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Document 62019CJ0907

    Acórdão do Tribunal de Justiça (Primeira Secção) de 25 de março de 2021.
    Q-GmbH contra Finanzamt Z.
    Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Bundesfinanzhof.
    Reenvio prejudicial — Diretiva 2006/112/CE — Imposto sobre o valor acrescentado (IVA) — Isenções — Artigo 135.o, n.o 1, alínea a) — Operações de seguro e prestações de serviços relacionadas com essas operações, efetuadas por corretores e intermediários de seguros — Prestação efetuada por uma seguradora e composta por diferentes serviços — Qualificação de prestação única.
    Processo C-907/19.

    Court reports – general – 'Information on unpublished decisions' section

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:2021:237

     ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção)

    25 de março de 2021 ( *1 )

    «Reenvio prejudicial — Diretiva 2006/112/CE — Imposto sobre o valor acrescentado (IVA) — Isenções — Artigo 135.o, n.o 1, alínea a) — Operações de seguro e prestações de serviços relacionadas com essas operações, efetuadas por corretores e intermediários de seguros — Prestação efetuada por uma seguradora e composta por diferentes serviços — Qualificação de prestação única»

    No processo C‑907/19,

    que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Bundesfinanzhof (Tribunal Tributário Federal, Alemanha), por Decisão de 5 de setembro de 2019, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 11 de dezembro de 2019, no processo

    Q‑GmbH

    contra

    Finanzamt Z,

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção),

    composto por: J.‑C. Bonichot (relator), presidente de secção, L. Bay Larsen, C. Toader, M. Safjan e N. Jääskinen, juízes,

    advogado‑geral: M. Szpunar,

    secretário: A. Calot Escobar,

    vistos os autos,

    considerando as observações apresentadas:

    em representação de Q‑GmbH, por T. Küffner e M. Rust, Rechtsanwälte,

    em representação do Governo alemão, por J. Möller e S. Eisenberg, na qualidade de agentes,

    em representação da Comissão Europeia, por A. Armenia e L. Mantl, na qualidade de agentes,

    vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

    profere o presente

    Acórdão

    1

    O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 135.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado (JO 2006, L 347, p. 1).

    2

    Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe Q‑GmbH ao Finanzamt Z (Serviço de Finanças Z, Alemanha) a respeito do imposto sobre o valor acrescentado (IVA) a pagar pelos serviços prestados por Q a uma seguradora, que incluem a concessão de uma licença para a utilização de um produto de seguros, a venda desse produto por conta da seguradora e a execução dos contratos de seguro celebrados.

    Quadro jurídico

    Direito da União

    3

    Nos termos do artigo 1.o, n.o 2, segundo parágrafo, da Diretiva 2006/112:

    «Em cada operação, o IVA, calculado sobre o preço do bem ou serviço à taxa aplicável ao referido bem ou serviço, é exigível, com prévia dedução do montante do imposto que tenha incidido diretamente sobre o custo dos diversos elementos constitutivos do preço.»

    4

    Integrado no capítulo 3 do título IX desta diretiva, sob a epígrafe «Isenções em benefício de outras atividades», o seu artigo 135.o dispõe, no n.o 1:

    «Os Estados‑Membros isentam as seguintes operações:

    a)

    As operações de seguro e de resseguro, incluindo as prestações de serviços relacionadas com essas operações efetuadas por corretores e intermediários de seguros;

    […]»

    Direito alemão

    5

    Nos termos do § 4, ponto 11, da Umsatzsteuergesetz (Lei do Imposto sobre o Volume de Negócios; a seguir «UStG»), de 21 de fevereiro de 2005 (BGBl. 2005 I, p. 386), estão isentas de imposto as operações efetuadas no âmbito da atividade de representante de uma instituição de crédito à habitação, de intermediário de seguros e de corretor de seguros.

    Litígio no processo principal e questão prejudicial

    6

    Q desenvolve, comercializa e vende produtos de seguros. No âmbito das suas atividades, esta sociedade celebrou um contrato com uma seguradora, concretamente a F‑Versicherungs‑AG (a seguir «F»).

    7

    Nos termos desse contrato, Q devia prestar três tipos de serviços. Em primeiro lugar, punha à disposição de F, mediante uma licença de utilização não exclusiva, um produto de seguros concebido para a cobertura de riscos especiais. Em segundo lugar, efetuava vendas de seguros para esta seguradora, adaptando as apólices em caso de necessidade e avaliando os riscos. Esses contratos de seguro foram celebrados entre a seguradora e os tomadores dos seguros. Em terceiro e último lugar, Q assegurava, nomeadamente, a gestão desses contratos e a regularização de sinistros.

    8

    Estes serviços eram objeto de uma remuneração paga por F a Q, sob a forma de comissão de corretagem.

    9

    Em 27 de agosto de 2012, Q apresentou às autoridades fiscais alemãs a sua declaração de imposto sobre o volume de negócios relativa ao exercício de 2011. Nessa declaração, requereu a isenção de IVA relativamente à totalidade das suas prestações, nos termos do artigo 4.o, ponto 11, da UStG.

    10

    No aviso de liquidação de 4 de novembro de 2014, o Serviço de Finanças Z indeferiu o pedido. Declarou que existiam várias prestações distintas, das quais unicamente a atividade de mediação de seguros estava isenta ao abrigo do artigo 4.o, ponto 11, da UStG.

    11

    Q interpôs recurso do referido aviso de liquidação no órgão jurisdicional de primeira instância competente em matéria tributária e, posteriormente, impugnou a decisão proferida por este no Bundesfinanzhof (Tribunal Tributário Federal, Alemanha). Este último órgão jurisdicional considera que, em aplicação dos critérios desenvolvidos pela jurisprudência do Tribunal de Justiça, nomeadamente no Acórdão de 18 de janeiro de 2018, Stadion Amsterdam (C‑463/16, EU:C:2018:22), os serviços em causa devem, em princípio, ser qualificados de prestação única.

    12

    O regime fiscal de uma prestação única é determinado em função do seu elemento principal, concretamente, no caso em apreço, segundo o órgão jurisdicional de reenvio, a concessão de licenças para a utilização de um produto de seguros. Os outros elementos, que são a mediação de seguros e as prestações com vista à execução dos contratos de seguro, incluindo a regularização de sinistros, são apenas prestações acessórias. Com efeito, as atividades de mediação de seguros exercidas por Q estão associadas à disponibilização do seu produto de seguros à seguradora. Foi por conta desta que a referida sociedade colocou esse produto junto dos tomadores de seguros. Além disso, a remuneração de Q era igualmente devida se outros intermediários de seguros procedessem à venda do seu produto de seguros por conta da seguradora.

    13

    Além disso, como decorre da jurisprudência do Tribunal de Justiça, a isenção prevista no artigo 135.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva 2006/112 não se aplica a uma atividade que consiste na concessão de licenças para a utilização de um produto de seguros.

    14

    Com efeito, na hipótese de uma seguradora externalizar a prestação de serviços de produtos de seguros para os confiar a terceiros, esses serviços não estão abrangidos pela isenção, o que resulta do Acórdão de 3 de março de 2005, Arthur Andersen (C‑472/03, EU:C:2005:135). Além disso, face ao Acórdão de 17 de março de 2016, Aspiro (C‑40/15, EU:C:2016:172), a regularização de sinistros por um empresário por conta de uma seguradora não pode ser qualificada de prestação efetuada por um intermediário de seguros, uma vez que falta a relação com os aspetos essenciais da atividade de intermediário de seguros, concretamente a angariação de clientes e o estabelecimento de uma relação entre estes e a seguradora.

    15

    Ora, segundo o Bundesfinanzhof (Tribunal Tributário Federal), não está excluído que o Acórdão de 17 de março de 2016, Aspiro (C‑40/15, EU:C:2016:172), possa ser interpretado de forma diferente, de modo a que uma prestação única deva igualmente ser isenta quando só uma prestação acessória cumpre os requisitos estabelecidos no artigo 135.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva 2006/112. No processo principal, é pacífico que Q exercia, com caráter acessório, uma atividade de mediação de seguros que, enquanto tal, deveria estar isenta ao abrigo dessa disposição.

    16

    Por conseguinte, para dirimir o litígio que lhe foi submetido, o órgão jurisdicional de reenvio considera necessário determinar o alcance exato do Acórdão de 17 de março de 2016, Aspiro (C‑40/15, EU:C:2016:172), a fim de determinar se a prestação única efetuada por Q deve estar isenta de IVA.

    17

    Nestas condições, o Bundesfinanzhof (Tribunal Tributário Federal) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

    «Constitui uma prestação de um serviço relacionado com operações de seguro e de resseguro efetuadas por corretores e intermediários de seguros, isenta de imposto ao abrigo do artigo 135.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva [2006/112], a prestação realizada por um sujeito passivo que exerce uma atividade de mediação para uma sociedade de seguros e que, além disso, disponibiliza a essa sociedade o produto de seguros de que é mediador?»

    Quanto à questão prejudicial

    18

    Com a sua questão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 135.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva 2006/112 deve ser interpretado no sentido de que a isenção de IVA que estabelece é aplicável às prestações efetuadas por um sujeito passivo que incluem a disponibilização de um produto de seguros a uma sociedade de seguros e, a título acessório, a venda desse produto por conta da referida sociedade e a gestão dos contratos de seguro celebrados, na medida em que essas prestações devam ser qualificadas de prestação única para efeitos de IVA.

    19

    Resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que, quando uma operação é constituída por um conjunto de elementos e de atos, há que tomar em consideração todas as circunstâncias em que se desenvolve a operação em questão, para determinar se essa operação dá lugar, para efeitos de IVA, a duas ou mais prestações distintas ou a uma prestação única (Acórdão de 18 de janeiro de 2018, Stadion Amsterdam, C‑463/16, EU:C:2018:22, n.o 21 e jurisprudência referida).

    20

    Se cada operação deve normalmente ser considerada, para efeitos de IVA, distinta e independente, como decorre do artigo 1.o, n.o 2, segundo parágrafo, da Diretiva 2006/112, a operação constituída por uma só prestação no plano económico não deve ser artificialmente decomposta, para não alterar a funcionalidade do sistema do IVA. É por isso que existe uma prestação única quando dois ou mais elementos ou atos fornecidos pelo sujeito passivo ao cliente estão tão estreitamente ligados que formam, objetivamente, uma única prestação económica indissociável, cuja decomposição revestiria caráter artificial [Acórdão de 2 de julho de 2020, Blackrock Investment Management (UK), C‑231/19, EU:C:2020:513, n.o 23 e jurisprudência referida].

    21

    Tal sucede, por exemplo, quando se verifica que um ou vários elementos constituem uma prestação principal e que, pelo contrário, outros elementos devem ser considerados uma ou várias prestações acessórias que partilham do destino fiscal da prestação principal. Em especial, uma prestação deve ser considerada acessória de uma prestação principal quando não constitua para a clientela um fim em si mesma, mas um meio de beneficiar, nas melhores condições, do serviço principal do prestador (Acórdão de 2 de dezembro de 2010, Everything Everywhere, C‑276/09, EU:C:2010:730, n.os 24, 25 e jurisprudência referida).

    22

    No caso em apreço, resulta da decisão de reenvio que é a licença de utilização do produto de seguros em questão que permite a uma seguradora oferecer esse produto a potenciais clientes. Para esse efeito, é‑lhe permitido recorrer aos serviços de mediação prestados por Q, mas não está de forma alguma obrigada a fazê‑lo. Parece, assim, que os serviços de mediação prestados por esta sociedade não são indispensáveis para a distribuição do referido produto de seguros aos futuros segurados, constituindo antes uma atividade distinta e independente, o que cabe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar.

    23

    Além disso, as informações constantes da decisão de reenvio não permitem determinar se os serviços de mediação prestados por Q se distinguem dos mesmos serviços prestados por outros intermediários. Em especial, sem prejuízo das verificações que incumbem ao órgão jurisdicional de reenvio, não se afigura que a mediação efetuada por Q permita a uma seguradora utilizar melhor a licença concedida pela referida sociedade ou que só ela possa garantir, através dos seus serviços de mediação, que essa seguradora beneficie dessa licença nas melhores condições.

    24

    Nestas circunstâncias, não parece que a concessão de uma licença de utilização do produto de seguros em causa a uma seguradora, por um lado, e os serviços de mediação prestados por Q, por outro, devam ser qualificados de prestação única para efeitos de IVA.

    25

    Por outro lado, cabe ao órgão jurisdicional de reenvio, tendo em conta as mesmas considerações que resultam dos n.os 22 e 23 do presente acórdão, verificar se os serviços de gestão dos contratos de seguro igualmente prestados por Q e a concessão de uma licença de utilização do produto de seguros em questão constituem uma prestação única.

    26

    Todavia, não compete ao Tribunal de Justiça, chamado a pronunciar‑se no âmbito do artigo 267.o TFUE, qualificar os factos do litígio no processo principal, uma vez que essa qualificação é da exclusiva competência do órgão jurisdicional nacional. O papel do Tribunal de Justiça limita‑se a fornecer àquele uma interpretação do direito da União útil para a decisão que lhe cabe adotar no processo que lhe foi submetido [Acórdão de 2 de julho de 2020, Blackrock Investment Management (UK), C‑231/19, EU:C:2020:513, n.o 25 e jurisprudência referida].

    27

    Por conseguinte, uma vez que não se pode excluir totalmente que, após ter efetuado as verificações referidas nos n.os 22 a 25 do presente acórdão, o órgão jurisdicional de reenvio conclua que os diferentes serviços prestados por Q constituem uma prestação única, cumpre examinar se essa prestação pode estar abrangida pela isenção de IVA prevista no artigo 135.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva 2006/112.

    28

    A este respeito, importa recordar que, dado que as prestações acessórias partilham do tratamento da prestação principal em matéria de IVA, na hipótese de essa prestação principal estar abrangida pelo artigo 135.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva 2006/112, a totalidade da operação deve estar isenta de IVA nos termos desta disposição (v., neste sentido, Acórdão de 8 de dezembro de 2016, Stock ’94, C‑208/15, EU:C:2016:936, n.o 25).

    29

    No caso em apreço, o órgão jurisdicional de reenvio considera que a concessão de licenças para a utilização de um produto de seguros constitui a prestação principal efetuada por Q. Por conseguinte, há que examinar se essa prestação cumpre os requisitos previstos no artigo 135.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva 2006/112 para estar isenta de IVA.

    30

    A este respeito, importa recordar que os termos utilizados para designar as isenções previstas no artigo 135.o, n.o 1, desta diretiva devem ser interpretados estritamente, uma vez que constituem derrogações ao princípio geral de que o IVA é cobrado sobre cada prestação de serviços efetuada a título oneroso por um sujeito passivo agindo nessa qualidade [Acórdão de 8 de outubro de 2020, United Biscuits (Pensions Trustees) e United Biscuits Pension Investments, C‑235/19, EU:C:2020:801, n.o 29].

    31

    Nos termos do artigo 135.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva IVA, os Estados‑Membros isentam de imposto, por um lado, «[a]s operações de seguro e de resseguro» e, por outro, «as prestações de serviços relacionadas com essas operações, efetuadas por corretores e intermediários de seguros».

    32

    No tocante, em primeiro lugar, às operações de seguro, estas caracterizam‑se, como é geralmente admitido, pelo facto de o segurador, mediante o pagamento prévio de um prémio pelo segurado, se comprometer a fornecer a este último, em caso de realização do risco coberto, a prestação acordada no momento da celebração do contrato. Tais operações implicam, pela sua própria natureza, a existência de uma relação contratual entre o prestador do serviço de seguro e a pessoa cujos riscos são cobertos pelo seguro, a saber, o segurado (Acórdão de 17 de março de 2016, Aspiro, C‑40/15, EU:C:2016:172, n.os 22 e 23).

    33

    Assim, é imperioso observar que a prestação efetuada por Q, que consiste na concessão de uma licença para a utilização de um produto de seguros, não pode ser qualificada de operação de seguro, uma vez que o concedente só está contratualmente vinculado ao segurador que, em conformidade com o contrato de licença, explora o produto em questão. Segundo o órgão jurisdicional de reenvio, Q também não assume a cobertura dos riscos segurados com base nesse produto.

    34

    No que respeita, em segundo lugar, às «prestações de serviços relacionadas com […] operações [de seguro] efetuadas por corretores e intermediários de seguros», como resulta dos próprios termos do artigo 135.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva 2006/112, a sua isenção está sujeita ao cumprimento de dois requisitos cumulativos. Com efeito, essas prestações devem estar «relacionadas» com operações de seguro e ser «efetuadas por corretores e intermediários de seguros».

    35

    No que se refere ao primeiro destes requisitos, o Tribunal de Justiça declarou que o termo «relacionadas» é suficientemente amplo para cobrir diferentes prestações que contribuem para a realização de operações de seguro, designadamente, a regularização de sinistros, a qual é uma das partes essenciais dessas operações (Acórdão de 17 de março de 2016, Aspiro, C‑40/15, EU:C:2016:172, n.o 33). Por conseguinte, não está excluído que a concessão de uma licença que permita a uma seguradora utilizar um produto de seguros concebido por um terceiro e, ao abrigo deste, celebrar contratos de seguro possa constituir uma prestação relacionada com uma operação de seguro.

    36

    Quanto ao segundo dos referidos requisitos, a fim de determinar se as prestações para as quais é pedida a isenção ao abrigo do artigo 135.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva 2006/112 são efetuadas por um corretor ou por um intermediário de seguros, importa não se basear na qualidade formal do prestador, mas analisar o próprio conteúdo dessas prestações (v., neste sentido, Acórdão de 17 de março de 2016, Aspiro, C‑40/15, EU:C:2016:172, n.os 35 e 36).

    37

    No âmbito dessa análise, há que verificar se estão preenchidos dois requisitos. Em primeiro lugar, o prestador deve manter uma relação com a seguradora e com o segurado, podendo essa relação ser apenas indireta se o prestador for um subcontratante do corretor ou do intermediário. Em segundo lugar, a sua atividade deve abranger os aspetos essenciais da função de intermediário de seguros, como a angariação de clientes e o estabelecimento de relações entre estes e a seguradora (v., neste sentido, Acórdão de 17 de março de 2016, Aspiro, C‑40/15, EU:C:2016:172, n.os 37 e 39).

    38

    No que respeita à concessão de licenças para a utilização de um produto de seguros por Q, há que declarar, sem prejuízo das verificações que incumbem ao órgão jurisdicional de reenvio, que nenhum destes requisitos está preenchido.

    39

    Com efeito, uma vez que há que examinar o conteúdo dessa prestação específica para determinar se está abrangida pelo artigo 135.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva 2006/112, o facto de Q também prestar serviços de mediação não é pertinente.

    40

    Conforme salientado no n.o 22 do presente acórdão, resulta da decisão de reenvio que a licença de utilização do produto de seguros em questão permite a uma seguradora oferecer esse produto a potenciais clientes, com vista à celebração de contratos de seguro. Em contrapartida, não se afigura que, na fase da concessão dessa licença, seja exigido o concurso de futuros clientes potenciais. Unicamente quando a seguradora decide recorrer a serviços de mediação e escolhe, nesse âmbito, os serviços prestados por Q é que esta última pode entrar em contacto com os segurados.

    41

    Pelas mesmas razões, a concessão de licenças para a utilização de um produto de seguros não é uma atividade que abranja aspetos essenciais da função de intermediário de seguros. Admitindo que o produto em questão tenha sido concebido especificamente para um círculo restrito de pessoas em função das suas necessidades específicas, incumbe, todavia, à seguradora empreender as diligências necessárias para as abordar com vista à venda desse produto, nomeadamente recorrendo a um intermediário de seguros.

    42

    Daqui resulta que a atividade exercida por Q, que consiste na concessão de licenças para a utilização de um produto de seguros, não pode ser qualificada de prestação efetuada por corretores e intermediários de seguros, na aceção do artigo 135.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva 2006/112.

    43

    Por conseguinte, se os serviços prestados por Q constituíssem uma prestação única, esta não poderia estar isenta de IVA em aplicação da referida disposição, uma vez que a prestação principal não está abrangida pelo âmbito de aplicação da mesma.

    44

    Tendo em conta as considerações precedentes, há que responder à questão submetida que o artigo 135.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva 2006/112 deve ser interpretado no sentido de que a isenção de IVA que estabelece não é aplicável às prestações efetuadas por um sujeito passivo que incluem a disponibilização de um produto de seguros a uma sociedade de seguros e, a título acessório, a venda desse produto por conta da referida sociedade e a gestão dos contratos de seguro celebrados, no caso de o órgão jurisdicional de reenvio qualificar essas prestações de prestação única para efeitos de IVA.

    Quanto às despesas

    45

    Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

     

    Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Primeira Secção) declara:

     

    O artigo 135.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, deve ser interpretado no sentido de que a isenção de imposto sobre o valor acrescentado (IVA) que estabelece não é aplicável às prestações efetuadas por um sujeito passivo que incluem a disponibilização de um produto de seguros a uma sociedade de seguros e, a título acessório, a venda desse produto por conta da referida sociedade e a gestão dos contratos de seguro celebrados, no caso de o órgão jurisdicional de reenvio qualificar essas prestações de prestação única para efeitos de IVA.

     

    Assinaturas


    ( *1 ) Língua do processo: alemão.

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