intermédios através dos limites das instalações.»

10.

O artigo 2.o desta decisão, intitulado «Âmbito de aplicação», previa:

«A presente decisão é aplicável à atribuição de licenças de emissão a título gratuito prevista no capítulo III (instalações fixas) da Diretiva [2003/87] nos períodos de comércio de licenças de emissão a partir de 2013 […].»

11.

O artigo 3.o da Decisão 2011/278 previa:

«Para efeitos da presente decisão, entende‑se por:

[…]

b)

“Subinstalação abrangida por um parâmetro de referência relativo a produtos”, os fatores de produção, rendimentos e emissões correspondentes relacionados com a produção de um produto relativamente ao qual tenha sido estabelecido um parâmetro de referência no anexo I;

c)

“Subinstalação abrangida por um parâmetro de referência relativo ao calor”, os fatores de produção, rendimentos e emissões correspondentes não cobertos por uma subinstalação abrangida por um parâmetro de referência relativo a produtos no que diz respeito à produção ou à importação a partir de uma instalação ou de outra entidade abrangida pelo regime da União, ou a ambas, de calor mensurável que é:

consumido dentro dos limites da instalação com vista à produção de produtos, à produção de energia mecânica com exceção da utilizada para a produção de eletricidade e ao aquecimento ou arrefecimento com exceção do consumo para a produção de eletricidade, ou

exportado para uma instalação ou outra entidade não abrangida pelo regime da União, com exceção da exportação para a produção de eletricidade;

d)

“Subinstalação abrangida por um parâmetro de referência relativo a combustíveis”, os fatores de produção, rendimentos e emissões correspondentes não cobertos por uma subinstalação abrangida por um parâmetro de referência relativo a produtos, relacionados com a produção de calor não mensurável através da queima de combustíveis consumidos com vista à produção de produtos, à produção de energia mecânica com exceção da utilizada para a produção de eletricidade e ao aquecimento ou arrefecimento com exceção do consumo para a produção de eletricidade, incluindo a queima de segurança em tocha;

e)

“Calor mensurável”, um fluxo líquido de calor transportado através de condutas identificáveis que utilizem o calor como meio de transferência, tais como, em especial, o vapor, o ar quente, a água, o petróleo, metais líquidos e sais, em relação ao qual foi ou pode ser instalado um fluxímetro de calor;

[…]

g)

“Calor não mensurável”, todo o calor que não o calor mensurável;

h)

“Subinstalação com emissões de processo”, as emissões de gases com efeito de estufa enumeradas no anexo I da Diretiva [2003/87], com exceção do dióxido de carbono, que ocorrem fora dos limites do sistema de um parâmetro de referência relativo a produtos enumerado no anexo I, ou as emissões de dióxido de carbono que ocorrem fora dos limites do sistema de um parâmetro de referência relativo a produtos enumerado no anexo I em resultado de qualquer uma das seguintes atividades e emissões decorrentes da combustão de carbono parcialmente oxidado produzido na sequência das atividades a seguir indicadas para fins da produção de calor mensurável, de calor não mensurável ou de eletricidade, desde que sejam subtraídas as emissões que teriam ocorrido devido à combustão de uma quantidade de gás natural equivalente ao teor de energia tecnicamente utilizável do carbono parcialmente oxidado consumido:

i)

redução química ou eletrolítica de compostos metálicos em minérios, concentrados e materiais secundários,

ii)

remoção de impurezas de metais e compostos metálicos,

iii)

decomposição de carbonatos, com exceção dos destinados a depuração dos gases de combustão,

iv)

sínteses químicas em que os materiais carbonados participam na reação, para um fim primário que não seja a produção de calor,

v)

utilização de matérias‑primas ou aditivos carbonados para um fim primário que não seja a produção de calor[,]

vi)

redução química ou eletrolítica de óxidos metálicos ou óxidos não metálicos como os óxidos de silício e os fosfatos;

[…]»

12.

O artigo 10.o, n.o 8, da Decisão 2011/278, intitulado «Atribuição a nível de cada instalação», dispunha:

«Quando determinarem a quantidade total anual preliminar de licenças de emissão atribuídas a título gratuito a cada instalação, os Estados‑Membros devem assegurar que não haja dupla contagem das emissões e que a atribuição não seja negativa. […]»

13.

A Decisão 2011/278 foi revogada com efeitos a partir de 1 de janeiro de 2021 pelo Regulamento Delegado (UE) 2019/331 da Comissão, de 19 de dezembro de 2018, sobre a determinação das regras transitórias da União relativas à atribuição harmonizada de licenças de emissão a título gratuito nos termos do artigo 10.o‑A da Diretiva 2003/87/CE do Parlamento Europeu e do Conselho ( 5 ). No entanto, segundo o artigo 27.o deste regulamento delegado, a referida decisão continuará a ser aplicável às atribuições relativas ao período anterior a 1 de janeiro de 2021.

B.   Direito alemão

1. Treibhausgas‑Emissionshandelsgesetz

14.

O § 9 da Treibhausgas‑Emissionshandelsgesetz (Lei do Comércio de Direitos de Emissão de Gases com Efeito de Estufa), de 21 de julho de 2011 ( 6 ) (a seguir «TEHG»), tem a seguinte redação:

«1.   Os operadores de instalações têm direito a uma atribuição de direitos de emissão a título gratuito, em conformidade com os princípios enunciados no artigo 10.o‑A […] da Diretiva [2003/87] […], na versão em vigor à data pertinente, e na Decisão [2011/278].

[…]»

15.

O anexo 1, parte 2, da TEHG, intitulado «Atividades», refere, no seu n.o 1, entre as instalações cujas emissões são abrangidas pelo âmbito de aplicação desta lei, as «unidades de combustão de combustíveis cuja potência térmica total de combustão é igual ou superior a 20 MW numa instalação, exceto se estiverem previstas num dos números seguintes».

2. Zuteilungsverordnung 2020

16.

O § 2, n.os 27 e 29, do Verordnung über die Zuteilung von Treibhausgas‑Emissionsberechtigungen in der Handelsperiode 2013 bis 2020 (Zuteilungsverordnung 2020) (Regulamento Relativo à Atribuição de Licenças de Emissão de Gases com Efeito de Estufa no período de 2013 a 2020), de 26 de setembro de 2011 ( 7 ) (a seguir «ZuV 2020»), define os conceitos de «subinstalação abrangida por um parâmetro de referência relativo a combustíveis» e «subinstalação com emissões de processo» em termos idênticos aos do artigo 3.o, alíneas d) e h), da Decisão 2011/278.

III. Factos do litígio no processo principal

17.

A Aurubis explora em Hamburgo (Alemanha) uma instalação que produz cobre primário. Uma vez que esta atividade faz parte da categoria de atividades enumeradas no anexo I, n.o 6, da Diretiva 2003/87, «[p]rodução ou transformação de metais ferrosos […] quando são exploradas unidades de combustão com uma potência térmica nominal total superior a 20 MW», a Aurubis está sujeita à obrigação de comércio de emissões.

18.

A instalação é composta por duas subinstalações, a Rohhüttenwerk Nord e a Rohhüttenwerk Ost (a seguir «RWO»). O litígio no processo principal diz respeito apenas a esta última. A subinstalação RWO é uma fundição em que o cobre primário é produzido pela fusão rápida do concentrado de cobre, através do chamado processo «Outokumpu» ( 8 ). No entanto, segundo a Aurubis, este processo foi melhorado através do seu próprio trabalho de investigação e desenvolvimento para que o forno de fusão rápida pudesse funcionar sem a utilização de combustíveis de carbono ( 9 ).

19.

Por Decisão de 17 de fevereiro de 2014, a DEHSt atribuiu à recorrente um total de 2596999 licenças de emissão gratuitas para os anos de 2013 a 2020, na sequência do pedido apresentado por esta em 20 de janeiro de 2012.

20.

A recorrente impugnou essa decisão em 14 de março de 2014. Por Decisão de 3 de abril de 2018, a DEHSt anulou parcialmente a decisão de atribuição na parte em que excedia a atribuição de 1784398 licenças de emissão. A DEHSt apresentou como fundamentação o facto de não poder ser tida em conta a utilização de concentrado de cobre no âmbito de uma «subinstalação abrangida por um parâmetro de referência relativo a combustíveis», devendo esse concentrado ser associado a uma «subinstalação com emissões de processo». Depois de recalcular o direito à atribuição, a DEHSt revogou 523027 licenças de emissão.

21.

Por recurso interposto em 30 de abril de 2018 no órgão jurisdicional de reenvio, a recorrente contestou a decisão proferida sobre a impugnação.

22.

Segundo o pedido de decisão prejudicial, a Aurubis defendeu perante o órgão jurisdicional de reenvio que o concentrado de cobre que utiliza no processo de fusão rápida é constituído por sulforeto de cobre e de ferro (30 %, respetivamente, de cobre, ferro e enxofre). Além disso, o concentrado contém vestígios de carbono e de outros metais. Para obter cobre primário, esse concentrado é, em primeiro lugar, misturado com areia e outras substâncias que, por vezes, também contêm pequenas quantidades de carbono. O preparado obtido desse modo é colocado no forno de fusão rápida com uma mistura de ar e oxigénio. Devido à reação química entre o oxigénio e o enxofre contido no concentrado de cobre, a temperatura no forno é superior a 1200 °C, o que, por sua vez, leva à liquidificação do concentrado de cobre. A areia também é aquecida e as massas de ferro em bruto também se liquefazem. Não são utilizados combustíveis fósseis no processo.

23.

Segundo o pedido de decisão prejudicial, as substâncias obtidas desse modo são o mate (que é uma mistura de sulfureto de cobre e de ferro), o silicato de ferro (escórias) e o dióxido de enxofre (SO2). Subsequentemente, este mate é inserido num conversor, no qual as frações restantes de enxofre e ferro são também oxidadas pela insuflação de uma mistura de ar e oxigénio. Nessa ocasião, também é produzido calor. O produto desta fase, denominado «cobre blister», é colocado num forno de ânodo, no qual as restantes frações de enxofre são transformadas em SO2 por combustão. O produto final, cobre primário, é obtido deste modo.

24.

Afigura‑se, assim, que o processo não utiliza combustíveis fósseis. Contrariamente a outros produtores de cobre que utilizam combustíveis que contêm carbono como o fuelóleo pesado ou o gás natural, o processo desenvolvido e utilizado pela Aurubis é, portanto, uma melhoria em termos de proteção do clima. Todavia, embora este processo produza geralmente SO2 — e não dióxido de carbono (CO2) — a fundição em causa emite, ainda assim, na atmosfera, pequenas quantidades de CO2 devido à presença de quantidades mínimas de carbono no concentrado de cobre. O concentrado de cobre utilizado continha um teor de carbono de aproximadamente 0,7 % (em massa). A RWO emitia, assim, 0,026 toneladas de CO2 por tonelada de concentrado de cobre, ou seja, em média, 29024 toneladas de CO2 por ano.

25.

A Aurubis alega que a atribuição de licenças de emissão a título gratuito deveria ter sido baseada no § 2, n.o 27, do ZuV 2020 e no artigo 3.o, alínea d), da Decisão 2011/278, porque o enxofre sujeito a combustão no forno de fusão rápida é um «combustível» para esse efeito. A classificação de uma matéria como combustível não pressupõe que o objetivo principal da utilização dessa matéria seja a produção de calor ou que se trate de um combustível corrente como o carvão, o petróleo ou o gás natural. No concentrado de cobre, o componente cobre é a matéria‑prima e o enxofre é o combustível.

26.

A Aurubis argumenta ainda que a recorrida sempre partiu do princípio de que existe uma relação hierárquica entre os três métodos chamados de «fall‑back». Segundo a Aurubis, uma vez que os critérios para uma «subinstalação com parâmetro de referência relativo a combustíveis» estão preenchidos, a atribuição com base no parâmetro de referência de emissões de processo está fora de questão. Além disso, para que sejam preenchidos os critérios de «subinstalação com emissões de processo», deve haver uma relação causal direta e imediata entre a emissão de CO2 e o processo utilizado. Tal não é o caso do processo Outokumpu.

27.

Por estas razões, a Aurubis pede a anulação da Decisão de 3 de abril de 2018 e a atribuição complementar de licenças de emissão para os anos de 2013 a 2020.

28.

Segundo a República Federal da Alemanha, para que exista uma «subinstalação abrangida por um parâmetro de referência relativo a combustíveis» na aceção do § 2, n.o 27, da ZuV 2020 e do artigo 3.o, alínea d), da Decisão 2011/278, é necessário que a utilização do material em causa tenha por finalidade principal a produção de calor. Considera que não é esse o caso da fábrica RWO, uma vez que o concentrado de cobre é uma matéria‑prima e a finalidade principal da sua utilização é a produção de cobre primário. Além disso, esse concentrado não é completamente queimado no processo utilizado, contrariamente ao que se presume quando se calcula o parâmetro de referência relativo a combustíveis. Além disso, os combustíveis, na aceção do parâmetro de referência relativo a combustíveis, são combustíveis que podem ser substituídos por outros combustíveis, em especial pelo gás natural.

29.

O órgão jurisdicional de reenvio salienta, antes de mais, que, se se considerar que a RWO é uma «subinstalação abrangida por um parâmetro de referência relativo a combustíveis», isso equivaleria a classificar o concentrado de cobre — ou a fração de enxofre nele contida — como «combustível».

30.

Esse órgão jurisdicional salienta que o Tribunal de Justiça declarou, no n.o 53 do Acórdão de 20 de junho de 2019, ExxonMobil Production Deutschland (C‑682/17, EU:C:2019:518), que o artigo 3.o, alínea t), da Diretiva 2003/87 não circunscreve o conceito de «combustão» apenas às reações de oxidação que geram, elas próprias, um gás com efeito de estufa. Todavia, esta interpretação do Tribunal de Justiça não é necessariamente determinante para interpretar o alcance do termo «combustível» constante do artigo 3.o, alínea d), da Decisão 2011/278.

31.

É necessário, em especial, determinar se uma atribuição com base no parâmetro de referência relativo a combustíveis pressupõe que o objetivo principal da combustão seja a produção de calor. No entanto, em substância, no caso em apreço, o concentrado de cobre utilizado é simultaneamente matéria‑prima e combustível. Além disso, a jurisprudência do Tribunal de Justiça também não responde à questão de saber se a existência de um combustível, na aceção do parâmetro de referência relativo a combustíveis a que se refere a Decisão 2011/278, requer a possibilidade de substituição do combustível.

32.

Por último, o órgão jurisdicional de reenvio salienta que o terceiro período de comércio termina em 31 de dezembro de 2020. Afirma que, segundo a jurisprudência alemã, o fim do primeiro e do segundo períodos de comércio implicou a extinção dos direitos relativos aos pedidos das licenças que ainda não tinham sido pagas em 30 de abril na sequência do fim do período de comércio, na falta de qualquer disposição transitória expressa no direito nacional. O direito nacional também não contém qualquer disposição transitória relativa ao terceiro período de comércio. As autoridades alemãs recusaram‑se a adotar tal disposição com o fundamento de que as regras relativas ao quarto período de comércio (2021‑2030) foram estabelecidas exaustivamente pela legislação da União e que a compensação por direitos que abrangessem vários períodos só seria lícita se prevista por essa legislação.

33.

Segundo o órgão jurisdicional de reenvio, nenhum dos atos da União pertinentes contém disposições relativas à compensação dos direitos que abrangem vários períodos. Além disso, não foi prevista qualquer reserva específica de quotas em antecipação às decisões judiciais. Dito isto, um indício a favor do argumento segundo o qual a passagem do terceiro para o quarto período não extingue os direitos de atribuição não concedidos em 31 de dezembro de 2020 pode resultar da Decisão 2015/1814 ( 10 ), que prevê que determinadas licenças não atribuídas até 31 de dezembro de 2020 devem ser colocadas na «reserva de estabilização do mercado».

IV. Questões prejudiciais e tramitação do processo no Tribunal de Justiça

34.

Foi nestas circunstâncias que, por Decisão de 11 de junho de 2020, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 19 de junho de 2020, o Verwaltungsgericht Berlin (Tribunal Administrativo de Berlim) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

Os requisitos previstos no artigo 3.o, alínea d), da [Decisão 2011/278] para a atribuição de licenças de emissão a título gratuito com base numa subinstalação com um parâmetro de referência relativo a combustíveis estão preenchidos quando, numa instalação dedicada à produção de metais não ferrosos, nos termos do anexo I da Diretiva [2003/87], é utilizado para a produção de cobre primário, num forno de fusão rápida, um concentrado de cobre contendo enxofre, e o calor não mensurável necessário à fusão do cobre contido naquele concentrado é essencialmente produzido pela oxidação do enxofre, sendo o concentrado de cobre utilizado como matéria‑prima e como matéria combustível para a produção de calor?

2)

Em caso de resposta afirmativa à primeira questão:

Pode o direito à atribuição complementar de licenças de emissão a título gratuito para o terceiro período de comércio ser satisfeito após o decurso desse período através da atribuição de licenças para o quarto período de comércio, quando a existência desse direito à atribuição só é judicialmente reconhecida após o decurso do terceiro período de comércio, ou, com o termo desse terceiro período, extinguem‑se todos os direitos à atribuição que ainda não tenham sido concedidos?»

35.

A Aurubis, a Bundesrepublik Deutschland (República Federal da Alemanha) e a Comissão apresentaram observações escritas. Além disso, apresentaram alegações na audiência que teve lugar em 19 de maio de 2021.

V. Análise

A.   Primeira questão

36.

No âmbito do litígio sobre o qual foi chamado a pronunciar‑se, o órgão jurisdicional de reenvio deve determinar se a atividade de produção de cobre primário num forno de fusão rápida que utiliza o processo «Outokumpu» preenche os critérios de «subinstalação abrangida por um parâmetro de referência relativo a combustíveis». A primeira questão submetida pelo órgão jurisdicional de reenvio diz respeito, por conseguinte, à interpretação do artigo 3.o, alínea d), da Decisão 2011/278, que define este conceito para o período de comércio compreendido entre 2013 e 2020.

37.

As especificidades do processo em causa no processo principal suscitam três dificuldades especiais na interpretação do conceito de «subinstalação abrangida por um parâmetro de referência relativo a combustíveis» que figura no artigo 3.o, alínea d), da Decisão 2011/278. Em primeiro lugar, a substância em causa é simultaneamente uma matéria‑prima e um combustível. Além disso, trata‑se de uma matéria‑prima com baixo teor de carbono e sujeita a uma reação autotérmica. Não há, portanto, uma fonte de calor externo nem utilização de combustíveis de elevado teor de carbono. Em segundo lugar, a combustão do combustível utilizado é apenas parcial. Em terceiro lugar, a produção de calor não é necessariamente a finalidade principal da utilização da matéria em causa.

38.

No entanto, pelos motivos que adiante explicarei, não considero que estas especificidades obstem a que os requisitos do artigo 3.o, alínea d), da Decisão 2011/278 se verifiquem quando uma instalação de produção de metais não ferrosos utiliza um concentrado de cobre contendo enxofre num forno de fusão rápida para produzir cobre primário e em que o calor não mensurável necessário para fundir o minério de cobre contido nesse concentrado é produzido essencialmente através da oxidação do enxofre contido no mesmo concentrado.

39.

Esta interpretação baseia‑se nos métodos de interpretação tradicionais utilizados pelo Tribunal de Justiça no âmbito do regime de comércio de licenças de emissão de gases com efeito de estufa, ou seja, à luz não apenas dos termos do artigo 3.o, alínea d), da Decisão 2011/278, mas também da economia geral da Diretiva 2003/87 e da Decisão 2011/278, bem como dos objetivos que prosseguem ( 11 ). De seguida, analisarei sucessivamente cada um destes aspetos.

1. Interpretações literal e contextual

40.

Em primeiro lugar, há que observar que, embora o termo «combustível» não seja definido pela Decisão 2011/278, o conceito de «subinstalação abrangida por um parâmetro de referência relativo a combustíveis» é, não obstante, definida pelo artigo 3.o, alínea d), da Decisão 2011/278.

41.

Segundo esta disposição, existe uma «subinstalação abrangida por um parâmetro de referência relativo a combustíveis» quando «os fatores de produção, rendimentos e emissões correspondentes não [são] cobertos por uma subinstalação abrangida por um parâmetro de referência [e estão] relacionados com a produção de calor não mensurável através da queima de combustíveis consumidos com vista à produção de produtos […]».

42.

Resulta desta definição que a expressão «queima de combustíveis» pode ser pertinente para especificar o significado do conceito de «combustível» utilizado no artigo 3.o, alínea d), da Decisão 2011/278. No entanto, a «combustão» é definida no artigo 3.o, alínea t), da Diretiva 2003/87 como «qualquer oxidação de combustíveis, independentemente da forma de utilização da energia térmica […] produzida por esse processo e quaisquer outras atividades diretamente associadas […]». Além disso, no processo que deu origem ao Acórdão de 20 de junho de 2019, ExxonMobil Production Deutschland (C‑682/17, EU:C:2019:518), o Tribunal de Justiça esclareceu que o artigo 3.o, alínea t), da Diretiva 2003/87 não circunscreve o conceito de «combustão» apenas às reações de oxidação que geram elas próprias um gás com efeito de estufa ( 12 ).

43.

Como explicou o advogado‑geral H. Saugmandsgaard Øe nas suas conclusões nesse processo, os respetivos trabalhos preparatórios confirmam que a inserção do artigo 3.o, alínea t), da Diretiva 2003/87 visava consagrar uma definição ampla do conceito de «combustão» que devia englobar qualquer oxidação de combustíveis, independentemente da sua finalidade ( 13 ).

44.

Neste contexto, importa observar que as duas disposições do quadro jurídico pertinente que se referem ao conceito de «combustível» não limitam de modo algum o alcance deste termo, quer no que respeita à sua composição ou natureza, à quantidade de carbono que deve conter, à forma como a ignição deve ser efetuada, à percentagem de combustível a utilizar no processo ou à finalidade da utilização da substância que contém o combustível em causa. Contrariamente ao disposto no artigo 3.o, alínea h), v), da Decisão 2011/278 — que se refere expressamente à utilização de matérias‑primas ou aditivos carbonados para um fim primário que não seja a produção de calor — o artigo 3.o, alínea d), da Decisão 2011/278 parece exigir apenas que os fatores de produção, rendimentos e emissões correspondentes estejam relacionados com a produção de calor não mensurável através da queima de combustíveis consumidos com vista à produção de produtos.

45.

As finalidades prosseguidas pela Diretiva 2003/87 e pela Decisão 2011/278 permitem confirmar esta interpretação específica.

2. Interpretação teleológica

46.

Como resulta de jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, a Diretiva 2003/87 tem por objeto a criação de um regime de comércio de licenças de emissão com vista à redução das emissões de gases com efeito de estufa na atmosfera para um nível que previna qualquer perturbação antrópica perigosa do clima e cujo objetivo último consiste na proteção do ambiente ( 14 ). No entanto, é evidente que existe uma lógica económica subjacente ao regime que incita quem nele participa a emitir uma quantidade de gases com efeito de estufa inferior às licenças de emissão que lhe foram inicialmente atribuídas, para que ceda o excedente a outro participante que tenha produzido uma quantidade de emissões superior às licenças atribuídas ( 15 ).

47.

Por outras palavras, o regime de comércio de licenças de emissão de gases com efeito de estufa a nível da União é um instrumento económico de proteção do ambiente baseado no princípio do poluidor‑pagador. O objetivo deste instrumento é que o nível global de poluição diminua. Daqui decorre, por conseguinte, que a Decisão 2011/278 deve, se possível, ser interpretada de uma forma que recompense — e não que penalize — a empresa que atenuou e reduziu as emissões de gases com efeito de estufa.

48.

Neste contexto, o mecanismo de incentivo subjacente ao sistema de comércio de licenças de emissão não pode ser subestimado. De facto, uma das funções do regime é incentivar o investimento tendo em vista a redução das emissões de dióxido de carbono em condições economicamente eficazes e, assim, ser um motor para a inovação com baixo teor de carbono, contribuindo para a luta contra as alterações climáticas ( 16 ). Este mecanismo de incentivo é claramente pretendido pelo legislador da União com o artigo 10.o‑A, n.o 1, da Diretiva 2003/87 que especifica que a atribuição deve processar‑se «de uma forma que incentive reduções das emissões de gases com efeito de estufa e técnicas energéticas eficientes, ao tomar em consideração as mais eficientes técnicas, substitutos [e] processos de produção alternativos». O primeiro considerando da Decisão 2011/278 chama expressamente a atenção para este aspeto do regime.

49.

No entanto, como já referi, essa é a lógica económica subjacente ao regime que incentiva um participante a emitir menor quantidade de gases com efeito de estufa do que as licenças de emissão que lhe foram inicialmente atribuídas, a fim de ceder o excedente a outro participante que tenha produzido uma quantidade superior à da sua licença. Deste modo, o segundo participante não reduzirá as suas emissões, mas terá de pagar pelas suas emissões e, sobretudo, o objetivo global será alcançado — uma vez que o primeiro participante terá reduzido as suas emissões — graças a um investimento cujos efeitos positivos no ambiente continuarão após a eliminação total das licenças gratuitas ( 17 ). Até lá, a retenção de licenças de emissão não constitui uma forma de licença para poluir ( 18 ), mas a obtenção de um lucro com a venda de licenças não utilizadas faz, de facto, parte do sistema de incentivos criado pelo regime de comércio de emissões ( 19 ).

50.

Nestas circunstâncias, parece‑me que os objetivos prosseguidos pela Diretiva 2003/87 e pela Decisão 2011/278 conduzem à rejeição de uma interpretação que excluiria do conceito de «queima de combustíveis» utilizado no artigo 3.o, alínea d), da Decisão 2011/278 um concentrado como o que está em causa no processo principal simplesmente porque a sua combustão é apenas parcial ou porque a finalidade principal da sua utilização não seria a produção de calor, enquanto, em primeiro lugar, é pacífico que o processo em causa leva à produção de calor não mensurável por um fenómeno de combustão e, em segundo lugar e mais importante, esse processo é uma inovação que garante uma redução das emissões de gases com efeito de estufa ou, pelo menos, parece ter algum potencial de redução das emissões de CO2 ( 20 ).

51.

Contra esta interpretação, a Comissão e a República Federal da Alemanha argumentam que existe um risco de sobreposição e dupla contagem de emissões, embora tal sobreposição seja proibida por várias disposições da Decisão 2011/278 ( 21 ). Na audiência de 19 de maio de 2021, o representante da República Federal da Alemanha salientou a inexistência de quaisquer critérios na Decisão 2011/278 que, em processos «duplos», permitam fazer a distinção entre o que é combustível, por um lado, e o que constitui matéria‑prima, por outro.

52.

No entanto, pela minha parte, não partilho deste receio. De facto, expliquei recentemente nas Conclusões, de 3 de junho de 2021, no processo ExxonMobil (C‑126/20, EU:C:2021:457), por que razão considero que seria contrário ao regime do artigo 10.o‑A da Diretiva 2003/87 e da Decisão 2011/278 não aplicar uma hierarquia entre os diferentes parâmetros de referência, como expressamente descrito no considerando 12 da Decisão 2011/278 ( 22 ).

53.

Portanto, a este respeito, recordo simplesmente que, embora o Tribunal de Justiça já tenha afirmado em múltiplas ocasiões que as definições das diferentes subinstalações abrangidas por um parâmetro de referência se excluem mutuamente ( 23 ), declarou igualmente que a Decisão 2011/278 formulou «três abordagens de recurso hierarquizadas […] para maximizar a redução das emissões de gases com efeito de estufa e a economia de energia, pelo menos em parte dos processos de produção em causa» ( 24 ). Estabeleceu, assim, que «só nos casos em que não foi possível calcular o parâmetro de referência de um produto, mas são produzidos gases com efeito de estufa elegíveis para a atribuição de licenças de emissão a título gratuito, é que essas licenças devem ser atribuídas com base nas três abordagens ditas “de recurso”, segundo a hierarquia determinada» ( 25 ). A própria existência desta hierarquia milita contra o risco de dupla contagem.

3. Conclusão sobre a primeira questão

54.

Consequentemente, com base numa interpretação literal, contextual e teleológica do artigo 3.o, alínea d), da Decisão 2011/278, concluo que esta disposição deve ser interpretada no sentido de que os requisitos para a atribuição de licenças de emissão a título gratuito com base numa «subinstalação com um parâmetro de referência relativo a combustíveis» estão preenchidos quando, numa instalação dedicada à produção de metais não ferrosos abrangida pelo anexo I da Diretiva 2003/87, é utilizado, num forno de fusão rápida, um concentrado de cobre contendo enxofre para a produção de cobre primário e o calor não mensurável necessário à fusão do cobre contido nesse concentrado é essencialmente produzido pela oxidação do enxofre, de modo que o concentrado de cobre é utilizado simultaneamente como matéria‑prima e como matéria combustível para a produção de calor.

B.   Segunda questão

55.

Com a sua segunda questão, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se os direitos a uma atribuição de licenças de emissão a título gratuito para o terceiro período de comércio, que só são judicialmente reconhecidos após o decurso desse período de comércio, podem ser satisfeitos através da atribuição de licenças a título gratuito para o quarto período de comércio.

56.

Esta questão é rigorosamente idêntica à quinta questão no processo ExxonMobil (C‑126/20).

57.

Na sequência da análise que desenvolvi nas conclusões apresentadas nesse processo, cheguei à conclusão de que esta questão deve ser respondida afirmativamente. Como o Tribunal de Justiça ainda não proferiu o seu acórdão, mantenho respeitosamente esta interpretação e tomo a liberdade de remeter para as minhas conclusões anteriores para mais explicações ( 26 ).

VI. Conclusão

58.

Por conseguinte, à luz das considerações precedentes, proponho que o Tribunal de Justiça responda do seguinte modo às questões prejudiciais apresentadas pelo Verwaltungsgericht Berlin (Tribunal Administrativo de Berlim, Alemanha):

1)

O artigo 3.o, alínea d), da Decisão da Comissão 2011/278/UE, de 27 de abril de 2011, sobre a determinação das regras transitórias da União relativas à atribuição harmonizada de licenças de emissão a título gratuito nos termos do artigo 10.o‑A da Diretiva 2003/87, deve ser interpretado no sentido de que os requisitos para a atribuição de licenças de emissão a título gratuito com base numa «subinstalação com um parâmetro de referência relativo a combustíveis» estão preenchidos quando, numa instalação dedicada à produção de metais não ferrosos abrangida pela Diretiva 2003/87/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de outubro de 2003, relativa à criação de um regime de comércio de licenças de emissão de gases com efeito de estufa na Comunidade e que altera a Diretiva 96/61/CE do Conselho, conforme alterada pela Diretiva 2009/29/CE do Parlamento e do Conselho, de 23 de abril de 2009, é utilizado, num forno de fusão rápida, um concentrado de cobre contendo enxofre para a produção de cobre primário e o calor não mensurável necessário à fusão do cobre contido nesse concentrado é essencialmente produzido pela oxidação do enxofre, de modo que o concentrado de cobre é utilizado simultaneamente como matéria‑prima e como matéria combustível para a produção de calor.

2)

Os direitos a uma atribuição complementar de licenças de emissão para o terceiro período de comércio podem ser satisfeitos após o decurso deste período de comércio, através da atribuição de licenças para o quarto período de comércio, quando a existência desses direitos à atribuição só for judicialmente reconhecida após o decurso do terceiro período de comércio. As licenças para o terceiro período de comércio não se extinguem com o termo deste período de comércio.


( 1 ) Língua original: inglês.

( 2 ) JO 2011, L 130, p. 1.

( 3 ) JO 2009, L 140, p. 63.

( 4 ) JO 2018, L 76, p. 3.

( 5 ) JO 2019, L 59, p. 8.

( 6 ) BGBl. 2011 I, p. 1475.

( 7 ) BGBl. 2011 I, p. 1921.

( 8 ) A designação deriva do nome de uma mina de cobre (atualmente desativada) na Finlândia oriental, que desenvolveu pela primeira vez este processo de fusão para minérios contendo enxofre no final da década de 1940.

( 9 ) V. n.o 8 das observações escritas da Aurubis.

( 10 ) Decisão (UE) 2015/1814 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de outubro de 2015, relativa à criação e ao funcionamento de uma reserva de estabilização do mercado para o regime de comércio de licenças de emissão de gases com efeito de estufa da União e que altera a Diretiva 2003/87/CE (JO 2015, L 264, p. 1).

( 11 ) V., neste sentido, Acórdãos de 18 de janeiro de 2018, INEOS (C‑58/17, EU:C:2018:19, n.os 34 e 35), e de 3 de dezembro de 2020, Ingredion Germany (C‑320/19, EU:C:2020:983, n.os 49 e 50).

( 12 ) N.o 53.

( 13 ) Conclusões do advogado‑geral H. Saugmandsgaard Øe no processo ExxonMobil Production Deutschland (C‑682/17, EU:C:2019:167, n.o 44).

( 14 ) V., neste sentido, Acórdãos de 20 de junho de 2019, ExxonMobil Production Deutschland (C‑682/17, EU:C:2019:518, n.o 62), e de 3 de dezembro de 2020, Ingredion Germany (C‑320/19, EU:C:2020:983, n.o 38).

( 15 ) V., neste sentido, Acórdãos de 8 de março de 2017, ArcelorMittal Rodange et Schifflange (C‑321/15, EU:C:2017:179, n.o 22); de 20 de junho de 2019, ExxonMobil Production Deutschland (C‑682/17, EU:C:2019:518, n.o 63); e de 3 de dezembro de 2020, Ingredion Germany (C‑320/19, EU:C:2020:983, n.o 39).

( 16 ) V., neste sentido, Acórdãos de 12 de abril de 2018, PPC Power (C‑302/17, EU:C:2018:245 n.o 27), e de 21 de junho de 2018, Polónia/Parlamento e Conselho (C‑5/16, EU:C:2018:483, n.o 61).

( 17 ) O princípio da eliminação total das licenças de emissão a título gratuito até 2027 foi consagrado no artigo 10.o‑A, n.o 11, da Diretiva 2003/87, na sua versão aplicável ao presente processo. Todavia, este princípio foi posto em causa pelas alterações introduzidas nos artigos 10.o‑A e 10.o‑B da Diretiva 2003/87 pelo artigo 1.o, n.o 14, alínea k), e n.o 15, da Diretiva 2018/410.

( 18 ) V., neste sentido (implicitamente), Acórdão de 17 de outubro de 2013, Billerud Karlsborg and Billerud Skärblacka (C‑203/12, EU:C:2013:664, n.o 32).

( 19 ) V., neste sentido, Acórdão de 12 de abril de 2018, PPC Power (C‑302/17, EU:C:2018:245, n.o 27).

( 20 ) Segundo o meu entendimento do processo em causa, conforme explicado pela Aurubis e pelo órgão jurisdicional de reenvio no seu pedido de decisão prejudicial, e, portanto, sujeito a verificação por este último.

( 21 ) V., a este respeito, artigos 6.o, n.o 2, 7.o, n.o 7, e 8.o, n.o 5, da Decisão 2011/278 e Acórdão de 8 de setembro de 2016, Borealis e o. (C‑180/15, EU:C:2016:647, n.os 69 e 70).

( 22 ) V. minhas Conclusões, de 3 de junho de 2021, no processo ExxonMobil (C‑126/20, EU:C:2021:457, n.os 79 a 87).

( 23 ) V., neste sentido, Acórdãos de 8 de setembro de 2016, Borealis e o. (C‑180/15, EU:C:2016:647, n.o 62); de 18 de janeiro de 2018, INEOS (C‑58/17, EU:C:2018:19, n.o 29); de 20 de junho de 2019, ExxonMobil Production Deutschland (C‑682/17, EU:C:2019:518, n.o 104); e de 3 de dezembro de 2020, Ingredion Germany (C‑320/19, EU:C:2020:983, n.o 68).

( 24 ) Acórdão de 8 de setembro de 2016, Borealis e o. (C‑180/15, EU:C:2016:647, n.o 67). O sublinhado é meu.

( 25 ) Acórdão de 18 de janeiro de 2018, INEOS (C‑58/17, EU:C:2018:19, n.o 30). O sublinhado é meu.

( 26 ) V. minhas Conclusões, de 3 de junho de 2021, no processo ExxonMobil (C‑126/20, EU:C:2021:457, n.os 89 a 98).

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