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Document 62020CC0013

    Conclusões do advogado-geral M. Szpunar apresentadas em 10 de março de 2021.
    Top System SA contra État belge.
    Pedido de decisão prejudicial apresentado pela cour d'appel de Bruxelles.
    Reenvio prejudicial — Direitos de autor e direitos conexos — Proteção jurídica dos programas de computador — Diretiva 91/250/CEE — Artigo 5.o — Exceções aos atos sujeitos a autorização — Atos necessários para permitir ao legítimo adquirente corrigir erros — Conceito — Artigo 6.o — Descompilação — Requisitos.
    Processo C-13/20.

    Court reports – general

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:2021:193

     CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

    MACIEJ SZPUNAR

    apresentadas em 10 de março de 2021 ( 1 )

    Processo C‑13/20

    Top System SA

    contra

    État belge

    [pedido de decisão prejudicial apresentado pela cour d’appel de Bruxelles (Tribunal de Recurso de Bruxelas, Bélgica)]

    «Reenvio prejudicial — Direito de autor e direitos conexos — Diretiva 91/250/CEE — Proteção jurídica dos programas de computador — Artigo 5.o, n.o 1 — Exceções aos atos sujeitos a autorização — Atos necessários para a correção de erros — Artigo 6.o — Descompilação de um programa de computador»

    Introdução

    1.

    O presente processo dá ao Tribunal de Justiça uma nova oportunidade de se debruçar sobre as especificidades da proteção jurídica dos programas de computador. Com efeito, apesar de ser aceite, tanto no direito da União ( 2 ) como no direito internacional ( 3 ), que os programas de computador estão protegidos pelo direito de autor enquanto obras literárias, eles distinguem‑se destas sob vários aspetos. O seu caráter específico, enquanto objetos de proteção, reflete‑se nos mecanismos dessa proteção, que são de tal forma diferentes das regras gerais do direito de autor que levam alguns autores a falar de um regime de proteção de facto sui generis ( 4 ).

    2.

    Desde logo, não apenas os programas de computador têm uma finalidade utilitária mas essa utilidade tem um caráter muito específico: permitir o funcionamento dos computadores. Com efeito, esses programas são constituídos por um conjunto de instruções que, executadas por um computador, permitem que este realize determinadas funções ( 5 ). Daqui resulta que, contrariamente a qualquer outra categoria de objetos protegidos pelo direito de autor, os programas de computador não se destinam a ser utilizados por intermédio da perceção humana. Os primeiros programas de computador eram, aliás, considerados acessórios da própria máquina e o software só progressivamente se foi autonomizando em relação ao hardware ( 6 ).

    3.

    É certo que, em determinadas situações, que podem ser pertinentes do ponto de vista do direito de autor, a leitura de um programa de computador pelo homem pode ser útil, por exemplo para criar um programa concorrente ou complementar. No entanto, em princípio, não é o utilizador, mas sim o computador, que «lê» o programa e o executa. Para o utilizador, a utilidade não reside, portanto, no programa de computador enquanto tal, mas nas funcionalidades que esse programa permite que o computador implemente. Isto aproxima mais os programas de computador das invenções protegidas por patente do que das obras «clássicas» protegidas pelo direito de autor.

    4.

    Desta primeira característica dos programas de computador decorre a segunda, a saber, a sua forma de expressão. Com efeito, se o programa de computador não se destina à perceção humana, mas a ser reconhecido pela máquina, deve ser expresso de forma a ser inteligível por esta. Esta forma de expressão é o código binário, uma «escrita» que se limita a dois sinais, habitualmente representados por 0 e 1, representação que corresponde ainda a uma convenção para uso humano. O processador do computador «lê» esses sinais como impulsos elétricos diferentes.

    5.

    Se é certo que os programas para os computadores ditos «da primeira geração» eram frequentemente codificados diretamente sob a forma binária, os programas atuais são bem mais complexos para que possam ser criados, ou mesmo lidos, sob essa forma. Por conseguinte, existem linguagens de programação, ditas «linguagens de alto nível», que contêm diversas instruções para os computadores, codificadas sob a forma de expressões próximas da linguagem natural e, portanto, percetíveis pelo homem e inteligíveis por quem conhece essas linguagens. Um programa de computador redigido nessa linguagem de programação constitui o seu «código‑fonte». Em seguida, este código‑fonte é «compilado», através de um software específico designado «compilador», num «código‑objeto» ou «código‑máquina», ou seja, a forma inteligível e executável por um computador ( 7 ).

    6.

    Não se pode negar que, na prática, os programas de computador são normalmente comunicados aos utilizadores apenas sob a forma do código‑objeto. Isto permite utilizar esses programas executando‑os no computador, mas não permite conhecer‑lhes o conteúdo, o que habitualmente não acontece quando se trata de uma obra protegida pelo direito de autor. A questão de saber se e, eventualmente, em que medida o utilizador de um programa de computador tem o direito de traduzir o código‑objeto do referido programa para código‑fonte (operação que se designa «descompilação»), a fim de lhe poder ler o conteúdo, é justamente a questão fulcral do presente processo.

    7.

    Essa questão conduz‑nos à terceira característica dos programas de computador enquanto objetos de proteção pelo direito de autor: a articulação entre esta proteção e o princípio clássico do direito de autor segundo o qual este não protege as ideias, mas apenas a respetiva expressão. Este princípio reflete a razão de ser do direito de autor, que é a de servir não apenas a criação, protegendo o trabalho criativo dos autores, mas também a difusão e o acesso às ideias, prevenindo a sua monopolização, de modo a que estas possam ser fonte de outras criações. No entanto, o facto de a expressão dos programas de computador, como são habitualmente divulgados, ser impercetível para o homem permite dissimular as ideias subjacentes a esses programas, conferindo aos seus autores uma proteção que ultrapassa o que é justificado pelos objetivos do direito de autor ( 8 ). Assim, os programas de computador constituem a única categoria de obras protegidas para as quais é impossível o acesso às ideias que lhe estão subjacentes pela mera análise sensorial que não implique atos sujeitos ao monopólio do autor ( 9 ).

    8.

    Estas considerações introdutórias pareceram‑me necessárias para situar o presente processo no contexto específico da proteção dos programas de computador pelo direito de autor. Com efeito, o problema‑chave deste processo, o do direito à descompilação de um programa, não pode suscitar‑se em relação a qualquer outra categoria de objetos protegidos, pela simples razão de que nem o procedimento de descompilação nem qualquer procedimento análogo são necessários para aceder ao conteúdo das obras de categorias diferentes da dos programas de computador.

    Quadro jurídico

    Direito da União

    9.

    O artigo 1.o da Diretiva 91/250/CEE do Conselho, de 14 de maio de 1991, relativa à proteção jurídica dos programas de computador ( 10 ), dispõe:

    «1.   De acordo com o disposto na presente diretiva, os Estados‑Membros estabelecerão uma proteção jurídica dos programas de computador, mediante a concessão de direitos de autor, enquanto obras literárias, na aceção da Convenção de Berna para a Proteção das Obras Literárias e Artísticas. Para efeitos da presente diretiva, a expressão “programas de computador” inclui o material de conceção.

    2.   Para efeitos da presente diretiva, a proteção abrange a expressão, sob qualquer forma, de um programa de computador. As ideias e princípios subjacentes a qualquer elemento de um programa de computador, incluindo os que estão na base das respetivas interfaces, não são protegidos pelos direitos de autor ao abrigo da presente diretiva.

    3.   Um programa de computador será protegido se for original, no sentido em que é o resultado da criação intelectual do autor. Não serão considerados quaisquer outros critérios para determinar a sua suscetibilidade de proteção.»

    10.

    Nos termos do artigo 4.o, alíneas a) e b), desta diretiva:

    «Sem prejuízo do disposto nos artigos 5.o e 6.o, os direitos exclusivos do titular, na aceção do artigo 2.o devem incluir o direito de efetuar ou autorizar:

    a)

    A reprodução permanente ou transitória de um programa de computador, seja por que meio for, e independentemente da forma de que se revestir, no todo ou em parte. Se operações como o carregamento, visualização, execução, transmissão ou armazenamento de um programa de computador carecerem dessa reprodução, essas operações devem ser submetidas a autorização do titular do direito;

    b)

    A tradução, adaptação, ajustamentos ou outras modificações do programa e a reprodução dos respetivos resultados, sem prejuízo dos direitos de autor da pessoa que altere o programa».

    11.

    Nos termos do artigo 5.o, n.o 1, da referida diretiva:

    «Salvo disposições contratuais específicas em contrário, os atos previstos nas alíneas a) e b) do artigo 4.o não se encontram sujeitos à autorização do titular sempre que sejam necessários para a utilização do programa de computador pelo seu legítimo adquirente de acordo com o fim a que esse programa se destina, bem como para a correção de erros.»

    12.

    Por último, o artigo 6.o da mesma diretiva, sob a epígrafe «Descompilação», dispõe:

    «1.   Não é necessária a autorização do titular dos direitos quando a reprodução do código e a tradução da sua forma, na aceção das alíneas a) e b) do artigo 4.o forem indispensáveis para obter as informações necessárias à interoperabilidade de um programa de computador criado independentemente, com outros programas, uma vez preenchidas as seguintes condições:

    a)

    Esses atos serem realizados pelo licenciado ou por outra pessoa que tenha o direito de utilizar uma cópia do programa, ou em seu nome por uma pessoa devidamente autorizada para o efeito;

    b)

    Não se encontrarem já fácil e rapidamente à disposição das pessoas referidas na alínea a) as informações necessárias à interoperabilidade;

    c)

    Esses atos limitarem‑se a certas partes do programa de origem necessárias à interoperabilidade.

    2.   O disposto no n.o 1 não permite que as informações obtidas através da sua aplicação:

    a)

    Sejam utilizadas para outros fins que não o de assegurar a interoperabilidade de um programa criado independentemente;

    b)

    Sejam transmitidas a outrem, exceto quando tal for necessário para a interoperabilidade do programa criado independentemente;

    ou

    c)

    Sejam utilizadas para o desenvolvimento, produção ou comercialização de um programa substancialmente semelhante na sua expressão, ou para qualquer outro ato que infrinja os direitos de autor.

    3.   De acordo com o disposto na Convenção de Berna para a Proteção das Obras Literárias e Artísticas, as disposições do presente artigo não podem ser interpretadas no sentido de permitirem a sua aplicação de uma forma suscetível de lesar os legítimos interesses do titular de direitos ou que não se coadune com uma exploração normal do programa de computador.»

    13.

    A Diretiva 91/250 foi revogada, com efeitos a partir de 24 de maio de 2009, por força do artigo 10.o da Diretiva 2009/24/CE ( 11 ). No entanto, os factos do processo principal estão sujeitos, ratione temporis, à Diretiva 91/250. Por outro lado, as disposições pertinentes desta diretiva não foram alteradas.

    Direito belga

    14.

    Os artigos 4.o, 5.o e 6.o da Diretiva 91/250 foram transpostos para o direito belga, literalmente quanto ao essencial, nos artigos 5.o, 6.o e 7.o da loi du 30 juin 1994 transposant en droit belge la directive 91/250/CEE du Conseil du 14 mai 1991 concernant la protection juridique des programmes d’ordinateur (Lei de 30 de junho de 1994, que Transpõe para o Direito Belga a Diretiva 91/250/CEE do Conselho, de 14 de maio de 1991, relativa à Proteção Jurídica dos Programas de Computador) ( 12 ).

    Matéria de facto, tramitação do processo e questões prejudiciais

    15.

    O Selor [bureau de sélection de l’Administration fédérale (Serviço de Seleção da Administração Federal)] é uma instituição pública belga, que foi integrada no service public fédéral Stratégie et Appui (Serviço Público Federal Estratégia e Apoio), responsável pela seleção e orientação dos futuros colaboradores dos diversos serviços da administração pública. O État belge (Estado belga) é designado como parte no processo principal.

    16.

    A Top System SA, sociedade de direito belga, desenvolve programas informáticos e assegura diversas prestações de serviços informáticos aos seus clientes. Colabora com o Selor há muitos anos.

    17.

    A Top System é, nomeadamente, autora de diversas aplicações desenvolvidas a pedido do Selor, entre as quais o «SWA» (Selor Web Access), também denominado «eRecruiting». Estas aplicações são compostas, por um lado, por elementos concebidos «por medida», adequados a satisfazer as necessidades e exigências específicas do Selor, e, por outro, por elementos extraídos pela Top System do «TSF» (Top System Framework), programa que concebeu. Um dos componentes do TSF é o «DGE» (DataGridEditor). O Selor detém uma licença de utilização das aplicações desenvolvidas pela Top System.

    18.

    Em 6 de fevereiro de 2008, o Selor e a Top System celebraram vários contratos de prestação de serviços, um deles tendo por objeto a instalação e a configuração de um novo ambiente de desenvolvimento, bem como integração e a migração das fontes das aplicações do Selor para esse novo ambiente. Entre os meses de junho e de outubro de 2008, foram trocadas mensagens de correio eletrónico a respeito de problemas que afetavam algumas aplicações, designadamente a aplicação eRecruiting.

    19.

    Seguiu‑se um litígio nos órgãos jurisdicionais comerciais de Bruxelas (Bélgica). Em particular, em 6 de julho de 2009, a Top System intentou uma ação contra o Selor e o Estado belga no tribunal de commerce de Bruxelles (Tribunal de Comércio de Bruxelas, Bélgica) com vista a obter a declaração de que, em substância, o Selor procedera à descompilação do framework TSF. A Top System alegou, nomeadamente, uma violação dos seus direitos exclusivos sobre o TSF e pediu a condenação do Selor e do Estado belga no pagamento de uma indemnização. O processo foi remetido ao tribunal de première instance de Bruxelles (Tribunal de Primeira Instância de Bruxelas, Bélgica), que julgou improcedente o pedido de indemnização.

    20.

    A Top System recorreu desta decisão para o órgão jurisdicional de reenvio. Perante este órgão jurisdicional, o Selor reconhece ter procedido a uma descompilação de uma parte do TSF, cujas funcionalidades foram integradas nas aplicações do Selor, a fim de desativar uma função defeituosa. O Selor alega estar autorizado a proceder a essa descompilação, em primeiro lugar, contratualmente, afirmação que o órgão jurisdicional de reenvio julga improcedente, e, em segundo lugar, por força das disposições que transpõem o artigo 5.o, n.o 1, da Diretiva 91/250. Em contrapartida, a Top System, contestando a existência de qualquer erro nos seus programas informáticos, alega que a descompilação de um programa de computador só é permitida, fora do âmbito contratual, nos termos do artigo 6.o dessa diretiva, e não para corrigir erros, mas apenas para assegurar a interoperabilidade de programas independentes.

    21.

    Foi neste contexto que a cour d’appel de Bruxelles (Tribunal de Recurso de Bruxelas, Bélgica) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

    «1)

    Deve o artigo 5.o, n.o 1, da [Diretiva 91/250] ser interpretado no sentido de que permite ao adquirente legítimo de um programa de computador descompilar todo ou parte deste quando essa descompilação seja necessária para lhe permitir corrigir erros que afetam o funcionamento do referido programa, incluindo quando a correção consiste em desativar uma função que afeta o bom funcionamento da aplicação da qual esse programa faz parte?

    2)

    Em caso afirmativo, devem, além disso, estar preenchidas as condições do artigo 6.o da [Diretiva 91/250] ou outras condições?»

    22.

    O pedido de decisão prejudicial deu entrada no Tribunal de Justiça em 14 de janeiro de 2020. Foram apresentadas observações escritas pelas partes no processo principal e pela Comissão Europeia. Tendo em consideração as atuais circunstâncias relativas à crise sanitária, o Tribunal de Justiça decidiu anular a audiência. As partes responderam por escrito às questões do Tribunal de Justiça.

    Análise

    Quanto à primeira questão prejudicial

    23.

    Com a sua primeira questão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 5.o, n.o 1, da Diretiva 91/250 permite a um legítimo adquirente de um programa de computador proceder à descompilação desse programa quando essa descompilação seja necessária para corrigir erros que afetam o seu funcionamento. Decorre da decisão de reenvio que a dúvida deste órgão jurisdicional resulta, nomeadamente, do argumento apresentado pela Top System de que a descompilação de um programa de computador apenas é permitida na hipótese prevista no artigo 6.o dessa diretiva ( 13 ) e, por conseguinte, é excluída nas hipóteses abrangidas pelo artigo 5.o da referida diretiva. A resposta a essa questão exige que sejam analisadas as prerrogativas do titular dos direitos de autor sobre um programa de computador face ao legítimo adquirente desse programa.

    Quanto à relação entre o titular dos direitos e o legítimo adquirente de um programa de computador

    24.

    Antes de mais, o artigo 4.o da Diretiva 91/250 prevê os direitos exclusivos do titular dos direitos de autor, de caráter preventivo ( 14 ), sobre o seu programa de computador. O primeiro desses direitos é o direito de reprodução, cujo âmbito é particularmente amplo, uma vez que engloba não apenas qualquer forma de reprodução, permanente ou transitória, mas também as operações necessárias à utilização de um programa. Ora, contrariamente a outras categorias de obras, pelo menos as que são distribuídas no seu próprio suporte, a utilização de um programa de computador necessita sempre de uma reprodução, ainda que transitória, na memória do computador. Por conseguinte, os direitos exclusivos do titular relativos aos programas de computador configuram uma ingerência mais profunda na esfera privada do utilizador do que no caso de outras categorias de objetos protegidos, pois exigem de facto uma autorização do referido titular, mesmo para a mera utilização do programa. Ora, a Diretiva 91/250 não comporta exceções equivalentes às previstas no artigo 5.o, n.o 1 e n.o 2, alínea b), da Diretiva 2001/29/CE ( 15 ).

    25.

    Em seguida, a Diretiva 91/250 integra no monopólio do titular toda uma série de operações relativas à transformação de um programa de computador, incluindo «a reprodução dos respetivos resultados». Também nesse caso, os direitos do titular são particularmente abrangentes por contraposição às soluções clássicas do direito de autor, segundo as quais as transformações da obra só eventualmente entram na esfera exclusiva do autor através de uma divulgação pública do produto da transformação.

    26.

    Assim, o monopólio do titular dos direitos de autor sobre um programa de computador abrange não só os atos de exploração da obra clássicos no direito de autor mas igualmente a fruição dessa obra na esfera privada do utilizador.

    27.

    Por último, a Diretiva 91/250 consagra o direito de distribuição, que não está em causa no presente processo.

    28.

    Todavia, esta definição ampla das prerrogativas do titular é limitada quanto às relações com um legítimo adquirente do seu programa de computador. Com efeito, segundo a frase introdutória do artigo 4.o da Diretiva 91/250, os direitos exclusivos são conferidos ao titular «[s]em prejuízo do disposto nos artigos 5.o e 6.o» dessa diretiva. Assim, mesmo que estes artigos sejam apresentados como exceções aos direitos exclusivos ( 16 ), constituem de facto um limite inerente a esses direitos. Ora, segundo o artigo 5.o, n.o 1, da referida diretiva, não se encontram sujeitos à autorização do titular os atos previstos no artigo 4.o, alíneas a) e b), da mesma, ou seja, a reprodução e todas as formas de transformação do programa, sempre que sejam necessários para permitir ao legítimo adquirente do programa a sua utilização, incluindo a correção de erros.

    29.

    No entanto, do artigo 5.o, n.o 1, da Diretiva 91/250 consta a sua própria reserva, a saber, que os atos do legítimo adquirente de um programa de computador efetuados no âmbito da utilização do referido programa não estão sujeitos ao monopólio do titular, «[s]alvo disposições contratuais específicas em contrário».

    30.

    Em última análise, o verdadeiro resultado do artigo 4.o, alíneas a) e b), da Diretiva 91/250 é o de permitir ao titular dos direitos de autor sobre um programa de computador, nas suas relações com um legítimo adquirente do seu programa, definir contratualmente, de forma detalhada, as modalidades da utilização deste programa pelo adquirente. Em contrapartida, na falta dessas estipulações contratuais, o adquirente é livre de efetuar atos sujeitos, em princípio, ao monopólio do titular, desde que contidos no âmbito da utilização do programa em questão de acordo com o fim a que se destina, o que inclui a correção de erros.

    31.

    Por outro lado, é verdade que, segundo o décimo sétimo considerando da Diretiva 91/250, «as ações de carregamento e funcionamento necessárias à utilização de uma cópia do programa legalmente adquirido, incluindo a ação de correção dos respetivos erros, não podem ser proibidas por contrato». No entanto, não se pode negar que a análise da parte normativa dessa diretiva conduz à conclusão inversa. Com efeito, não só a referida diretiva não contém qualquer disposição expressa que vá no sentido desse considerando mas nem sequer permite uma interpretação nesse sentido. A única disposição da Diretiva 91/250 que poderia intervir, a saber, o seu artigo 5.o, n.o 1, trata do mesmo modo todos os atos enumerados no artigo 4.o, alíneas a) e b), dessa diretiva. Esta disposição não deixa, assim, qualquer margem de interpretação que permita subtrair determinados atos, a saber, o carregamento e o funcionamento do programa de computador, bem como a correção de erros, à reserva relativa às disposições contratuais específicas constantes do artigo 5.o, n.o 1, da referida diretiva. Ora, se é certo que os considerandos de uma diretiva podem guiar a interpretação das disposições que refletem esses considerandos, não têm, todavia, valor normativo que lhes permita substituir disposições inexistentes ou levar a uma interpretação contra legem.

    32.

    Tanto assim é que o artigo 9.o, n.o 1, segundo período, da Diretiva 91/250 dispõe expressamente que serão consideradas nulas quaisquer disposições contratuais contrárias ao artigo 6.o, bem como ao artigo 5.o, n.os 2 e 3, dessa diretiva. O facto de o legislador da União não ter aí mencionado o artigo 5.o, n.o 1, da referida diretiva só pode ser considerado deliberado.

    33.

    Pode acontecer que, como alega a Comissão na sua resposta a uma questão do Tribunal de Justiça a este respeito, que o décimo sétimo considerando da Diretiva 91/250 reflita a redação da proposta original desta diretiva ( 17 ). Com efeito, esta última, no seu artigo 5.o, n.o 1, estabelecia uma distinção entre os contratos de licença objeto de negociação entre as partes e os contratos ditos «de adesão», nos quais a liberdade contratual do adquirente de um programa de computador se limitava a decidir celebrar ou não celebrar o contrato. Segundo a Comissão, a proibição mencionada no décimo sétimo considerando dizia respeito apenas a esta segunda categoria de contratos. No entanto, o texto do artigo 5.o, n.o 1, da Diretiva 91/250 finalmente adotado não faz esta distinção. Por conseguinte, as estipulações de qualquer contrato de licença de utilização de um programa de computador podem regulamentar todos os aspetos desta utilização, incluindo o carregamento e o funcionamento, bem como a correção de erros.

    34.

    Isto não é tão ilógico como parece à primeira vista. É certo que é difícil de imaginar uma licença de utilização de um programa que proíba completamente essa utilização. No entanto, a utilização do programa pode ser limitada, por exemplo, no que respeita ao número de computadores em que o programa pode ser instalado e utilizado, de modo que o seu carregamento e o seu funcionamento em computadores adicionais, ainda que pelo mesmo adquirente ( 18 ), são proibidos. E, por maioria de razão, o mesmo se aplica à correção de erros que, habitualmente, não figura entre as operações necessárias à utilização de um programa de computador de acordo com o fim a que se destina. A correção de erros pode, portanto, ser reservada ao titular dos direitos de autor, sem afetar a coerência de uma licença de utilização do programa ( 19 ).

    35.

    Por conseguinte, compreendo a conclusão do Tribunal de Justiça, no Acórdão SAS Institute ( 20 ), segundo a qual, nos termos do décimo sétimo considerando da Diretiva 91/250, as operações de carregamento e de funcionamento de um programa de computador necessárias à utilização não podem ser proibidas pelo contrato, no sentido de que uma licença de utilização que proíba completamente os atos necessários a essa utilização seria uma contradição nos termos ( 21 ). Em contrapartida, essa conclusão não pode, na minha opinião, ser interpretada como conferindo um valor normativo autónomo àquele considerando.

    36.

    No que respeita, mais especificamente, à correção dos erros, uma interpretação segundo a qual não fosse possível excluir contratualmente a faculdade de o adquirente do programa proceder a essa correção criaria um desequilíbrio em detrimento dos titulares dos direitos de autor. Este desequilíbrio seria tanto mais grave se o Tribunal de Justiça seguisse a minha proposta de resposta no presente processo e considerasse que importa conferir ao adquirente a faculdade de descompilar o programa para efeitos dessa correção sem previamente pedir autorização ao titular. Com efeito, isto iria privar esse titular de qualquer possibilidade de se opor a essa descompilação ( 22 ).

    37.

    Todavia, essa questão não parece ser relevante em circunstâncias como as que estão em causa no processo principal. Com efeito, resulta dos autos do processo que o contrato entre a Top System e o Selor não contém qualquer estipulação que proíba ao Selor a correção dos erros nos programas de computador da Top System ou, pelo menos, esta empresa não invoca essas estipulações perante o órgão jurisdicional de reenvio. Assim, por força do artigo 5.o, n.o 1, da Diretiva 91/250, o Selor tem direito de corrigir os erros nos programas em causa.

    38.

    Por conseguinte, agora há que verificar se esta disposição permite ao adquirente de um programa de computador proceder à descompilação desse programa a fim de lhe corrigir os erros. Começarei a minha análise com alguns esclarecimentos quanto ao conceito de «descompilação».

    Quanto ao conceito de «descompilação»

    39.

    Como já referi ( 23 ), um programa de computador, redigido pelo programador numa linguagem de programação inteligível para o homem, deve em seguida ser vertido numa forma inteligível para o computador, ou seja, em linguagem‑máquina. Esta operação é efetuada através de um programa específico, o compilador, e toma o nome de «compilação». A versão do programa na linguagem de programação é designada «código‑fonte» e a versão em linguagem‑máquina, «código‑objeto». Não se trata de uma simples transcrição do programa em código binário, mas de uma «tradução» das instruções formuladas de maneira funcional e abstrata no código‑fonte em instruções concretas para os componentes de um processador de computador com uma determinada arquitetura. Alguns programas, redigidos em linguagens de programação mais próximas da linguagem‑máquina (linguagens ditas «de baixo nível»), não são compilados, mas sim agrupados. É um procedimento análogo ao da compilação e, uma vez que a Diretiva 91/250 não distingue entre esses dois procedimentos, há que considerar que os programas compilados e os programas agrupados devem ser tratados da mesma forma em termos legais.

    40.

    Os programas de computador são normalmente distribuídos apenas sob a forma de código‑objeto. Ora, o código‑objeto não é inteligível pelo homem. Por conseguinte, o legítimo adquirente de um programa de computador, na medida em que pretenda ler o conteúdo do programa e fazer‑lhe modificações, nomeadamente para corrigir erros, deve proceder a uma transformação do código‑objeto de que dispõe numa forma de programa inteligível para o homem, ou seja, redigido numa linguagem de programação. Esta operação, designada «descompilação», consiste em reproduzir, a partir de instruções para o processador inscritas no código‑objeto, instruções funcionais do programa. A descompilação é assim uma espécie de «engenharia de inversão» (reverse engineering), ou seja, uma operação mediante a qual se consegue descobrir a construção de uma ferramenta complexa partindo do produto final, aplicada aos programas de computador.

    41.

    No entanto, a descompilação não permite reproduzir o código‑fonte original do programa de computador em questão. Com efeito, durante o processo de compilação, perdem‑se algumas informações contidas no código‑fonte, não essenciais para o funcionamento do processador do computador, e o processo de descompilação não permite recuperá‑las. Por outro lado, o mesmo código‑fonte pode originar resultados diferentes depois de compilado, consoante a parametrização do compilador. Assim, o produto da descompilação constitui uma terceira versão do programa, frequentemente designado «quase código‑fonte». Não obstante, o programa assim descompilado pode ser novamente recompilado num código‑objeto suscetível de funcionar.

    Quanto à descompilação enquanto elemento integrante do monopólio do autor

    42.

    Interrogados sobre a questão de saber se a descompilação de um programa de computador está abrangida pelos direitos exclusivos do autor, conforme definidos no artigo 4.o, alíneas a) e b), da Diretiva 91/250, os interessados que apresentaram observações no presente processo foram unânimes respondendo afirmativamente. A Comissão apresentou uma resposta detalhada a este respeito. Entende que, em substância, se é certo que a descompilação enquanto tal não é diretamente visada nessas disposições, um determinado número de atos que, em conjunto, constituem o processo de descompilação, como a reprodução e a transformação do programa de computador, estão sem dúvida sujeitos ao monopólio do autor.

    43.

    Concordo com este ponto de vista.

    44.

    Com efeito, segundo o artigo 1.o, n.o 2, primeiro período, da Diretiva 91/250, a proteção prevista nesta diretiva aplica‑se a qualquer forma de expressão de um programa de computador. Ora, como o Tribunal de Justiça já declarou, tanto o código‑fonte como o código‑objeto constituem duas formas de expressão de um mesmo programa de computador, estando ambas protegidas ( 24 ). A passagem de uma forma para a outra requer, portanto, uma reprodução e uma transformação do programa.

    45.

    No que respeita à descompilação, esta consiste numa transformação do programa sob a forma do código‑objeto (protegida) no «quase código‑fonte». Este último constitui uma reprodução do programa resultante da sua transformação, consistindo esta na tradução da linguagem‑máquina numa linguagem de programação. Essa reprodução está expressamente sujeita ao direito exclusivo do autor do programa por força do artigo 4.o, alínea b), da Diretiva 91/250.

    46.

    Isto é, aliás, confirmado pelo décimo nono considerando dessa diretiva, segundo o qual «qualquer reprodução, tradução, adaptação ou transformação não autorizadas da forma do código em que uma cópia de um programa de computador foi criada constitui uma infração aos direitos exclusivos do autor».

    47.

    Por último, uma última confirmação de que a descompilação está abrangida pelo artigo 4.o, alíneas a) e b), da Diretiva 91/250 pode ser encontrada no artigo 6.o, n.o 1, da mesma. Com efeito, o artigo 6.o dessa diretiva, sob a epígrafe «Descompilação», refere a «reprodução do código e a tradução da sua forma na aceção das alíneas a) e b) do artigo 4.o » ( 25 ) daquela diretiva. Trata‑se, portanto, de uma definição indireta do conceito de «descompilação», na aceção da Diretiva 91/250, definição que remete expressamente para os direitos exclusivos do autor de um programa de computador enumerados no artigo 4.o, alíneas a) e b), dessa diretiva.

    48.

    Por conseguinte, importa concluir que a descompilação de um programa de computador está abrangida pelos direitos exclusivos do autor desse programa previstos no artigo 4.o, alíneas a) e b), da Diretiva 91/250.

    Quanto à inclusão da descompilação no âmbito do artigo 5.o, n.o 1, da Diretiva 91/250

    49.

    A conclusão mencionada no número anterior das presentes conclusões implica que a resposta à questão de saber se a descompilação beneficia da exceção (ou, para ser mais preciso, da limitação) prevista no artigo 5.o, n.o 1, da Diretiva 91/250 deva ser afirmativa. Sobre este ponto estou de acordo com a Comissão.

    50.

    Com efeito, segundo essa disposição, o legítimo adquirente de um programa de computador tem direito de efetuar todos os atos enumerados no artigo 4.o, alíneas a) e b), da Diretiva 91/250, desde que esses atos sejam necessários para a utilização desse programa, inclusivamente para a correção de erros. Por conseguinte, logicamente, se a descompilação ou os atos que a integram, como a reprodução e a transformação do código, entram no âmbito de proteção do artigo 4.o, alíneas a) e b), dessa diretiva, esses atos devem também entrar necessariamente no âmbito do artigo 5.o, n.o 1, da referida diretiva.

    51.

    A interpretação destas disposições apresentada pela Top System, segundo a qual a descompilação entra na esfera do monopólio do autor ao abrigo do artigo 4.o, alíneas a) e b), da Diretiva 91/250, mas é excluída da exoneração prevista no artigo 5.o, n.o 1, da mesma, não pode ser acolhida. A elaboração e a redação destas disposições mostram claramente que essas duas interpretações não são cumuláveis.

    Quanto à contribuição do artigo 6.o da Diretiva 91/250

    52.

    No entanto, a Top System alega que o artigo 6.o da Diretiva 91/250 deve exigir uma interpretação do artigo 5.o, n.o 1, desta diretiva, diferente da que propus acima. Com efeito, segundo esta empresa, o artigo 6.o da referida diretiva constitui uma espécie de lex specialis e é a única disposição relativa à descompilação. O caráter de lex specialis desta disposição exclui a descompilação do âmbito de aplicação do artigo 5.o, n.o 1, da Diretiva 91/250. Ora, uma vez que o artigo 6.o desta diretiva não autoriza a descompilação a não ser para assegurar a interoperabilidade dos programas de computador criados independentemente, a descompilação para corrigir erros num programa de computador, efetuada sem a autorização do titular dos direitos de autor, é proibida.

    53.

    No entanto, esta argumentação não resiste à crítica.

    54.

    Com efeito, como referi, o artigo 5.o, n.o 1, da Diretiva 91/250 não enumera os diversos atos que abrange. Esta disposição limita‑se a remeter para o artigo 4.o, alíneas a) e b), desta diretiva, exonerando da obrigação de obter a autorização do titular dos direitos de autor «os atos previstos» no referido artigo 4.o, alíneas a) e b), desde que sejam necessários à utilização de um programa de computador. Além disso, essa disposição não contém qualquer reserva quanto ao artigo 6.o da referida diretiva.

    55.

    Em contrapartida, o artigo 6.o, n.o 1, da Diretiva 91/250 diz respeito a duas categorias específicas entre os atos abrangidos pelas alíneas a) e b) do artigo 4.o desta diretiva, a saber, a «reprodução do código» e «a tradução da sua forma», e isto se esses atos forem indispensáveis para obter as informações necessárias à interoperabilidade, com outros programas, de um programa de computador criado independentemente, ou seja, uma finalidade diferente da prevista no artigo 5.o, n.o 1, da referida diretiva.

    56.

    Nada indica, assim, que o artigo 6.o da Diretiva 91/250 constitua uma lex specialis relativamente ao artigo 5.o, n.o 1, da mesma diretiva. Estas duas disposições têm um âmbito de aplicação diferente, uma vez que dizem respeito a dois casos diferentes. O artigo 5.o, n.o 1, diz respeito aos atos necessários à utilização de um programa de computador, incluindo a correção de erros, ao passo que o artigo 6.o é relativo aos atos necessários para assegurar a interoperabilidade dos programas criados independentemente. Estas duas disposições são, portanto, independentes uma da outra e não integram qualquer relação de lex specialis e lex generalis.

    57.

    O argumento da Top System de que o artigo 6.o da Diretiva 91/250 é a única disposição que permite a descompilação de um programa de computador deve, portanto, ser considerado improcedente.

    Incidência dos trabalhos preparatórios da Diretiva 91/250

    58.

    A conclusão segundo a qual o artigo 5.o, n.o 1, da Diretiva 91/250 abrange a descompilação de um programa de computador com a finalidade de lhe corrigir erros não é infirmada, contrariamente ao que afirma a Top System, pelos ensinamentos decorrentes dos trabalhos preparatórios dessa diretiva.

    59.

    Assim, não partilho dos argumentos da Top System, desenvolvidos, nomeadamente, na sua resposta às questões do Tribunal de Justiça, de que os trabalhos preparatórios da Diretiva 91/250 demonstram que a descompilação de um programa de computador protegido só é possível nas circunstâncias e para os fins definidos no artigo 6.o dessa diretiva. Com efeito, os documentos referidos pela Top System indicam que era claro, desde o início dos trabalhos, que os direitos exclusivos dos autores definidos no artigo 4.o, alíneas a) e b), da referida diretiva abrangiam a descompilação do programa protegido. Ora, uma vez que o artigo 5.o, n.o 1, da Diretiva 91/250 permite ao legítimo adquirente executar todos os atos enumerados no artigo 4.o, alíneas a) e b), da mesma diretiva, quando tal for necessário à utilização do programa, incluindo a correção de erros, isto engloba necessariamente a descompilação. Assim, toda a discussão durante o processo legislativo da Diretiva 91/250, que levou ao aditamento, ao projeto inicial da Comissão, do atual artigo 6.o desta diretiva, incidia sobre a descompilação efetuada fora da utilização normal de um programa de computador e, portanto, fora do âmbito do artigo 5.o, n.o 1, da referida diretiva. Trata‑se, com efeito, da descompilação para efeitos da interoperabilidade dos programas criados por autores independentes.

    60.

    Por conseguinte, é errado afirmar, como faz a Top System, que a questão da descompilação está definitivamente excluída do artigo 5.o da Diretiva 91/250. Com efeito, para que a descompilação fosse subtraída ao artigo 5.o, n.o 1, devia sê‑lo também ao artigo 4.o, alíneas a) e b), da mesma, o que a retiraria completamente da esfera exclusiva do titular dos direitos de autor, na falta de outra disposição que lhe pudesse assegurar uma proteção contra a descompilação. Ora, essa conclusão seria absurda.

    61.

    Com efeito, tudo o que os trabalhos preparatórios da Diretiva 91/250 demonstram é que a ideia inicial de incluir a exceção da descompilação para efeitos de interoperabilidade num número específico do artigo 5.o dessa diretiva (distinto do seu n.o 1) foi substituída pela criação de um novo artigo, mais complexo, consagrado a essa exceção. No entanto, isto em nada afeta o alcance do artigo 5.o, n.o 1, da referida diretiva.

    62.

    É certo que o Conselho limitou consideravelmente o âmbito desta nova exceção. Nomeadamente, foi abandonada a ideia, apresentada inicialmente pela Comissão, de permitir a descompilação para efeitos da manutenção do programa recentemente criado, interoperável com o programa descompilado. Na minha opinião, isto explica‑se pelo facto de, por força do artigo 9.o, n.o 1, segundo período, da Diretiva 91/250, esta exceção não poder ser derrogada por via contratual, contrariamente ao que acontece com o artigo 5.o, n.o 1. A intenção era, assim, proteger os titulares dos direitos de autor contra abusos. Não se pode negar que, neste caso, a descompilação é efetuada com fins alheios à utilização normal do programa ( 26 ).

    63.

    Assim, partilho da opinião da Comissão de que os trabalhos preparatórios da Diretiva 91/250 não permitem chegar a conclusões diferentes das que decorrem da interpretação literal e sistémica do artigo 5.o, n.o 1, dessa diretiva.

    Proposta de resposta

    64.

    Por conseguinte, proponho responder à primeira questão prejudicial dizendo que o artigo 5.o, n.o 1, da Diretiva 91/250 deve ser interpretado no sentido de que permite ao legítimo adquirente de um programa de computador proceder a uma descompilação desse programa se for necessária para corrigir erros que afetem o seu funcionamento.

    Quanto à segunda questão prejudicial

    65.

    Com a sua segunda questão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se, no caso de o artigo 5.o, n.o 1, da Diretiva 91/250 dever ser interpretado no sentido de que permite ao legítimo adquirente de um programa de computador proceder a uma descompilação desse programa se for necessária para corrigir erros, essa descompilação deve satisfazer as exigências impostas no artigo 6.o desta diretiva ou outras exigências.

    Quanto à aplicabilidade das exigências decorrentes do artigo 6.o da Diretiva 91/250

    66.

    O artigo 6.o da Diretiva 91/250 introduz uma exceção aos direitos exclusivos do titular dos direitos de autor sobre um programa de computador que permite a descompilação deste se isso for necessário para assegurar a compatibilidade com esse programa de um outro programa criado independentemente. Esta exceção é acompanhada de um determinado número de condições e de proibições, enumeradas naquela disposição.

    67.

    De acordo com a minha análise ( 27 ), o artigo 6.o da Diretiva 91/250 é autónomo em relação ao artigo 5.o desta diretiva, nomeadamente ao n.o 1 deste último artigo. O âmbito de aplicação e os objetivos da exceção instaurada pelo artigo 6.o da referida diretiva são diferentes dos da exceção prevista no artigo 5.o, n.o 1, da mesma diretiva e os atos por ela autorizados são, assim, definidos de forma diferente.

    68.

    Por conseguinte, as exigências impostas no artigo 6.o da Diretiva 91/250 não são aplicáveis, nem diretamente, nem por analogia, à exceção prevista no artigo 5.o, n.o 1, desta diretiva.

    69.

    Todavia, isso não significa que a aplicação desta última exceção não deva obedecer a nenhuma exigência.

    Quanto às outras exigências aplicáveis

    70.

    Com efeito, face à redação do artigo 5.o, n.o 1, da Diretiva 91/250, algumas condições e limitações são inerentes à exceção aos direitos exclusivos instaurada nessa disposição ( 28 ).

    71.

    Desde logo, esta exceção beneficia apenas o legítimo adquirente de um programa de computador. Este ponto não parece levantar qualquer problema no processo principal e não necessita, portanto, de um desenvolvimento mais amplo.

    72.

    Em seguida, os atos executados, no caso em apreço os atos que constituem, em conjunto, a descompilação de um programa de computador ( 29 ), devem ser necessários para permitir utilizar esse programa de acordo com o fim a que se destina e, mais especificamente, para corrigir erros. A respeito desta condição impõem‑se as seguintes observações.

    73.

    Em primeiro lugar, há que definir o conceito de «erro». Com efeito, a própria existência de um erro num programa de computador pode tornar‑se um pomo de discórdia entre o autor e o utilizador desse programa ( 30 ). Aquilo que, do ponto de vista deste último, pode ser um erro, pode ser uma funcionalidade ou uma característica intencional do ponto de vista do autor do referido programa. Embora a Diretiva 91/250 não contenha a definição desse termo, esta pode, todavia, deduzir‑se da redação e da finalidade do artigo 5.o, n.o 1, desta diretiva.

    74.

    Nos termos desta disposição, os atos efetuados pelo legítimo adquirente de um programa de computador devem permitir‑lhe «a utilização [do programa] de acordo com o fim a que esse programa se destina, bem como […] a correção de erros». Assim, a correção de erros faz parte de uma utilização do programa de acordo com o fim a que se destina.

    75.

    O fim a que se destina o programa de computador é o definido pelo seu autor ou, consoante o caso, o acordado entre o fornecedor e o adquirente do programa aquando da respetiva aquisição. Por conseguinte, um erro é uma disfunção que impede a utilização do programa de acordo com o fim a que se destina. Apenas a correção desses erros pode justificar os atos do utilizador, incluindo a descompilação, efetuados sem o consentimento do titular dos direitos de autor.

    76.

    Em contrapartida, nenhuma modificação ou aperfeiçoamento do programa relativamente ao fim a que se destinava inicialmente constitui uma correção de erros que justifique esses atos. Trata‑se, nomeadamente, da atualização do programa decorrente do progresso tecnológico. Por outras palavras, a obsolescência técnica do programa de computador não constitui um erro na aceção do artigo 5.o, n.o 1, da Diretiva 91/250.

    77.

    Com efeito, como os programas de computador não só constituem uma categoria de obras utilitárias mas, além disso, integram um setor em que o desenvolvimento tecnológico é particularmente rápido, é normal que, com o decurso do tempo, se tornem obsoletos. Ora, solucionar essa obsolescência com a atualização dos programas de computador, ou até mesmo com a sua substituição por novos programas, faz parte da exploração normal desses programas enquanto objetos protegidos pelo direito de autor e, por conseguinte, das prerrogativas dos titulares desse direito.

    78.

    Em segundo lugar, a intervenção do utilizador do programa de computador deve ser necessária do ponto de vista do objetivo prosseguido. No caso em apreço, a questão é a de saber se e em que medida a descompilação de um programa de computador é necessária para lhe corrigir os erros.

    79.

    É certo que existem erros que podem ser corrigidos sem acesso ao código‑fonte do programa, quer «manualmente» pelo utilizador, quer através de um software específico. No entanto, as partes que apresentaram observações no presente processo parecem estar de acordo quanto ao facto de que essa correção necessita, na maioria das vezes, introduzir modificações no próprio código do programa. Na medida em que o código‑objeto é ininteligível para o homem, essa correção exige o acesso ao código‑fonte de origem ou a tradução do código‑objeto em código‑fonte («quase código‑fonte» ( 31 )). Suscita‑se assim a seguinte questão: em que circunstâncias é que esta necessidade justifica a descompilação do programa pelo seu legítimo adquirente?

    80.

    A Top System alega que esses casos são muito raros e excecionais. Segundo esta empresa, na maioria das situações, ou o legítimo adquirente de um programa de computador já dispõe do código‑fonte, ou o titular dos direitos de autor pode permitir‑lhe o acesso, ou o titular, por força de um contrato de manutenção, é responsável pela correção dos erros.

    81.

    Deixo de lado a hipótese de o legítimo adquirente dispor da versão não compilada ou já descompilada do programa, ou seja, do acesso ao código‑fonte. É evidente que, nesta situação, não é necessária uma descompilação. O que é mais problemático é a relação entre esse adquirente e o titular dos direitos de autor sobre o programa de computador e as respetivas obrigações mútuas. No entanto, não se trata aqui da necessidade da descompilação do programa para a correção de erros, mas sim da condição da aplicabilidade do artigo 5.o, n.o 1, da Diretiva 91/250, a saber, a inexistência de disposições contratuais em contrário.

    82.

    Cabe recordar que o artigo 5.o, n.o 1, da Diretiva 91/250 é aplicável «[s]alvo disposições contratuais específicas em contrário». Dito de outro modo, o contrato de aquisição do programa pode organizar a utilização do programa, incluindo a correção de erros, limitando a possibilidade de o adquirente efetuar atos sujeitos ao monopólio do titular para efeitos dessa correção. Esta limitação pode ir até à interdição absoluta da correção de erros pelo adquirente ( 32 ). Nesse caso, a exceção prevista naquela disposição não se aplica e os atos do adquirente ficam limitados aos autorizados no contrato.

    83.

    Em contrapartida, se do contrato entre as partes não consta essa limitação, o legítimo adquirente de um programa de computador é, na minha opinião, livre de efetuar os atos enumerados no artigo 4.o, alíneas a) e b), da Diretiva 91/250, incluindo descompilar o programa, se tal se revelar necessário, nomeadamente para corrigir erros. Esse adquirente não tem quaisquer outras obrigações em relação ao titular dos direitos de autor sobre o programa. Por conseguinte, não é obrigado a solicitar ao titular a correção dos erros ou o acesso ao código‑fonte do programa, nem a recorrer aos tribunais para que estes ordenem ao titular que efetue um determinado ato. Em contrapartida, se essas obrigações não decorrem do artigo 5.o, n.o 1, da referida diretiva, é necessário ter consciência de que a descompilação é um processo complexo, dispendioso e de efeitos aleatórios. Na prática, para os utilizadores esta técnica será sempre utilizada em último recurso ( 33 ).

    84.

    Em caso de litígio, cabe certamente ao órgão jurisdicional competente determinar o conteúdo exato dos direitos e obrigações contratuais das partes no contrato de aquisição de um programa de computador.

    85.

    Se a correção de um erro exige frequentemente a modificação de um fragmento ínfimo do código de um programa de computador, encontrar esse fragmento pode exigir a descompilação de uma parte substancial, ou até mesmo de todo o programa. Por conseguinte, não se pode considerar essa descompilação desnecessária à correção do erro, pois isso impossibilitaria a correção e privaria de efeito útil a exceção prevista no artigo 5.o, n.o 1, da Diretiva 91/250. O legítimo adquirente do programa de computador tem assim o direito, por força desta disposição, de descompilar o programa na medida necessária não apenas à correção de um erro stricto sensu mas também para localizar esse erro e a parte do programa a modificar.

    86.

    Por último, importa concluir que o artigo 5.o, n.o 1, da Diretiva 91/250 não faz qualquer referência a restrições quanto à utilização das informações obtidas graças à descompilação de um programa de computador, como as constantes do artigo 6.o, n.o 2, dessa diretiva. No entanto, daí não decorre que o legítimo adquirente de um programa de computador, que tenha procedido à descompilação desse programa tendo em vista a correção de erros, seja livre de utilizar em seguida o produto dessa descompilação para outros fins.

    87.

    Com efeito, o artigo 4.o, alínea b), da Diretiva 91/250 sujeita ao monopólio do autor não apenas «[a] tradução, adaptação, ajustamentos ou outras modificações do programa» mas também «a reprodução dos respetivos resultados», ou seja, no caso da descompilação, o código‑fonte resultante dessa descompilação. Assim, qualquer reprodução do referido código‑fonte para um fim diferente da correção de erros está sujeita à autorização do titular dos direitos de autor. Por outro lado, o artigo 4.o, alínea c), dessa diretiva proíbe a distribuição ao público de cópias de um programa de computador sem o consentimento do titular dos direitos de autor sobre esse programa, o que se aplica também às cópias do código‑fonte resultante da descompilação.

    88.

    Em contrapartida, em conformidade com o artigo 1.o, n.o 2, da Diretiva 91/250, não são protegidas as informações que não façam parte do programa propriamente dito, isto é, que não sejam uma forma da sua expressão ( 34 ).

    89.

    Por conseguinte, proponho responder à segunda questão prejudicial dizendo que o artigo 5.o, n.o 1, da Diretiva 91/250 deve ser interpretado no sentido de que a descompilação de um programa de computador, nos termos dessa disposição, por um legítimo adquirente, para lhe corrigir os erros, não está sujeita às exigências do artigo 6.o dessa diretiva. Em contrapartida, essa descompilação só pode ser efetuada na medida necessária a essa correção e com os limites decorrentes das obrigações contratuais do adquirente.

    Conclusão

    90.

    Atendendo às considerações precedentes, proponho assim ao Tribunal de Justiça que responda às questões prejudiciais submetidas pela cour d’appel de Bruxelles (Tribunal de Recurso de Bruxelas, Bélgica) da seguinte forma:

    1)

    O artigo 5.o, n.o 1, da Diretiva 91/250/CEE do Conselho, de 14 de maio de 1991, relativa à proteção jurídica dos programas de computador, deve ser interpretado no sentido de que permite ao legítimo adquirente de um programa de computador proceder a uma descompilação desse programa se for necessária para corrigir erros que afetem o seu funcionamento.

    2)

    O artigo 5.o, n.o 1, da Diretiva 91/250 deve ser interpretado no sentido de que a descompilação de um programa de computador, nos termos dessa disposição, por um legítimo adquirente, para lhe corrigir os erros, não está sujeita às exigências do artigo 6.o dessa diretiva. Em contrapartida, essa descompilação só pode ser efetuada na medida necessária a essa correção e com os limites decorrentes das obrigações contratuais do adquirente.


    ( 1 ) Língua original: francês.

    ( 2 ) V. n.o 9 das presentes conclusões.

    ( 3 ) V. artigo 4.o do Tratado da Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI) sobre direito de autor, adotado em Genebra, em 20 de dezembro de 1996.

    ( 4 ) V., nomeadamente, Markiewicz, R., Ilustrowane prawo autorskie, Wolters Kluwer, Varsóvia, 2018, p. 463. Outros autores qualificam os programas de computador de «escritos por determinação legal», v. Vivant, M., Bruguière, J.‑M., Droit d’auteur et droits voisins, Dalloz, Paris, 2015, p. 183.

    ( 5 ) Janssens, M.‑Ch., «The Software Directive», dans Stamatoudi, I., e Torremans, P., EU Copyright Law. A Commentary, Edward Elgar Publishing, Cheltenham, 2014, pp. 89 a 148, designadamente p. 93.

    ( 6 ) Bing, J., «Copyright Protection of Computer Programs», em Derclaye, E. (edição), Research Handbook on the Future of EU Copyright, Edward Elgar Publishing, Cheltenham, 2009, pp. 401 a 425, designadamente p. 401.

    ( 7 ) Ou, mais especificamente, para o processador com uma determinada arquitetura, uma vez que as instruções do código‑objeto são específicas para cada tipo de processador e não serão executadas por um tipo diferente de processador.

    ( 8 ) V., nomeadamente, Karjala, D. S., «Copyright Protection of Computer Documents, Reverse Engineering and Professor Miller», University of Dayton Law Review, 1994, vol. 19, pp. 975 a 1020.

    ( 9 ) Shemtov, N., Beyond the Code. Protection of Non‑Textual Features of Software, Oxford University Press, Oxford, 2017, p. 28. Para desenvolvimentos mais amplos sobre a dicotomia ideia/expressão em direito de autor e a sua aplicabilidade aos programas de computador, v., em especial, pp. 102 a 127 desta obra.

    ( 10 ) JO 1991, L 122, p. 42.

    ( 11 ) Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de abril de 2009, relativa à proteção jurídica dos programas de computador (JO 2009, L 111, p. 16).

    ( 12 ) Moniteur belge de 27 de julho de 1994, p. 19315.

    ( 13 ) A saber, para assegurar a interoperabilidade de um programa de computador criado independentemente do programa descompilado.

    ( 14 ) O titular tem o direito «de efetuar ou autorizar».

    ( 15 ) Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de maio de 2001, relativa à harmonização de certos aspetos do direito de autor e dos direitos conexos na sociedade da informação (JO 2001, L 167, p. 10).

    ( 16 ) Artigo 5.o da Diretiva 91/250 tem por epígrafe «Exceções aos atos sujeitos a autorização».

    ( 17 ) V. proposta de diretiva do Conselho relativa à proteção jurídica dos programas de computador [COM(88) 816 final], apresentada pela Comissão em 5 de janeiro de 1989.

    ( 18 ) Contrariamente ao artigo 5.o, n.o 3, da Diretiva 91/250, o artigo 5.o, n.o 1, da mesma não refere o utilizador de uma cópia do programa, mas o adquirente do programa, independentemente do número de cópias adquiridas.

    ( 19 ) Por outro lado, os contratos de utilização dos programas de computador estão sujeitos a outras regras de direito, como as disposições do direito dos contratos, da proteção dos consumidores ou da concorrência. Essas regras limitam a liberdade contratual das partes, protegendo os adquirentes dos programas de computador contra os abusos por parte dos titulares dos direitos de autor sobre estes programas.

    ( 20 ) Acórdão de 2 de maio de 2012 (C‑406/10, EU:C:2012:259, n.o 58).

    ( 21 ) Na medida em que seria contrária ao próprio objetivo de um contrato de utilização de um programa de computador.

    ( 22 ) Ora, não se pode excluir que a descompilação possa ser efetuada com uma finalidade ilegítima que não esteja relacionada com a correção de erros.

    ( 23 ) V. n.o 5 das presentes conclusões.

    ( 24 ) Acórdão de 2 de maio de 2012, SAS Institute (C‑406/10, EU:C:2012:259, n.os 37 e 38).

    ( 25 ) O sublinhado é meu.

    ( 26 ) Por outro lado, como irei explicar em seguida, o artigo 5.o, n.o 1, da Diretiva 91/250 não permite, na minha opinião, a descompilação de um programa de computador para efeitos da manutenção do programa descompilado, exceto para a correção de erros em sentido estrito (v. n.os 75 e 76 das presentes conclusões).

    ( 27 ) V., nomeadamente, n.os 52 a 56 das presentes conclusões.

    ( 28 ) V., nomeadamente, Janssens, M.‑Ch., op.cit., p. 127.

    ( 29 ) V. n.os 45 a 47 das presentes conclusões.

    ( 30 ) No processo principal, a Top System nega a existência de um erro no programa em causa, apesar de o órgão jurisdicional de reenvio referir uma peritagem que constata a existência desse erro.

    ( 31 ) V. n.o 41 das presentes conclusões.

    ( 32 ) Essa possibilidade existe, na minha opinião, apesar da redação do décimo sétimo considerando da Diretiva 91/250 (v. n.os 31 a 34 das presentes conclusões).

    ( 33 ) Essa característica da descompilação é salientada por inúmeros autores. V., nomeadamente, Bing, J., op.cit., pp. 423 e 424.

    ( 34 ) Devo assinalar que, na minha opinião, esta interpretação não confere ao titular dos direitos de autor sobre um programa de computador uma proteção menor do que a conferida pelo artigo 6.o, n.o 2, da Diretiva 91/250 na hipótese de uma descompilação para efeitos da interoperabilidade dos programas criados independentemente. Com efeito, lido à luz do artigo 1.o, n.o 2, dessa diretiva, o artigo 6.o, n.o 2, da mesma só pode ser interpretado no sentido de que o termo «informações» designa apenas os elementos de um programa de computador que são protegidos em virtude da referida diretiva, ou seja, as formas da sua expressão, e não apenas as «ideias e princípios subjacentes» a esses elementos. Por outro lado, devo recordar que, por força do artigo 9.o, n.o 1, segundo período, da Diretiva 91/250, a descompilação baseada no artigo 6.o desta diretiva não pode ser excluída por contrato, contrariamente à descompilação efetuada para efeitos da correção de erros.

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